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Unidade 1

1.2 Conceitos e características fundamentais da Justiça

Restaurativa

1.2.1 Definição

Talvez você já tenha lido obras consagradas sobre Justiça Restaurativa

(JR), mas tenha finalizado o estudo sem uma compreensão precisa do conceito

de JR. Normalmente, os autores preocupam-se em definir exclusivamente o que

a Justiça Restaurativa não é, deixando a compreensão do que ela é – e pode

ser – como algo a definir, que pode variar conforme o tempo, o contexto e os

sujeitos aos quais é direcionada.

No seu pequeno livro da Justiça Restaurativa, Howard Zehr (2012, p. 18)

chega a ser enfático quando diz: “muitas ideias equivocadas cercam o termo e

penso que é cada vez mais importante definir aquilo que a Justiça Restaurativa

não é”. Em seguida, o autor especifica que a JR não é: perdão ou reconciliação;

mediação; voltada a reduzir reincidência; um programa ou projeto específico;

voltada a atos infracionais e crimes de menor potencial ofensivo; algo novo com

origem nos Estados Unidos da América; panaceia ou substituto do sistema

penal; alternativa ao aprisionamento; contraposta ao sistema de justiça

retributiva.

Nesse mesmo sentido, Zehr (2012, p. 20-21) expressa que

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Muitos programas adotam a Justiça Restaurativa em todo ou em parte.

Contudo, não existe um modelo puro que possa ser visto como ideal

ou passível de implementação imediata em qualquer comunidade.

Estamos ainda numa fase de aprendizado muito intenso nesse campo.

As práticas mais interessantes que têm surgido nos últimos anos não

passavam pela cabeça daqueles que deram início aos primeiros

programas, e muitas ideias inovadoras surgirão em virtude do diálogo

e experimentação futuros.

Do mesmo modo, todos os modelos estão, em alguma medida,

atrelados à cultura. Portanto, a Justiça Restaurativa deve ser

construída de baixo para cima, pelas comunidades, através do diálogo

sobre suas necessidades e recursos, aplicando os princípios às

situações que lhes são próprias.

A Justiça Restaurativa não é um mapa, mas seus princípios

podem ser vistos como uma bússola que aponta na direção

desejada. No mínimo, a Justiça Restaurativa é um convite ao diálogo

e à experimentação.

Desse modo, o que garante que uma prática é restaurativa não é sua

forma, mas seu conteúdo. Justiça Restaurativa não demanda círculo.

Particularmente, já testemunhei várias práticas circulares que tinham aparência

de processo restaurativo, mas que eram eminentemente retributivas em sua

abordagem. Para a Justiça Restaurativa, não importa a aparência, mas a

materialidade de seu conteúdo. Se não for centrada nas necessidades dos

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sujeitos direta e indiretamente envolvidos, por exemplo, não será uma prática

restaurativa.

Por isso, uma formação sólida em JR não perpassa conhecer um sem-

número de métodos ou mesmo ter larga prática de círculos. A formação em

Justiça Restaurativa será de grande robustez quanto maior for o cuidado e

atenção aos seus fundamentos, princípios e valores.

Tanto é assim que se fala em continuum restaurativo para indicar práticas

que atendem em maior ou menor grau aos princípios da JR, admitindo-se ações

total ou parcialmente restaurativas. Esse continuum contempla desde

abordagens a processos restaurativos.

Sendo assim, os limites e a extensão da Justiça Restaurativa não são pré-

determinados e estáticos. Ao contrário, são tão dinâmicos quanto a própria

existência. Ainda falaremos com cuidado sobre fundamentos, princípios e

valores da JR. Por enquanto, gostaria que você entendesse que não há um

conceito rígido.

Vou procurar trazer aqui uma compreensão que carrego de Justiça

Restaurativa e que acredito que pode ter utilidade didática. Percebo na maior

parte dos estudantes e profissionais certa ansiedade por um conceito. Longe de

querer reduzir a JR a algo, acredito que apresentar o que entendo por Justiça

Restaurativa é um ato de honestidade intelectual, ao mesmo tempo que observo

que reduz insegurança de profissionais que estão iniciando os estudos no tema.

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A Justiça Restaurativa é uma visão de justiça voltada à satisfação de

necessidades dos direta e indiretamente interessados em uma situação conflitiva

ou de conexão. Ela preocupa-se com composição de danos e cuidado com

traumas, uma vez que busca transformar situações indesejadas em

possibilidades de experimentar restauração de um passado bom ou de criar um

novo começo.

