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Didática

Fundamentos da Didática
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS

Gerente Editorial
CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA
Projeto Gráfico
TIAGO DA ROCHA
Autoria
MARLY SAVIOLI
AUTORIA
Marly Savioli
Olá! Meu nome é Marly Savioli. Sou mestranda em Educação e
pós-graduada em Ética, Valores e Cidadania na Escola. Além disso,
sou formada em Pedagogia, com especialização em Administração e
Supervisão Escolar. Tenho 35 anos de experiência técnico-profissional na
área educacional, durante os quais trabalhei para escolas particulares,
Prefeituras Municipais e Assessorias Educacionais em geral.

Como educadora, exerci nas escolas diversos papéis, como


professora, orientadora educacional, coordenadora pedagógica, vice-
diretora e diretora. Por acreditar nas pessoas e na capacidade de mudar
o mundo por meio da educação, trabalho atualmente para a Fundação
Lemann como formadora de educadores e gestores educacionais,
orientando-os e subsidiando seus trabalhos com caminhos mais eficazes.
Por isso, fui convidada pela Editora Telesapiens a integrar seu elenco de
autores independentes.

Estou muito feliz em poder ajudar você nesta fase de muito estudo
e trabalho. Conte comigo!
ICONOGRÁFICOS
Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez
que:

OBJETIVO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimento de de se apresentar um
uma nova compe- novo conceito;
tência;

NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram que
vações ou comple- ser priorizadas para
mentações para o você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado ou sobre o tema em
detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e links sidade de chamar a
para aprofundamen- atenção sobre algo
to do seu conheci- a ser refletido ou dis-
mento; cutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso aces- quando for preciso
sar um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das últi-
assistir vídeos, ler mas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma quando o desen-
atividade de au- volvimento de uma
toaprendizagem for competência for
aplicada; concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
A Didática: Conceitualização e Características............................... 10
Conceitualizando a Didática..................................................................................................... 14

Grandes Educadores e a Didática......................................................... 18


Educação, suas Definições e Processos.............................................29
Educação como Forma de Dominação............................................... 34
Didática 7

01
UNIDADE
8 Didática

INTRODUÇÃO
A disciplina Didática faz parte da cadeia de estudos da Educação
que busca compreender o processo de ensino e aprendizagem em sua
multidimensionalidade. O objetivo da disciplina é promover diferentes
formas e práticas de interação entre professores e alunos no contexto
educacional de aprendizagem e nas circunstâncias históricas, sociais e
culturais em que são construídos os conhecimentos.

Existe também a ação intencional de organizar de forma


sistematizada os conteúdos, buscando responder “por que’, ”para que”
e “como” fazer, além de “qual a importância da aprendizagem. Ademais,
pretende-se proporcionar a reflexão do processo da avaliação e as formas
como ele acontece.

Nesta unidade de ensino, vamos buscar clarear mais cada aspecto


que envolve a Didática, iniciando por suas acepções e históricos e
conhecendo diversos educadores que se destacaram por suas ideias
sobre a aprendizagem.

Entendeu? Ao longo desta unidade letiva você mergulhará nesse


universo!
Didática 9

OBJETIVOS
Olá! Seja bem-vindo a nossa Unidade 1, e o nosso objetivo é auxiliar
você no desenvolvimento das seguintes competências profissionais até o
término desta etapa de estudos:

1. Conhecer a conceitualização e as características dos fundamentos


didáticos.

2. Identificar os grandes educadores e suas teorias sobre Didática.

3. Refletir sobre a história do processo de ensino e as tendências


pedagógicas.

4. Reconhecer as acepções e processos da educação.

Preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao


trabalho!
10 Didática

A Didática: Conceitualização e
Características

OBJETIVO:

A escola se transformou em sua essência. O que, antes,


era um espaço de ensino, no qual professores eram os
supremos conhecedores da cognição científica, os alunos,
meros expectadores, e a reprodução do conhecimento, a
base do trabalho pedagógico, hoje se transformou em uma
área de desafios constantes..

O professor já não consegue garantir o aprendizado com apenas


a transmissão do conhecimento em aulas expositivas, como fazia antes.
Até meados do século XX, a tendência pedagógica tradicional dominou
o cenário brasileiro. Dentro dessa perspectiva, a função do professor
centra- se na transmissão dos conhecimentos científicos visando à
adaptação do aluno à sociedade. Na abordagem tradicional, é o professor
quem ocupa o centro do processo educativo, sendo o único detentor do
conhecimento. O seu papel é garantir que, por meio da memorização e
da repetição de exercícios, o aluno memorize os conteúdos estudados.
Os procedimentos didáticos não levam em conta o contexto escolar nem
os problemas reais vivenciados na realidade social.

A diversidade cultural encontrada atualmente nas escolas teve sua


origem na democratização do ensino. Antes, os professores lidavam com
alunos oriundos das classes sociais mais abastadas. Com a Constituição
de 1988, a educação tornou-se um direito de todos e um dever do Estado.
Com isso, encontramos nas escolas pessoas com diversas características
e situações socioeconômicas múltiplas.

A tecnologia, a violência e as transformações da sociedade trazem


um desafio crescente para o educador. Como trabalhar conteúdos e
competências com alunos que não desejam estar no espaço escolar?
Como motivá-los? Como usar essa tecnologia como apoio didático?
Didática 11

Para responder a essa pergunta, precisamos mergulhar no universo


da didática, que abreviadamente pode ser entendida como a prática de
ensino que o professor escolhe para que ocorra a aprendizagem.

A palavra “Didática” vem do grego Téchne Didaktike, que significa


o dom de ensinar. Com o surgimento da Pedagogia Moderna, rompeu-
se a ideia de que para ensinar basta ter um dom ou gostar de crianças.
A Pedagogia como “a ciência que investiga a teoria e a prática da
educação tem como um ramo de estudo a Didática. A Didática, nesse
sentido, é entendida como a Prática do Ensino” (LIBÂNEO, 2013, p. 24). A
Didática é um ramo de estudo exclusivo da Pedagogia. Sendo assim, seu
objeto de estudo é o ensino- aprendizagem.

