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Correntes Antropológicas

Autora: Rebeca Jaime Sabão Gundana1

Resumo

A história da antropologia está indissociavelmente ligada à busca pelo conhecimento de


nossa origem, isto é, das formas mais simples de organização social e de mentalidade até as
formas mais complexas das nossas sociedades. No século XIX, a etnologia se aderiu à teoria do
monogenismo enquanto a antropologia física defendia o poligenismo. Foi nesse período que
surgiram dois linhas de pensamento teórico entre os etnólogos acerca da origem do ser humano:
o evolucionismo e o difusionismo e posteriormente as correntes funcionalistas e estruturalista.

Os principais pontos levantados por autores chamados a tecer seus pensamentos da


edificação deste artigo foram os seguintes: a sociedade, mesmo as pequenas sociedades, deve ser
analisada na perspectiva das suas respectivas totalidades, ou seja, cada fenómeno cultural, para
ser melhor compreendido, tem que ser contextualizado no interior da própria sociedade.

Palavras-Chaves: Cultura, Homem, Sociedade, Antropológia.

Introdução

O presente artigo pretende desenvolver em torno das correntes Antropológicas


nomeadamente: Evolucionismo, Difusionismo, Estruturalismo e por fim Funcionalismo, portanto
a leitura desta sobre as correntes Antropológicas contribuiu para melhorar o meu conhecimento
sobre a prática antropológica, principalmente a respeito das duas correntes de pensamento
construídas na primeira metade do século XIX e no início do século XX. Contudo, preciso entrar
em contato com o meu monitor para melhor compreender as mudanças em relação à prática de
pesquisa entre os dois modelos de pensamento. Micros sociedades e sociedade total ainda não
estão claros para mim. comparativo, espaço metodológico importante para decifrar os signifi
cados dos fenômenos culturais.

1
Estudante da Universidade Alberto Chipande, curso de mestrado em Saúde Pública. Licenciada em Nutrição pela
Universidade Adventista de Moçambique, Funcionária no Hospital Central da Beira. Correio electrónico:
rabecajaimesabao9@gmail.com
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O artigo tem como objectivo geral: Compreender as correntes Antropológicas. E tem


como objectivos específicos:

 Focalizar o desenvolvimento das correntes Antropologia (Evolucionista,


Difucionista, estruturalista e funcionalista)
 Apresentar o pensamento funcionalista no âmbito da antropologia.
 Identificar os principais pensadores funcionalistas na antropologia e os seus
princípios.
Na abordagem científica, o artigo tem como método hermenêutico que consistiu não só
na leitura e interpretação dos textos escritos, factos ou acontecimentos. Com esta base
metodológica, sustenta-se para um pressuposto que fundamente a análise o tema supracitada.
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1.Corrente Evolucionista

A primeira corrente teórica que propriamente pode ser chamada de antropológica, o


evolucionismo cultural pressupunha uma unidade psíquica do ser humano. Com esse
pressuposto, todos os povos passariam unilinearmente por estágios de desenvolvimento
sociocultural semelhantes, do mais primitivo modo de vida ao mais complexo. Desse modo, seria
possível conhecer o passado da humanidade bastando investigar os povos mais “primitivos”.

Essa busca pelos seres humanos mais prístinos levou ao estudo da origem das instituições –
principalmente a religião, a família, a propriedade e o direito – entre os esses povos “fósseis”
como os arunta da Austrália, por sua suposta simplicidade. Como pode se inferir dessa visão bem
enviesada, a complexidade tecnológica reflectiria uma maior complexidade social. Assim, as
sociedades ocidentais seriam as mais “avançadas” (Leach, 1977).

O difusionismo — similarmente ao evolucionismo cultural — foi uma abordagem diacrónica


para explicar a diversidade da cultura. Os dados sobre as diferenças entre os povos acumulados
exponencialmente desde as grandes navegações não possuíam coerência. Enquanto o
evolucionismo tentava explicar essas variações pelos diferentes estágios que supostamente a
humanidade passaria (mas sem esclarecer como passava de um estágio a outro), o difusionismo
pressupunha uma falta de inventividade. As grandes invenções teriam local de origem certa e se
propagariam por difusão, migração, apropriação, aculturação ou assimilação, depois adquirindo
conotações locais (Leach, 1977).