Em essência, a Justiça Restaurativa visa fortalecer e construir vínculos de

pertencimento e significado; transformar conflitos, comunidades e relações,

materializando narrativas que indivíduo ou coletividades almejam para si. Desse

modo, volta-se ainda a construir resiliência, isto é, a habilidade de permanecer

íntegro aos seus princípios e valores, mantendo equanimidade, mesmo diante

de situações desafiadoras e desconfortáveis.

Para tanto, a Justiça Restaurativa busca desenvolver e estimular o

protagonismo dos sujeitos. Isso porque ela tanto é centrada nesses mesmos

sujeitos, quanto estimula a sua participação ampliada, contemplando os atores

direta e indiretamente envolvidos no caso. Supera compreensões como “autor”

e “réu” e contempla microcomunidades de apoio e referência de cada um dos

sujeitos diretamente envolvidos na situação.

A título de exemplo, pense num caso de bullying numa escola. Se

considerarmos exclusivamente a pessoa que praticou o ato e aquela que sofreu

os danos diretamente, perderemos uma excelente oportunidade de transformar

a escola num ambiente restaurativo.


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Digo isso porque o bullying não acontece simplesmente porque alguém o

pratica e outra pessoa é vitimada. Também existe bullying porque, em algum

aspecto, outras pessoas daquela comunidade escolar o sustentam, ainda que

não o pratiquem diretamente. É o caso, por exemplo, de quem apoia um dos

lados, formando coalisão; de quem sorri diante do constrangimento do outro; de

quem observa o que está acontecendo e silencia.

Se o interesse for de restauração, isto é, de transformar a realidade

indesejada num contexto de satisfação de necessidades de todos os envolvidos,

é importante mobilizar outros sujeitos que escapam dos lugares-comuns “autor”

e “réu”, mas que contribuem diretamente para que a situação tenha o resultado

apresentado.

Outro ponto importante é que em situações desconfortáveis, como

costuma ser o caso de um conflito, os sujeitos diretamente interessados podem

se sentir mais seguros, confiantes e encorajados a participar caso o ritual

também contemple outras pessoas que são referência de afeto e apoio para eles.

Essas pessoas, por óbvio, não podem ser supostas: é preciso que sejam

indicadas pelos próprios interessados, uma vez que a prática restaurativa é

centrada nos sujeitos.

O protagonismo também fica manifesto no “narrar a si”. Em maior ou

menor grau, as práticas de Justiça Restaurativas pautam-se em Personal

Storytelling, no compartilhamento de narrativas pessoais. A escuta atenta

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dessas narrativas possibilita melhor compreensão de impactos, sentimentos e

necessidades em questão.

Para que haja essa escuta de qualidade, todavia, é imprescindível garantir

rapport. Deve-se oferecer igual oportunidade de fala a todos os participantes.

Porque sei que tenho oportunidade legítima de fala, consigo ouvir os outros com

maior empatia. Não há necessidade de disputa do espaço de fala.

Para a JR, o conceito de responsabilização também é diferenciado. Fala-

se em responsabilidade ativa para referir-se a essa compreensão direta dos

impactos do ato ou relação em cada um dos participantes por meio da escuta

ativa. Agora que ouço e compreendo impactos, agora que sei as necessidades

manifestas de cada um, posso refletir a respeito das minhas possibilidades de

agir para reparação e transformação dessa realidade.

Fala-se ainda em responsabilização ampliada, uma vez que contempla

não só os sujeitos diretamente envolvidos, mas também suas microcomunidades

de apoio. Isso porque se compreende que ninguém é um ser sozinho e que,

mesmo que não sejam determinantes, os contextos e relações que nos cercam

são importantes na constituição de quem damos conta de ser e de como somos

capazes de agir.

1.2.2 Elementos gerais dos processos restaurativos

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A Justiça Restaurativa é uma visão de justiça voltada tanto a resolver e

transformar conflitos, quanto a fortalecer e construir conexão. Preocupa-se com

a construção de paz e de realidades desejadas, com a autocomposição de

conflitos e com o fomento de vínculos de pertencimento e significado.

Preciso ser manifesta quanto a um aspecto: quando falo em

pertencimento e significado, estou remetendo diretamente ao conceito de

comunidade.