A Didática vem do campo das ciências humanas, da relação


interpessoal “eu e o outro”, isto é, da empatia do ato de ensinar. Define-se
a Didática a partir do tempo e do espaço dos fatos históricos, sociais e
econômicos que determinaram o processo de ensino e aprendizagem.

O que o ensino e a aprendizagem têm a ver com a Didática?

Apesar de serem palavras com sentidos diferentes, a ideia


de ensino e aprendizagem são congruentes e se complementam. E é na
didática que encontramos essa ponte entre teoria e prática. A didática
abrange o ato de ensinar e os métodos empregados no ensino.

O ensino está pautado no trabalho do professor. A aprendizagem,


por sua vez, refere-se ao resultado do esforço cognitivo do aluno. Um
depende do outro. Em tempos atuais, há uma variedade de concepções
de aprendizagem no contexto da educação, cada um deles decorrente
de variadas correntes epistemológicas e psicológicas.

A aprendizagem pode acontecer diante de uma vivência ou


um diálogo informal. Já o ensino é intencional e precisa ser planejado
didaticamente.
12 Didática

Segundo Pimenta e Carvalho:


“Quando narramos um acontecimento numa roda de
amigos ou quando a mãe relata aos filhos o seu dia de
trabalho na hora do jantar, não há intenção do falante
de produzir uma aprendizagem nos seus ouvintes. Já no
ensino, todas as atividades são concebidas e planejadas
em função desse objetivo. Portanto, a compreensão
do conceito de ensino só pode ser feita em referência
ao conceito de aprendizagem.” (PIMENTA E CARAVALHO
apud CORDEIRO, 2007, p. 21)

Considerando essa realidade que abordamos, a Didática atualmente


transborda a prática de ensino e se afeta pela aprendizagem. Dessa forma,
sua conceitualização continua evoluindo.
Figura 1: Ensino é diferente de aprendizagem

Fonte: Elaborado pela Autora, 2019.

Para Zabalza, Didática é, hoje em dia, esse campo de


conhecimentos, pesquisas, propostas teóricas e práticas que se centram,
principalmente, nos processos de ensino e aprendizagem.

O desafio central da escola é garantir o aprendizado. Será que


a educação brasileira está atingindo esse objetivo? Quais são seus
resultados no ranking mundial?

Diante da realidade atual em que o Brasil se encontra, em situação


de rebaixamento em seus resultados no Programa Internacional de
Avaliação (PISA), devemos nos preocupar com a forma como garantir
o aprendizado dos alunos. Na última edição do programa de avaliação,
realizada em 2015, em que 70 países foram analisados, o Brasil ficou entre
os dez últimos no ranking.
Didática 13

Um caminho é certo e deve ser percorrido nas escolas: a


formação dos professores. Prepará-los para a realidade da sala de aula,
instrumentalizando-os com caminhos didáticos, é fundamental.

As universidades formam, nos dias de hoje, professores


conhecedores de algumas teorias, mas poucas encaminham uma prática
voltada para o trabalho que o professor deve realizar em sala de aula.
Sabe-se que a articulação entre teoria e prática constitui um ponto crucial
na formação de qualquer educador (lembrando que a teoria se ocupa
da pesquisa a partir de problemas reais que aparecem no dia a dia do
professor). Dentro dessa perspectiva, a didática deve ocupar posição
central nos currículos de formação de professores.

Considerando essa realidade, as escolas e os coordenadores


pedagógicos devem assumir a responsabilidade formativa do corpo
docente. É fundamental que essa formação continuada dos professores
seja organizada nas escolas com base em uma reflexão conjunta sobre a
teoria e a prática pedagógica.

Claro que, para isso, o coordenador pedagógico também deverá


receber formação, pois normalmente ele fica totalmente imerso na
logística da escola, em detrimento da aprendizagem. Por isso, ele precisa
também ter encaminhamentos de como se organizar e o que priorizar em
sua atuação.

Nesse contexto, vamos, na sequência, buscar a conceitualização da


palavra “didática” e como ela interfere na educação escolar.
14 Didática

Figura 2: Professores e os alunos

Fonte: Andros1234 / Pixabay

Conceitualizando a Didática
Alguma vez você ouviu alguém dizendo: “aquele professor não tem
Didática”? Ou então: “a Didática daquele professor é perfeita”? O que essas
pessoas estão querendo dizer?

Sem dúvida, a primeira está questionando a capacidade do


professor de ensinar e a segunda está reconhecendo sua habilidade de
ensinar.

Libâneo (1992, p. 25) define Didática como “teoria do ensino por


investigar os fundamentos, as condições e as formas de realização do
ensino”.

A Didática representa a prática que o professor escolhe para ensinar


e, consequentemente, garantir a aprendizagem dos alunos. A Didática
escolhida pelo professor deve estar em consonância com a realidade do
aluno e facilitar o aprendizado.
Didática 15

Figura 3: Didática a serviço da aprendizagem

Fonte: Elaborado pela Autora, 2019.

SAIBA MAIS:

Para Libâneo (1994), a Didática trata dos objetivos, condições


e formas de realização do processo de ensino, ligando
meios pedagógico-didáticos a objetivos sociopolíticos. Não
há técnica pedagógica sem uma concepção de homem e
de sociedade, isto é, sem uma competência técnica para
realizá- la educacionalmente; portanto, o ensino deve ser
planejado e ter propósitos claros, preparando os alunos
para viver em sociedade. Segundo o autor, não existe
neutralidade no fazer pedagógico, pois, quando o professor
planeja sua aula, ele deixa explícita sua concepção de
mundo e sociedade. Para Libâneo, a prática pedagógica
está vinculada a condicionantes de natureza social e
política.

