Você está na página 1de 270

Maria Cristina Munhoz Araújo

Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade Modelos de Gestão:


Modelos de Gestão: Qualidade
Qualidade
e Produtividade e Produtividade
Maria Cristina Munhoz Araújo

Modelos de Gestão:
Qualidade
e Produtividade
2.ª edição
2009

Maria Cristina Munhoz Araújo

Mestre em Educação pela PUCPR – Área de Gestão da Educação. Especialista


em Tecnologia de Projetos Educacionais pela UFPR. Pedagoga, com habilitação
em Administração Escolar. Autora de material didático para Pós-Graduação em
Gestão Educacional e para a Educação Infantil. Professora de Pós-Graduação nas
áreas de Gestão da Educação, Educação Infantil e Séries Iniciais, Educação Inclusi-
va e Inovações Pedagógicas.
Sumário
Historicizando brevemente: da administração
empresarial à gestão democrática...................................... 11
Origem e desenvolvimento.................................................................................................... 11

Evidenciando o papel da gestão


educacional e o perfil do gestor escolar........................... 25

Da administração autocrática à democrática................. 41

Modos de produção e a escola:


descompassos e desafios ...................................................... 59
Breve histórico e desafios na gestão escolar.................................................................... 59

Administração escolar e transformação social............... 75


O papel do educando no processo de produção pedagógico.................................. 77
O conceito de produto da educação escolar................................................................... 78
Natureza do saber envolvido no processo educativo escolar.................................... 78

Na contramão de uma gestão educacional de


qualidade: a gestão da qualidade total na escola......... 87
Referencial teórico..................................................................................................................... 87
Estabelecendo a qualidade de educação
desejada: a escola como construtora da cidadania....101
Análise dos paradigmas.........................................................................................................101
Especificidade da organização escolar.............................................................................104
Qualidade na educação.........................................................................................................105

A qualidade como processo e


qualidade total: estabelecendo paralelos.........................117

Conceitualizando: qualidade e produtividade.............133


Discutindo qualidade.............................................................................................................133
O que se entende por qualidade?......................................................................................133
De que forma acontece ou se produz qualidade?.......................................................135

Retomando a gestão democrática:


instrumento principal para a transformação
do processo qualitativo da educação.................................149

Os alicerces da construção e
manutenção da gestão democrática...............................165
Quando se fala em autonomia, deve-se ter claro qual é seu significado............167

Instrumentos fundamentais à construção da gestão


democrática: programa de formação continuada......183
Instrumentos fundamentais à
construção da gestão democrática:
instituindo o planejamento participativo......................199
O que é o Projeto Político-Pedagógico?..........................................................................201

Instrumentos fundamentais à construção


da gestão democrática: a prática
pedagógica baseada na ação-reflexão-ação.................217

Avaliação institucional: instrumento relevante


para o aperfeiçoamento da educação.............................225
Qual é a nossa pretensão maior com este texto?.........................................................232

Gabarito......................................................................................239

Referências.................................................................................259

Anotações..................................................................................267
Apresentação

Prezado aluno,
Durante a escrita deste livro, estive por diversas e diversas vezes ao seu lado seja
como colega, professor, diretor ou mantenedor, colocando-me no papel com
certa facilidade por ter exercido todas essas funções e ainda no exercício do ma-
gistério da Educação Superior e na direção e sendo sócia-proprietária de escola
de Educação Infantil e Fundamental.
Hoje, um dos fatores que me permite escrever sobre educação é justamente a
experiência rica na área educacional. Outro fator está calcado na formação acadê-
mica em Pedagogia, especialização em Administração Escolar e em Tecnologia de
Projetos Educacionais e Mestrado em Educação, na área de Gestão Educacional.
Respaldada nessa caminhada, permeada de teoria, prática e reflexão, propus-me
a não somente escrever Gestão Educacional, antes preocupei-me em, indepen-
dente do cargo/função que você exerça, pois entendo todos como gestores de
sua sala de aula, se professor, da equipe de professores, se coordenador, e... con-
ceber um programa para a disciplina Modelos de Gestão: qualidade e produtivida-
de, que contemplasse conteúdo e reflexões essenciais ao aprofundamento teóri-
co, imprescindível à fundamentação da prática, objetivando possibilitar a você o
estudo e também a vivência da proposta de uma educação diferenciada da que
está posta na sociedade atual, voltada ao capitalismo, numa visão neoliberal.
Trago à tona a proposta de uma nova escola, propiciadora de educação para a
cidadania e, em decorrência, a gestão democrática, historicizando e contextuali-
zando no intuito de elucidar desde a origem e desenvolvimento da Administra-
ção Empresarial e a Educacional até a conceituação, fundamentação, construção
e manutenção da Gestão Democrática, discutindo no percurso a Qualidade em
Educação.
Ressalto, neste contexto, estabelecendo paralelos, o desenvolvimento da huma-
nidade relacionado à educação e ao trabalho.
O indicativo ao aproveitamento do estudo desta disciplina estará no seu cons-
tante estabelecimento de relações à teoria já conhecida por você e a sua prática.
Além disso, utilize não só as pontuações de leitura nos textos mas vá às referên-
cias bibliográficas e poderá vislumbrar ainda mais uma educação humanista e
igualitária, fazendo com que você amplie o seu conhecimento e seja mais feliz
como pessoa e profissional, podendo possibilitar aos seus alunos, professores,
a alegria de aprender, desvelando a realidade, a fim de transformá-la, buscando
uma sociedade justa e solidária.
Desejo a você, expressando o meu respeito e interesse na sua apropriação/cons-
trução de um conhecimento, que este livro propicie seu crescimento pessoal e
profissional.

Maria Cristina
Historicizando brevemente:
da administração empresarial
à gestão democrática

Origem e desenvolvimento
As propostas de administração foram surgindo através dos tempos,
a partir da formação de organizações sociais, como: família, tribo, igreja,
exército e estado, bem como mediante o desenvolvimento da sociedade
humana.

Desde a Antiguidade, existem ideias de como coordenar os empreen-


dimentos. Os egípcios apresentaram princípios administrativos que nor-
teiam seus projetos arquitetônicos. Os gregos e os romanos se sobressaí-
ram ao dirigir empreendimentos cooperativos, como aventuras militares,
obras públicas e sistemas judiciários. Aristóteles, na Grécia, estabeleceu
princípios para o desenvolvimento de atividades científicas. Em Roma,
estabeleceram-se princípios de governo fundamentados no conceito de
ordem. A Igreja Católica Romana estabeleceu diretrizes para sua atuação
doutrinária e os princípios de hierarquia.

Em virtude do processo produtivo, a exigência de maior organização


fez surgir indústrias, reorganizando a produção artesanal nas famílias, exi-
gindo, pois, estudos formais voltados à administração,­ tendo isso ocorri-
do, principalmente, com a Revolução Industrial, na Inglaterra, nos séculos
XVIII e XIX.

A teoria administrativa do século XX está respaldada no desenvolvi-


mento das escolas: a clássica, a psicossocial e a contemporânea.

A escola clássica foi representada por três movimentos:

 A administração científica de Taylor, que estabelece o caráter cientí-


fico dos processos produtivos e a eficiência na empresa. Criador da
administração científica, preocupa-se com o controle e a racionaliza-
ção do trabalho, dando ênfase ao capital. Taylor buscava determinar
cientificamente os melhores métodos para a realização de qualquer
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

tarefa e para selecionar, treinar e motivar os trabalhadores. Taylor baseou


sua filosofia em quatro princípios básicos:

 o desenvolvimento de uma verdadeira ciência da administração, no


intuito de ser possível determinar o melhor método para realizar cada
tarefa;

 a seleção científica dos trabalhadores, a fim de que cada um deles ficas-


se responsável pela tarefa para a qual fosse mais bem habilitado;

 a educação e o desenvolvimento científico do trabalhador;

 a cooperação íntima e amigável entre a administração e os trabalha-


dores.

 A administração como ciência, de Henri Fayol, que propõe a previsão, a


organização, o comando, a coordenação e o controle como suas fases fun-
damentais, apresentando também os princípios da divisão de trabalho.
Fayol se interessava pela organização total e acreditava que a adminis-
tração era uma habilidade como qualquer outra, que pode ser ensinada,
desde que se compreendesse seus princípios básicos.

 A administração burocrática de Max Weber, propondo uma estrutura de


poder e autoridade, ou seja, defendia a necessidade de uma hierarquia
definida e governada por regulamentos e linhas de autoridade claramen-
te definidos.

A escola psicossocial apresenta a abordagem das relações humanas, repre-


sentadas por Elton Mayo e outros, contrapondo-se ao critério da eficiência eco-
nômica trazida pela escola clássica e no comportamento administrativo de Ber-
nard e Simon. Essa escola concebe a organização como um sistema orgânico e
natural, preocupando-se com a integração funcional em função dos objetivos
organizacionais, avançando em relação à escola clássica, mantendo, entretanto,
os critérios da eficiência e eficácia, mas relacionado ao sistema de decisões.

A escola contemporânea surge no início da década de 1980 e, segundo Hora


(2000), em função da instabilidade econômica e política em nível internacional,
surgiram questionamentos, levando a novas perspectivas teóricas da administra-
ção, sendo críticas, com base na fenomenologia, no existencialismo, no método
dialético e nas abordagens de ação, vinculando os atos e fatos administrativos
à relevância humana, considerando, portanto, a administração e a qualidade de
vida humana dos participantes, imbuídos de suas próprias opções existenciais.

12
Historicizando brevemente: da administração empresarial à gestão democrática

Critérios adotados nas diversas escolas


Cabe destacar a diferença significativa, em termos de critérios adotados pelos
teóricos da escola clássica, da psicossocial e da contemporânea, pois refletem
diretamente no sistema educacional. Aquelas definem eficiência – produzir o
máximo com o mínimo de recursos e tempo e alta produção – e eficácia – atingir
os objetivos voltados aos interesses organizacionais. Já a contemporânea elege
como critério a efetividade – mensuração da capacidade de produzir solução
pelos participantes da comunidade. Há, aqui, compromisso com objetivos so-
ciais e políticos da comunidade, preocupando-se com o desenvolvimento socio-
econômico e a melhoria das condições de vida humana.

Bordignon apud Ferreira e Aguiar (2000), quando enfoca a elaboração do pla-


nejamento, utiliza na relação: finalidade (definição da filosofia, das políticas e
objetivos institucionais) e ambiente (orienta as ações de acompanhamento do
projeto), além dos tradicionais conceitos de eficiência e eficácia (restritos à di-
mensão organizacional) os de efetividade e congruência. Estes dois últimos são
conceitos que buscam situar a organização no seu ambiente.

Dessa forma, deixa a organização, seja educacional ou não, de estar volta-


da apenas ao atingimento de metas internas e passa a um nível mais amplo,
abrangendo externamente, movimentos político-sociais. Assim, a efetividade se
sobrepõe à eficiência.

Critérios esses analisados na administração, com base nas teorias críticas, es-
tabelecendo como critério-chave a relevância humana na orientação dos atos e
fatos administrativos. “A relevância humana é um critério eticamente filosófico e
antropológico, cuja medida se dá em termos do significado, do valor, da impor-
tância e da pertinência dos atos e fatos administrativos para a vida dos partici-
pantes.” (HORA, 2000, p. 40).

Reflexos na educação brasileira


Nessa concepção teórica, está implícita a postura participativa dos responsá-
veis pela administração. Dessa forma, o grau que se imprime ao processo admi-
nistrativo de participação, de democracia e de solidariedade é que ampliará as
possibilidades de promoção de qualidade de vida humana. Aí, à administração
educacional e ao administrador cabem um outro papel: o de coordenador da
ação, atentando às características e aos valores dos grupos de indivíduos, com
vistas à realização plena desses.
13
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Tratamos até aqui das teorias da administração influenciadoras da teoria da


administração escolar brasileira, denotando que simplesmente copiaram-se os
conceitos e as teorias desenvolvidas para outra realidade, com cultura própria, e
não educacionais, e foram aplicadas nas escolas brasileiras.

Segundo Paro (1993), não constitui absurdo ou heresia utilizar conhecimen-


tos desenvolvidos em outra realidade, desde que se faça uma análise crítica e se
proceda à adequação dos conceitos e teorias à realidade escolar brasileira. Pode,
assim, a teoria da administração escolar situar-se historicamente e desenvolver
sua função crítica, retomando a especificidade da administração vinculada à na-
tureza da educação, pois a natureza do processo educativo é diversa da natureza
do processo produtivo.

Assim, administrar uma escola não significa apenas aplicar técnicas e méto-
dos desenvolvidos para empresas que não têm qualquer propósito com a reali-
zação de objetivos educacionais.

Tais objetivos têm a ver com a própria construção da humanidade do educan-


do, à medida que é pela educação que o ser humano atualiza-se como sujeito
histórico, em termos do saber produzido pelo homem em sua progressiva dife-
renciação do restante da natureza, segundo Paro (1997, p. 7).

A produção teórica sobre administração escolar no Brasil, em sua maioria,


acaba adotando os princípios administrativos utilizados nas empresas capita-
listas, mesmo que implicitamente. Ocorre, entretanto, que a administração es-
colar fica sendo vista pelos educadores como decorrente, ou mais ainda, mera
aplicação da administração geral, “a administração escolar é uma das aplicações
da administração geral; ambas têm aspectos, tipos, processos, meios e objetivos
semelhantes” (RIBEIRO, 1978, p. 95). Nessa visão, a administração geral passa a
ter validade universal, pois seus métodos e técnicas podem ser aplicados em
qualquer organização, uma vez adaptados.

Ainda, essa visão de administração traz à luz uma dimensão restrita, valori-
zando somente os aspectos administrativos, descontextualizados sociopolítico
e economicamente, nas possíveis soluções aos problemas. A citação a seguir evi-
dencia o que acabamos de dizer:
A problemática central da escola brasileira, possivelmente da escola em geral, parece situar-se em
uma falha de natureza administrativa, qual seja, a sua incapacidade de ajustar-se às exigências
da vida contemporânea, ajustamento esse que requer, necessariamente, ação organizada
e planejada, realizada por pessoas qualificadas, a fim de que sejam atendidas as crescentes
demandas quantitativas e qualitativas da sociedade atual. (ALONSO, 1978, p. 11)

14
Historicizando brevemente: da administração empresarial à gestão democrática

Após essas colocações, é importante retomarmos a colocação de Paro, desta-


cando a especificidade da administração e da escola e a adequação de conceitos
e teorias, pois, ao desconsiderar esses elementos essenciais, assume a adminis-
tração escolar uma postura acrítica a serviço dos interesses e necessidades do
capital, comprometida com os objetivos e interesses da classe capitalista, que
detém o poder político e econômico na sociedade brasileira, a fim de assegurar
a manutenção do status quo.
De fato, na medida em que a prática da administração escolar é tratada do ponto de vista
“puramente” técnico, são omitidas as suas articulações com as estruturas econômica, política e
social, obscurecendo a análise dos condicionantes da educação. As normas técnico-administrativas
que são propostas como normas para o funcionamento do sistema escolar constituem um
produto desses condicionantes. No entanto, elas são adotadas e implementadas como se fossem
autônomas, isentas das determinações econômico-sociais. (FÉLIX, 1984, p. 81-82).

Assim como Paro, Félix deixa em suas colocações a clareza de que a adminis-
tração é um instrumento que, dependendo dos objetivos a ela destinados, pode
servir à conservação apenas do que já está posto e estatuído pela classe domi-
nante como também pode articular-se para a transformação social.

A bibliografia especializada em administração escolar, como pudemos per-


ceber nesta unidade e procuraremos elucidar mais ainda na próxima, quando
abordaremos o papel da administração e do administrador, destaca dois mo-
mentos distintos: o primeiro, ressaltando a transferência dos princípios e méto-
dos da Teoria Geral da Administração Empresarial para a Administração Escolar;
e no segundo momento verifica-se uma crítica a essa primeira abordagem e a
apresentação de novas propostas voltadas à transformação social.

Nesse contexto, e principalmente pelo referencial bibliográfico utilizado, ci-


taremos, no primeiro momento, Querino Ribeiro e Myrtes Alonso e, no segundo,
Maria de Fátima Félix e Vítor Paro.

Da mesma forma que encontramos visões diferenciadas em concepções da


administração escolar, vamos também encontrá-las na gestão da educação. São
autores que a remetem no sentido de reprodução e de justificativa para a sua
utilização como gestão empresarial, usando inclusive o termo gestão como pre-
domínio ao de administração. Outros buscam a ressignificação dos conceitos da
administração da educação, mediante o contexto das transformações que estão
a ocorrer na chamada sociedade do conhecimento.

Diversos são os estudos e para isso vasta a literatura que nos apoia na posição
e no acreditar, pois se trata de instituição educacional, e aí voltamos à concepção
de homem, de sociedade, de cidadania, de uma gestão educacional que possibi-

15
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

lite a participação ativa e efetiva de toda a comunidade escolar no processo de


tomada de decisões.

Uma escola que se propõe a possibilitar a formação para a cidadania deve ter, por
pressupostos teóricos fundamentais, a gestão democrática, a autonomia da escola
e a construção coletiva do Projeto Político-Pedagógico. Vemos, assim, a escola como
cumpridora de sua função social, seu verdadeiro papel político-institucional, afirma
Ferreira (2000, p. 304).
A gestão democrática da educação é, hoje, um valor já consagrado no Brasil e no mundo,
embora ainda não totalmente compreendido e incorporado à prática social global e à
prática educacional brasileira e mundial. É indubitável sua importância como um recurso de
participação humana e de formação para a cidadania. É indubitável sua necessidade para a
construção de uma sociedade mais justa e igualitária. É indubitável sua importância como
fonte de humanização. (FERREIRA, 2000, p. 167)

A gestão da educação, hoje, e no nosso entendimento, superou a fase de transpo-


sição dos princípios e métodos da Teoria da Administração Empresarial para a Admi-
nistração Educacional e encontrou respaldo na participação de todos os integrantes
da escola, podendo, assim, construir coletivamente a sua cidadania, constituindo-se
na gestão democrática.
Gestão é administração, é tomada de decisão, é organização, é direção. Relaciona-se com
a atividade de impulsionar uma organização a atingir seus objetivos, cumprir sua função,
desempenhar seu papel. Constitui-se de princípios e práticas decorrentes que afirmam ou
desafirmam os princípios que as geram. Estes princípios, entretanto, não são intrínsecos à
gestão como a concebia a administração clássica, mas são princípios sociais, visto que a gestão
da educação é responsável por garantir a qualidade de uma “mediação no seio da prática social
global” (SAVIANI, 1980, p. 120), que se constitui no único mecanismo de hominização do ser
humano, que é a educação, a formação humana de cidadãos. (FERREIRA, 2000, p. 306-7)

Texto complementar

Da administração escolar à gestão educacional


e escolar: um longo caminho de mudanças
(SANTOS, 2008)

O caminho para a mudança será construído no dia a dia, à medida que


vamos compreendendo os problemas educacionais.

Neidson Rodrigues

16
Historicizando brevemente: da administração empresarial à gestão democrática

[...]

Para Drucker (1993), passamos de uma sociedade industrial para uma so-
ciedade de serviços, o que exige nova parceria entre a educação e os negócios.
Nos tempos atuais, a educação mudará mais do que já mudou desde a criação
da escola “moderna”, há 300 anos. O mesmo autor nos faz um alerta, o de que
não se pode limitar a educação apenas ao trabalho da escola, porque toda ins-
tituição deve tornar-se um educador, isto é, deve existir para aceitar e propor
mudanças. Um novo mundo surge a cada 30 ou 40 anos e os jovens não con-
seguem entender como seus pais e avós viviam.

No século XIII, na Europa, ocorreu o êxodo em massa para as cidades, sur-


gindo, de um dia para o outro, os grupos sociais diferentes e o comércio entre
os povos mais distantes, especialmente com o Oriente Médio. Em meados
do século XV, Gutenberg inventou a imprensa de tipos móveis de metal; pos-
teriormente, aconteceram a Reforma Protestante de Lutero, a Revolução In-
dustrial, iniciada com o motor a vapor; Adam Smith escreveu A Riqueza das
Nações. No fim do século XX apareceram os sofisticados meios de comunica-
ção e a informática. Tais fatos provocaram importantes e significativas trans-
formações no mundo, em todos os aspectos: social, econômico, político, tec-
nológico, de usos e costumes, religioso e, acentuadamente, no educacional.

[...]

As mudanças levam a uma nova dicotomia de valores, não literária e cien-


tífica, mas entre “intelectuais” e “gerentes”. Enquanto os primeiros se preocu-
pam com palavras e ideias, os segundos imporiam-se com pessoas e traba-
lho. O grande desafio filosófico e educacional é transcender essa dicotomia.
Dowbor (1997) aponta os grandes eixos dessas mudanças que atingem o
início do século XXI:

 O progresso tecnológico – a informática revolucionou todas as áreas,


em particular as do conhecimento; a biotecnologia provocou profun-
das modificações na agricultura e na indústria química e farmacêutica;
as telecomunicações transmitem mensagens, imagens, sons, em gran-
de volume e com impressionante rapidez e eficácia; as novas formas
de energia, especialmente o “laser”, são aplicadas na medicina, no co-
mércio etc., por novos materiais, incluindo as cerâmicas, supercondu-
tores e variados tipos de plásticos.

17
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

 A internacionalização – o processo de globalização responsável por


boa parte dos avanços tecnológicos...

 A urbanização – apesar de fenômeno discreto, em meio século, vem


provocando o êxodo rural.

 As polarizações – a distância entre ricos e pobres ultimamente vem


aumentando a um ritmo não conhecido em épocas anteriores.

 A dimensão do Estado Moderno – a modernização institucional e


política determina a opção pelo neoliberalismo.

Dryden e Vos (1996) indicam as tendências que moldarão o mundo de


amanhã:

 A era da comunicação instantânea – grande capacidade de armaze-


namento de informações e de torná-las disponíveis em diferentes for-
mas para todos os lugares e a qualquer momento, como a informática
e, em especial, a internet. Atualmente, pelos meios modernos de co-
municação, não ouvimos falar de guerras, catástrofes, acontecimentos
políticos e sociais etc., nós os vemos diretamente no momento em que
acontecem. Não se pode falar hoje em educação escolar sem o uso das
modernas tecnologias.

 Um mundo sem fronteiras econômicas – a transferência de dinheiro,


em todo o mundo, alterou a natureza das transações e do comércio mun-
dial. Ao sistema educacional não pode bastar um número limitado de in-
formações, para não se manter à margem da tecnologia e do mercado.

 Três passos para uma economia única – embora se proponha uma


economia mundial única, pela globalização, estão se destacando três
blocos comerciais: Europa unificada, as Américas e os países asiáticos.
Se, no comércio do século XIX, o destaque foi britânico, e no século XX
foi o norte-americano dos Estados Unidos, a previsão é que o próximo
será dos países orientais, liderados por Japão, Coreia e China, os cha-
mados “tigres asiáticos” e/ou outros emergentes, designados pela sigla
“Bric”: Brasil, Rússia, Índia e China.

 A nova sociedade de serviços – há consenso quanto à mudança de


uma sociedade industrial para uma sociedade de serviços, em que as
demandas educacionais serão muito grandes e exigirão novas meto-

18
Historicizando brevemente: da administração empresarial à gestão democrática

dologias de ensino. A educação sempre acompanhou o método in-


dustrial de produção, hoje em pleno declínio. Por isso, os currículos
atuais ainda são divididos em matérias e disciplinas, para se trabalhar
em unidades em um semestre ou em um ano letivo e avaliar, na maio-
ria das vezes, por provas ou testes padronizados.

 De grande a pequeno – na economia industrial tradicional, predo-


minavam as grandes empresas com administração centralizada; hoje
ocorre a divisão em pequenas equipes de projeto, autônomas e com
gerência própria, fazendo desaparecer a hierarquia piramidal. A nova
empresa exige mais o raciocínio criativo e habilidades conceituais.

 A nova era do lazer – as expectativas de vida aumentaram e, conse-


quentemente, o lazer é bastante valorizado.

 A forma mutável do trabalho – atualmente, há uma tendência de di-


minuir o número de adultos em idade de trabalho em emprego em
tempo integral nas empresas tradicionais, nos serviços administrati-
vos essenciais. Boa parte trabalhará:

 projetos específicos, normalmente por períodos curtos;

 trabalhadores em meio período e sazonais, com dois ou três dias


por semana, nos fins de semana ou em temporadas (turismo e ou-
tras formas de lazer);

 grupos familiares, fazendo o que lhes apraz, e que exigirão uma


educação que os habilite a ser seus próprios gerentes, divulgado-
res e comunicadores.

 Mulheres na liderança – no emprego, aumento significativo de mu-


lheres em posições de liderança no mundo todo, especialmente nos
países desenvolvidos. A presença feminina está mudando a filosofia
das empresas e o encaminhamento dos negócios.

 A década do cérebro – nos anos 1970 ocorreu a explosão espacial;


nos anos 1980, a voracidade e a ganância; nos anos 1990, o uso do
homem-cérebro: a aprendizagem exige raciocínio, leitura, discussão,
conhecimento.

 Nacionalismo cultural – a economia única cria um contramovimen-


to denominado nacionalismo cultural. A globalização torna os países

19
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

economicamente independentes, porém cresce o desejo de cada povo


de valorizar sua língua, suas raízes e cultura. Quanto mais a tecnologia
se desenvolve, maior deve ser o esforço para manter a nossa herança
cultural: música, dança, linguagem, arte e história.

 A crescente subclasse – nas cidades grandes, especialmente na peri-


feria, vegeta uma subclasse de pessoas presas em um ciclo autoperpe-
tuador: sem poder de ganho, sem autoestima, que sofre o preconceito
de toda ordem, o fracasso escolar, a violência, a subnutrição, o desem-
prego, a dependência às drogas, a falta de perspectiva, com muitas
jovens que engravidam precocemente e se casam sem preparo.

 O envelhecimento da população ativa – o perfil demográfico está


mudando. A expectativa de vida nos Estados Unidos, por exemplo,
conforme dados da U.S. National Center for Health Statistics (DRYDEN;
VOS, 1996), que em 1860 era pouco mais de 40 anos, em 1950 passou
para 75 anos. A geração com mais de 60 anos representa um dos maio-
res recursos não explorados para o futuro da educação.

 A nova onda do “faça você mesmo” – a confusão da estrutura com o


funcionamento é um fenômeno típico da era industrial. Grandes em-
presas surgiram para “fornecer” educação e saúde, o que ocasionou a
confusão de educação com instrução, saúde com tratamento de do-
ença e hospital, e lei com advogado. O slogan “faça você mesmo”, mais
do que pintar a casa e cuidar do jardim, envolve assumir o controle da
própria vida.

 Empreendimento cooperativo – o comunismo soviético entrou em


colapso na década de 1990; o mesmo ocorre com o capitalismo estilo
“jogo de cassino”. Ambos estão sendo substituídos pelos novos con-
ceitos de “empreendimento corporativo”: parcerias, posse de ações,
distribuição de lucros, educação continuada, divisão de tarefas, hono-
rários flexíveis, equipes de projeto etc. Os empresários financiam cur-
sos para o desenvolvimento profissional dos funcionários.

 O triunfo do individualismo – em todo o mundo, valorizam-se as po-


tencialidades e responsabilidades individuais. O consumidor é o “rei”,
com direito a escolher os melhores produtos e serviços. A própria edu-
cação, para alguns, torna-se uma escolha pessoal.

20
Historicizando brevemente: da administração empresarial à gestão democrática

[...]

A escola precisa encarar a mudança como necessidade e não só transmitir


conteúdo aos alunos – o que Paulo Freire (1975) denominou de “educação ban-
cária”, isto é, o ato de depositar, transferir, transmitir valores e conhecimentos
como em uma operação financeira mecânica e informatizada. A educação deve
ser a problematizadora e rompedora dos esquemas verticais de ensino caracte-
rísticos da “educação bancária”.

Há nas escolas uma cultura que impede – e ao mesmo tempo rechaça –


qualquer proposta de reformas, muitas vezes, planejadas com critério.

[...]

Dica de estudo
O vídeo Princípios e Bases da Gestão Democrática (parte 1). Disponível em:
<http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.jsp>, possibili-
ta uma visão histórica da caminhada da gestão democrática, com imagens verídi-
cas, e mais importante ainda, conta com a participação de educadores e também
autores, os mais atuantes e reconhecidos no país na área de Gestão Educacional,
como: Vitor Henrique Paro, Isaura Beloni, Jamil Cury, Ilma Passos e outros. A con-
tribuição dos educadores referidos, além de facilitar o entendimento do processo
histórico traz à tona a discussão da conceituação, ou seja, a compreensão do que
vem a ser gestão democrática.

Atividades
1. Analise o texto e responda: qual foi a real necessidade do desenvolvimento
das teorias administrativas?

21
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

2. A partir da leitura da aula, faça uma síntese dos elementos mais significativos
das escolas: clássica, psicossocial e contemporânea.

22
Historicizando brevemente: da administração empresarial à gestão democrática

23
Evidenciando o papel da gestão
educacional e o perfil do gestor escolar

O que é relevante extrairmos para o entendimento da gestão educa-


cional e do papel do gestor?

De princípio, a clareza de que a administração educacional está fun-


damentada na Teoria Geral da Administração e que esta está respaldada
inteiramente nos interesses capitalistas e, ainda, que a administração está
atrelada aos interesses políticos, econômicos e sociais. Assim, na organiza-
ção capitalista, o atingimento dos objetivos é função dos recursos, meios
de produção e força de trabalho, considerados mercadorias. A administra-
ção da organização capitalista controla esses recursos, desconsiderando o
elemento humano.

A administração, sob essa ótica, é entendida como o “processo de pla-


nejar, organizar, dirigir e controlar recursos humanos, materiais, financei-
ros e informacionais, visando à realização de objetivos.” (MARTINS, 1999,
p. 24). E o administrador, um gerente, um controlador de trabalho, respon-
sável pelo planejamento e controle das atividades. “O administrador, cuja
ação passou a garantir ao capitalista um poder maior sobre os trabalhado-
res.” (HORA, 2000, p. 36).

Vitor Paro apud Hora (2000, p. 37) explica essa assertiva:


[...] Embora com matizes variadas, que servem para encobrir suas reais dimensões e visam
atender às necessidades de justificação ideológica do momento, a gerência enquanto
controle do trabalho alheio, através da apropriação do saber e do cerceamento da
vontade do trabalhador, encontra-se permanentemente presente na teoria e na prática
da administração e nossa sociedade, perpassando as diferentes “escolas” e “correntes” da
administração neste século.

Ainda é visto o administrador, na organização capitalista, como agente


integrador, decisor, voltado à consecução dos objetivos organizacionais.

O desafio é imenso aos educadores, mas o sonho, o querer e o acreditar


em uma educação diferenciada da que aí está posta, leva-os à busca de uma
administração escolar pautada na concepção de Paro (1997, p. 7).
Administração escolar é portadora de uma especificidade que a diferencia da
administração especificamente capitalista, cujo objetivo é o lucro, mesmo em prejuízo
da realização humana implícita no ato educativo. Se administrar é utilizar racionalmente
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

os recursos para a realização de fins determinados, administrar a escola exige a permanente


impregnação de seus fins pedagógicos na forma de alcançá-los.

Hoje, a administração de uma escola só pode por nós ser entendida numa
gestão democrática e fortemente educadora, ou seja, a partir dela todos os
princípios norteadores da ação educativa seriam construídos e vivenciados no
cotidiano.

Com esse entendimento, pensa-se no gestor com formação pedagógica, im-


buído do espírito de educador e da convicção de que a concepção de sociedade,
de escola e de homem deveriam impregnar o trabalho em todas as dimensões
administrativa, jurídica, financeira e pedagógica, forma esta para se garantir a
proposta de uma escola calcada na proposta de “Educação para cidadania”.
A pesquisa e a observação empírica mostram que um dos principais fatores de eficiência
escolar (se não o principal) reside nos órgãos diretivos dos estabelecimentos de ensino. Um
bom administrador, capaz de organizar um trabalho de equipe eficaz e tido como competente
e aberto, consegue, muitas vezes, introduzir no seu estabelecimento de ensino grandes
melhorias. É preciso, pois, fazer com que a direção das escolas seja confiada a profissionais
qualificados, portadores de formação específica, sobretudo em matéria de gestão. Esta
qualificação deve conferir aos gestores um poder de decisão acrescido de gratificações que
compensem o bom exercício das suas delicadas responsabilidades. (DELORS, 1999, p. 163)

Acrescentamos a essa citação, a importância de uma gestão democrática, pois


a gestão se constitui em processo democrático de decisões, no qual o papel do
gestor está na liderança do processo educativo, sendo de sua competência essa
responsabilidade, uma vez que a razão de ser da escola, segundo Prais (1996),
está na valorização da função educativa. Busca-se Prais, em Makarenko, para afir-
mar que o diretor, antes de ser um administrador, deve ser um educador, como
ela diz, um educador por excelência.
Dificilmente pode surgir uma boa coletividade e uma situação criativa para o trabalho dos
educadores, se à frente da escola está um homem que só sabe ordenar e mandar. O diretor é o
principal educador da coletividade, o educador mais experimentado, com maior autoridade.”
(apud PRAIS, 1996, p. 85).

A grande competência do diretor está em saber conciliar a competência


técnica com a clareza política, na condução do conteúdo educativo e nas exi-
gências burocrático-administrativas. Ora ele é educador, ora administrador, ora
mestre de obras, o que não pode ser é um único, um ou outro, deve saber de-
sempenhar todos os papéis, em se embrenhando, perpassando um pelo outro.

Para que o diretor da escola possa desempenhar sua função com responsabi-
lidade e compromisso político, há necessidade de uma atuação com maior com-
petência, tendo a clareza de que se exige numa gestão democrática a coordena-
ção do processo educativo-administrativo, a fim de garantir o atingimento dos

26
Evidenciando o papel da gestão educacional e o perfil do gestor escolar

objetivos, interesses e necessidades comuns, pois a escola é uma comunidade.


Recorremos a Ferreira (2000, p. 113), no intuito de melhor explicitar a colocação,
“a direção se constrói e se legitima na participação, no exercício da democracia
e na competência da construção coletiva do projeto pedagógico que reflita o
projeto de homem e da sociedade que se quer.”

Entretanto, que democracia e que cidadania vivemos? A revolução burguesa


aboliu o sistema escravocata e servil, e instituiu uma democracia e cidadania
formal e legalmente igual para todos, todavia, por tratar-se de uma sociedade
classista, estrutura-se em relações sociais de exclusão. As escolas, por sua vez, e
a história da administração escolar estão a relatar a transferência dos princípios
norteadores da administração empresarial, a serviço do capitalismo, para a ad-
ministração escolar.

A ousadia das escolas e dos educadores reside justamente em vivenciar o co-


tidiano escolar no exercício da cidadania, contrariando os interesses meramente
capitalistas, excludentes e de desvalorização do homem. Pois, não há cidadania
sem democracia. “É que a democracia, como qualquer sonho, não se faz com
palavras desencarnadas, mas com reflexão e prática.” (FREIRE, 1998, p. 91).

O propósito de transformação social, o exercício da cidadania e a democracia,


preconizados na filosofia educacional da maioria das escolas, deixariam, numa
escola voltada à educação cidadã, de serem vistos como produto formal, resul-
tado conseguido a longo prazo, mas como processo a ser conquistado por todos
no dia a dia. A concepção de educação que perpassa nos princípios dessa escola
utiliza outra lógica organizativa, na qual a prática social passa a ser a fonte do co-
nhecimento e a teoria se coloca a serviço da ação transformadora, num processo
que envolve o coletivo da escola, buscando constantemente coerência entre o
discurso e a prática, num processo dialético, que remete à concepção de conhe-
cimento, ­educação, homem e sociedade, com embasamento nas contribuições
de Freire, Vygotsky, Wallon e Piaget.

A despeito da história tradicionalista e da administração autoritária, a pouca


experiência democrática dos educadores traz limitações à transformação das es-
colas. Transformação essa, desde a concepção de educação aos atos e atitudes,
estratégias, especialmente as relações sociais internas e externas. Trata-se de um
grande aprendizado, que demanda tempo, dedicação, seriedade e muito trabalho.
Os meios e os instrumentos a serem utilizados são os centrados nas pessoas com
trabalhos coletivos. Recomendamos, para isso, a utilização do psicodrama, pois
permite o ir e o vir, e na prática como instrumentos da gestão democrática a adoção
do planejamento participativo e de um programa de educação continuada.
27
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

A recomendação pela escolha do psicodrama (uma das linhas da Psicologia)


como uma das técnicas utilizadas para o trabalho com o grupo, de professores e
alunos, está na valorização do “encontro” e por sua base filosófica compatível à
concepção de uma escola progressista.

Enquanto os aspectos de toda e qualquer natureza se modificam a uma ve-


locidade rápida, algumas escolas andam a passos lentos. As escolas precisam
urgentemente buscar alternativas atuais para os problemas e/ou necessidades
também atuais, dando respostas a essa nova realidade, preocupando-se em
adaptar-se a ela, da melhor forma possível. Ao contrário disso, o que em geral
se percebe nas ­gestões escolares é uma apatia, um marasmo de característica
alienada do dinamismo e da flexibilidade da realidade social, portanto, é neces-
sário acompanhar as mudanças que ocorrem na sociedade, nas concepções de
educação e, especialmente, nas ­atitudes e nos comportamentos dos indivíduos
envolvidos, a fim de direcionar a instituição para uma nova postura condizente
com as exigências das novas tendências educacionais.

Com a necessidade do abandono das práticas educativas tradicionais, a


­gestão das organizações educacionais também tem passado por processos de
transformação para incorporar aparatos teóricos consagrados, visto que elas
têm sentido a necessidade de se filiarem às mudanças mais amplas que estão
ocorrendo na sociedade e na economia. A tendência foi deixar de enfatizar as
hierarquias estruturais para incorporar muito mais a coordenação e a motivação
como métodos de trabalho, renunciando ao estilo tradicional das chefias e da
supervisão.

O líder, para tal gestão, deve ser capaz de ouvir e de se fazer ouvir, e não apenas
de aceitar a opinião do outro mas, sobretudo, de incentivá-lo a envolver-se no
processo, sendo participante dele. Não se resolve nada sozinho, mas se consi-
deram as decisões como responsabilidade de todos, porque se acredita que os
colaboradores podem dar o que têm, o que sabem e o que são.

A responsabilidade das pessoas encarregadas da gestão deverá ser de liderar,


coordenar e gerenciar os esforços, de forma a se construir um ambiente no qual
a criatividade, a busca de novas experiências, o trabalho em equipe, a predispo-
sição em estar sempre aprendendo e o acompanhamento tranquilo das mudan-
ças sejam uma constante.

Para tal realidade se concretizar, é necessário que gestores valorizem todas


as esferas da natureza humana e social, a saber: aprender a conhecer, aprender
a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser. Tais necessidades exigem desse

28
Evidenciando o papel da gestão educacional e o perfil do gestor escolar

gestor moderno a valorização, não apenas dos recursos físicos e técnicos mas,
notavelmente, da pessoa humana que caracterizam as organizações educacio-
nais. Para tanto, é preciso uma visão administrativa com abordagem, ao mesmo
tempo, interativa, sistêmica e com grande sensibilidade às diferenças pessoais
ou singularidades dos sujeitos.

Devemos ressaltar que, para uma boa gestão, não é suficiente a competência
administrativa, mas também a competência técnica, a liderança intelectual e o
conhecimento humano. E a esses somam-se o dinamismo, a adaptação, a reali-
dade, o conhecimento do meio de atuação, a capacidade de análise e a compre-
ensão da comunidade escolar, no que diz respeito aos seus anseios e necessida-
des. Sobre essa questão, vale a pena lembrar a importância de envolver todos
os profissionais por mais difícil que possa parecer. Para isso, é de fundamental
importância saber estabelecer metas e objetivos, criar medidas de contingência
antecipadas, usufruir de ferramentas para avaliação processual e estar sempre
elaborando novos projetos de ação, valendo-se de dados concretos.

A relação humana interpessoal deve ser encarada como parte importante do


processo de transformação de gestão, propiciando um ambiente de transparên-
cia, confiança, com clima de cooperação e não competição. Dentro desse perfil,
é preciso ter habilidades para planejar, organizar, avaliar, resolver conflitos, ser
líder, comunicativo, aberto às quebras de paradigmas e ao pioneirismo de novas
criações. Os profissionais precisam firmeza, união, clareza e objetividade da
equipe técnica.

Sabemos que toda e qualquer escola moderna deve ter uma missão bem de-
finida e é essa filosofia que garantirá a identidade própria à organização, uma
vez que, sem ela, aparecerão as incoerências ou incompatibilidades de valores
com as pessoas envolvidas direta ou indiretamente.

Objetivos, valores e compromissos precisam ser compartilhados pelo conjun-


to organizacional, pois, com certeza, surgirá uma equipe comprometida e não
apenas envolvida e essa tarefa deverá ser garantida pelo gestor.

Outro aspecto que precisa ser considerado pelos gestores é a capacitação


permanente de todos os profissionais, pois são eles que mantêm o bom e cres-
cente funcionamento da escola.

Enfim, o perfil do profissional responsável pela gestão de uma organização


enfatiza a competência, competência essa resultante da combinação de habi-
lidades técnicas e comportamentais responsáveis pela qualidade e pela defini-
ção do que se pretende chegar de acordo com a proposta instituída pela escola.
29
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Cabe aqui uma ressalva: ser competente não significa simplesmente fazer bem
feito mas sim despertar nos outros a vontade de fazer bem feito e até mesmo
conseguir estimular o seu grupo a comprometer-se com o processo. É preciso
uma ação muito mais direta de liderança e de processos grupais, em uma intera-
ção contínua e permanente.

Outro elemento tomado de real significado a ser destacado na formação e


atuação do gestor, é que o entendimento agora da gestão como recurso crítico,
estratégico para o avanço de qualquer sociedade, não admite mais um gestor
administrativo, burocrático, guiado por manuais normativos. A gestão ganha va-
lorização social, pois se trata de gerir um processo permanente de mudança, no
qual o gestor/educador passa a ser um articulador, uma facilitador das relações,
uma promotor da participação ativa, enfim um educador em que sua
[...] formação passa a ser vista como instrumento fundamental para o desenvolvimento de
competência, envolvendo valores, conhecimentos e habilidades para lidar com as mudanças
aceleradas, contextos complexos diversos e desiguais, para aprender a compartilhar
decisões envolvendo maior participação dos membros da sociedade e para adaptar-se
permanentemente às novas circunstâncias e demandas institucionais. (MACHADO, 1998)

A escola, cuja finalidade básica é a educação, visando à formação de indivídu-


os capazes de analisar, interpretar e transformar a realidade e possibilitando essa
situação visando ao bem estar do homem, em nível pessoal e coletivo, procura
desenvolver a criatividade, o espírito crítico, a capacidade para análise e síntese,
o autoconhecimento, a sociabilização, a autonomia e a responsabilidade, pois é,
dessa forma, que acredita ser possível a formação de um homem com aptidões e
atitudes para colocar-se a serviço do bem comum, possuir um espírito solidário,
sentir o gosto pelo saber, dispor-se a conhecer-se, desenvolver uma capacidade
afetiva e possuir uma visão inovadora.

Acreditamos que a coordenação dos cursos de formação para professores


deva vivenciar uma gestão democrática não com a criação de nova disciplina
específica de gestão mas inserindo conteúdos significativos dessa área, com os
quais todos os estudantes possam conhecer, para que em suas vidas pessoais e
profissionais sejam gerenciadores de suas ações.

No que se refere especificamente à gestão educacional, é de fundamental


relevância o conhecimento de teorias e tendências educacionais, processos de
aprendizagem, grandes educadores, suas obras e propostas, que contemplem e
levem saberes necessários à construção de competências de um educador. Aliás,
esse processo deve ocorrer durante todo o curso de formação de professores. Re-
lativo à gestão educacional, aparecem os conhecimentos das políticas públicas, da

30
Evidenciando o papel da gestão educacional e o perfil do gestor escolar

legislação constitucional e educacional, da organização dos sistemas de ensino


e as diversas formas de gestão, em destaque a gestão de pessoas.

O perfil desses profissionais deve conciliar as duas dimensões essenciais da


própria proposta: a técnica e a política. A qualificação técnica requer o domínio
dos fundamentos da educação e da pedagogia – com sua indispensável base
docente – e o conhecimento dos processos de gestão de uma organização, tanto
em nível macro quanto em nível micro. Os requisitos políticos requerem sensi-
bilidade para perceber e se antecipar aos movimentos da realidade, capacidade
dialética de negociação de conflitos nas relações interpessoais, sem negar as
diferenças, coordenando as forças institucionais na direção de sua finalidade –
cumprimento de seu papel social (BORDIGNON, apud FERREIRA; AGUIAR, 2000).

Acrescentamos o necessário estabelecimento de relações entre todas as


áreas citadas para a formação do gestor/educador. E, ainda, a vivência prática
respaldada em teoria e na decorrente reflexão.

Conscientes de todo esse processo, inclusive como participantes de curso de


Formador de Pedagogo, com especialização em Gestão Escolar, e no exercício da
profissão, por muitos anos, repetidores e reprodutores até o despertar por uma
educação libertadora, que imprime em seus princípios a realidade sócio-histórica
e cultural, a ação política, a participação, o educador político e a transformação
social, buscamos, tendo a teoria como referencial, a participação de todos os
profissionais da escola na construção das ações e na realização dessas, não per-
mitindo mais a dicotomia entre planejadores e executores. O papel e a postura
do gestor é de um educador, coordenando e organizando o trabalho escolar
com todos, não mais passivos, meros executores, mas ativos, dinâmicos, autôno-
mos, construtores de suas práticas, capazes de tomadas de decisões conjuntas
de suas ações.

De posse de um referencial teórico sobre as mudanças que estão a ocor-


rer na gestão educacional e em decorrência no papel e perfil do gestor esco-
lar, buscamos agora focalizar o nosso estudo em liderança e no líder, para elu-
cidar ainda mais quem é ou deve ser esse profissional para gerir uma escola
democraticamente.

As teorias de liderança, na sua totalidade, baseiam-se na crença de que o


estilo de líder é o principal fator determinante do processo administrativo. Pois,
a liderança é um processo interpessoal a fim de influenciar as pessoas para que
elas busquem os objetivos e metas estabelecidas pela organização educacional
ou não, e por processos.

31
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

 Líder X Pessoas e Relações – propensos a ter um grupo mais satisfeito e


harmônico.

 Líder X Tarefa – propenso a ter um grupo menos satisfeito e harmônico.

A liderança enfatiza que a orientação para as pessoas e para tarefa não é


mutuamente exclusiva. Os melhores líderes mostram uma preocupação forte e
equilibrada tanto pelas pessoas quanto pelas tarefas.

Matérias recentes publicadas na mídia sobre educação, com autoridades res-


peitadas na área educacional nacionalmente, têm destacado a importância do
gestor escolar, aquele que exerce o cargo ou a função de diretor de escola. Cita-
mos alguns exemplos abaixo:

Entrevista com Celso Antunes, educador e escritor na


área educacional, Gazeta do Povo
Gazeta: Como obter qualidade na educação pública no país?

Celso: É possível pensar [...] poderão alcançar qualidade. [...] São resulta-
dos concretos que podem ser obtidos com envolvimento de todos, desde o
gestor, passando pelo professor, alunos e família.

Gazeta: E como é possível fazer isso?

Celso: O gestor, diretor, coordenador, enfim, aquela figura central da escola,


sempre deve ser alguém com formação superior.

Entrevista com Maria Helena Guimarães de Castro,


Secretária de Educação do Estado de São Paulo
Veja: Como algumas escolas públicas conseguem sobressair diante das
demais, apesar do mesmo orçamento apertado?

Maria Helena: Há um fator comum a todas as escolas nota 10, e ele merece
atenção das demais: trata-se da presença de um diretor competente, com atri-
butos de liderança semelhantes ao de qualquer chefe numa grande empre-
sa. Sob sua batuta, os professores trabalham estimulados, os alunos desfru-
tam de um clima positivo para o aprendizado e os pais são atraídos para
o ambiente escolar. Se tais diretores fossem a maioria, o ensino público não
estaria tão mal das pernas.

32
Evidenciando o papel da gestão educacional e o perfil do gestor escolar

Seção “Ponto de Vista”, de Cláudio


de Moura Castro, Revista Veja, 2.047
Como a escola tem a cara do diretor, a sua escolha irresponsável arruína
o ensino. Onde isso ocorre, os professores se sentem desvalorizados e mani-
pulados pela burocracia.

Destaca-se nas colocações dos educadores/escritores a relevância ao papel do


diretor/gestor, enquanto líder, exercendo liderança na conquista de uma escola
de qualidade. Há que se considerar também, a visão atual de liderança. Os estu-
dos sobre liderança passaram por uma transformação, ou seja, de início era visto
apenas como a descrição de traços e características de um líder, passando para uma
análise do funcionamento do papel de liderança para então chegar a um estudo
numa abordagem situacional, investigando-se o contexto em que está inserido.

Ainda, o desempenho das atividades do líder depende do compartilhamento


dos resultados com as pessoas que fazem parte de sua equipe, no sentido de im-
pulsionar os esforços em uma mesma direção, fazendo com que todos possam
atingir um mesmo objetivo.

Buscamos em Lück, em seu livro Liderança em Gestão Escolar, maiores respal-


dos para o entendimento do assunto e destacamos dos seus estudos aspectos
que consideramos relevantes, como na apresentação do quadro a seguir:

Atitudes identificadas em pessoas


que expressam comportamentos de liderança

Aceitação a desafios Autoconfiança


Autocontrole Autodeterminação
Comprometimento Dedicação
Determinação Empatia
Empreendedorismo Entusiasmo
Espírito de equipe Expectativas elevadas
Flexibilidade Gosto pelo trabalho
Inteligência emocional Inteligência social
Laboriosidade Maturidade psicológica e social
Motivação Ousadia
Perseverança Persistência
Proatividade Resiliência
Tolerância aos desafios

33
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Atitudes essas que, como sabemos, numa gestão participativa e pelo desta-
que feito aqui, ressaltado pelos educadores citados nas entrevistas, do papel do
líder, caracterizado no diretor da escola, criam uma sinergia, do gestor aos profes-
sores, destes aos alunos, aos pais e aos colaboradores de ensinamento e apren-
dizagem, esta é a linguagem da escola, portanto, no cotidiano, as atitudes do
gestor passam a fazer parte da comunidade de aprendizagem e generalizam-se,
transformando-se num clima organizacional favorável à vivência democrática.
Lück apresenta também um quadro comparativo entre os estilos de liderança
centralizada e compartilhada:

Estilos de liderança
Estilo autoritário – Liderança Estilo democrático – Liderança
centralizada compartilhada
Centrada no dirigente. Pessoas espe- Compartilhada entre os membros
Iniciativa ram permissão para tomar iniciativa. da organização e determinada cole-
tivamente.
Considerada como secundária. Mais Fortalecida mediante o desenvolvi-
forte é o culto ao dirigente e suas mento de competências pelo com-
Cultura
decisões. partilhamento de decisões e ações,
organizacional que transformam positivamente o
modo de ser e de fazer escola.
Tomada de Centralizada e baseada em proces- Distribuída, mediante processos de re-
decisão sos formais. flexão e disseminação de informações.
Definido e assumido pelo dirigente, Definido e assumido pelos membros
que se torna seu arauto. da escola e incorporado no ideário de
Sentido de
suas ações, mediante sua iniciativa
missão e visão para implementá-lo. Continuamente
revistos à luz das ações e reflexões.
Crédito do Atribuído ao dirigente. Atribuído ao trabalho de conjunto.
sucesso
Assumidos de acordo com cargos e Assumidos de forma compartilhada,
respectiva definição. segundo o sentido de responsabili-
Papéis e
dade comum. Desenvolve-se em as-
funções sociação com o desenvolvimento das
competências das pessoas.

Em síntese, a autora consegue nos demonstrar as diferenças altamente signi-


ficativas dos estilos de liderança e, em função desta, a decorrente gestão autori-
tária ou democrática. Em nosso relato destacamos sempre, por opção, a gestão
democrática porque cremos e temos esperança no ser feliz do homem e, para
que isso realmente ocorra, a educação que preconizamos nos leva continuamen-
te à busca de uma educação libertadora, transformadora. Dessa forma, exercen-
do uma liderança compartilhada, as atitudes de liderança vão se fortalecendo
em todos os envolvidos no processo educacional, o que é salutar, a sociedade
carece de líderes eficazes e à escola incumbe esse papel.
34
Evidenciando o papel da gestão educacional e o perfil do gestor escolar

Texto complementar

Gestão e liderança
(ANTUNES, 2008)

Existe a certeza de que todo bom diretor ou diretora de uma escola, públi-
ca ou particular, necessita ser um líder e que o domínio ou não dessa compe-
tência representa essencial diferença na qualidade de uma escola. Acontece,
entretanto, que as qualidades de liderança não são atributos que a pessoa
traz em sua bagagem hereditária, mas competências que domina e desen-
volve. Se assim é, cabe discutir quais seriam essas competências e até que
ponto podem ser as mesmas exercidas por outros profissionais e, também,
se algumas destas qualidades não exigem traços de caráter, estes já não tão
facilmente adquiridos pelo estudo e pelo esforço. Comecemos pela segunda
questão.

Durante muitos anos se pensou que liderança e caráter eram atributos sia-
meses e que seria impossível encontrar um bom líder se entre os fundamen-
tos de sua personalidade faltassem certos elementos cruciais à liderança. Era
comum, por exemplo, destacar que todo líder, entre muitos outros atributos,
não poderia ser excessivamente tímido e se, por acaso, essa característica se
mostrava marcante em um profissional, não era compatível com o exercício
sereno da liderança. Essas argumentações já não mais fazem sentido e em
muitas organizações pessoas sabidamente tímidas exercem insuperável li-
derança. Não só a timidez é atributo que com algum esforço e paciência se
transforma, como seu exercício em si não se choca com as estratégias essen-
ciais de sólida liderança. É até possível pensar que na pré-história humana a
boa liderança se associasse a alta agressividade e que esta não combinava
com a timidez, mas não mais vivemos nas savanas e as escolas modernas em
nada se identificam com neolíticas cavernas.

Consolidando-se, dessa forma, a indispensável distância entre caráter e


liderança, chega-se então às “competências” essenciais a um ou a uma líder
escolar. Vamos a essa relação, advertindo-a ser incompleta, pois além de atri-
butos gerais que aqui se relacionam, cabem outros de natureza específica
e pontual que diferenciam uma escola de outra. Mas, independente destes,
não existe liderança verdadeira, quando falta:

35
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Consciência de que se é eterno aprendiz


Impossível identificar capacidade humana mais distante da liderança que
a prepotência de se pensar que se sabe tudo e a arrogância de acreditar que
nada mais se tem a aprender. Uma liderança moderna se opõe ao autoritaris-
mo de quem se pensa imutável, de quem se deixa envolver pela ingenuida-
de infantil de acreditar que o que deu certo ontem, com certeza representa
elemento válido para o amanhã.

Clareza sobre recursos e meios para alcançar


a essência dos objetivos traçados
Essa competência poderia ser descrita com as palavras “pés na terra”, ex-
pressando a certeza de que todo líder necessita conhecer a fundo a realidade
de que dispõe, julgá-la sem qualquer preconceito ou estereótipo e traçar ob-
jetivos realistas, ainda que o alcance de alguns passos não impeça que sejam
dinâmicos e, portanto, refeitos sempre, buscando cada vez menos os sonhos
e construindo em todas as oportunidades a melhor realidade possível.

Capacidade de formar verdadeira equipe


Da mesma forma que a qualidade de um ato cirúrgico complexo somente
pode ser aferida pela ação da equipe médica, não se pode crer que a qualidade
de uma excelente escola possa repousar no trabalho deste ou destes profes-
sores. Um grande líder é sempre um excelente formador de equipe, capaz de
acompanhar dia a dia seu desempenho, elogiando esta ou aquela ação, corrigin-
do este ou aquele procedimento. Nenhuma equipe pedagógica caminha bem
sem o olhar atento, analítico e crítico de um bom líder que jamais se ampara em
“certezas” imutáveis. Um time de futebol, por exemplo, pode jogar vez ou outra
uma partida excepcional, mas os torneios e campeonatos são sempre prêmios à
regularidade no desempenho, à constância na avaliação e correção de rotas.