Comunidade é elemento central da Justiça Restaurativa. No entanto, ao

falar em comunidade, a JR não se refere a favela ou bairro periférico.

Comunidade é algo que todo e qualquer ser humano precisa ter em alguma

medida para garantir sua necessidade de conexão.

Conforme defendi em outro momento:

Para a Justiça Restaurativa, comunidade é todo agrupamento humano

pautado em vínculos de pertencimento e significado. Se analisada

enquanto opção política e ética emancipatória, mesmo com

consciência quanto ao seu passado e às possibilidades de futuro, a

comunidade é definida no presente, fruto dos diálogos contínuos e

provisórios estabelecidos entre seus membros. Nessa perspectiva, a

narrativa comunitária deve contemplar sua diversidade, reavaliando

constantemente se as histórias dominantes têm correspondido àquelas

desejadas (CARVALHO, 2019).

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Comunidade demanda responsabilidade diante dos demais sujeitos

comunitários definida no aqui e agora. Isto é, comprometimento com o bem-estar

coletivo no presente, ainda que as condições e possibilidades não sejam as desejadas.

A comunidade é um organismo vivo, dinâmico, relacional.

Os sujeitos comunitários são o devir desse processo. Para ser restaurativa, a

comunidade não pode ter um rol prévio de incluídos e excluídos, não pode pautar-se

em ódio ou distinção.

Nas palavras de Martin Buber (2012),

Ela [nossa comunidade] não quer reformar; a ela importa

transformar. [...] Desse modo, nossa comunidade não quer

revolução, ela é revolução. [...] Para nós, revolução não significa

destruir coisas antigas, mas viver coisas novas. Não estamos

ávidos por destruir, mas ansiosos por criar. Nossa revolução

significa que criamos uma nova vida em pequenos círculos [...]

Cada um viverá ao mesmo tempo, em si-mesmo.

Outro elemento fundante da Justiça Restaurativa é a noção de

responsabilização, que, em certa medida, relaciona-se diretamente com o que

apresentei até aqui sobre comunidade. Isso porque a comunidade tanto é parte dessa

compreensão ampliada de responsabilização, quanto é sustentáculo para as condições

materiais da responsabilidade.

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Na JR, a responsabilidade é centrada no sujeito e contempla danos,

sentimentos, necessidades e relações. As práticas restaurativas costumam impulsionar

a responsabilidade por meio da narrativa de histórias pessoais. Histórias ajudam a

desenvolver empatia e a compreender impactos, necessidades, contexto e

possibilidades.

Conforme desenvolvi em outra oportunidade:

Para que haja responsabilização, é necessário que alguns elementos

sejam observados: a) reconhecimento de que sua ação, ainda que não

intencional, causou dano; b) compreensão de si enquanto agente que

poderia ter agido de modo diverso; c) dimensão dos impactos diretos e

indiretos do ato; d) conjunto de ações com vistas a, na medida do

possível, reparar o dano; e) identificação de padrões pessoais de

comportamento que possibilitaram a ação danosa; f) transformação

desses padrões de comportamento. Embora os dois últimos aspectos

não estejam necessariamente presentes no encontro restaurativo,

constituem derivações frequentes desse processo (CARVALHO,

2019).

A janela da disciplina social, desenvolvida por Ted Wachtel e Paul McCold,

auxilia nessa compreensão. Segundo os autores, as abordagens que lidam com

conflitos podem ser punitivas, negligentes, permissivas ou restaurativas, conforme os

graus de apoio e controle.

Confira:

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Uma abordagem de baixo apoio e alto controle costuma ser punitiva, acreditando

que quem fez algo indevido é individual e isoladamente culpado pelo ato. Essa

perspectiva pouco se preocupa com o contexto ou fatores de vulnerabilidade do sujeito.

Também não está interessada em saber sobre danos revelados pelo ato lesivo. Olha

exclusivamente para os danos que o ato causou e busca punir por isso o sujeito.

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A contrário senso, se oferecemos alto apoio e baixo controle, somos permissivos.

Popularmente nos referimos a essa situação como “passar a mão na cabeça”. Essa

perspectiva não permite que o sujeito compreenda os impactos dos próprios atos e que

assuma responsabilidade pelos mesmos. Por isso, é essencialmente assistencial e

desconsidera a autonomia e potência do indivíduo.