1.1 Visão Etnocêntrica

A visão etnocêntrica2, na perspectiva dos evolucionistas, é o conceito europeu do homem


que se atribui o valor de “civilizado”, denotando, com isso, a ideia de atrasados ou inferiores aos
outros povos, em suma, povos que não tinham uma história ou dela estavam fora. Nesta unidade,
vimos, através do pensamento de Franz Boas, o rompimento que esse autor introduz ao
pensamento antropológico, que se apoiava na visão etnocêntrica (Leach, 1977).

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A visão etnocêntrica da corrente evolucionista, para explicar o conceito de homem, sofreu críticas de muitos
teóricos ulteriores há seu tempo. Mas afinal o que é etnocentrismo? Perpassando todos estes campos de
investigações, a herança boasiana estabelece uma crítica impertinente ao conceito de etnocentrismo. A palavra
[etnocentrismo] foi criada pelo sociólogo americano Willian G. Summer e apareceu pela primeira vez em 1906.
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A explicação evolucionista das diferenças culturais transporta para os sistemas sociais a


mesma compreensão da evolução biológica. Mesmo demonstrando pouca criticidade quanto ao
lugar da enunciação da superioridade civilizacional do ocidente, essa corrente teórica tomará a
cultura como um fenômeno capaz de ser estudado de maneira sistemática, procurando leis e
regularidades no comportamento humano, antes atribuído inteiramente à biologia (Leach, 1977).

Edward Tylor, em 1871 tinha como preocupação central de Tylor era reconhecer a
cultura como um fenômeno da natureza humana, independente da biologia ou da teologia.
Introduziu a noção de unidade psíquica da espécie humana, definindo como tarefa para
antropologia o estabelecimento de uma escala de civilizações. O problema destes argumentos era
“a idéia de a cultura desenvolver-se de maneira uniforme, de tal forma que era de se esperar que
cada sociedade percorresse etapas que já tinham sido percorridas pelas sociedades mais
avançadas” (Laraia, 2002, p. 34).

As teorias antropológicas evolucionistas chegaram acompanhadas pelas teorias de


evolução biológica e foram reafirmadas pela noção positivista da história. Desta forma,
adquiriram grande popularidade e, ainda hoje, é muito frequente ouvirmos suas teses serem
resgatadas para explicar a diferença entre as sociedades. As escolas teóricas ulteriores, nas quais
tanto a antropologia quanto o conceito de cultura conquistou maturidade e destaque científico,
foram extremamente críticas aos métodos de investigação e as conclusões das teses
evolucionistas. Reagiram incontestes à admissão de que as sociedades humanas pudessem ser
escalonadas em termos de superioridade ou inferioridade (Laraia, 2002, p. 34).

Seus pesquisadores denunciavam o preconceito ideológico dos evolucionistas ao


utilizarem como critério comparativo para aferição de desenvolvimento das sociedades humanas
justamente aqueles quesitos nos quais a sociedade europeia se destacava como a tecnologia e o
progresso económico. (Laraia, 2002, p. 34).

Segundo Everardo Rocha (1994), o etnocentrismo se apoia em duas reações humanas


diante do desconhecido: uma de origem emocional – o medo que qualquer ser humano apresenta
diante daquilo que ele desconhece, e outra de ordem cognitiva– a necessidade de afirmar os
limites entre a sociedade do Eu e a sociedade do Outro.
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Para se opor a comportamentos que surgem de “mal entendidos sociológicos” (na medida
em que compreendemos os outros através de nossas próprias lentes, como dizia Margaret Mead),
a antropologia cunhou o conceito de relativismo cultural. Ou nas palavras de Everardo Rocha
(1988), “estamos diante de sócio-lógicas diferentes”.

1.2 Critica a corrente Evolucionista

Diante dessas considerações, temos que destacar que a tendência teórica da qual estamos
tratando, a evolucionista, pressupõe que as mudanças por que a humanidade passa, seguem leis
definidas e que são aplicáveis para todas as sociedades humanas. Os teóricos evolucionistas se
baseavam no método dedutivo, ou seja, do geral para o particular. Através do método dedutivo,
há, a priori, a\premissas que são entendidas como verdades gerais e, assim, buscam-se novos
conhecimentos (Laraia, 2002, p. 34).