Habilidade para gerar um ambiente


“saudável” em todas as dimensões
A escola é, por essência, um espaço alegre, criativo, dinâmico, fomenta-
dor de ideias e pronto para acolher iniciativas, e esses atributos estão muito

36
Evidenciando o papel da gestão educacional e o perfil do gestor escolar

ligados ao exercício da liderança. Seriedade no trabalho docente não deve


ser sinônimo de tristeza, e amargura persistente não combina com a juven-
tude. A palavra recreare vem do latim, expressa o “criar de novo” e, por essa
razão, uma excelente escola é escola recreativa, onde tudo quanto se desco-
bre se acrescenta e onde cada ano letivo que passa é lição que fica, para um
renascer permanente.

Mostrar-se empreendedor, pensando


sempre nas estratégias, condições
e possibilidades de se construir o futuro
Toda escola se afirma preparadora do futuro, mas é importante que se
saiba que o futuro não está pronto, não simboliza ilha que, do oceano, o náu-
frago descobre. O líder é o profissional que olha esse amanhã como um de-
safio e que sempre está pronto para mudanças. A excelente escola é aquela
em que os alunos aprendem a aprender e os professores aprendem a recons-
truir planos e fomentar desafios e incertezas. Não existe maneira mais serena
e otimista de pensar o futuro, que reconstruir com bases sólidas o presente,
que a todo instante se modifica.

Dica de estudo
LÜCK, Heloísa. Liderança em Gestão Escolar. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. v. IV,
série cadernos de gestão.

Esse livro mostra ao gestor escolar e aos demais profissionais da equipe de


gestão como proceder para o exercício da liderança efetiva, pois influenciam
pessoas positivamente, a fim de envolvê-las e para que, em conjunto, aprendam,
construam conhecimento, desenvolvam projetos, enfim promovam melhorias. A
abordagem do livro está diretamente voltada à questão da liderança na escola.

Atividades
1. Tendo a clareza que a princípio a administração educacional está fundamen-
tada na Teoria Geral da Administração e que esta está respaldada inteira-

37
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

mente nos interesses capitalistas e, ainda, que a administração está atrelada


aos interesses políticos, econômicos e sociais, quais são os efeitos diretos à
educação quando esta administração é aplicada interinamente ao âmbito
educacional?

2. Alguns perfis de gestores estão delineados abaixo. Qual deles mais se apro-
xima de um gestor democrático? Use V ou F.

( ) Disciplinado, rígido, controlador, supervisor, que não fomenta o trabalho em


equipe, a criatividade e autonomia, que centraliza a tomada de decisões.

( ) Facilitador das relações interpessoais, estimulador da criatividade e au-


tonomia, motivador e orientador do trabalho em equipe.

38
Evidenciando o papel da gestão educacional e o perfil do gestor escolar

3. Frente a necessidade de rever a ação do gestor escolar frente a gestão demo-


crática, este deverá mudar suas concepções a respeito dos encaminhamen-
tos tanto políticos, quanto técnicos, incluindo a sua própria esfera humana,
no que tange a inter-relação. Analise no texto que mudanças são necessárias
ao gestor frente a uma gestão democrática.

4. Releia o último parágrafo desta unidade e procure fazer um paralelo entre o


seu conteúdo e a realidade escolar atual.

39
Da administração
autocrática à democrática

Buscamos embasamento teórico nos estudos clássicos sobre estrutu-


ras organizacionais complexas e sobre as práticas e os sistemas adminis-
trativos, a fim de elucidar melhor as diferenças existentes nas condutas
administrativas de um sistema a outro.

Um dos estudos clássicos sobre estruturas organizacionais abrangem


as práticas e os sistemas administrativos, bem como a liderança participa-
tiva ou democrática e foram realizados sob a direção de Rensis Likert, do
Centro de Pesquisa da Universidade de Michigan, por meio do Institute for
Social Research.

Tendo presente que a instituição educacional é também uma organiza-


ção complexa, de caráter público, pois presta serviços ao público, enten-
demos ser possível tornar o referencial de Rensis Likert, como base para a
reflexão, mantidas aí as especificidades da instituição educacional.

Likert desenvolveu esse estudo sobre os quatro sistemas administra-


tivos, levando em conta os ­perfis organizacionais que caracterizam uma
instituição. Esses perfis são compostos com base em certas variáveis com-
parativas, as quais foram selecionadas de acordo com quatro variáveis di-
ferentes, quais sejam:

 processo decisorial, que define como e quem toma as decisões den-


tro da instituição, centralizadas ou descentralizadas;

 os sistemas de comunicação, que definem como as comunicações são


transmitidas e recebidas dentro da organização, ou seja, fluxo vertical
e descendente, vertical com dupla mão de direção, ou horizontal;

 os relacionamentos interpessoais, que definem como as pessoas se


relacionam entre si, e qual o grau de liberdade nesses relacionamen-
tos (os funcionários trabalham isolados ou em equipes de trabalho);

 os “sistemas de recompensas e de punições” definem como a insti-


tuição motiva seus funcionários a se comportar (motivação positiva
e incentivadora ou restritiva e inibidora).
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

De acordo com Likert (1971), quanto mais o “sistema de interação-influência”,


que significa relacionamentos interpessoais de uma instituição, se aproximam
de uma forma estrutural de superposicão grupal múltipla e, quanto mais efi-
cientes são os grupos, melhores são as comunicações, a motivação e os outros
processos da organização.

O conjunto dessas variáveis pode


constituir as seguintes alternativas
dos quatro sistemas administrativos
Sistema 1 – “Autoritário-coercitivo” é um sistema autocrático e forte, centraliza-
dor, coercitivo e arbitrário. Há um controle rígido de tudo que ocorre dentro da ins-
tituição. O nível mais elevado da instituição centraliza o processo decisorial. Todas
as decisões, as ocorrências imprevistas, as resoluções e os eventos são responsa-
bilidades exclusivas da cúpula da instituição, que se tornam sobrecarregadas com
essa tarefa, enquanto os níveis mais baixos ignoram as decisões tomadas.

As comunicações sempre ocorrem verticalmente, no sentido descendente,


carregando apenas ordens e raramente orientações ou explicações. Nunca ocor-
rem comunicações ascendentes ou laterais. Dessa forma, as decisões tomadas
pela cúpula baseiam-se em informações limitadas, geralmente incompletas ou
distorcidas, visto que os membros da comunidade escolar não são solicitados
para gerarem informações.

O relacionamento interpessoal é considerado prejudicial aos interesses em-


presariais. Dessa forma, a informalidade é vedada com o intuito de dar bom an-
damento aos trabalhos. Os cargos e as tarefas são desenhados de forma a isolar
as pessoas, coibindo as relações humanas. Uma instituição com esse sistema en-
fatiza as punições e medidas disciplinares, os membros da comunidade escolar
devem obedecer atentamente às regras e aos regulamentos e executar as tare-
fas, de acordo com os métodos e os procedimentos prescritos.

Esse tipo de sistema acaba por gerar um ambiente de temor e desconfiança,


as recompensas são raras e, quando ocorrem, são geralmente de ordem salarial
e material, sempre frias e impessoais. Geralmente, é encontrado em uma organi-
zação do tipo empresarial, que utiliza mão de obra intensiva e adota tecnologia
rudimentar, pois os funcionários são de baixa qualificação profissional. Emprega-se
esse sistema em área de produção, de construção civil ou de construção industrial.

42
Da administração autocrática à democrática

Sistema 2 – “Autoritário-benevolente”, também é um sistema autoritário, uma


variação do sistema autoritário-coercitivo, porém há uma maior condescendên-
cia e menor rigidez. O processo decisorial é centralizado na cúpula institucional,
no entanto há delegações de decisões de pequeno porte e de caráter repetitivo
e burocrático, com uma posterior aprovação.

O sistema de comunicação é relativamente precário, prevalecendo as des-


cendentes, embora ocorra uma comunicação ascendente, como retroação das
decisões dos níveis mais elevados. Há uma maior tolerância nos relacionamen-
tos interpessoais, no entanto, a incipiente interação humana ainda é considera-
da uma ameaça aos interesses organizacionais.

Ocorre ênfase nas punições e medidas disciplinares, mas de forma menos


arbitrária. As recompensas são mais frequentes, geralmente de ordem salarial e
material, raramente do tipo simbólico ou social.

Frequentemente, é encontrado nas organizações empresariais vinculadas a


indústrias que utilizam tecnologia mais apurada e mão de obra mais especia-
lizada, mas mantendo ainda alguma forma de coerção a fim de não perder o
controle sobre o comportamento das pessoas. É encontrado, principalmente,
nas áreas de produção e montagem, da maioria das indústrias e nos escritórios
de algumas fábricas.

Sistema 3 – “Consultivo” é um sistema administrativo com maior ­par­ti­ci­pação,


apresentando um abrandamento da arbitrariedade presente nas organiza-
ções ­empresariais. O processo decisorial é participativo e consultivo porque as
­decisões são delegadas aos diversos níveis hierárquicos, mas devem seguir as
políticas e diretrizes da direção. No entanto, para defini-las, os níveis mais baixos
são ­consultados. As decisões tomadas ainda são submetidas a uma posterior
­aprovação pela cúpula.

O sistema de comunicação ocorre tanto verticalmente, no sentido descen-


dente com orientações, ascendente, nas laterais, bem como horizontalmente,
proporcionando maior fluxo de informações.

O relacionamento interpessoal é favorável à organização, o trabalho permite


formação de grupos e de equipes transitórias, nas quais a organização informal
é sadia e positiva.

As punições são leves e esporádicas, há ênfase nas recompensas, que são mate-
riais, como incentivos salariais e promoções simbólicas, como prestígio e status.

43
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Esse sistema é empregado em organizações de prestação de serviços, como


bancos e financeiras ou em organizações industriais com tecnologias avançadas
e com políticas de pessoal mais abertas.
Sistema 4 – “Participativo” é um sistema administrativo mais aberto, fran-
camente democrático e participativo. O processo decisorial é descentralizado.
Dessa forma, é frequentemente delegado aos níveis hierárquicos mais baixos,
que seguem as políticas e diretrizes definidas pela direção. Nesse sistema, há
um consenso entre as pessoas. Em situações emergenciais, a cúpula assume as
decisões, sujeitando-se à ratificação explícita dos demais níveis envolvidos.
A informação é considerada o recurso mais importante dentro da organiza-
ção, fazendo vultosos investimentos nos sistemas informacionais e o seu com-
partilhamento. Dessa forma, as comunicações fluem em todos os sentidos, ou
seja, vertical, horizontal e lateral.
O relacionamento interpessoal baseia-se, principalmente, na confiança
mútua entre as pessoas e não em esquemas formais. O trabalho em equipe é en-
fatizado, principalmente nos grupos de formação espontânea. Os funcionários
desse sistema sentem-se responsáveis por suas decisões, por ser estimulada a
participação e o envolvimento grupal.
As punições são raras e sempre são definidas pelos grupos envolvidos. As re-
compensas são fortemente enfatizadas, principalmente as de ordem simbólica,
embora também ocorram as salariais e materiais.
Esse sistema é pouco encontrado na prática, predominando em organizações
que utilizam tecnologia sofisticada e nas quais o pessoal é extremamente quali-
ficado e desenvolvido, tais como: instituições de propaganda, de consultoria em
engenharia, administração ou processamento de dados etc.
Para uma melhor visualização e compreensão, os quatro estilos adminis­
trativos serão caracterizados apenas em relação a quatro variáveis: processo
­decisorial, sistema de comunicação, relacionamentos interpessoais e sistema de
recompensas e punições.
(CHIAVENATO, 1999)

QUATRO SISTEMAS DE ADMINISTRAÇÃO


1 2 3 4
Variáveis
principais “Autoritário- “Autoritário- “Consultivo” “Participativo”
-Coercivo” -Benevolente”
Totalmente Centralizado na Consulta aos Totalmente dele-
centralizado na administração, níveis inferiores, gado e descen-
Processo administração. mas permitindo permitindo tralizado. Nível
decisorial diminuta dele- participação e institucional define
gação de caráter delegação. políticas e controla
rotineiro. resultados.
44
Da administração autocrática à democrática

Bastante pre- Relativamente Procura-se faci- Sistemas de comu-


cário. Apenas precário, preva- litar o fluxo no nicação eficiente
sentido vertical são fundamentais
Sistema de comunica- lecendo comuni-
ções verticais cação descen- (descendente e para o sucesso da
comunicação descendentes dentes sobre as ascendente) e empresa.
carregando ascendentes. horizontal.
ordens.
Provocam São minima- Provocam certa Trabalho realizado
desconfiança. mente toleradas. desconfiança em equipes. Forma-
Organização in- Organização in- nas pessoas e ção de grupos
formal é vedada formal incipiente nas suas rela- torna-se impor-
Relações e considerada é considerada ções. A empresa tante. Confiança
interpessoais prejudicial. como uma ame- procura facilitar mútua, participa-
Cargos e tarefas aça à empresa. o desenvolvi- ção e envolvimento
confinam as mento de uma grupal intensos.
pessoas. organização
informal sadia.
Ênfase em puni- Ênfase em puni- Ênfase nas Ênfase nas recom-
ções e medidas ções e medidas recompen- pensas sociais.
disciplinares. disciplinares, sas materiais Recompensas
Obediência mas com menor (principalmente materiais e salariais
Sistema de estreita aos arbitrariedade. salário). Recom- frequentes. Puni-
recompensas regulamentos Recompensas pensas sociais ções são raras e,
internos. Raras salariais mais ocasionais. quando ocorrem,
recompensas frequentes. Raras punições. são definidas pelo
(de cunho Recompensas grupo.
salarial). sociais raras.

Os quatro sistemas administrativos, segundo Rensis Likert (1971). [Fonte: Idalberto CHIAVENATO,
Teoria Geral da Administração. Vol. II – 5.ª edição atualizada. São Paulo: Campus, 1999, 200 p.]

Conforme as pesquisas realizadas por Rensis Likert (1971), pode-se verificar


que, quanto mais perto do sistema democrático ou “padrão grupal de organi-
zação” ­estiver situado o estilo de administração da instituição, tanto mais pro-
vável é que alcance uma considerável participação, autonomia e liderança dos
membros da ­comunidade escolar, por conseguinte equipes de trabalho alta-
mente eficientes, boas relações no trabalho, comunicação eficaz, satisfação dos
funcionários, indivíduo mais ­motivado para o trabalho e, consequentemente, o
aumento significativo da produtividade. Em contrapartida, quando uma institui-
ção se aproxima do sistema 1 ou administrativo autocrático, ou ainda “homem-
-a-homem”, é provável que sejam refletidas ­péssimas relações no trabalho, com:
funcionários passivos e sem iniciativa frente a ­resoluções de problemas, acarre-
tando um comodismo e alienação.

Segundo Likert (1971), foram desenvolvidos dois sistemas de administração


em uma empresa norte-americana. Um dos sistemas é chamado de “organização
do trabalho”, ou seja, sistema autocrático no qual predomina a tarefa repetitiva.
Em contrapartida, o outro sistema é conhecido como “motivação cooperativa”,
ou seja, um sistema democrático na qual prevalece a tarefa variada.
45
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

O sistema “organização do trabalho” se fundamenta em princípios da Teoria


da Organização Militar, teorias de Taylor etc. É um sistema que possui um antece-
dente histórico de administração, tem seu prestígio aumentado por ter melhora-
do a produção e possibilitar a redução de custos.

Nesse sistema, os serviços são bem organizados, com um reduzido desper-


dício de movimentos e das tarefas ineficientes. Portanto, baseia-se nos motivos
econômicos de comprar o tempo de um indivíduo e, em seguida, dizer-lhe com
precisão o que deve fazer, como fazer e em que nível produzir.

Os “sistemas de administração de motivação cooperativa” nunca foram des-


critos como sistema de administração. São poucos os administradores que têm
pleno conhecimento da dimensão desse sistema.

Esse tipo de sistema de administração focaliza o trabalho variado, que utiliza


limitadamente os princípios e os métodos da administração científica e os prin-
cípios correlatos de administração. Sendo assim, melhor organização, simplifica-
ção do trabalho e procedimentos similares são apenas parcialmente realizados.

Os melhoramentos pela aplicação da “administração de motivação coopera-


tiva” não podem ser tão rapidamente comprovados, como podem os aumentos
de ­produtividade em relação à tarefa repetitiva do “sistema de organização do
trabalho”. Quando se utiliza uma melhor liderança e se focaliza a “motivação coo-
perativa”, geralmente decorre um longo tempo para que se apresente um melho-
ramento no desempenho. Para a avaliação do desempenho, é necessário observar
as variáveis intervenientes. Essas variáveis intervenientes, para o autor, são as ati-
tudes, como motivações e percepções. Essas atitudes devem ser periodicamen-
te medidas em todos os membros da empresa. Sem o envolvimento de todos os
colaboradores, tal melhoramento na produtividade não será atribuído de forma
clara e inquestionável ao “sistema de motivação cooperativa de administração”.

Um semblante essencial mencionado nas pesquisas de Rensis Likert é a es-


trutura organizacional. Likert (1971) definiu dois modelos de padrão estrutural:
o primeiro é a estrutura organizacional tradicional, apresentada nos sistemas 1
e 2 usando o modelo baseado no “homem-a-homem”. As relações que se esta-
belecem são diretas e exclusivas entre superior e subordinado; o poder é cen-
tralizado na cúpula, portanto a cadeia de comando de cima para baixo funcio-
na via regras, metas e decisões. A forma individual da liderança é enfatizada, os
dirigentes não confiam em seus subordinados, como ilustra a Figura 1. A nova
estrutura organizacional mencionada em sua obra é apresentada pelos sistemas
3 e 4, usando o modelo de organização grupal, como na Figura 2.

46
Da administração autocrática à democrática

Organização homem-a-homem

(LIKERT, 1971)
Padrão grupal de organização

(LIKERT, 1971)

Figura 2 – Padrão grupal de organização.

Para Likert (1971), o modelo grupal utilizado pelo sistema administrativo 4,


em especial nas tomadas de decisões, é efetivado de modo participativo, intro-
duzindo diferentes contribuições requeridas para a reflexão e para uma adequa-
da tomada de decisões. Cada grupo de trabalho é ligado por elos aos demais
grupos da empresa, por meio das pessoas que são membros de mais de um
grupo. Esses empregados, que superpõem suas ligações e seu relacionamento
com os demais grupos, são chamados de “elos de ligação”.

Segundo Chiavenato (1999, p. 205), “são verdadeiros elos de ligação entre


os grupos de trabalho, o que proporciona uma dinâmica totalmente nova no
sistema. Na prática, a estrutura organizacional permite uma vinculação de
grupos superpostos da seguinte maneira”.

47
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

(CHIAVENATO, 1999)
Figura 3 – A forma de organização em grupos superpostos.

Para Chiavenato (1999), o processo de interação ocorre entre os subalternos


e superiores e vice-versa. Cada equipe de trabalho compõe-se de um superior e
de todos os subalternos a esse superior. Dessa forma, um ou mais funcionários
de cada equipe passam a comportar-se como elos de vinculação com os demais
grupos da empresa. Entretanto, ocorrem os elos de vinculação superpostos.

Em contrapartida, o sistema 4 baseia-se em três aspectos principais: o primeiro


é a utilização de princípios de motivação em vez da dialética tradicional de “re-
compensas e punições”. O segundo baseia-se na composição de equipes de tra-
balho altamente motivadas, capazes de se empenhar para alcançarem as finalida-
des empresariais; e o terceiro está calcado na administração, a qual escolhe metas
para elevar a performance da empresa e para os demais funcionários. Essas metas
podem ser melhor alcançadas por meio de um sistema de administração que per-
mita condições de satisfazer aos objetivos individuais dos colaboradores.

Para Chiavenato (1999, p. 207),


[...] muitos executivos calculam a eficiência da organização apenas em termos de produtividade
ou produção física, negligenciando as atitudes, motivações e percepções de todos os
empregados. Assim, surge uma dificuldade: executivos que se baseiam apenas nos resultados,
deixando a seus sucessores uma grande quantidade de fragmentos de atitudes e percepções,
cuja ordenação e correção exigem longo período de trabalho árduo.

E nas palavras de Assmann (1998, p. 169)


[...] uma organização aprendente é aquela na qual as pessoas envolvidas procuram, em todos
os níveis, individual e coletivamente, aumentar a sua capacidade de resultados pelos quais
estão efetivamente interessados. Um envolvimento interessado é coisa muito diferente da
eficiência quase-maquínica mediante a execução imposta por comandos externos aos agentes
e prexidados numa única direção que não admite desvios. Por isso é aprendente, a criatividade
individual e coletiva capaz de criar e assumir mudanças. Sem isso faltaria precisamente
aquela dinâmica de mutações que justifica que se fale na presença contínua de processos de
aprendizagem.

48
Da administração autocrática à democrática

Iniciamos este texto expondo a busca no embasamento teórico nos estudos


clássicos sobre estruturas organizacionais complexas, considerando a instituição
educacional como tal, respeitando as especificidades próprias, e também sobre as
práticas e os sistemas administrativos, usando para isso, os estudos desenvolvidos
por Rensis Likert, no intuito de demonstrar as diferenças existentes nas condutas
administrativas de um sistema a outro, ou seja, do autocrático ao democrático.

Recorremos, agora, a outros dois autores: Idalberto Chiavenato, da Teoria da


Administração Geral e Hugo Assmann, da Área Educacional, comungando em
suas citações acima que uma organização em que os sujeitos estão envolvidos,
individual e coletivamente, na busca do desenvolvimento de suas capacidades
criativas e em decorrência a organização, no nosso caso a escola, torna-se uma
organização, pois aprendente, participativa, trazendo em suas entranhas os inte-
resses, as motivações, as atitudes, as percepções dos partícipes.

Poderíamos, ainda, trazer outros autores, como Peter Senge e sua obra Esco-
las que Aprendem, bem como da área educacional a exemplo de Heloísa Lück.
Eles concebem a escola como organização, utilizando-se de teorias a favor da
qualidade e da produtividade da escola, com vistas a formação de sujeitos autô-
nomos, criativos, críticos e, ainda, a objetividade na educação para a transforma-
ção social, ao bem comum individual e coletivo. Com isso, possibilitam um outro
olhar, inclusive o aqui utilizado pelo estudo de Likert, abrindo horizontes pela
sua teoria aos gestores para que estes reflitam e analisem a situação de suas es-
colas e possam, à luz de teorias administrativas, observando as particularidades
da educação, atingir os objetivos, evidentemente, os educacionais.

Ainda, para concluir, na certeza de apenas despertar para a necessária pes-


quisa e estudo, a escola saindo do seu reduto – clausura –, vendo-o como ex-
clusivo o espaço da educação, fazer uso de outros meios, como o aqui realizado
e mais importante, estabelecer a devida relação entre o que estamos fazendo
em nossas escolas e, com os indicativos apontados, preferencialmente o sistema
4 – Participativo da teoria de Likert, para realmente construirmos a gestão de-
mocrática. Uma gestão democrática comprometida com o desenvolvimento e o
ser feliz do homem, voltada para a construção e participação e não mais para a
reprodução e servidão, retratadas nos sistemas 1 e 2 da Teoria de Likert.

Ao ampliarmos nosso entendimento sobre as teorias, sejam administrativas,


como a apresentada, ou outras, dão-nos embasamento para uma prática com
intencionalidade, que na sua vivência pode ser refletida cientificamente. Assim,
poderemos oferecer aos brasileiros uma escola de qualidade, portanto produti-
va, privilegiando valores para uma vida plena de significados solidários, coope-
rativos e mais igualitários.
49
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Texto complementar

Gestão democrática na prática educacional


sob uma visão filosófica
(DUDEK; SOUZA; URBAN, 2005)
[...]

Definição de democracia
A reflexão sobre a democracia é uma discussão que produziu, e produz,
ao longo da história das ideias políticas e sociais, várias abordagens, desdo-
bramentos e propostas. Por isso, é uma teorização inacabada, e talvez nunca
o seja. Porém, a reflexão permanente sobre a democracia é necessária e
fundamental tanto para instituição quanto para a análise das relações entre
Estado e Sociedade e das relações sociais em sua totalidade.

Existem vários autores referenciados por Fares Netto (2000, p. 15) que
trazem seus próprios conceitos ao termo democracia. Por exemplo, para
John Marshal, ex-presidente da Suprema Corte norte-americana, democra-
cia é “eficácia e verdadeiramente, um governo do povo. Na forma e substân-
cia a democracia emana do povo, recebe poderes do povo, que exerce sobre
o povo e em seu benefício” (apud NETTO, 2000, p. 15).

Daniel Webster, senador americano, dizia que “democracia é o governo


do povo, feito pelo povo, para o povo e responsável perante o povo” (apud
NETTO, 2000, p. 15).

Abrahan Lincoln, em 1863, apresentou a até então mais famosa e divul-


gada definição de democracia como sendo “O governo do povo, pelo povo e
para o POVO” (apud FARESNETTO, 2000, p. 15). Essa definição é considerada
como sendo a clássica definição de democracia.

E Fares Netto (2000, p. 15-16) afirmava que:


[...] na verdade é impossível dar uma definição oficial de democracia, pois ela não é nem
um sistema, nem uma série de instituições, nem um código de leis, nem uma combinação
de medidas políticas. A democracia é antes uma crença na natureza humana e um código
de comportamento que traduz aquela crença em pensamento e ação. É, pois, um tipo de
filosofia e não um fim em si mesma.

50
Da administração autocrática à democrática

Para resumir, democracia é um sistema de governo onde o poder de tomar


importantes decisões políticas está com o povo. Para usar uma frase famosa,
democracia é o “governo do povo para o povo”. Democracia se opõe às formas
de ditadura e totalitarismo onde o poder reside em uma elite auto-eleita.

Perspectivas e possibilidades de uma


democracia na educação brasileira
O processo de democratização da sociedade brasileira ocupou o sistema
de ensino público em vários Estados por meio da adoção de práticas cole-
giadas, eleições e descentralização dos recursos financeiros. Essas inovações
foram sendo introduzidas de forma pontual, desde 1981. Esses movimen-
tos, pela primeira vez na história do Brasil, conquistaram uma inclusão na
constituição brasileira, o princípio da Gestão Democrática na Educação. A
participação e a tomada de decisões mais coletivas possibilitou a formação
de Conselhos, Colegiados e Comissões, nas mais diversas instâncias sociais,
e, assim, foram formados os Conselhos de Saúde (regionais e municipais),
Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente (estaduais e municipais),
Conselhos da Condição Feminina (estaduais), entre outros.

Na área da educação, os segmentos democráticos e progressistas defen-


diam a formulação da “gestão democrática do ensino, com a participação de
docentes, alunos, funcionários e comunidade” (Art. 206, VI), porém o preceito
constitucional para a educação ficou definido como “gestão democrática do
ensino público, na forma de Lei” (Art. 206, VI).

Nessa perspectiva, a instituição educacional deve ter como princípios


fundamentais: o caráter público da educação; a inserção social e a gestão
democrática, onde as práticas participativas, a descentralização do poder, a
socialização das decisões desencadeiam um permanente exercício de con-
quista da cidadania. Esta última é concebida como materialização dos direi-
tos fundamentais legalmente constituídos, entre eles o direito à educação.

[...]

No processo de construção da gestão democrática da educação, a autono-


mia, a representatividade social e a formação da cidadania são elementos fun-
damentais que vão contribuir para que as instituições educacionais, articuladas
com outras organizações da comunidade, possam participar da construção de
uma sociedade fundada na justiça social, na igualdade e na democracia.
51
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Porém, gestão democrática na educação não se dá apenas pelo cumpri-


mento de uma lei, mas também, a partir da efetiva integração da comuni-
dade escolar. É preciso ter planos e propostas para interferir na realidade
educacional. Em síntese, gestão democrática “é a mobilização efetiva dos
esforços individuais para superar atitudes de acomodação, alienação e mar-
ginalidade; eliminar comportamentos individualistas, construir espírito de
equipe” (LÜCK, 1998, p. 13).

O gestor é o principal responsável para criar e manter um ambiente em que


todos participam plenamente, ou seja, em que todos tenham espaço para dis-
cordar, opinar e participar nas tomadas de decisões, que desenvolvam uma
consciência social crítica e aprendam o princípio de cidadania na prática.

[...]

A pesquisa
E para compreender essa prática, se fez necessário realizar uma pesqui-
sa em uma Escola Estadual, localizada no bairro Novo Mundo, município de
Curitiba, capital do Paraná nos períodos de agosto e setembro de 2003.

Esta escola tem um total de 1 350 alunos, divido nos três turnos sendo 530
alunos do Ensino Médio no período da manhã, 455 alunos do Ensino Fundamen-
tal no período da tarde e 400 alunos do Ensino Médio no período da noite. Seu
corpo técnico-pedagógico está assim constituído: 5 gestores (diretor, vice-dire-
tores, supervisores e orientadores), 73 docentes e 25 auxiliares administrativos.

Essa pesquisa teve como objetivo entender sob uma visão filosófica as
implicações da gestão democrática na prática educacional, ou seja, verificar
de que forma o termo democracia é entendido no âmbito de uma gestão
pública escolar e estabelecer a relação entre o entendimento da gestão de-
mocrática por parte da instituição pesquisada com os referenciais teóricos.
Para tanto, apoiou-se nos procedimentos de observações e questionários
dirigidos para toda a comunidade escolar presente nas visitas a escola. Per-
cebeu-se na pesquisa que a comunidade escolar ainda não sabe o signifi-
cado verdadeiro de gestão democrática. O Projeto Político-Pedagógico da
instituição relata que a gestão é participativa e democrática. Os membros
da comunidade escolar acreditam que trabalham sob uma democracia, pois
responderam o questionário tentando comprovar os fatos. Porém, há uma
contradição em suas respostas que leva a concluir tendo como respaldo teó-
rico, que a verdadeira Gestão Democrática não acontece na escola.
52
Da administração autocrática à democrática

[...]

Para que a gestão democrática saia do papel, é de fundamental impor-


tância que algumas coisas aconteçam de forma coletiva como, por exemplo:
a) reestruturação do Projeto Político-Pedagógico; b) organização da ação do-
cente; c) planejamento educacional participativo; d) conselho escolar ativo;
e) formação continuada.

[...]

Parte do questionário aplicado foi embasado no referencial teórico e de-


senvolvido acerca dos estudos clássicos sobre estruturas organizacionais
complexas e sobre as práticas e os sistemas administrativos, bem como os
de liderança participativa ou democrática, pesquisas realizadas sob a direção
de Rensis Likert que desenvolveu um estudo sobre os quatro sistemas ad-
ministrativos, levando em conta os perfis organizacionais que caracterizam
uma instituição.

[...]

E, para finalizar, foi perguntado o que o entrevistado entende por gestão


democrática. Esta foi uma pergunta aberta, que se obteve como resposta
pessoal as mais diversas possíveis, conforme a transcrição abaixo:

“Etimologicamente falando, a palavra democracia, significa POVO no


poder. Portanto, entende-se como gestão democrática, aquela em que toda
a comunidade escolar toma as principais decisões em relação ao bom anda-
mento da educação como um todo”.

“É a gestão onde todos os envolvidos e a escola (professores, funcioná-


rios, alunos, comunidade APM), participam para dar o melhor direcioname-
nio nas decisões”.

“Participação do corpo docente e de alguns membros da comunidade na


administração da escola”.

“Forma de gerenciamento na qual as decisões provêm da maioria, a ad-


ministração é descentralizada, a soberania é do grupo”.

“Gestão democrática é quando toda a equipe pedagógica, incluindo fun-


cionários, participam e ajudam efetivamente em todo processo escolar jun-
tamente a gestão da escola”.

53
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Concluiu-se, com isso, que na teoria quase todos sabem de antemão num
discurso formal, entretanto, na prática, nem sempre há uma aplicação da
teoria que, no caso, é a realidade da escola pesquisada.

Considerações finais
Evidentemente que um referencial teórico para os educadores é de fun-
damental importância, pois será ele o alicerce para se entender a educação.
Entretanto, sem a pesquisa da prática pedagógica, ou seja, sem estar in loco,
no contexto diário, na prática, na realidade escolar, a fundamentação fica
insuficiente. É necessário analisar a realidade para que seja feita uma com-
paração entre teoria e prática, a fim de se propor uma melhoria no proces-
so ensino-aprendizagem. Falar em gestão democrática é acreditar em uma
escola construída a partir da ação coletiva.

[...]

Analisando os questionários apresentados na pesquisa, chega-se à conclu-


são de que a escola ainda não entendeu o verdadeiro significado de gestão de-
mocrática. Contudo, é importante ressaltar que estão caminhando para isso.

O que a escola entende por gestão democrática é o que é chamado da


área da Administração de Empresas de Gestão Participativa, ou seja, uma
gestão com o objetivo de envolver as pessoas e buscar aliados de “boa von-
tade” que se interessem em salvar a escola pública. Por isso, o Projeto Políti-
co-Pedagógico, espaço privilegiado para a escola definir em seus objetivos,
sua organização e a forma da gestão, não encontra ressonância na gestão
compartilhada. Essa concepção vem se expressando em vários programas
do governo ou dos seus parceiros, alguns apoiados pela mídia, como é o caso
do “Amigos da Escola”, ou então projetos como o Renageste – Rede Nacional
de Referência em Gestão Educacional do CONSED que enfatizam as parcerias
entre o público e o privado, as premiações públicas por méritos em gestão
compartilhada, a descentralização da gestão, a cultura do sucesso e a par-
ticipação das empresas e entidades empresariais tanto para recuperação
física das escolas, como para atividades de complementação educacional.
Nenhum desses projetos ou programas prevê a participação da comunida-
de escolar na sua elaboração ou permite condições para críticas e possíveis
alterações. A “autonomia“ fica por conta das adaptações à realidade de cada
escola, desde que preservados os princípios. Os professores são meros exe-
cutores e a comunidade escolar assume a condição de convidada especial.

54
Da administração autocrática à democrática

Para se chegar a uma verdadeira gestão democrática será necessário


mudar paradigmas. E assim como toda mudança de paradigma, terá que se
investir tempo e ser persistente pelo fato de estarmos lidando com questões
culturais e de valores éticos e morais. Entretanto, acreditamos que o cami-
nho a ser percorrido pela Escola para chegar à Gestão Democrática primei-
ramente será entender o que é democracia, o que é cidadania e como cada
uma delas acontecem em sua plenitude. Posterior a isso, faz-se necessário
que a comunidade escolar debata sobre o assunto, que haja estudos dirigi-
dos e que o gestor seja o primeiro a servir de exemplo para que o resto da
comunidade trabalhe em harmonia.

[...]

Dica de estudo
O vídeo Princípios e bases da Gestão Democrática (parte 3). Disponível em:
<http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.jsp>. Os pro-
fessores em seus pronunciamentos estabelecem os paralelos dicotômicos para
a verdadeira gestão democrática, mas também apontam pistas para a superação
das dificuldades, como:

 gestão democrática mais integrada, mais articulada, no conceito para a


educação básica de preparação para a cidadania;

 valorização da dimensão humana;

 valorização do projeto pedagógico;

 identidade da escola;

 democratização do espaço escolar – espaço público de fato, reduto de


conversação, do diálogo;

 dimensão da solidariedade;

 políticas pedagógicas avançadas, que apontam: autodireção, auto-orga-


nização dos alunos na escola, possibilitando autonomia;

 formação humana multilateral, ou seja, formação integral, melhor prepa-


rado para a vida.

55
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Atividades
1. Complete o quadro assinalando 1, 2, 3 ou 4, de acordo com um dos quatro
sistemas administrativos propostos por Rensis Likert.

1 2 3 4
Variáveis “Autoritário- “Autoritário- “Consultivo” “Participativo”
-Coercivo” -Benevolente”
principais
Processo
decisorial
Sistema de
comunicação
Relações
interpessoais
Sistema de
recompensas

Processo decisorial

( ) Centralizado na administração, mas permitindo diminuta delegação de


caráter rotineiro.

( ) Totalmente delegado e descentralizado. Nível institucional define políti-


cas e controla resultados.

( ) Totalmente centralizado na administração.

( ) Consulta aos níveis inferiores, permitindo participação e delegação.

Sistema de comunicação

( ) Sistemas de comunicação eficiente são fundamentais para o sucesso da


empresa.

( ) Procura-se facilitar o fluxo no sentido vertical (descendente e ascenden-


te) e horizontal.

( ) Bastante precário. Apenas comunicações verticais descendentes carre-


gando ordens.

( ) Relativamente precário, prevalecendo comunicação descendentes sobre


as ascendentes

56
Da administração autocrática à democrática

Relações interpessoais

( ) Provocam certa desconfiança nas pessoas e nas suas relações. A empresa


procura facilitar o desenvolvimento de uma organização informal sadia.

( ) Provocam desconfiança. Organização informal é vedada e considerada


prejudicial. Cargos e tarefas confinam as pessoas.

( ) São minimamente toleradas. Organização informal incipiente é conside-


rada como uma ameaça à empresa.

( ) Trabalho realizado em equipes. Formação de grupos torna-se importan-


te. Confiança mútua, participação e envolvimento grupal intensos.

Sistema de recompensas

( ) Ênfase em punições e medidas disciplinares, mas com menor arbitrarieda-


de. Recompensas salariais mais frequentes. Recompensas sociais raras.

( ) Ênfase nas recompensas sociais. Recompensas materiais e salariais fre-


quentes. Punições são raras e, quando ocorrem, são definidas pelo grupo.

( ) Ênfase em punições e medidas disciplinares. Obediência estreita aos re-


gulamentos internos. Raras recompensas (de cunho salarial).

( ) Ênfase nas recompensas materiais (principalmente salário). Recompen-


sas sociais ocasionais. Raras punições.

2. Faça um comparativo entre modelos de padrão estrutural mencionado nas


pesquisas de Rensis Likert sobre a estrutura organizacional estabelece uma
relação aos sistemas administrativos.

57
Modos de produção e a escola:
descompassos e desafios

Breve histórico e desafios na gestão escolar


O modo de produção predominante em determinado período, com
suas características principais, e os ciclos econômicos têm sido utilizados
por muitos autores como marcos divisórios da história da humanidade.

Um dos autores que trouxe à tona a evolução da humanidade, median-


te o modo produtivo, Alvin Toffler, com seu livro A Terceira Onda, apresen-
ta três ondas de desenvolvimento. Criticada por alguns historiadores, a
forma simplista como Toffler coloca a evolução, entretanto, facilita o seu
entendimento. Decorreram-se duas décadas da publicação desse livro e,
como as mudanças vêm acontecendo muito rapidamente, evoluíram para
cinco ondas.

No intuito de didaticamente facilitar a compreensão, apresentamos


a seguir um quadro que apresenta as ondas de mudanças, situando nos
períodos e suas implicações na administração. A autora desse quadro
(Gomes, 2003, p. 37) tomou Toffler por base teórica e acrescentou mais
uma onda que antecede a primeira; para servir de análise ao estudo que
desenvolvia sobre as mudanças ocorridas na evolução humana e as decor-
rentes mudanças de mentalidade sofridas pela administração por muitas
gerações.

Ondas/Pegadas Período Diferencial de poder


Era da caça Até a agricultura são mais de A caça “a sobrevivência”
500 mil gerações. comum abordagem concreta-
mente voltada para as neces-
sidades básicas do homem.
Era agrícola Trezentas gerações de cultura A terra como o maior valor.
do cultivo da terra.
Era industrial Aproximadamente 11 gerações. O capital.
Século XIX até a década de
1960.
Era da informação e Década de 1960 até hoje. Inteligência – comunicação –
conhecimento software.
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Ondas/Pegadas Período Diferencial de poder


Produtividade Década de 1990 até hoje. Excelência pela qualidade.

Intuição “espírito das Presente em nossas mentes desde Competência essencial “Uma
coisas” o nascimento até a morte. Mas só escola cheia de significados”.
valorizada como ferramenta de
gestão nos dias atuais.

Outros autores, principalmente da área educacional, referem-se aos marcos


históricos que procedem à divisão em períodos da história da humanidade re-
lacionada ao modo de produção como momentos e, geralmente, colocando-os
em três grandes e distintos momentos.

Independente de autorias, o importante nesse estudo para nós está em ­levar


a compreensão da relação do modo de produção dominante com a aprendiza-
gem: exigências e perspectivas.

O primeiro momento da história da humanidade, ou a primeira onda, segundo


Toffler, teve a agricultura como o principal trabalho do homem, e se manteve até
meados do século XVIII. Os indicadores de produção desse período eram apenas
os da natureza: as diferentes estações o tempo de plantio e a colheita. Enfim, os
homens trabalhavam sobre a terra sem aparato tecnológico, apenas com instru-
mentos simples, levando o novo trabalhador a dominar fácil e rapidamente o tra-
balho agrário. A terra era considerada, portanto, de extremo valor. A quantidade
dela, como indicador de riqueza e poder dos homens uns sobre os outros.

O segundo momento da humanidade, ou a segunda onda, denominada Era


Industrial, considerando-se o modo de produção, tem seu início marcado pela
Revolução Industrial. Acontece nesse período, ou seja, a partir de meados do
século XVIII, uma mudança de concepção de economia – do cultivo da terra para
a administração de máquinas – portanto, uma mudança de paradigma.

Do trabalho agrícola ao trabalho industrial, decorrem alterações no sistema


produtivo. Essas alterações são determinadas pela não dependência do tempo
cíclico da natureza, mas sim do tempo linear do relógio. Com a descoberta das
leis da eletricidade no século XIX e o meio , ou seja, o instrumento de trabalho – a
máquina – e o local de trabalho – na indústria –, qualquer hora – dia ou noite – é
hora (tempo) de trabalho. A aprendizagem passa a exigir maior tempo do traba-
lhador, pois, além do domínio da máquina, permanente deve ser o estudo para
atualizações frente às constantes transformações da tecnologia.

60
Modos de produção e a escola: descompassos e desafios

Há que se ressaltar ainda, nesse período, a produção em série. Cada trabalhador


é responsável por uma tarefa específica, tornando-se cada vez mais especializado
naquilo que fazia, desconhecendo o processo produtivo como um todo. O objetivo
era de fazer mais, com menor gasto de tempo e de recursos materiais e financeiros,
visando ao lucro, sendo este o gerador do capital, fator principal da produção.

O terceiro momento da história humana, ou a terceira onda, denominada Era


da Informação e do Conhecimento, de acordo com o modo de produção, tem
seu início na segunda metade do século XX. Profundas e rápidas são as mudan-
ças ocorridas nos meios de comunicação e na tecnologia.

Poderíamos, ainda há pouco tempo, imaginar a possibilidade de comu­


nicação por um aparelho telefônico móvel? E a internet, então?

As transformações acontecem e a revolução nas telecomunicações e na infor-


mática possibilitam espaços ao imenso número de informações e conhecimento
produzido e acumulado na história da humanidade. Com isso, há mudanças no
conhecimento e elas nos espaços do conhecimento e interferem diretamente
no mundo do trabalho.

O espaço, ou seja, o local de trabalho, antes definido na terra ou na indústria,


não depende mais de local previamente estabelecido, assim como os horários.
Deixa de existir a jornada de trabalho.

Da mesma forma, ocorre com o conhecimento e a aprendizagem. Diversas


são as fontes de acesso, bem como os locais. Agora, o espaço do conhecimento
é global, a aprendizagem se dá dentro e fora da escola e, como já comentamos,
com a expansão da tecnologia, a multiplicação da informação e do conhecimento
criam novas possibilidades de locais para aprender, de novas pessoas para ensinar,
tornando a aprendizagem uma constante na vida do trabalhador, pois a este novas
exigências surgem periodicamente, especialmente em termos de competência.

Ressaltamos, ainda, em relação aos três momentos, que têm sido utilizados
para dividir a história da humanidade relativos às principais características do
modo de produção predominante e dos grandes ciclos econômicos, que um não
destitui o outro, mas o influencia.

A agricultura e a indústria não deixaram de existir, contudo fazem elas uso da


tecnologia da informação e da comunicação em sua tecnologia específica. Caso
não o façam, estão arriscadas a sucumbir.

61
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Nas escolas presenciamos, num momento em que vivemos em espaço e tempo


de quarta e quinta ondas, que ainda há a adoção do modelo de fragmentação dos
processos produtivos. Na empresa, isso aconteceu eliminando a participação do
trabalhador na totalidade do processo. E o reflexo disso, nos sistemas educacio-
nais, foi a fragmentação do conhe­cimento, compartimentalizando-os em discipli-
nas, matérias, temas, impos­sibilitando ao professor e ao aluno uma visão do todo.
Por isso, deixam de existir leitura e exercício de reflexão sobre a realidade.

Na adoção desse modelo, a educação assumiu o papel de adequar, preparar


o aluno para aceitar e servir a um modelo de sociedade classista e alienante,
despersonalizando o aluno.

As mudanças estão ocorrendo aceleradamente e trazem novas formas de tra-


balho, de viver e de conviver e, em decorrência, exercem influência na economia,
na política e nas formas como as sociedades se organizam. A produção do co-
nhecimento é o maior desafio da modernidade.

Hoje, em outro contexto, a sociedade do conhecimento, já nos reportamos


anteriormente a ela como Era da Informação e do Conhecimento, está a solicitar
uma nova escola, pois não podemos mais pensar apenas em escolarização formal
frente à crescente e acelerada avalanche de informações e de conhecimentos.

E, na eminência dessa nova escola, vamos primeiramente indagar: Qual é o


papel da educação num contexto globalizado, de maior amplitude nos espaços
do conhecimento?

Introduzimos esse questionamento, citando:

 o pronunciamento do Papa João Paulo II na encíclica Centesimus Annus,


de 1991: “Se antes a terra, e depois o capital, eram os fatores decisivos da
produção [...] hoje o fator decisivo é, cada vez mais, o homem em si, ou
seja, seu conhecimento”.

 Moraes (1997, p. 190)


É preciso colocar o conhecimento à disposição do maior número possível de pessoas,
criando um ambiente que seja não só de comunicação mas que também atue como
ferramenta instigadora, que colabore para uma reflexão crítica, para o desenvolvimento
da pesquisa, que facilite uma aprendizagem contínua, permanente e autônoma.

Com essas colocações, podemos afirmar que o papel da educação, nesse con-
texto e no prenúncio da era das relações, indicativo de uma nova fase da evolução
da humanidade, em que prevalece o poder do indivíduo e das sociedades, segun-

62
Modos de produção e a escola: descompassos e desafios

do Moraes, é facilitar a transição entre a era material e a era das relações, para cor-
reção das injustiças, das desigualdades e dos desequilíbrios existentes, buscando:

 educação e desenvolvimento humano;

 enfoque reflexivo na prática pedagógica;

 novos instrumentos: uma nova ecologia cognitiva;

 autonomia, cooperação e criticidade;

 educar para a cidadania global.

Dessa forma, vemos nascer uma nova escola, propondo uma nova educação
em que tudo está em movimento e o conhecimento sendo construído num pro-
cesso de compartilhamento, interação e transformações. Ela considera os quatro
pilares da educação: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver
e aprender a ser (UNESCO, 1999) e os extrapola, prin­cipalmente quando situa
A conjuntura atual da humanidade requer o desenvolvimento de uma consciência ecológica,
relacional, pluralista, interdisciplinar, sistêmica e espiritual, que traga maior noção de abertura,
novos hábitos e valores, uma nova visão de realidade baseada na consciência do estado da
inter-relação e interdependência essencial de todos os fenômenos da natureza, que transcende
fronteiras disciplinares, conceituais, físicas, sociais e culturais. (MORAES, 1999, p. 226)

Vamos buscar na Física, e aqui traçar um paralelo entre a Física clássica e a Física
quântica, numa tentativa de clarear à gestão educacional os desafios a enfrentar
na construção da nova escola e o referencial teórico necessário à condução de um
novo paradigma à educação.

O conjunto de ciências do século XX traz novos paradigmas, muda os concei-


tos fundamentais pelos quais compreendemos o mundo. Podemos, com eles,
perceber um contexto maior, ver coisas que não percebíamos.

Para entendermos a realidade, a Física clássica estabeleceu diversos paradig-


mas. As organizações, segundo esses modelos, chamados newto­nianos, racio-
cinam com a certeza e a previsibilidade. São hierárquicas, o poder emana da
cúpula e é regido pelo controle em todos os níveis. Elas são gerenciadas e or-
ganizadas, racionalmente instrumentalizadas, como se a soma de suas partes
explicasse o todo.

A Física quântica e as teorias do Caos e da Complexidade e as últimas des-


cobertas sobre o funcionamento do cérebro indicam um novo paradigma, com
base nas ideias, na linguagem e nas imagens dessas novas ciências.

63
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Danah Zohar, autora do livro O Ser Quântico (1998), aponta as diferen­ças de


paradigmas introduzidas pelas novas ciências:

 Holismo, não atomismo

O modelo da Física clássica, bem como o da Filosofia grega é atomista. Isso


quer dizer: o todo é formado pelas suas partes, a interação delas explica
o conjunto. A organização quântica é holística. Ela deve se preocupar me-
nos com o controle dos processos e encorajar mais o relacionamento en-
tre líderes e empregados, entre os colegas, entre as divisões. Ela deve ser
consciente do contexto maior-humano, cooperativo, social e ecológico e
aumentar suas relações com ele.

 Indeterminismo

Na Física clássica, cada efeito tem sua causa. Nas teorias Quânticas e do
Caos, não há previsibilidade, não há controle possível.

A organização quântica deve ser flexível, adotar funções não tão especí-
ficas para os profissionais. Deve mover-se entre o conceito mecanicista e
o orgânico. É a sua indeterminação que a torna capaz de evoluir em qual-
quer direção, conforme a situação requeira.

 Auto-organização

Na Física clássica, o que vigora é o reducionismo e a análise. ­­­Constrói-se


um modelo simples o suficiente para que se possa entender, e amplo o
bastante para dar conta da realidade. A Física quântica e a Teoria da Com-
plexidade acrescentam uma nova percepção: uma empresa quântica deve
ser auto-organizada e emer­gente. Deve valorizar a criatividade, deve dei-
xar fluir a informação e a troca de ideias. As partes (indivíduo, equipes,
setores) devem ser tão livres quanto possível para se organizarem. O pro-
cesso de decisão deve ser mais bem-sucedido.

 Ambos, não um ao outro

Na Física clássica, uma partícula está aqui ou lá, agora ou em outro ­tempo.
Na Física quântica, as partículas têm comportamento de partículas e, ao
mesmo tempo, agem como se fossem ondas. Uma empresa quântica deve
aproveitar a diversidade, deve aproveitar as ondas de possibilidades de
cada um de seus componentes e só quando for a hora da medição, o mo-
mento de decisão, seguir um caminho (deixar que sua função de onda
colapse), aquele que naturalmente vai se impor.
64
Modos de produção e a escola: descompassos e desafios

 O mundo é incerto

De acordo com a Teoria do Caos, pequenas causas podem ter grandes efei-
tos. A Física quântica tem uma imagem ainda mais radical: o Princípio da
Incerteza diz que é impossível determinar, ao mesmo tempo, a posição e a
velocidade de uma partícula. Uma organização quântica seria menos pare-
cida com uma orquestra e mais parecida com uma jam session. Na orques-
tra, há vários instrumentos, mas o tema é o mesmo e o resultado é sempre a
soma das partes. Na jam session, os músicos interagem livremente e não há
condutor e o resultado final é sempre uma surpresa. “Administradores que
dão tarefas podem conseguir os resultados que esperam. Mas nunca vão
saber o que mais poderiam ter conseguido.” (ZOHAR, 1998, p. 106-112).

 Potencial, não real

Resultados trimestrais e avaliações de desempenho fazem parte do mun-


do mensurável, aquele que cabe nos gráficos cartesianos e que pode
ser analisado, controlado, verificado. Não há como fugir disso. Mas não
é preciso exagerar. Na Física quântica, todas as asserções dizem respeito
a probabilidades. Uma organização quântica seria brincalhona. Ela teria
estruturas que encorajassem o valor de aceitar riscos.

 Universo participativo

Na ciência clássica, um experimento se divide entre o sujeito e o obje-


to, o observador e o fenômeno. Já na Física quântica, um dos seus pa-
radigmas está na visão da impossibilidade de se estudar um fenômeno
por si só, como se o observador não existisse. A observação modifica a
realidade.

Segundo Danah (ZOHAR, 1998), uma empresa quântica seria “profunda-


mente ecológica”. Teria consciência da Terra como um sistema integral,
com o homem inserido nela. Ela seria participativa nos ambientes social,
cultural e natural.

 O vácuo

A Teoria do Campo Quântico nos diz que todas as coisas no universo são
excitações do vácuo quântico”, afirma Danah. Uma organização quântica
seria centrada em sua visão e dirigida por seus valores. A partir deles se-
riam organizados os padrões de energia que representam os produtos, as
relações, serviços etc.

65
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Como aplicar esses novos paradigmas?


Danah Zohar (1998) fornece uma receita simples: diálogo, considerando:

Descobrir, no lugar de saber Investigar com o outro e não buscar a sua certeza.
Perguntas, não respostas Explorar novas possibilidades.
Partilhar, não ganhar Trabalhar com propostas e não com um ponto de vista melhor.
Igual, não superior Considerar todas as posições para aprender com todos.
Reverência, não poder Não existe imposição de ideias e sim a gratidão pela riqueza de
cada experiência.
Escutar Dialogar é explorar novas possibilidades.

O líder quântico é alguém sábio para manter-se no limite, saber quando usar
a Teoria Clássica e quando usar os novos paradigmas, segundo Zohar (1998).

Dois estilos de gestão


O ideal é oscilar entre eles

Rewiring the Corporate Brain, de Danah Zohar


Newtoniano Quântico

Certeza Incerteza
Previsibilidade Mudanças rápidas
Hierarquia Redes não-hierárquicas
Divisão de trabalho e fragmentação de funções Esforço integrado (holístico)
O poder vem do centro ou do topo O poder vem de vários centros
Empregados passivos Empregados sócios
Uma maneira correta Vários pontos de vista
Competição Cooperação
Controle burocrático Estruturas flexíveis
Eficiência Relacionamento
Operação de cima para baixo (reativa) Operação de baixo para cima (experimental)

Com essa concepção de gestão, e partindo dela e da democratização das


relações, a escola deve procurar o favorecimento de caminhos para uma edu-
cação para a cidadania global, que significa formar seres capazes de conviver,
comunicar e dialogar num mundo interativo e interdependente, utilizando os
instrumentos da cultura.

Apresentado um panorama geral e sucinto, estabelecendo um paralelo entre


os modos de produção, com um breve histórico, e a escola percebemos de forma
gritante o descompasso. Os avanços nas ciências, exemplo de fácil constatação e

66
Modos de produção e a escola: descompassos e desafios

compreensão, como apenas um deles, mas altamente significativo, a Física quânti-


ca, e na comunicação e na informatização, com as novas tecnologias revoluciona-
ram e continuam revolucionando o mundo, em todos os aspectos da sociedade.

Da mesma forma, os desafios acentuam-se, enquanto educadores e gesto-


res sabemos e acompanhamos as mudanças, e mais ainda, estamos a ouvir “os
gritos” dos alunos, por suas manifestações, bem como dos professores, ambos,
em muitas das escolas sofredores, aprisionados em um paradigma ultrapassado,
portanto, não trazendo indicativos de novas possibilidades para ambos.

A mudança, por mais que propalada, e com pistas, difícil ainda se faz e diver-
sos são os motivos: históricos, culturais, econômicos, políticos e sociais. Entre-
tanto, antes de derramarmos aqui as nossas lágrimas de lamentação, vamos à
busca do que fazer e de imediato.

Reconhecemos um novo paradigma, uma nova concepção de gestão, eviden-


te, como pano de fundo, a convicção e escolha de uma concepção de homem,
sociedade e educação para uma nova educação e uma nova escola, as quais si-
nalizamos. Sim, e agora, o que fazer?

Agora, e não com o intuito de potencializar e querer incumbir toda a proble-


mática e a resolução desta na figura do professor e muito menos de ditar receitas
a ele, porém como gestores comprometidos com educação de qualidade, pos-
sibilitadora de formação para a cidadania, apresentamos, a seguir, algumas das
características de um professor condizente, ou seja, que minimize o descompas-
so e maximize o desafio entre os modos de produção e a escola.

Quem é este professor?


É um educador que direciona e conduz o processo com os alunos, lidera, ar-
ticulando e mediando o conhecimento de mundo pelo diálogo, ou seja, estabe-
lece uma relação dialógica. Faz uso da autoridade que lhe é própria pela compe-
tência, portanto, numa relação horizontal.

Dessa forma, professor e aluno crescem juntos e ambos são sujeitos do


processo. Questiona a cultura dominante, provocando análise do contexto e,
ainda, procura produzir/construir cultura. A educação, portanto, não se restringe
à escola, transpõe seus muros, parte para a conscientização e politização, ocor-
rendo o abandono de uma consciência ingênua. Só assim, podemos afirmar que
este professor realmente é um educador, pois trabalha com educação proble-
matizadora, portanto transformadora.