Pesquisas Didáticas buscam encontrar alternativas que transformem


as aulas em um espaço de aprendizagem. É preciso conhecer o aluno,
o conteúdo, o objetivo e as formas de abordar esse conteúdo para, dessa
forma, garantir a aprendizagem.

Será que existe uma receita que ajude os professores a ensinarem


com garantias de aprendizagem? Algum teórico já garantiu que
determinada forma de ensinar assegura a aprendizagem? Com certeza a
resposta para essas perguntas é “não”.
16 Didática

Como sabemos, cada escola tem suas próprias características.


Cada sala de aula é um espaço diferente. Portanto, é impossível garantir
sucesso com uma única forma de ensino.

Fundamental é compreender que as ações dos professores não


podem ser improvisadas. É necessário que haja um plano de aula que
atenda a Didática escolhida, com um objetivo específico e uma estratégia
que leve os alunos a esse objetivo. Sua ausência pode incorrer em aulas
monótonas, desmotivadoras e ineficientes.

Como um ator, que nos emociona ou faz rir com sua atuação,
o professor deve garantir o aprendizado. O ator tem um script muito
bem orientado, o qual ele estuda para demonstrar a emoção do autor. O
professor, da mesma forma, precisa ter um plano de aula e pensar nos
detalhes para que seus alunos se sintam contemplados por sua atuação.

Por não ser uma questão tão simples, propomos o entendimento


da variação que a palavra Didática apresenta. Em uma perspectiva de
investigação, a Didática, como um campo teórico da Pedagogia, estuda
os procedimentos de ensino, entre eles os materiais didáticos, como os
livros didáticos utilizados por professores e alunos.

O que são livros didáticos? Normalmente, as pessoas se remetem


à ideia do livro que o professor usa para ensinar. Sim, o livro didático é um
apoio para ensinar. Ele também tem sofrido muitas transformações.

Houve uma época em que os livros didáticos eram apenas textos


que fundamentavam a aula expositiva do professor. Com o tempo, as
editoras foram aperfeiçoando esse instrumento e, atualmente, os livros,
em sua maioria, trazem imagens, dicas, perguntas e sugestões de
leitura. Existem, inclusive, livros chamados consumíveis, ou seja, os
quais já apresentam atividades a serem realizadas como fixação de
aprendizagem. O livro produzido nesse formato deve ser usado apenas
por um aluno.
Didática 17

Como escolher o livro didático? Tudo vai depender da escola, sua


concepção de educação e currículo. Por exemplo: uma escola pode
simplesmente abrir mão do uso de livros e adotar apostilas Didáticas.
Essas apostilas trarão a proposta de ensino que a escola defende.
[...] são os livros didáticos que estabelecem grande parte
das condições materiais para o ensino e a aprendizagem
nas salas de aula de muitos países através do mundo
e considerando que são os textos destes livros que
frequentemente definem qual é a cultura legítima a ser
transmitida. (APPLE, 1995, p. 82)

EXPLICANDO MELHOR:

O livro didático deve trazer a concepção de educação


na qual a escola acredita, ele deve contribuir para a na
aprendizagem dos alunos, e não ser mais um “peso” na
mochila das crianças. O livro didático é um recurso didático
extra.

Figura 4: Livro Didático

Fonte: LubosHouska / Pixabay


18 Didática

Pensando em recursos didáticos, seria importante esclarecer até


onde podemos explorar essa expressão.

Recursos didáticos são todos os apoios que o professor usa para


realizar sua aula. Estamos falando de todo tipo de recursos. Pode ser um
apagador, a lousa, um livro, computador, sites de pesquisa, apostilas.

Exemplo:

Se um professor ministrar uma aula de educação física, ele


precisará de alguns recursos, como bola, quadra e demais equipamentos
específicos. Se um professor ministrar aula de química, precisará de
instrumentos como tubos, materiais químicos, microscópio etc.

A teoria da educação está diretamente ligada à Didática. Por ser


um ramo de estudo da Pedagogia, sua fundamentação teórica deve
ser conhecida pelo professor, assim como sua história e os grandes
educadores que obtiveram bons resultados para orientar seu trabalho
como mediadores do ensino.
A ela (Didática) cabe converter objetivos sociopolíticos e
pedagógicos em objetivos de ensino, selecionar conteúdos
e métodos em função desses objetivos, estabelecer os
vínculos entre ensino e aprendizagem, tendo em vista o
desenvolvimento das capacidades mentais dos alunos (...)
trata da teoria geral do ensino. (LIBÂNEO, 1990, p.26)

Grandes Educadores e a Didática


Ser educador é uma profissão para poucos. Esses poucos indivíduos
que dedicam suas vidas à educação devem ter em mente que o desafio
é grande.

Muitos acham que é preciso ser alguém apaixonado pelos alunos


e pela profissão. Não desprestigiando a importância do amor à educação,
precisamos de profissionais competentes para realizar um trabalho de
grande influência na sociedade. Atualmente, não podemos aceitar a
ideia de que basta gostar de crianças para ser professor. Os desafios
contemporâneos exigem uma profissionalização cada vez maior dos
profissionais da educação.
Didática 19

Mais que aprender conteúdos, hoje, os professores são mentores,


exemplos, inspiradores que podem construir excelentes cidadãos no
futuro, ou então destruí-los em algumas aulas.

Iniciaremos com um pequeno resumo histórico sobre a Didática,


pois olhar para o passado nos permite encontrar as explicações das
variações e transformações vividas no presente. É muito importante
conhecer como se deram as mudanças que justificam a pluralidade de
propostas pedagógicas presentes em nossa realidade.

Esses personagens foram além da mesmice e estudaram,


pesquisaram e ousaram em suas práticas pedagógicas. Escreveram sobre
elas, foram criticados, admirados, rejeitados, contestados, mas tentaram
criar caminhos diferenciados para que o trabalho educativo fosse mais
significativo. Segundo Freire (1996, p. 39): “é pensando criticamente a
prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática”.