Como diz (Castro, 2004, p. 15), [...] impulsionada pela analogia com a teoria da evolução
biológica (Darwin publicara a A origem das espécies em 1859), essa linha buscava descobrir leis
uniformes da evolução, partindo do pressuposto fundamental de uma igualdade geral da natureza
humana. Em função disso, todos os diferentes povos deveriam progredir segundo os mesmo
estágios sucessivos, únicos e obrigatórios – daí o uso que os evolucionistas fazem de “cultura
humana” e “cultura sociedade humana”, sempre no singular. Esse substrato comum de toda a
humanidade explicaria a ocorrência de elementos semelhantes em diferentes épocas e lugares do
mundo.

A comparação entre tais elementos permitiria esclarecer, não só esse caminho único da
evolução da humanidade, como também o estágio no tempo em que cada povo se encontra.
Obviamente, esses autores colocavam no ápice do processo de evolução a própria sociedade em
que viviam [...]

De tal forma, ficam claras as críticas que a corrente teórica sofreu, fundamentada pelo exemplo
já mencionado, o teutoamericano Franz Boas Esse antropólogo criticava o determinismo
geográfico do método comparativo/evolucionista, por conseguinte negava a existência de uma
linha de evolução geral no desenvolvimento cultural da humanidade. Segundo (Boas, 2004, P.31-
32):
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[...] não se pode dizer que a ocorrência do mesmo fenómeno sempre se deve às mesmas
causas, nem que ela prove que a mente humana obedece às mesmas leis em todos os
lugares. Temos que exigir que as causas a partir das quais o fenómeno se desenvolveu
sejam investigadas, e que as comparações se restrinjam àqueles fenómenos que se
provem se efeitos das mesmas causas.

Diante disso, a crítica para com o método comparativo/evolucionista é a impossibilidade


que há de se traçar leis gerais para todos os povos. Pelo contrário, os estudos antropológicos
devem considerar as culturas na sua individualidade. Muitos outros teóricos da corrente
culturalista, como Boas, insistiam nessa crítica. Para o autor, diferente dos evolucionistas, o
método antropológico deve possibilitar que a escala evolutiva das sociedades deve originar-se do
agrupamento dos homens tido como “selvagens” ou “naturais” para chegar às “sociedades
civilizadas” europeias. Sua teoria fazia uma notória oposição à dos evolucionistas, que
consideravam a cultura das sociedades não caucasianas como inferior. “[...] um meio de
reconstruir história do desenvolvimento das ideias com uma precisão muito maior do que aquela
permitida pelas generalizações do método comparativo” (Boas, 2004, p. 34).

Na actualidade, os estudos antropológicos contemplam novos conhecimentos, o que


refuta as generalizações do método comparativo evolucionista, ou seja, rejeita a visão
etnocêntrica do pensamento evolucionista. Essa desarticulação trouxe benesses para os estudos
antropológicos, cuja ocupação abarca investigações bastante diversas. Ora busca compreender as
origens das desigualdades sociais nas formas de cultura, tecnologia, economia, género e tantas
outras.

2. Corrente Difusionista

Outra corrente que surgiu em contraponto ao evolucionismo foi o difusionismo. Segundo


os difusionistas, “o homem originário teria vivido em pequenos grupos que isolados, com o
tempo criaram ciclos culturais bem caracterizados, resultantes do confronto de diferentes grupos
com diferentes meios”. A partir das ideias difusionistas nasceram as primeiras teorias sobre o
contacto e a troca cultural entre sociedades diferentes. A antropologia difusionista veio em
resposta ao evolucionismo e foi sua contemporânea (Santos, 2002).