67
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Trabalhamos, acreditamos e procuramos fazer acontecer, porque, sempre...


crescer é evoluir, explorar diferentes possibilidades. Aprender os benefícios da
vida em sociedade ao mesmo tempo em que nos voltamos para nós mesmos:
nossos sonhos, talentos e interesses.

A escola deve oferecer aos seus alunos uma visão ampla do mundo que os
cerca, indo muito além das salas de aula. Por meio de visitas, pes­quisas, experiên-
cias e práticas, instiga-se os alunos a vivenciarem o mundo e a vencerem seus pró-
prios medos. Mais do que passar no vestibular, o objetivo é prepará-los para a vida,
oferecendo a base para que cheguem até onde seus sonhos possam alcançar.

A escola deve permitir o desenvolvimento individualizado de cada aluno, pro-


curando colaborar com o desenvolvimento pleno de todas as suas capacidades.
Só assim é possível oportunizar a formação de cidadãos na verdadeira acepção
da palavra: gente que pensa, que age, sonha e, mais importante, realiza.

Texto complementar

Os fins são os mesmos, já os meios...


A ineficiência dos modelos tradicionais de ensino no Brasil impulsiona o
mercado educacional, que ultrapassa universidades e escolas no
desenvolvimento de metodologias
(RODRIGUES, 2008)
[...]
Segundo a mestra em educação brasileira Gisela Wajskop, que tem em seu
currículo a coordenação de Educação Infantil do MEC no período de 1998 a
2000, as mudanças nas redes de ensino geralmente sofrem mais resistência por
parte dos professores, e nunca devem ser feitas de uma só vez. “Os docentes e
coordenadores precisam introduzi-las gradativamente, para que possam avaliar
o impacto no funcionamento escolar e nas aprendizagens infantis. E na aprova-
ção dos pais, é claro”. Resumidamente, os passos tomados são os seguintes:

 estudar as novas metodologias;

 envolver toda a equipe nas avaliações que indicam necessidades de


mudanças;

68
Modos de produção e a escola: descompassos e desafios

 incorporar gradativamente as mudanças, acompanhadas de avaliações


de impacto no funcionamento escolar e na aprendizagem das crianças;

 envolver os pais nas mudanças para que se tornem parceiros da escola.

A necessidade da atualização se explica em parte pela ineficiência dos


modelos tradicionais de ensino no Brasil, que não acompanham a evolução
da sociedade. Cursos de pedagogia falam em transformação, mas pouco
fazem. Enquanto isso, quem faz é o mercado. Ele se tornou a turbina das
inovações, ultrapassando universidades e escolas no que diz respeito à pro-
dução de materiais educacionais e desenvolvimento de técnicas de ensino.
Enxerga como oportunidade de ganhos a carência que o mercado tem por
novas tecnologias educacionais. Quem também ganha são os alunos, com
lançamentos pedagógicos diversificados e de qualidade.

[...]

Formato 360º
Também é inovador o formato em 360º da publicação. Cada volume conta
com quatro livros de histórias, um por bimestre, e garante ao professor auto-
nomia para abordar as histórias na ordem mais conveniente para a turma, de
acordo com a demanda e o ritmo do aprendizado. Os alunos ainda recebem
outra novidade: o Diário de Bordo, um livro de registro de toda a trajetória do
aluno durante o ano (dados pessoais, preferências, fatos marcantes etc.).

“Os docentes e coordenadores precisam introduzir as metodologias


gradativamente, para que possam avaliar o impacto no funcionamento
escolar e na aprendizagem.”

[...]

Para a Secretária Municipal de Educação e Esporte de Esteio, Magela


Lindner F., um dos fatores determinantes para a conquista do maior Ideb da
região metropolitana de Porto Alegre foi a sintonia entre a gestão municipal
e a proposta da Aymará.

O Programa Cidade Educadora inclui ações na comunidade, formação


continuada de professores, desenvolvimento de projetos envolvendo escola
e comunidade, integração com as ações socioambientais do município e a
utilização de uma nova proposta de inclusão digital (www.espiraleducadora.

69
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

com.br), complementadas com avaliação e acompanhamento permanentes


por uma equipe local da editora. Além disso, os alunos podem levar o livro
para casa e, assim, envolver a família no aprendizado.

E qual é a impressão dos alunos? Jean Hernandes tem dez anos de idade e
está na quarta série. Considera as perguntas dos livros bem criativas, e conta
que conheceu um pouco mais sobre Pernambuco com o Livro das Histórias e
Ideias. “Gostamos tanto, que a minha professora trouxe várias fotos e objetos
de lá”, conta Jean, cujo pai conheceu os novos livros, e o que mais gostou
foi do Diário de Bordo. “Eu posso escrever várias coisas, anotações sobre os
amigos. Na escola, o que eu mais aprendo é a me comportar. E isso é muito
importante, porque se eu bagunçar, ninguém vai gostar. Mas, se eu me com-
portar, vou agradar as pessoas”, conclui o garoto. Já seu colega Bruno Dutra,
da mesma idade, considera interessantes os personagens. “Quando lemos as
histórias, rimos muito, e isso é bom. Estamos quase terminando as histórias
do livro. Quando acabar, vai dar saudade”, diz.

EJA
A editora foi criada no final de 2005 e, no ano seguinte, realizou testes
diversos em redes de educação. Antes de entrar nas 17 escolas públicas de
Esteio, por um ano o material didático passou por planejamento, ajustes e
adequação. Hoje está presente em duas outras cidades: Salvador (BA) e Praia
Grande (SP), totalizando cerca de 80 mil alunos em pouco mais de 400 es-
colas. Todas as instituições tiveram a oportunidade de testar a metodologia
antes de adotá-la. Recentemente, o município de Santos pôde experimentar.
Como gostou, está estudando a possibilidade de utilizar o programa em toda
a rede municipal. Para 2009, outras sete cidades devem adotar o sistema. A
previsão é chegar aos 100 000 alunos.

[...]

Ensino em três dimensões


Melhorias no ensino também podem ser obtidas por meio da utiliza-
ção de ferramentas tecnológicas interativas. Um instrumento que tem feito
a cabeça de muitos professores e alunos é o P3D, programa desenvolvido
pela empresa que leva o mesmo nome. O software roda em computadores
comuns e é projetado em telão touch screen, onde o professor de Biologia,

70
Modos de produção e a escola: descompassos e desafios

por exemplo, pode mostrar o esqueleto humano em três dimensões, girando


a figura na tela, escrever observações sobre as figuras e destacar os pontos
importantes da imagem. O melhor de tudo: os alunos passaram a interagir
com a aula. “Eles participam muito mais. Outro dia pedi que montassem o
Sistema Solar, como se fosse um jogo” conta Jair Messias Ferreira Júnior, pro-
fessor de História e Geografia da Escola Estadual Armando Gaban, de Osasco,
Grande São Paulo, que utiliza a tecnologia desde 2006.

Ela foi desenvolvida aqui no Brasil, na Universidade de São Paulo, pelo pau-
lista Mervyn Lowe. Após um período inicial no Centro Incubador de Empre-
sas Tecnológicas da USP e um investimento relativamente baixo, o programa
foi lançado em 2004. “A maior inovação foi usar a tecnologia 3D e rodá-la em
qualquer computador que tenha no mínimo 1GB de memória e Windows
Vista”, diz Mervyn, que tem como meta construir a plataforma para o Linux, o
que beneficiará as escolas públicas. O conteúdo do programa, por enquanto
disponível para Biologia, Geografia, Química e para as línguas portuguesa,
espanhola, inglesa, alemã, italiana e turca, é atualizado a cada quatro meses
por professores da USP. Eles já estão trabalhando no conteúdo de Física e
pretendem desenvolver o de Matemática em seguida.

“Para explicar o olho humano, por exemplo, podemos mostrá-lo por fora e
fazer um corte para ver as estruturas internas”, explica Juana Ordonez, professora
de Ciências do Colégio Miguel de Cervantes, de São Paulo. O professor Ferreira
também aprova a novidade. “É o começo do futuro da educação, e eu espero
que chegue em breve a todas as escolas públicas do Brasil”, conclui. Hoje, são
mais de 200 escolas no Brasil utilizando o sistema, sendo 15 públicas.

Outros exemplos
[...]

Em Guaratinguetá, no Vale do Paraíba, em São Paulo, para mudar esse


quadro, a prefeitura quis que a Matemática, considerada um bicho-papão
entre os estudantes, passasse a ser ensinada de um jeito diferente. Para isso,
implantou um projeto do método A+, para que os estudantes aprendam a
disciplina de forma lúdica e prazerosa.

Mas não é apenas o método A+ que vem revolucionando a educação em


Guaratinguetá. Em todas as 52 escolas da rede municipal foi implantado o
“Programa de Inclusão Digital – O futuro agora”. Alunos e professores têm à

71
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

disposição tecnologias de última geração: computadores, impressoras, scan-


ners e câmeras digitais. Os professores contam ainda com profissionais para
orientá-los a obter o máximo dos equipamentos, utilizando modernos sof-
twares educacionais com temas que complementam os conteúdos do currí-
culo escolar, tornando as aulas mais atraentes e dinâmicas.

Método cubano
Ainda falando sobre a alfabetização de jovens e adultos, o que você pensa
sobre a adoção de metodologias desenvolvidas em outros países? A discus-
são é controversa, pois muitos são contra a utilização de qualquer projeto
ou sistema estrangeiro. Entretanto, não podemos esquecer de um exemplo
de sucesso: o método cubano de alfabetização Yo, si puedo, implantado no
Brasil no início de 2006 e aplicado com êxito em dezenas de países após ter
erradicado o analfabetismo na ilha caribenha. Quem defende sua utilização
argumenta que se trata de um método acessível economicamente, didatica-
mente flexível, efetivo, simples e com resultados positivos em curto prazo.

Uma das principais características do Yo, si puedo, segundo Carlos Mar-


tinez, professor cubano responsável por acompanhar sua implantação no
Piauí, é partir do que é conhecido pelos estudantes, que são os números,
para entrar no que é desconhecido, que são as letras. “Isso faz com que eles
não esqueçam as letras”. Essa corresponde à segunda etapa do método, após
as dez primeiras aulas dedicadas a familiarização, desenvolvimento da ex-
pressão oral e habilidades psicomotoras e garantia da representação gráfica
dos números de zero a 30. Nas aulas seguintes aprende-se uma letra, que
corresponde a um número, até se alcançar a apresentação de uma palavra
ou ideia e produção de novas palavras e ideias.

Dica de estudo
MORIN, Edgar. DVD Coleção Grandes Educadores. São Paulo: Paulus, 2006.

Edgar Morin destaca-se, na atualidade, como um dos maiores intelectuais


e como crítico da fragmentação do conhecimento. Propõe o desenvolvimento
do pensamento complexo, uma reforma do pensamento por meio do ensino
transdisciplinar, capaz de formar cidadãos planetários, solidários e éticos, apto
a enfrentar os desafios atuais. Este vídeo apresenta os principais conceitos pre-

72
Modos de produção e a escola: descompassos e desafios

sentes no pensamento de Morin, especialmente: Reorganizações genéticas;


Pensamento complexo; Operadores da complexidade; Totalidade: razão, racio-
nalidade, racionalismo e racionalização; A reforma do pensamento; Transdisci-
plinaridade; Os 7 saberes à educação do futuro e A escola.

Atividades
1. Faça um breve registro sobre os marcos históricos que dividem a história da
humanidade a partir do modo de produção e dos ciclos econômicos.

2. Para compreender as transformações do processo produtivo a autora recorre


ao estudo desenvolvido por Alvin Toffler e Débora Dias Gomes, os autores
analisam e estabelecem marcos divisórios da história da humanidade, me-
diante o modo produtivo, situando períodos e suas implicações na adminis-
tração. De acordo com esse estudo explique em que momento as escolas se
situam e qual se torna o grande desafio da modernidade nas escolas.

73
Administração escolar
e transformação social

Para o trabalho com este tema vamos recorrer, em especial, aos estu-
dos desenvolvidos por Vitor Henrique Paro e Danilo Gandin em suas obras
– Administração Escolar: introdução crítica e Escola e Transformação Social,
respectivamente, com o propósito de aprofundar a compreensão da Ad-
ministração Escolar comprometida com a transformação social. Lembran-
do, “a administração se constitui num instrumento que, como tal, pode
articular-se tanto com a conservação do status quo quanto com a trans-
formação social, dependendo dos objetivos aos quais ela é posta a servir”
(PARO, 1993, p.123).

Trazemos outro autor que também acredita nessa concepção, “A escola é


simultaneamente reprodução das estruturas existentes, correio de transmis-
são da ideologia oficial, domesticação, mas também é ameaça à ordem esta-
belecida e possibilidade de libertação” (SNYDERS, 1976, p. 106).

Paro, ao considerar que a administração se constitui num instrumento,


vê a importância em se recuperar o caráter instrumental de toda a ad-
ministração, a fim de viabilizar a análise da atividade administrativa da
escola, forma esta de se possibilitar uma administração escolar voltada
para a transformação social.

Com esse entendimento, o autor procura analisar as condições possibi-


litadoras, assim como estabelece alguns pressupostos para que a prática
administrativa que se espera realmente ocorra.

Elege para a análise os pressupostos básicos a seguir:

 o caráter conservador da administração escolar vigente;

 a natureza do processo de produção pedagógica na escola;

 administração escolar para a transformação social.

Selecionamos alguns desses e, de uma forma bastante simplificada,


apresentamos para o entendimento do contexto geral e conceitual esco-
lhido para a disciplina ora estudada.
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Ao iniciarmos o estudo sobre a natureza do trabalho pedagógico vamos pri-


meiramente ao conceito de trabalho humano no geral.

Paro recorre a Marx, e este considera o trabalho como “uma atividade ade-
quada a um fim”. Essa conceituação nos leva ao entendimento de que essa ativi-
dade é essencialmente humana, pois somente o homem é capaz de estabelecer
objetivos, embasados em valores, e planejar ações que o levem ao alcance e à
realização do que se espera com o trabalho.

O trabalho, portanto, identifica e diferencia o homem dos demais seres da


natureza e, também por meio dele, o homem imprime sua história.

Segundo Paro, o homem de hoje é extremamente diferenciado do homem


de cem anos atrás, pois o conceito de homem não está atrelado apenas à sua
natureza mas também ao que ele produz, introduzindo sempre modificações
em seu meio. Vemos um ser histórico e isto se faz pelo trabalho, o que lhe dá
uma característica social.

Basta ­relacioná-los ao estudo de agora e a contextualização nos auxiliará a


fazer uma síntese sobre o papel histórico do homem relacionado à sua produ-
ção, pelo trabalho.

Especificamente, então, em relação à natureza do processo de produção pe-


dagógica na escola, numa perspectiva de uma administração escolar compro-
metida com a transformação social, a preocupação primeira deve estar na cla-
reza de como a escola pode contribuir para que essa transformação realmente
ocorra. Recorremos a Paro (1993, p. 136) quando afirma: “estamos convencidos
de que a maneira de a escola contribuir para a transformação social é o alcance
de seus fins especificamente educacionais, sendo que precisamos dotá-la da ra-
cionalidade interna necessária à efetiva realização desses fins.”

Para isso, é premente à administração escolar aprender a buscar na própria na-


tureza da escola e dos objetivos que ela procura alcançar, os princípios, os métodos
e as técnicas adequados para possibilitar a racio­na­lidade no interior da escola.

Façamos um breve retrospecto para um necessário paralelo entre empresa e


escola e o desenvolvimento histórico da atividade administrativa no interior da
empresa, objetivando esclarecer as diferenças significativas das duas organiza-
ções no tocante ao atingimento de seus objetivos.

A empresa capitalista atinge com eficiência seu objetivo principal de levar a


cabo a mais-valia, devido ao crescimento de sua racionalidade interna, uma vez
que ocorreu o desenvolvimento de métodos, técnicas e princípios a partir da

76
Administração escolar e transformação social

­ rópria empresa, de sua especificidade voltada à consecução de seus objetivos.


p
Entretanto, a irracionalidade social se faz presente, pois, assim, atende apenas
aos interesses de uma pequena parcela da sociedade.

A escola promove irracionalidade no seu processo interno, bem como no plano


social frente à sua ineficiência no atingimento dos objetivos educacionais, tendo em
vista o papel que vem desempenhando na sociedade de apenas manter, na aparên-
cia, sua função específica de distribuir a todos o saber historicamente acumulado.

Esta ocorrência deve-se à simples reprodução das teorias administrativas em-


presariais para a administração escolar. Contudo, pode-se reverter a situação,
aproveitando os indicativos positivos.

É notória a evidência de que a atividade administrativa constitui-se em pro-


cesso permanente de aperfeiçoamento e ferramenta para o atingimento da ra-
cionalidade e que, portanto, deve acontecer o desenvolvimento de princípios,
métodos e técnicas relacionados com a natureza e os objetivos educacionais.

Assim, a administração escolar que tenha por objetivo promover a raciona-


lização das atividades no interior da escola deve iniciar por examinar a própria
especificidade do processo de trabalho, de acordo com Paro.

Ao estudo da natureza do processo de produção escolar é necessário primei-


ramente estabelecer a posição da escola no contexto social; e ao seu aprofunda-
mento, Saviani faz uso da colocação de Marx “produto não é separável do ato de
produção”, concluindo que o modo de produção capitalista, devido à natureza
própria do fenômeno educativo, não pode ser aplicado plenamente na escola.

Paro leva em consideração os assuntos: o papel do educando no processo de


produção pedagógico; o conceito de “produto” da educação escolar e a nature-
za do saber envolvido no processo educativo escolar, no intuito de fortalecer a
posição de Saviani.

O papel do educando no processo


de produção pedagógico
A análise do papel do educando, no processo educativo escolar, é que ele não
pode ser visto apenas como consumidor ou como cliente, assim colocado por diver-
sas escolas, que têm seu trabalho pautado no desenvolvimento da escola/empresa.

77
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Muito mais que a simples presença, a participação do educando em todas as


atividades desenvolvidas pela escola é que vai dar significado ao processo peda-
gógico. A atividade educativa não se realiza sem a participação do educando. Na
medida em que o aluno se insere no processo educativo, ele é ao mesmo tempo
objeto e sujeito da educação.

Visto o aluno como “objeto de trabalho” do processo produtivo escolar, pois


ao se posicionar como objeto da educação, deixa de ser o aluno um simples
consumidor, uma vez que ele se constitui na própria “matéria-prima” a receber o
trabalho humano com fim educacional.

Também, ao participar do processo produtivo como objeto de trabalho, o


aluno está assumindo o papel de produtor e ao compartilhar com seus colegas
o processo pedagógico assume o papel de coprodutor.

Fica em evidência o papel do aluno de produtor, de partícipe de sua própria


educação, de sua participação efetiva na ação educativa enquanto objeto e en-
quanto sujeito da educação.

O conceito de produto da educação escolar


No que verdadeiramente se constitui o produto do processo pedagógico
escolar?

Considerando a participação ativa do aluno no processo ensino-aprendi-


zagem como elemento relevante para ocorrer a aprendizagem, ele é inserido
como sujeito do processo porque a educação supõe uma modificação na natu-
reza do seu objeto. A diferença é constatada entre a entrada e a saída do aluno
no processo, se realmente a educação se efetivou.

E, é essa diferença, “que não é simples acréscimo, já que supõe uma real trans-
formação na personalidade viva do educando, é que se constitui no efetivo pro-
duto do processo pedagógico escolar.”(PARO, 1997, p.144).

Natureza do saber envolvido


no processo educativo escolar
Vimos que a apropriação do saber historicamente acumulado acontece na
escola, a partir de uma relação em que o aluno se encontra enquanto objeto e
enquanto sujeito da educação.
78
Administração escolar e transformação social

Enquanto sujeito, o aluno participa ativamente do processo, constituindo-se


em coautor da atividade pedagógica. Enquanto objeto, o aluno entra como
“consumidor”, mas ao mesmo tempo também como objeto de trabalho, pois
sofre transformações no processo. E o resultado, ou seja, o “produto”, está além
do ato de produção, uma vez que “o consumo” – a aprendizagem – não se atrela
somente à atividade produtiva, se estende.
A presença do aluno enquanto objeto e sujeito da educação supõe necessariamente a existência
do saber, que é o que dá substância e conteúdo à própria relação educador-educando. Este saber,
enquanto matéria-prima do processo, não pode ser alienado do ato de produção, o que exige
que o próprio educador, enquanto trabalhador, não seja expropriado do saber que ele precisa
deter para “passar” ao educando no processo de produção pedagógico. (PARO, 1993, p. 148).

Administração escolar para a transformação social


No estudo de Paro pudemos perceber o estabelecimento de paralelos de
análise da administração e da escola, assim como seus intervenientes sociais e
econômicos. Com base, ainda, no levantamento e exame do caráter específico
do processo pedagógico escolar e na constatação da natureza conservadora da
teoria e prática escolar, estabelece pressupostos básicos a uma administração
escolar efetivamente comprometida com a transformação social, quais sejam:

 a questão da especificidade da administração escolar;

 a administração escolar e a racionalidade social;

 a racionalidade interna na escola;

 a administração escolar e a participação coletiva; e

 a administração escolar e a consideração das condições concretas.

Texto complementar

A escola de todos
Ajude e eduque os pais para melhorar o rendimento dos filhos
(RODRIGUES, 2008)

Escolas públicas de todo o país, principalmente as que trabalham com


alunos carentes, enfrentam uma dificuldade em comum: reverter os quadros

79
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

de baixo aproveitamento do corpo discente. Com uma abordagem obsoleta


da situação, boa parte das instituições se limita a apenas transmitir o conhe-
cimento, ou então realiza ações paliativas, sem encontrar novas formas de
mudar em definitivo o cenário. Mal sabem esses gestores que a solução para
inúmeros problemas, incluindo os sociais, se encontra além das portas da
escola. Falamos das famílias dos alunos.

Uma ação bem feita, envolvendo os pais e a escola, pode trazer resultados
acima do previsto, com benefícios para todas as partes. Constatou-se, em
países mais desenvolvidos, que a aproximação dos pais ao ambiente escolar
resulta em sensível aumento no rendimento dos alunos e na qualidade de
vida da comunidade. Um exemplo vem de escolas públicas dos EUA, que
resolveram mudar de estratégia e conquistaram resultados surpreendentes.

[...]

Mesmo cientes de que se trata de outra realidade, tomemos o exemplo


de famílias norte-americanas que residem nos bairros mais ricos. Elas não
apenas entendem sobre o funcionamento do sistema, mas se envolvem em
ações da comunidade e na educação dos filhos.

Nos EUA, muitos pais participam de atividades escolares e conferências


com professores, ou então são voluntários em sala de aula e inspetores de
viagens. Buscando oferecer o ideal para seus filhos em termos de educação,
criam coalizões em prol de reformas e solicitam mudanças sempre que ne-
cessário. Entretanto, quando se trata de famílias carentes, não é tarefa fácil
atraí-las para o ambiente escolar. Afinal, poucos são os pais, vivendo próxi-
mos da linha da miséria, que acreditam ser capazes de fazer alguma diferen-
ça no que diz respeito à qualidade da educação de seus filhos.

[...]

Ações que aproximam a família da escola também existem no Brasil, e


os números, ainda tímidos, confirmam que a iniciativa tende a ser positiva
para os alunos. Recentemente, dados divulgados pelo Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), obtidos pelos sistemas nacionais de
avaliação, mostraram que os 37 municípios com melhor desempenho esco-
lar incluíram em sua política educacional a participação das famílias.
[...]

80
Administração escolar e transformação social

Papel social
Em comunidades muito carentes, são raras as situações de lazer e de par-
ticipação em práticas sociais. Então, quando as escolas as promovem, são
bem-vindas. “Não se deve esquecer também que cabe às escolas estimular
os pais para que frequentem com assiduidade as reuniões das Associações
de Pais e Mestres”, completa a professora da UNB.

[...]

Seguindo essa política de portas abertas, a Secretaria Municipal de Edu-


cação de Curitiba recomenda que as escolas aconselhem os pais a acompa-
nharem os filhos nos primeiros dias de aula. Desta maneira, eles se informam
sobre as normas da escola e passam a receber orientações sobre a evolução
do aprendizado. [...]

A participação da família nos estudos também traz frutos para dentro de


casa. Para que a criança tenha o hábito de manter em ordem seus materiais
escolares, deve estar acostumada a ser organizada com seus brinquedos,
roupas e quarto. Tal objetivo se atinge novamente quando existe vigilância
sobre cadernos e agenda escolar. Ainda no lar, os pais conseguem exercitar a
disciplina se forem rígidos com os horários, principalmente os de refeição e
de ir para a cama. Gestores cuidadosos identificam problemas semelhantes a
esses e oferecem conselhos úteis aos pais mais carentes ou àqueles que não
tiveram acesso a esse tipo de educação secular. [...]

São Paulo
O mesmo conceito de parceria existe no Estado de São Paulo, mas com
nome diferente: é o Programa Escola da Família, uma iniciativa que une
quase 50 mil voluntários, entre profissionais da educação e estudantes uni-
versitários. Foi criado em 2003, para despertar potencialidades e estimular
uma cultura de paz e hábitos saudáveis junto aos familiares dos mais de
sete milhões de jovens de baixa renda que vivem no Estado. Aos finais de
semana, 2.334 escolas da rede pública de ensino transformam-se em cen-
tros de convivência, com atividades voltadas às áreas esportiva, cultural, de
saúde e de trabalho. São crianças, jovens, pais e mães que buscam diversão,
lazer e conhecimento com as oficinas e cursos de qualificação. [...]

81
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Participação da família no processo educativo


Cartilhas informativas, lançadas na segunda semana de maio junto com
o plano de mobilização de igrejas cristãs pela educação, estão sendo distri-
buídas a famílias de todo o país, explicando aos pais como ajudar os filhos
no processo educativo. Ilustrada pelo cartunista Ziraldo, a publicação tem
linguagem simples e direta, e convoca as famílias a se envolver na educação
das crianças, acompanhando a frequência e o desempenho na escola, par-
ticipando de conselhos escolares, verificando se a escola é bem organizada,
entre outras ações. A iniciativa, cujo foco são as famílias e as lideranças co-
munitárias, tem a participação de entidades como o Conselho Latino Ame-
ricano de Igrejas (Clai), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e
o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic). Foram relacionadas
ações e atividades a ser implementadas por lideranças e membros das igrejas,
para debater a importância do acompanhamento da educação das crianças,
como campanhas de conscientização, reuniões, cultos, missas, entre outros.

[...]

Programas nacionais
O governo federal oferece uma série de programas sociais para ajudar as
famílias carentes. Confira alguns:

 PETI – O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil tem por objeti-


vo afastar os menores de trabalhos considerados perigosos, penosos,
insalubres ou degradantes. [...]

 BOLSA FAMÍLIA – Criado em 2003, o Bolsa Família é um programa de


transferência de renda executado pelo Ministério do Desenvolvimen-
to Social e Combate à Fome. [...]

 PROJOVEM – O Programa Nacional de Inclusão de Jovens permite que


jovens em posição de vulnerabilidade social recebam qualificação
profissional e tenham acesso à educação, à cidadania, ao esporte e à
cultura. A iniciativa dá aos jovens a oportunidade de estudar e se qua-
lificar para, no futuro, concorrer a uma vaga de trabalho digno.

82
Administração escolar e transformação social

Dica de estudo
O Filme Coach Carter – treino para a vida, Paramount Collection. Esse filme é
baseado em uma história real, inspirado na atuação do treinador de basquete de
uma escola de baixa qualidade, inserida em uma comunidade carente. A expecta-
tiva da comunidade escolar está focada unicamente nos jogos e campeonatos de
basquete do time campeão estadual, desqualifica e ignora o baixo rendimento
escolar e mais ainda a formação dos seus alunos e o futuro desses na sociedade.
O treinador posiciona-se como educador e interfere na sistemática e no cotidia-
no da escola, sendo visto como opositor ao sistema, todos queriam e apenas se
preocupavam com os campeonatos. Ele enfrentou a todos, inclusive foi expulso
por sua rejeição em participar com o time de campeonato, pelo baixo rendimen-
to acadêmico dos alunos. O importante é que pelo seu credo em transformar a
realidade daquela juventude ele consegue mudanças significativas na escola, no
desempenho dos alunos e principalmente na vida das pessoas.

Atividades
1. Como é considerada a administração por Vitor Henrique Paro e quais são as
condições possibilitadoras para uma efetiva escola voltada para a transfor-
mação social?

83
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

2. Como deve ser visto o papel do educando no processo de produção peda-


gógico, tendo em vista uma educação para transformação social?

84
Administração escolar e transformação social

3. Analise a afirmativa transcrita do texto: “que não é simples acréscimo, já que


supõe uma real transformação na personalidade viva do educando, é que se
constitui no efetivo produto do processo pedagógico escolar.” (PARO, 1997,
p.144). Segundo o autor em que verdadeiramente se constitui o produto do
processo pedagógico escolar?

85
Na contramão de uma gestão
educacional de qualidade:
a gestão da qualidade total na escola
Referencial teórico
A Gerência da Qualidade Total (GQT), ou Controle de Qualidade Total
(CQT), seria a versão brasileira da Total Quality Control (TQC), assim deno-
minada a Filosofia da Qualidade Total, implantada nas empresas japonesas,
pelo físico norte-americano W. Edwards Deming, após a Segunda Guerra
Mundial. Os resultados conseguidos no Japão surpreenderam o mundo.

É uma filosofia que procura a excelência por meio da sensibilização e


da capacitação de recursos humanos da empresa. O próprio termo quali-
dade total, de acordo com A. Feigenbaum, quer dizer a mobilização total
dos recursos humanos para a qualidade.

A filosofia da qualidade total tem por base as teorias da administração


científica de Taylor, os conceitos de comportamento humano de Maslow,
o controle estatístico de Shewhart e as teorias de administração da quali-
dade de Deming e Juran. Denota, portanto, a vinculação aos conceitos de
eficácia, eficiência e produtividade.

Os japoneses não utilizaram essas teorias para o seu sistema educa-


cional, ainda que se considerando o ângulo da eficácia e da eficiência. É
importante destacar que o sistema educacional do Japão é considerado
um dos melhores do mundo, nas avaliações comparativas.

A qualidade total é um processo que exige:

 permanente atenção;

 crença na excelência cotidianamente;

 adesão espontânea de cada indivíduo envolvido;

 enaltecimento do pragmático.

Atualmente, já não se fala em controle de qualidade, mas em cultura da


qualidade, segundo Drügg.
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Implantação e influências na escola brasileira


Reproduzimos, a seguir, parte de entrevista contida na Revista Dois Pontos
M. 15/93, com Evando José Neiva, um dos fundadores do grupo Pitágoras, com
sede em Belo Horizonte que, além de implantar o programa de qualidade total
em suas escolas, promoveu diversos cursos, no intuito de divulgar e expandir a
qualidade total.

D.P. – No contexto mundial, o que representa a experiência do Pitágoras?

Evando – A qualidade total em educação é uma ação pioneira em nível mun-


dial. As escolas do Japão não adotam a qualidade total. Uma ou outra escola
americana começa a tomar iniciativa nessa área. E assim também é na Europa,
em que as propostas estão em estado nascente. Em todo o mundo, executivos
se interessam em saber como nossa experiência se desenvolve, em que pé ela
se encontra, que tipo de estratégia utilizamos – é uma grande novidade. E a tal
ponto vai o interesse, que a própria direção do Instituto Juran, após ouvir-nos re-
latar o que ­temos feito, manifestou-se no sentido de firmar conosco um convênio
de cooperação, um intercâmbio das experiências do Pitágoras e do instituto.

D.P. – Podemos, então, dizer que ainda não existe, no mundo, um trabalho de
qualidade total em educação, expressivo, sedimentado?

Evando – Realmente, podemos afirmar que estamos inovando. No Japão, a


qualidade total jamais chegou às escolas: praticamente restringiu-se às indús-
trias, área em que não apresentou resultados notáveis. Quanto aos Estados
Unidos, sabe-se que, a partir deste ano, algumas escolas e universidades impor-
tantes estão começando um trabalho para o qual contam com a cooperação de
indústrias que já adotam a qualidade total.

D.P. – Que relação o senhor faz entre qualidade na educação e educação para
a qualidade?

Evando – Os grandes mestres da qualidade total reconhecem que a educação


é o carro-chefe de um programa de qualidade. “A qualidade total começa com
a educação e termina com a educação”, afirma Ishikawa. Quer dizer: o processo
educacional é decisivo e fundamental para o processo de qualidade de qualquer
instituição. Se uma escola tem um programa de qualidade dentro de seu próprio
processo educacional, ela pode oferecer às empresas pessoas mais bem prepa-
radas e, consequentemente, potencializar programas de qualidade dentro das

88
Na contramão de uma gestão educacional de qualidade: a gestão da qualidade total na escola

­ róprias empresas em que essas pessoas vão atuar. Se o país quer evoluir, suas
p
organizações têm de melhorar, oferecer produtos sempre melhores. As escolas
precisam contribuir para essa melhoria global. É assim que relaciono qualidade
na educação e educação para a qualidade. Qualidade na educação em sintonia
com a empresa.

Evidencia-se nas colocações feitas a preocupação premente em qualidade na


educação para a qualidade de produtos e de empresas. Em nenhum momento
percebe-se qualquer questionamento sobre a formação do educando: que tipo
de formação? Para que sociedade?

Apesar do conhecimento da implantação do programa da qualidade total


somente em empresas nos outros países e dos princípios norteadores, como os
da Teoria da Administração Científica, o tema da qualidade total invadiu alguns
setores do discurso pedagógico no brasileiro.

No Brasil, a Fundação Christiano Ottoni, da Escola de Engenharia da Univer-


sidade Federal de Minas Gerais, tornou-se o centro orientador e divulgador da
Teoria da Qualidade Total na década de 1980. A partir de 1990, o movimento
ganhou destaque por iniciativa do governo federal e de empresários. Empresas
governamentais, como a Petrobras e a Telebrás, adotam o programa de quali-
dade e o MEC, com a “política de competitividade”, expressa em três programas:
Programa de Apoio à Capacitação Tecnológica (PACT), Programa Brasileiro de
Qualidade e Produtividade (PBQP) e o Programa de Competitividade Industrial
(PCI) introduz o Programa de Qualidade em seus serviços e um bom número de
universidades federais e escolas técnicas federais.

Atribui-se à Secretaria de Educação de Minas Gerais, quando então respondia


por essa pasta o Prof. Walfrido Silvino dos Mares Ghia Neto, oriundo da iniciativa
privada, a introdução na área da educação do Programa de Qualidade Total.

Participou significativamente na defesa e divulgação do programa a Professo-


ra Cosete Ramos, que coordenou o Núcleo Especial de Qualidade Total do MEC,
proferindo palestras, organizando e coordenando seminários para empresários,
professores e estudantes. Ela publicou dois livros, intitulados: Excelência na Edu-
cação: a Escola de Qualidade Total e Pedagogia da Qualidade Total.

Ao término daquela administração, estadual e federal, a transposição para a


educação perdeu espaço, ainda que a Fundação Christiano Ottoni tenha tenta-
do sistematizar os princípios da qualidade total para a área educacional.

89
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Gestão da Qualidade Total na escola


Para implantar a qualidade total na escola, é necessário engajar todos os ele-
mentos envolvidos no processo educacional à Gestão da Qualidade Total (GQT) e
aplicar as diretrizes estabelecidas por Deming, os 14 pontos, são descritos a seguir:

 Filosofia de qualidade – consiste no atendimento das necessidades, dos


interesses e das expectativas do cliente. A comunidade escolar deve ser sen-
sibilizada e preparada para um trabalho compromissado com a qualidade.

 Constância de propósitos – após estabelecidos os propósitos futuros, os


procedimentos e os recursos, a escola tem sempre muito presente os seus
objetivos para manutenção de seus propósitos.

 Avaliação no processo – a avaliação é realizada durante o processo, acom-


panhando e avaliando a aprendizagem, para evitar dificuldades futuras.

 Não usar somente o preço como referencial nos negócios – a escola deve
ter critérios estabelecidos para suas compras, vinculando-as à sua qualidade e
às necessidades e interesses dos alunos e não buscar apenas o mais barato.

 Aperfeiçoamento constante – os dirigentes devem sempre estar atentos


em avaliar se o trabalho que está sendo realizado é de qualidade e se está
atendendo às necessidades, às expectativas e aos interesses da comuni-
dade escolar.

 Implantação do treinamento em serviço – a escola de qualidade deve


contar com um sistema de treinamento a todos que dela participam, pois
assim, com a capacitação, os dirigentes serão mais eficazes e mais eficien-
tes até mesmo na escolha de procedimentos mais adequados à qualidade.
Da mesma forma, os professores e os funcionários, por meio de treina-
mentos, são mais engajados na filosofia da qualidade, promovendo a qua-
lidade dos serviços que prestam.

 Instituição da liderança – os dirigentes devem liderar de forma democrá-


tica e usar métodos administrativos que possibilitem a participação dos
comandados.

 Afastar o medo – “O medo tem um custo elevadíssimo. O medo está em


toda parte, tirando das pessoas seu orgulho, ferindo-as, tirando-lhes a
oportunidade de construir para a empresa”. Deming faz essa afirmação,
evidenciando que a escola que adotar a filosofia da qualidade deve extin-
guir da instituição qualquer situação geradora do medo.
90
Na contramão de uma gestão educacional de qualidade: a gestão da qualidade total na escola

 Eliminar barreiras entre setores – a administração na escola de qualida-


de é descentralizada, podendo assim o diretor acompanhar as atividades
desenvolvidas e os professores interagirem entre si.

 Eliminar slogans, dísticos exortativos e metas para os empregados –


valoriza-se o diálogo entre todos os elementos participantes do processo
educacional, na consecução dos objetivos comuns. As informações são
abertas, claras e concisas.

 Eliminar as cotas numéricas – a escola de qualidade adota o controle es-


tatístico sistemático durante o processo, elimina as cotas numéricas por-
que estão vinculadas a expectativas numéricas de desempenho.

 Retirar os obstáculos ao orgulho da execução – prioriza o trabalho em


equipe, levando em consideração o trabalho de cada integrante na conse-
cução dos objetivos da equipe.

 Instituir um programa de educação e retreinamento – a escola de qua-


lidade preocupa-se com a oferta de cursos, seminários, participação em
congressos etc. pois, para um trabalho de qualidade, é necessária a atua-
lização.

 Agir visando à concretização da transformação – a inovação, em ter-


mos de propostas educacionais, está presente numa escola de qualidade
e todos devem estar convictos do objetivo de realização para a transfor-
mação.

Na implantação da Gestão da Qualidade Total, além da aplicação das dire-


trizes estabelecidas por Deming, as 14 que acabamos de relacioná-las, a escola,
por seu diretor, como primeiro responsável, deverá se estruturar, estudar pro-
fundamente todo o processo, suas técnicas, estratégias, métodos e instrumen-
tos e segui-los à risca tendo em vista a prontidão do modelo, com sua filosofia
da qualidade total, ao ponto do não cumprimento de passos, etapas etc., estar
fadado ao insucesso.

Em paralelo a nossa colocação, citaremos Demo (2003, p. 17)


Está na moda a “qualidade total”, tomada como imperativo da organização empresarial
moderna e traduzida para outras áreas de atividade, inclusive educação. Em si, trata-se de
proposta fundamental, desde que não permaneça apenas nos procedimentos organizativos e
em táticas de aliciamento de funcionários e clientes, e respectivos treinamentos.

Levantamos a questão, estabelecendo o paralelo, para destacar também


alguns aspectos trazidos na literatura a respeito da Gestão da Qualidade Total:

91
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

 consiste numa sistemática de administração voltada para o atendimento


das necessidades, dos interesses e das expectativas dos clientes;

 diferencia-se de outros sistemas administrativos uma vez que possibilita


a capacitação para todos os envolvidos no processo, objetivando a parti-
cipação no planejamento e gerenciamento do seu próprio trabalho, com
preparação adequada, propiciando a cada um sua contribuição eficaz
com o grupo na resolução dos problemas e para que os objetivos traçados
sejam alcançados;

 prevê a necessária sensibilização de todos, pois exige mudança de hábitos,


atitudes e modo de pensar de todos os participantes para que aconteça
adesão espontânea, muito mais do que a utilização de métodos, técnicas
e instrumentos.

Retornemos a Demo (2003, p.19), a fim de destacar a sua colocação de que “Na
acepção mais básica, qualidade total denota o compromisso com a qualificação
dos recursos humanos envolvidos, tendo em vista que qualidade provém deles.”
Entretanto, ele ressalta, a partir da sua concepção de qualidade, destacando a
qualidade formal e a qualidade política, de que a escola de “qualidade total” im-
plica diretamente em um professor formal e politicamente bem formado e bem
remunerado. Acresce a isso, que a obtenção de qualidade não ocorre simples-
mente por meio de treinamentos rápidos para se dizer como fazer, pois, “em vez
de sujeitos críticos, criativos, participativos, teremos apenas lacaios lustrados”.

Isto posto, procuraremos agora conhecer o mínimo necessário ao entendi-


mento do método, técnicas e estratégias da Gestão da Qualidade Total. A Gestão
da Qualidade Total utiliza como método gerencial o Ciclo PDCA, em que:

P – Plan fase do estabelecimento de objetivos tendo em vista as necessidades, in-


(planejamento) teresses e expectativas dos clientes e os meios para atingi-los.
fase em todos são checados para averiguação do preparo pessoal à execução
D – Do
eficaz das tarefas sob sua responsabilidade, como também fase em que se
(execução) coletam os dados referentes ao objetivos estabelecidos no planejamento.
C – Check fase da comparação entre os objetivos estabelecidos e os alcançados,
(verificação) mediante os dados colhidos durante a execução.
fase em que, verificado qualquer desvio entre o objetivo estabelecido
A – Action no planejamento e o objetivo atingido, providências devem ser tomadas
para a sua eliminação. Esta ação é permanente no decorrer do processo.

A Gestão da Qualidade Total fixa as diretrizes, estas amplas, que serão seto-
rizadas de acordo com sua especificidade e aí estabelecidas as metas, a partir e
coerente às diretrizes oriundas do PDCA.

92
Na contramão de uma gestão educacional de qualidade: a gestão da qualidade total na escola

Ao adotar a Filosofia da Qualidade Total a escola deverá passar por um rigoroso


processo de revisão em todos os seus setores para verificar quais são os seus pontos
fortes, fracos e neutros. Para isto deverão ser observados os seguintes itens:

1. Sensibilização

O diretor deverá desenvolver um programa de sensibilização abrangendo


toda a comunidade escolar no sentido de dar conhecimento da filosofia
da qualidade total, mobilizando-a ao envolvimento.

2. Comissões

O diretor designará comissões para cada setor da escola. Assim, existirão:


comissão da direção, comissão de professores, comissão de funcionários,
comissão de alunos, comissão de pais. Todas as comissões irão proceder a
avaliação do seu setor, tendo por base os 14 pontos de Deming, emitindo,
ao final, um relatório.

3. Relatórios

O diretor designará uma comissão central constituída por um representan-


te de cada uma das comissões e, sob sua coordenação, analisarão todos os
relatórios e a partir destes, elaborarão um único, o qual retratará todos os
pontos fortes, fracos e neutros. Tal relatório será a peça fundamental para
a elaboração do planejamento da instituição.

4. Capacitação

O diretor constituirá uma comissão integrando representantes de todos


os setores da escola para a elaboração e implementação de um projeto de
educação para a qualidade, com a finalidade de capacitar tecnicamente as
pessoas que irão promover as mudanças.

A professora Cosete Ramos, em seu livro Pedagogia da Qualidade Total, reforça as


necessidades das constituições das comissões, bem como destaca a figura do diretor
centralizando todo o processo e prega que o planejamento da escola de qualidade
total exige a formação de diversos grupos de trabalho, comissões ou núcleos, sendo
cada um deles responsável pelo planejamento de um setor, anuais sejam:

 Comissão geral da qualidade – responsável por elaborar o programa


geral de qualidade, integrada por representantes de todos os setores da
escola. Esse programa, de no mínimo cinco anos, determina as diretrizes
que nortearão o plano de ação da escola.

93
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

 Núcleo central da qualidade – integrado pela equipe diretiva da escola, di-


retor, vice-diretor, especialistas, secretário e tesoureiro. Esse núcleo tem por
responsabilidade a elaboração do plano de ação da escola, anualmente.

 Núcleos setoriais da qualidade – composto pela equipe do setor. Existi-


rão tantos núcleos quantos forem os setores. Cada núcleo é responsável
pela elaboração do plano de ação setorial do seu setor. Exemplos:

 Núcleo de assuntos pedagógico – professores;

 Núcleo de assuntos administrativos – diretor, vice-diretor, secretário;

 Núcleo de apoio pedagógico – especialistas, bibliotecário, responsável


pelo material didático-pedagógico;

 Comissões de qualidade – integradas por representantes de diversas áre-


as e clientes: pais, alunos, pessoas da comunidade. Essas comissões são res-
ponsáveis pela elaboração do plano de acompanhamento e assessoria.

 Pessoas da qualidade – cada profissional da escola deve elaborar seus


planos individuais de trabalho.

Segundo ainda a professora Cosete Ramos, as comissões e os núcleos, mesmo


após a implantação e o desenvolvimento do plano de qualidade elaborado no
planejamento continuam com as funções de:

 identificação e resolução de problemas, assim como propostas de melho-


ria dos processos: comissão geral da qualidade, núcleos central e setoriais,
comissões da qualidade e pessoas da qualidade.

 avaliação da qualidade: satisfação dos clientes: todos os dirigentes e pro-


fissionais da escola. Relatórios de avaliação: comissão geral da qualidade,
núcleos, comissões da qualidade e pessoas da qualidade.

Para finalizar, convém lembrar da realidade educacional brasileira e do que


almejamos em termos de educação e de vida aos brasileiros. Não enaltecemos
a Gestão da Qualidade Total na Escola, mas também não temos o direito de
desmerecê-la a quem dela bom uso fizer, ciente e consciente, porque deseja os
resultados por ela definidos.

Hoje, ao acessarmos a internet encontramos rede de ensino divulgando que


estabelece, documenta, implementa e mantém um Sistema de Gestão da Quali-
dade, portadora de Certificado de Qualidade ISO 9001.

94
Na contramão de uma gestão educacional de qualidade: a gestão da qualidade total na escola

Texto complementar

Educação não é mercadoria!


(CASTRO, 2008)

Aluno não é “matéria-prima”. Nem “cliente”! Escola não é empresa! O “pro-


dutivismo” é inaceitável. E por aí afora. Educadores fervorosos não se cansam
de denunciar a mercantilização do ensino. As palavras são usadas como taca-
pes, na esperança de abater os infiéis. Existem tais assombrações?

Há escolas que se declaram empresas (e ninguém demonstrou se são me-


lhores ou piores do que as demais). Porém, o presente ensaio não se dirige a
elas. Em vez disso, considera a “empresa” como uma metáfora para entender
o “processo produtivo” (mais uma heresia!) de qualquer escola. Tais conceitos
se revelaram úteis na economia e podem ser aplicados na educação pública,
mesmo sem considerá-la como atividade empresarial.

As empresas têm toda a liberdade de definir o seu “produto”. RoIls-Royces?


Ladas? Cirurgias cardíacas? Rolex? Relógios de camelô? As escolas também:
ensino para poucos? Ou para muitos? Ensino de violino? Uma vez definido
o produto, faz todo o sentido obter o máximo resultado com o mínimo de
gastos. Isso vale na “fabricação” de hóstias, seminaristas, doutores ou macar-
rão. Igualmente, é preciso controlar a qualidade e avaliar os resultados. Para
isso, há inspetores de qualidade na fábrica e a Prova Brasil na educação. Nas
artes, consideram-se os prêmios. Se isso é “produtivismo”, três vivas para ele.

Das empresas bem administradas afloram conselhos proveitosos para as


escolas: clareza ao definir (poucas) metas e assegurar que sejam compar-
tilhadas (por diretores, alunos e professores); avaliação dos processos; e a
regra pétrea de que é preciso tomar providências quando os resultados não
correspondem ao esperado. Nada disso fere a sacrossanta nobreza da edu-
cação nem a complexidade e a delicadeza dos seus processos. De fato, as
melhores escolas seguem tal figurino.

Mas podemos ir mais longe, tomando como metáfora o mais poderoso


motor da economia de mercado: o lucro ou sua nêmesis, o prejuízo. É feno-
menal o poder de prêmios para quem faz melhor e puxões de orelha para
quem pisa na bola.

95
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

À primeira vista, trata-se de uma heresia a ser afastada das escolas públi-
cas. Mas o lucro é apenas uma das manifestações de bons resultados. A me-
táfora sugere o vínculo entre desempenho e recompensa. Em vez de lucro,
o sucesso pode ser mais pontuação na Prova Brasil. Ou menos deserção. Ou
mais alunos aprovados na OAB.

De fato, não é preciso que haja mercados para que existam incentivos.
Dentro da empresa não há mercados. O montador do automóvel não compra
as peças do almoxarife e depois vende o carro. Por essa razão, as empresas
criam incentivos e penalidades para os funcionários, visando a motivar seu
comportamento. Está nas livrarias o livro 1001 Maneiras de Premiar Seus Cola-
boradores. Tais regras internas não são desconhecidas das escolas e vão das
medalhas até as medidas drásticas de expulsão.

Obviamente, errando nos prêmios provocamos impactos desastrados. Se


apenas penalizamos a repetência, isso pode gerar a aprovação indiscrimina-
da e uma degradação do ensino. É preciso recompensar também a qualida-
de (como faz o ldeb).

Não se trata de um mercado no sentido convencional, mas do que foi


chamado (pelo economista Albert Hirschman) de “quase-mercado”. Onde ele
não existe, cria-se uma metáfora do mercado, com metas concretas, prêmios
e penalidades para que os desvios sejam automaticamente corrigidos.

Até mesmo os incentivos financeiros podem estar presentes no Ensino


Público. Em menos de meio século o Brasil saiu de uma produção cientí-
fica próxima de zero e tornou-se hoje o 15.º maior “fabricante” de ciência.
Sua pós-graduação passou a produzir anualmente quase 10 000 doutores
e 40 000 mestres, uma das maiores colheitas do globo. O segredo? Prêmio
ou puxão de orelha, acoplados a uma avaliação para decidir quem ganha
qual. Há bolsas da Capes e do CNPq, há amplo financiamento da Finep,
da Fapesp e de outras agências. Quem brilha ganha mais. Quem tropeça
perde. A pós-graduação (que não foi privatizada) opera em um “quase-
mercado” criado com inteligência, e que tem apresentado bons exemplos
para o restante da educação.

“Das empresas bem administradas afloram conselhos proveitosos


para as escolas. Nada disso fere a sacrossanta nobreza da educação nem
a complexidade e a delicadeza dos seus processos. De fato, as melhores
escolas seguem tal figurino”.

96
Na contramão de uma gestão educacional de qualidade: a gestão da qualidade total na escola

Dica de estudo
O texto “A Narrativa Instrumental da Avaliação na Educação”, de Vandré
Gomes da Siva – USP. Disponível em: <www.fcc.org.br/pesquisa/publicacoes/
eae/arquivos/1437/1437.pdf>. A partir da análise conceitual do termo “quali-
dade de educação”, o texto discute a validade do que se denomina narrativa
instrumental da qualidade em educação. A narrativa está calcada na definição
de qualidade restrita a resultados obtidos pelos alunos, quanto rendimento cog-
nitivo, em avaliações de larga escala, e na utilidade e eficiência que porventura
tenham esses resultados, em termos estritamente econômicos. Desse modo, a
formação escolar se vê reduzida a atender a certos interesses socialmente valo-
rizados, supostamente capazes de viabilizar as condições para se obterem mais
e melhores resultados.

Atividades
1. Explique o conceito da filosofia da qualidade total.

97
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

2. Para o estabelecimento da Gestão da Qualidade Total na escola, segundo


Deming, é necessário aplicar 14 pontos norteadores dos elementos envolvi-
dos num processo educacional à Gestão da Qualidade Total. Cite cinco dos
pontos elencados por ele e comente-os.

98
Na contramão de uma gestão educacional de qualidade: a gestão da qualidade total na escola

99
Estabelecendo a qualidade
de educação desejada: a escola
como construtora da cidadania
Bordignon, ao abordar o tema Gestão da Educação, especialmente
quando estabelece seus pressupostos, define-a como um processo de
articulação para o desenvolvimento da proposta Político-Pedagógica da
escola, fundamentado numa determinada concepção de educação e de
sociedade. Assim, pensar um processo educacional e a ação da escola sig-
nifica definir um projeto de cidadania e atribuir à escola uma finalidade
coerente a esse projeto, estabelecendo seus fundamentos, ou seja: defi-
nindo os pressupostos filosóficos, sociais e educacionais.

Assegura-se que esses pressupostos vão fundamentar a organização


da proposta pedagógica, constituindo-se a partir da análise dos paradig-
mas, da definição da especificidade da organização escolar e da clareza
da finalidade da escola como construtora da cidadania, estabelecendo a
qualidade de educação desejada.

Análise dos paradigmas


Termo utilizado como estruturas generalistas e radicalistas do pensa-
mento de grupos sociais que, de um todo, determina as concepções de
homem e de sociedade e de outro estabelece posições e ações desses
grupos. Um paradigma que trata das ideias e dos valores assumidos cole-
tivamente (conscientemente ou não) e que representa o cenário da socie-
dade ou que temos ou que queremos.

O paradigma que afiancia a construção de uma escola voltada à forma-


ção de cidadãos, via ­gestão democrática, na qual a autonomia, a partici-
pação e a emancipação afiguram-se como fundamentos, baseia-se numa
concepção educacional derivada de um poder respaldado nas esferas de
responsabilidade, garantindo que as relações interpessoais ocorram entre
sujeitos iguais e ao mesmo tempo diferentes. E, ainda, nessas relações in-
terpessoais, as relações de poder encontram-se na intersubjetividade de
comunicação entre atores sociais.
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Importante ressaltar que a mudança de paradigma envolve mudanças de es-


truturas do pensamento por mais radicais que sejam e que, por si, envolvem
uma revolução da consciência, que faz naufragar ­posturas de resignação e passi-
vidade, alienação e aceitabilidade, fazendo emergir a consciência crítica e ativa.

Para uma melhor compreensão do novo paradigma, estabelecemos uma


comparação desse com os velhos paradigmas, em relação aos diversos aspectos
da organização escolar.

Velhos paradigmas Novo paradigma


Princípios filosóficos Direito de ensinar. Direito de aprender.
A estética da sensibilidade, a po-
lítica da igualdade e a ética da
identidade estarão presentes em
todos os trabalhos.
Conteúdo Um fim em si mesmo. Um meio para desenvolvimento
humano.
Conhecimento Fragmentado. Integrado pelo trabalho interdis-
Compartimentado nas disciplinas. ciplinar e transdisciplinar e pela
contextualização.
Ensino de regras, fatos definições,
acúmulo de informações desvin- Privilegia a construção de con-
culadas da vida dos alunos. ceitos e o entendimento. Teoria e
prática aplicada ao cotidiano do
Caráter mais enciclopédico. aluno. Ênfase está na produção e
Privilegia a memória e a padro- sistematização do sentido.
nização.
Currículo Fracionado, estático e linear. Integrado, vivo e em rede, pro-
porcionando a oportunidade de
conhecer, fazer relacionar, apli-
car e transformar.
Organização curricular Por disciplinas. Por áreas do conhecimento.
Por eixo organizador.
Por tema gerador.
Por projetos de trabalho.
Sala de aula Espaço de transmissão e recep- Espaço privilegiado de reflexão,
ção do conhecimento. de situações de aprendizagem
vivas e enriquecedoras.
Atividades Rotineiras que favorecem a pa- Centradas em projetos de traba-
dronização da resolução. lho e na resolução de problemas
Pesquisa igual a cópia. para desenvolver a aprendizagem.
Pesquisa igual a buscar várias fon-
tes para resolução de uma deter-
minada situação-problema com
espontaneidade e criatividade.