Cabe-nos conhecer alguns nomes importantes desses estudiosos, nos


inspirar com seus trabalhos e talvez aperfeiçoar o que as suas teorias trouxeram,
com a nossa determinação e vontade de acertar. Vamos conhecê-los?

Esses teóricos contribuíram significativamente para a educação.


No Brasil, eles inspiraram o movimento conhecido como “Manifesto dos
Pioneiros da Educação Nova”, que ocorreu na Europa e aqui no Brasil na
metade do século XX. No Brasil, o objetivo do Manifesto era renovar o
sistema educacional nacional. O documento do Manifesto foi escrito por
26 educadores brasileiros, assinado e liderado por Fernando de Azevedo,
e apoiado por Aluízio de Azevedo, Anísio Teixeira, Cecília Meireles e várias
outras personalidades. Esses educadores acreditavam em uma educação
pública e de qualidade. Uma educação que questionasse a escola
tradicional, elitizada e com matérias distantes da realidade concreta
do estudante. Comecemos por John Dewey (1859-1952), um filósofo
norte-americano que foi o grande precursor das ideias progressistas.
Dewey iniciou uma verdadeira reflexão sobre a importância de uma
escola útil, que ouvisse os alunos e ensinasse aquilo que é importante,
trabalhando a partir de problemas reais. Defendia os trabalhos manuais
e o desenvolvimento com base na vivência dos alunos com o conteúdo,
explorando e expondo suas visões. Ele acreditava que a democracia
seria possível com um trabalho na escola que estimulasse os alunos na
percepção, reflexão, crítica e definição do seu próprio “eu”.
20 Didática

Figura 5: Educadores

Fonte: Pixabay

Ovide Decroly (1871-1932) foi um médico belga que defendeu o


que entendemos agora como metodologia ativa. Ele defendeu que o:

Conhecimento deveria partir do todo, e não das partes, como é feito


normalmente até os dias de hoje;

Aluno é capaz de conduzir sua aprendizagem, reforçando a


importância do “aprender a aprender”.

Foi um dos inspiradores do método global de alfabetização. “A


criança tem espírito de observação; basta não matá-lo”, escreveu Decroly.

Na sequência, vamos falar de um dos pensadores que foram muito


influenciados por Dewey: Anísio Teixeira (1900-1971).

Anísio Teixeira foi um grande defensor da democratização do ensino


gratuito no Brasil. Seguindo as ideias de Dewey, ele foi um constante
questionador da arte de ensinar, reforçando a relevância de pesquisa e
inovação.

Anísio defendia a importância de que os alunos conseguissem


transferir os conhecimentos da escola para a vida e da educação integral,
ou seja, todos os aspectos do cidadão deveriam ser abordados, refletidos
e discutidos na escola.
Didática 21

Maria Montessori (1870-1952) nasceu na Itália, era médica e


pesquisadora. Acreditava que nascíamos com a capacidade de ensinar
e aprender. Defendia o potencial da criança, desde a primeira infância, e
a importância de estimular o aspecto criativo. Para ela, o conhecimento
deveria servir como instrumento de desenvolvimento pessoal, por meio
do qual os indivíduos fazem suas escolhas conscientes. Seus métodos
são usados atualmente nas escolas infantis, permitindo à criança explorar
diversas propriedades que a cercam, como o cheiro, as cores, as
brincadeiras etc.

Celestin Freinet (1896- 1966), um pedagogo francês que defendeu


o trabalho como guia da escola. A escola deve formar o aluno de maneira
a torná-lo um trabalhador criativo e reflexivo. Ele acreditava na importância
do desenvolvimento afetivo e preocupava-se com o desestímulo dos
alunos, após o erro. Incentivou aulas em locais abertos, como em passeios,
visitas etc., e ainda valorizava o diálogo entre professor e aluno.

Carl Roger (1902-1987), psicólogo norte-americano, argumentava


que o professor tem a tarefa de facilitar o aprendizado, o qual o aluno
conduz a seu modo. Sustentava que o ser humano aprende o que sente
necessidade de aprender, e assim, na escola, aprenderá o que julgar ser
importante para sua vida. Dessa forma, o ensino deve ser significativo para
o aluno. Rudolf Steiner (1861-1925), austríaco, criou a linha de pensamento
que enxergava além do que é material e com base na Antroposofia, criou
a Pedagogia Waldorf (muito conhecida por suas escolas espalhadas pelo
Brasil). Ele considerava a espiritualidade, a individualidade, a criatividade e
o exemplo dos professores como influenciadores da aprendizagem.

As formas de organizar a educação são diferentes. Os alunos têm


apenas um professor do 1º ao 8º ano, ensinando todas as disciplinas. A
partir do 9º ano surge a figura do tutor, que deverá acompanhar o aluno
com autorização legitimada pela amizade.

Anton Seminionovich Makanko (1888-1939), educador ucraniano,


ajudou com suas pesquisas e seu trabalho centenas de crianças e
adolescentes marginalizados, transformando-os em cidadãos. A escola
de Anton baseou- se em exercícios físicos, trabalhos manuais, recreação,
excursões, aulas de música e idas ao teatro. Dessa forma, desenvolvia-se
o contato com a sociedade.
22 Didática

As conhecidas assembleias de escola, usadas atualmente para


discutir sobre situações comuns no cotidiano escolar, eram realizadas
desenvolvendo a cidadania e o poder de decisão coletivo dos alunos.
Anton criou personalidades sem rigidez, e sua obra serve de inspiração
para as escolas atuais. Muitas escolas se esforçam para mudar seus
padrões em função de sua teoria, na qual as habilidades e competências
individuais devem ser desenvolvidas por meio de uma metodologia que
contemple cada indivíduo.

Jean Piaget (1896-1980), um biólogo sueco, investiu na observação


científica rigorosa com relação à aquisição do conhecimento. Ele defendia
que o pensamento infantil passa por quatro estágios, até a adolescência,
quando o raciocínio se torna pleno.