Foi caracterizada pela anti-unilinearidade, ou seja, não admitia a recta constante e


ascendente cultural defendida pelos evolucionistas. Portanto, a cultura para o difusionismo era
um mosaico de traços advindos de outras culturas precussoras com várias origens e histórias.
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Privilegiava o entendimento da natureza da cultura, em termos de origem e extensão, de uma


sociedade a outra. Para os difusionistas, o empréstimo cultural seria um mecanismo fundamental
de evolução cultural. O difusionismo acreditava que as diferenças e semelhanças culturais eram
consequência da tendência humana para imitar e a absorver traços culturais, como se a
humanidade possuísse uma "unidade psíquica", tal como defendia Bastian (Santos, 2002).

Dentro do difusionismo existia duas correntes principais: uma britânica e outra alemã. Na
escola Alemã, conduzida por Wilhelm Schmidt e Fritz Graebner, acreditava-se que os traços
culturais difundiam-se em círculos para outras regiões e pessoas através de áreas culturais
variadas. Esses círculos culturais eram chamados de 'Kulturkreise'. A escola alemã foi a principal
especialização, uma vez que o evolucionismo foi questionado por Herder, que foi inspirado pela
unidade psíquica proposta por A. Bastian, trazendo a questão da singularidade e da geografia da
herança cultural de cada povo (Santos, 2002).

Na versão britânica do Difusionismo existia apenas um centro cultural primordial


(difusão heliocêntrica, alusão ao Deus Sol egípcio) que era o Egito Antigo, do qual todos os
traços culturais derivaram. Os principais adeptos dessa teoria inglesa foram G. Elliot Smith e
William J. Perry. O difusionismo tem respaldo científico, a partir do momento que suas
inferências são baseadas em achados arqueológicos e pesquisas etnográficas (Santos, 2002).

2.1 Três linhas de pensamento difusionistas a que chamaremos escolas:

a) O difusionismo inglês ou a escola inglesa: defende a difusão como sendo a única causa
da expansão e dinâmica cultural, nega a teoria do paralelismo cultual exposta pelo evolucionismo
e considera a existência apenas de um centro cultural (difusão heliocêntrica), desde o qual todos
os traços culturais foram difundidos. Este centro cultural era o Egipto Antigo. Os principais
proponentes dessa teoria foram Grafton Elliot Smith (1871-1937) e William James Perry (1887 -
1949), ambos estudaram o Egipto Antigo intensamente, resultando na sua crença que o Egipto
era o único centro cultural. As teorias destes pensadores passaram a ser designadas de pan-
egiptismo (Santos, 2002).

b) O difusionismo alemão ou escola alemã: os seus fundadores são Father Wilhelm


Schmidt e Fritz Graebener, os quais defenderam a teoria dos círculos culturais de difusão que
surgiram em determinados espaços e épocas e daí se difundiram. Estes teóricos acreditavam que
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o progresso da difusão seria a via mais eficiente para o avanço da civilização e advogavam a
necessidade de fortalecer os contactos dos povos menos civilizados com os círculos culturais. O
que em certo modo procurava legitimar a exploração colonial da Europa pelo mundo. O
difusionismo é importante ainda hoje. O conceito de difusionismo explica como alguns traços
culturais adquiridos e difundidos.

c) O difusionismo americano ou escola americana: considerou as culturas particulares


como sendo o principal campo de estudo da Antropologia. Segundo Franz Boas, a cultura é tão
complexa que não permite um levantamento histórico de carácter universal. A antropologia deve
centrar os seus estudos em pequenas comunidades culturais, nomeadamente clãs, tribos, castas e
outras formas primitivas de organização social. Acrescenta Boas que a difusão não é um
processo linear e mecânico, mas pressupõe uma elaboração complexa por parte dos povos que
apreende certos traços culturais. Considera que para a compreensão das culturas é importante o
seu levantamento histórico, pois o facto de determinados traços culturais terem origem diversas
condiciona a compreensão da cultura, ou seja, precisa-se conhecer a história de uma dada cultura
para compreender a cultura em si (Santos, 2022)

3. Corrente Funcionalista

Apresentarei neste titulo dois autores considerados os “pais fundadores da etnografi a”:
Franz Boas (1858-1942) e Bronislaw Kasper Malinowski (1884-1942). Esses autores primaram
pela ruptura com o velho modelo de pesquisa, iniciando e consolidando uma prática marcada
pela coleta de informações pelo próprio pesquisador. Segundo esse novo modelo, o pesquisador
de antropologia, ao se dirigir ao campo para o trabalho de coleta das informações, “(...)..Aprende
então, como aluno atento, não apenas a viver entre eles, mas a viver como eles, a falar sua língua
e a pensar nessa língua, a sentir suas próprias emoções dentro dele mesmo.” (Laplantine, 2000, p.
76).