102
Estabelecendo a qualidade de educação desejada: a escola como construtora da cidadania

Velhos paradigmas Novo paradigma


Professor Mero transmissor do conheci- Facilitador da aprendizagem do
mento. aluno.
Determina o conteúdo a ser tra- Facilitador da construção de sen-
balhado sem levar em conta as tidos.
necessidades que surgem em Gerenciador de informação.
sala de aula.
Reflexivo.
Avalia e resignifica sua prática
pedagógica.
Incentivador da estética, da sen-
sibilidade, zela pela política da
igualdade e pela ética da iden-
tidade.
Aluno Passivo, receptáculo do conheci- Ativo e participativo na constru-
mento, descontextualizado. ção do seu conhecimento.
Não sabe porquê e para quê es-
tuda determinados conteúdos.
Avaliação Classificatória e excludente. Formativa e diagnóstica do ensi-
Gera dados que possibilitam ape- no aprendizagem.
nas avaliar a capacidade do aluno Aponta dificuldades e possibilita
em reter informações. intervenção pedagógica.
Gera dados que possibilitam ava-
liar o desenvolvimento do aluno.
Livro didático Um fim em si mesmo. Um entre vários recursos didáticos.
Atividades previsíveis e padroni-
zadas.

Ao procedermos a análise comparativa dos dois quadros percebemos que os


enfoques e as atitudes são díspares entre os paradigmas. E na contundência das
diferenças é que podemos novamente afirmar pela necessidade de construção
de gestão democrática, a partir de uma nova visão e concepção de mundo e
para como resultado e não só a ele, mas no processo como um todo só ocorrerão
mudanças nos aspectos da gestão se houver mudança na organização escolar
em todos os seus aspectos.

A seguir, apresentamos um quadro comparativo que explicita as mudanças


de enfoque e de atitudes propostas pelo novo paradigma:

Paradigma vigente Paradigma emergente


(BORDIGNON apud FERREIRA;
AGUIAR, 2000, p. 152.)

Aspectos da gestão
(tradicional) (novo)
Relações de poder Verticais Horizontais

Estruturas Lineares/segmentares Circulares/integradas

Espaços Individualizados Coletivos

103
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Paradigma vigente Paradigma emergente


Aspectos da gestão
(tradicional) (novo)
Descentralização/diálogo/nego-
Decisões Centralizadas/imposição
ciação

Formas de ação Autocracia/paternalismo Democracia/autonomia

Centro Autocentrismo/individualismo Heterocentrismo/grupo-coletivo

Cooperação/cessão/interdepen-
Relacionamento Competição/independência
dência

Meta Eliminação de conflitos Mediação dos conflitos

Tipo de enfoque Objetividade Intersubjetividade

Visão Das partes Do todo

Objetivo Vencer de – convencer Vencer com – co – vencer

Consequência Vencedores – predadores Vencedores

Objeto do trabalho Informação Conhecimento

Base A-ética Ética

Ênfase No Ter No Ser

Especificidade da organização escolar


Pressupõe identificar em que aspectos a organização escolar difere das ­demais
organizações. Sua especificidade é determinada pelos fatores que são: sua finali-
dade, sua estrutura, suas relações internas e externas e a sua produção.

A educação escolar realiza sua finalidade tanto na dimensão individual quanto


na dimensão social, pois vive e realiza-se no espaço coletivo. Assim, a finalidade
da escola fundamenta-se na concepção do homem histórico, autônomo e livre, vi-
vendo uma relação solidária entre seus pares em espaço e tempo determinados.
Pensar e construir uma escola é, essencialmente, colocar em prática uma concepção política
e uma concepção pedagógica que se realimentam e que se corporificam na sua Proposta
Político-Pedagógica. Concepção política, porque é ela que promove a ação transformadora da
sociedade, e concepção pedagógica, porque é ela o substrato da função escolar. (BORDIGNON
apud: FERREIRA; AGUIAR, 2000, p. 154)

Nesse contexto, as relações interpessoais do processo educativo devem de-


senvolver-se no eixo da horizontalidade e a “produção” da escola tem sua qua-

104
Estabelecendo a qualidade de educação desejada: a escola como construtora da cidadania

lidade definida na produção de seres autônomos e emancipados e na “produ-


ção” da equidade e da justiça social, conquistando o espaço privilegiado para a
construção da cidadania, no qual o trabalho e o conhecimento identificados na
qualidade se fundamentam.

Qualidade na educação
A questão da qualidade é decorrente do paradigma de ações educacionais
da escola. Qualidade na educação não consiste em um conjunto de critérios. É
definida como
reflexo da concepção de mundo e de sociedade. A partir de então a escola procura desenvolver
conhecimentos, habilidades e atitudes que irão encaminhar a forma por meio da qual os
indivíduos vão se relacionar com a sociedade, com a natureza e consigo mesmos. (GRACINDO,
citado por BORDIGNON In: FERREIRA; AGUIAR, 2000, p. 156).

A questão da qualidade na educação remete à indagação da finalidade do


saber, que é um meio, um instrumento do ser cidadão, pois não se ensina para
responder às necessidades do mercado. O saber é, como instrumento-cidadão,
cada vez mais, a matéria-prima que move a sociedade do conhecimento.

Que cidadania é essa e que tipo de cidadão ela forma são questionamentos
levantados por Bordignon. Cidadania “é a condição essencial para a efetivação
da verdadeira democracia”. Os conceitos de democracia e de cidadania são ine-
rentes e indissociáveis. Um não se viabiliza sem o outro. E, sem democracia não
há espaço para os cidadãos, apenas para governados. (BORDIGNON apud FER-
REIRA; AGUIAR, 2000, p. 158).

Cidadão, por sua vez, é o sujeito que faz história e, “neste sentido, é gover-
nante, não apenas de si mesmo, mas, solidariamente com os outros cidadãos,
do caminhar da humanidade”. Ser cidadão “é ser capaz de ser crítico das in-
formações, construtor do conhecimento e produtor das tecnologias. Se isso é
válido para o educando, é condição fundamental para o professor que deve
constituir requisito básico do perfil e da qualificação do docente.” (FERREIRA;
AGUIAR, 2000, p. 158).

Para desenvolver a cidadania e o cidadão, a escola precisa de um clima orga-


nizacional favorável ao cultivo do saber e da cultura, do prazer e da sensibilida-
de, desenvolvendo nos alunos suas múltiplas capacidades que os habilitam ao
aprendizado, às competências técnicas e políticas; à ética e à emancipação e à
autonomia. Assim, a escola “produz” pelas relações que estabelece e alimenta,

105
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

pela estrutura e organização que encampa, por seu papel socializador e pelos
conteúdos que transmite. (BORDIGNON apud FERREIRA; AGUIAR, 2000).

Edgar Morin, em seu livro A Cabeça Bem-Feita (2000), no capítulo 6, intitulado


“A aprendizagem cidadã”, afirma que a
Educação deve contribuir para a autoformação da pessoa (ensinar a assumir a condição ­humana,
ensinar a viver) e ensinar como se tornar cidadão. Um cidadão é definido, em uma democracia,
por sua solidariedade e responsabilidade em relação à sua pátria. (MORIN, 2000, p. 65)

Parafraseando Durkheim, educar não é transmitir conhecimentos sempre


mais numerosos ao aluno, mas sim criar nele um estado interior e profundo, uma
espécie de polaridade de espírito que o oriente em um sentido definido, não só
durante a infância mas para a vida toda (MORIN, 2000).

Para Morin, o ensinar a viver necessita não só dos conhecimentos mas ­também
de transformação do ser, desse conhecimento adquirido em sabedoria e da incor-
poração dessa sabedoria para a vida toda.

Para esse autor, a educação trata de transformar as informações em conheci-


mento, de transformar conhecimento em sabedoria, segundo os pressupostos
apontados.

A aprendizagem cidadã evoca um enraizamento do sujeito e de sua identida-


de nacional, no qual questões como pátria, nação, comunidade e religião devem
ser tratados.

A consciência e o sentimento de pertencer à terra, a uma nação, e de uma


identidade terrena e patriótica são vitais atualmente. A progressão e o enraiza-
mento de uma consciência de pertencer a uma pátria permitirão o desenvolvi-
mento de um sentimento de religião e intersolidariedade, imprescindível para
civilizar as relações humanas. Há uma correlação entre o desenvolvimento da
consciência e a consciência da pátria terrena.

Contribuir para a autoformação do cidadão e dar-lhe consciência do que sig-


nifica uma nação é tão importante quanto estender a noção de cidadania.

Solidariedade e responsabilidade advêm de um profundo sentimento de fi-


liação, sentimento matripatriótico que deve ser cultivado de modo concêntrico
sobre o país, sobre o continente.

A didática exposta por Comenius em sua obra Didática Magna (1632), já dizia
que uma educação deve ensinar tudo e a todos. Esse ensinar tudo não significa

106
Estabelecendo a qualidade de educação desejada: a escola como construtora da cidadania

exigir o conhecimento de todas as ciências e de todas as artes, o que seria im-


possível e inútil. Ensinar tudo significa que se ensine a todos os fundamentos, as
razões e os objetivos de todas as coisas que existem na natureza e na produção.

Ensinar a todos porque o homem tem a necessidade de se educar para se


­tornar homem, pois este tem as sementes da piedade, da moralidade e da sabe-
doria, que devem ser desenvolvidas pela educação. Essa educação para todos é
uma proposta derivada de igualdade básica entre os homens. É uma educação
para todos que deverá formar o cidadão.

Embora, no Brasil, e, apesar de tanto os direitos do cidadão – à vida, à saúde,


à educação, à moradia – quanto os direitos civis – liberdade, igualdade jurídica,
justiça –, o que se oferece à grande parcela da população é uma rede de ensino
precária em todos os sentidos. Não chegando a atender a todas as crianças em
idade escolar. Há, no Brasil, uma imaturidade quanto aos ideais de cidadania.

Para Arroyo, a cidadania jamais será doação do Estado, pois é essencialmente


uma conquista dos excluídos, por meio do exercício político e de lutas.

A educação escolar, por consequência, não confere cidadania ao sujeito que


dela esteja excluído. Ao contrário, esta é resultado da própria prática política, de
lutas e de inconformismos sociais. A educação dos excluídos dá-se, sobremodo,
nas lutas de reinvindicação, de sabotagem.

A pedagogia moderna integra-se a um movimento global de redefinição e


afirmação de diretrizes políticas como submissão-liberdade, exclusão-participa-
ção, barbárie-civilização.

A educação moderna vai se configurando nos confrontos sociais e políticos


seja como instrumento de conquista de liberdade, de participação e de cidada-
nia, seja como um dos mecanismos para controlar e dosar os graus de liberdade,
de civilização, de racionalidade e de submissão suportáveis pelas novas formas
de produção e pelas novas relações sociais entre os homens, na qual a educação
passa a ser um paliativo, capaz tanto de tornar cidadãos livres como controlar a
liberdade dos cidadãos.
O que importa ressaltar é que a relação entre educação e construção de uma nova ordem
política não é invenção de educadores ou políticos, mas trata-se de uma relação que faz parte
de um movimento maior de interpretação dos processos de constituição das sociedades
modernas. (ARROYO apud BUFFA, 2000)

Esperamos da educação, “o milagre de configurar o novo homem livre para o


novo mercado econômico, social e político”. (BUFFA, 2000, p. 37).

107
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

A educação passou a ser pensada como mecanismo central na constituição


da nova ordem social, tornando-se um dos mecanismos de controle dessa nova
ordem social, na qual não será aceito qualquer homem a título de sujeito de
participação no convívio social, mas tão-somente os civilizados, os racionais, os
modernos, os de espírito cultivado e os instruídos e cultivados. Por aptos, serão
apenas reconhecidos, na participação da política e do social, aqueles que tive-
rem transposto as fronteiras da barbárie, da ignorância, aqueles que se fizerem
homens modernos.

A prática educativa moderna reflete uma concepção do convívio social, das


relações indivíduo-sociedade e da cidadania permeados dos elementos do
romantismo e da sociologia positivista que enfatizam a educação, quer como
elemento de defesa do indivíduo perante a sociedade, quer como elemento de
integração do indivíduo no social, reduzido à unidade moral, à coesão, à integra-
ção e à cooperação.

A cidadania é vista dessa forma como aceitação da obrigação moral para


o convívio harmônico com seus semelhantes. Assim, educar para a cidadania
­­reduz-se a cultivar o senso do valor moral em cada indivíduo, na criança e no
jovem, ­sobretudo. É, na verdade essa concepção de cidadania, sua negação.

As lutas pela escola e pelo saber, tão legítimas e urgentes, vêm se constituin-
do um dos campos de avanço político na história dos movimentos populares e
na história da construção da cidadania.

Há muita relação entre cidadania e educação,


no sentido de que a luta pela cidadania, pelo legítimo, pelos direitos, é o espaço pedagógico
onde se dá o verdadeiro processo de formação e constituição do cidadão. A educação não é
uma precondição da democracia e da participação, mas é parte, fruto e expressão do processo
de sua constituição. (ARROYO apud BUFFA, 2000, p. 79)

É possível perceber em todos os autores citados uma visão comprometida


com o social, num discurso contextualizado historicamente em relação à cida-
dania, alguns remontando à Grécia, outros à Revolução Burguesa, trazendo as
ocorrências e implicações e reconhecendo que a gestão, a cidadania, tal como
conhecemos, estão ainda pautadas numa visão positivista.

A unanimidade está presente ao indicar a necessidade da construção de uma


nova escola, construída a partir da existente, coletivamente, com concepção po-
lítica e pedagógica, explicitada no seu Projeto Político-Pedagógico. Escola públi-
ca, de qualidade e autônoma, que permita ingresso e permanência a todos, sem
­qualquer distinção. Educação que privilegia a participação ativa, a construção

108
Estabelecendo a qualidade de educação desejada: a escola como construtora da cidadania

da cidadania, a vivência democrática, a responsabilidade, o compromisso e as


relações interpessoais sadias, que contemplam valores e atitudes de coopera-
ção e solidariedade. Escola permeada de avaliação pelos seus sujeitos partici-
pantes, objetivando a transformação da realidade, da situação presente para a
desejada.

Democracia e cidadania são conquistas indissociáveis, decorrentes de cons-


truções coletivas, que demandam muito tempo, avançando lentamente ainda
em poucas escolas.

Texto complementar
Aprender por toda a vida
Por necessidade ou gosto, pelo exemplo ou erro, coisas úteis ou simplesmente
divertidas. Aprender é o que nos faz humanos e felizes. Desistir disso é negar o
que temos de melhor
(FARIA, 2008)

MARINA NASCEU NA FLORESTA, no interior do Acre. Por lá, não havia


escola. Assim como quase toda a sua família, a menina cresceu sem saber ler
nem escrever. Aos 14 anos, seu pai lhe ensinou a ver as horas e a fazer contas.
Aos 16, quando se mudou para a capital, começou a alfabetização, frequen-
tando a escola noturna depois do expediente como empregada doméstica.
Quando tinha 12 anos, Paula foi mandada embora de casa. Mudou-se para
outra cidade, para morar com a família de seu treinador de basquete. Seus
pais queriam que ela fosse uma estrela do esporte. Paula, não. Enquanto re-
petia 100 vezes o mesmo movimento da cesta, se cobrando e sendo cobrada
para não errar, desejou desistir. O sonho de Denil era ser secretária. Mas se
casou cedo, logo William e David nasceram. Resolveu, então, ficar em casa.
ser mãe em tempo integral. Era bom, mas, conforme os meninos cresciam,
ela se sentia um pouco... inútil. Mais uma frustração no rol, como não ter
aprendido a tocar piano nem saber andar de bicicleta. Depois dos 40 anos,
dá pra pensar nessas coisas?

Elas poderiam ter se conformado. Com a falta de oportunidade e apoio,


com dificuldade e solidão. Poderiam ter se encolhido, diante das perspecti-
vas incertas e da falta de confiança na própria capacidade. Mas resolveram

109
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

aprender. Cada uma, a seu modo – pelo exemplo, com os erros, experimen-
tando o novo, tentando – encontrou um caminho para descobrir o que não
sabia e crescer. Marina tornou-se Marina Silva, professora de história, senado-
ra da República, ministra e a mulher mais respeitada do mundo nas questões
de meio ambiente. Paula virou Magic Paula, jogadora da Seleção Brasileira
de Basquete, medalhista em Olimpíadas e Jogos Pan-Americanos e uma das
maiores atletas que o país já teve. Com os filhos crescidos, Denil Rossato, 65
anos, foi ser secretária médica, estudou espanhol e italiano, usa a internet
como se fosse nascida nos anos 2000 e aprendeu a andar de bicicleta ainda
outro dia. A história delas prova que aprender não é algo que se faz apenas
sentado no banco da escola: é vivo, constante e está em toda parte – basta
querer.

“Se aquilo que aprendemos na vida se resumisse ao que nos ensinam na


escola, estaríamos perdidos”, fala Rubem Alves, filósofo, psicanalista e um dos
maiores pensadores da educação no Brasil. Até porque a humanidade veio
bem antes das formalidades de carteira, lousa e todos olhando para a frente,
por favor. ”Talvez o impulso básico do processo de aprendizagem seja a luta
pela sobrevivência. Quando tem um problema, o homem se põe a pensar”,
diz Rubem. Depois, vem a curiosidade – um desejo que a ciência não expli-
ca de onde nasce, sem razão prática. “É como uma coceira no pensamento
quando defrontamos com algo intrigante”.

[...]

Caixa de brinquedos
Essa ferramenta de que Marina fala – a curiosidade por saber – todos nós
temos: é o que nos faz humanos. O interesse pode ser podado por uma escola
que enfia goela abaixo assuntos entediantes, pela falta de estrutura e incen-
tivo para explorar nosso potencial, ou pelos limites que nos impomos, em
frases como “não tenho mais idade para isso” ou “não sei, não consigo, deixa
pra lá”. Mas o desejo de conhecer pode ser retomado e exercido – desde que
se mude a forma de encarar o aprendizado. Em vez de fazê-lo apenas pela
obrigação de saber coisas úteis, como a tabuada ou dirigir, pode-se (e deve-se)
aprender por prazer. Que seja empinar pipa, boiar no mar, contar piadas, cantar
em chinês – o que quiser.

110
Estabelecendo a qualidade de educação desejada: a escola como construtora da cidadania

“Digo que o corpo carrega duas caixas: uma de ferramentas e outra de


brinquedos”, fala Rubem Alves. Na das ferramentas, constam as utilidades.
São construídas pelo conhecimento formal e compulsório da escola, como
aprender a escrever e a fazer contas, e por habilidades práticas que desen-
volvemos com a experiência em sociedade, como subir escadas e lavar louça.
Na caixa de brinquedos moram as coisas inúteis, mas deliciosas. ”São conteú-
dos e atividades que não levam a nada, como a música, dançar, beijos, pores
do sol. Para que serve um poema? Só para nos dar felicidade. Não é uma
ferramenta com fim prático”, diz.

Para Rubem, a melhor maneira de aprender é desenvolvendo as ferra-


mentas certas para acessar o que mais lhe interessa na sua caixa de brinque-
dos. Ou seja, dane-se a física elétrica, se o que você gosta é de plantar jardins.
Se as escolas e universidades não oferecem essa liberdade tão individual de
optar pelas ferramentas que nos servem, a vida adulta ao menos dá a pos-
sibilidade de escolher o que se tem vontade de aprender. A limitação, aí, é
outra: os preconceitos deixados pelo gosto amargo das lições chatas, pela
sensação de que aprender é custoso, pela tola ideia de que se não for útil é
perda de tempo, pelo medo de errar – resultado de experiências de apren-
dizagem frustrantes na infância e na adolescência. Difícil mesmo é não se
deixar emperrar.

[...]

Coisa da sua cabeça


Como no basquete de Paula, aprender exige atenção, treino e emoção.
”Primeiro, focamos no objeto: o quadro, uma história, uma pessoa. A infor-
mação passa para a memória de curto prazo e, se necessário, é arquivada na
de longo prazo”, explica o neurologista Marco Antonio Arruda. É a diferença
entre decorar todas as capitais do Brasil uma hora antes da prova – e não
lembrar da lista na semana seguinte – e fazer exercícios regularmente, que
lhe possibilitarão não confundir, anos depois, Porto Alegre com Porto Velho.

[...]

Com o passar dos anos, o cérebro muda e fica mais difícil entender novi-
dades. Mas é sempre possível aprender. Somos nós quem limitamos (ou não)
o conhecimento.

111
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

A liberdade de saber
Denil Rissato achou seu caminho em um domingo no Parque do Ibira-
puera, em São Paulo. Foi lá, aos 64 anos, que andou de bicideta pela pri-
meira vez. Bicicleta não, triciclo! A vontade vinha guardada desde menina.
No parque, alugou o possante, duas rodinhas atrás, uma grande na frente.
”Olhando para ele, parecia impossível. Com um pouco de esforço, consegui
subir. Comecei a pedalar devagarinho... e estava andando!”, lembra. A sen-
sação foi tão boa que resolveu comprar um. Na noite anterior à entrega mal
dormiu. Quando me vi no meu triciclo, fiquei gritando “yes! yes! yes!”, conta.
Agora, Denil passeia toda prosa com suas três rodas até pela feira. Não fosse
a proibição do filho, já estava de olho numa moto.

Como tantas outras mulheres de sua geração, Denil fez planos de carrei-
ra, que interrompeu para cuidar do casamento e dos filhos. Mas continuou
com um olho para a vida lá fora – e a idade, ao contrário do que seu cérebro
poderia esperar, deu-lhe mais coragem para experimentar o novo. Depois de
15 anos em casa, sentiu que estava na hora de sair. “Precisava me sentir útil
para outras pessoas”, afirma. Foi estudar, aprendeu a mexer no computador
e virou secretária de um hospital, profissão que sempre quis seguir. No dia a
dia, vendo os médicos, achou que podia ajudar mais e resolveu ser enfermei-
ra. E lá foi Denil para a sala de aula, aos 40 anos.

Depois de dois anos de curso, estreou o uniforme branco. A carreira não


durou. “Ih, não era o que eu queria, não. As pessoas eram tristes, sentiam
muita dor, e eu não queria ver aquilo”, conta. ”Nasci para ser secretária, e sou
boa nisso”. Voltou para trás do balcão, mas, para não ficar parada, inventou
umas aulas de espanhol, outras de italiano. Sempre gostei de estudar. Faço
um monte de coisas que nem uso. Mas me divirto. Gosto da liberdade de
viver, e isso só se consegue aprendendo a se virar, conhecendo as coisas,
sabendo”, diz. Da própria sabedoria, Denil segue a filosofia de Rubem Alves,
em que aprender é mais do que uma função. Como diz o mestre: “A vida
não se justifica pela utilidade, mas pelo prazer de desfrutar sua caixa de
brinquedos”.

112
Estabelecendo a qualidade de educação desejada: a escola como construtora da cidadania

Dica de estudo
O filme Escritores da Liberdade. História baseada em fatos reais. Paramount
Pictures.

A história refere-se a adolescentes, criados no meio de tiroteios e agressivida-


de, e a uma professora que oferece o que eles mais precisam: uma voz própria.
Quando vai parar em uma escola corrompida pela violência e tensão racial, a
professora combate um sistema deficiente, lutando para que a sala de aula faça
a diferença na vida dos estudantes. Agora, contando suas próprias histórias, e
ouvindo a dos outros, uma turma de adolescentes supostamente indomáveis
vai descobrir o poder da tolerância, recuperar suas vidas desfeitas e mudar seu
mundo.

Escritores da Liberdade é baseado no livro O Diário dos Escritores da Liberdade.

Atividades
1. Correlacione as colunas marcando 1 para aspectos da gestão paradigma vi-
gente (tradicional) e 2 para paradigma emergente (novo), de acordo com os
aspectos específicos da gestão:

Relações de poder:
(( Horizontais (( Verticais
Estruturas:
(( Lineares / segmentares (( Circulares / integradas
Espaços:
(( Individualizados (( Coletivos
Decisões:
(( Descentralização / diálogo / (( Centralizadas / imposição
negociação
Formas de ação:
(( Democracia / autonomia (( Autocracia / paternalismo

113
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Centro:
(( Autocentrismo / (( Heterocentrismo /
individualismo grupo-coletivo
Relacionamento:
(( Competição/independência (( Cooperação/ cessão/
Interdependência
Meta:
(( Mediação dos conflitos (( Eliminação de conflitos
Tipo de enfoque:
(( Visão das partes do todo (( Objetividade
Intersubjetividade
Objetivo:
(( Vencer com – co – vencer (( Vencer de – convencer
Consequência:
(( Vencedores – predadores (( Vencedores
Objeto do trabalho:
(( Informação (( Conhecimento
Base:
(( A-ética (( Ética
Ênfase:
(( No Ser (( No Ter

2. Quais são os fatores que determinam a especificidade da organização esco-


lar? Explique-os quanto a sua finalidade e estrutura.

114
Estabelecendo a qualidade de educação desejada: a escola como construtora da cidadania

115
A qualidade como processo
e qualidade total: estabelecendo paralelos
Antes de estabelecermos paralelos vale ressaltar que a qualidade da
educação, tanto na qualidade total quanto na qualidade em educação,
afirmam que a mesma só pode ser alcançada por meio de uma gestão
participativa, trabalho de equipe e currículo interdisciplinar. Entretanto,
adiante vamos perceber as diferenças nas suas concepções.

Quando se fala em estabelecer paralelos quer-se dizer estabelecer se-


melhanças e diferenças ­entre uma corrente de pensamento e a outra.

Poderíamos, ainda, indagar: Ambas não buscam o mesmo objetivo, “a


qualidade”?

Então, poderíamos, também, afirmar: uma não é melhor do que a outra,


quando exercidas por gestores competentes e que conheçam a fundo os
processos de implantação. Em verdade, toda a comunidade escolar entra
na máxima do “aprender a aprender”.

O princípio norteador de todo o trabalho pedagógico e administrativo


é diferenciado:

 o da qualidade total está voltado para a aprendizagem do aluno em


ambiente de qualidade, ou seja, vivencia sempre a qualidade, para
que quando estiver no mercado de trabalho, objetive qualidade,
voltado aos interesses da empresa como projeto de adulto – pro-
jeto de profissional. Está, dessa forma, a qualidade total ligada ao
desenvolvimento produtivo e não ao ser humano em todos os seus
aspectos afetivo, cognitivo, social e espiritual.

Ainda, a gestão da qualidade total consiste num sistema administra-


tivo voltado ao atendimento das necessidades, interesses e expectativas
dos clientes, diferindo, entretanto, de outros sistemas porque possibilita
aos participantes a capacitação para planejar e gerenciar o próprio traba-
lho, contribuindo eficazmente com o grupo na solução dos problemas e
para que os objetivos estabelecidos sejam atingidos.
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

 O da qualidade em educação está voltado para a aprendizagem cidadã. E


ao falarmos em qualidade de educação e aprendizagem cidadã, primeira-
mente, como premissa fundamental temos de indagar e colocar:

Que homem e que sociedade se deseja construir?

A resposta a essa premissa é que vai fundamentar a proposta educacional da


escola, retratada no seu Projeto Político-Pedagógico, instituindo os seus pilares
sustentadores e elegendo a esse projeto os princípios, de acordo com o nosso
credo, respaldado em diversos autores como: Paulo Freire, Pedro Demo, Danilo
Gandin, Celso Vasconcellos e outros que acreditam e defendem uma linha de
educação humanista, ou seja, educação para a liberdade, quais sejam:

 instrumento de transformação social tendo em vista a construção de uma


sociedade democrática e participativa, na qual a participação coletiva nas
decisões sejam uma constante;

 defesa aos direitos do homem, individuais e coletivos, buscando o resgate


da dignidade, liberdade e justiça;

 defesa por uma sociedade em que todos os homens (pessoa humana)


­possam se tornar sujeitos de seu processo histórico, do seu próprio desen-
volvimento e do desenvolvimento social;

 auxílio na construção de uma sociedade pluralista, imperando o respeito


às pessoas e às organizações.

O Projeto Político-Pedagógico, além de promover a organização da escola


como um todo, traz à escola uma nova qualidade de trabalho, partindo dos se-
guintes princípios norteadores:

 igualdade (igualdade não quer dizer uniformidade, ao contrário, é a única


autêntica diversidade. Segundo Marx: a cada um, segundo suas necessi-
dades, de cada um, segundo suas capacidades.);

 qualidade para todos;

 gestão democrática;

 liberdade X autonomia;

 valorização do magistério, formação continuada, no que se refere ao levan-


tamento de necessidades de formação, e com a elaboração de programas.

118
A qualidade como processo e qualidade total: estabelecendo paralelos

A educação, sendo uma prática social, não pode restringir-se a ser puramente
livresca, teórica, sem compromisso com a realidade local e com o mundo em
que vivemos.

Conscientemente, a educação está voltada para a democracia e contribuin-


do para a democratização na sociedade; desenvolvendo as habilidades neces-
sárias para a consecução de projetos e a consciência de cidadania, podendo os
alunos propor em soluções para o bem comum, por meio de produtos com utili-
dade social para ­grupos específicos ou para a sociedade como um todo.

A orientação do educando está voltada para que assuma os valores huma-


nos, com consciência e responsabilidade para que seja agente de transformação
na realidade em que está inserido.

A formação de alunos críticos e reflexivos leva a perspectivas de promover


o homem na sua integridade e consciência de que todos os valores humanos
encontram-se na sua realização plena.

O grande desafio do cotidiano escolar está em saber orientar no sentido de


possibilitar a formação de pessoas dotadas de intensa curiosidade diante do
desconhecido, preocupadas em desvendar a realidade e investigá-la, capazes de
expressar sua afetividade em seus relacionamentos, possuidoras de uma atitude
coerente diante da vida.

Uma nova postura educacional surge. O mundo contemporâneo exige que


os homens de seu tempo tenham competências que os tornem capazes de atu-
arem, com flexibilidade e criatividade, num universo de informações permanen-
temente renovadas. A educação comprometida com o “formar” leva o educando
ao pleno exercício de seus direitos e deveres de cidadão.

Educadores e educandos aprimoram suas formas de interagir, pensando


­sobre as relações de poder entre os homens e suas ideologias. Conhecer, enten-
der, criticar, opinar são meios de fazer com que todos participem do processo
educativo. O pensar e o agir são centrados numa postura renovadora e contínua,
para que os alunos possam enfrentar os desafios de um mundo em constante
transformação.

Quem faz a educação com seriedade, com determinação, certamente cons-


trói cidadania, pois estamos num tempo em que a cidadania precisa ser enca-
rada com coragem e determinação. A educação que ousa oxigenar sinais con-
cretos de uma cidadania, pratica e constrói novas possibilidades, novos sonhos,
novos mundos.

119
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

O pleno exercício da cidadania inclui a prática do ato educativo e requer a par-


ticipação ativa e compromissada dos cidadãos, indistintamente, escola e comu-
nidade juntas para a construção de uma sociedade humana, justa e solidária.

Assim, a filosofia de uma escola voltada à qualidade em educação se resume


em possibilitar uma construção conjunta de novos cidadãos, capacitados, críti-
cos, conscientes e responsáveis, despertando em cada educando o valor da vida,
o prazer e a busca do conhecimento, o significado e a importância dos valores
éticos e morais, com um ensino inspirado nos princípios de liberdade, igualdade,
solidariedade e democracia.

Ao nos referirmos à qualidade em educação estamos afirmando nossa posi-


ção de que a educação só será realmente de qualidade se estiver compromissa-
da com a construção cotidiana do referencial teórico que acabamos de colocar,
ainda que de forma simplificada, e no propósito constante de busca, realização
e avaliação da práxis condizente à teoria. Assim, processos, métodos, estruturas,
relações internas e externas têm de necessariamente conspirar favoravelmente
à construção da qualidade em educação como processo.

Uma escola de qualidade deve ser objetivo de qualquer gestor, portanto, este
deve perseguir os objetivos propostos, refletindo em uma efetividade social e,
para tanto, a escola deve ter claro o que quer, estruturar e programar o melhor
possível para seus alunos, captando ao máximo os recursos que dispõe (físicos,
humanos e financeiros), unindo a energia de todos os envolvidos para ser cum-
pridora de seus objetivos (éticos e sociais).

Enfim, a qualidade em educação que defendemos é a de uma educação com-


prometida com a transformação social.

A linguagem utilizada para qualidade total está baseada em princípios


como:

 planejamento da qualidade;

 total satisfação dos clientes;

 gerência participativa;

 desenvolvimento dos Recursos Humanos;

 constância de propósitos;

 aperfeiçoamento contínuo, gerenciamento de processos;

120
A qualidade como processo e qualidade total: estabelecendo paralelos

 disseminação das informações;

 garantia da qualidade;

 desempenho zero defeitos.

Essa linguagem fica mais evidente quando alguns teóricos definem escolas
de qualidade total, expondo seus princípios e resultados. Um dos autores é o
professora Carlos Henrique Carrilho Cruz que relata:
Um paralelo interessante a respeito da evolução do conceito de qualidade aplicado à
educação acontece se for fortalecido o entendimento de que qualidade estava sempre ligada à
expansão do ensino, à garantia de acesso, à dotação de recursos. A partir dos anos 1980 outras
questões começam a tomar lugar como o índice de evasão, de repetência... e atualmente
assume uma transposição do conceito do mundo do mercado para o mundo de educação,
ou seja, passando pelas determinações da produção material para a produção cultural escolar.
Caracterizando ainda mais as raízes do conceito de qualidade aplicado à Qualidade Total com
a visão administrativa capitalista.

Por manter, ainda, essa forte ligação, a educação, neste contexto, passa por
mensuração como forma de avaliação; pela interferência na produção cultural
do ­homem, visando acumulação de saber, para inserção em uma sociedade
competitiva.

Nesse ponto, fazendo um paralelo com a qualidade em educação, fica evi-


dente a diferença entre as duas propostas e a nossa opção, uma vez que a quali-
dade em educação está relacionada à qualidade de vida, à apropriação do saber
e à sua intervenção na sociedade de maneira consciente, solidária, participativa
e cooperativa.

A socióloga Sylvia Schmelkes define qualidade em educação como a


[...] capacidade de proporcionar aos alunos o domínio de códigos culturais básicos, a
capacidade para a participação democrática e cidadã, o desenvolvimento da capacidade de
resolver problemas e seguir aprendendo, o desenvolvimento de valores e atitudes compatíveis
com uma sociedade que deseja uma vida de qualidade para seus habitantes. (SCHMELKES
apud MORAES, 1997, p. 193)

Retomando a qualidade total, se levarmos mais a fundo o conceito podemos


dizer que visa à distinção, diferenciação dos demais. De acordo com Araci Hack
(1997, p. 36)
[...] produzir o melhor produto com menos custos e maior condição de competitividade. Nesse
paradigma, a qualidade de vida está relacionada à possibilidade de consumo de todas as
inovações tecnológicas. Trata-se da incorporação da cultura de satisfação.

A qualidade de vida posta em discussão quando agregada à qualidade na


educação toma conotação de apropriação de saberes que desenvolverão “o ser

121
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

humano”, “o cidadão”, “a cidadania”, sendo assim tendo valor social. Ainda, segun-
do Araci Hack (1997, p. 36), “a qualidade de vida entendida como condições e
possibilidades de satisfazer necessidades básicas de existência humana”.

O processo de avaliação, por conseguinte, difere sob as duas óticas:

 na qualidade em educação, a avaliação possui procedimentos que envol-


vem participação, consciência, entendimento, tendo como instrumentos
a conversa, a participação da vida comunitária e até mesmo buscando as-
sumir o projeto político da comunidade;

 na qualidade total, a avaliação é mensuração, o quanto aprendeu, o quan-


to se destacou, o quanto recebeu de conhecimento.

Não só a qualidade total visa à mudança dos processos para implantação da


mesma no contexto educacional como também a qualidade em educação exige
que se estabeleça o envolvimento de toda comunidade em busca de uma totali-
dade, o estabelecimento de um processo de qualidade pressupõe dinamicidade,
compromisso, e uma visão sistêmica que agrege a ­todos, porque este processo
é baseado na troca, na interação, refletindo seu resultado mais nos próprios pro-
cessos e nas relações, afetando todo o sistema.

A respeito dessas mudanças no processo Moraes (1997, p. 195), complementa:


[...] melhorar os processos significa não apenas levar em conta as necessidades dos usuários dos
sistemas em cada etapa de sua trajetória mas a busca de novas estratégias de aprendizagem
mais adequadas à produção do conhecimento mais atualizado, ampliado, que induz à
expansão da cognição humana, à crescente intelectualização do trabalho.

Vivemos em uma época de rápidas e profundas mudanças. Esta é hoje a


nossa realidade, por isso há que se ter a clareza e o cuidado suficientes para per-
ceber que a qualidade somente poderá ocorrer, interferindo na realidade para
sua transformação, se a ação para tal for coletiva e coerente ao projeto também
construído coletivamente.

O professor Carlos Henrique Carrilho Cruz coloca “Quanto mais clara for essa
opção e coerente for a ação que a realiza, maior qualidade terá a ação educativa
e a escola.”

As discussões acerca da busca de qualidade em educação já possuem uma


estrada longa, já se falava em qualidade total na empresas com grande ênfase e
já começava a ser implantada em algumas instituições de ensino, ainda que su-
tilmente. Uma delas foi o Sistema de Ensino Pitágoras, que começou a abrir suas

122
A qualidade como processo e qualidade total: estabelecendo paralelos

portas para as mudanças em busca da qualidade dentro das novas concepções


de qualidade, ou seja da qualidade total. Evando José Neiva, um dos fundadores
do sistema, concedeu uma entrevista à revista Dois Pontos, que fala sobre suas
ideias e vivências para implantação do processo de Qualidade Total. Transcreve-
mos ­alguns trechos, para unirmos a teoria a uma situação real:

D. P. – Como se coloca em prática a qualidade total?

Evando – A prática da qualidade total exige a mudança de comportamen-


to, aspecto que representa também a maior dificuldade do processo. É preciso
desenvolver uma nova consciência, novas crenças e valores para suportar a mu-
dança. Em todos os cursos sobre qualidade total em educação que ministramos,
e já o fizemos até para rede pública de ensino de 2.º grau de Contagem, temos
percebido que, embora a escola demore algum tempo a entrar no processo, o
pessoal da área de educação está bastante sensibilizado e motivado a buscar
um caminho que realmente signifique a melhoria de ensino. A qualidade total é
uma alternativa.

D.P. – Percebe-se que é outra a relação professor-aluno. Como se estabe-


lece essa nova postura?

Evando – De fato, é uma relação vista como prestação de serviços: o professor


serve ao aluno, que é o cliente, assim como o diretor e os técnicos pedagógicos e
educacionais servem ao professor, cliente que é dessas pessoas. Então, se o pro-
fessor se reconhece como quem serve ao aluno, seu comportamento em relação
a esse aluno será mudado. Ao fazer isso, o professor não vai perder sua posição de
educador, não vai se humilhar. Ele vai ter uma postura humilde, não humilhante.
É uma postura nova, que exige que ele colha dos alunos informações sobre o an-
damento do curso e, em consequência, atue corretivamente para melhorá-lo. Nós
estamos a serviço uns dos outros e só assim é que vamos servir melhor, criar mais
satisfação e ficar mais satisfeitos, porque a satisfação é um sentimento recíproco.
Estamos buscando uma relação em que satisfação, orgulho do trabalho, desejo
de ultrapassar as expectativas indo além permeiem todos os níveis.

Esta entrevista não pode ser descontextualizada, ela se passou em 1993. De lá


para cá algumas posições foram aperfeiçoadas e reestruturadas, mas esta entre-
vista foi escolhida porque marca toda uma mudança de postura e entendimen-
to a respeito da escola enquanto prestadora de serviço. Também reforça o que
vimos no início deste capítulo, quando falamos sobre as raízes da qualidade total
a aspectos administrativos, bem como e fundamentalmente, sobre a qualidade

123
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

da educação como um processo, que demanda tempo, estudo, compromisso,


gestão participativa etc.
Para projetos educativos que propõem uma educação integral, por fim, é importante ressaltar
que, quanto mais abrangente for a resposta educativa, quanto mais dinâmica, quanto mais
aspectos da vida ela vivenciar dentro da escola, mais perto está de uma escola de Qualidade
Total.

É de qualidade porque vivencia concreta e processualmente os ideais propostos no seu


referencial de trabalho definidos participativamente pelo grupo que o põe em prática.
Essa qualidade é total porque abarca as várias dimensões da vida humana, do político ao
econômico, do artístico ao cognitivo, do mundo ao transcendente e por que não se sustenta
apenas pela vontade de um líder, mas pela opção de um grupo que assumiu coletivamente um
ideal de sociedade e pessoa humana e busca concretizá-lo historicamente e processualmente,
articulando sua ação educativa com ação de outros grupos sociais que têm a mesma ­opção de
transformação social. (CRUZ, 1994).

Acreditamos ter conseguido estabelecer o paralelo entre a qualidade como


processo e a qualidade total pelos referenciais e comentários até aqui expostos,
em alguns momentos o que parece se assemelhar, nos princípios, no processo
e principalmente em seus resultados, os quais com premissa devem ser espera-
dos, são díspares. Entretanto, no intuito de ampliar a nossa visão em relação a
que tipo de qualidade almejamos para as nossas escolas, evocamos outro edu-
cador/escritor que também traça paralelos, como aqui o fizemos, entre os dois
tipos de qualidade.

Primeiramente vamos à busca do entendimento em Libâneo (2004). A quali-


dade total, oriunda da concepção neoliberal da economia, largamente difundida
como noção de qualidade, inicialmente teve sua proposta e elaboração voltada
para a empresa capitalista, todavia expande-se também para a escola e sistemas
escolares,
[...] a qualidade total tem como objetivo o treinamento de pessoas para serem competentes no
que fazem, dentro de uma gestão eficaz de meios, com mecanismos de controle e avaliação
dos resultados, visando a atender a imperativos econômicos e técnicos. (LIBÂNEO, 2004)

Cita algumas medidas em função dessa concepção organizacional, quais


sejam:

 hipervalorização dos resultados da avaliação;

 classificação das escolas em função dos resultados avaliativos, objetivan-


do estimular a competição;

 descentralização administrativa e repasse dos recursos de acordo com os


resultados obtidos na avaliação externa;

124
A qualidade como processo e qualidade total: estabelecendo paralelos

 parcerias com a iniciativa privada;

 repasse das funções do Estado para a comunidade e empresas.

Finaliza expressando “a qualidade total decorre de uma concepção econo-


mista, empresarial, pragmática.” (LIBÂNEO, 2004).

Inicia o seu estabelecimento do paralelo entre as duas concepções de quali-


dade, pela defesa da qualidade social, portanto, opondo-se à da qualidade total,
afirmando:
Educação de qualidade é aquela que promove para todos o domínio de conhecimentos e o
desenvolvimento de capacidades cognitivas, operativas e sociais necessários ao atendimento
de necessidades individuais e sociais dos alunos, à inserção no mundo do trabalho, à
constituição da cidadania, tendo em vista a construção de uma sociedade mais justa e
igualitária. (LIBÂNEO, 2004)

Consideramos importante, ainda, apresentar as características de uma educação


escolar de qualidade social, destacadas por Libâneo, aqui apenas mencionadas:

 sólida formação que possibilita desenvolvimento cognitivo, operativo e


social;

 processos de formação para a cidadania;

 elevação do nível escolar para todas as crianças;

 integração entre a cultura escolar e outras culturas;

 formação de qualidades morais, de acordo com ideais humanistas;

 condições físicas, materiais e financeiras necessárias a um bom funciona-


mento;

 cotidiano escolar contemplado com novas tecnologias da comunicação e


da informação.

Antagônicas para o autor as concepções de qualidade discutidas, deixando a


clareza da intencionalidade apenas capitalista, ou seja, aprende a aprender para
responder, em serviço – na empresa – aos interesses políticos e sociais voltados
ao capital, que forçosamente excludentes, em detrimento do desenvolvimento
humano enquanto sua realização para a construção e participação na socieda-
de, podendo intervir nesta, com competência, para a melhoria de sua vida e do
seu entorno.

125
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Texto complementar

Lições provenientes de escolas democráticas


(APPLE; BEANE, 2000)

Vivemos numa época em que o próprio significado de democracia está a


sofrer mudanças radicais. Em vez de se referir as maneiras através das quais
a vida institucional e política são moldadas por uma participação igualitá-
ria, activa, abrangente e altamente informada, a democracia está, cada vez
mais, a ser definida como sendo o equivalente de manobras mercantis não
regulamentadas numa economia de livre mercado. Na sua aplicação a esco-
las, esta redefinição tem vindo a resultar não só em tentativas de aumento
de isenções fiscais e atribuições de planos voucher para a educação, gestão
por companhias privadas, produtos media e materiais comercializados, bem
como no abandono dos ideais mais abrangentes de uma educação pública
(APPLE, 1993).

Esta degradação tem-se vindo a alastrar ao ponto de uma firma privada de


consultadoria ter recomendado que o termo “público” seja eliminado da ex-
pressão “escolas públicas” devido ao seu uso em vocábulos, como habitação,
bibliotecas, rádio e programas de assistência, ter vindo a ter uma conotação
negativa. De tal forma é o poder da manipulação linguística: compromissos
sociais para o bem comum são vistos agora como “embaraços públicos”.

As escolas descritas, neste livro, fazem parte de uma corrente maior que
ilustra a redefinição da democracia na educação. As escolas estão intensa-
mente envolvidas na tentativa de encontrar maneiras práticas de aumentar
a participação significativa de todos os intervenientes na experiência educa-
cional, incluindo também pais, residentes locais e, muito especialmente, os
alunos. Das suas experiências, podemos verificar que este objectivo é atin-
gível através da criação de comunidades de aprendizagem dentro de cada
escola e entre a escola e a comunidade em geral (vide também SMITH, 1993).

Em todas estas escolas, o currículo é baseado na crença de que o conheci-


mento se torna importante para estudantes e professores somente quando
é relacionado com aspectos sérios. O desempenho intelectual rigoroso é
valorizado, não por causa de níveis simbólicos ou publicidade conveniente
ou adequada, mas sim por causa da sua capacidade de fazer uma grande

126
A qualidade como processo e qualidade total: estabelecendo paralelos

diferença na maneira como compreendemos e actuamos, poderosamente,


no mundo social em que vivemos.

A necessidade de um processo de avaliação dramaticamente diferente


dos procedimentos relativamente mecanizados e redutoramente estandar-
dizados, usados por tantos dos sistemas escolares, é também visível nestas
escolas pioneiras.

A noção de um currículo temático domina estas escolas, não simplesmen-


te como uma metodologia eficaz que mantém os miúdos satisfeitos, mas
porque esta abordagem implica por em prática o conhecimento relativo a
problemas e assuntos verídicos (BEANE, 1993).

A focalização sobre o que é chamado “necessidades comunitárias não


cumpridas” na Rindge, sobre assuntos sociais e ecológicos na Fratney e Mar-
quette, ou sobre a procura de respostas a “questões sérias” na Central Park
East está presente porque o conhecimento é repensado de modo diferente.

O conhecimento, em vez de se traduzir em listas de conceitos, factos e


destrezas que os alunos aperfeiçoam para os testes de avaliação estandar-
dizados (e que, na generalidade, esquecerão), encontra-se intimamente
relacionado com as comunidades e com as biografias de pessoas reais. Os
alunos aprendem que o conhecimento estabelece a diferença nas vidas das
pessoas, inclusive nas deles.

A noção do conhecimento pode ser vista na ênfase evidenciada em


Rindge na transformação da educação vocacional. Neste contexto, a educa-
ção vocacional não é simplesmente o ensino de destrezas flexíveis a futuros
trabalhadores que, supostamente, serão necessárias para o século XXI, pois,
não obstante a retórica política e educacional atestar o contrário, a maior
parte das previsões econômicas demonstra que quase todos os empregos
que a economia moderna está a criar exigem destrezas mínimas, são em
part-time e mal pagos (APPLE, 1989).

Na Rindge, a educação vocacional é desenhada como uma preparação


para um modelo aperfeiçoado de cidadania activa na qual a todas as pessoas
é dado o poder de tomar importantes decisões sobre as instituições onde
trabalham e vivem – agora e no futuro.

Esta mesma ideia é evidente na ênfase, nas escolas Marquette, Fratney


e Central Park East, dada ao desenvolvimento de currículos que apelam às

127
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

preocupações actuais e aos sonhos futuros dos alunos, dos professores e das
comunidades que têm tanto a ganhar como a perder nestas escolas.

Não pretendemos ser românticos de olhos enamorados. Os autores


destes capítulos são honestos sobre as dificuldades com que ainda se depa-
ram: reduções financeiras, pressão de grupos poderosos para definirem os
objectivos escolares em termos das necessidades comunitárias de mercado,
ataques ultraconservadores sobre programas e materiais, a obsessão com a
medição de tudo que aconteça na sala de aula, a intransigência burocrática
e uma sociedade à qual foi dito que as escolas públicas não conseguem pro-
ceder de maneira criativa. O que é talvez mais impressionante sobre estas
escolas é o seu progresso impressionante face aos desafios que enfrentam.
Várias lições são daqui depreendidas.

Um facto que emerge, claramente, destes testemunhos é a atenção que


os educadores prestam às realidades “mundanas” da vida quotidiana nas es-
colas. Estas histórias lembram-nos que o significado mais poderoso da de-
mocracia é formado não em retóricas políticas polidas, mas nos detalhes das
vidas vividas todos os dias.

Nestas escolas, as pessoas consideram, seriamente, as realidades do de-


senvolvimento curricular, o ensino, a avaliação, e as vidas dos alunos e dos
professores que têm de cooperar para possibilitarem o funcionamento real
destas escolas. Dizer que as pessoas estão dedicadas a estas questões pode
parecer uma reafirmação desnecessária do óbvio; até porque os mesmos tó-
picos fazem parte de qualquer discurso “reformador” em qualquer sala das
universidades.

Todavia, o que é notável nestes educadores é que se recusam a permitir


que as restrições financeiras difíceis, os quase sempre inflexíveis regulamen-
tos burocráticos e as imensas pressões e exigências sociais impostas às es-
colas constituíssem algum obstáculo ao desenvolvimento das experiências
educacionais que fazem uma grande diferença na vida dos seus alunos. Ao
encarar condições como estas como desafios a serem ultrapassados, e não
como desculpas para a inacção, estes educadores demonstraram uma qua-
lidade a que todos nós deveríamos aspirar, a qualidade de uma coragem in-
vulgar. Estes educadores também conseguiram evocar uma educação que
é disciplinada e afectuosa; eles não providenciam fórmulas para alunos,
professores ou administradores. Uma educação deste tipo é o resultado de
muito trabalho por parte de todos os envolvidos.

128
A qualidade como processo e qualidade total: estabelecendo paralelos

[...]

Em vez de gastarem a maior parte do seu tempo em tarefas administra-


tivas, com os currículos e com a avaliação, que estão desligados dos seus
alunos e das comunidades que eles servem, em vez de continuarem a repro-
duzir as condições que fazem de tantos dos nossos mais talentosos profes-
sores e administradores sentirem-se frustrados nas suas vidas quotidianas,
estes educadores optaram por alterar o rumo do seu trabalho.

[...]

Uma das tragédias mais claras das tentativas de reforma escolar actual
é que as pessoas envolvidas possuem um conhecimento quase inexistente
das muitas tentativas com sucesso de construir escolas mais democráticas.

A história da reforma escolar progressiva documenta o facto de que os


milhares de professores, administradores, activistas comunitários e outros
passaram as suas vidas profissionais na tentativa de construírem instituições
que estivessem mais atentas aos planos educacional e social. Temos muito a
ganhar se prestarmos atenção aos seus sucessos e ao modo como enfrenta-
ram e lidaram com dificuldades.

Existem vários sítios aos quais educadores podem recorrer para contar
as suas histórias e para ouvir o que outros têm feito: grupos como Repensar
a Escola em Milwaukee, o Instituto pela Democracia na Educação em Ohio,
Educadores para a Responsabilidade Social, A Coligação Nacional de Activis-
tas Educacionais, e publicações como Ensinar a Tolerância, Repensar a Escola,
Democracia e Educação e Equidade e Excelência.

Estes grupos e publicações providenciam espaços para partilhar e ouvir,


o que fará muito para contrapor o cinismo e o desespero que muitos educa-
dores sentem quando são confrontados com as dificuldades quotidianas no
bom desempenho das suas responsabilidades nestes tempos incertos.

[...]

Poderíamos, assim, descobrir que este volume se tornaria somente o pri-


meiro de uma série que relata a emergência de escolas democráticas. Deste
modo, podemos afirmar que a nossa melhor esperança para contrapor as
tendências arrogantes que, actualmente, são impostas às escolas por grupos
com agendas políticas autoritárias, por centralistas e por privatizadores é

129
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

precisamente demonstrar que existem escolas públicas que de facto funcio-


nam e que o fazem ao trazerem a verdadeira democracia para a vida. A vida
e o futuro dos nossos filhos estão em jogo. Não podemos esperar que sejam
os outros a decidir. [sic]

Dica de estudo
O filme: Fazendo História, Twentieth Century FOX.

Uma instigante história. Tem como foco principal a dinâmica de uma escola
em relação a um grupo de excelentes alunos. O grande objetivo da escola, de
seu diretor, é o ingresso desses alunos nas Universidades de Oxford e Cambrid-
ge, bem como pela motivação também desses alunos e seus familiares. Para isso,
as dúvidas metodológicas surgem e se confrontam, e, nesse confronto mudan-
ças de horários, de professores, de estratégias acontecem. O entendimento de
aprendizagem, de conhecimento, de cultura também é outro motivo de diálo-
gos acirrados entre alunos e professores.

Atividades
1. Ao se falar em qualidade de educação e aprendizagem cidadã, deve-se fazer
a indagação: que homem e que sociedade se deseja construir?

130
A qualidade como processo e qualidade total: estabelecendo paralelos

2. Com base no texto trace o paralelo entre as duas propostas: qualidade em edu-
cação e qualidade total quanto ao papel e desempenho que se espera:

Qualidade em educação Qualidade total


Princípios
norteadores

Relação
professor-aluno

Metodologia/
avaliação

131
Conceitualizando:
qualidade e produtividade

Discutindo qualidade
Tente imaginar algumas situações:

Você está na internet e o provedor cai justo na hora em que você havia
encontrado o que precisava. Qual a qualidade do seu provedor?

Você comprou uma roupa e na primeira lavagem ela encolheu. Qual a


qualidade do produto que você comprou?

Você elegeu um político que foi indiciado por fraude. Qual a qualidade
da sua escolha?

Você estuda em uma escola que não lhe ensina a pensar, mas sim a
reproduzir conhecimentos. Qual a qualidade de ensino que você está re-
cebendo? Que formação você terá? E como o reflexo dessa formação con-
tribuirá para uma melhora na sua qualidade de vida?

Acreditamos que tenha sido fácil responder a essas perguntas, pois na


verdade são reflexões a respeito das escolhas feitas em nossas vidas. Ou
vivemos para a busca da qualidade ou aceitamos pateticamente o que
nos mostra a vida, pois essa questão está presente (ou talvez ausente) em
praticamente todos os momentos da nossa existência.

O que se entende por qualidade?


Entende-se qualidade como um conceito que envolve a dimensão
humana. Se queremos quantificar e mensurar, vemos ou provamos a ex-
tensão, o concreto de algo, estamos assim, falando estritamente de quan-
tidade, enquanto que a qualidade proporciona o valor qualitativo, apon-
tando para uma dimensão de intensidade. A qualidade torna-se o fator
humano aplicado à quantidade, é o diferenciador humano em relação à
busca da perfeição, à consciência, à participação e à construção de algo.
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Sendo qualidade a busca qualitativa de vida, sustenta-se em Demo (2003,


p.12) que,
[...] qualidade representa o desafio de fazer história humana com o objetivo de humanizar a
realidade e a convivência social. Não se trata apenas de intervir na natureza e na sociedade, mas
de intervir com sentido humano, ou seja, dentro de valores e fins historicamente considerados
desejáveis e necessários, eticamente sustentáveis. A intensidade da qualidade não é a da força
(som intenso, por exemplo), mas da profundidade, da sensibilidade, da criatividade.

Posto isto, conclui-se que a responsabilidade pela qualidade de vida no


âmbito social é do ser humano, frente à sua intervenção e participação no con-
texto social. É o homem quem deve construir a qualidade da sua história e, con-
sequentemente, da sociedade.

Maria Cândida Moraes (1997) complementa esta ideia, dizendo:


Existe, hoje, uma aspiração legítima de todo ser humano em direção a uma melhoria na
qualidade de vida, nos processos, nas relações humanas, na qualidade do ensino, o que
caracteriza uma busca de qualidade total por parte da maioria da população. Total porque
abrange todos os segmentos e convoca a participação de todos.

Quando se fala em qualidade na educação ou educação de qualidade, leva-


-nos a unir tais conceitos como a busca do fator humanizador no processo edu-
cacional, busca-se, então, “ensinar muito bem” (muito – quantitativo/bem – qua-
litativo). Tendo como desafio alcançar uma qualidade visando a igualdade de
oportunidades.