Quando os limites e o encorajamento são baixos, estamos diante de uma

posição negligente. É o não ver, não agir, deixar o sujeito entregue à própria sorte. Seria

o caso de apatia e indiferença.

Na perspectiva restaurativa, ao contrário, temos tanto alto apoio, quanto

responsabilidade ativa e ampliada. A centralidade desses elementos está justamente na

presença da microcomunidade e na 'contação' e escuta de histórias pessoais.

1.2.3 Microcomunidade de referência e afeto

O texto de Martin Buber é fundamental para entender do que a JR trata ao falar

em comunidade:

[...] o mal propriamente dito hoje existente na vida política consiste [...]

no fato de o homem ver seu semelhante como algo que ele pode

experimentar, descobrir, isto é, que ele pode usufruir em sua utilidade,

em sua aplicabilidade. [...] É isto que se deve ultrapassar. Há, porém,

um grande obstáculo no caminho, e este é o falso radicalismo da

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juventude atual. Esta juventude apraz-se em representar as coisas da

seguinte maneira: tem-se um ideal das coisas como devem ser, por

exemplo, como Estado e sociedade deveriam ser. Isto pode ser

efetivado, de certo modo, de certa maneira política ou revolucionária e,

portanto, não pode ser realizado aqui e agora. Com este adiamento

ganha-se a base para uma vida fora da realização. Assim, aqui e agora,

participa-se daquilo que é válido agora. Este é o radicalismo como

fuga. [...]

Oposto a isso, reconhece-se a linha divisória que é traçada a cada dia.

Hoje isto pode ser realizado por mim, entre nós, nesta vida que nos é

dada, e aquilo não pode. [...] Isto significa responsabilidade. E se

tomarmos o conceito em toda a sua realidade, responsabilidade

significa sempre responsabilidade diante de alguém. Responsabilidade

para consigo mesmo é uma ilusão.

A verdadeira responsabilidade é sempre responsabilidade diante do

outro. [...] Responsabilidade do hic et nunc, do aqui e agora. Esse é o

último ponto que, na realidade, podemos atingir. Tudo o mais é

pessoal, tudo o mais cada homem individualmente deve decidir por si

próprio e é uma questão de tempo, dependendo de sua situação, de

seu talento, de suas possibilidades, de seu lugar, de seu momento.

Ao considerar outra pessoa como ser vivo para o qual estou aqui, assim como

ela está aqui para mim, estou em comunidade.

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Por tratar-se de uma visão de justiça enquanto satisfação de necessidades, a JR

busca mobilizar um sem-número de atores que extrapola ideias firmes de “partes”.

Na Justiça Restaurativa, não se fala apenas em “comunidade”, mas em

“microcomunidade”. Com isso, quer-se referir a comunidades específicas de cada um

dos envolvidos no caso. Ao abranger os sujeitos direta e indiretamente interessados na

situação, considera as microcomunidades de afeto e referência, que oferecem suporte

para que a situação estagne, intensifique ou para que seja transformada.

Com a presença dessa microcomunidade, busca-se oferecer apoio, já que o

sujeito é lembrado pela presença de pessoas de sua rede afetiva de que, por mais

desafiadora que seja a situação, não está só.

A participação da microcomunidade também auxilia na compreensão ampliada

dos impactos e das possibilidades de atuação em cada circunstância, já que evidencia

talentos e recursos individuais e coletivos que estão disponíveis.

Por estarem presentes, os participantes da microcomunidade também narram a

si. As vulnerabilidades compartilhadas no processo restaurativo contribuem para a

construção e transformação dessa própria comunidade.

Conforme dito em outro espaço,

A presença desses atores é fundamental para que os planos de ação

sejam sustentáveis e para a edificação de vínculos de cuidado,

conexão e sentido nesse processo. Por isso, o modo como o processo

é operacionalizado garante que seja significativo também para as

esferas que o excedem; tanto que, frequentemente, é via de

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transformação não só da situação conflitiva, mas também dos

participantes (CARVALHO, 2019, np).

1.2.4 Pressupostos materiais

A Justiça Restaurativa pode servir a qualquer conflito, independente do bem

jurídico em questão. No Ocidente, sua utilização oficial teve início nos casos de atos

infracionais, crimes e conflitos violentos, mas logo foi estendida para conflitos cíveis.