No antigo modelo desenvolvido pelos evolucionistas o contato entre o pesquisador e os


atores sociais nos seus respectivos fenômenos era praticamente inexistente. Isto é, o pesquisador,
instalado no seu gabinete, em Londres ou qualquer outra cidade europeia ou americana, de posse
das informações colectadas por viajantes, realizava as análises, considerando completamente
desnecessário esse contacto. Não havia, nesse sentido, qualquer contacto com o personagem,
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com a sua língua, com os seus costumes, não havia, portanto, vivência com os fenómenos
sociais. Não havia interacção – troca de informações – entre o pesquisador e o pesquisado
Laplantine, 2000, p. 77).

A nova antropologia, iniciada no final do século XIX e início do século XX, propunha
um outro modelo, no qual o pesquisador, obrigatoriamente, teria que sair do seu ambiente social
e instalar-se no ambiente do pesquisado, permanecendo longos períodos nesses espaços,
aprendendo o idioma, mas, sobretudo, observando quotidianamente os seus costumes,
interessado em penetrar nas mentes dos nativos de cada região. Com esse objectivo Franz Boas
afirma a necessidade de anotar tudo a respeito das coisas observadas, mesmo aquelas
consideradas rotineiras e até sem importância. Considerava Boas que a rotina dos nativos
escondia aspectos importantes das suas culturas e que, por isso, não podia ser desprezada
(Laplantine, 2000).

Outro aspecto importante nesse novo modelo diz respeito ao modo de perceber a cultura
do outro. Se antes a cultura do outro era vista como parte de uma totalidade, a cultura universal
do homem, nessa nova perspectiva, a cultura do outro, passa a ser vista como uma totalidade
autónoma. O que isso significou em termos de maior eficácia da ciência antropológica? Na
proposta evolucionista os costumes não eram relacionados com os seus respectivos contextos. Os
críticos dessa corrente entendiam a necessidade, para um melhor entendimento dos fenómenos
culturais, que esses fossem relacionados ao contexto particular nos quais estavam inseridos. Para
melhor compreensão apresentarei exemplos de como a proposta funcionava e ainda continua
funcionando no âmbito da antropologia (Laplantine, 2000).

A religião sempre fez parte do interesse dos pesquisadores da ciência antropológica. Na


proposta evolucionista as diversas formas de religiosidades eram colocadas nos estágios
considerados como partes do processo evolutivo: selvageria, barbárie e civilização, sem a
necessária contextualização. Na prática era como se o fenómeno religioso pudesse ser
compreendido sem ser relacionado ao contexto particular. Na proposta boasiana o fenómeno
religioso ou qualquer outro fenómeno cultural teria que ser relacionado ao seu contexto
particular, analisando os obrigatórios relacionamentos entre eles e as conseqüentes trocas de
informações. Essa nova proposta – e os seguidores desse pensamento a ampliaram nos anos
seguintes – afi rma não ser mais possível opor sociedade simples, dos povos descobertos a partir
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do movimento das grandes navegações, à sociedade complexa, dos povos considerados


civilizados. Ou, muito menos, tratar os povos diferentes como superiores ou inferiores. Dessa
forma, cada povo passa a ter a sua própria configuração e importância a partir das suas
construções culturais e sociais. Cada fenómeno é autónomo em relação a outros povos, mas
uarda, necessariamente, interdependência com fenómenos distintos no interior do próprio grupo,
ou seja, o religioso interage com o económico, com o social, com o político e assim sucessiva e
indefinidamente(laplantine, 2000, p. 78).