A conceituação de qualidade em educação como:


Capacidade de proporcionar aos alunos o domínio de códigos culturais básicos, a capacidade
para a participação democrática e cidadã, o desenvolvimento da capacidade de resolver
problemas e seguir aprendendo, o desenvolvimento de valores e atitudes compatíveis com
uma sociedade que deseja uma vida de qualidade para os seus habitantes. (MORAES, 1997).

Moraes (1997, p. 194) reforça esta definição, teorizando:


Na atual conjuntura, qualidade educativa envolve também a preparação dos indivíduos
para que reconheçam a interdependência dos processos individuais e coletivos, a percepção
da transpessoalidade dos contatos entre o ser humano e a natureza, além da consciência
­espiritual.

O diferencial de uma educação de qualidade está intimamente ligado, por


conseguinte, à cidadania, sendo esta a “capacidade culturalmente construída de
fazer uma história própria participativa” (CEPAL, 1992 apud DEMO, 2003, p. 13).

134
Conceitualizando: qualidade e produtividade

De que forma acontece ou se produz qualidade?


A busca por esta educação confronta-se com a realidade de que o desenvol-
vimento humano está sustentado pela produção econômica e pela cidadania,
distinguindo dois tipos de qualidade: a formal e a política.

A primeira, a qualidade formal, refletindo a habilidade para manejo e pro-


dução de conhecimento, é um meio, um instrumento, tornando-se atributo da
técnica, muitas vezes a serviço da tecnologia, em busca da excelência, ou seja,
utilizar de toda técnica, de métodos, meios e procedimentos para a mais eficaz
construção do conhecimento.

A segunda, a qualidade política, em sintonia com o conceito de cidadania,


reflete a competência em fazer história, em participação, no ambiente escolar é
inspiradora da construção do Projeto Político-Pedagógico, necessitando da par-
ticipação de toda comunidade escolar, tornando-se um assumir em conjunto,
facilmente observado na ação de cada envolvido focando uma vida ética, posta
a serviço do bem comum.

Não se pode dissociar uma da outra, pois viver dotado de conhecimento, mas
sem princípios éticos, não se faria história de qualidade, assim como ser dotado
dos princípios éticos, porém sem acesso ao conhecimento, tornaria-o segrega-
do, excluído e da mesma maneira não se faria história de qualidade, frente ao
desenvolvimento e história humana.

E nos perguntamos, então, por que se preocupar com uma educação de qua-
lidade ou qualidade na educação?

A resposta é fácil:

 é na escola que se constrói, se apropria, se propaga, se transpira e se ins-


pira conhecimento;

 é na escola que somos introduzidos à responsabilidade social, ao adquirir-


mos conhecimento;

 é a escola a detentora da responsabilidade formativa do cidadão;

 a escola é o locus da formação do sujeito histórico-crítico, criativo, parti-


cipativo.

135
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Solidariedade, compaixão, compromisso, alegria, felicidade etc., todos são


indicativos de intensidade – aplicada à educação. São reflexos de qualidade
­educacional, uma educação preocupada com o sujeito em formação e, assim, a
educação toma a conotação de indicador de qualidade por estar posta a serviço
da formação humana.

Chegamos, então, à máxima da “qualidade de vida”. Esta não está ligada so-
mente ao bem-estar físico como comumente escutamos. Qualidade de vida en-
globa as condições totais de uma pessoa, estando aqui presente a consciência a
respeito da mesma.

Fazemos aqui o uso da poesia “O operário em construção”, de Vinicius de


Moraes que, apesar de longa e até por isso, nos faz refletir sobre sua utilização
ou não neste texto. Enfim, decidimos colocar parte da poesia, pois ela é tão ilus-
trativa e real que nos leva a convidá-los à leitura e à releitura.

E o Diabo, levando-o a um alto monte,


mostrou-lhe num momento de tempo
todos os reinos do mundo.
E disse-lhe o Diabo:
– Dar-te-ei todo este poder e a sua glória,
porque a mim me foi entregue e dou-o a quem quero;
portanto, se tu me adorares, tudo será teu.
E Jesus, respondendo, disse-lhe:
– Vai-te, Satanás; porque está escrito:
adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás.
Lucas, 4, 5-8.

O operário em construção
Era ele que erguia casa
[...]
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia

136
Conceitualizando: qualidade e produtividade

De sua grande missão:


Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.
De fato, como podia
Um operário em construção
Compreender por que um tijolo
Valia mais do que um pão?
[...]
Além uma igreja, à frente
Um quartel e uma prisão:
[...]
Um operário em construção.
Mas ele desconhecia
[...]
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
[...]
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
[...]
Que tudo naquela mesa
[...]

137
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Ele, um humilde operário


Um operário que sabia
Exercer a profissão.
Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
[...]
Um mundo novo nascia
[...]
Operário emocionado
Olhou sua própria mão
[...]
De operário em construção
E olhando bem para ela
Teve em um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela.
Foi dentro da compreensão
Desse instante solitário
Que, tal sua construção
Cresceu também o operário.
Cresceu em alto e profundo
Em largo e no coração
E como tudo que cresce
Ele não cresceu em vão
Pois além do que sabia
– Exercer a profissão –

138
Conceitualizando: qualidade e produtividade

O operário adquiriu
Uma nova dimensão:
A dimensão da poesia.
[...]
E assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção
E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.
[...]
Dia seguinte, o operário
Ao sair da construção
Viu-se súbito cercado
Dos homens da delação
E sofreu, por destinado
Sua primeira agressão.
[...]
Mas quando foi perguntado
O operário disse: Não!
Sentindo que a violência
Não dobraria o operário
Um dia tentou o patrão
Dobrá-lo de modo vário.

139
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

[...]
Mostrou-lhe toda a região
E apontando-a ao operário
Fez-lhe esta declaração:
– Dar-te-ei todo esse poder
E a sua satisfação
Porque a mim me foi entregue
E dou-o a quem bem quiser.
[...]
Portanto, tudo o que vês
Será teu se me adorares
E, ainda mais, se abandonares
O que te faz dizer não.
Disse, e fitou o operário
Que olhava e que refletia
Mas o que via o operário
O patrão nunca veria
[...]
Misteriosamente havia
A marca de sua mão.
E o operário disse: Não!
– Loucura! – gritou o patrão
Não vês o que te dou eu?
– Mentira! – disse o operário
Não podes dar-me o que é meu.
E um grande silêncio fez-se
Dentro do seu coração

140
Conceitualizando: qualidade e produtividade

Um silêncio de martírios
[...]
Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
[...]
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão.
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquisito
Razão porém que fizera
Em operário construído

O operário em construção.

A busca de qualidade dá-se efetivamente quando uma pessoa conhece o


contexto socioeconômico, político e cultural e consegue entender a sua partici-
pação, passando a intervir nele de maneira consciente.

No contexto educacional esta busca caracteriza-se pela construção de conhe-


cimento, diferente de transmissão de conhecimento. A construção do conhe-
cimento requer participação, é o aprender a aprender, enquanto transmissão
retrata somente o repasse e a absorção de conhecimento, calcados em velhas
metodologias e didáticas de ensino.

O docente toma a figura de catalisador, frente à sua atitude construtiva (cata-


lisa o saber para auxiliar na construção do conhecimento), unindo o histórico ao
atual, para intervenção e planejamento de futuro – este será o sujeito conscien-
te, crítico e transformador. E, este será o produto da qualidade.

141
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Recorremos a José Carlos Libâneo no intuito de ampliar a nossa visão sobre qua-
lidade. Ele nos traz a qualidade social, buscando a excelência na educação por meio
da qualidade educacional, visando, também, a constituição da cidadania e ­deixando
evidente sua concepção em suas obras, como nesta citação:
Educação de qualidade é aquela que promove para todos o domínio de conhecimentos e o
desenvolvimento de capacidades cognitivas, operativas e sociais dos alunos, à inserção no
mundo do trabalho, à constituição da cidadania, tendo em vista a construção de uma sociedade
mais justa e igualitária. Em outras palavras, escola com qualidade social significa a inter-relação
entre qualidade formal e política, é aquela baseada no conhecimento e na ampliação de
capacidades cognitivas, operativas e sociais, com alto grau de inclusão. (LIBÂNEO, 2004, p. 66)

Apresenta, ainda, as características de uma educação escolar de qualidade


social, a seguir colocadas em síntese:

 sólida formação, aliando habilidades individuais às urgências tecnológi-


cas atuais;

 formação para cidadania, desenvolvendo modelos de gestão e participação;

 igualdade de oferta educacional a todos;

 integração cultural;

 formação de caráter;

 disposição e valorização do capital humano, físico e financeiro;

 incorporação das mudanças sociais no dia a dia da escola, especialmente


quanto às tecnologias da comunicação e informação.

Libâneo considera como meios e não como fins, os processos de organização


e gestão educacional, a avaliação institucional, a avançada tecnologia, as altera-
ções curriculares como fatores relevantes à promoção de qualidade.

Entretanto, para que realmente ocorra a qualidade, é necessária a busca in-


cessante por parte das escolas da qualidade cognitiva das experiências de apren-
dizagem dos alunos, indagando, ou seja, pesquisando sempre, de acordo com
Libâneo (2004, p. 69) “o que os estudantes aprendem, como aprendem e em que
grau são capazes de pensar e atuar com o que aprendem?”

Ao finalizarmos esta unidade, em decorrência do estudo que desenvolvemos,


pudemos perceber, então, que a

 qualidade constitui-se num processo de construção e participação c­ oletiva;

 sendo a qualidade, como Pedro Demo enfoca, questão de competência


humana;
142
Conceitualizando: qualidade e produtividade

 e para que e a qualidade realmente ocorra faz-se indispensável a presença


da consciência crítica e da capacidade de ação.

Aponta, ainda, Demo, para a conquista da qualidade, mediante a sociedade


atual, a capacidade de enfrentamento a dois desafios principais:

 o construtivo – está voltado à capacidade de iniciativa, de proposições, co-


locando o homem na condição de sujeito histórico, autônomo e criativo;

 o participativo – está voltado à capacidade de inovar para o bem comum,


objetivando uma sociedade democrática, pacífica e igualitária.

Pedimos a releitura do poema “O operário em construção”, de Vinicius de


Moraes, para que a contextualização e a compreensão do que é qualidade ao ser
humano, na concepção aqui trabalhada, seja perfeita.

Texto complementar

É hora de investir em qualidade


(ANTUNES, 2008)

Gestão transparente, professores criativos


e diretores capacitados, com Ensino Superior
Para o educador Celso Antunes, esse é o tripé que pode sustentar um
Ensino Público de qualidade no Brasil. Antunes não se autoclassifica como
um otimista, mas acredita que há sinais de evolução na Educação Básica,
mesmo diante de um cenário em que cerca de 50 mil escolas tiraram média
3,5, numa escala de 0 a 10, segundo apontou o Índice da Educação Básica
(Ideb), divulgado pelo Ministério da Educação (MEC) no ano passado. A
meta do governo é atingir, em 2022, a nota 6 em todas as escolas públicas
do país.

Para o educador, as escolas que vão mal devem olhar com cuidado para
as que obtiveram bom desempenho. Do total de escolas avaliadas pelo MEC,
0,3%, ou seja, 178 submetidas às mesmas provas, tiraram nota 6 ou mais.
“Se existem essas ilhas de qualidade e, se o que fazem não envolve custos

143
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

nem gastos, é possível que o mesmo seja feito pelas demais. A esperança de
melhora está aí”, diz.

O que Antunes propõe não é seguir receitas prontas, mas medidas que
envolvem a gestão, o professor, a prática pedagógica, a permanênda do
aluno e o envolvimento familiar. “O mais interessante é que essas escolas
nunca conversaram entre si e adotaram linhas de ações semelhantes. Isso
exclui aquela ideia de que estados mais ricos têm melhor educação”, diz.

Mestre em Ciências Humanas, especialista em inteligência e cognição


e com mais de 180 livros publicados na área de educação, Celso Antunes
esteve na quinta-feira passada em Curitiba, durante o 2.° Fórum Extraordi-
nário da Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação)
no Paraná. Antunes conversou com a Gazeta do Povo sobre qualidade nas
escolas públicas.

Como obter qualidade na educação pública no país?

E possível pensar que, se as escolas com notas baixas fizerem o que fazem
as que têm padrão de qualidade potencial, todas poderão alcançar qualida-
de. Não é fácil, não é um trabalho de um ano e não é uma receita de bolo. São
resultados concretos que podem ser obtidos com envolvimento de todos,
desde o gestor, passando pelo professor, alunos e família.

E como é possível fazer isso?

O gestor, diretor, coordenador, enfim, aquela figura central da escola,


sempre deve ser alguém com formação superior. Já os professores não con-
cebem uma forma única de dar aula, são rigorosos, mas carinhosos, com for-
mação superior e se aprimoram sempre. Esses professores não são animados
salarialmente, mas com medalhas de honra ao mérito.

Além de premiar os professores, o que mais pode ser feito?

Adotar diferentes maneiras de dar aula, de pensar currículo e avaliação.


E adotar práticas pedagógicas contemporâneas, similares às que são desen-
volvidas em outros países. Aulas expositivas, discursivas, são uma maneira
de dar aula, mas não as únicas. Todas essas escolas possuem atividades pe-
dagógicas em que o aluno é protagonista. Os diretores devem ainda incitar o
envolvimento familiar e atendimento para os alunos com mais dificuldades.
Faço uma paródia com as UTls dos hospitais, mas chamo de ULI. É uma Uni-
dade de Leitura Intensiva para alunos que precisam de reforço, de ajuda.

144
Conceitualizando: qualidade e produtividade

O que levou a esse quadro de baixa qualidade na educação?

Há cerca de 30 anos, o Brasil tinha praticamente 40 milhões de crianças


fora da escola. Ou porque a população vivia no meio rural e não tinha escola
ou porque a própria classe média era muito pouco significativa e a classe
pobre entendia que se o filho se alfabetizasse tudo bem, mas não era preciso
ir muito além disso. Mas o Brasil começou a ser pressionado por uma série
de organismos internacionais, dentro já de um conceito de globalização. E o
governo tratou de colocar todo esse pessoal dentro da escola e conseguiu.

Então as crianças estão na escolas, mas nem todas recebem ensino


de qualidade?

Foi um formidável salto de quantidade, mas sem qualidade. Escolas foram


criadas em qualquer canto, em qualquer bairro e professores formados de
qualquer maneira. Agora que não é mais preciso abrir escola do dia para a
noite, dá para investir em qualidade. A escola pública no Brasil chegou a esse
descalabro porque ela precisou dar um salto quantitativo anormal.

A publicação de avaliações feitas pelo MEC por instituições é recente.


É importante expor à opinião pública o desempenho de cada escola e
região do país?

Indiscutivelmente, essa exposição é desconfortável. Se fosse prefeito ou


secretário de Educação, eu gostaria que os defeitos do meu município não
aparecessem. Mas você só pode curar sua doença se souber de seu estado
de saúde. Acho que a transparência é o caminho para a democracia.

As estatísticas mostram que é um desafio manter jovens e adoles-


centes dentro das escolas. Como fazer com que a escola seja atraente?

Essa é a fuga de uma escola chata, falida e até uma fuga inteligente para o
aluno que percebe que está perdendo o seu tempo. Os jovens fogem dessa
escola retrógrada, descompromissada e que realmente não tem muita razão
de ser. A evasão é muito mais um sintoma de escola de má qualidade do que
razão de natureza social. Eu reitero que dificilmente os alunos fogem de uma
escola profissionalizante que realmente prepara os jovens e adolescentes
para o mercado.

“Se existem essas ilhas de qualidade e, se o que fazem não envolve custos
nem gastos, é possível que o mesmo seja feito pelas demais. A esperança de
melhora está aí.”

145
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Dica de estudo
DEMO, Pedro. Educação e Qualidade. Campinas, SP: Papirus, 1994. Coleção Ma-
gistério: Formação e Trabalho Pedagógico.

Pedro Demo discute conceitos de qualidade, quantidade, colocando-os em


paralelo e em confronto e nos leva a indicativos da prática e do fazer qualidade.
Vê qualidade para atingir qualidade de vida e esta não há como se obter sem
educação. E, ainda, esta só será de qualidade se possibilitar a formação do sujeito
histórico e criativo. O desafio, então, está no ultrapassar da mera aprendizagem
para o aprender a aprender e fazer da escola o local privilegiado da educação e
do conhecimento. Para propiciar base educativa para uma sociedade que busca
a cidadania.

Atividades
1. Conceitue qualidade, a partir da sua compreensão do texto.

146
Conceitualizando: qualidade e produtividade

2. Quais os desafios principais apontados por Pedro Demo para a conquista da


qualidade na sociedade atual? Explique-os.

147
Retomando a gestão democrática:
instrumento principal para a transformação
do processo qualitativo da educação
Vamos à busca da necessária compreensão do surgimento de uma nova
perspectiva de gestão em que fundamentou-se e consolidou-se como o
principal veículo à educação de qualidade e, por conseguinte, a formação
de alunos críticos, participativos e transformadores de uma sociedade.

Para abordarmos este assunto, nos inspiraremos em uma poesia, pois


esta em si já é um exemplo da necessidade de uma gestão democrática. A
poesia é a liberdade do pensamento, é todo poder criativo, é colocar em
símbolos o quase indecifrável mundo dos sentimentos.

Para pintar um pássaro

Jacques Prévert
Pintar primeiro uma gaiola
Com uma porta aberta
Pintar depois
Algo bonito,
Algo simples,
Algo belo,
Algo útil
para o pássaro;
Depois, encostar a tela em uma árvore
Num jardim, num bosque ou
numa floresta,
Se esconder atrás da árvore
Sem dizer nada
Sem se mexer
E, quando o pássaro chegar,
se ele chegar
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Guardar o mais profundo silêncio,


esperar que o pássaro entre na gaiola
e quando ele tiver entrado
Fechar docemente a porta com o pincel
Depois, apagar uma a uma todas as barras
Tendo o cuidado de não tocar nenhuma
das plumas do pássaro
Pintar, em seguida, a árvore
Escolhendo o mais belo dos seus galhos
para o pássaro
Pintar também a verde folhagem e a frescura do vento
A poeira do sol
E o barulho dos animais de erva no calor do verão
E, depois, esperar que o pássaro se decida a cantar
Se o pássaro não cantar
É mau sinal
Sinal de que o quadro é ruim
Mas, se ele cantar é bom sinal
Sinal de que você pode assinar, então tire suavemente
Uma das plumas do pássaro
E escreva seu nome num canto do quadro.

Maria Aglaê de Medeiros Machado, na revista Gestão em Rede, n. 12, de 1998,


estabeleceu paralelos a respeito do cenário atual e as consequências destes na
gestão, os quais reproduzimos, a seguir:

Cenário geral Consequências sobre a gestão


Alterações no sistema de produção, Os avanços tecnológicos, em especial a informática,
avanço do conhecimento e do desenvol- impulsionam as mudanças nos processos de gestão.
vimento tecnológico. Bases de dados relacionais, sistemas de redes, tem-
pos reais etc., têm transformado as formas de ges-
tão e de produção.
Sociedade mais complexa, mais diversa Os paradigmas tradicionais modificam-se: os pro-
e desigual, com um ritmo de transforma- cessos de gestão devem dar conta de gerir as no-
ção extremamente acelerado, marcada vas complexidades, com respostas mais flexíveis e
por um processo de urbanização gene- maior participação da sociedade – trata-se de gerir
ralizado e pela ampliação da polarização um processo permanente de mudança e não uma
econômica e social. situação.

150
Retomando a gestão democrática: instrumento principal para a transformação do processo qualitativo da educação

Cenário geral Consequências sobre a gestão


Esgotamento do papel do Estado (crise A gestão ganha valorização social como meio de
fiscal e do seu modo de intervenção). obtenção da eficiência e eficácia das instituições.
Ampliação do controle social pela po- A gestão converte-se em recurso crítico e estratégi-
pulação, implicando maior cobrança da co para o avanço de qualquer sociedade.
sociedade pela qualidade dos serviços
públicos.
A eficiência e a eficácia transformam-se O poder na sociedade do conhecimento associa-se a
em questão de Estado à medida que quem tem mais competência para competir, gerir a
passam a envolver custos políticos – a complexidade, decodificar e interpretar as informa-
sociedade não tolera mais a ineficiência ções, dar conta dos avanços tecnológicos e suprir
dos serviços públicos. necessidades sociais. Essas competências remetem
não só à questão da gestão mas à educação e à for-
mação dos gestores.

Maria Aglaê, com uma visão voltada à formação de gestores e buscando


contextualizar as mudanças pelas quais a gestão educacional passou, consegue
exemplificar as mudanças ocorridas para, consequentemente, reforçar e fazer
com que os gestores repensassem sua prática. Complementando,
Se a gestão se faz de modo democrático, compartilhado e com a participação dos ­profissionais
e da comunidade nas decisões, pode-se firmar, em sentido amplo, que todos os profissionais
da educação são gestores educacionais. (MACHADO, 1998, p. 14)

E a gestão democrática toma esta conotação, estando aliada indiscutivel-


mente e dependentemente à participação. Não se viabiliza a gestão democráti-
ca sem o compromisso de todos os envolvidos. Nos anos 1960, entendia-se par-
ticipação, na administração escolar, como ser integrante de algo. Hoje, participar
é comprometer-se. A gestão democrática impõe como condição a participação.
São interdependentes, ou seja, não é possível uma sem a outra.

Desde os anos 1970, quando o regime político autoritário levou o povo à des-
crença de que proporcionaria qualidade de vida às pessoas, ele já foi perdendo
forças, dando lugar à necessidade de maior participação (comprometimento)
das pessoas no cenário político, as pessoas (alunos), já não se ­permitiam ser
meros espectadores.

De acordo com Artemis Torres (1998, p. 13), esta crise fez aumentar:
1) a crescente desigualdade na distribuição de renda; 2) os atos institucionais com suas graves
repercussões no âmbito dos direitos de cidadania, como o cerceamento de liberdade de opinião
e de crítica; 3) o mínimo aumento do índice de alfabetização, que esteve longe de corresponder
às expectativas geradas pelo “milagre econômico”.

Outros fatos históricos no campo político como a greve geral do ABC, a lei
que permitia a criação de novos partidos políticos, a lei de anistia, a renovação

151
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

da política sindical, caminhando às Diretas Já; todos estes fatos que demons-
tram a consciência do povo de poder transformar e lutar pela qualidade de vida
faz com que o contexto educacional busque melhorias educacionais, vistas estas
como a democratização das relações e das políticas educacionais.

A administração escolar, entendendo-se gestão, era exercida por diretores, os


quais detinham o poder centralizado, deles vinham todas as decisões, hierarquica-
mente detinham todas as informações e não davam espaço à crítica ou sequer esti-
mulavam a liberdade de pensamento, ou seja, prendiam seus pássaros em gaiolas.

Ao passo que ocorriam mudanças no setor político, a denúncia e revolta de


professores e alunos fomentaram educadores a repensar os caminhos da edu-
cação e a gestão escolar. Um dos fatores mais difíceis era a descentralização do
poder, mas ultrapassada essa barreira, cada vez mais as escolas eram desejosas
de possibilitar a formação de sujeitos mais críticos e construtores de relações
mais sadias, culminando com a gestão democrática.

O caminho passado pela gestão vem de uma cultura autoritária, a qual limi-
tava a liberdade de pensamento, de expressão e participação, na qual o poder
era dos governantes e o povo era governado, o papel do professor era de trans-
missor de conhecimento, e os valores cultuados eram de individualismo, egoís-
mo e competição, a se chegar em princípios totalmente opostos na atualidade
como a participação nas decisões, caracterizando a todos como governantes e
na mesma proporção responsáveis pelos caminhos traçados, o professor passa
a ser o catalisador do saber e da construção do conhecimento e tendo valores
cultuados como a liberdade, igualdade, solidariedade e cooperatividade.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB – Lei 9.394, de dezembro de 1996)


formaliza e institui a gestão democrática nas escolas e vai além. Dentre algumas
conquistas destacam-se, segundo Luiz Fernando Dourado (2002, p. 149):

 concepção de educação: concepção ampla, estendendo a educação para


além da educação escolar (escolarização);

 fins da educação: educação como instrumento para o exercício da cida-


dania;

 educação como direito de todos e dever do Estado: “garantia” da universali-


zação do Ensino Básico (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio);

 gratuidade do ensino público em todos os níveis;

152
Retomando a gestão democrática: instrumento principal para a transformação do processo qualitativo da educação

 articulação entre os sistemas de ensino da União, dos Estados e do Distrito


Federal e dos Municípios;

 instituição do Conselho Nacional de Educação e do Fórum Nacional


de Educação, garantindo a representação de setores organizados da
­sociedade civil;

 gestão democrática nas instituições públicas.

As pessoas que vivenciaram e lutaram por condições melhores de vida e de


educação saudaram a nova lei. Mas a lei por si só não muda a atitude dos edu-
cadores se estes não entenderem e se comprometerem com as mudanças, pois
para aquelas pessoas que vinham de uma cultura autoritária a mudança repre-
sentava o caos.

A valorização das pessoas/profissionais envolvidos no processo de transfor-


mação deve ser uma constante, especialmente quando visa a uma mudança ra-
dical, pois o processo é lento e deve ser cauteloso. A concepção, ou seja, a visão
de mundo das pessoas não se altera rapidamente, com algumas ações.

Na construção da gestão democrática deve haver o incentivo ao crescimento


pessoal, intelectual e técnico dos sujeitos profissionais, possibilitando autono-
mia de ação e garantindo o aumento de eficiência do coletivo. O inverso ocorre
nas instituições burocráticas, ocasionando a manipulação e a alienação dos
sujeitos.
Esta crítica, de resto bastante conhecida, não quer dizer que a adaptação individual às
experiências amplamente participativas não vai requerer esforços pessoais e organizacionais
importantes, principalmente nos seguintes aspectos: adequação à cultura e história específicas
do grupo; envolvimento intenso com o trabalho; crítica e superação de uma formação
autoritária e burocrática inculcada pelo meio social em sentido amplo (familiar, escolar,
profissional, político etc.). (GUTIERREZ e CATTANI apud FERREIRA, 2000, p. 64)

Ao se pretender a construção de uma escola democrática define-se a de-


mocracia como princípio norteador e orientador do processo de construção da
escola e da gestão democrática.

Frente a essas mudanças, o que vem a ser a gestão democrática?

Artemis Torres (1998, p.16) define como sendo um


[...] projeto cujas condições de existência implicam, de uma parte, a responsabilidade
coletiva e, de outra parte, a vontade individual de transformar a própria consciência, pelo
autoconhecimento, pela autocrítica, pela humildade de aceitar a diferença como condição
para o diálogo e ação conjunta.

153
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

A gestão democrática, sempre que posta em questão, seja em nível de discus-


são e reflexão ou, e principalmente, de execução, na qual como premissa surge a
participação efetiva da comunidade escolar, passa a fazer parte imediatamente
de um campo utópico. Entendida aí, utopia, como algo ou lugar que não existe.
Entretanto, não quer dizer que não possa vir a existir.

Na medida em que não existe, mas que ao mesmo tempo coloca-se como
algo de valor, algo desejável do ponto de vista da solução dos problemas da
escola, a tarefa deve consistir, inicialmente, em tomar consciência das condições
concretas, ou das contradições concretas, que apontam para a viabilidade de um
projeto de democratização das relações no interior da escola (PARO, 1997, p. 9).

A gestão democrática passa, de fato, a ser a reestruturadora de relações inter-


pessoais mais sadias, a ser a responsável por levar a alegria e o prazer em apren-
der, orientados por gestores comprometidos com a realidade socioeconômica e
cultural.

Possibilita que todos os seres envolvidos na instituição possam exercer com


maior assertividade sua cidadania, relacionando-se melhor e alcançando a liber-
dade de expressão porque cada um dos envolvidos carrega em si um conhe-
cimento, que é único e que pode ser somado ao do seu colega e, quando se
trata de uma escola, ao dos seus alunos. Essa troca faz com que a cada dia os
envolvidos incorporem mais conhecimentos, sejam eles formais ou informais,
tornando-os mais capacitados, envolvidos, comprometidos, críticos e reflexivos.

A escola democrática deve ser a escola da cidadania, possibilitadora da for-


mação de cidadãos autônomos, críticos e governantes, promovendo a inclusão
social na sociedade do conhecimento, expurgando a concepção do governante
e governado, do mero servidor para participante de um processo construtivo.

Aqui, retratamos a escola promotora da inclusão social frente às ações desen-


volvidas pela escola no processo educativo tendo em vista sua finalidade, objetivos
e metas construídas pelo coletivo da escola no seu Projeto Político-Pedagógico.

Ainda, podemos destacar a inclusão denotando a aceitação e a forma de


como esta se dá a todo tipo de aluno, com dificuldades ou não de aprendizagem
ou comportamental e a portadores de síndromes.

Na busca constante da gestão democrática, há que se objetivar a descentra-


lização do poder. E, a fim de descentralizá-lo, é necessário que cada profissional
possua e desenvolva um nível de autonomia e liderança de suas atitudes, ou
seja, cada profissional tornar-se-á líder dele mesmo.

154
Retomando a gestão democrática: instrumento principal para a transformação do processo qualitativo da educação

Na escola, com estrutura mais flexível, menos hierarquizada e burocratizada,


as soluções para a resolução de problemas são mais rápidas, comprometidas,
responsáveis e criativas. Por isso, a crença e a escolha da escola deve também
­estar voltada a trabalhar o desenvolvimento do potencial dos profissionais,
­estimulando-os a apresentar suas ideias, sejam pequenas ou grandes, para que
contribuam de forma significativa com o crescimento qualitativo da escola.

O desafio é imenso quando se deseja imprimir alegria, música, relações,


­curio­sidade, criatividade, fantasia, imaginação... enfim, liberdade, autonomia, vida.

O gestor deve ser o grande sonhador, o utopista de uma sociedade mais


humana, igualitária, solidária e participante, pois ele é, pela própria natureza do
cargo e da função que exerce, o líder, o articulador à plena realização do Projeto Po-
lítico-Pedagógico, com vistas a possibilitar a formação de verdadeiros cidadãos.

Voltando à poesia, a gestão democrática veio para tirar o pássaro da gaiola,


para ressaltar sua beleza, conservando e admirando seu contexto e restabele-
cendo a alegria, que possa propiciar o canto e o orgulho de ser um agente de
transformação da sociedade, de ser um idealizador da qualidade de vida, e assim
assinar a sua obra, que nada mais é que sua responsabilidade para consigo e
com os outros.

Esta maravilhosa poesia mais uma vez reforça a busca pela qualidade em
educação e, quando atingida, é merecedora de sua assinatura, pois por intermé-
dio dela, você conseguiu captar e junto com os alunos ou colegas/professores
transpor todo o contexto, toda a situação, todas as hipóteses e possibilidades a
serem levantadas e permitiu que eles experimentassem, colocando-os próximos
da realidade.

As mudanças nas perspectivas de gestão foram se remodelando com as mu-


danças do contexto social. Conforme há mudança no cenário mundial, faz-se
necessário repensar que aluno se almeja formar e, por conseguinte, qual o meio
(instrumento) para tal feito.

Para se ter o real entendimento do que é gestão democrática, alguns concei-


tos devem ser esclarecidos para que, então, tenha-se uma definição abrangente
e concisa. Todo entendimento parte da noção de pessoa, ou seja, neste contex-
to, cidadão.

Etimologicamente, cidadão é o habitante da cidade (pólis). E com o surgi-


mento desta, nasce a política e o governo. E o termo cidadão assumiu um senti-
do social e político.

155
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Aristóteles, em sua obra Política, observa que o homem é um animal essen-


cialmente político, que se define por sua vida na sociedade organizada politi-
camente. Por isso, na história sempre encontramos o homem convivendo em
grupos sociais, inicialmente pequenos (família, clã, tribo) e, posteriormente,
maiores (aldeia, cidade, Estado) (PERRY, 1985).

A cidade-estado, ou pólis, “comunidade política organizada, que possui um


mínimo de autonomia” (DUROZOII, 1993, p. 79), proporcionava aos indivíduos
um sentimento de vinculação, pois estavam intimamente envolvidos na vida
cultural e política da comunidade (PERRY, 1985).

A pólis, em sua plena maturidade no século V a.C., era considerada pelos


gregos como o caminho para a felicidade, contexto em que o homem podia re-
alizar suas capacidades espirituais, morais e intelectuais. A pólis era uma comu-
nidade com governo próprio que expressava a vontade de cidadãos livres, base-
ando o governo na inteligência humana e não em divindades. Esta foi a grande
inovação que os ­gregos trouxeram à teoria social e política, de que a lei não era
advinda de deuses ou governantes divinos mas sim da comunidade humana.

A vida política grega diferencia-se das civilizações primitivas, pois os ­gregos


aos poucos compreenderam que os problemas da comunidade são provocados
pelos homens e exigem soluções humanas, entendendo que a lei era uma con-
quista da mente racional e não uma imposição dos deuses. Os gregos queriam
que os princípios de justiça fossem incorporados pela lei e que esta fosse igual
para ­todos, sendo valorizada e obedecida porque expressava a vontade e as ne-
cessidades da comunidade e não o temor ao divino (PERRY, 1985).

Assim, o pensamento político e a política democrática tiveram origem na


Grécia e é ela que remonta à ideia de democracia e todas as suas implicações – a
cidadania, as constituições, a igualdade perante a lei, o governo da lei, a discus-
são racional, o respeito ao indivíduo e a confiança na inteligência humana.

Platão e Aristóteles foram os dois primeiros grandes mestres do pensamento


político. Platão formulou uma teoria política, ou seja, idealizou um modelo racio-
nal de Estado, a partir das práticas realizadas pelos gregos de distanciamento de
uma política de caráter mítico e teocrático. Afirmava que se os homens devem
­viver uma vida ética, devem fazê-la como cidadãos de um Estado racional e justo
(PERRY, 1985).

Em A República, Platão imaginou um Estado ideal e tentou analisar racional-


mente a sociedade e reformular o Estado, pois um Estado justo devia conformar-se

156
Retomando a gestão democrática: instrumento principal para a transformação do processo qualitativo da educação

aos princípios universalmente válidos e visar ao aprimoramento moral dos seus


cidadãos e não ao aumento do seu poder e bens materiais (PERRY, 1985).

Afirmava Aristóteles que, para uma pessoa viver a vida feliz, devia fazê-lo como
membro de uma comunidade política. A pólis proporcionaria às pessoas a oportu-
nidade de levar uma existência racional e moral. Em sua Política, sintetizava a ten-
dência da civilização helênica para centralizar-se em torno da pólis (PERRY, 1985).

Aristóteles, assim como Platão, acreditava que as necessidades e resoluções


humanas podiam ser compreendidas racionalmente e conduzidas com inteli-
gência, partindo do princípio de que a finalidade do Estado é facilitar o alcance
do bem comum. Divide as possíveis formas de governo (constituições) em duas
categorias: justas e injustas.

Em síntese, os gregos criaram a liberdade política, compreendendo o Estado


como uma comunidade de cidadãos livres que instituíam as leis em interesse
­próprio. Enfim, para eles, o Estado era um agente civilizador que permitia ao
povo desfrutar uma vida feliz.

Contudo, o conceito grego de liberdade apresenta uma diferença significati-


va com relação àquele que é hoje por nós concebido. Aos gregos, o Estado era
quem lhes indicava o caminho correto e lhes possibilitava desenvolver o seu po-
tencial humano, identificando o bem do indivíduo com o bem da comunidade.
A nós, o Estado é considerado como ameaça à liberdade individual e um dificul-
tador à busca de nossas próprias vidas.

Esses são os primórdios do que se entende por democracia, cidadão, cidadania.


São os primeiros entendimentos acerca de liberdade, autonomia e participação.

Liberdade, querida e suspirada


Bocage
Liberdade querida, e suspirada
Que o despotismo acérrimo condena:
Liberdade, a meus olhos mais serena
Que o sereno clarão da madrugada.
Atende à minha voz, que geme e brada
Por ver-te, por gozar-te a face amena;
Liberdade gentil, de terra a pena

157
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Em que esta alma infeliz jaz sepultada.

Vem, ó deusa imortal, vem maravilha,


Vem, ó consolação da humanidade,
Cujo semblante mais que os astros brilha:

Vem, solta-me o grilhão da adversidade;


Dos céus descende, pois dos céus é filha,
Mãe dos prazeres, doce Liberdade!

Texto complementar
A escola que aprende
(FELDMAN, 2005)
Estabelecimentos públicos de ensino inspiram-se em projetos pedagógicos
bem-sucedidos para promover mudanças rumo à democracia

“Eu imagino que, ao lado da entrada maciça da televisão, a degradação


do ensino público tenha sido a maior transformação cultural que se deu no
Brasil.” Essa afirmação é do professor, músico e ensaísta José Miguel Wisnik,
que estudou na rede pública na década de 1960 e completa “31 anos dedi-
cados ao ensino público e gratuito”. As palavras de Wisnik são quase um con-
senso quando se fala em educação, e as críticas podem tomar proporções
mais severas, como atesta a afirmação do professor Julio Groppa Aquino,
docente da Faculdade de Educação da USP. “A gente não tem mais escola. A
escola privada é um campo de concentração e a pública é o pasto do lado. Eu
não sei o que aconteceu com a educação, é uma tristeza.”

Com índices altíssimos de analfabetismo funcional, indisciplina, des-


motivação e falta de professores, o ensino público perdeu a qualidade
de outrora. Segundo Wisnik, a escola de hoje se fecha num processo “degra-
dante”, as coisas são feitas por “obrigação”. “Você tem que fingir que cumpre o
programa, os alunos têm que fingir que estudam e têm que fingir que existe
escola, isso é uma tragédia nacional”, lamenta ele.

158
Retomando a gestão democrática: instrumento principal para a transformação do processo qualitativo da educação

Em vez de retomar um modelo perdido no tempo, algumas escolas estão


apostando em novos caminhos para mudar esse quadro. A Escola Municipal
de Ensino Infantil e Fundamental Rural Sebastião Félix da Silva, no bairro dos
Mellos, em Campos do Jordão (SP), e a Escola Municipal de Ensino Funda-
mental Desembargador Amorim Lima, no Butantã, zona oeste da cidade de
São Paulo (SP), são duas delas. Ambas elegeram o ano de 2004 para iniciar ex-
periências que modificaram suas práticas pedagógicas. Apesar de distantes
física e conceitualmente, buscaram repensar suas metodologias de formas
distintas, a fim de tentar construir uma escola verdadeiramente democrática
e sanar problemas como baixa qualidade, indisciplina e falta de professores.

A história dos Mellos


A Fundação Semco, mantenedora do Instituto e da escola Lumiar, em
São Paulo (SP), tem uma propriedade no bairro dos Mellos, em Campos do
Jordão, há quase 20 anos e faz um trabalho de desenvolvimento comunitário
na região. O instituto e a prefeitura da cidade assinaram um convênio para a
gestão pedagógica da escola local, em dezembro de 2003.
A educadora Maíra Lopes foi deslocada da Lumiar para trabalhar em perí-
odo integral na estruturação do novo projeto da escola, junto a uma equipe
do instituto e da fundação. A educadora ficou encarregada da formação das
professoras, da composição do banco de mestres, do diálogo com a Secreta-
ria Municipal de Educação e da organização de reuniões com a comunidade
escolar. “Criamos um conselho escolar que começou a discutir as questões
pedagógicas, formado por pais, crianças, membros da Secretaria de Educa-
ção e da Fundação Semco, além de professores e funcionários; e formamos
uma proposta pedagógica”, lembra Maíra, salientando que a ideia era usar o
conhecimento desenvolvido na Lumiar como ponto de partida para a cons-
trução de uma proposta local.
No primeiro semestre, a proposta da Lumiar funcionou no período alter-
nado à escola. Os mestres locais propunham atividades e cada criança podia
decidir se queria participar ou não. Maíra conta que a escola implantou
também uma assembleia. No segundo semestre, as propostas se fundiram
em uma escola única.

Uma escola sem paredes


A inspiração na Escola da Ponte, de Portugal, veio dar forma a um mo-
vimento que ocorre há oito anos na Escola Municipal Amorim Lima. Desde

159
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

que assumiu a direção da escola, a pedagoga Ana Elisa Siqueira promove


ações para tentar solucionar os problemas da organização escolar e conta
com o suporte de um conselho de escola bastante participativo, composto
por pais, alunos, professores e funcionários.
Assim, as grades da escola foram retiradas, as paredes ganharam novas
cores, o prédio ganhou horta, jardim, mosaicos e azulejos coloridos feitos
pelos alunos. Além dessas ações, a escola usava verba repassada pelo Mi-
nistério da Educação para a formação de professores. Foi nessa época que
Rosely Sayão, psicóloga e consultora em educação, começou a participar das
reflexões sobre a prática pedagógica da entidade.
O conselho de escola fez um levantamento dos principais problemas
locais e concluiu que a falta de professores era prioridade. “Em quatro meses
de pesquisa, obtivemos dados absurdos, como uma turma que não teve
80% das aulas de português no período”, aponta Fátima D’Auria, mãe de dois
alunos e membro do conselho.
“O conselho do Amorim pediu uma reunião e me apresentou várias ques-
tões, como ‘alunos-problema’, faltas de professores, alunos que ficam atrasa-
dos e passam de série sem aprender”, lembra Rosely. A psicóloga tinha aca-
bado de voltar de uma visita à Escola da Ponte e relatou o que observou em
Portugal: “Eles ficaram maravilhados e perguntaram se eu não queria fazer
um projeto para o Amorim.” Aproveitando a estrutura existente na escola,
com apoio da Secretaria da Educação de São Paulo e assessoria de Rosely
Sayão, formou-se uma equipe para a construção do projeto. José Pacheco,
professor e diretor aposentado da Escola da Ponte, aprova a reflexão, mas
ressalta que a experiência da Ponte não pode ser replicada. “Felizmente,
ainda não é possível fazer clonagem de projetos”, brinca. “O que sei é que,
cada qual a seu modo, todas as escolas podem – e devem – repensar suas
práticas. Todos os professores devem refletir criticamente sobre o ato peda-
gógico. E devem abstrair-se de que existem ministério e diretrizes.” Rosely
concorda com Pacheco: “Não é uma cópia, é outra escola, são outras pessoas;
a Ponte é uma inspiração de possibilidade”, frisa.

O corpo de volta à escola


Um traço comum aos dois projetos é a inclusão de atividades culturais
e dinâmicas corporais ao currículo. “A Educação Infantil trabalha o corpo. Aí
quando a criança chega ao Ensino Fundamental não tem mais corpo, só tem
cabeça”, salienta Ana Elisa Siqueira.

160
Retomando a gestão democrática: instrumento principal para a transformação do processo qualitativo da educação

“Buscamos que o aluno conheça a identidade brasileira”, defende Rosely.


A escola Amorim Lima tem aulas de capoeira, circo e teatro “a serviço de dois
eixos, a arte e a cultura brasileiras”. Mesmo com iniciativas semelhantes, a
proposta das duas escolas se diferenciam em muitos aspectos, como na ideia
de autonomia. Julio Groppa Aquino pondera as duas experiências. “Na pro-
posta da Lumiar, a autonomia não se constrói, uma vez que ela já é dada
de largada – o aluno toma decisões sem estar ainda preparado. A criança é
vista como um pequeno cidadão e ela ainda é pré-cidadão”, adverte. “Já na
proposta do Amorim, o lugar do aluno é equalizado com o dos outros e a
proposta é de construção da autonomia.”
Apesar de se colocar como entusiasta do projeto do Amorim e de não
compartilhar o ideário da Lumiar, o professor afirma que qualquer experi-
ência pedagógica é bem-vinda e necessária “se quisermos continuar a ter
escola”. No entanto, a escola não tem que ser pragmática, pois escola é
sempre do ontem, nunca do hoje. Ela deve se ancorar no passado, para viver
no presente e vislumbrar o futuro”, conclui.
As duas experiências contabilizam um ano letivo, o que é muito pouco
para uma profunda avaliação dos resultados. Mesmo assim, a necessidade
latente de mudança do sistema de ensino público permite que os primeiros
passos dessas duas escolas sirvam de exemplo e, talvez, de inspiração para
outras instituições.
“Cada caso é um caso. A gente nunca vai poder criar um modelo e gene-
ralizar. Mas eu espero que as pessoas descubram que existem outras formas
de educação e, se tiverem interesse, venham, perguntem e a gente vai dar
o apoio necessário”, afirma Maíra. Além do trabalho em Campos do Jordão,
o Instituto Lumiar vai oferecer, a pedido da prefeitura, um curso opcional de
formação de educadores para a rede pública.
Rosely Sayão lembra que José Pacheco acredita que a proposta da Escola
da Ponte só funciona se aplicada em um público pequeno, cerca de 200
alunos. Ao ser informado de que a travessia para o Brasil seria para quase mil
alunos, ele falou que o projeto não seria viável, conta Rosely. “E tem sido. Mas
o olhar do educador português está acostumado a olhar a escola do jeito
que ela é lá, e é pequena mesmo. Não se compara o tamanho de Portugal e
do Brasil. Nós temos que criar as possibilidades, então eu creio que esse pro-
jeto é viável para a educação em massa, não sei se como um sistema público,
mas pelo menos para aquelas escolas que desejarem.” Os primeiros passos
estão sendo dados.

161
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Dica de estudo
AZEVEDO, José C; GENTILI, Pablo; KRUG, Andréa; SIMON, Cátia. Qual educação
para qual cidadania? Reflexões sobre a formação do sujeito democrático. In:
GENTILI, Pablo. Utopia e Democracia na Educação Cidadã. Porto Alegre: Ed.
Litorada UFRGS. Secretaria Municipal de Educação, 2000.

Pablo Gentili constrói este texto questionador e reflexivo a respeito da edu-


cação para a cidadania. Afirma, como muitos, que a educação, a cidadania, o
direito, a sociedade, a justiça e a democracia se vinculam entre si. A isto não
coloca dúvidas, mas sim, como o fazem, sobre quais fundamentos se define tal
vínculo. Apresenta diversas questões, bem como suas possíveis respostas ainda
questionadoras.

Atividades
1. A gestão democrática está aliada indiscutivelmente e é dependente da par-
ticipação efetiva de todos envolvidos no processo educacional. Como era
entendida a participação e como se desvela com esta nova conotação da
administração escolar?

162
Retomando a gestão democrática: instrumento principal para a transformação do processo qualitativo da educação

2. Leia com atenção as duas poesias propostas nesta aula e faça uma relação
delas com o conteúdo exposto.

163
Os alicerces da construção
e manutenção da gestão democrática
Apenas aceitar que a gestão democrática fez parte da evolução da so-
ciedade e que refletia a necessidade do povo de liberdade, autonomia,
de democracia, não permite por si que a ­gestão democrática se sustente
e se viabilize caso alguns alicerces que a fundamentam e a mantêm não
estejam solidificados.

A base para estruturação e implantação da gestão democrática no con-


texto educacional (e não só neste, mas o que abrange toda a esfera relacio-
nal) passa por quatro instâncias, sendo elas, de acordo com Bordignon:

 autonomia;

 participação;

 clima organizacional;

 estrutura organizacional.

É por meio dessa base sólida que se fundamenta a gestão democrática


e a busca pela construção da cidadania.

Ao discutir entraves estruturais e contextuais importantes que não


podem ser negligenciados por nenhuma tentativa educacional construti-
vista eficiente e relevante, é necessário associar o problema da construção
do conhecimento ao aprendizado de objetivos sociais, como a cidadania.
(BERTRAND, 1999).

É Bertrand (1999) quem afirma que as reflexões avançam, hoje, para a


identificação de características que influenciam as diferentes práticas de
cidadania pelo mundo afora. A estratégia para a construção de uma so-
ciedade democrática não é única. Nesse aspecto, vale ressaltar que, atual-
mente, o papel da educação na preparação para a cidadania passa por uma
profunda revisão.

E, nesse quadro de mudanças necessárias na preparação para a cidada-


nia, a proposta de construção de uma nova escola, que tem seus princípios
norteadores calcados na proposta de educação para a cidadania, começa
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

a tomar corpo. Segundo Frigotto (apud GADOTTI; ROMÃO, 1997), a construção


da escola voltada à formação do cidadão pressupõe, concomitantemente, a
construção de relações sociais efetivamente democráticas e igualitárias.

A luta pela cidadania, no campo educacional, é a mesma luta pela cidadania


que constrói a emancipação humana no conjunto das lutas sociais, no qual o
princípio básico universal constitui-se em igualdade, solidariedade e democra-
cia efetiva.

À construção dessa escola renovada um longo trajeto há que ser percorrido


na conquista da confiança na própria escola em ousar, enfrentar o desafio em
experimentar o novo, ou seja, colocar em prática e não ficar apenas no discurso,
em nível de pensamento.

A autonomia se refere à criação de novas relações sociais que se opõem às


relações autoritárias existentes. A escola autônoma não significa escola isolada,
mas em constante intercâmbio com a sociedade. E, nesse momento, lutar por
uma escola autônoma é lutar por uma escola que projete, com ela, uma outra
sociedade. Pensar numa escola autônoma e lutar por ela é dar sentido novo à
função social da escola e do educador que não se considera um mero cão de
guarda de um sistema iníquo e imutável, mas se sente responsável também por
um futuro possível com equidade (GADOTTI, 1999).

Assim, não é possível falar em escola voltada à cidadania sem falar em


­autonomia. Entretanto, Azanha (apud GADOTTI, 1999, p. 144) afirma que “nos
­tempos que correm, muito se tem falado sobre a autonomia da escola como
algo a ser conquistado e estabelecido. No entanto, nas discussões que se travam,
poucas vezes se vai além da superfície do tema.” Ainda, completa, “a autonomia
da escola só ganha relevância se significar autonomia da tarefa educativa [...] é
algo que se põe com relação à liberdade de formular e executar um projeto edu-
cativo.” O ­mesmo autor comenta:
Autonomia dos colaboradores, condições reais à prática do planejamento (inclusive espaço
físico, recursos didáticos e humanos), foram colocados, mas, acima de tudo, o respeito ao
aluno/cidadão, foco desse processo, revisando todas as demais condições de forma a propiciar
ambiente produtivo, criativo, esclarecedor, ético-democrático e feliz.

Mas, falar de autonomia da escola é também falar de resistência e conflito


que caracterizam essa escola vivida. A tradição burocrática da escola é um fardo
pesado que limita os ideais de uma escola projetada para a liberdade e a auto-
nomia. Mas é aqui, no interior dessa escola vivida, que é possível construir outra
escola (GADOTTI, 1999).

166
Os alicerces da construção e manutenção da gestão democrática

Os sistemas educacionais, segundo Gadotti (1999), encontram-se num con-


texto de explosão descentralizadora. De fato, numa época em que o pluralismo
político aparece como um valor universal, assistimos tanto à crescente globa-
lização da economia como à emergência do poder local, que despontam nos
sistemas educacionais de muitos países com uma força inédita. Cresce a reivindi-
cação pela autonomia, contra a uniformização, cresce o desejo de afirmação da
singularidade de cada região e local, de cada língua, de cada dialeto. E, dentro
desse contexto, a escola que está perdendo a sua autonomia também está per-
dendo a sua capacidade de educar para a liberdade.

A humanidade entrou em um período de mudanças cuja amplitude, pro-


fundidade e, sobretudo, rapidez, provavelmente nunca tiveram um equivalente
na história. As sociedades, as relações entre as pessoas, entre estas últimas e as
instituições, entre diversos grupos e nações tornaram-se cada vez mais comple-
xas. Um nível inicial de educação cada vez mais elevado e uma educação cons-
tantemente renovada e completada no decorrer da vida passaram a constituir
necessidade absoluta para ­todos os seres humanos, a fim de que eles possam
levar uma vida com sentido, obter um rumo na sociedade, enfrentar os inúmeros
novos desafios e evitar cair numa situação sem identidade e objetivos claros.
(MAYOR, apud DELORS et al., 1999).

O senso comum, a cultura, a vida, os valores, os saberes, e até mesmo os pre-


conceitos dos diferentes sujeitos e grupos sociais são o ponto de partida para a
organização da escola, do conhecimento e dos processos formativos. O ponto de
chegada será uma cultura e um saber orgânicos, articulados e socialmente signi-
ficativos para as classes populares (FRIGOTTO apud GADOTTI; ROMÃO, 1997).

Quando se fala em autonomia,


deve-se ter claro qual é seu significado
Autonomia não está desvinculada a relações, ao contrário, autonomia se es-
tabelece na relação, pois difere de independência. Ter autonomia é responsa-
bilizar-se, de acordo com um código ético – seja individual ou coletivo – é ter a
liberdade de decidir, resolver situações e ir em busca de soluções.

A autonomia em sala de aula é, por sua vez, o modelo relacional e a liberdade


tanto de aluno quanto de docente em estabelecer paralelos, argumentar e contra-
argumentar em busca de soluções e escolhas, pois é em sala de aula que se efeti-
va o Projeto Político-Pedagógico e, por conseguinte, as políticas educacionais.
167
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Sobre a importância e preocupação dos educadores para que tal fato seja
uma vivência constante nas escolas, Bordignon (2000, p. 170) escreve:
Se o conceito fundamental da cidadania é o exercício da autonomia, a construção da
emancipação, uma escola subserviente, mera reprodutora de ordens e decisões elaboradas
fora seu contexto, não cumprirá sua finalidade. A escola autônoma é aquela que constrói
no seu interior o seu projeto, que é a estratégia fundamental para o compromisso com sua
realização.

Outros autores também enfatizam que a autonomia da escola, que busca


uma gestão democrática, deve estar atrelada ao seu cotidiano, tal como José
Eustáquio Romão (2000, p. 104):
A eficácia dessa luta (pela autonomia da escola) depende muito da ousadia de cada escola
em experimentar o novo e não apenas pensá-lo. Mas, para isso, é preciso percorrer um longo
caminho de construção da confiança na escola e na capacidade dela de resolver seus problemas
por ela mesma, confiança na capacidade de autogerenciar-se.

A escola autônoma é fruto da vivência, pois se consolida nas relações e po-


líticas no seu interior. As leis são, em suma, rígidas e conservadoras, a quebra
do paradigma, em busca da autonomia, se torna responsabilidade do gestor,
viabilizando ações e atitudes suas e de seus alunos em busca de autonomia, e
assim toda a escola pulsará um dos principais alicerces da gestão democrática –
a caminho da cidadania.

Além da autonomia, já introduzimos na unidade anterior os conceitos fun-


damentais da participação – torna-se incoerente falar em gestão democrática
se não estiver associada à participação, à colaboração, à construção coletiva dos
educadores. Tal ação deve ter início em seus corações, o desejo mais profun-
do de ser parte integrante e transformadora de sua realidade. Desse profundo
desejo, a ação deve ser condizente aos seus pensamentos, a sua ação deve estar
voltada ao compromisso, levando à troca, contribuição e aceitação, argumenta-
ção e contra-argumentação.

A preparação para uma participação ativa na vida de cidadão tornou-se, para


a educação, uma missão de caráter geral, uma vez que os princípios democráti-
cos se expandiram pelo mundo (DELORS et al., 1999). E, sendo a educação para
a cidadania e democracia, por excelência, uma educação que não se limita ao
espaço e tempo da educação formal, é preciso implicar diretamente nela as fa-
mílias e os outros membros da comunidade. Também, deverá responder a ques-
tões como: ­viver juntos, com que finalidades, para fazer o quê? E terá de dar a
cada um, ao longo de toda a vida, a capacidade de participar, ativamente, num
projeto de sociedade. O sistema educativo tem, assim, por missão explícita e
implícita, preparar cada ­sujeito para este papel social.

168
Os alicerces da construção e manutenção da gestão democrática

A exposição de ideias, a aceitação de opiniões e sugestões, bem como as de-


cisões dos caminhos da educação almejados, devem ser discutidas com o grupo
escolar e a sociedade, a participação deve ser constante e igualitária a todos.

Para tanto, faz-se necessária a criação de espaços como Conselhos, Assem-


bleias... As decisões deixam de ser individualizadas e passam a ser do coletivo.
Nas bibliografias enfatiza-se as características das escolas públicas, as quais per-
tencem ao público, e, como a participação deste foi por muito tempo limitada,
tal realidade passada não pode mais existir em uma gestão democrática. A so-
ciedade entra na escola, na mesma medida em que os alunos estarão voltados à
sociedade. A escola privada não mais difere da escola pública enquanto constru-
tores de cidadania, ambas caminham dentro do mesmo propósito – desenvolver
cidadania – é a busca incessante por qualidade de vida. Bordignon (2000, p. 171)
ressalta:
[...] participação requer o sentido da construção de algo que pertence a todos e que tem
diretamente a ver com a qualidade de vida de cada um, seja no sentido da realização pessoal,
seja pelos benefícios sociais que dela advém. O compromisso, que gera a participação,
requer a participação coletiva do sucesso, não apenas da responsabilidade. A participação
e o compromisso não se referem apenas à comunidade interna, mas devem buscar alianças
com a comunidade externa, a quem a escola serve e pertence efetivamente, promovendo a
cooperação interinstitucional.