Dentre estes, tem sido bastante presente em conflitos familiares, de grupos de trabalho

ou societários.

Isso acontece porque, embora possa ser utilizada em qualquer conflito, a Justiça

Restaurativa costuma ter maior potencial transformador diante de vínculos continuados,

como é o caso de família, vizinhança, equipes de trabalho, empresas, grupos religiosos

e coletivos culturais.

Segundo Zehr (2012), grandes danos costumam ser indicativos de um grande

potencial restaurativo, uma vez que, diante de uma grande dor, é imprescindível que se

tenha o viés transformativo, e não simplesmente de resolução.

Por isso, a Justiça Restaurativa pode ser bastante útil em casos envolvendo

traumas. Ao mesmo tempo, é preciso bastante cuidado e responsabilidade no agir. Caso

contrário, pode-se acentuar dor e danos, o que feriria um dos princípios básicos para a

atuação restaurativa.

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É o caso, por exemplo, da violência doméstica. É possível e mesmo desejado

que se atue de forma a transformar aquele conflito. Todavia, é importante ter

discernimento de que, sendo o perdão parte do ciclo da violência doméstica, a atuação

restaurativa precisa ser intencional e cuidadosa, para não correr o risco de contribuir

para a perpetuação das condições de violência.

Por isso, nesses casos, é preferível a criação de grupos de reflexão entre

agressores ou ainda de grupos de apoio entre vítimas. Aqui, quando se fala em

restauração não se trata propriamente de retomar uma relação. Em muitos casos, o

relacionamento era essencialmente tóxico desde o princípio. A restauração, aqui, pode

ser a construção de um novo começo quanto ao autoamor e ao amor que se acredita

merecer. Reflexões sobre o que é e como é possível receber e oferecer amor.

Na JR, não há espaço para sugestões, conselhos ou mesmo para “dar lição” ou

advertência. Todo o processo restaurativo, seja nos encontros individuais, seja nos

coletivos, é pautado por perguntas. Ao perguntar, o facilitador busca identificar

elementos para mapear a narrativa sobre o conflito ou a situação. Além disso, as

perguntas também funcionam como convite de consciência. Ao perguntar, estimula-se

reflexão.

Dentre as condições elementares para o encontro restaurativo estão o sigilo, a

voluntariedade, a cooperação e a informação plena e precedente.

Para a Justiça Restaurativa, a compreensão de sigilo é ampliada e contempla as

seguintes ações: a) falar apenas de si e de suas necessidades; b) não reproduzir inteira

ou parcialmente uma história de que tomou conhecimento em virtude da prática

restaurativa; c) caso queira contar algo que ouviu no encontro, pedir expressa

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autorização de seu autor; d) não voltar a comentar sobre alguma história de outro sujeito

que tenha sido por ele compartilhada no espaço seguro do círculo se ele não iniciar o

tema por conta própria.

Nessa concepção, é indiferente se a história que pretendemos compartilhar é

positiva ou negativa. Se é algo que outra pessoa narrou, precisamos pedir permissão

para compartilhar em outro espaço.

A voluntariedade, por sua vez, diz respeito à autonomia de cada um dos sujeitos

ao manifestar-se a favor ou contra sua participação no processo restaurativo. Para tanto,

é preciso que essa voluntariedade venha acompanhada de informação plena e

antecedente sobre as condições e os propósitos da prática restaurativa.

Outro pressuposto da JR é a cooperação. Ainda que as pessoas entendam os

contornos da prática, manifestem interesse em participar e se comprometam com o

sigilo, se o processo não for cooperativo, não é possível falar em Justiça Restaurativa.

Como dito anteriormente, mais do que forma, a prática restaurativa exige substância; e

essa substância é garantida através da observância de seus pressupostos básicos.

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REFERÊNCIAS

BUBER, Martin. Sobre comunidade. São Paulo: Perspectiva, 2012.

CARVALHO, Mayara. Justiça restaurativa na comunidade. Belo Horizonte:

Instituto Pazes, 2019.

MACKAY, Robert E. The nexus between rights and restorative justice. In.:

GRAVIELIDES, Theo; ARTINOPOULOU, Vasso. Reconstructing restorative justice

philosophy. Surrey: Ashgate Publishing Limited, 2013.

ZEHR, Howard. Justiça restaurativa. São Paulo: Palas Athena, 2012. Tradução

de Tônia Van Acker.

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