Se Franz Boas foi o iniciador mais intenso dessa nova proposta e um ardoroso crítico do
evolucionismo, Malinowski foi quem a consolidou, colocando em prática a pesquisa participante
– pesquisa em que o pesquisador passa a habitar com o pesquisado -, considerando que “uma
sociedade deve ser estudada enquanto uma totalidade, tal como funciona no momento mesmo
onde a observamos.” (Laplantine, 2000: p. 80).

3.1 Contribuição de Malinowski para a Corrente Funcionalista

Malinowski criou os princípios do funcionalismo, sobretudo da biologia, que estabelecia


a função como ponto de partida principal. Segundo esse modelo teórico, o indivíduo tem
determinadas necessidades e a cultura, através das suas instituições, existiria exactamente para
atender a essas necessidades, construindo, dessa forma, a estabilização da sociedade. Tentarei
explicitar melhor, nas linhas seguintes, essa situação no interior do modelo. Para os
funcionalistas a sociedade é o resultado da articulação entre o social, o psicológico e o biológico.
Essa articulação acontece a partir da satisfação das necessidades sentidas pelos indivíduos
através dos diversos mecanismos - fenómenos culturais -. É possível tentar clarear um pouco
mais esse princípio: o indivíduo é parte da sociedade.

A sociedade, com as suas instituições sociais e culturais, é um sistema que atende às


necessidades dos indivíduos. As diversas instituições sociais e culturais, todas com funções
sociais específicas, atenderiam aos indivíduos nas suas necessidades, tudo isso funcionando de
forma harmónica. Tentando ser ainda mais claro: a religião, a família, o aparato jurídico, os
costumes, as regras, tudo, a partir das suas funções, existiria para atender o indivíduo e, dessa
forma, possibilitar o pleno funcionamento da sociedade.
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O funcionalismo teria descoberto o modelo perfeito, que retrataria plenamente a realidade


da sociedade, contudo, os críticos não perderam tempo e construíram perguntas que o modelo
funcionalista também não conseguia responder: se a sociedade pensada pelos funcionalistas se
organiza de forma equilibrada e capaz de atender às necessidades do homem, como explicar os
processos de mudanças sociais comuns a toda sociedade em qualquer época e em qualquer lugar?

Os críticos ponderaram ainda que Malinowski havia construído leis gerais ou propostas
de leis gerais a partir da análise dos costumes de uma micro-sociedade localizada em minúsculo
arquipélago quase ou totalmente afastado dos contactos inter-culturais. Mesmo que
consideremos as críticas formuladas contra Malinowski, é evidente a sua contribuição aos
estudos antropológicos, tanto que ainda permanece: primeiro, a invenção literal da observação
participante. Pesquisar o outro deixou de ser tarefa dos viajantes circunstanciais e passou a ser,
em profundidade, tarefa do pesquisador.

E Malinowski realizou essa tarefa na prática, deslocando-se do seu mundo civilizado e


habitando com os seus pesquisados, na tentativa de melhor compreender os fenômenos culturais
desses indivíduos e dos seus grupos. É como no dizer de “Malinowski nos ensinou a olhar”
(Laplantine, 2000, p. 84). Outra contribuição importante de Malinowski diz respeito ao social.
Na sua pesquisa o social deixou de ser anedótico, exótico ou curioso e passou a ser apresentado
na profundidade do seu processo de construção.

A partir de Malinowski o homem nas suas interacções sociais e culturais passou a ser
observado no seu quotidiano, mesmo as coisas consideradas mais insignificantes foram tratadas
como relevantes, tendo em vista que, dentro do contexto e das suas interacções, poderiam
apresentar significações importantes. Observando esses fatos sociais considerados insignificantes
o observador poderia, como observador participante, identificar as trocas generalizadas desses
fatos com os demais fatos do grupo social. E, por último, Malinowski, no seu trabalho de
pesquisa e na sua obra, restaura o homem primitivo no interior do sistema social do qual faz
parte. Através da observação participante o homem observado é mais importante do que o
sistema do qual ele faz parte
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4.Origem do Estruturalismo

Na Europa, tem origem múltipla. Geralmente, seu nascimento é identificado com a


publicação do Cours de linguistique génerale, de Saussure, em 1916. Os estruturalistas procuram
pôr em prática a fórmula que encerra o Cour: “a Linguística tem por objecto a língua considerada
em si mesma, e por si mesma” por isso, não medem esforços por explicar a língua por ela
própria, assumindo uma visão imanentista. Os linguistas se limitam ao estudo do corpus
(enunciados realizados), com o objectivo de definir sua estrutura (Lyons, 1987, p. 203).