Relembrando que a escola possui suas raízes em uma administração autocrá-


tica e, atualmente, busca a transformação pela democratização das relações no
contexto educacional, a participação é um diferencial significativo à transforma-
ção, quanto mais envolvimento e comprometimento com os objetivos estabele-
cidos pelo coletivo, maior o poder de transformação.

Paro (1997, p. 27) pronuncia-se a respeito de participação e transformação:


[...] a transformação é um processo contraditório em que a questão da dependência não é
cronológica, mas dialética. Assim, a luta pela participação coletiva e pela superação dos
condicionantes deve compor em um só processo, de modo que avanços em um dos campos
levem a avanços no outro, de forma contínua e interdependente.

A participação na gestão da escola permite a abertura, o engajamento e a


liberdade que contribuem para a construção político-pedagógica da escola que
se expressará, por sua vez, na cidadania. Elementos dificultadores como “falta
de ­tempo” e “encontros”, poderão promover maior e melhor participação, contri-
buindo, igualmente, para a construção da escola e do cidadão.

Perseguir a administração de tempo tanto quanto propiciar oportunidades e


promover envolvimento são dificultadores e facilitadores que devem ser revistos
por um lado e realimentados por outro, na busca da construção político-pedagógica

169
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

da escola, na qual a democracia se expressa no direito de concordar e discordar, de


rever e reformular, se concretiza.

A preocupação em produzir/construir alunos/cidadãos conscientes deve


­estar presente nas ideias e atitudes, tanto de professores quanto de funcioná-
rios. Uma construção que evoca condições de trabalho, como: planejamento,
recursos (técnicos, didáticos e humanos), ética, participação e autonomia por
parte de todos os colaboradores da escola.

Todo sistema, seja ele enquanto pessoa única ou enquanto organização, en-
volvendo mais de uma pessoa, carrega os traços de todo o contexto que viven-
ciou e que vive. Dizemos, então, que qualquer sistema possui um clima e sua cul-
tura específica de funcionamento é calcada na história de vida de cada sujeito
envolvido e da sociedade em que estão inseridos.

A cultura organizacional é um reflexo do “jeito” de ser da instituição, é uma força


penetrante e poderosa nos comportamentos incorporados na organização.

Para Gassala (1996), a cultura organizacional está se transformando, mas ainda


existem numerosas questões que precisam ser modificadas. Para estar compro-
metido em um processo de mudança cultural faz-se necessário investir no papel
da liderança. A ideia da liderança também tem mudado muito nos últimos anos.
O líder tem que atuar como o principal agente de transformação. “Por outro lado,
minha experiência profissional mostra que o problema aparece quando se faz
mudanças radicais e não se conseguem os objetivos intermediários. Temos de
ir demonstrando que a mudança é uma realidade e não só um planejamento
teórico.” (GASSALA, 1996, p. 68).

Em uma escola, a cultura organizacional reside em todos os profissionais en-


volvidos. Este é o grupo que permanece ano após ano e que chama a escola de
“o seu lugar de trabalho”. Qualquer “lugar de trabalho” desenvolve a cultura com
o passar do tempo.

A cultura organizacional é o lugar para começar uma mudança, uma transfor-


mação, porque sem uma mudança cultural é altamente improvável que ­qualquer
outro esforço de mudança tenha êxito.

O clima organizacional, propiciado pela cultura organizacional, reflete tal


como um espelho o comprometimento com a proposta assumida pelo coletivo.
Por meio do clima organizacional consegue-se perceber se os desejos, postos
em teoria no Projeto Político-Pedagógico, se efetivam, na prática, pelos colabo-

170
Os alicerces da construção e manutenção da gestão democrática

radores. Muitas vezes, um sorriso, a maneira de abraçar um aluno, a maneira do


corpo docente se expressar entre eles, o acesso à direção e demais setores... são
as imagens desse espelho.

Um ambiente livre, democrático e compromissado com os ditames da cida­


dania fazem transpirar a criatividade, a liberdade, o respeito e a colaboração.

Para que esse espelho seja de cristal e propicie a melhor imagem, Bordignon
(2000, p. 171-173) propõe que alguns pontos devem estar claros:

 a finalidade e os objetivos;

 as responsabilidades e ações;

 a direção seja concebida como a coordenação das “alteridades”;

 as pessoas sejam situadas como sujeitos;

 os conflitos não sejam negados, mas mediados dialeticamente;

 a informação flua límpida e transparente;

 o respeito profissional.

Um clima de democracia, unido, aberto, deve nortear as relações funcioná-


rios-dirigentes. Aceitação de críticas e limitações do ser humano são dificultado-
res que, revistos, contribuem para um clima de satisfação e cooperação pleno.

Essa concepção de educação almejada é participativa, engajada na comuni-


dade da mesma forma que engaja a comunidade no processo de aprendizagem,
seja em projetos, atividades sociais (passeios, atividades em bibliotecas, parques,
programas de pesquisas, entrevistas), envolvendo moradores da região, abrindo
as portas à comunidade em seus eventos socioculturais, ou seja, praticando, es-
tabelecendo e transmitindo a cidadania.

Respeito, atenção, carinho, amizade e identidade delineiam a conduta e o


relacionamento professor-aluno da escola, fazendo com que os alunos (e os pais,
por extensão) sintam-se em casa, proliferando um ambiente de confiança, segu-
rança e, acima de tudo, de respeito entre cidadãos.

Informação, diálogo, relacionamento aberto e, claro, e participação nas ativi-


dades pedagógico-socioculturais, norteiam as relações escola-família, no intuito
de promover o processo de aprendizagem e de cidadania aos alunos/filhos.

171
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

“Mais importante são as relações internas, o nível de transparência, o grau de


autonomia e responsabilidade dos membros e a possibilidade de interferir efeti-
vamente na construção de um plano consensual de ação coletiva.” (GUTIERREZ;
CATANI apud FERREIRA, 2000, p. 63).

A participação, orientação, diálogo e respeito dos e aos alunos pela escola


é colocado como uma prática efetiva. A escola, por meio do exercício da cida-
dania, estende aos alunos esse mesmo exercício, preparando-os para a vida. O
diálogo, o envolvimento com as questões do seu cotidiano e da comunidade e o
estímulo dado pelo professor propiciam um desenvolvimento concreto e efetivo
do aluno.

Essa é a escola que vai ao encontro dos anseios da comunidade. Uma escola
participativa, ativa, voltada às questões e desejos do cidadão.

O preparo da criança/adolescente é preocupação da comunidade que neles


vê um futuro melhor, onde a cidadania se concretizará. A esse “preparo” só po-
demos entender sob a responsabilidade de um professor, não com perfil, mas
identidade profissional:

Uma pessoa com potencial intelectual muito bom, líder, empreendedor, com-
promissado com a educação, perseverante, criativo e dinâmico. Relaciona-se bem,
favorecendo o espírito de equipe.

Ainda, o propiciamento de um clima organizacional favorável, ambiente em que


as pessoas sintam-se bem, felizes, gostem do que estão fazendo, e sintam prazer
em estar ali, determina a participação ou alienação da comunidade escolar.

O corpo técnico-docente, vivenciando um clima organizacional positivo,


passa de uma postura passiva, apenas receptiva de decisões unilaterais, a par-
ticipar sistematicamente da vida da escola, principalmente acompanhando o
aproveitamento escolar dos alunos por suas produções e desenvolvimento.

A gestão democrática dentro da instituição escolar visa à democratização da


escola, conclui-se, então, que a gestão democrática deve ser “a realidade viven-
ciada” na escola e não uma posição utópica, posta em papéis.

A gestão democrática só é possível com a vivência e a prática.

A gestão democrática é “o principal instrumento para transformar o processo


educativo em sua prática social voltada para a construção da cidadania”. (BOR-
DIGNON apud FERREIRA; AGUIAR, 2000, p. 175).

172
Os alicerces da construção e manutenção da gestão democrática

Evidentemente, vemos aqui um organismo, uma escola viva, orgânica, dinâ-


mica, harmônica, retratante da prática social na busca de soluções e transforma-
ções que propiciem à criança e ao jovem prazer na descoberta e no conhecimen-
to como elemento integrante da sua sabedoria aplicável à sua vida, para ser feliz
e saber se relacionar, buscando, na cooperação e na solidariedade, alternativas
da vida comunitária que levem ao bem comum.

Quando elencada questões como a autonomia, a participação, o clima orga­


nizacional positivo, como fatores imprescindíveis à construção da Gestão Demo-
crática, cabe um questionamento. Se todos participam igualmente das ­decisões,
se todos buscam autonomia para sua prática e são responsáveis pelo ­clima
organizacional (responsabilidade pelas suas atitudes e qualidade das relações
­sociais), onde fica a questão do poder e hierarquia? A estrutura organizacional
perde características autocráticas também.

A descentralização do poder permite que as relações circularizem mais, priori-


zando a horizontalidade dessas relações, pois, em conformidade com Bordignon
(2000, p. 174):
Essa estrutura teria como fundamento e princípio articulador da organização do trabalho
pedagógico, assentada nos eixos da interação, cooperação e solidariedade. Dela ­decorreriam
formas de ação, em que seriam privilegiadas as relações interpessoais e esferas de
responsabilidade, mais do que meras relações de poder, estabelecendo processos cooperativos
no plano do reconhecimento dos diferentes espaços do poder, com igual compromisso
institucional e social.

Por meio desses alicerces, bem estabelecidos e fundamentados, sendo fruto


de constantes reflexões, sempre a partir do coletivo, começa-se efetivamente a
construção da cidadania.

Entretanto, construir a cidadania é uma preocupação constante dentro de nossa


história. Rui Barbosa, em 1882 (apud LOURENÇO FILHO, 1956, p. 17), já afirmava que“a
instrução do povo tem especialmente em mira habilitá-lo a governar a si mesmo.”

Nas últimas décadas e, principalmente, com o retorno da democracia, a


cidadania passou a ser referência central na redefinição dos caminhos da
sociedade.

Segundo Valenini (1995, p. 7) “a cidadania é o espaço para a realização das


pessoas.” É por meio de seu exercício que a sociedade pode reassumir seus
rumos, redefinir sua organização e reorganizar suas instâncias estatais, para que
essas sejam voltadas para o bem comum e para que se atualizem de acordo com
as mudanças que vão ocorrendo.

173
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Covre (apud GONÇALVES, 1994, p. 59) conceitua cidadania como


[...] o ­próprio direito à vida no sentido pleno. Trata-se de um direito que precisa ser construído
coletivamente, não só em termos do atendimento às necessidades básicas, mas de acesso
a todos os níveis de existência, incluindo o mais abrangente, o papel do(s) homen(s) no
Universo.

Vivemos ou pretensamente vivemos cidadania. É certo que estamos em


­tempo de cidadania. O grande desafio atual da humanidade, na retomada de
sua caminhada, é a superação do individualismo e da competição para compre-
endermos o que se afirma e se busca com a cidadania. Uma cidadania universal,
para todos. Traz, como sua característica, uma forte conotação social, afirmando
a inclusão e negando a exclusão.

Percebemos, então, que o que urge é superar a “cilada” que se apresenta: o


caminho da competição como meio de afirmação do indivíduo. Ao contrário,
é a solidariedade que marca a construção da cidadania, não a competição que
busca vencer e derrotar os outros para abrir espaço para os mais fortes.

Vivemos hoje uma cultura difundida pelo neoliberalismo, o qual incentiva


a competitividade, estimula a concorrência, exaspera o individualismo e traz
em suas entranhas a convicção de que o homem é mau, incapaz de ultrapassar
motivações individualistas, as quais se tornam a mola propulsora da atividade
humana. Na visão liberal, não há lugar para a solidariedade. Ao contrário do con-
ceito de cidadania, que baseia seu fundamento na dignidade de toda a pessoa
humana, entendida como um sujeito capaz e responsável por suas ações.

Assim, Valenini (1995, p. 9) situa a cidadania “que se constrói pela participação,


em que as pessoas se sentem e são tratadas como sujeitos livres e responsáveis. A ci-
dadania que se consolida, então, pela participação, e que se abafa pela dominação.”

Dominações essas que se expressam não só na política mas no cotidiano da


família, da comunidade, da escola, da igreja, das organizações. Identificá-las, per-
ceber sua dinâmica e superar sua prática, é tarefa que a todos compete, e de um
modo especial, desafia o processo educativo.

Assim, a cidadania desabrocha pela educação e pela formação permanente,


mas se atrofia pela alienação.

Ela precisa ser ativa, estar em constante construção dentro de um processo


de conquista permanente, que não pode se dar por concluído, se contentar com
o já alcançado, pois tem a necessidade de ir sustentando os passos já dados e
consolidando as conquistas a serem realizadas.

174
Os alicerces da construção e manutenção da gestão democrática

Valenini (1995, p. 10) comenta:


A cidadania se entende, então, como um exercício, para a realização plena das pessoas e dos
seus direitos, percebidos no contexto comunitário, como direito de todos. Uma cidadania
que busca a efetivação dos direitos já consignados pela legislação estatal, mas que procura
desenvolver uma nova ética no cotidiano. Uma ética que supere toda a forma de preconceitos
e discriminações, construindo uma cultura de respeito à diversidade e de desenvolvimento da
subjetividade das pessoas, a partir da convivência fraterna e solidária.

Em oposição a esse modelo de desenvolvimento excludente, o qual privilegia


o indivíduo e a fragmentação social, toma corpo a ética da solidariedade, que
­constrói novas relações, as quais são marcadas pela atitude de ajuda mútua. E,
neste contexto, emergem novos sujeitos sociais, conscientes, unidos e munidos
de esforços, que buscam a vivência de uma cidadania efetiva e plena, fortalecen-
do a democracia.

Estabelece-se como princípios norteadores a autonomia, que permite que


cada um busque soluções e a participação, que fortalece a identidade de cada
um e ao mesmo tempo o desejo de todos, permitindo estabelecer um ambien-
te de trabalho mais respeitoso e com liberdade de expressão. Mais libertos, os
pensadores e transformadores da educação estabelecem espontaneamente um
clima organizacional favorável à construção de relações positivas e sadias.

Texto complementar

Nota 10!
(BORDEWICH, 2006)
As escolas finlandesas dão um exemplo que o Brasil deveria seguir

Só o ambiente da Escola Primária Poikkilaakso, num subúrbio de Helsin-


que, já bastaria para causar inveja a educadores do mundo todo. A turma da
professora Anna Leena Olkinuora, composta por alunos do curso de alfabe-
tização e da 1.a série, está sentada ao redor de mesas redondas, pintando.
Anna Leena passeia entre as crianças e elogia o desenho de um aluno. “Fico
sempre atenta ao estilo diferente de aprendizado de cada um”, diz. “Cada
criança tem sua meta e seu tempo de aprender.” Esse tipo de orientação faz
do sistema educacional finlandês o melhor do mundo.

No andar de cima, a luz fraca do sol de inverno entra pelas janelas da sala
de aula de Mervi Valta, que ensina 28 alunos da 4.ª e 5.ª séries, com idades

175
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

entre 10 e 11 anos. Alguns estudam História, outros, Matemática, e outros


escrevem. “Eles sabem o que deve ser feito”, explica Mervi, indicando uma
tabela colorida na parede que determina as tarefas diárias de cada aluno.
“Nem sempre fazemos a mesma coisa do mesmo jeito ou no mesmo ritmo”,
ela esclarece. No corredor iluminado que conduz à sala de Mervi, quatro
meninos que terminaram o dever do dia estão sentados em torno de um
jogo de tabuleiro. Em outra parte da ampla escola, três meninas ensaiam
a coreografia de uma dança moderna que vai ser apresentada numa peça
escolar, sem nenhum professor à vista. Apesar da pouca supervisão, a escola
encontra-se surpreendentemente tranquila. (E silenciosa, porque, em todas
as escolas primárias finlandesas, as crianças não usam sapatos e ainda cami-
nham devagar de meias.)

“Cada criança é responsável por seu plano de estudos”, diz Kimmo Sunds-
trom, diretor da escola de 280 alunos. “Cada aluno, ajudado por pais e pro-
fessores, traça a meta que melhor se ajuste a ele, de modo que a motivação
permaneça alta. Se ele precisa de ajuda em Matemática, pode recebê-la. Se é
melhor do que os outros em línguas, pode se adiantar.”

[...]

As escolas filandesas, além de terem ficado academicamente na frente


entre os países da OCDE, também mostraram melhor resultado na educa-
ção de alunos menos dotados e na redução significativa da diferença de
conhecimento entre meninos e meninas. Em resumo, as escolas finlandesas
não deixavam nenhuma criança para trás. “As descobertas do PISA finlandês
mostram que o sistema educacional pode obter êxito unindo desempenho
de qualidade a igualdade”, afirma o relatório.

Então o que exatamente os finlandeses estão fazendo de tão melhor?

[...]

Os finlandeses, que em sua grande maioria frequentam escolas públi-


cas, na verdade começam a estudar mais tarde do que os alunos de outros
países – aos 7 anos – e gastam uma média de apenas 30 horas semanais
com lições escolares, incluídas as de casa. Isso contrasta com as 50 horas
semanais despendidas por alunos coreanos, cujo nível de excelência no
teste PISA ficou pouco atrás do da Finlândia.

176
Os alicerces da construção e manutenção da gestão democrática

Problemas que afligem as escolas de muitos países são relativamente


raros na Finlândia. Embora brigas, uso de drogas e desrespeito aos profes-
sores existam, os problemas são resolvidos o mais cedo possível, e o absen-
teísmo também é raro. Dos cerca de 62 mil alunos formados no curso médio
todos os anos, apenas em torno de mil abandonam os estudos, e metade
deles acaba voltando para concluir o curso.

[...]

Até meados dos anos 1970, porém, esse país estava longe de ser um
exemplo de inovação escolar. Assim como em muitos Estados europeus, aos
10 anos os alunos finlandeses faziam uma prova que os dividia em cursos
técnicos ou acadêmicos. Isso definia o restante de suas vidas, uma vez que
era praticamente impossível mudar de ideia depois que a opção era feita. Os
críticos a esse modelo argumentaram que, se a Finlândia queria competir
com sucesso numa economia mundial em mutação, o sistema educacional
precisava ser repensado. “Na nova sociedade, baseada no conhecimento, é
muito mais fácil que um povo com alto nível de instrução reaprenda novas
profissões”, defende Leo Pahkin, membro antigo do Conselho Finlandês de
Educação.

Por volta dessa mesma época, os educadores começaram a adotar um


modelo mais voltado para o aluno, o que dava maior poder aos professores
e maior atenção às necessidades individuais dos estudantes. Primeiro, o
exame de âmbito nacional aos 10 anos foi abolido, e as crianças se manti-
veram juntas em escolas gerais até os 16 anos. Depois, na década de 1980,
alunos de todos os níveis de conhecimento foram agrupados nas mesmas
turmas. Por fim, em 1994, a administração escolar se descentralizou radi-
calmente, e escolas e professores conquistaram a liberdade de estabelecer
suas prioridades educacionais. Os finlandeses atribuem o sucesso a diver-
sos fatores:

Os professores finlandeses estão entre os mais bem treinados do mundo.


Embora o salário não seja maravilhoso – varia de 2 mil a 4 mil euros por mês,
dependendo da experiência – a profissão traz prestígio. As universidades
aceitam apenas um em cada sete candidatos aos programas de ensino, que
são ainda mais seletivos do que aqueles para aspirantes a médicos e advoga-
dos. Professores incompetentes podem ser demitidos, mas isso quase nunca

177
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

acontece, diz Riitta Sarras, conselheira especial do Sindicato dos Educadores


da Finlândia. “A educação do professor é tão rigorosa que, se ele a concluiu,
significa que é muito capaz”, justifica ela.

Os professores gozam de alto grau de autonomia. São livres para usar


o método que desejarem, com cursos criados por eles próprios, e escolher
livros didáticos, ou até não usar nenhum. Depois de contratados, não ficam
sujeitos a avaliações ou inspeções regulares. Ricbard Cousins, imigrante da
Inglaterra que há mais de uma década leciona Matemática na Finlândia, ob-
serva: “No Reino Unido, arquivamos uma quantidade enorme de relatórios.
Aqui, o sistema confia em nós.”

O sistema tradicional de testes é evitado. Os finlandeses alegam que os


testes geram uma pressão artificial por causa dos prazos e penalizam os
alunos que querem aprender ao seu modo. “Muitos países acreditam que,
priorizando o teste, a educação será melhor”, diz Riitta. “Mas nós pensamos o
contrário. Provas demais nos fazem começar a ensinar só para as provas. Só
que muitos aspectos do aprendizado não podem ser medidos assim.
[...]
O sucesso do sistema de educação na Finlândia é tão grande que fica
difícil encontrar defeitos nele. Alguns educadores finlandeses, porém, se
perguntam se as escolas fazem o suficiente pelos alunos excepcionalmen-
te inteligentes. “Somos ótimos em cuidar do aluno médio, mas não sei se
inspiramos os gênios a progredir”, diz Kyllikki Vilkuna, diretora da Escola Ku-
losaari. “Será que os alunos mais dotados deveriam ter uma escola especial?
Será que deveríamos fazer mais para auxiliá-los? São perguntas que preci-
samos considerar.” No entanto, os finlandeses acreditam – e os resultados
do PISA confirmam – que alunos com capacidades diversas se beneficiam
do aprendizado cooperativo que se tece de maneira indissolúvel em cada
aula. Kirsti Santaholma sempre divide as turmas de francês em grupos de
dois ou quatro, deixando pelo menos um aluno melhor em cada grupo. “Se
eu puser todos os fracos ou medianos juntos, terei de ficar supervisionando
esse grupo”, esclarece Kirsti. “Assim, os melhores ajudam os piores, e posso
circular entre eles.” Contrastando com a paisagem de árvores nuas e céu cin-
zento lá fora, a sala de aula de Kirsti é decorada com quadros coloridos de
pratos da culinária francesa e um mapa de Paris. Ela pediu aos alunos da
turma de 8.ª série de francês que descrevessem um hobby real ou imagi-
nário e o apresentassem a seus grupos. Kirsti passeia de grupo em grupo,

178
Os alicerces da construção e manutenção da gestão democrática

ouvindo problemas, prestando auxílio com questões gramaticais e oferecen-


do palavras de incentivo. Nunca crítica. “Não dizemos: você errou”, explica
ela. “Isso deixa os alunos constrangidos. E, quando ficam constrangidos, eles
não querem aprender. Todo mundo pode errar. É normal não aprender, ou
aprender devagar. Pedimos aos alunos que comparem suas notas apenas a
seus resultados anteriores, não aos dos colegas.” Kirsti para por um instante
e fica pensativa. O que diz em seguida sintetiza, de certa forma, tudo o que o
sistema educacional finlandês oferece aos alunos: a promessa de paciência,
tolerância e um compromisso autocrítico com a excelência. “Se não consigo
ensinar um aluno”, ela diz, “deve haver algo errado comigo.”
[...]

Dica de estudo
LIBÂNEO, José Carlos. Princípios e Características da Gestão Escolar Partici-
pativa, no Livro Organização e Gestão da Escola: teoria e prática. 5. ed. Revista
e ampliada. Goiânia: Alternativa, 2004. Capítulo VII.

Neste capítulo Libâneo retoma os conceitos de gestão democrática, partici-


pação e direção, destacando a direção como princípio e atributo da gestão de-
mocrática e alguns princípios da organização e gestão escolar participativa.

Atividades
1. As bases para estruturação e implantação da gestão democrática no con-
texto educacional passam por quatro instâncias, de acordo com Bordignon.
Cite-as e discorra sobre elas.

179
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

2. Neste capítulo há várias definições sobre cidadania, releia-as e elabore a sua


definição.

180
Os alicerces da construção e manutenção da gestão democrática

181
Instrumentos fundamentais à
construção da gestão democrática:
programa de formação continuada
Historicamente, evidencia-se um processo amplamente conhecido na
sociedade como um todo que não restringe-se à educação. Processo cha-
mado de reprodutor, no qual os envolvidos na avaliação desencadeadora
das novas propostas e no planejamento, normalmente, são pessoas perti-
nentes ao sistema (em nível macro) por, muitas vezes, há muito distanciadas
da práxis. Essas pessoas apenas “ditarão” aos executores “as regras do jogo”. E
estes, como autômatos, angustiados e desvalorizados, buscam reproduzir.

Esse tem sido o modelo educacional adotado pelo sistema e pela


maioria das escolas brasileiras. Conhecido como tradicional, nos moldes
jesuíticos, desconhece e mesmo não se preocupa com a pessoa e o pro-
fissional, seja do aluno ou do professor. Para melhor conhecer os efeitos
desse tipo de educação, Paulo Freire, em sua obra Pedagogia do Oprimido
retrata apropriadamente a educação bancária.
Na concepção “bancária” que estamos criticando, para qual a educação é o ato de
depositar, de transferir, de transmitir valores e conhecimentos, não se verifica nem se
pode verificar-se esta superação [sic]. Pelo contrário, refletindo a sociedade opressora,
sendo dimensão da ‘cultura do silêncio’, a ‘educação bancária’ mantém e estimula a
contradição. (FREIRE, 1987, p. 58-59)

A procura de um novo referencial para a educação surgiu da gravidade


dos problemas enfrentados tanto no setor educacional quanto nas dife-
rentes áreas do conhecimento humano. Porém, esses desafios reivindi-
cam, além do compromisso com a educação, toda a criatividade colocada
em prática, para se buscar soluções possíveis para os problemas da huma-
nidade, adquirindo novas perspectivas de compreensão da natureza do
ser humano.

Para D’Ambrosio (apud MORAES, 1997, p. 29), “a fragmentação dos enfo-


ques utilizados para analisar a realidade ampara-se em esquemas racionais e
científicos especializados, em detrimento de uma visão global da realidade e
mesmo com desprezo por essa visão”. Para ele, o surgimento das disciplinas,
apesar de ser a invenção fundamental da ciência moderna, trouxe, também,
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

o afastamento da realidade no seu todo, criando o especialista, e consequentemen-


te, desaparecendo a preocupação com abordagens importantes do conhecimento,
da criticidade, da criatividade e da visão global dos fenômenos naturais.

Moraes (1997, p. 30), para melhor explicar o atual momento conflitivo, em


nível planetário, recorre a autores como Naisbitt, Tofler, Capra, Morin, D’Ambrosio,
Weill, Harman e Boaventura dos Santos, que apontam:
[...] estarmos vivendo num período de transição muito importante; um período decorrente
da presença simultânea de inúmeros desafios. E o mais grave é que esses desafios não se
restringem a uma dimensão ou outra, nem se localizam neste ou naquele país, mas envolvem
diferentes dimensões – culturais, sociais, políticas, intelectuais, morais e espirituais – da
sociedade, e afetam os mais diferentes aspectos de nossa vida no planeta: [...] saúde, educação,
meio ambiente, economia, relações sociais, trabalho, tecnologia e política. O conjunto desses
desafios vem provocando sérias ameaças à sobrevivência da raça humana e às diferentes
formas de manifestação da vida neste planeta, o que tem requerido a restauração do diálogo
crítico entre o homem e o mundo da natureza, entre ciência e sociedade.

A partir dessas reflexões, qual tem sido a educação (formação pessoal e


­ rofissional) instituída no país, especialmente dos professores? Levanta-se esse
p
questionamento, visto que os professores continuam a serviço da manutenção
do status quo, podendo-se entender as razões das deficiências de formação e da
­insignificante minoria da classe que busca uma continuidade em sua formação.

A década de 1990 desponta com mobilizações: sociedade X sistema; sistema


e sociedade X escola; escola X professor e professor X aluno.

Essas mobilizações tiveram início nas teorias educacionais, remontando a estu-


diosos que deslocaram o centro do processo educacional do professor para o aluno,
como John Dewey, Carl Rogers, Piaget, Vygotsky, Luria e Freire. Aí, vislumbrou-se um
novo homem (novo aluno) participativo, criativo, crítico, social, autônomo etc. A esse
novo aluno urge um novo professor e uma nova relação se estabelece (dialógica).
A educação autêntica, repitamos, não se faz de A para B ou de A sobre B, mas de A com B,
mediatizados pelo mundo. Mundo que impressiona e desafia a uns e a outros, originando
visões ou pontos de vista sobre ele. Visões impregnadas de anseios, de dúvidas, de esperanças
ou desesperanças que implicitam temas significativos, à base dos quais se constituirá o
conteúdo programático da educação. (FREIRE, 1987, p. 83-84)

Hoje, a ciência como conhecimento sistemático do universo evoca uma nova


visão de mundo, não fragmentada, não compreendida como dominação ou
controle da natureza.

A atual abordagem, “que analise um mundo em partes independentes, já


não funciona” (MORAES, 1997, p. 31), como também não é possível conceber a
aprendizagem fracionada, desvinculada de um todo, um saber sem fazer, sem
reflexão e sem ação.
184
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: programa de formação continuada

Urge a necessidade da compreensão do que vem a ser um paradigma:


­padrões compartilhados, os quais permitem a explicação de aspectos relativos à
realidade. É “[...] uma construção que põe fim às controvérsias existentes na área
a respeito de determinados fundamentos” (MORAES, 1997, p. 31).
Thomas Kuhn (apud PIMENTEL, p. 31) define com muita propriedade o con-
ceito de paradigma: “realizações científicas, universalmente reconhecidas que,
durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares aos pratican-
tes de uma ciência”.
Entretanto, há décadas esse referencial teórico e muitos outros colocados em
cursos de aperfeiçoamento e atualização são promovidos pelos sistemas de
ensino e por entidades particulares, largamente ofertados no território nacional e
com busca e participação significativas pelas escolas (enquanto organização)
e pelos­­ ­professores, que buscam esses cursos para implementar sua prática
(a eterna busca da receita).
A frustração e o esvaziamento não tardam a chegar. As colocações feitas na-
queles cursos foram construídas por outras pessoas com referenciais, histórias
de vida e práticas diferenciadas, acrescida ao projeto pedagógico da instituição.
Evidentemente, não há que se desmerecer as iniciativas de promoção de cursos e
de participação, pois o enriquecimento pela aquisição de novos referenciais teó-
ricos e práticos no encontro de pares na diversidade com certeza irá acontecer.
Para ocorrer, todavia, o crescimento do profissional da educação, a proposta
deve ser diferenciada. A literatura especializada vem apontando uma nova di-
reção numa perspectiva de valorização da pessoa e sua construção individual
e coletiva, objetivando um profissional que rompa com o conceito moderno de
ciência e conhecimento:
Através da crítica e da criatividade parte para a construção de novas formas de ensino. Cria
seus próprios paradigmas, procurando não trabalhar com as dicotomias tradicionais. Abre
trilhas, ensaia, experimenta e ousa. Sofre em sua vida, como ser existencial, as repercussões
da epistemologia científica. Muda sua concepção de vida, de indivíduo, de sociedade e de
conhecimento e ensino. Das suas incertezas parte para sua práxis na busca da coerência e das
verdades. (apud PIMENTEL, 1994, p. 34)

O aprendiz
Bertolt Brecht
Construí antes de areia, depois construí de pedra.
Como a pedra desabasse,
não construí de mais nada,

185
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Depois voltei muitas vezes a construir


de areia e pedra; conforme, porém,
tinha aprendido.
Aqueles a quem eu confiava a mensagem
dela faziam pouco; porém aquelas em que eu nem reparava
vinham com ela até mim.
Isso tenho aprendido.
O que eu recomendava não era posto em prática;
chegando mais perto, eu via
que estava equivocado e que o correto
havia sido feito.
Com isso eu tinha aprendido.
As cicatrizes doem
nos momentos de frio.
E eu digo sempre: só a sepultura
não terá nada mais a me ensinar.

Na coerência e na verdade, busca a transformação para o mundo, compreen-


dendo primeiro a si mesmo e querendo transformar-se. Conhecendo a si mesmo
e a sua extraordinária capacidade de agir poderá, então, atingir sua plenitude e
dignidade, colaborando para uma nova ordem mundial, adequada para si, para
todos e que traga a paz e a felicidade por meio do processo de transformação
científica, humana e social.

Dentre as contribuições mais recentes sobre a formação continuada de pro-


fessores relevam-se os autores: Nóvoa (1992), Behrens (1996), Schön (1992),
Perrenoud (1999), Reali (1991) e Veiga (1996) com colocações relevantes, pro-
pondo mudanças radicais no pensar da formação continuada do professor, aliás,
também uma nova terminologia no vocabulário educacional.

Alguns destaques constantes nos escritos dos autores citados, em síntese:

 a escola como locus, ligada à resolução de problemas reais, com participa-


ção dos professores;

 a formação deve privilegiar a construção de uma identidade pessoal e


profissional;

186
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: programa de formação continuada

 a formação como processo contínuo, interativo, reflexivo e dinâmico;

 a formação continuada tem sua essência na construção coletiva do saber


e a discussão crítica reflexiva do saber fazer;

 a formação considerando o conhecimento como um processo de reflexão


na ação e sobre a ação;

 a formação como processo dialético, individual e coletivo, crítico, autôno-


mo e transformador.

À concretização da nova proposta de formação continuada de docentes


exigem-se conquistas e coerências, fielmente expressas no colocar de McBride
(1989, p. 29):
Para a formação de professores, o desafio consiste em conceber a escola como um ambiente
educativo, onde trabalhar e formar não sejam atividades distintas. A formação deve ser
encarada como um processo permanente, integrado no dia a dia dos professores e das escolas,
e não como uma função que intervém à margem dos projetos profissionais e organizacionais.

Com essa concepção de formação docente, a escola na prática pode promo-


ver, sistematicamente:

 incentivo à equipe técnico-docente ao estudo formal, em nível de gradua­


ção e pós-graduação;

 participação em congressos, seminários e cursos ofertados na comunidade;

 realização de reuniões pedagógicas:

 individuais, semanalmente;

 coletivas, semanalmente (dia permanência);

 coletivas, bimestralmente (ordinárias) e sempre que necessário (extra-


ordinárias).

As reuniões pedagógicas têm por objetivo promover a reflexão sobre a prá-


tica e a circulação das informações, para que seja possível a construção do tra-
balho em equipe e a formação constante. Busca-se, também, a construção de
um referencial teórico comum por meio de leituras, seminários, discussões em
pequenos grupos ou com o grupo todo.

As reuniões pedagógicas devem ser planejadas antecipadamente, a partir de


um diagnóstico das necessidades que a equipe sente para melhoria de sua prá-
tica e também das sugestões por ela apresentadas. O planejamento deve incluir

187
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

a pauta, as técnicas de trabalho, o tempo, a definição das responsabilidades e o


registro das conclusões do grupo.

É necessário que haja forte circulação de informações, dúvidas e soluções no


grupo. Para tanto, os encontros pedagógicos devem ser organizados de maneira
a favorecer:

 planejamento compartilhado e frequentemente reavaliado;

 frequência na exposição de trabalhos e atividades realizadas. Essas expo-


sições devem conter produções dos alunos, não só dos que têm um bom
desempenho mas, principalmente, dos alunos com dificuldades;

 registro dessas discussões, realizado preferencialmente por outro profes-


sor e distribuído para o restante do grupo;

 busca de material teórico relevante para as dúvidas e interesses surgidos


no grupo;

 maior contato possível entre todas as séries;

 maior conhecimento dos planos de trabalho e das didáticas de outras áreas;

 contato frequente com outros setores: esportes, biblioteca, informática.


Enviando planejamento, combinando atuações conjuntas que potenciali-
zem e agilizem o trabalho em sala de aula ou promovam uma integração
dos alunos em atividades mais amplas.

Quando nos referimos à equipe pedagógica, não podemos nos esquecer dos
outros profissionais, além dos professores, orientador, coordenador e gestor,
que estão em contato com os alunos e também desempenham papel signifi-
cativo na formação deles. É importante que, periodicamente, os responsáveis
pela informática, esportes e outros setores participem da reunião pedagógica
para trocarem informações sobre os projetos ou para avaliarem a relação entre
os trabalhos desenvolvidos. Considerando que a aprendizagem dos alunos não
se restringe à sala de aula, esses outros profissionais podem contribuir para uma
visão mais abrangente das competências dos alunos.

Na reflexão sobre a prática, consideramos necessário estar sempre buscando


maior clareza em relação ao conhecimento didático específico de cada área; e
estarmos atentos frequentemente às perguntas:

– O que os alunos precisam aprender?

– Como os alunos aprendem?

– Como sabemos se os alunos aprenderam?


188
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: programa de formação continuada

Para isso, necessitamos rever nossas práticas de ensino com um olhar mais
atento às produções dos alunos. O coordenador precisa incentivar o professor
a selecionar material para análise conjunta em orientação e, quando achar ade-
quado, estender essa oportunidade ao restante da equipe.

Assim, como compartilhamos objetivos com os alunos, professor e coordena-


ção necessitam elaborar um plano conjunto para os encontros, tanto individu-
ais, quanto da equipe. O que será priorizado? Quais as expectativas que cada um
tem com relação ao trabalho a ser desenvolvido? Como será avaliado?

Esse plano deve conter aspectos relacionados à observação de classe. Caso o


professor queira, poderá filmar, ele mesmo, as atividades e vê-las antes, para decidir
se quer utilizá-las em discussão com o coordenador ou com os colegas. É importante
intensificar, sempre que possível, as observações inter-professores. O papel do coor-
denador é extremamente relevante para que se instaure um clima de confiança no
grupo. Ele deve estar atento às competências individuais e promovê-las. Pode ser
adequado iniciar as apresentações pelas experiências com sucesso. Aos poucos, o
próprio grupo se sentirá à vontade para expor suas dúvidas e dificuldades.

Com o intuito de favorecer o trabalho em equipe, a escola pode desenvolver


um trabalho com psicólogos, que se utilizam da técnica do psicodrama.

O psicodrama é uma técnica fundamentada no Teatro, na Psicologia e na


Sociologia. Na visão da Psicologia, o psicodrama é tido como marco inicial dos
trabalhos com grupos, passa-se a ver o sujeito não como indivíduo isolado, mas
como um ser social, utilizando-se de métodos de ação. Conforme Bermudéz
(1980, p. 21-22), o psicodramatista,
atua no “in vivo”, objetivando e analisando a situação presente, quantas vezes for necessário
para seu esclarecimento e compreensão [...] O Psicodrama investiga ao máximo os vínculos e
suas características. Não se detém no vínculo bipessoal, mas além dele, estuda e investiga os
vínculos multipessoais e suas influências conjuntas, “in toto”.

Os trabalhos desenvolvidos por meio das técnicas do psicodrama, envolven-


do todos os profissionais que atuam na escola, possibilitam que não apenas se
verbalizem os sentimentos, as impressões, ou seja, a subjetividade humana, pos-
sibilitam ir além. Por meio delas as pessoas passam a experienciar, a vivenciar e
analisar de uma forma mais verdadeira e condizente com o seu próprio eu, suas
influências em si e nos outros; garantindo com isso que:

 instalem relações interpessoais favorecedoras das aspirações diversas de


cada membro, para que consigam articular os diferentes projetos ­pessoais
com as mínimas renúncias de cada um;

189
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

 despontem suas potencialidades criativas, assim como o próprio enrique-


cimento com as contribuições dos outros;

 definam as relações interpessoais segundo uma compreensão positiva


entre os membros;

 criem uma situação de grupo em que predominem as comunicações grati-


ficantes recíprocas, que são sinceras, incrementando o nível de bem-estar
dos componentes da equipe;

 instaurem relações profundamente marcadas pelo respeito à diversidade


nos modos de trabalhar, ritmos, formas de entender o trabalho do profes-
sor e modalidades de relacionar-se;

 ampliem a comunicação entre os componentes do grupo;

 dotem-se de metodologias eficazes para planificar e realizar o trabalho


em grupo;

 disponham de instrumentos para analisar as relações internas e para ava-


liar a eficácia das atuações coletivas, com o objetivo de planificar, em tudo
o que se necessite, as mudanças pertinentes;

 pratiquem o autogerenciamento de suas ações e da prática profissional;

 percebam que o somatório das partes é diferente do todo, pois a natureza


do todo é diferente da natureza de cada parte (ser), mas se relacionam e
interdependem.
As proposições de capacitação docente que não busquem envolvimento e participação efetiva
e coletiva dos professores está fadada ao descomprometimento dos docentes. A perspectiva
da formação contínua aponta para a busca do equilíbrio entre as necessidades educativas das
pessoas (professores e alunos), do grupo e das exigências do sistema. E, neste caminho coletivo,
enfatiza-se a construção de saberes, e o saber fazer amplia-se no saber ser, compartilhando
experiências, trocando dificuldades, recolhendo falhas e valorizando os avanços e a mudança.
(BEHRENS, 1996, p. 137).

Poderíamos, após esta citação de Behrens, darmo-nos por satisfeitos ao pen-


sarmos em formação continuada, pela colocação dos elementos principais ao
assunto, mas especialmente, porque abordamos, sucintamente, senão todos, os
por nós considerados relevantes a este estudo, acrescidos de possíveis encami-
nhamentos em escolas, adaptados, evidentemente as suas realidades. Entretan-
to, destacamos na continuidade do nosso estudo outro autor e a experiência
vivenciada pela autora enquanto gestora de escola de Educação Infantil e Fun-
damental, no intuito de ressaltar a importância da implantação do programa de
formação continuada e da sua continuidade no interior da escola.
190
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: programa de formação continuada

Assim, recorremos a Libâneo (2004, p. 227):


A formação continuada é outra das funções da organização escolar, envolvendo tanto o setor
pedagógico como o técnico e o administrativo. A formação continuada é condição para a
aprendizagem permanente e para o desenvolvimento pessoal, cultural e profissional de
professores e especialistas. É na escola, no contexto de trabalho, que os professores enfrentam
e resolvem problemas, elaboram e modificam procedimentos, criam e recriam estratégias de
trabalho e, com isso, vão promovendo mudanças pessoais e profissionais.

Mediante tal colocação, o autor deixa clara a sua postura, principalmente em


dois pontos: a existência permanente do programa de formação continuada e
a chamada para a responsabilidade e o compromisso da escola como sendo
também o seu fazer. Com isso, Libâneo vincula a formação continuada à gestão
escolar. Postula, ainda, a formação continuada como condição para a aprendiza-
gem contínua e o decorrente desenvolvimento integral dos professores, envol-
vendo aspectos pessoais, culturais e profissionais e como propiciadora do aper-
feiçoamento profissional teórico e prático no contexto escolar, construindo uma
cultura geral mais ampla, que transpassa o exercício profissional.

Na escola, da qual participamos da gestão por dez anos, e em seu projeto edu-
cativo, construído coletivamente, como instrumento à construção da gestão de-
mocrática, a formação continuada teve seu destaque no que se refere à implanta-
ção como na sua continuidade e implementação, observados todos os aspectos a
serem envolvidos a sua prática efetiva, a título de exemplo: previsão orçamentária
anual, definição de horários para reuniões e encontros pedagógicos, participação
em cursos, congressos, fóruns..., implicando forçosamente em outras reestrutura-
ções, desde horários de aulas a situações do cotidiano, diríamos até fáceis e em
pouco tempo para as tomadas de decisões e colocações em prática.

O processo mais longo, após os aparatos técnicos e administrativos, está no


pedagógico, pois as mudanças estão a ocorrer aceleradamente em todos os as-
pectos da vida humana, mas a mudança de visão do professor é lenta, os pro-
blemas e as dificuldades apresentadas estão no aluno, na família deste, enfim
no que circunda e pode servir de referência para o fracasso, geralmente, do de-
sempenho escolar do aluno. Acompanhamos todo esse processo, e há que se
considerar toda uma história cultural e se houver imposição para rápida altera-
ção, deixa de existir construção democrática e, assim, vivenciamos por diversas
reuniões o apontar distante da prática pedagógica do professor, entretanto não
deixando de questionar e instigar para uma nova postura. Em paralelo, no co-
letivo, construía-se um referencial teórico para embasamento de uma prática
pedagógica reflexiva, bem como a apresentação pelos próprios professores de
uma prática inovadora e seus resultados valorizados e compartilhados.

191
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Paciência, tolerância, respeito, valores esses não só preconizados na escola


e em seu projeto, mas vivenciados por todos, especialmente pelos gestores,
uma vez que conduzem o processo de transformação, e eis que uma professora
apresenta uma situação e expõe a sua prática pedagógica e a questiona, indaga,
compartilha e... mais outra professora e a mudança começa a ocorrer. O foco
antes no entorno do aluno, agora para o aluno, contudo com a indagação: e eu
enquanto educadora qual tem sido a minha prática pedagógica? Inicia-se um
novo processo, denominado ação-reflexão-ação.
Constrói-se uma nova relação entre todos, num crescente, professores e ges-
tores, professores e alunos, professores e familiares, envolvidos, interessados e,
num processo constante de diálogo, objetivando a ampliação da aprendizagem
do aluno, mas para tal concretização, o estudo, a reflexão, a discussão, o confron-
to entre as diversas experiências são uma constante.
O processo de formação continuada, como vimos no relato acima, deve con-
siderar importante a reflexão em relação a teoria e a prática, pois uma de suas
características mais marcantes, por acontecer no contexto de trabalho, é trazer
à tona experiências e reflexões que levem à compreensão e à resolução dos pro-
blemas presentes nas práticas pedagógicas dos professores. Importante ainda
destacar, e reforçando o papel e a responsabilidade da escola, o compromisso
do professor para com a sua própria formação, requisito primordial de sua pro-
fissão – ser professor – no mundo atual.
Nesse processo, o professor faz leitura de sua prática, da prática de seus pares
e das teorias utilizadas, confrontando-as aos de autores diversos, ensaia, tenta,
ousa, abre novos caminhos, novas leituras da realidade e da ciência, especial-
mente as humanas, amplia sua leitura de mundo, tornando-se leitor/autor.

Texto complementar
A importância da formação continuada dos
profissionais da educação na sociedade moderna
(RAUL et al., 2005)

[...]

O processo de adaptação ao novo perfil do profissional educador exige


rapidez, flexibilidade e boa vontade para enfrentar novos desafios, pois

192
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: programa de formação continuada

conforme preconiza Tofler (1970), o indivíduo precisará se tornar mais adap-


tável e capacitado para evitar o impacto das modificações que virão, porque
será preciso compreender e adaptar-se “[...] à transitoriedade, à inovação e à
diversidade [...] “dos cenários da sociedade.

Considerando as novas perspectivas e exigências de mercado, a escola


não é a única responsável, o novo paradigma exige o auto-investimento
na carreira, com a busca dos novos conhecimentos adquiridos por meio de
pesquisa e produção do conhecimento e principalmente com atualizações
constantes em cursos de interesse da área, ou seja, uma formação continua-
da. Nóvoa (2001) observa que, para manter-se atualizado, o educador deve
investir em pesquisa de novas tecnologias de ensino, bem como apostar e
descobrir em novas práticas pedagógicas permanentemente, centrado em
dois pilares, nele mesmo, o professor, e na escola. O autor ainda adverte que
para o processo ser completo, este deve se dar desde a formação do aluno
até o mais alto título obtido, de maneira a dar continuidade à renovação de
conhecimentos, conforme podemos verificar a seguir:

Manter-se atualizado sobre as novas metodologias de ensino e desenvol-


ver práticas pedagógicas mais eficientes são alguns dos principais desafios
da profissão de educador. O aprender contínuo é essencial em nossa profis-
são. Ele deve se concentrar em dois pilares: a própria pessoa do professor,
como agente, e a escola, como lugar de crescimento profissional permanen-
te. Sem perder de vista que estamos passando de uma lógica que separava
os diferentes tempos de formação, privilegiando claramente a inicial, para
outra que percebe esse desenvolvimento como um processo. Aliás, é assim
que deve ser mesmo. A formação é um ciclo que abrange a experiência do
docente como aluno (educação de base), como aluno-mestre (graduação),
como estagiário (práticas de supervisão), como iniciante (nos primeiros anos
da profissão) e como titular (formação continuada). Esses momentos só serão
formadores se forem objeto de um esforço de reflexão permanente.

Dentro deste contexto, o papel do professor/educador frente aos novos


desafios passa a ser visto sob uma ótica diferente. Há uma reorganização em
suas funções dentro do ambiente escolar, envolvendo o trabalho em equipe,
reforçando as possibilidades de um caminho com metas de trabalho em
conjunto que apontam para uma renovação das práticas e dos saberes.

Este novo cenário aponta para um processo no qual o professor passa a


ter uma importância maior em sua função e sua responsabilidade também

193
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

aumenta, bem como pressupõe um esforço por parte das estruturas edu-
cacionais vigentes, no sentido de adequar-se às novas exigências que en-
volvem investimento em formação continuada por parte dos profissionais
educadores bem como da escola como ambiente de expansão do conhe-
cimento. Acredita-se que a formação continuada é um dos aspectos impor-
tantes para reunir a teoria e a prática no contexto profissional do docente,
em que a escola desempenha papel significativo como suporte para que o
processo possa ocorrer com harmonia.

Dentro deste contexto, o papel da escola passa a ser então fundamental


como mediador no processo de formação e formas de comunicação entre
docente, discente e comunidade, ou seja, a escola pode abrir-se mais, haven-
do uma dimensão maior na forma de pensar a gestão escolar. Esta pode ser
feita mediante um processo coletivo, envolvendo dentro de um Projeto Polí-
tico-Pedagógico todas as dimensões da escola, bem como currículo, avalia-
ção, novas tecnologias, escola e comunidade que afetem diretamente a sala
de aula, pois é dentro desse ambiente que é preciso iniciar as mudanças.

[...]

A formação continuada na sociedade moderna é imprescindível e vem


deixando de ser entendida apenas como uma complementação da forma-
ção inicial do docente, vem contribuir, segundo Porto (2000, p. 32), “para me-
lhorar a escola, reinventando-a, redefinindo e ressignificando-a, em simultâ-
neo, os contornos de uma profissionalidade docente”.

[...]

Os sistemas formais organizam-se por meio de curso de secretarias de


educação ou de vínculos com universidades. Esta proposta muitas vezes
atrai pela questão de incentivos. Os sistemas informais consideram a prática
contextualizada, a reflexão na e da ação. A formação continuada tem função
de contribuir para a qualificação dos professores, buscando consolidar a
identidade profissional adquirida previamente em sua formação inicial, e
parte da reflexão dos próprios educadores em busca de melhorias na prática
educativa. Para Libâneo (2001, p. 66):
A formação continuada é uma maneira diferente de ver a capacitação profissional de
professores. Ela visa ao desenvolvimento pessoal e profissional mediante práticas de
envolvimento dos professores na organização da escola, na organização e articulação do
currículo, nas atividades de assistência pedagógico-didática junto com a coordenação
pedagógica, nas reuniões pedagógicas, nos conselhos de classe etc.

194
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: programa de formação continuada

Nesse aspecto, o professor tem que ultrapassar seus conceitos, mudar a si


mesmo e estar aberto ao novo, e junto com a instituição, formar um elo em
busca de novos saberes.

[...]

Nóvoa (1992a) lembra que o objetivo central da formação continuada é


desenvolver o educador pesquisador. Não um pesquisador obcecado pela
academia ou pela cientificidade, mas um profissional que tem, primeiramen-
te, uma atitude cotidiana de reflexividade da sua prática, que busca compre-
ender os processos de aprendizagem e desenvolvimento de seus alunos e
que vai construindo autonomia na interpretação da realidade e dos saberes
presentes no seu fazer pedagógico. Dessa forma, Nóvoa (1992b, p. 38) adver-
te que educar, formar nesta nova perspectiva, é considerar a pessoa do pro-
fessor e sua experiência; a profissão e seus saberes e a escola e seus projetos.

[...]

O papel do professor e o seu investimento em aperfeiçoamento, em pes-


quisa, titulação, auto-aprendizagem e inter-relacionamento com as equipes
interdisciplinares, levando a urna socialização e multiplicação dos saberes e
das práticas pedagógicas configura-se na realidade no elemento mais im-
portante do processo de formação conunuada e permanente.

[...]

Cabe a todos os atores desse processo, como escola, professor e gover-


no, cumprir sua parte neste complexo de operações, que ao final visam ao
mesmo objetivo, que é de uma escola que possua um corpo docente atuali-
zado permanentemente, capaz de atender às expectativas a ela confiadas.

Dica de estudo
FERREIRA, N.S.C. Formação continuada e gestão da educação no contexto da
“cultura globalizada”. In: FERREIRA, N.S.C. (Org.). Formação Continuada e Gestão
da Educação. São Paulo: Cortez, 2003.

Este texto ressalta a necessidade premente da “formação continuada” nos


tempos atuais e o seu entendimento como forma permanente de capacitação
reflexiva de todos os cidadãos frente aos desafios e às exigências da ciência, da
195
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

tecnologia e do mundo do trabalho. Reflexiva, ao ser examinada frente ao seu


estatuto teórico e valor, finalidades e integração no mundo globalizado, assim
como, o papel da gestão democrática da educação como prática política respon-
sável e coerente com a formação continuada.

Atividades
1. Os encontros pedagógicos devem ser organizados de maneira a favorecer a
circulação de informações, dúvidas e soluções no grupo. Para tanto, são ne-
cessárias algumas ações. Quais são e como você pode implementar as ideias
propostas no texto?

196
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: programa de formação continuada

2. Em relação ao conhecimento didático, quais são os questionamentos que


se deve fazer para se manter atento sobre a pertinência do conhecimento
específico de cada área? E por quê?

197
Instrumentos fundamentais à
construção da gestão democrática:
instituindo o planejamento participativo
À construção da gestão democrática, o planejamento participativo é
instituído como instrumento, ferramenta possibilitadora de exercício, vi-
vência da prática democrática, implicando já, em primeira instância, em
compromisso, responsabilidade, autonomia e distribuição de poder.

Devemos esclarecer o entendimento quanto ao planejamento e o


porquê da opção ao planejamento participativo e não a outros, como o da
qualidade total e o estratégico, historiando, brevemente, o planejamento
na educação.

A exemplo da administração escolar, também o planejamento educa-


cional enveredou no respaldo teórico da administração e planejamento
empresarial, objetivando organização racional e racionalidade financeira,
com desempenho. Surgiram os técnicos de planejamento, importando,
copiando e sofisticando os modelos das empresas privadas, altamente
capitalistas. Dessa forma, os atores do processo tornaram-se meramente
executores, distanciados, portanto, da elaboração e avaliação, pois o pla-
nejamento não é visto como processo, a avaliação ocorre no final e é de in-
teresse da administração. Agrava-se o quadro ao detectar a não discussão
do significado social e político da ação, objeto do planejamento.

O planejamento é um processo social, com opções filosófico-políticas,


estabelecendo os fins de uma determinada ação, visando o alcance de ob-
jetivos em períodos previamente determinados. Não há, portanto, neutra-
lidade. Aos que assim querem entendê-lo, usam-no apenas como instru-
mento técnico, a serviço reprodutor da sociedade. O ato de planejar é um
ato axiológico e ideológico, comprometido com a sociedade.

O planejamento sem comprometimentos, tecnocrático, reduz os


homens à condição de objetos e valor de produção e não a somente sujei-
tos da ação planejadora.
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

O planejamento participativo
[...] constitui um processo político, um contínuo propósito coletivo, na deliberada e amplamente
discutida construção do futuro da comunidade, na qual participa o maior número possível de
membros de todas as categorias que a constituem. Significa, portanto, mais do que na atividade
técnica, um processo político a decisão da maioria, tomada pela maioria, em benefício da
maioria. (CORNELY apud ZAINKO, 1998, p. 89)

Baseado na Pedagogia da Libertação, de Paulo Freire, parte da crença


[...] no potencial humano, propõe que o povo seja encarado como o sujeito da história, como
ator e não como mero espectador e aceita que o desenvolvimento não é um pacote de
benefícios dados à população necessitada, mas um processo, por meio do qual a população
adquire maior domínio sobre seu próprio destino. (CORNELY apud ZAINKO, 1998, p. 89).