Henri Wallon (1879-1962), um médico, psicólogo e filósofo francês,


considerava o corpo, a mente e as emoções das crianças na educação.
A reprovação era altamente condenável em sua obra, pois segundo
ele, o emocional é preponderante no desenvolvimento da pessoa.
Wallon afirmava que a aprendizagem não é linear, e sim marcada por
instabilidades, e provém das vivências, podendo sofrer avanços ou recuos.
Crítico da escola tradicional, Henri Wallon incentivava uma sociedade
democrática, justa, cooperativa e solidária.
Figura7: Imagem de Wallon e Durkeim

Fonte: Wikipedia
Didática 23

Até aqui conhecemos diversos nomes que fizeram diferença na


educação, contribuindo com reflexões muitas vezes similares e outras
paralelas. No entanto, ainda existem muitos outros nomes para estudar,
como Johann Pestalozzi, Philippe Perrenoud, Burrhus Frederic Skinner e
outros educadores cujas obras contribuíram para a evolução do pensar a
Didática. Cabe-nos sempre pesquisar e aprofundar nossos conhecimentos
sobre esses estudiosos, pois, com isso, poderemos ampliar nossas visões
de educação.
Figura 8: Inteligências múltiplas de Philippe Perrenoud

Intrapessoal

Corpórea
Interpessoal
Cinestésica

Inteligências
múltiplas
Lógico-
Visual
Matemática

Linguística Musical

Fonte: A Autora

Dados históricos e tendências pedagógicas

A história, sua evolução e forte persuasão política sempre


influenciaram a escola e sua forma de ensinar. Conhecer sinteticamente
dados históricos e tendências pedagógicas nos fará entender melhor as
características contemporâneas e os processos que ainda poderão surgir
para renovar a Didática escolar.
24 Didática

Para iniciarmos essa navegação histórica, partiremos do início no


século XVII, quando a burguesia apoiava a monarquia.

Jan Amos Comenius (séc. XVII) era um bispo protestante que


acreditava que a Didática poderia mudar a Escola e que a educação
poderia criar uma sociedade mais justa e pacífica. Ele foi um dos primeiros
a expressar, em pleno século XVII, que a educação deveria ser pública,
e que todos, homens e mulheres, tinham o direito de aprender a ler.
Para Comenius, todas as pessoas deveriam poder ler a Bíblia e fazer sua
própria interpretação. Foi ele quem sistematizou um tratado de educação
em que a Didática era posta como a arte de ensinar tudo a todos, em
seu livro conhecido como Didática Magna, a arte universal de ensinar
tudo a todos. Ele foi considerado o primeiro pedagogo ocidental, e seu
trabalho contemplava a ideia de que todos os seres humanos deveriam
ter possibilidade de aprender.
A concepção da Didática Moderna nasceu com Comenius e teve
o respaldo de Jean Jacques Rousseau. Em 1762, Rousseau publicou um
livro conhecido como Emilio ou da Educação. Esse romance pedagógico
revolucionou a Pedagogia e serviu de inspiração para as teorias de todos
os grandes educadores dos séculos XIX e XX. De acordo com Rousseau,
o homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe. Toda a sua proposta
fundamentava-se na ideia de que, se a criança tiver a educação fortalecida
na infância e na adolescência, ela se tornará um ser incorruptível.
No século XIX, com a consolidação do modo de produção
capitalista, as empresas começaram a precisar de uma educação que
fornecesse profissionais para ocupar os cargos desse tipo de produção.
Ter somente a elite capacitada não produzia mão de obra necessária.

Johann Friedrich Herbart surgiu adotando a ideia de que o indivíduo


é formado pelas percepções que vêm do exterior. Assim, o aluno deve
ser preparado intelectual e fisicamente. Para Herbart, o ensino deve
percorrer as seguintes etapas: preparação, apresentação, associação,
generalização e aplicação. Herbart pode ser considerado um dos
responsáveis por organizar a Pedagogia como ciência. Nesse sentido, ele
resgatou a ideia do ensino por meio da instrução e da disciplina. As escolas
herbartianas transmitiam um ensino totalmente receptivo, sem diálogo
entre professor e aluno e com aulas que obedeciam a esquemas rígidos
e preestabelecidos. Ele é uma das referências na tendência pedagógica
tradicional.
Didática 25

Essas teorias se instalaram no século XIX pelas escolas públicas


mundiais.Com a abertura de espaço na educação para mais pessoas, a
burguesia se sentiu fragilizada, pois as classes mais baixas passaram a ter
acesso ao conhecimento.

John Dewey surgiu com a Escola Nova, que contestava a escola


tradicional e apontava a necessidade de um novo homem social. Sua
proposta adotou métodos de pesquisa como método didático. Contudo,
apesar de defender a democracia dentro da sala de aula, a Escola Nova
ainda era elitista e não se preocupava com o que acontecia socialmente
fora da escola.

No Brasil Colônia, as escolas jesuítas cumpriram o papel de atender


às necessidades políticas da coroa portuguesa, explorando indígenas e os
menos abastados financeiramente. O ensinamento cristão fundamentou
os trabalhos.

Manoel da Nóbrega inseriu as “escolas de ler e escrever”, as quais


foram contestadas inclusive pelos jesuítas. Os professores eram formados
pelos jesuítas e a ciência deveria ser interpretada como imutável. A
aprendizagem era avaliada pela memorização.

Em 1759, o Marquês de Pombal expulsou os jesuítas e causou


retrocesso na organização escolar.

Na Primeira República, o ensino continuava reforçando a supremacia


da classe dominante. O trabalho escravo era explorado intensamente no
país.

O Estado de São Paulo foi o primeiro a preocupar- se com a


educação pública, e em 1983 regulamentou a escola preocupada na
formação para o magistério. Esse acontecimento influenciou diversos
outros estados a buscarem um aperfeiçoamento educacional.