Então poderíamos dizer que o mérito do estruturalismo do séc XX não será o de


introduzir a noção de estrutura; como vimos, os gregos já haviam feito isso. Nesse caso, o mérito
de Saussure consistiu em lançar as bases para a compreensão e uma nova significação do termo-
chave “estrutura” para o desenvolvimento do pensamento linguístico e das ciências sociais que
surgiram a partir da década de quarenta. Para Saussure, a matéria linguística pode ser estudada
sob dois pontos de vista: sincrónico e diacrónico (já abordados na aula anterior) e, por isso, vê
duas espécies de Linguística – sincrónica e diacrónica. Contudo, o mestre chama de verdadeira
linguística, a sincrónica. Surge, assim, a noção de sistema linguístico (autônomo e dependente de
uma descrição própria), essencial na doutrina estruturalista (lyons, 1987, p. 203).

A explicação sincrónica difere da diacrónica ou histórica por ser estrutural em vez de


causal: ela fornece um tipo de resposta diferente à pergunta “Por que as coisas são como são?”.
Em vez de investigar o desenvolvimento histórico de determinadas formas ou sentidos, ela
demonstra de que maneira todas as formas e sentidos estão interrelacionados num determinado
sistema linguístico, em determinado ponto no tempo (Lyons, 1987, p. 207).

4.1 Sobre a Noção de Estruturalismo

Costumamos reunir sob o nome de estruturalismo um conjunto de diferentes elaborações


teóricas que compartilham uma concepção imanentista da linguagem verbal (isto é, a linguagem
assumida como um objecto autónomo, definido por relações puramente linguísticas, internas),
concepção essa cujas coordenadas básicas encontram suas origens próximas no trabalho de
Saussure, no início do século XX (FARACO, 1991, p. 98).
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Lévi-Strauss (1975) inicia uma comunicação (publicada no seu livro Antropologia


Estrutural), chamando atenção que “A noção de estrutura social evoca problemas demasiado
vastos e vagos para que se possam trata-los nos limites de um artigo” (p. 313). Daí explica que é
uma comunicação voltada para aqueles interessados aos “estudos tais como os consagrados ao
estilo às categorias universais da cultura e à linguística estrutural” (p. 313).

Assim, ele delimita a sua preocupação com universais da cultura enquanto temáticas que
irá desenvolver nos seus estudos, como é o caso do parentesco, totemismo, mitologia, etc., como
veremos mais adiante. A menção à Linguística Estrutural se deve a influência da linguística que
se relaciona com símbolos e significados, dentro do campo da antropologia que tem
preocupações com comunicação também.

Lévi-Strauss (1975) chama atenção que esta noção “estrutura social” é associada “aos
aspectos formais dos fenómenos sociais” e por isso, “sai-se... do domínio da descrição para
considerar noções e categorias que não pertencem propriamente à etnologia” (p. 314). Ele
explica que é dessa forma, “com a condição de adoptar o mesmo tipo de formalização [que] o
interesse das pesquisas estruturais... nos dão a esperança de que ciências mais avançadas...
possam nos fornecer modelos de métodos e de soluções” (p. 314).

4.2 Escolas estruturalistas

A análise das línguas indígenas foi o ponto forte no estruturalismo norte-americano; por
isso, suas teorias e métodos surgiram de um trabalho efetuado sobre um material retirado de uma
observação direta; os linguístas registravam a fala dos índios de uma determinada nação e depois
a analisavam. Os resultados dos estudos foram resumidos na grande obra de Franz Boas
Handbook of American Indian Languages (1911–1939). Pesquisadores, como Sapir e Whorf,
partiram da estrutura das línguas indígenas e estudaram a relação entre língua e pensamento,
entre formas lingüísticas, instituições sociais e representações religiosas. Outro objetivo atendido
pelo estruturalismo americano foi desenvolver métodos de aprender línguas estrangeiras em
forma coloquial (Lévi-Strauss 1975)