Assim, ao assumir como valor principal e essencial a pessoa, os sujeitos envol-


vidos, seres com histórias singulares, com conhecimentos próprios, agentes dos
processos, valoriza-se uma educação mais humana, justa e participativa.
As relações verticais que ocorrem no processo tecnocrático passam a ser, no
planejamento participativo, relações horizontalizadas, valorizadas e assumidas.
A participação é altamente considerada e, além disso, na prática, o planeja-
mento participativo consegue integrar o operacional e o estratégico, organizan-
do-os num todo, ao que Freire denomina processo de reflexão-ação.
A transformação social propalada teoricamente, na prática, entretanto ausen-
te, talvez pelo comodismo, resistência a mudanças, implicação em lidar com de-
safios e conflitos, eleva o planejamento participativo à condição de instrumento
viável de execução e à renovação das estruturas e das relações na educação.
[...] ser o planejamento participativo, um desafio para os verdadeiros educadores, exigindo
daqueles que pretendem realizá-lo muita disponibilidade, coragem, persistência, tenacidade,
garra, espírito de luta. Não é trabalho impossível, mas plenamente viável, apesar de ­todos os
empecilhos colocados pelo sistema e por educadores descompromissados com a tarefa que
abraça como profissão: educar as novas gerações de brasileiros conscientes e livres. (VIANNA
apud DALMÁS, 1994, p. 30).

Ao assumir o planejamento participativo, é necessário ter a clareza de que


planejar consiste em um processo para alcançar determinados objetivos, signifi-
cando transformação, revolução. E a esta opção da escola é importante juntar-se
a consciência das dificuldades a serem encontradas, principalmente pela forma-
ção das pessoas, tradicionalmente, sem vivência democrática, mas acreditando,
primeiramente no potencial humano, no diálogo, debate, discussão e no sonho,
na utopia, na busca do impossível, no desejo de crescimento pessoal e comu-
nitário. “Fazer hoje o possível de hoje para amanhã fazer o impossível de hoje”.
(FREIRE apud GADOTTI, 1999, p. 32).

200
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: instituindo o planejamento participativo

Hoje, em discussões sobre formas de administrar, a participação está sempre


presente, tomando espaço, apesar de muito lentamente, junto a valores atuais
como flexibilidade, tolerância com as diferenças, relações mais igualitárias, jus-
tiça e cidadania, de pressupostos teóricos do taylorismo, segundo Gutierrez e
Catani (apud FERREIRA, 2000, p. 60).

Ao tratar da participação temos de ter certeza do que se entende por partici-


par, pois há os que pensam que as pessoas devem participar para estarem bem
integradas, harmonicamente, sem conflitos. Isso significa apenas apoiar, traba-
lhar, colaborar, fazer o que está previsto que se faça. Também é permitido dar
sugestões, não reclamar, estar presente às programações da direção, ou seja, o
velho termo “vestir a camisa”, de acordo com Gandin (1999, p. 56).

Esta é, ainda, a visão conservadora da reprodução, da manutenção, de deixar


tudo como está. Não existe intenção de transformação.

Buscando o entendimento em Habermas (GUTIERREZ; CATANI apud FERREI-


RA, 2000, p. 62), “participar significa que todos podem contribuir com igualda-
de de oportunidades, nos processos de formação discursiva da vontade.” Expli-
cam: “participar consiste em ajudar a construir comunicativamente o consenso
quanto a um plano de ação coletiva”.

Riscos e conflitos constituem-se num desafio constante na vivência da parti-


cipação da comunidade escolar no processo educativo.

A partir do entendimento aqui exposto de planejamento e da opção pelo pla­


nejamento participativo, introduzimos o estudo do Projeto Político-Pedagógico.

O que é o Projeto Político-Pedagógico?


O Projeto Político-Pedagógico constitui-se no plano global da instituição. Pode
ser entendido como a sistematização, nunca definitiva, de um processo de pla-
nejamento participativo, que se aperfeiçoa e se concretiza na caminhada, e que
define claramente o tipo de ação educativa que se quer realizar. É um instrumen-
to teórico-metodológico para a transformação da realidade. É um elemento de
organização e integração da atividade prática neste processo de transformação.

Tem, portanto, este valor de articulação da prática, de memória do signifi-


cado da ação, de elemento de referência para a caminhada. O Projeto Político-
-Pedagógico é também a construção coletiva de um conhecimento.

201
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

O Projeto Político-Pedagógico, quando elaborado de forma ética, é um instru-


mento de transformação, na medida em que expressa o compromisso do grupo
com uma caminhada. Dessa forma, tanto o dirigente pode cobrar coerência do
dirigente, bem como dos companheiros entre si. Havendo um projeto, há uma
maior facilidade em não se tomar as críticas como pessoais; as críticas devem
fazer parte do cotidiano, se queremos superar as contradições.

Temos, então, como finalidades do Projeto Político-Pedagógico:

 aglutinar pessoas em torno de uma causa comum;

 dar um referencial para a caminhada;

 ser um instrumento de transformação da realidade;

 colaborar na formação dos participantes.

O projeto necessita ser político pelo compromisso deste com a formação do


cidadão, e pedagógico pela efetivação da função da escola no mesmo. Portanto, o
Projeto Político-Pedagógico é a forma de organização do trabalho pedagógico que
supere conflitos, elimine relações competitivas, corporativas e autoritárias, para
que o mesmo rompa com o tradicional, diminuindo a fragmentação na escola.

Organizando a escola como um todo, não como um simples rearranjo ­formal,


mas tendo uma nova qualidade de trabalho, partindo dos seguintes princípios
norteadores:

 igualdade (igualdade não quer dizer uniformidade, ao contrário, é a única


autêntica diversidade);

 qualidade para todos;

 gestão democrática;

 liberdade X autonomia;

 valorização do magistério, formação continuada, no que se refere ao levan-


tamento de necessidades de formação, e com a elaboração de programas.

No entanto, o projeto não pode ser idealizado como “panaceia”, como solução
para todos os problemas. Antes de mais nada, precisamos de uma “matéria-pri-
ma” fundamental: as pessoas, que buscam, sonham, pensam, interrogam, dese-
jam. Sujeitos, projeto e organização devem se articular a partir do fundamental,
que são as pessoas, construtoras e destinatárias da transformação social.

202
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: instituindo o planejamento participativo

O que dá vida a uma escola? Seria o Projeto Político-Pedagógico?

Não podemos ter essa ilusão. O que dá vida à escola são as pessoas, os sujei-
tos que historicamente assumem a construção de uma prática transformadora.
E para que isso aconteça é necessário considerar a estrutura organizacional da
escola, o seu currículo, o seu tempo escolar, o processo de decisão, as relações de
trabalho, e a avaliação que é feita na mesma.

Criando condições para outra forma de trabalho, que começa com a reor-
ganização de dentro para fora, pois o Projeto Político-Pedagógico é uma re-
flexão do cotidiano visando uma continuidade no processo do conhecimento,
democratizando-o.

O referencial teórico a respeito da construção do Projeto Político-Pedagógico


é vasto, entretanto, a prática, ou seja, as pessoas, os elementos a serem conside-
rados, enfim, o processo de construção, traz dificuldades aos educadores. Assim,
apenas para elucidar ou, ainda, visualizar e, porque não dizer, vislumbrar possi-
bilidades reais de construção do Projeto Político-Pedagógico traremos, a seguir,
indicativos do processo ocorrido em uma escola.

À elaboração do Projeto Político-Pedagógico da escola X ocorreram estudos


prévios pela equipe técnico-docente, reuniões, organização de comissões, ela-
boração e distribuição do questionário à comunidade escolar, envolvendo pro-
fessores e funcionários, pais e comunidade (vizinhos), estudos dos resultados
para embasamento e formulação do projeto.

A coleta de dados para a construção do Projeto Político-Pedagógcio abor-


dou assuntos que remetem à reflexão e compreensão do mundo atual, incluindo
movimentos de melhoria de qualidade de vida e dificultadores do bem-estar
comum. Dessa visão inicial foram levantadas as finalidades, o papel e os desejos
para a escola X. Reavaliação das opções teóricas para embasamento e estrutura-
ção da escola, encaminhamentos sejam de: objetivos, conteúdos, metodologia,
avaliação e disciplina, e as relações que se estabelecem.

Atividades culturais, estrutura e organização da escola, gestão, participação,


condições objetivas de trabalho, gerenciamento de recursos financeiros, a partici-
pação da escola X na comunidade, relacionamentos professor/aluno, escola/família,
escola/comunidade, participação e orientação de aluno, educação religiosa, ati-
vidades esportivas e culturais, a coerência da proposta pedagógica e a prática,
bem como item aberto a qualquer outra opinião ou comentário fizeram parte do
instrumento de pesquisa direcionado aos professores e funcionários.

203
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Os instrumentos direcionados aos pais e à comunidade abrangeram as


­mesmas situações questionadoras; entretanto, foram selecionadas as questões
pertinentes aos pais e à comunidade. Esses instrumentos procuraram envolver o
“todo” da escola, no intuito de democratizar a construção da escola X, objetivan-
do o planejamento participativo.

Sugestões foram dadas, opiniões, debates foram realizados, leitura conjunta


de todos os itens e a estruturação do Projeto Político-Pedagógico tornou-se não
“um projeto”, mas um processo, pois num continuum, realizado, revisto e debati-
do por todos que constituem a comunidade escolar.

Retratamos a seguir, em síntese, alguns elementos relevantes colhidos dos


questionários relativos ao Projeto Político-Pedagógico.

 Finalidade e papel da escola X

De extrema importância, definição primeira a ser construída, a finalidade e o


papel da escola X, que são os geradores e embasadores das ações pedagógicas
e administrativas, foram amplamente discutidos quando da elaboração do Pro-
jeto Político-Pedagógico. Também entraram em pauta os resultados enquanto
definição pelos sujeitos envolvidos apresentados, principalmente na Filosofia e
Princípios Didáticos-Pedagógicos.

 Opções teóricas da escola X em relação ao campo de ação e à instituição,


nos níveis pedagógico, comunitário e administrativo.

O processo de planejamento:

“[...] elaborado de forma a servir de referencial para o trabalho reflexivo e crí-


tico [...] aberto e flexível, [...]”

“[...] orientar o trabalho em sala de aula”.

“[...] discussões com a equipe de trabalho para uma maior participação dos
alunos e professores”.

“[...] realidade e necessidade do ‘grupo’”.

“[...] dinâmico, fruto de pesquisa e atualizações, feito no coletivo”.

“[...] realizado no conjunto, levando em consideração uma proposta inovadora”.

“democrático”.

“maior interdisciplinaridade”.

“participativo”.
204
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: instituindo o planejamento participativo

Um planejamento participativo, portanto, democrático, construído para


­servir de referencial, orientador de um trabalho reflexivo e crítico, devendo ser
aberto e flexível, atento e voltado aos interesses, às necessidades e à realidade
dos alunos. Dinâmico, fruto de pesquisas e atualizações, levando em considera-
ção uma proposta inovadora, visando também à interdisciplinaridade.

A definição dos objetivos, dos conteúdos, da metodologia e da avaliação:

“[...] que façam relações com o cotidiano do aluno”.

“[...] os conteúdos e objetivos sejam definidos de acordo com a realidade


social”.

“[...] com a participação e opinião de todos os professores”.

“A metodologia deve ser empregada com o máximo de tecnologia, na forma


de despertar o interesse do aluno”.

“Que o aluno seja capaz de compreender a cidadania como exercício de di-


reitos e deveres, que tenham atitudes de solidariedade, cooperação e respeito
ao outro e a si mesmo. Os conteúdos devem ser determinados por uma seleção
dos mais significativos. Quanto à metodologia e avaliação poderiam ser mais
discutidas. Em algumas vezes nota-se uma ‘falta de sintonia’ entre disciplinas e
turmas”.

A elaboração e a definição dos objetivos, conteúdos, metodologia e da ava-


liação devem ser feitas com a participação de todos, de acordo com o cotidiano
e realidade social, com metodologia inovadora. A avaliação deve ser processual
e contínua e os conteúdos selecionados pelo seu valor de significância.

A disciplina e a relação professor/aluno/coordenador/diretor:

“[...] o diálogo como principal pergunta para que as dificuldades sejam


resolvidas”.

“[...] direta, aberta, afetuosa, respeitosa, cumplicidade, trocas”.

“[...] relação de respeito mútuo”.

“Sem barreiras de comunicação, de forma aberta e direta, com bom nível de


relacionamento e seus devidos limites”.

A disciplina e a relação entre todos devem ocorrer pelo diálogo, franco e


aberto, numa relação de respeito mútuo, no qual haja cumplicidade e trocas,
com afetividade e limites.
205
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Participação e organização dos alunos:

“Desejamos a participação e organização dos alunos de forma que os ­mesmos


posicionem-se de maneira crítica e responsável, utilizando o diálogo como forma
de medir conflitos e tomar decisões”.

“Inserida no processo ensino-aprendizagem e estruturada pelo professor


para que isso faça parte do cotidiano do aluno”.

“Incentivando e acreditando no potencial e criatividade dos alunos”.

“Que a participação seja uma constante troca de conhecimentos e experiências”.

“De forma a combater os elementos que excluam uns aos outros, interferindo
de forma consciente, buscando harmonia entre eles”.

Ideias, sugestões e reflexão da atual condição de participação e organização


dos alunos foi a maior constante.

A participação deve ser constantemente incentivada e motivada, tendo o


professor como organizador e disponibilizador de recursos, em um clima de res-
peito, bem como sempre acreditar no potencial e criatividade dos alunos.

As atividades culturais:

“Significativas para os alunos e contando com a participação e presença dos


pais e, quando possível, da comunidade”.

“Estimular a leitura, passeios culturais, visitas a museus”.

“Com a participação da família e comunidade”.

“Voltadas para a necessidade e interesse de todo o grupo, com a participação


de todos, valorizando a nossa cultura”.

Participação, significância são aspectos que fazem proliferar o estímulo pelo


conhecimento, pela cultura e pelo engajamento do sujeito e que vinculados à
necessidade e interesse do aluno estarão voltados ao exercício da cidadania.

Estrutura e organização da escola:

“De forma que haja um ambiente de trabalho onde todos desempenhem


suas funções com prazer”.

“Com democracia”.

206
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: instituindo o planejamento participativo

“Buscando no coletivo soluções conjuntas, bem como ações de ordem indivi-


dual que cada um ofereça visando concretizar o objetivo da escola”.

“Que seja compromissado com a educação (como já é)”.

Estruturada democraticamente, produzindo um ambiente de colaboração,


participação, integração e prazeroso no qual o compromisso para com o proces-
so de aprendizado transpire em todas as suas ações e atuações junto aos alunos,
pais, colaboradores e comunidade.

Direção e equipe técnica:

“Democrático”.

“Abertos a sugestões e críticas construtivas”.

“Devem estar atentos e dispostos a colaborar para resolver situações com os


professores e com alunos, dando ideias, gerenciando recursos e mantendo-se
acessíveis”.

“Cooperativos”.

“Pessoas abertas para discussão profissional, compreendendo que atitudes


deverão ser tomadas, se necessário, de forma ética e levando todos a uma cons-
ciência de que nada é no pessoal”.

“Compromissados com a educação, dispostos e abertos a opiniões e críticas”.

“[...] competência”.

A vivência em um ambiente mais democrático e participativo remete à ­revisão


das posturas dos educadores, neste caso, equipe técnica e direção. Nessa vivência,
os comportamentos passivos, reprodutores, cerceados pela direção, já não cabem
mais, pois exige-se competência, compromisso, participação, orientação, ­incentivo,
ou seja, uma postura de líder, receptivo a discussões e democratização das ­relações.

Que professor?

“Professores atualizados, humanos, preocupados com as características indi-


viduais de cada aluno, aptos a mudanças, criativos, amigos e conscientes do seu
papel na formação dos alunos”.

“Professores amorosos, que valorizem cada aluno como eles são. Professores
mais amigos do que julgadores e juízes injustos. Professores firmes que não deixam

207
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

os alunos mandarem, mas que buscam um relacionamento de respeito mútuo [...]”.

“Que tenham capacidade para aproveitar todo o potencial do aluno, e que


possam explorar ao máximo a criatividade das crianças”.

Os pais, hoje, não desejam mais a postura do professor de concepção tradi-


cional, na qual impera o autoritarismo e a inflexibilidade. Os pais mostram-se de-
sejosos de professores afetivos, participativos, criativos e capacitados e que sua
autoridade seja baseada no respeito mútuo e sua visão de mundo seja coerente
às necessidades da sociedade.

A participação e organização dos alunos:

“Compartilhar responsabilidades: o aluno pode e deve participar das ativi-


dades escolares, e até decidir em grupos por estas atividades, respeitando-se
o ­currículo-base e a orientação do professor. Ele quer sentir-se corresponsável
pela sua ­educação”.

“Participação ativa; porém com ordem. Organização em grupos”.

“Que debatam os assuntos e criem espírito de corpo e união”.

“Alunos responsáveis, conhecedores de seus deveres e da importância de


participar na sociedade. Alunos com pensamento crítico, buscando soluções,
­tendo dúvidas respondidas”.

A expectativa de formar-se alunos conscientes e críticos, tanto quanto parti-


cipativos e envolvidos em grupos, norteia os desejos de pais preocupados em
educar formal e informalmente filhos/alunos-cidadãos. Emerge o desejo de que
os alunos se organizem em grupos e equipes, debatendo desde questões do co-
tidiano do sujeito até a sua própria construção no que se refere a conhecimento
e cidadania, tendo, sempre, como bússola, o respeito ao ser humano (limites,
organização, diálogo, criatividade, criticidade).

À proposta dessa escola realmente não caberia outro modelo e metodologia


de planejamento senão o participativo, pois segundo Gandin (1994, p. 57):
Aí se pode construir um processo de planejamento em que todos, com seu saber próprio,
com sua consciência, com sua adesão específica, organizam seus problemas, suas ideias, seus
ideais, seu conhecimento da realidade, suas propostas e suas ações. Todos crescem juntos,
transformam a realidade, criam o novo, em proveito de ­todos e com o trabalho c­ oordenado.

208
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: instituindo o planejamento participativo

Texto complementar
Projeto pedagógico: construção coletiva da
identidade da escola – um desafio permanente
(EYNG, 2002)

Situando a reflexão
No cotidiano escolar, os educadores se deparam continuamente com
tarefas e desafios novos. Muitos surpreendem pela complexidade, outros
surpreendem pela dificuldade e, outros ainda, pela satisfação da inovação
que possibilitam. Uma tarefa que possui todos esse atributos é a constru-
ção e gestão colegiada do projeto da escola, onde novas possibilidades são
descortinadas constantemente e, a partir dessas práticas pedagógicas, são
construídas, atualizadas e compartilhadas na construção coletiva da identi-
dade da escola. Cada escola define, constrói, compartilha e comunica a sua
identidade à comunidade, na organização e operacionalização de sua pro-
posta pedagógica.

[...]

A construção continuada desse projeto implica as tarefas coletivas de


pensar/escrever o projeto, pensar/aplicar o projeto, pensar/avaliar o proje-
to e pensar/atualizar o projeto. Tais tarefas não ocorrem em momentos se-
parados, mas num movimento que as integra, permeadas pela articulação
teórico-aplicativa.

[...]

Por onde iniciar a tarefa? Encarar o desafio requer, antes de mais nada, mu-
dança de cultura nas práticas pedagógicas: das tarefas isoladas para as tarefas
integradas; do trabalho individual para o coletivo; do estático para o dinâmi-
co; do conservador para o inovador; da rigidez para a flexibilidade; da depen-
dência para a autonomia; da competição para a cooperação e da alienação

209
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

para a conscientização na construção coletiva da identidade da escola.


A construção do projeto próprio requer fundamentação teórica ampla e atu-
alizada e conhecimento da prática e do contexto escolar para que a proposta
seja operacionalizada, integrando a teoria pedagógica à prática pedagógica,
lembrando que a inovação na prática educativa constitui um processo em
contínua renovação, indagação e adequação em que, flexibilidade, dinami-
cidade, criatividade e criticidade são as características essenciais. Esses pres-
supostos estão presentes na proposição da educação continuada, conside-
rando o aspecto dialético da realidade, do sujeito e, consequentemente, do
conhecimento elaborado que os significa.

Definindo Projeto Político-Pedagógico


Denomina-se projeto porque faz uma projeção da intencionalidade edu-
cativa para futura operacionalização, a teleologia, ou seja, a finalidade de
cada organização educativa expressada nos seus processos e metas propos-
tos. Segundo Veiga (1998, p. 13), “O projeto busca um rumo, uma direção”. Ao
definir a sua proposta pedagógica, cada organização educativa estará, por-
tanto, determinando sua finalidade, meta e direção. O projeto denomina-se
político porque coletivo, político porque consciente, político porque define
uma posição do grupo, político porque expressa um conhecimento próprio,
contextualizado e compartilhado. Político, porque supõe uma proposta
coletiva, consciente, fundamentada e contextualizada para a formação do
cidadão.

[...]

Veiga (1998, p. 13) referenda esses conceitos quando afirma que o proje-
to pedagógico é uma ação intencional, com um sentido explícito, com um
compromisso definido coletivamente. Por isso, todo projeto pedagógico da
escola é, também, um projeto político por estar intimamente articulado ao
compromisso sociopolítico com os interesses reais e coletivos da população
majoritária. É político no sentido de compromisso com a formação do cida-
dão para um tipo de sociedade”.

[...]

O Projeto Político-Pedagógico como projeção para o futuro supõe a refle-


xão e operacionalização da proposta curricular do centro educativo. Segun-
do Gadotti (1990), todo projeto supõe a reflexão que envolve a organização

210
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: instituindo o planejamento participativo

e vivência curricular, orienta-se por pressupostos teórico-aplicativos, expres-


sos no Projeto Político-Pedagógico. É, portanto, extremamente necessário
que todos os sujeitos que integram a comunidade escolar, destacando-se
dentre esses os professores, tenham claro a importância da concepção teóri-
ca que explique e oriente sua prática educativa. O compromisso de inovar a
proposta pedagógica exige a definição do referencial teórico capaz de orien-
tar a inovação a ser construída. A grande tarefa e talvez o maior desafio da
educação na atualidade está na construção e na gestão de propostas peda-
gógicas contextualizadas, capazes de efetivar as finalidades propostas para
a educação integral. Ao efetivar-se, a ação educativa se apoia em uma opção
teórica que orienta o currículo por meio do qual o processo de aprendiza-
gem será construído.

A gestão colegiada do currículo


no processo pedagógico
A comunidade escolar está agora desafiada a assumir outra postura,
diante de sua prática pedagógica, adotando uma vivência coletiva inter e
transdisciplinar, que implica consciência e competência, em saber atuar de
forma crítica democrática e transformadora na gestão colegiada do processo
pedagógico.

[...]

A gestão colegiada do processo pedagógico supõe participação e tra-


balho cooperativo, que se refletirá no Projeto Político-Pedagógico de cada
unidade escolar, projeto esse capaz de por em marcha a formação integral
de cada aprendiz como objetivo compartilhado na unidade escolar. Dessa
forma, a unidade escolar cria condições de efetivar o que lhe é essencial: a
realização do seu Projeto Político-Pedagógico, concretizado no currículo,
capaz de integrar o formal e o não-formal, a escola e o cotidiano, consideran-
do o binômio conhecimento e trabalho, no exercício da cidadania. Na gestão
colegiada, a comunidade escolar define, constrói e atualiza sua identidade
como instituição formadora, num processo continuado. O Projeto Político-
-Pedagógico sempre em construção cria as possibilidades de definição de
metas coletivas que possam conduzir à busca da elaboração de um “patri-
mônio ideal comum” e não exclusivamente baseado na participação comum
nos processos técnicos, burocráticos ou instituídos (VATTIMO, 1992, p. ll).

211
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

A reflexão crítica e coletiva é de vital importância na adoção do referen-


cial teórico-aplicativo, capaz de operacionalizar a prática pedagógica, na for-
mação que efetive as competências básicas, propostas na educação integral.
Esta operacionalização acontece e é orientada no currículo.

[...]

Ressaltada está a importância da sensibilização e organização coletiva da


comunidade escolar, a fim de que trabalhe como time articulado, em que
cada qual perceba sua tarefa como singular, tendo a clareza da sua função e
corresponsabilidade na configuração e operacionalização colegiada do Pro-
jeto Político-Pedagógico da escola.

A gestão colegiada do currículo implica as tarefas de reflexão crítica, co-


letiva e continuada, considerando o dinamismo do contexto formativo espe-
cífico. Esse contexto se constitui pelo contexto organizacional da instituição
educativa, pelo contexto dc atuação profissional, pelo contexto sociopolíti-
co-histórico-cultural da comunidade e pelo contexto internacional que con-
dicionam o processo educativo. Necessitando de reflexão, avaliação, ajustes,
aperfeiçoamento contínuo, a gestão do currículo é um processo que se in-
terpõe e transcende as ações de planejar, aplicar e avaliar o currículo que
projeta publicamente a identidade da escola.

A tarefa de reflexão inicia pela tomada de decisão coletiva da modalidade


de organização curricular a ser adotada. Tomada essa decisão, cabe refletir e
definir os fundamentos do currículo, que permitirão o esboço da proposta
curricular. A proposta esboçada teoricamente vai adquirindo novas configu-
rações à medida que passa a ser operacionalizada.

As modalidades de organização curricular


Da mesma forma que os problemas e contextos educacionais variam, as
soluções para os mesmos são múltiplas. As respostas são construídas em
função das referências consideradas e da matriz teórica adotada, poden-
do-se verificar, como consequência, uma grande variedade de concepções
curriculares.

A partir da distinção entre teorias reprodutoras e teorias transformadoras


ou construtoras, pode-se distinguir duas modalidades de organização curri-
cular: o currículo linear e o currículo integrado.

212
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: instituindo o planejamento participativo

[...]

Currículo integrado
A segunda modalidade de organização curricular é do currículo integra-
do. Nesta proposta, superando a dicotomia e a fragmentação curricular, a
ênfase está na produção do conhecimento interdisciplinar, contextualizado
e inovador.

[...]

Currículo integrado é aquele capaz de promover a inter-relação teórico-


-prática no processo formativo, ainda mais que as disciplinas estarão intera-
tuando como “cada uma das partes de um todo que se completam”, ou sejam
“unidades integradas”, e contextualizadas.

[...]

Possibilita, ainda, a educação emancipatória segundo Freire (1980), uma


vez que viabiliza a formação da consciência no profissional e no cidadão.
Nessa vertente destaca-se a teoria crítica e a teoria construtivista como ca-
pazes não só de enfatizar, como também concretizar a formação do cidadão
capaz de convivência consciente e democrática.

O currículo integrado se orienta pela produção do conhecimento, ou seja,


considera o conhecimento como resultante de um processo a ser construí-
do. “Tanto docentes quanto alunas e alunos, à medida que vão participando
de propostas curriculares integradoras, irão aprendendo a debater e a refletir
em equipe e a negociar dernocraticamente tarefas e modos de efetivá-las”.
(TORRES In: SILVA, 1996, p. 73).

[...]

O currículo integrado possibilita não somente a estruturação do conhe-


cimento do indivíduo, mas, sobretudo, a estruturação do próprio indivíduo
como sujeito e como cidadão.

[...]

A vivência do currículo integrado permite ao aprendiz o desenvolvi-


mento de habilidades e competências extremamente importantes para a

213
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

sua atuação, na sociedade do conhecimento. Na tarefa coletiva de constru-


ção, desenvolvimento, avaliação e atualização do projeto pedagógico que
projeta a identidade da escola, a equipe envolvida deve ter clareza do re-
ferencial teórico-aplicativo adotado ou a ser adotado no projeto da escola.
O projeto configura-se na inter-relação de três dimensões teórico-aplicati-
vas: ideológico-explicativa (teórico), contextual (realidade) e operacional ou
metodológica (prática), sendo essas perpassadas por uma quarta dimensão:
a avaliativa. [...]

Dica de estudo
PADILHA, P.R. Planejamento Dialógico: como construir o projeto pedagógico
da escola. Guia da escola cidadã. 6. ed. São Paulo: Cortez; Instituto Paulo Freire,
2006. v. 7.

Esse livro traz a teoria necessária ao entendimento de planejamento educa-


cional, agora o que o enobrece é que, a par dessa, coloca a prática, oferecendo
indicativos, propostas, os passos a serem dados para se chegar à ação, sem con-
tudo, pretender dar receitas, sim, reforçamos, orientações.

Atividades
1. Registre o seu entendimento por planejamento participativo, a partir das de-
finições explicitadas no texto.

214
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: instituindo o planejamento participativo

2. Quais são as finalidades do Projeto Político-Pedagógico? Comente-os com


possibilidades aplicadas a sua prática.

3. O que dá vida à escola é o Projeto Político-Pedagógico. Essa afirmativa esta


correta ou errada, de acordo com o texto? Justifique sua resposta, respalda-
da no conhecimento teórico exposto e ou em sua vivência escolar.

215
Instrumentos fundamentais à
construção da gestão democrática: a prática
pedagógica baseada na ação-reflexão-ação
Vivemos, hoje, a aurora de um novo milênio, época de profundas e ace-
leradas transformações, portanto, a escola não pode ficar alheia às mu-
danças que ocorrem na sociedade e que afetam profundamente o modo
de ser, de pensar, de sentir e de agir das pessoas.

Considerando que hoje existe a consciência de que o trabalho pedagó-


gico deve ser realizado no equilíbrio e na harmonia do desenvolvimento
de cada ser humano, e que a rapidez das mudanças da sociedade brasilei-
ra interfere na formação de valores das crianças e adolescentes, torna-se
necessário e urgente, repensar a prática pedagógica e os novos caminhos
que permeiam e oportunizam o aguçar do senso-crítico, a criatividade e a
expressividade dos educandos, para que atuem no mundo em que vive-
mos, com sabedoria e justiça e, assim, transformem o hoje e o amanhã em
dias cada vez melhores.

De acordo com Paulo Freire, ninguém caminha sem estar aprendendo


a caminhar.

O legado que Paulo Freire nos entrega tem sua base na necessidade
de descobrir o pensamento crítico e se apoia no processo contínuo de
ação-reflexão-ação, uma realidade concebida como um espaço concreto,
um momento histórico, que desafia o homem para a ação da transfor-
mação dessa realidade, fazendo-a mais de acordo com as necessidades
humanas. “Não posso entender os homens e as mulheres, a não ser mais
do que simplesmente vivendo, histórica, cultural e socialmente existindo,
como seres fazendo do seu caminho que, ao fazê-lo, se expõem ou se en-
tregam aos caminhos que estão fazendo e que assim os refaz também.”
(FREIRE, 1998, p. 97).

Os existencialistas Dewey, Freire, Schön e outros vinculam e reconhecem


o processo de humanização, como resultante do processo de ação-reflexão.
Na educação, ao se valorizar a prática pedagógica com enfoque reflexivo,
considerando ação e reflexão como constituintes da práxis, assume-se o
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

compromisso de ser capaz de agir e refletir. É fundamental que o professor se reco-


nheça como intelectual, como sujeito social, que pensa criticamente a sociedade,
a educação e sua prática pedagógica.

Nessa concepção, o professor não é um sujeito pronto e acabado, responsável so-


mente pelo desenvolvimento cognitivo de seus alunos. Ao considerarmos a escola
como locus do conhecimento, devemos vê-la como um espaço político-reflexivo, no
qual todas as pessoas dela participantes, especialmente professores e alunos,
sejam mobilizados, incentivados ao estudo, como agentes críticos do ato de co-
nhecer. Não há como formar sujeitos se o professor não é ele próprio, sujeito.
Não há como conquistar os alunos para uma posição crítica diante do conheci-
mento se o professor não tem essa mesma postura. Como diz Paulo Freire: “Estu-
dar é uma forma de reinventar, de recriar, de reescrever – tarefa de sujeito e não
de objeto” (GANDIN, 1999, p. 129).

Na escola em que se tem por concepção a educação humanista, o estudo


tem de ser uma prática constante, indagando que sociedade, escola e homem
se quer construir com o trabalho educativo da escola. É o referencial básico, a
concepção adotada para refletir e avaliar a prática pedagógica e planejar ações
coerentes aos ideais definidos pela equipe dessa escola. O estudo envolve ainda
questões pertinentes à docência, à construção do conhecimento, à relação entre
a sociedade e a educação e outros temas importantes à formação continuada
do professor crítico. Lembrando-se sempre da necessária conexão à sua prática,
problematizando o seu trabalho docente e o espaço da sala de aula.

A busca incessante por uma pedagogia reflexiva leva a um repensar da edu-


cação, não permitindo mais um pensamento dicotômico, linear, reducionista e
fragmentado, mas sim por um pensamento complexo, que busca a totalidade,
as interações, os desafios, encontros e desencontros do dia a dia, encontrando
soluções aos problemas, levando em consideração a multidimensionalidade do
real, abrangendo aspectos sociais, históricos, ecológicos e cerebrais.

Se o foco é o sujeito no coletivo, a aprendizagem e a construção do conheci-


mento só se justificam na realização de uma prática pedagógica voltada para o de-
senvolvimento humano como fator preponderante deste momento de transição.

Esse desenvolvimento humano,


[...] depende de nossa capacidade de reflexão, das habilidades de pensar e saber. Reflexão
significa a tomada de consciência do próprio pensamento em vista de uma ação livre, cada
vez mais adaptada. É a capacidade que permite ao ser humano, e somente a ele, perceber a si
próprio como chave da compreensão da realidade, com base em seu saber e em seu fazer, ou
seja, em sua ação. (CHARDIN, 1989, p. 24)

218
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: a prática pedagógica baseada na ação-reflexão-ação

A ação-reflexão propõe um repensar da educação centrado na adoção do


enfoque reflexivo na prática pedagógica valorizando as reflexões que ocorreram
antes, durante e depois das experiências vividas.

Uma pedagogia reflexiva envolve um pensamento mais complexo, que abar-


que aspectos sociais, históricos, econômicos, políticos e qualitativos, dentre ­outros.
É um pensamento que busca a totalidade, as interações e a integração para o en-
contro de soluções aos problemas e aos desafios apresentados no dia a dia.

A nova educação pressupõe o alcance de um novo patamar na história da evo-


lução da humanidade, no sentido de corrigir os inúmeros desequilíbrios existentes,
com base na compreensão de que se está numa jornada individual e ao mesmo
tempo coletiva, o que requer o desenvolvimento de uma consciência relacional,
pluralista, transdisciplinar e sistêmica, que traga maior abertura, uma nova visão
da realidade a ser transformada, baseada na consciência da inter-relação e da in-
terdependência essenciais que existem entre todos os fenômenos da natureza.

Uma educação que favoreça a busca de diferentes alternativas que ajudem as


pessoas a aprender a viver e a conviver, que tenha como princípio a ­valorização
do saber docente, a escola como o locus fundamental da construção e a reflexão
na e sobre sua ação, para que, então, se construa um novo profissional capaz de
produzir e transformar o seu contexto e, principalmente, auxiliar o educando
nesta transformação.

Acreditamos na vivência, imbuída de construção coletiva, envolvendo um


aprendizado onde destacam-se: o aprender a conhecer, o aprender a conviver,
o aprender a fazer e o aprender a ser, conforme expresso por Jacques Delors
(1999) em Educação: um tesouro a descobrir, Relatório da Unesco da Comissão
Internacional sobre a Educação para o Século XXI.

Relegando, dessa forma, uma concepção de formação meramente de trans-


missão de conhecimentos e assumindo uma formação de competências, trans-
ferindo da qualificação (saber-fazer) à competência, na qual o saber assume
uma atribuição de sujeito e a relação cognitiva define-se sobre o modo de ser. A
competência, assim, é inseparável da ação e os resultados são mensuráveis pela
capacidade de resolução de problemas em determinada situação.
O pensar do trabalho docente é uma proposição nova, pelo menos no que tange à possibilidade
de os professores discutirem e construírem sua própria ação pedagógica. Nesta visão, os cursos,
os livros, as propostas são instrumentos para uma reflexão coletiva e partilhada. A perspectiva
é dar voz ao professor, ouvir o seu discurso e poder pensar e refletir sobre ele com seus pares.
(BEHRENS, 1996, p. 116).

219
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Além da contribuição da teoria e dos teóricos, a realidade hoje está exigin-


do novas posturas e, para isso, necessita-se de pensadores, “em lugar de pedrei-
ros com tijolos isolados, o conhecimento exige aventuras arquitetônicas que
rompam com o estabelecido” (SANTOS, 1998, p. 40).

A reflexão sobre a própria prática propicia à escola e ao professor uma base


mais segura e consistente para a tomada de decisões pedagógicas.

A perspectiva de uma práxis reflexiva torna a prática diferenciada, pois ocorre


quando se compreende a ação docente como uma interação em sala de aula. O
professor trabalha o conhecimento ativa e reflexivamente, colocando-se como
elemento mediador e integrador.

Assim, o professor instiga, interpela e questiona os alunos insistentemente,


apresentando conhecimentos organizados. Para isso, o professor, em sua me-
todologia, deve sistematizar os elementos principais para a apropriação do co-
nhecimento, levando os alunos a refletirem, a estabelecerem relações entre o
aprendido e o novo aprendizado e a tomarem consciência sobre suas ideias, des-
cobertas e, ainda, a elaborarem outras.

Os professores que conseguem evoluir com a experiência têm capacidade


de conhecimento prático, ou seja, a capacidade de resolver problemas pela inte-
gração inteligente e criativa do conhecimento adquirido de forma teórica com a
técnica desenvolvida na atividade prática.

É esse tipo de professor que se pretende, reflexivo, capaz de construir e re-


construir conhecimentos, aplicá-los corretamente e obter melhores resultados
em termos de aprendizagem dos seus alunos, que assume responsabilidades
pessoais pelos resultados obtidos, comprometendo-se com a educação de
forma responsável e profissional.

Visualiza-se, assim, o caminho para a conjugação teoria-prática, “conheci-


mento na ação, reflexão sobre a ação e sobre a reflexão na ação” (SCHÖN apud
BEHRENS, 1996, p. 116).

É papel da verdadeira escola e de todos que nela estão envolvidos a reflexão


e análise constante da caminhada, pois crescer é evoluir, é explorar diferentes
possibilidades, aprender os benefícios da vida em sociedade.

Dessa forma, num processo constante de reflexão e ação, estaremos oportu-


nizando o crescer da pessoa e, consequentemente, da sociedade, colaborando
para a construção de um mundo mais humano, justo e fraterno.

220
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: a prática pedagógica baseada na ação-reflexão-ação

Texto complementar
Ensinar exige reflexão crítica sobre a prática
(FREIRE, 2008)

O pensar certo sabe, por exemplo, que não é a partir dele como um dado
dado, que se conforma a prática docente crítica, mas sabe também que sem
ele não se funda aquela. A prática docente crítica, implicante do pensar certo,
envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o
fazer. O saber que a prática docente espontânea ou quase espontânea, “de-
sarmada”, indiscutivelmente produz é um saber ingênuo, um saber de experi-
ência feito, a que falta a rigorosidade metódica que caracteriza a curiosidade
epistemológica do sujeito. Este não é o saber que a rigorosidade do pensar
certo procura. Por isso, é fundamental que, na prática da formação docen-
te, o aprendiz de educador assuma que o indispensável pensar certo não é
presente dos deuses nem se acha nos guias de professores que iluminados
intelectuais escrevem desde o centro do poder, mas, pelo contrário, o pensar
certo que supera o ingênuo tem que ser produzido pelo próprio aprendiz em
comunhão com o professor formador. É preciso, por outro lado, reinsistir em
que a matriz do pensar ingênuo como a do crítico é a curiosidade mesma, ca-
racterística do fenômeno vital. Neste sentido, indubitavelmente, é tão curioso
o professor chamado leigo no interior de Pernambuco quanto o professor de
Filosofia da Educação na Universidade A ou B. O de que se precisa é possibi-
litar, que, voltando-se sobre si mesma, através da reflexão sobre a prática, a
curiosidade ingênua, percebendo-se como tal, se vá tornando crítica.

Por isso é que, na formação permanente dos professores, o momento fun-


damental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prá-
tica de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. O próprio
discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto
que quase se confunda com a prática. O seu “distanciamento” epistemológico
da prática enquanto objeto de sua análise, deve dela “aproximá-lo” ao máximo.
Quanto melhor faça esta operação tanto mais inteligência ganha da prática
em análise e maior comunicabilidade exerce em torno da superação da in-
genuidade pela rigorosidade. Por outro lado, quanto mais me assumo como
estou sendo e percebo a ou as razões de ser de porque estou sendo assim,
mais me torno capaz de mudar, de promover-me, no caso, do estado de

221
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

curiosidade ingênua para o de curiosidade epistemológica. Não é possível


a assunção que o sujeito faz de si numa certa forma de estar sendo sem a
disponibilidade para mudar. Para mudar e de cujo processo se faz necessa-
riamente sujeito também.

Seria porém exagero idealista, afirmar que a assunção, por exemplo, de


que fumar ameaça minha vida, já significa deixar de fumar. Mas deixar de
fumar passa, em algum sentido, pela assunção do risco que corro ao fumar.
Por outro lado, a assunção se vai fazendo cada vez mais assunção na medida
em que ela engendra novas opções, por isso mesmo em que ela provoca rup-
tura, decisão e novos compromissos. Quando assumo o mal ou os males que
o cigarro me pode causar, movo-me no sentido de evitar os males. Decido,
rompo, opto. Mas, é na prática de não fumar que a assunção do risco que
corro por fumar se concretiza materialmente.

Me parece que há ainda um elemento fundamental na assunção de que


falo: o emocional. Além do conhecimento que tenho do mal que o fumo me
faz, tenho agora, na assunção que dele faço, legítima raiva do fumo. E tenho
também a alegria de ter tido a raiva que, no fundo, ajudou que eu continuasse
no mundo por mais tempo. Está errada a educação que não reconhece na justa
raiva1, na raiva que protesta contra as injustiças, contra a deslealdade, contra
o desamor, contra a exploração e a violência um papel altamente formador. O
que a raiva não pode é, perdendo os limites que a confirmam, perder-se em
raivosidade que corre sempre o risco de se alongar em odiosidade.

1
A de Cristo contra os vendilhões do Templo. A dos progressistas contra os inimigos da reforma agrária, a dos ofendidos contra a violência
de toda discriminação, de classe, de raça, de gênero. A dos injustiçados contra a impunidade. A de quem tem fome contra a forma luxuriosa
com que alguns, mais do que comem, esbanjam e transformam a vida num desfrute.

Dica de estudo
PEREIRA, E. D. P. C; ELY, V. D. O supervisor na escola reflexiva: gestão-formação-
-ação. Revista Linguagens, Educação e Sociedade. Teresina/PI, n. 13, p. 58-65,
jul./dez. 2005. Disponível em: <http://www.ufpi.br/mesteduc/Revista/N%2013/
artigo5.pdf>.

O artigo objetiva refletir sobre a necessidade de pensar uma teoria geral para
a escola. Apresenta a gestão a partir da proposta de uma escola reflexiva que
usa como metodologia para a construção do seu Projeto Político-Pedagógico
a pesquisa-ação. Aborda também a equipe pedagógica e a teoria e a prática no
cotidiano escolar.
222
Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática: a prática pedagógica baseada na ação-reflexão-ação

Atividades
1. Analise a afirmativa: “De acordo com Paulo Freire, ninguém caminha sem estar
aprendendo a caminhar”. Discorra sobre o que ela tem a ver com o conteúdo
exposto nesta aula.

2. Que papel ocupa o professor que envolve-se em uma educação reflexiva?

223
Avaliação institucional:
instrumento relevante para
o aperfeiçoamento da educação
Avaliar é estabelecer juízo de valor sobre dados
relevantes da realidade, visando tomada de posição.

(LUCKESI, 1984)

O dia a dia da humanidade desde os tempos remotos está permeado


de ações que levam os indivíduos a medir, comparar, analisar e valorar,
emitindo um juízo de valor.

A avaliação, seja formal ou informal, sistemática ou assistemática, faz


parte de um processo de reflexão do cotidiano sobre toda e qualquer ati-
vidade humana, sendo o instrumental de orientação ou reorientação das
ações dos indivíduos e organizações sociais.

Usamos Bertold Brecht, a seguir, para com seu pensamento percebermos


que a avaliação poderá ser utilizada, numa perspectiva diagnóstica e orien-
tadora do trabalho pedagógico, quanto concebida como processo e instru-
mento de desvelamento da realidade, ou ainda enfatizando mais, da vida.

Nós vos pedimos com insistência:

Não digam nunca:

Isso é natural;

sob o familiar,

descubram o insólito.

Sobre o cotidiano,

desvelem o inexplicável.

Que tudo o que é considerado habitual


Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

provoque inquietação.

Na regra, descubram o abuso.

E sempre que o abuso for encontrado,

encontrem o remédio.
Bertold Brecht

(Citação de Maria Estrela Araújo Fernandes, 2002, p.116).

E, por fazer parte da permanente reflexão sobre a atividade humana, a avaliação


se constitui em processo com intencionalidade, auxiliado por diversas ciências, e
aplicável em qualquer prática, segundo Gadotti (apud DEMO, 2002, prefácio).

A avaliação, além de ser um processo técnico, é também uma questão po-


lítica, pois a avaliação pode ser usada apenas para julgar e aí se constitui em
instrumento do poder (autoritário) ou pode se constituir em processo ou projeto
em que os participantes, avaliadores e avaliados, tendo o propósito da transfor-
mação, procuram e sofrem mudanças qualitativas.

“A avaliação institucional visa ao aperfeiçoamento da qualidade da educação,


isto é, do ensino, da aprendizagem e da gestão institucional, com a finalidade
de transformar a escola atual em uma instituição comprometida com a apren-
dizagem de todos e com a transformação da sociedade” (BELLONI, 2000 apud
FERNANDES, p. 114).

Ao se tratar de avaliação institucional, esta deverá ser dentro de um processo


sistemático, utilizando-se de procedimentos do método científico e realizando
o estudo com objetivos definidos de elementos da realidade. Ainda, a avaliação,
vista como processo que julga, implica no necessário conhecimento do objeto a
ser avaliado, com base em dados e informações pertinentes e relevantes. Há que
se destacar também a avaliação como guia para a tomada de decisões.

Esses pontos essenciais levantados estão claramente explicitados na defini-


ção elaborada, a partir de diversos conceitos pesquisados por Aquilar et al., apud
Freitas (1997, p. 19-20):
A avaliação é uma forma de pesquisa social aplicada, sistemática, planejada e dirigida; destinada
a identificar, obter e proporcionar de maneira válida e confiável dados e informações suficientes
e relevantes para apoiar um juízo sobre o mérito e o valor dos diferentes componentes de um
programa (tanto na fase de diagnóstico, programação ou execução), ou de um conjunto de
atividades específicas que se realizam, foram realizadas ou se realizarão, com o propósito de
produzir efeitos e resultados concretos: comprovados à extensão e o grau em que se deram

226
Avaliação institucional: instrumento relevante para o aperfeiçoamento da educação

as conquistas, de forma tal que sirva de base ou guia para uma tomada de decisão racional e
inteligente entre cursos de ação, ou para solucionar problemas e promover o ­conhecimento e a
compreensão dos fatores associados ao êxito ou fracasso de seus resultados. [...] a necessidade
de avaliação se explica porque permite uma retroalimentação ­sobre o que se está fazendo
e os erros que se cometem ou foram cometidos, a fim de poder ir sanando, melhorando ou
evitando passo a passo. (op.. cit., 1994, p. 31-2 e 35).

Da mesma forma, embasados em vários conceitos de diferentes autores e


correntes, Flores et al. (1993, p. 24-4) chegaram ao conceito de que:
La evaluación es el processo sistemático y permanente que permite captar información sobre el
objeto evaluada para contrastarlo com un marco de referência y a partir de esta contrastación
emitir juicios de valor y proporner alternativa para mejorar dicho objeto.

Conceitos outros, constituídos por diversos autores, em sua síntese, acabam


por refletir a definição dada por Luckesi (1984), citado como elemento introdu-
tório desse breve registro sobre a avaliação institucional.

A avaliação, principalmente no campo educacional, remonta aos primórdios


bancos escolares. Evidentemente que, em sua trajetória, sofre alterações de
acordo com sua concepção. Entretanto, em termos de avaliação institucional,
trata-se de assunto relativamente novo no cenário educacional brasileiro, geran-
do polêmicas nesse meio.

A literatura, a respeito de avaliação educacional, está na sua maioria voltada


à avaliação da aprendizagem. Acresce a isso a preparação dos educadores para
proceder somente a avaliação da aprendizagem dos alunos.

Avaliar a escola como um todo, sua gestão, seu funcionamento, as atividades


que são desenvolvidas levam realmente à formação conforme apregoa a filoso-
fia da escola?

E os professores, como está a sua atuação?

A participação do pais e da comunidade é significativa?

E o papel e a função da escola na comunidade?

O que está bem e o que precisa melhorar?

A avaliação institucional é uma função primordial do sistema de organização


e gestão dos sistemas escolares e das escolas. Essa avaliação, também chamada
de administrativa, visa à obtenção de dados quantitativos e qualitativos sobre os
alunos, os professores, a estrutura organizacional, os recursos físicos e materiais,
as práticas de gestão, a produtividade dos cursos e dos professores etc., com o
objetivo de emitir juízos valorativos e tomar decisões em relação ao desenvolvi-
mento da instituição (LIBÂNEO, 2004, p. 239).
227
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

São diversos os questionamentos que podem ser respondidos mediante a


avaliação institucional, constituindo-se esta em ferramenta fundamental de per-
cepção, de investigação e de construção.

A avaliação institucional ainda é uma área bastante restrita, são poucas as ex-
periências e a tradição em avaliação sistemática de instituições, bem como sua li-
teratura e, em consequência, carente ainda em sua conceituação e metodologia.

Apesar de recente, destaca-se com relevância o tema, deixando a discussão


de lado sobre a realização ou não da avaliação institucional, na busca da melhor
metodologia que levará à maior qualidade e eficiência.

A avaliação institucional “assume importância fundamental no planejamento


e gestão de organizações educacionais”, de acordo com Bordignon (apud GA-
DOTTI, 2000, p. 201). Ao fazer essa afirmação ele vincula a consecução dos obje-
tivos da avaliação institucional aos pressupostos, a seguir descritos:

 processo crítico e dialógico – a avaliação deve ser realizada com a partici-


pação de todos, tornando-se em espaço de crítica construtiva e de “plura-
lidade de vozes”;

 atribuir valores a meios e processo – e não atribuir a pessoas para superar


o autoritarismo;

 objetivos institucionais – o atingimento dos objetivos para a qualidade do


ensino e a educação cidadã:

 referencial de qualidade – parâmetro para a crítica da realidade;

 função diagnóstica – identificação das causas e não classificatória;

 promover mudanças – transformação da realidade pelo processo decisório;

 promover a cultura do sucesso institucional.

Reconhece-se assim, a avaliação institucional como instrumento de ­gestão que


permite repensar o compromisso da escola com a sociedade na qual está inserida.

A avaliação institucional é hoje vista como necessária, pois é um instrumen-


to de grande valia que pode ser construído e implantado por uma instituição
de ensino para produzir um conhecimento da realidade, daquilo que se deseja,
bem como do indesejável do interior da organização, no intuito de fornecer sub-
sídios ao planejamento para a melhoria da qualidade.

228
Avaliação institucional: instrumento relevante para o aperfeiçoamento da educação

Assim, a avaliação institucional não é mais vista somente como um instrumen-


to de controle burocrático e centralizador, em conflito com a autonomia. Na ver-
dade ela está sendo concebida como um processo necessário da administração
educacional e como exigência da democratização, segundo Moacir Gadotti.

Freitas e Silveira (1997) destacam pontos fundamentais sobre a avaliação na


universidade, que aqui generalizamos para toda e qualquer instituição de ensino:

 necessária clareza da concepção da educação e da realidade social;

 compromisso da instituição com o avanço da sociedade, no sentido de


transformação ou pelo menos interpretação da realidade;

 definição do Projeto Político-Pedagógico da instituição.

Como conclusão, a partir de considerações e conceitos diversos, Freitas e Sil-


veira (1997, p. 22) colocam que:
[...] a melhor definição que representa o significado da avaliação institucional na universidade
é aquela que contemple os aspectos básicos, tais como: um processo sistemático de reflexão,
acompanhamento e aperfeiçoamento das atividades acadêmico-administrativas; um instrumento
necessário para a tomada de decisões de forma racional, servindo também para comparar o real
com o ideal e, por fim, tendo como objeto a qualidade dos serviços oferecidos, no cumprimento de
sua missão como organização social.

Neste contexto, a avaliação institucional deve ser concebida como um processo sistemático de
análise, informação, acompanhamento e orientação das atividades desenvolvidas, cujo objeto
é a qualidade do ensino, da pesquisa, da extensão e de sua gestão. (FREITAS; SILVEIRA,1997).

Queremos mais uma vez retornar ao início deste nosso texto, face à relevân-
cia do conteúdo ora tratado “Avaliação Institucional”. Dissemos que avaliar é um
ato que exercemos no nosso dia a dia, pois sempre que precisamos tomar uma
decisão, fazemos avaliação dos aspectos positivos e negativos e nesse processo
estamos ao mesmo tempo atribuindo valores.

Além desse entendimento, o que levantamos para ressaltar, especialmente aos


gestores, é que ao instituir a avaliação institucional como instrumental à ­gestão,
voltamos à concepção de educação e aos objetivos que se desejam atingir porque
evidentemente ela será correspondente à concepção educacional e, portanto, a
avaliação institucional poderá acontecer por meio:

 de um diálogo construtivo e reflexivo, numa visão de educação humani-


zadora; ou

 de autoritarismo e repressão, com finalidade classificatória e competi­tiva.

229
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Como já existe a clareza de nossa postura educacional, salta aos olhos de


vocês leitores, até porque colocamos a conceituação também de avaliação, prin-
cipalmente, quando a vemos de forma processual, a nossa ­opção por uma ava-
liação institucional num enfoque humanizador, reflexivo e construtivo.
Nesse sentido, o processo de avaliação institucional é profundamente formativo e, atualmente,
vem desempenhando um destacado papel “proativo e construtivo” (SOBRINHO-BALZAN, 1995,
p. 11) na reestruturação de universidades, escolas e sistemas de ensino. Através dele é possível
compreender melhor os processos que produzem a instituição para poder melhorar a qualidade
de seus serviços e produtos. (GADOTTI, 2000, p.197).

Assim, a avaliação institucional pode ser promotora de qualidade no ­interior


da escola, melhorando as relações sociais, humanas e interpessoais e aperfei-
çoando sistematicamente todos os participantes, bem como e principalmente
em decorrência desse acontecimento, ocorre também a melhoria dos serviços
educacionais prestados pela escola.

Gadotti (2000, p. 199) refere-se à colocação de Genuíno Bordignon ao ­dizer:


a avaliação institucional constitui-se num “processo de autoconsciência institu-
cional”, desvelando causas e determinantes dos seus avanços, seus retrocessos,
seus sucessos e insucessos.

A avaliação de desempenho das instituições de ensino tem como objetivo geral


a revisão e o aperfeiçoamento do projeto pedagógico da mesma, promovendo a
continuada melhoria da qualidade e o propósito das atividades desenvolvidas.

Dessa forma, a utilização eficiente e eficaz, a ética e a relevância dos recursos


humanos e materiais da instituição transformadas em compromissos científicos
e sociais, afiança a qualidade e a importância dos seus serviços à comunidade.

Enfim, o processo de avaliação deve ser um processo contínuo e sistemático,


visando promover e manter aperfeiçoamento institucional, incentivando uma
sistemática de reflexão, redefinição de objetivos e priorização científica e social
da instituição educacional.

E a avaliação vista como um processo e para a transformação e aperfeiçoamento


institucionais tem as características descritas por Fernandes (2002, p. 134), a seguir:

 instrumento para a melhoria da educação;

 presta-se à identificação de dificuldades e sucessos;

 possibilita a formulação de ações para a transformação e aperfeiçoamen-


to da escola e do sistema educacional;

230
Avaliação institucional: instrumento relevante para o aperfeiçoamento da educação

 utilizada para construir qualidade e democratização da escola, influindo


positivamente no processo de transformação social.

Verifica-se que os processos de avaliação possuem objetivos que, para além


de qualquer preocupação classificatória, buscarão apontar – dentre os elemen-
tos considerados determinantes – pontos necessários de superação e pistas de
encaminhamentos para isto.

Para um processo de avaliação institucional, visando a transformação e aper-


feiçoamento institucional, segundo Fernandes (2002, p.135), alguns princípios
básicos devem ser seguidos:

 Adesão voluntária – deve ser um projeto desejado por todos da comuni-


dade escolar, o que possibilitará a legitimidade política ao processo. Diver-
sas reuniões deverão ser realizadas para sensibilizar e dar conhecimento
dos objetivos do projeto no intuito de instigar a participação de todos.

 Avaliação total e coletiva da escola – todos os setores que compõem a


escola devem ser avaliados e por todos os componentes da escola. Assim,
todos serão avaliadores e avaliados.