Na década de 1920, após a Primeira Guerra Mundial, a escola


brasileira iniciou seu encontro com a Escola Nova. O êxodo rural e as
necessidades de mão de obra especializada foram motivos para a
abertura de mais escolas. A Didática era compreendida como regras que
asseguravam boas aulas que orientassem o trabalho.
26 Didática

Em 1930, foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública, e


a oferta de escolas gratuitas foi ampliada. Nessa época, acontecia uma
renovação Didática em detrimento da tradicional.

Com a Constituição de 1934, foi elaborado o Plano Nacional da


Educação, que determinou a obrigatoriedade da escola do ensino
primário.

Em 1932, surgiu a primeira universidade brasileira. A origem da


Didática como disciplina na formação de professores aconteceu em 1934,
com a criação da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade
de São Paulo.

A Constituição de 1937 abordou a educação introduzindo o ensino


profissional para atender às necessidades industriais. A Carta tornou
obrigatórias as disciplinas de Educação Moral e Cívica e Organização
Social e Política Brasileira.

Ainda na década de 1930, foi criado o Instituto Nacional de Estudos


Pedagógicos, do qual Anísio Teixeira foi diretor por duas décadas,
aproximadamente. Nesse período, ele realizou grandes reformas no
ensino.

Em 1941, a Didática passou a ser um curso à parte, como uma


especialização.

Na Era Vargas, a educação estagnou-se e condicionou-se às


posições políticas.

Com a redemocratização, a Constituição de 1946 instituiu a Lei de


Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Ao final da década de 1950, com a expansão econômica e industrial,


a escola defendeu a liberdade, a iniciativa e a autonomia, e enfatizou a
atenção às diferenças individuais.

Segundo Saviani, entre 1930 e 1960, ideias da Escola Nova


predominaram na educação brasileira. Já a partir daí se iniciou um período
tecnicista.
Didática 27

Candau (1983) escreveu:


O ensino da Didática assume certamente uma perspectiva
idealista e centrada na dimensão tecnicista do processo
de ensino-aprendizagem. É idealista porque a análise
da prática pedagógica concreta na maioria das escolas
não é objeto de reflexão. Considerada tradicional ela
justificada pela ignorância dos professores que, uma vez
conhecedores dos princípios e técnicas escalavonistas,
a transformariam. Para reforças esta tese, experiências
pedagógicas que representa, exceções dentro do
sistema e que, mesmo quando realizadas no sistema
oficial de ensino, se dão em circunstâncias excepcionais,
são observadas e analisadas. Os condicionamentos
socioeconômicos e estruturais da educação não são
levados em consideração. A prática pedagógica
depende exclusivamente da vontade e do conhecimento
dos professores que, uma vez dominando os métodos
e técnicas que desenvolvidos pelas experiências
escalavonovistas, poderão aplica-los às diferentes
realidades em que se encontram. A base científica desta
perspectiva se apoia fundamentalmente na psicologia.
(CANDAU, 1983, p.49)

Na década de 1960, Paulo Freire iniciou seu trabalho de


alfabetização de jovens e adultos com a metodologia em que acreditava
e que repercutiu em todo o mundo da educação.
Penso em um dos capítulos tão fecundos na história
da educação latino-americana: a educação popular e
o pensamento de Paulo Freire. Eles nasceram colados
à terra e foram cultivados em contato estreito com
os camponeses, com suas redes de socialização, de
reinvenção da vida e da cultura. Nasceram percebendo
que o povo do campo tem também seu saber, seus
mestres e sua sabedoria. (ARROYO, 2000, p. 14)

Depois do Golpe Militar de 1964, a educação foi vinculada à


Segurança Nacional, e passou a sofrer controle e repressão, causando
um retrocesso no desenvolvimento educacional do país. O professor
retornou à Didática tradicional.

A partir de 1974, mesmo com a abertura do regime político,


instaurou-se um pessimismo em função da influência política que se
estabelecia a cada governo.
28 Didática

A partir da década de 1980, a escola começou a se reinventar,


questionando velhos métodos e redefinindo a política educacional. A
Didática passou a centrar seus esforços na formação integral do aluno.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394/96)


foi reorganizada com grandes inovações.
Figura 9: LDB

LDB 9394/96

LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL

Atualmente, a educação já é vista com o vínculo sociopolítico e


preocupa-se com a formação social do cidadão. A busca é pela união
entre teoria e prática, conteúdo e forma, técnico e político, ensino e
pesquisa, professor e aluno.

A Didática precisa evoluir e acompanhar as mudanças


paradigmáticas que estão se instalando na sociedade. Para que essa
evolução continue, é preciso que os professores se conscientizem da
necessidade de serem pesquisadores de outras práticas que não as
historicamente conhecidas e também de sua própria prática. É necessário
fundamentar- se teoricamente, ousar no ato de planejar, errar ou acertar,
refletir e novamente ousar em planejar.

A Didática só evoluirá e será funcional se nossos educadores se


perceberem como eternos aprendizes.
Didática 29

Figura 10: Pesquisa-ação

Planejar

Pesquisa
Ação

Avaliar Implantar

Educação, suas Definições e Processos


O direito a educação é assegurado por lei, independentemente da
procedência do cidadão. Esse direito é um caminho que garante outros
direitos.

Não é possível lutar por um direito que não se conhece, e a


escola nos traz informações essenciais sobre o que nos resguarda
constitucionalmente. Se a escola não cumpre esse papel, deverá repensar
seus caminhos. A escola deve ser um dos principais caminhos de acesso
à informação verdadeira, consistente e útil para a formação cidadã.

Mas o que é educação? Como conceitualizar uma palavra que traz


percepções diversas?
30 Didática

Figura 11: Fatores que envolvem a palavra “educação”

SER MAL
SER EDUCADO? EDUCADO?

EDUCAÇÃO

CULTURAL? RESPONSABILIDADE
DE QUEM?