Para Lévi-Strauss, a antropologia se apoia na ideia de que toda cultura é dos humanos,
como por exemplo, a capacidade de comunicação e a transmissão dos conhecimentos. Para o
autor, o conhecimento dos traços culturais de sociedades só pode ser analisado de forma
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conjunta, como as práticas alimentares, os mitos. Dessa forma, Lévi-Strauss releva sua percepção
de apreender o mundo e o homem. Os trabalhos de Strauss apontam para a importância do uso
dos símbolos como meios de comunicação. Como por exemplo, a linguagem. Nessa visão
estruturalista, Lévi-Strauss não mostrou ocupar-se com as particularidades dos grupos humanos.
Sua ocupação deu-se no campo da investigação como apreensão dos traços universais das
sociedades e não nas suas especificidades (Leach, 1977).

No transcorrer dos anos 1960, a visão estruturalista começa a ser abandonada,


principalmente, pelas críticas quanto a seu caráter determinista, o que, para alguns autores,
configura o estruturalismo como forma analítica das generalizações, cujas investigações afastam-
se do conhecimento das particularidades. Muitos dirão que o pensamento estruturalista de Lévi-
Strauss coloca em plano menor a diversidade humana, como refere (Cunha, 1986

Para o antropólogo francês, a antropologia deveria se ocupar do conhecimento do que iria


além das diversidades, isto é, Lévi-Strauss defendia o conhecimento do que as espécies humanas
tinham de universal. Seu interesse era comparar as invariantes, ou seja, sua busca era conhecer
tudo o que as sociedades tinham em comum. Aspectos como a necessidade do homem preparar
os alimentos, comunicar-se, respeitar regras e coibir tabus, como por exemplo, o incesto. Na
visão estruturalista, a cultura é vista como um universo de regra. Vale destacar, para Lévi-
Strauss, a cultura tem sua origem 4 quando surge a primeira regra, a primeira convenção, que é o
tabu do incesto (proibição da relação sexual de um homem com certas categoriais de mulheres
(Leach, 1977).
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Consideração final

Em síntese, o difusionismo ajuda a explicar a aculturação, mas não é a capaz de explicar todos os
aspectos culturais como os primeiros difusionistas acreditavam. Existem exemplos de culturas
em contactos próximos, mas que não partilham muitos traços. Por isso, o difusionismo aparece
como uma corrente problemática por várias razões. Primeiro, é difícil demonstrar que uma
inovação teve um ponto de partida único. Segundo, muitas invenções e ideias culturais podem ter
sido descobertas ou ter evoluído isoladamente..

O funcionalismo foi criado a partir das críticas elaboradas contra os pensadores


evolucionistas e os seus modelos de história linear caracterizados pela análise
descontextualizadas dos fenômenos culturais. Os principais pensadores que iniciaram e
consolidaram essa corrente da antropologia foram Franz Boas (1858-1942) e Bronislaw Kasper
Malinowski (1884-1942), considerados os pais fundadores da moderna etnografi a.

Os principais pontos levantados por esses autores foram os seguintes: a sociedade,


mesmo as pequenas sociedades, deve ser analisada na perspectiva das suas respectivas
totalidades, ou seja, cada fenômeno cultural, para ser melhor compreendido, tem que ser
contextualizado no interior da própria sociedade; outro ponto importante foi a introdução e
consolidação da pesquisa de campo através da observação participante. Esse novo modelo foi
importante e continua entre nós como parte significativa da antropologia contemporânea. , mesmo
reconhecendo a avalanche de críticas a esses modelos de pensamento elaborados.

Corrente estruturalista em Linguística, como você pôde ver, define-se por sua
pluralidade. Os estruturalismos europeu e americano apresentam propostas de análise dos fatos
da língua nitidamente diferentes; mesmo dentro do estruturalismo americano, verificamos
correntes antagónicas, como o mecanicismo e mentalismo. Claro que os resultados e as
contribuições dessas escolas foram bem diferentes.
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Bibliografia

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Universidade Aberta.

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