 Respeito à identidade da escola – importante considerar que cada es-


cola situa-se historicamente, bem como cada uma com suas particularida-
des, daí a nossa defesa por um processo avaliativo construído pelas pró-
prias escolas, usando da metodologia da autoavaliação e de elementos da
avaliação externa, envolvendo sujeitos internos (os que participam dire-
tamente da escola alunos, professores, gestores etc.) e sujeitos externos
(pais, entidades sociais, parceiros etc.). O destaque está em se poder anali-
sar todas as informações obtidas no contexto da escola e para elas buscar
e encontrar respostas reais e específicas às situações detectadas.

 Unidade de “linguagem” – o consenso no entendimento dos conceitos,


princípios e finalidades do projeto. Possível mediante estudo e discussões
com todos os envolvidos no processo.

 Competência técnico-metodológica – o projeto deve ter uma base cien-


tífica que o direcione e lhe dê legitimidade e fidedignidade. Todo o pro-
cesso deve ser acompanhado passo a passo em todas as suas etapas.

Assim, um processo de avaliação precisará necessariamente da adesão dos par-


ticipantes, pois que a coleta, a tabulação e a análise dos dados não terão sentido se
não forem acompanhadas de um plano de superação das dificuldades constatadas

231
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

e de promoção de mudanças, pois a avaliação institucional possibilita, como ­vimos,


o aprofundamento do conhecimento da instituição, assim como a análise de sua
trajetória e de seu Projeto Político-Pedagógico.

Qual é a nossa pretensão maior com este texto?


Poderíamos simplesmente deixar para você responder, e seria mais construti-
vo inclusive, mas vamos pensar juntos?

Primeiramente, destacar a necessidade premente de se realizar a avaliação


institucional e de forma séria e competente, pesquisando e buscando a metodo-
logia mais adequada à instituição, objeto da avaliação.

Segundo, a avaliação deve se constituir em processo contínuo na instituição ao


seu desvelamento, aperfeiçoamento, aprofundamento, crescimento quantitativo e
qualitativo e às mudanças, tendo em vista sempre a melhoria e a transformação.

Terceiro, imprimir a visão da possibilidade de se fazer avaliação de maneira


diferenciada: democrática, portanto participativa, reflexiva e construtiva, tendo
como referencial o Projeto Político-Pedagógico e, por isso, com a avaliação, vai
sempre promover o enriquecimento deste e da escola, na realização de seu
papel de transformação social.

A avaliação precisa ser espelho e lâmpada,

não apenas espelho.

Precisa não apenas refletir a realidade,

mas iluminá-la,

mas iluminá-la,

criando enfoques

perspectivas,

mostrando relações,

atribuindo significado.
(ABRAMS apud RISTOFF, 1995)

(Texto Maria Estrela Fernandes, p. 139 – livro Gestão da


Escola – Desafios a enfrentar)

232
Avaliação institucional: instrumento relevante para o aperfeiçoamento da educação

Texto complementar
Avaliação institucional: pensando princípios
(SOBRINHO, BALZAN, 2000)

[ ... ]

 “Avaliar é importante para impulsionar um processo criativo de auto-


crítica”;

 “Avaliar é importante para conhecer como se realizam e se inter-rela-


cionam as tarefas acadêmicas em suas dimensões de ensino, pesquisa,
extensão e administração”;

 “Avaliar é uma forma de restabelecer compromissos com a sociedade”;

 Avaliar é importante para “repensar objetivos, modos de atuação e re-


sultados”;

 Avaliar é “ estudar, propor e implementar mudanças no cotidiano das


atividades acadêmicas”;

 “Avaliar para poder planejar”;

 “Avaliar para evoluir”;

 etc.

Estas colocações todas me satisfazem. Concordo com elas, entendo o seu


significado e vejo a sua importância.

Quero, entretanto, acrescentar mais uma definição a essa lista de obje-


tivos, pois creio que ela está fortemente presente em todos os projetos de
avaliação: avaliar para (a)firmar valores.

A palavra avaliação contém a palavra “valor” e, por isso mesmo, não po-
demos fugir dessa concepção valorativa. Quando dizemos que avaliar tem a
função de (a)firmar valores, estamos dizendo também que negamos a supos-
ta neutralidade do instrumento e do processo de avaliação para admitir que
eles são sempre resultado de uma concepção impregnada de valores, sejam
eles científico-técnicos, didático-pedagógicos, atitudinais, éticos, políticos,
ou outro. Assim que, quando, por exemplo, organizamos um instrumento

233
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

de avaliação do desempenho docente, e este instrumento põe perguntas,


há sempre um valor desejado e indesejado subjacente a cada uma destas
perguntas. Quando perguntamos, por exemplo, se o professor apresentou
plano de ensino, estamos na verdade afirmando que apresentar plano de
ensino é desejável. Quando perguntamos se o professor cumpriu o plano de
ensino, estamos de fato afirmando que cumprir o plano é desejável. Quando
perguntamos se o professor foi assíduo ou pontual, estamos, sem dúvida,
afirmando que assiduidade e pontualidade são valores que prezamos.

Estas são as formas mais escancaradas de apresentar o que muitas vezes


se disfarça, se insinua e se espalha como neutro, mas a avaliação não é neutra
como não é neutra ou desinteressada a linguagem. O que temos que assumir
com toda a honestidade e franqueza é que há valores que prezamos e que
queremos que se instalem, em um dado momento histórico, com a cons-
ciência de que eles não são necessariamente eternos, pelo menos não na
forma em que hoje os concebemos. Enquanto acreditarmos que apresentar
planos de ensino e cumprir planos, ser pontual, ser assíduo, ser claro etc. são
valores importantes, por que não fazer a sua defesa? Pode ser que amanhã
surja alguém que nos convença de que nossos valores são prejudiciais ao
ensino e à aprendizagem. Talvez. Se formos, de fato, levados a crer que este é
o caso, é porque o argumento deve ser muito convincente. Se convencidos,
temos mais é que, com humildade, aceitar a mudança.

[ ... ]

É esta função educativa que nos conduzirá ao processo de instalação da


cultura e da avaliação – um processo que é penoso e lento porque se inscre-
ve não no vazio, ou numa página em branco, mas em uma história existente,
em uma realidade, em um texto cultural que o antecede e o qual pretende-
mos reescrever.

[ ... ]

O que busca, repito, é a instalação da cultura da avaliação para que se


perceba diuturnamente a importância da preocupação com processos e
resultados. Hoje temos, na maioria das universidades, mais normas, regula-
mentos e legislação do que cobrança de resultados. Esta é a evidência viva
de que nos falta a cultura da avaliação, pois de que nos servirão as normas
se não tivermos um norte? Conforme ressaltava o professor Jesus Renato de

234
Avaliação institucional: instrumento relevante para o aperfeiçoamento da educação

Gallo Brunet, sem avaliação não há planejamento e, sem planejamento, não


há norte. Poderíamos acrescentar: sem norte estaremos condenados a uma
caminhada sem visão e sem destino.

[ ... ]

O que se busca, antes de tudo, é a compreensão da necessidade de insta-


larmos na universidade a cultura da avaliação – um conjunto de valores aca-
dêmicos, atitudes e formas coletivas de conduta que tornem o ato avaliativo
parte integrante do exercício diuturno de nossas funções. E este processo só
logrará êxito se for coletivamente construído e se puder contar com inten-
sa participação de seus membros, tanto nos procedimentos e implementação,
como na utilização dos resultados.

[ ... ]

Um processo de avaliação, [ ... ] deve ser contínuo.

A continuidade permitirá a comparabilidade dos dados de um determi-


nado momento a outro, revelando o grau de eficácia das medidas adotadas
a partir dos resultados obtidos. Esta característica longitudinal da avaliação
permite também testar a própria confiabilidade tanto dos instrumentos
quanto dos resultados. [ ... ] . Só a continuidade é preciso que se diga, garan-
tirá a construção da cultura da avaliação – cultura esta fundamental para que
o programa logre êxito.

Dicas de estudo
COLOMBO, S. S. et al. Gestão educacional: uma nova visão. Capítulo II. In: COSTA,
T. O. D. Avaliação Institucional: uma ferramenta para o sucesso da instituição
educacional. Porto Alegre: Artmed, 2004.

O capítulo objetiva demonstrar a avaliação institucional como ferramenta


de auxílio à administração das instituições educacionais que buscam a melhoria
da qualidade de ensino. Apresenta breve relato histórico de avaliações institu-
cionais, situando-a no contexto educacional e político das diretrizes nacionais,
incitando o leitor à reflexão.

235
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Atividades
1. A avaliação, além de ser um processo técnico, é também uma questão polí-
tica. Explique essa afirmativa com o conteúdo do texto e, analisando a sua
vivência enquanto aluno, cite momentos em que tenha vivenciado situações
importantes em avaliação e que reflitam essa concepção.

2. Qual é a finalidade da avaliação institucional? Reflita sobre a sua vivência


profissional e relate como se estabelece o processo de avaliação institucional
e se este está em consonância com os reais propósitos da avaliação institu-
cional aqui propostas.

236
Avaliação institucional: instrumento relevante para o aperfeiçoamento da educação

3. E você já realizou uma avaliação pessoal sobre a sua instituição de ensino,


enquanto gestor ou docente? Agora é o momento de responder a alguns
questionamentos propostos no texto: Como está a atuação dos professores
em sua realidade? A participação dos pais e da comunidade é significativa? E
o papel e a função da escola na comunidade? O que está bem e o que precisa
melhorar? “A avaliação institucional visa o aperfeiçoamento da qualidade da
educação, isto é, do ensino, da aprendizagem e da gestão institucional, com
a finalidade de transformar a escola atual em uma instituição comprometida
com a aprendizagem de todos e com a transformação da sociedade”.

Responda esses questionamentos e avalie como está sua vivência dentro


dessa proposta: coerente, discrepante ou em processo de transformação?

237
Gabarito

Historicizando brevemente: da administração


empresarial à gestão democrática
1. Ideias sobre coordenação de produção existem desde a Antiguidade,
contudo, frente ao desenvolvimento da sociedade humana e, especial-
mente, ao processo produtivo foi que surgiu a necessidade de organi-
zar a produção, até então artesanal para uma amplitude industrial, nos
séculos XVIII e XIX, surgindo, assim, a premência do desenvolvimento
das teorias administrativas.

2.

a) Clássica:

“A escola clássica foi representada por três movimentos:

1) A administração científica de Taylor – que estabelece o cará-


ter científico dos processos produtivos e a eficiência na empresa.
Criador da administração científica, preocupa-se com o contro-
le e a racionalização do trabalho, dando ênfase ao capital. Taylor
buscava determinar cientificamente os melhores métodos para a
realização de qualquer tarefa e para selecionar, treinar e motivar
os trabalhadores. Taylor baseou sua filosofia em quatro princípios
básicos: o desenvolvimento de uma verdadeira ciência da admi-
nistração, no intuito de ser possível determinar o melhor método
para realizar cada tarefa; a seleção científica dos trabalhadores, a
fim de que cada um deles ficasse responsável pela tarefa para a
qual fosse mais bem habilitado; a educação e o desenvolvimento
científico do trabalhador; a cooperação íntima e amigável entre a
administração e os trabalhadores.

2) A administração como ciência, de Henri Fayol – que propõe


a previsão, a organização, o comando, a coordenação e o controle
como suas fases fundamentais, apresentando também os princí-
pios da divisão de trabalho. Fayol se interessava pela organização
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

total e acreditava que a administração era uma habilidade como qual-


quer outra, que pode ser ensinada, desde que se seus princípios básicos
fossem compreendidos.

3) A administração burocrática de Max Weber – propondo uma estru-


tura de poder e autoridade, ou seja, defendia a necessidade de uma hie-
rarquia definida e governada por regulamentos e linhas de autoridade
claramente definidos.

b) Psicossocial:

A resposta deve basear-se neste trecho do texto a seguir. Estando em ne-


grito o que não deve faltar e em itálico o que deve respaldar a explicação:

A escola psicossocial apresenta a abordagem das relações humanas,


representadas por Elton Mayo e outros, contrapondo-se ao critério da
eficiência econômica trazida pela escola clássica e no comportamento
administrativo de Bernard e Simon. Esta escola concebe a organização
como um sistema orgânico e natural, preocupando-se com a integração
funcional em função dos objetivos organizacionais, avançando em relação
à escola clássica, mantendo, entretanto, os critérios da eficiência e eficácia,
mas relacionado ao sistema de decisões.

c) Contemporânea:

A escola contemporânea surge no início da década de 1980, e segundo


Hora (2000), em função da instabilidade econômica e política em nível
internacional, surgiram questionamentos, levando a novas perspectivas
teóricas da administração, sendo críticas, com base na fenomenologia, no
existencialismo, no método dialético e nas abordagens de ação, vinculando
os atos e fatos administrativos à relevância humana, considerando, portan-
to, a administração e a qualidade de vida humana dos participantes, imbu-
ídos de suas próprias opções existenciais.

Evidenciando o papel da gestão


educacional e o perfil do gestor escolar
1. Assim, na organização capitalista, o atingimento dos objetivos é função dos
recursos, meios de produção e força de trabalho, considerados mercadorias, a
educação passa a ter esta conotação; a escola de prestadora simplesmente de
um serviço – conteúdos; e o aluno de comprador-aquisitor desses conteúdos,

240
Gabarito

porque a administração da organização capitalista controla esses recursos, des-


considerando o elemento humano. A administração, sob essa ótica, é entendida
como o “processo de planejar, organizar, dirigir e controlar recursos humanos,
materiais, financeiros e informacionais, visando à realização de objetivos.” (MAR-
TINS, 1999, p. 24). E o administrador, um gerente, um controlador de trabalho,
responsável pelo planejamento e controle das atividades. “O administrador, cuja
ação passou a garantir ao capitalista um poder maior sobre os trabalhadores.”
(HORA, 2000, p. 36).”

2.

(F) disciplinado, rígido, controlador, supervisor, que não fomenta o traba-


lho em equipe, a criatividade e autonomia, que centraliza a tomada de
decisões;

(V) facilitador das relações interpessoais, estimulador da criatividade e


autonomia, motivador e orientador do trabalho em equipe.

3. “A responsabilidade das pessoas encarregadas da gestão deverá ser de lide-


rar, coordenar e gerenciar os esforços, de forma a se construir um ambiente
no qual a criatividade, a busca de novas experiências, o trabalho em equipe,
a predisposição em estar sempre aprendendo e o acompanhamento tran-
quilo das mudanças sejam uma constante.

Para tal realidade se concretizar, é necessário que gestores valorizem todas


as esferas da natureza humana e social, a saber: aprender a conhecer, apren-
der a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser. Tais necessidades exi-
gem desse gestor moderno a valorização, não apenas dos recursos físicos e
técnicos, mas notavelmente, da pessoa humana que caracterizam as organi-
zações educacionais.

Para tanto, é preciso uma visão administrativa com abordagem, ao mesmo


tempo, interativa, sistêmica e com grande sensibilidade às diferenças pesso-
ais ou singularidades dos sujeitos.

Devemos ressaltar que, para uma boa gestão, não é suficiente a competên-
cia administrativa, mas também competência técnica, liderança intelectual
e conhecimento humano. E a esses somam-se o dinamismo, a adaptação, a
realidade, o conhecimento do meio de atuação, a capacidade de análise e a
compreensão da comunidade escolar, no que diz respeito aos seus anseios
e necessidades. Sobre essa questão, vale a pena lembrar a importância de
envolver todos os profissionais por mais difícil que possa parecer. Para isso, é

241
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

de fundamental importância saber estabelecer metas e objetivos, criar me-


didas de contingência antecipadas, usufruir de ferramentas para avaliação
processual e estar sempre elaborando novos projetos de ação, valendo-se de
dados concretos.”

4. É fundamental que seja feito um paralelo sobre a realidade que o aluno(a)


vivencia à teoria apresentada, ou seja, deve estar claro para o aluno(a) que
as concepções apresentadas e implicações pertinentes. Parágrafo a que se
refere: “Conscientes de todo esse processo, inclusive como participantes de
curso de formador de pedagogo, com especialização em administração es-
colar, e no exercício da profissão, por muitos anos, repetidores e reprodutores
até o despertar por uma educação libertadora, que imprime em seus prin-
cípios a realidade sócio-histórico e cultural, a ação política, a participação, o
educador político e a transformação social, buscamos, tendo a teoria como
referencial, a participação de todos os profissionais da escola na construção
das ações e na realização dessas, não permitindo mais a dicotomia entre pla-
nejadores e executores. O papel e a postura do administrador é de um edu-
cador, coordenando e organizando o trabalho escolar com todos, não mais
passivos, meros executores, mas ativos, dinâmicos, autônomos, construtores
de suas práticas, capazes de tomadas de decisões conjuntas de suas ações.

Da administração autocrática à democrática


1.

Processo decisorial

(2) Centralizado na administração, mas permitindo diminuta delegação de


caráter rotineiro.

(4) Totalmente delegado e descentralizado. Nível institucional define políti-


cas e controla resultados.

(1) Totalmente centralizado na administração.

(3) Consulta aos níveis inferiores, permitindo participação e delegação.

Sistema de comunicação

(4) Sistemas de comunicação eficiente são fundamentais para o sucesso da


empresa.

242
Gabarito

(3) Procura-se facilitar o fluxo no sentido vertical (descendente e ascendente)


e horizontal.

(1) Bastante precário. Apenas comunicações verticais descendentes carre-


gando ordens.

(2) Relativamente precário, prevalecendo comunicação descendentes sobre


as ascendentes.

Relações interpessoais

(3) Provocam certa desconfiança nas pessoas e nas suas relações. A empresa
procura facilitar o desenvolvimento de uma organização informal sadia.

(1) Provocam desconfiança. Organização informal é vedada e considerada


prejudicial. Cargos e tarefas confinam as pessoas.

(2) São minimamente toleradas. Organização informal incipiente é considera-


da como uma ameaça à empresa.

(4) Trabalho realizado em equipes. Formação de grupos torna-se importante.


Confiança mútua, participação e envolvimento grupal intensos.

Sistema de recompensas

(2) Ênfase em punições e medidas disciplinares, mas com menor arbitrarieda-


de. Recompensas salariais mais frequentes. Recompensas sociais raras.

(4) Ênfase nas recompensas sociais. Recompensas materiais e salariais fre-


quentes. Punições são raras e, quando ocorrem, são definidas pelo grupo.

(1) Ênfase em punições e medidas disciplinares. Obediência estreita aos regu-


lamentos internos. Raras recompensas (de cunho salarial).

(3) Ênfase nas recompensas materiais (principalmente salário). Recompensas


sociais ocasionais. Raras punições.

2. A resposta deve estar vinculada aos seguintes parágrafos: “[...] o primeiro,


é a estrutura organizacional tradicional, apresentadas nos sistemas 1 e 2
usando o modelo baseado no “homem-a-homem”. As relações que se es-
tabelecem são diretas e exclusivas entre superior e subordinado; o poder
é centralizado na cúpula, portanto a cadeia de comando de cima para bai-
xo funciona via regras, metas e decisões. A forma individual da liderança

243
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

é enfatizada, os dirigentes não confiam em seus subordinados. [...] A nova


estrutura organizacional mencionada em sua obra é apresentada pelos sis-
temas 3 e 4, usando o modelo de organização grupal. Para Likert (1971),
o modelo grupal utilizado pelo sistema administrativo 4, em especial nas
tomadas de decisões, são efetivados de modo participativo, introduzindo
diferentes contribuições requeridas para a reflexão e para uma adequada
tomada de decisões. Cada grupo de trabalho é ligado por elos aos demais
grupos da empresa, por meio das pessoas que são membros de mais de um
grupo. Esses empregados, que superpõem suas ligações e seu relaciona-
mento com os demais grupos, são chamados de “elos de ligação”. Segundo
Chiavenato (1999, p. 205), “são verdadeiros elos de ligação entre os grupos
de trabalho, o que proporciona uma dinâmica totalmente nova no sistema.
Na prática, a estrutura organizacional permite uma vinculação de grupos
superpostos da seguinte maneira”. Para Chiavenato (1999), o processo de
interação ocorre entre os subalternos e superiores e vice-versa. Cada equi-
pe de trabalho compõe-se de um superior e de todos os subalternos a esse
superior. Dessa forma, um ou mais funcionários de cada equipe passam a
comportar-se como elos de vinculação com os demais grupos da empresa.
Entretanto, ocorrem os elos de vinculação superpostos. Em contrapartida,
o sistema 4 baseia-se em três aspectos principais: o primeiro é a utilização
de princípios de motivação em vez da dialética tradicional de “recompensas
e punições”. O segundo baseia-se na composição de equipes de trabalho
altamente motivadas, capazes de se empenhar para alcançarem as finalida-
des empresariais; e o terceiro está calcado na administração, a qual escolhe
metas para elevar a performance da empresa e para os demais funcionários.
Essas metas podem ser melhor alcançadas por meio de um sistema de ad-
ministração que permita condições de satisfazer aos objetivos individuais
dos colaboradores.

Modos de produção e a escola: descompassos e desafios


1. O aluno deve estabelecer um paralelo envolvendo os conceitos desenvolvi-
dos por Toffler e acrescentados pela autora Débora Dias Gomes, no livro MBA
Educação: escola que aprende. Rio de Janeiro: OR Editor Produtor Editor, p. 37,
2003. No quadro sobre o que foi chamado de Ondas/Pegadas, o período perti-
nente e os diferenciais de poder.

2. A resposta deve estar em consonância com o parágrafo: “Nas escolas pre-


senciamos, num momento em que vivemos em espaço e tempo de quarta e

244
Gabarito

quinta ondas, que ainda há a adoção do modelo de fragmentação dos pro-


cessos produtivos. Na empresa, isso aconteceu eliminando a participação do
trabalhador na totalidade do processo. E o reflexo disso, nos sistemas edu-
cacionais, foi a fragmentação do conhecimento, dividindo-os em disciplinas,
matérias, temas, impossibilitando ao professor e ao aluno uma visão do todo.
Por isso, deixam de existir leitura e exercício de reflexão sobre a realidade. Na
adoção desse modelo, a educação assumiu o papel de adequar, preparar o
aluno para aceitar e servir a um modelo de sociedade classista e alienante,
despersonalizando o aluno.

As mudanças estão ocorrendo aceleradamente e trazem novas formas de


trabalho, de viver e de conviver e, em decorrência, exercem influência na
economia, na política e nas formas como as sociedades se organizam. A pro-
dução do conhecimento é o maior desafio da modernidade.

Administração escolar e transformação social


1. “Paro, ao considerar que a administração se constitui num instrumento, vê a
importância em se recuperar o caráter instrumental de toda a administração, a
fim de viabilizar a análise da atividade administrativa da escola, forma esta de
se possibilitar uma administração escolar voltada para a transformação social.

Com esse entendimento, o autor procura analisar as condições possibilitado-


ras, assim como estabelece alguns pressupostos para que a prática adminis-
trativa que se espera realmente ocorra.

Elege para a análise os pressupostos básicos a seguir:

 o caráter conservador da administração escolar vigente;

 a natureza do processo de produção pedagógica na escola;

 administração escolar para a transformação social.”

2. “A análise do papel do educando, no processo educativo escolar, não pode


ser visto apenas como consumidor ou como cliente, assim colocado por di-
versas escolas, que têm seu trabalho pautado no desenvolvimento da esco-
la/empresa.

Muito mais que a simples presença, a participação do educando em todas as


atividades desenvolvidas pela escola é que vai dar significado ao processo pe-
dagógico. A atividade educativa não se realiza sem a participação do educando

245
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

tirar. Na medida em que o aluno se insere no processo educativo, ele é ao mes-


mo tempo objeto e sujeito da educação.

Visto o aluno como ‘objeto de trabalho’ do processo produtivo escolar, pois


ao se posicionar como objeto da educação, deixa de ser o aluno um simples
consumidor, uma vez que ele se constitui na própria “matéria-prima” a rece-
ber o trabalho humano com fim educacional.

Também, ao participar do processo produtivo como objeto de trabalho, o


aluno está assumindo o papel de produtor e ao compartilhar com seus cole-
gas o processo pedagógico assume o papel de coprodutor.

Fica em evidência o papel do aluno de produtor, de partícipe de sua própria


educação, de sua participação efetiva na ação educativa enquanto objeto e
enquanto sujeito da educação.”

3. Por advir da participação ativa do aluno no processo ensino-aprendizagem,


sendo este elemento relevante para ocorrer a aprendizagem, o coloca como
sujeito do processo porque a educação supõe uma modificação na natureza
do seu objeto, ou seja o produto é a própria transformação que ocorre no
aluno e não meramente acréscimo de conteúdo, mas englobando estraté-
gias de pensamentos, associações e desencadeamento de ideias, até mesmo
a criatividade para soluções diferentes aos mesmo questionamentos.

Na contramão de uma gestão educacional de qualidade:


a gestão da qualidade total na escola
1. “É uma filosofia que procura a excelência por meio da sensibilização e da
capacitação de recursos humanos da empresa. O próprio termo qualidade
total, de acordo com A. Feigenbaum, quer dizer a mobilização total dos re-
cursos humanos para a qualidade. A filosofia da qualidade total tem por base
as teorias da administração científica de Taylor, os conceitos de comporta-
mento humano de Maslow, o controle estatístico de Shewhart e as teorias de
administração da qualidade de Deming e Juran. Denota, portanto, a vincula-
ção aos conceitos de eficácia, eficiência e produtividade.

A qualidade total é um processo que exige:

 permanente atenção;

 crença na excelência cotidianamente;

246
Gabarito

 adesão espontânea de cada indivíduo envolvido;

 enaltecimento do pragmático.

Atualmente, já não se fala em controle de qualidade, mas em cultura da qua-


lidade, segundo Drügg.”

2. A resposta pode ser cinco das quinze citadas:

 Filosofia de qualidade – consiste no atendimento das necessidades, dos


interesses e das expectativas do cliente. A comunidade escolar deve ser
sensibilizada e preparada para um trabalho compromissado com a qua-
lidade.

 Constância de propósitos – após estabelecidos os propósitos futuros, os


procedimentos e os recursos, a escola tem sempre muito presente os seus
objetivos para manutenção de seus propósitos.

 Avaliação no processo – a avaliação é realizada durante o processo, acom-


panhando e avaliando a aprendizagem, para evitar dificuldades futuras.

 Não usar somente o preço como referencial nos negócios – a escola deve
ter critérios estabelecidos para suas compras, vinculando-as à sua qualida-
de e às necessidades e interesses dos alunos e não buscar apenas o mais
barato.

 Aperfeiçoamento constante – os dirigentes devem sempre estar atentos


em avaliar se o trabalho que está sendo realizado é de qualidade e se está
atendendo às necessidades, às expectativas e aos interesses da comuni-
dade escolar.

 Implantação do treinamento em serviço – a escola de qualidade deve con-


tar com um sistema de treinamento a todos que dela participam, pois as-
sim, com a capacitação, os dirigentes serão mais eficazes e mais eficientes
até mesmo na escolha de procedimentos mais adequados à qualidade. Da
mesma forma, os professores e os funcionários, por meio de treinamentos,
são mais engajados na Filosofia da Qualidade, promovendo a qualidade
dos serviços que prestam.

 Instituição da liderança – os dirigentes devem liderar de forma democrá-


tica e usar métodos administrativos que possibilitem a participação dos
comandados.

247
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

 Afastar o medo – “O medo tem um custo elevadíssimo. O medo está em


toda parte, tirando das pessoas seu orgulho, ferindo-as, tirando-lhes a
oportunidade de construir para a empresa”. Deming faz essa afirmação,
evidenciando que a escola que adotar a Filosofia da Qualidade deve extin-
guir da instituição qualquer situação geradora do medo.

 Eliminar barreiras entre setores – a administração na escola de qualidade


é descentralizada, podendo assim o diretor acompanhar as atividades de-
senvolvidas e os professores interagirem entre si.

 Eliminar slogans, dísticos exortativos e metas para os empregados – va-


loriza-se o diálogo entre todos os elementos participantes do processo
educacional, na consecução dos objetivos comuns. As informações são
abertas, claras e concisas.

 Eliminar as cotas numéricas – a escola de qualidade adota o controle esta-


tístico sistemático durante o processo, elimina as cotas numéricas porque
estão vinculadas a expectativas numéricas de desempenho.

 Retirar os obstáculos ao orgulho da execução – prioriza o trabalho em


equipe, levando em consideração o trabalho de cada integrante na conse-
cução dos objetivos da equipe.

 Instituir um programa de educação e re-treinamento – a escola de qualidade


preocupa-se com a oferta de cursos, seminários, participação em congres-
sos etc. pois, para um trabalho de qualidade, é necessária a atualização.

 Agir visando à concretização da transformação – a inovação, em termos de


propostas educacionais, está presente numa escola de qualidade e todos
devem estar convictos do objetivo de realização para a transformação.

Estabelecendo a qualidade de educação desejada:


a escola como construtora da cidadania
1.

Relações de poder:
( 2 ) Horizontais ( 1 ) Verticais
Estruturas:
( 1 ) Lineares / segmentares ( 2 ) Circulares / integradas

248
Gabarito

Espaços:
( 1 ) Individualizados ( 2 ) Coletivos
Decisões:
( 2 ) Descentralização / diálogo / ( 1 ) Centralizadas / imposição
negociação
Formas de ação:
( 2 ) Democracia / autonomia ( 1 ) Autocracia / paternalismo
Centro:
( 1 ) Autocentrismo / ( 2 ) Heterocentrismo /
individualismo grupo-coletivo
Relacionamento:
( 1 ) Competição/independência ( 2 ) Cooperação/ cessão/
Interdependência
Meta:
( 2 ) Mediação dos conflitos ( 1 ) Eliminação de conflitos
Tipo de enfoque:
( 2 ) Visão das partes do todo ( 1 ) Objetividade
Intersubjetividade
Objetivo:
( 2 ) Vencer com – co – vencer ( 1 ) Vencer de – convencer
Consequência:
( 1 ) Vencedores – predadores ( 2 ) Vencedores
Objeto do trabalho:
( 1 ) Informação ( 2 ) Conhecimento
Base:
( 1 ) A-ética ( 2 ) Ética
Ênfase:
( 2 ) No Ser ( 1 ) No Ter

2. Sua finalidade, tanto na dimensão individual quanto na dimensão social,


pois vive e realiza-se no espaço coletivo. Assim, a finalidade da escola funda-
menta-se na concepção do homem histórico, autônomo e livre, vivendo uma
relação solidária entre seus pares em espaço e tempo determinados.

249
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

A sua estrutura, suas relações internas e externas e a sua produção. Nesse


contexto, as relações interpessoais do processo educativo devem desenvol-
ver-se no eixo da horizontalidade e a “produção” da escola tem sua qualidade
definida na produção de seres autônomos e emancipados e na “produção” da
equidade e da justiça social, conquistando o espaço privilegiado para a cons-
trução da cidadania, no qual o trabalho e o conhecimento são identificados.

A qualidade como processo e qualidade total:


estabelecendo paralelos
1. É um instrumento de transformação social tendo em vista a construção de
uma sociedade democrática e participativa, na qual a participação coletiva
nas decisões sejam uma constante; fortalece a defesa aos direitos do homem,
individuais e coletivos, buscando o resgate da dignidade, liberdade e justiça;
fortalece a defesa por uma sociedade em que todos os homens (pessoa hu-
mana) possam se tornar sujeitos de seu processo histórico, do seu próprio de-
senvolvimento e do desenvolvimento social e auxilie na construção de uma
sociedade pluralista, imperando o respeito às pessoas e às organizações.

2.

Qualidade em educação Qualidade total


Princípios Voltado para a aprendizagem cidadã. Voltado para a aprendizagem do alu-
norteadores E ao falarmos em qualidade de educa- no em ambiente de qualidade, ou seja,
ção e aprendizagem cidadã. vivencia sempre a qualidade, para que
quando estiver no mercado de traba-
lho, objetive qualidade, voltado aos
interesses da empresa como projeto
de adulto – projeto de profissional.
Está, dessa forma, a qualidade total li-
gada ao desenvolvimento produtivo e
não ao ser humano em todos os seus
aspectos afetivo, cognitivo, social e es-
piritual.
Relação O estabelecimento de um processo de O professor serve ao aluno, que é o
professor-aluno qualidade pressupõe dinamicidade, cliente, assim como o diretor e os téc-
compromisso e uma visão sistêmica nicos pedagógicos e educacionais ser-
que atribua a todos, porque este pro- vem ao professor, cliente que é dessas
cesso é baseado na troca, na intera- pessoas.
ção, refletindo seu resultado mais nos
próprios processos e nas relações, afe-
tando todo o sistema.

250
Gabarito

Metodologia/ Avaliação possui procedimentos que Avaliação é mensuração, o quanto


avaliação envolvem participação, consciência, aprendeu, o quanto se destacou, o
entendimento, tendo como instru- quanto recebeu de conhecimento.
mentos a conversa, a participação da
vida comunitária e até mesmo bus-
cando assumir o projeto político da
comunidade.

Conceitualizando: qualidade e produtividade


1. Objetivo a ser alcançado por uma coletividade, com necessária participação de
todas as pessoas envolvidas e instituída a partir de um processo de busca
de melhoria na educação; ressaltando que a qualidade é uma competência
humana que envolve a capacidade construtiva e participativa.

2. A sociedade depende de pessoas que desenvolvam proatividade em relação


a sua vida, desenvolvendo iniciativa, autonomia, buscando resolução de si-
tuações de maneira criativa, não menos importante é a capacidade de ino-
var, propor situações diferentes objetivando o bem-estar a todos, efetivando
um sociedade democrática, pacífica e igualitária; para tanto necessita de es-
colas que tenham essa concepção de homem para propiciar uma educação
de qualidade.

Retomando a gestão democrática: instrumento principal para a


transformação do processo qualitativo da educação
1. Nos anos 1960, entendia-se participação, na administração escolar, como ser
integrante de algo. Hoje, participar é comprometer-se. A gestão democrática
impõe como condição a participação. São interdependentes, ou seja, não é
possível uma sem a outra. Desde os anos 1970, quando o regime político
autoritário levou o povo à descrença de que proporcionaria qualidade de
vida às pessoas, ele já foi perdendo forças, dando lugar à necessidade de
maior participação (comprometimento) das pessoas no cenário político, as
pessoas (alunos) já não se permitiam ser meros espectadores.

2. É importante a utilização de referências claras sobre o conteúdo que foi tra-


balhado, ou seja que o aluno consiga desenvolver uma análise subjetiva das
poesias e estabeleça relações entre os conceitos de liberdade / produtivida-
de / qualidade e participação.

251
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

Os alicerces da construção e manutenção da gestão democrática


1.

 Autonomia – se refere à criação de novas relações sociais que se opõem


às relações autoritárias existentes. A escola autônoma não significa esco-
la isolada, mas em constante intercâmbio com a sociedade. E, nesse mo-
mento, lutar por uma escola autônoma é lutar por uma escola que projete,
com ela, uma outra sociedade. Pensar numa escola autônoma e lutar por
ela é dar sentido novo à função social da escola e do educador que não
se considera um mero cão de guarda de um sistema iníquo e imutável,
mas se sente responsável também por um futuro possível com equidade
(GADOTTI, 1999).

 Participação – tal ação deve ter início em seus corações, o desejo mais pro-
fundo de ser parte integrante e transformadora de sua realidade. Desse
profundo desejo, a ação deve ser condizente aos seus pensamentos, a sua
ação deve estar voltada ao compromisso, levando à troca, contribuição e
aceitação, argumentação e contra-argumentação.

 Clima organizacional – propiciado pela cultura organizacional, reflete tal


como um espelho o comprometimento com a proposta assumida pelo
coletivo. Por meio do clima organizacional consegue-se perceber se os
desejos, postos em teoria no Projeto Político-Pedagógico, se efetivam,
na prática, pelos colaboradores. Muitas vezes, um sorriso, a maneira de
abraçar um aluno, a maneira do corpo docente se expressar entre eles, o
acesso à direção e demais setores são as imagens deste espelho. Um am-
biente livre, democrático e compromissado com os ditames da cidadania
faz transpirar a criatividade, a liberdade, o respeito e a colaboração.

 Estrutura organizacional – perde características autocráticas também. A


descentralização do poder permite que as relações circulem mais, priori-
zando a horizontalidade dessas relações.

2. Citações que servem como base para a resposta:

“A gestão democrática é “o principal instrumento para transformar o proces-


so educativo em sua prática social voltada para a construção da cidadania”.

(BORDIGNON apud FERREIRA; AGUIAR, 2000, p. 175).

252
Gabarito

“Segundo Valenini, ‘a cidadania é o espaço para a realização das pessoas.’ É


por meio de seu exercício que a sociedade pode reassumir seus rumos, re-
definir sua organização e reorganizar suas instâncias estatais, para que essas
sejam voltadas para o bem comum e para que se atualizem de acordo com
as mudanças que vão ocorrendo. Assim, a cidadania desabrocha pela educa-
ção e pela formação permanente, mas se atrofia pela alienação. A cidadania
que se consolida, então, pela participação, e que se abafa pela dominação.”

Covre conceitua cidadania como o próprio direito à vida no sentido pleno.


Trata-se de um direito que precisa ser construído coletivamente, não só em
termos do atendimento às necessidades básicas, mas de acesso a todos os
níveis de existência, incluindo o mais abrangente, o papel do(s) homen(s) no
universo.

Instrumentos fundamentais à construção


da gestão democrática: programa de formação continuada
1. A resposta pode basear-se nos seguintes parágrafos:

 planejamento compartilhado e frequentemente reavaliado;

 frequência na exposição de trabalhos e atividades realizadas. Essas expo-


sições devem conter produções dos alunos, não só dos que têm um bom
desempenho mas, principalmente, dos alunos com dificuldades;

 registro dessas discussões, realizado preferencialmente por outro profes-


sor e distribuído para o restante do grupo;

 busca de material teórico relevante para as dúvidas e interesses surgidos


no grupo;

 maior contato possível entre todas as séries;

 maior conhecimento dos planos de trabalho e das didáticas de outras áreas;

 contato frequente com outros setores: esportes, biblioteca, informática.


Enviando planejamento, combinando atuações conjuntas que potenciali-
zem e agilizem o trabalho em sala de aula ou promovam uma integração
dos alunos em atividades mais amplas.

253
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

2. O que os alunos precisam aprender? Como os alunos aprendem? Como sabe-


mos se os alunos aprenderam? Para isso, necessitamos rever nossas práticas
de ensino com um olhar mais atento às produções dos alunos. O coordena-
dor precisa incentivar o professor a selecionar material para análise conjunta
em orientação e, quando achar adequado, estender essa oportunidade ao
restante da equipe.

Instrumentos fundamentais à construção da


gestão democrática: instituindo o planejamento participativo
1. A construção da gestão democrática, o planejamento participativo é institu-
ído como instrumento, ferramenta possibilitadora de exercício, vivência da
prática democrática, implicando já, em primeira instância, em compromisso,
responsabilidade, autonomia e distribuição de poder.

O planejamento é um processo social, com opções filosófico-políticas, esta-


belecendo os fins de uma determinada ação, visando o alcance de objetivos
em períodos previamente determinados. Não há, portanto, neutralidade. Aos
que assim querem entendê-lo, usam-no apenas como instrumento técnico,
a serviço reprodutor da sociedade. O ato de planejar é um ato axiológico e
ideológico, comprometido com a sociedade.

Ao assumir o planejamento participativo, é necessário ter a clareza de que


planejar consiste em um processo para alcançar determinados objetivos, sig-
nificando transformação, revolução. E a esta opção da escola é importante
juntar-se a consciência das dificuldades a serem encontradas, principalmen-
te pela formação das pessoas, tradicionalmente, sem vivência democrática,
mas acreditando, primeiramente no potencial humano, no diálogo, debate,
discussão e no sonho, na utopia, na busca do impossível, no desejo de cres-
cimento pessoal e comunitário. “Fazer hoje o possível de hoje para amanhã
fazer o impossível de hoje”. (FREIRE apud GADOTTI, 1999, p. 32).

2.
 Aglutinar pessoas em torno de uma causa comum;

 dar um referencial para a caminhada;

 ser um instrumento de transformação da realidade;

 colaborar na formação dos participantes.

254
Gabarito

3. Não podemos ter essa ilusão. O que dá vida à escola são as pessoas, os sujei-
tos que historicamente assumem a construção de uma prática transforma-
dora. E para que isso aconteça é necessário considerar a estrutura organiza-
cional da escola, o seu currículo, o seu tempo escolar, o processo de decisão,
as relações de trabalho, e a avaliação que é feita na mesma.

Criando condições para outra forma de trabalho, que começa com a reorga-
nização de dentro para fora, pois o Projeto Político-Pedagógico é uma refle-
xão do cotidiano visando uma continuidade no processo do conhecimento,
democratizando-o.

O referencial teórico a respeito da construção do Projeto Político-Pedagógico


é vasto, entretanto, a prática, ou seja, as pessoas, os elementos a serem consi-
derados, enfim, o processo de construção, traz dificuldades aos educadores.

Instrumentos fundamentais à construção da gestão democrática:


a prática pedagógica baseada na ação-reflexão-ação
1. Na escola em que se tem por concepção a educação humanista, o estudo
tem de ser uma prática constante, indagando que sociedade, escola e ho-
mem se quer construir com o trabalho educativo da escola. É o referencial
básico, a concepção adotada para refletir e avaliar a prática pedagógica e
planejar ações coerentes aos ideais definidos pela equipe dessa escola. O
estudo envolve ainda questões pertinentes à docência, à construção do co-
nhecimento, à relação entre a sociedade e a educação e outros temas impor-
tantes à formação continuada do professor crítico. Lembrando-se sempre da
necessária conexão à sua prática, problematizando o seu trabalho docente e
o espaço da sala de aula.

Uma pedagogia reflexiva envolve um pensamento mais complexo, que abarque


aspectos sociais, históricos, econômicos, políticos e qualitativos, dentre outros.
É um pensamento que busca a totalidade, as interações e a integração para o
encontro de soluções aos problemas e aos desafios apresentados no dia a dia.

A reflexão sobre a própria prática propicia à escola e ao professor uma base


mais segura e consistente para a tomada de decisões pedagógicas.

Visualiza-se, assim, o caminho para a conjugação teoria-prática, “conheci-


mento na ação, reflexão sobre a ação e sobre a reflexão na ação”. (SCHÖN
apud BEHRENS, 1996, p.116).

255
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

2. Assim, o professor instiga, interpela e questiona os alunos insistentemen-


te, apresentando conhecimentos organizados. Para isso, o professor, em sua
metodologia, deve sistematizar os elementos principais para a apropriação
do conhecimento, levando os alunos a refletirem, a estabelecerem relações
entre o aprendido e o novo aprendizado e a tomarem consciência sobre suas
ideias, descobertas e, ainda, a elaborarem outras.

Os professores que conseguem evoluir com a experiência têm capacidade


de conhecimento prático, ou seja, a capacidade de resolver problemas pela
integração inteligente e criativa do conhecimento adquirido de forma teóri-
ca com a técnica desenvolvida na atividade prática; reflexivo, capaz de cons-
truir e reconstruir conhecimentos, aplicá-los corretamente e obter melhores
resultados em termos de aprendizagem dos seus alunos, que assume res-
ponsabilidades pessoais pelos resultados obtidos, comprometendo-se com
a educação de forma responsável e profissional.

Avaliação institucional: instrumento relevante


para o aperfeiçoamento da educação
1. A avaliação pode ser usada apenas para julgar e aí se constitui em instru-
mento do poder (autoritário) ou pode se constituir em processo ou projeto
em que os participantes, avaliadores e avaliados, tendo o propósito da trans-
formação, procuram e sofrem mudanças qualitativas.

2. “A avaliação institucional visa ao aperfeiçoamento da qualidade da educa-


ção, isto é, do ensino, da aprendizagem e da gestão institucional, com a fina-
lidade de transformar a escola atual em uma instituição comprometida com
a aprendizagem de todos e com a transformação da sociedade”. Ao se tratar
de avaliação institucional, esta deverá ser dentro de um processo sistemático,
utilizando-se de procedimentos do método científico e realizando o estudo
com objetivos definidos de elementos da realidade. Ainda, a avaliação, vista
como processo que julga, implica no necessário conhecimento do objeto a
ser avaliado, com base em dados e informações pertinentes e relevantes. Há
que se destacar também a avaliação como guia para a tomada de decisões.

3. Nesta questão específica não há uma resposta direcionada, tendo em vista


que o aluno irá realizar uma avaliação de sua própria vivência educacional.

256
Referências

ALBALA-BERTRAND, Luis. Cidadania e Educação. São Paulo: Papirus,


1999.

ALONSO, Myrtes. O Papel do Diretor na Administração Escolar. São


Paulo: Difel, 1978.

ANTUNES, Celso. Gestão e liderança. Revista Gestão Educacional, Curiti-


ba: Humana Editoral, fev. 2008.

_____. É hora de investir em qualidade. Gazeta do Povo, Curitiba, 9 mar.


2008.

APPLE, M.; TORRES, C.A.; FURTES, P.; PUIGGRÓS, A.; FERNANDES, A.M.S.;
NÓVOA, A. Paulo Freire: política e pedagogia. São Paulo. Coleção Ciências
da Educação.

APPLE, Michael W; BEANE, James A. (orgs.). Escolas Democráticas. Porto,


Portugal: Porto, 2000.

ASSMAN, H. Reencantar a Educação – rumo à sociedade aprendente. Rio


de Janeiro: Vozes, 1998.

AZEVEDO, J.P; GENTILI, P; KRUG, A; SIMON, C. Utopia e Democracia na


Educação Cidadã. Porto Alegre: Editora da Universidade, 2000.

BEHRENS, Marilda Aparecida. Formação Continuada dos Professores e a


Prática Pedagógica. Curitiba: Champagnat, 1996.

BERMÚDEZ, Jaime G. Rojas. Introdução ao Psicodrama. 3. ed. São Paulo:


Mestre Jou, 1980.

BERTRAND, L.A.(Org) Cidadania e Educação: rumo a uma prática signifi-


cativa. Campinas: Papirus, 1999.

BORDEWICH, Fergus M. Escola Nota 10. Revista Seleções, RJ: Reader’s


Digest, mar. 2006.

BOWDITCH, James L; BUONO Anthony F. Elementos de Comportamento


Organizacional. São Paulo: Pioneira, 1992.
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

BUFFA, Ester. Educação e Cidadania. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2000.

CASTRO, Cláudio de Moura. Educação não é mercadoria! Revista Veja. São Paulo:
Abril, edição 2055, ano 41, n.14., 9 abr. 2008.

CATAPAN, Araci Hack. O Contexto, o Texto e o Hipertexto. Belo Horizonte: Dois


Pontos, v. 5, n. 41, mar./abr., p.71-73, 1999c.

CATAPAN, Araci Hack; THOMÉ, Zeina Rebouças Corrêa. Trabalho e Consumo


para Além dos Parâmetros Curriculares. Florianópolis: Insular, 1999.

CHARDIN, T. O Fenômeno Humano. São Paulo: Cultrix, 1989.

CHIAVENATO, Idalberto. Teoria Geral da Administração. 6. ed. Rio de Janeiro:


Campus, 1999. 2 v.

COMENIUS. Didática Magna. 3. ed. São Paulo: Wmf, Martins Fontes, 2006.

CRUZ, C.H.C. A qualidade como processo. Revista de Educação AEC, n. 92,


1994.

DALMÁS, Angelo. Planejamento Participativo na Escola: elaboração, acompa-


nhamento e avaliação. 7. ed. Petrópolis: Vozes, 1994.

DAVIS, C.; VIEIRA, L. Gestão da Escola: desafios a enfrentar. Rio de Janeiro: DP&A,
2002.

DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir – Relatório da UNESCO da


Comissão Internacional sobre a Educação para o Século XXI. São Paulo: Cortez,
1999.

DEMO, Pedro. Avaliação Qualitativa. 7. ed. São Paulo: Autores Associados,


2002.

_____. Educação e Qualidade. 8. ed. Campinas, São Paulo: Papirus, 2003.

DUDEK, Cristiane; SOUZA, Márcia R.; URBAN, Renata C. P. Revista Educação em


Movimento, Curitiba, 4 v. n. 10, p. 21-28, jan./abr. 2005.

DUROZOII, G; ROUSSEL, A. Dicionário de Filosofia. Campinas: Papirus, 1993.

EYNG, Ana Maria. Projeto Padagógico: a construção coletiva da identidade da


escola: um desafio permanente. Revista Educação em Movimento, AEC/PR,
jan./abr. 2002.

260
Referências

FARIA, Roberta. Aprender por toda a vida. Revista Sorria. SP: Mol, jul./ago.
2008.

FELDMAN, Dinah. A Escola Que Aprende. Revista Educação, Editora Segmento,


n. 94, fev. 2005.

FERNANDES, Maria Estrela. Gestão da Escola – desafios a enfrentar. s. l., 2002.

FERREIRA, Naura S. Carapeto. Gestão Democrática da Educação: atuais tendên-


cias, novos desafios. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2000.

FERREIRA, Naura S. Carapeto; AGUIAR, M. A. S. Gestão da Educação. São Paulo:


Cortez, 2000.

FERREIRA, N.S.C.; AGUIAR, M.A.S. Para Onde Vão a Orientação e a Supervisão


Educacional. São Paulo: Papirus, 2002.

FERREIRA, N.S.C.; MACHADO, L.M. Política e Gestão da Educação: dois olhares.


Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. 21. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.

_____. Ação Cultural para Liberdade. 8. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.

_____. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

_____. Educação como Prática da Liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.

_____. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São


Paulo: Paz e Terra, 1996 (Coleção Leitura).

_____. Pedagogia da Esperança. Um reencontro com a pedagogia do oprimido.


5. ed. Rio de Janeiro: Pioneira, 1997.

_____. Professora Sim, Tia Não. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998.

FREITAS, Ieda Maria Chaves; SILVEIRA, Amélia. Avaliação da Educação Superior.


Florianópolis: Insular, 1997.

FÉLIX, Maria de Fátima. Administração Escolar: um problema educativo ou em-


presarial. Cortez, 1984.

GADOTTI, Moacir; ROMÃO, José E. (orgs.) Autonomia da Escola: princípios e


propostas. São Paulo: Cortez, 1997.

261
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

GADOTTI, Moacir. Escola Cidadã. 5. ed. São Paulo: Cortez, 1999.

GADOTTI, M. et al. Perspectivas Atuais da Educação. Porto Alegre: Artes Médi-


cas, 2000.

GANDIN, Danilo. Escola e Transformação Social. 3. ed. Petrópolis (RJ): Vozes,


1988.

_____. A Prática do Planejamento Participativo: na educação e em outras ins-


tituições, grupos e movimentos dos campos cultural, social, político, religioso e
governamental. Petrópolis (RJ): Vozes, 1994.

GANDIN, Danilo; GANDIN, Luís Armando. Temas para um Projeto Político-Pe-


dagógico. 2. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1999.

GASSALA, José Maria. Mudanças: a importância das pessoas nas organizações.


São Paulo, RH em Síntese, ano II, p. 69, 11 jul./ago. 1996. Entrevista concedida
à revista espanhola Aedipe, reproduzida pela revista RH. Disponível em: <www.
gestaoerh.com.br/artigos/comp_015.shtml [2.000]>. Acesso em fev. 2009.

GOMES, D. D. MBA/Escola que Aprende. Rio de Janeiro: OR Editor Produtor,


2003.

GONÇALVES, M.A. Formação da Cidadania. Rio Grande do Sul: Paulus, 1994 (Co-
leção Temas da Atualidade).

HORA, Dinair Leal. Gestão Democrática na Escola. 7. ed. São Paulo: Papirus,
1994.

HORA, Dinair Leal. Gestão Democrática na Escola. 7. ed. São Paulo: Papirus,
2000.

LAFFITTE, Eduardo; NUNES, Ana Maria. Bioação: uma abordagem relacional para
o sucesso organizacional. 1. ed. Curitiba, 1999.

LEOCÁDIO, Nelson. O Processo do Desenvolvimento Gerencial. São Paulo:


Summus, 1982. p. 174-175.

LIBÂNEO, J. C. Organização e Gestão da Escola. 5. ed. Goiânia: Alternativa,


2004.

LIBÂNEO, José Carlos. Organização e Gestão da escola: teoria e prática. 5. ed.


revista e ampliada. Goiânia: Alternativa, 2004.

LIKERT, Rensis. Novos Padrões de Administração. 2. ed. São Paulo: Pioneira, 1971.

262
Referências

LOURENÇO FILHO, B. A Pedagogia de Rui Barbosa. 2. ed. São Paulo: Melhora-


mentos, 1956.

LUCKESI, Cipriano C. Avaliação da Aprendizagem Escolar. São Paulo: Cortez,


1995.

LÜCK, Heloísa. A Escola Participativa: o trabalho do gestor escolar. 2. ed. Rio de


Janeiro: DP&A, 1998.

_____. Liderança em Gestão Escolar. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. Série Cadernos
de Gestão: 4.

MACHADO, Maria Aglaê. Políticas e Práticas integradas de formação de gestores


educacionais. Gestão em Rede, dez. 1998.

MARTINS, J do P. Administração Escolar. São Paulo: Atlas, 1999.

MORAES, Maria Cândida. O Paradigma Educacional Emergente. São Paulo: Pa-


pirus, 1997.

MORENO, Luiz Carlos. Gestão inteligente é uma gestão emocionante. Revista


Gestão Educacional. Curitiba: Humana, maio 2008.

MORIN, Edgar. A Cabeça Bem Feita: repensar a reforma/reformar o pensamen-


to. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.

PARO, Vitor Henrique. Administração Escolar: introdução crítica. 6. ed. São


Paulo: Cortez, 1993.

_____. Gestão Democrática da Escola Pública. São Paulo: Ática, 1997.

PEREIRA, Camila. Termômetro do bom ensino. Revista Veja, São Paulo: Abril, 7
maio 2008.

PERRENOUT, Philippe. Construir a Competência desde a Escola. Porto Alegre:


ArtMed, 1999.

PERRY, M. et al. Civilização Ocidental: uma história concisa. São Paulo: Martins
Fontes, 1985.

PIMENTEL, Maria da Glória. O Professor em Construção. São Paulo: Papirus,


1994.

PRAIS, Maria de Lourdes Melo. Administração Colegiada na Escola Pública. 4.


ed. São Paulo: Papirus, 1996.

263
Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade

RAMOS, Cosete. Excelência na Educação. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1994.

RAUL; MACHADO; BURZYNSKI; JUNQUEIRA. A importância da formação conti-


nuada dos profissionais da educação na sociedade moderna. Revista Educação
em Movimento, Curitiba: Champagnat, v. 4, n. 10, jan./abr. 2005.

RIBEIRO, José Quirino. Ensino da Teoria de Administração Escolar. São Paulo:


Saraiva, 1978.

RODRIGUES, Gustavo. A escola de todos. Revista Gestão Educacional, Curitiba:


Humana Editorial, ano 4, n. 37, jun. 2008.

_____. Os fins são os mesmos, já os meios.... Revista Gestão Educacional. Curiti-


ba: Humana editorial, ano 4, n. 42., nov. 2008.

_____. Você faz toda a diferença. Revista Gestão Educacional, Curitiba: Humana
editorial, ano 4, n. 41, out. 2008.

ROMÃO, José Eustáquio. Dialética da Diferença: o projeto da Escola Cidadã


frente ao Projeto Pedagógico Neoliberal. São Paulo: Cortez, 2000.

SANTOS, Clóvis Roberto. A Gestão Educacional e Escolar para a Modernidade.


São Paulo: Cengage Learning, 2008.

SAVIANI, D. Pedagogia Histórico-Crítica: primeiras aproximações. São Paulo:


Autores Associados, 2003.

SNYDERS, Georges. Escola, Classe e Luta de Classes. 2. ed. São Paulo: Centauro,
1976.

TOFFLER, A. A Terceira Onda. Rio de Janeiro: Record, 1987.

VALENINI, L.D. Qual cidadania? O professor necessário na construção da cida-


dania. In: CONGRESSO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 15, Fortaleza, CE, 1995.

ZAINKO, Maria Aurélia Sabbag. Planejamento, Universidade e Modernidade.


All Graf. Editora, 1998.

ZOHAR, Danah. O ser quântico. Revista Exame, p.106-112, nov. 1998,

264
Anotações
Maria Cristina Munhoz Araújo

Modelos de Gestão: Qualidade e Produtividade Modelos de Gestão:


Modelos de Gestão: Qualidade
Qualidade
e Produtividade e Produtividade

Você também pode gostar