Normalmente, quando as pessoas falam em educação, estão


se referindo à forma como se estabelece a convivência interpessoal. É
comum chamar alguém de “mal-educado”. Isso significa que a pessoa não
foi “bem educada” e não sabe tratar as pessoas das formas especificadas
pela sociedade como “educadas”. No entanto, a palavra “educação” pode
ser empregada de diversas maneiras, como educação cultural, educação
filosófica, educação científica, educação moral, educação profissional,
entre outras.

Entendendo a educação como o objeto de estudo da Pedagogia,


Libâneo (1990) define a educação como um conceito amplo que se refere
ao processo de desenvolvimento, envolvendo a formação de qualidades
humanas, físicas, morais, intelectuais e estéticas dentro de um contexto
de relações sociais.

Etimologicamente falando, a palavra “educação” provém de


educare, que, em Latim, significa alimentar, cuidar, criar. Por outro lado,
para alguns professores, a palavra se refere ao processo educacional
oferecido formalmente na escola.
Didática 31

Como tivemos a oportunidade de conhecer a história da Didática,


vimos que cada teórico enxergou a educação de uma forma. Para alguns,
é o saber acumulado, para outros, o desenvolvimento da cidadania.

No Brasil, temos a Constituição Federal, que, no capítulo III, artigo


205, apresenta o seguinte texto:
Art. 205 A educação, direito de todos e dever do Estado e da
família, será promovida e incentivada com a colaboração
da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho. (BRASIL, 1988, p. xx)

Nesse artigo, podemos verificar que a educação escolar é


algo que abrange o desenvolvimento integral do aluno, mas muitos
professores resistem a essa concepção alegando que na escola se deve
aprender disciplinas como Língua Portuguesa, Matemática, Ciências.
Complementam ainda que educação social é responsabilidade da família.
Mas será que é só da família?

Segundo a Lei de Diretrizes e Bases (LDB 9394/96), em seu artigo 1º:


Art. 1º A educação abrange os processos formativos que
se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana,
no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos
movimentos sociais e organizações da sociedade civil e
nas manifestações culturais.

§1º Esta Lei disciplina a educação escolar, que se


desenvolve, predominantemente, por meio do ensino, em
instituições próprias.

§ 2º A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do


trabalho e a prática social. (BRASIL, 1996, p. XX)

Como se pode notar, a LDB confirma a Constituição Federal e


entende a educação também como desenvolvimento social.

Somos educados a partir do momento em que nascemos.


Aprendemos a chorar para pedir alimento, pedir para trocar a fralda e
mostrar nossa insatisfação com alguma coisa. A vivência e a convivência
nos trazem educação. Também as formas culturais em que cada cidadão
estiver inserido serão fontes educativas. A religião que frequentamos, os
esportes que praticamos, a convivência e os exemplos que desfrutamos
sempre nos trarão formas de educação.
32 Didática

Figura 12: BNCC

Para a escola e, atualmente com a Base Nacional Comum Curricular, o


desenvolvimento social, isto é, a educação integral, já não é mais uma
sugestão, e sim uma determinação. Sendo assim, os professores podem
achar que devem se eximir dessa obrigação, mas a lei deixa clara a
importância do desenvolvimento de 10 competências gerais. São elas:

1. Conhecimento – reforço da importância da metacognição e da


transformação do aluno, que reconhece a importância do que foi
aprendido.

2. Pensamento científico, crítico e criativo – desenvolvimento do


raciocínio, da criatividade e da transferência do conhecimento para
o mundo real. Capacidade de correlacionar, questionar ideias, criar
novas soluções a partir de diferentes caminhos.

3. Repertório cultural – reconhecimento de diversas formas de


expressões culturais. Trata-se de ter conciência multicultural.

4. Comunicação – uso de diferentes linguagens, desenvolvendo


a escuta, a expressão, a discussão, o multiletramento e a
contextualização sociocultural.

5. Cultura digital – uso de tecnologias de forma crítica econsciente.

6. Trabalho e projeto de vida – compreensão das relações próprias


do mundo trabalho e das escolhas a serem feitas para o seu
projeto de vida.
Didática 33

7. Argumentação – desenvolvimento de opiniões e argumentos com


base em dados e evidências.

8. Autoconhecimento e autocuidado – conhecimento de si,


identificação de características próprias e aprendizagem
emocional.

9. Empatia e cooperação – exercício para a convivênciarespeitosa.

10. Responsabilidade e cidadania – desenvolvimento da flexibilidade,


resiliência, tomada de decisões, princípios éticos etc.

Talvez a maior dificuldade das escolas, hoje, seja capacitar os


professores para trabalharem essas questões, principalmente por meio
do exemplo, que deve ser dado em cada ação e movimento institucional.
Mas isso não é tão fácil. Devemos considerar que muitos professores
têm suas próprias “visões de mundo”, e muitas vezes sua conduta não é
exemplo para que se alcancem os objetivos esperados.

As Leis e Diretrizes e Bases da Educação Nacional é de competência


da União. As escolas, subordinadas aos estados e cidades, podem realizar
adequações, porém jamais mudar uma lei como essa.
34 Didática

Educação como Forma de Dominação


Todos os sentidos da palavra educação nos remetem ao caminho
de formação do indivíduo. Consideremos agora que a escola pode ser
manipuladora e reforçar cada vez mais o desnivelamento social. André
Borges (2004) baseia-se em (CLUNE; WITTE, 1990; COOKSON, 1994;
HESS, 1991) e em seu artigo, coloca que:
[...] nos Estados Unidos, tanto grupos conservadores e
tradicionalistas, quanto a esquerda liberal argumentaram,
que o reforço da “autonomia da escola” daria mais “voz”
a minorias étnicas e outros grupos marginalizados, que
contribui para a reversão de padrões prévios de segregação
racial e de classes no interior do sistema educacional.
Aborda ainda, conforme (JACOBS, 2000; THOMAS, 1993;
WHITTY et al., 1998), que na Inglaterra, Nova Zelândia
e Austrália, os governos da Nova Direita defenderam
que formas de gestão participativas e descentralizadas
aumentariam a capacidade de pais e alunos intervirem
nas políticas internas da escola, reduzindo a influência de
professores e burocratas e suas práticas corporativistas.

Enquanto alguns alunos agradecem os professores pela forma


como abordaram temas políticos na sala de aula, fazendo-os enxergar
criticamente os diversos aspectos sociais, outros reclamam daqueles que
aproveitam a oportunidade para convencer os alunos de suas convicções
pessoais.

Sim, a educação pode ser usada como forma de manipulação


política e, por isso, reforça-se a importância de que os professores passem
por formações constantes, sendo orientados acerca de como realizar
um trabalho pós-crítico, ou seja, podem abordar a sua opinião e posição
política, mas também abordar todas as outras vertentes, com respeito
e aceitação às diferenças. Dessa forma, leva-se o aluno a se posicionar
segundo suas próprias convicções, sem desrespeitar as pessoas cujas
convicções são diferentes das suas.
Didática 35

Temos vários exemplos na história que demonstram como a


educação foi utilizada como instrumento de manipulação e dominação.
Podemos citar alguns, como:

•• Nos EUA, tivemos o tão conhecido Macarthismo;

•• No Brasil, tivemos o duro período da Ditadura Militar;

•• Na Arábia Saudita, o islamismo é a religião oficial do país, e é ele


quem dita os conteúdos estudados nas escolas.

No Brasil, houve um projeto de lei chamado “Escola sem partido”.


Figura 13: Escola sem partido

O projeto de lei é claro, porém muitas pessoas ainda não acreditam


que seja possível trabalhar o senso crítico do aluno sem, com isso,
influenciá-lo em alguns aspectos. Essa é uma questão a ser estudada e
refletida incessantemente.

Como exemplo, citamos agora parte do artigo 3º desseprojeto:


Art. 3º. No exercício de suas funções, o professor:
- não se aproveitará da audiência cativa dos alunos,
para promover os seus próprios interesses, opiniões,
concepções ou preferências ideológicas, religiosas,
morais, políticas e partidárias;
- não favorecerá, não prejudicará e não constrangerá os
alunos em razão de suas convicções políticas, ideológicas,
morais ou religiosas, ou da falta delas;
- não fará propaganda político-partidária em sala de aula
nem incitará seus alunos a participar de manifestações,
atos públicos e passeatas;
- ao tratar de questões políticas, socioculturais e
econômicas, apresentará aos alunos, de forma justa,
as principais versões, teorias, opiniões e perspectivas
concorrentes a respeito. (RIO DE JANEIRO, 2019)
36 Didática

Considerando esse exemplo, é possível entender a neutralidade


da escola em relação às escolhas pessoais, porém muitos acreditam que
isso tirará do professor a possibilidade de trabalhar temas transversais,
como sexualidade e saúde.

O que precisa ficar claro em todas as questões abordadas é que a


escola poderá ajudar a educação integral, mas sozinha não dará conta
de tantas responsabilidades. É preciso que haja apoio da sociedade,
da família e da política. É claro que a escola influenciará todas esses
seguimentos também.

Ainda é possível verificar que a escola influenciará a sociedade, de


uma forma que poderá ser benéfica ou não. Citando Saldanha, 1980, p.147:
Se nos regimes democráticos a educação forme homens
livres, deixando livre a escolha da profissão e até
preparando o cidadão para a crítica social e para a vida
partidária, nos regimes ditatoriais a educação padroniza
opressivamente o educando. Na Alemanha nazista, por
exemplo, a juventude era formada no fanatismo belicoso
e exaltada quase magicamente para o culto do ‘Fuhrer’.
(SALDANHA, 1980, p.147)

Considerando essas informações, é possível entender que a escola


não resolverá tudo na sociedade, porém poderá ser grande influenciadora.
Libaneo coloca que:
[...] Em síntese, a escola é um meio insubstítuível de
contribuição para as lutas democráticas, na medida em
que possibilita às classes populares, ao terem acesso ao
saber sistematizaado e às condições de aperfeiçoamento
das potencialidades intelectuais, participarem ativamente
do processo político, sindical e cultural. (LIBANEO, 1990,
pg. 39)

Ainda pensando nos processos que se desenvolvem na escola,


haverá sempre uma dependência da legislação, que poderá mudar
conforme a influência política, as concepções de educação, a Didática,
a forma de encaminhar as situações cotidianas, o Projeto Político
Pedagógico construído periodicamente e a comunidade escolar, que
precisará ser ouvida, entendida, considerada em suas características
gerais e necessidades.
Didática 37

Nesse contexto, o Plano de Educação tem ‘um caráter


reflexivo, organizador e articulador e não acontece em um
percurso linear’, sua implementação “depende da criação
de mecanismos para sua gestão, processo que se inicia
no interior da Secretaria de Educação, na análise de sua
estrutura, organização e funcionamento. (CENPEC, 2009,
p. 25)

Os processos educacionais são norteados por:

Didática – em que se escolhem as formas de ensino em função


das necessidades locais e as formas de aprendizagem. Avaliação da
aprendizagem – que poderá ser entendida como forma de repressão,
ou mesmo forma de acompanhamento e fonte, para repensar a Didática
escolhida pelo professor.

Legislação - que fornecerá todo o apoio legal para os demais


processos educacionais.

RESUMINDO:

A Didática pode ser entendida como o caminho escolhido


pelo professor para ensinar e concretizar a aprendizagem
dos alunos.

As formas de trabalho atuais continuam muito tradicionais,


mas os pensadores da história nos mostraram vários
caminhos e concepções diversas de como ensinar. Todos
eles foram fortemente influenciados pela evolução histórica
e sociopolítica da humanidade.

Os processos educacionais dependerão das concepções


adotadas nas escolas e definirão as metodologias e
objetivos do ensino.
38 Didática

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promulgada em 5 de outubro de 1988. Obra coletiva de autoria da Editora
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