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Vilas
Primeira instrução:
A Maçonaria, ser Maçon
A vossa primeira instrução como maçon foi a que mais define o que é a
Maçonaria. Foi a instrução dos sinais que vos colocam em ordem, dos toques que vos
permitem reconhecer irmãos, da palavra que é o vosso nome de aprendiz e a chave
de acesso ao grau, da marcha, da bateria, da aclamação – foi a instrução de uma
prática iniciática, não de uma doutrina simpática.
O sinal, que é uma posição que vai dos pés à cabeça, feita de três esquadros, nível e
prumo, coloca-vos em ordem convosco próprio, com geometria da loja e com a do
universo. Ele, como todo o conjunto dos actos rituais, obriga-nos concentrar a
atenção no que estamos a fazer, criando consciência de nós próprios, unindo-nos a
nós próprios.
O facto de vos terem sido transmitidas formas de acção pessoais (sinais, toques e
palavras rituais) e não formas de justificação grupais (slogans, teorias, doutrinas)
indica-vos que a vossa primeira reflexão enquanto Maçons é sobre as vossas acções,
sejam elas actos, palavras, pensamentos ou omissões, para vos conhecerdes a vós
próprio.
As cerimónias rituais por que passaste na vossa iniciação aludem ao cego a quem é
dada a luz, isto é, a um recomeço da vossa vida. Para que esse recomeço seja efetivo,
tendes de abandonar tudo o que vos deformou ao longo da vida, regressando ao
vosso início.
O trabalho da Maçonaria permite-vos demolir o velho edifício que ereis antes, para
que possais construir-vos como templo. Fazê-lo, depende do vosso esforço, do vosso
interesse, da vossa sensibilidade, da vossa vontade de vos conhecerdes a vós próprio
– e da vossa coragem para o fazerdes –, da vossa capacidade para estardes presentes
de corpo e mente nos trabalhos.
A Maçonaria tem duas componentes essenciais: a das regras de conduta, que se pode
resumir na regra de ouro – fazei aos outros o que gostaríeis que vos fizessem a vós
–, e a da procura da sabedoria através do desenvolvimento da consciência. E só se
procura o que se sabe que está perdido.
A publicação inglesa «Três Pancadas Distintas», de 1760, refere que o maçon é «um
homem nascido de uma mulher livre», e o catecismo «Toda a Instituição da
Maçonaria», de 1724, refere especificamente o episódio bíblico (Génese 16 e 21,
comentado por São Paulo na Epístola aos Gálatas 4, 21-31) dos dois filhos de Abraão:
o primeiro, Ismael, gerado da serva Agar segundo a carne, e o segundo, Isaac, gerado
da mulher Sara (que sempre fora estéril) por determinação divina, ou seja, segundo
o espírito. Ismael ameaça o irmão e Abraão bane-o, fazendo do filho segundo o
espírito o seu herdeiro, pelo que livre significa também o que nasceu para a vida do
espírito libertando-se da servidão das paixões da carne.
Livre, remete ainda para a alegoria bíblica de que a generalidade dos israelitas
nascidos na servidão do Egipto morreu na travessia do deserto, só tendo entrado na
Terra Prometida os que não tinham nascido servos ou os que tinham passado com
sucesso pela purificação do deserto, ou seja, os que se tinham libertado dessa sua
condição.
A Maçonaria não aceita a ideia de que somos apenas homens com as falhas inerentes
a qualquer humano; se isso já não é aceitável no profano, no Maçon, homem que
procura transmutar-se, é intolerável.
Estamos aqui porque desejamos corrigir as nossas falhas – um processo que pode
levar muitos anos e sofrer recuos, mas do qual não queremos desistir – aplicando a
medida, o equilíbrio e a proporção às nossas vidas.
Estamos também aqui para nos conhecermos a nós próprios e a Maçonaria ajuda-
nos a fazê-lo, ao por a nú as verdadeiras motivações. Por isto, quando virdes dois
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irmãos zangarem-se por um ofício da loja, que não lhes dá qualquer sabedoria,
poder ou dinheiro, tereis visível a verdadeira origem da zanga: o ego de cada um.
Verdade vem do latim veritas que significa realidade, exactidão, rigor, conformidade
entre o pensamento e o seu objecto. No grego, aletheia significa sem véu, isto é,
visível ou compreensível, sendo lethe o esquecimento.
A primeira coisa que deveis aprender é que nada sabeis sobre a Maçonaria, e estais
aqui para aprender sobre ela, praticando, estudando, discutindo e formando a vossa
própria ideia. Deixai à porta qualquer ideia que acerca dela fazeis, pois é um metal
cujo falso brilho vos impede de aprender. Confrontai o que ouvirdes em Loja com os
textos tradicionais, para não seguirdes erros de irmãos mais antigos.
Para que isso possa acontecer temos de nos conhecer (para o que temos os
instrumentos de medida e as pedras que são padrões simbólicos), de nos
compreender cada vez mais profundamente (como nos assinala o prumo do
Segundo Vigilante), de nos corrigir (para o que temos os instrumentos de desbaste
da pedra e os instrumentos pelos quais se fazem os sinais) e de nos equilibrar na
régua entre os extremos do mais e do menos. O sinal de ordem e os passos que
aprendestes correspondem à aplicação dos instrumentos ao nosso comportamento
mental e físico.
É na loja que somos iniciados – mais ninguém tem o poder de conferir a iniciação, a
não ser a loja – e é na loja que aprendemos a trabalhar. Sem esta prática regular do
trabalho ritual, não nos tornamos realmente Maçons, ficando uma espécie de
maçons não praticantes. Temos, por isto, deveres para com a loja.
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Estas e outras regras de conduta têm origem nos Antigos Deveres medievais e
renascentistas quase todos ingleses, de que se conhecem 150 documentos. Estes
manuscritos contêm relatos míticos, em linguagem simbólica, portanto, da criação
da arte da construção e da outorga das instruções e deveres por personagens
fundadores como Jabal, um dos filhos de Noé, Pitágoras, Euclides, Salomão... todas
personagens bíblicas ou ligadas à Geometria ou ambas.
São esses deveres: os canteiros (maçons) devem ser fiéis a Deus, ao rei, e ao senhor
que servem (fidelidade); devem amar-se mutuamente (fraternidade), e ser
verdadeiros uns com os outros (verdade); devem chamar-se uns aos outros de
companheiro ou irmão, e não nenhum nome desagradável (afabilidade); devem
realmente merecer o seu salário (trabalho); devem designar o mais sábio para
Mestre da Obra, e não o designar por amizade, linhagem, riqueza, ou favor (mérito);
devem chamar o chefe do trabalho de Mestre enquanto trabalharem com ele
(respeito).
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A prática das regras de conduta tem ainda um aspecto iniciático, pois educa-nos na
observação da disciplina, o que é muito necessário ao processo de aperfeiçoamento
espiritual.
As «Constituições» de 1723 estabelecem que o Maçon deve obedecer à lei moral, isto
é, «ser um homem bom e verdadeiro, um homem de honra e honestidade». Contudo,
não basta ser homem de bem para se ser maçon, é preciso ter-se sido regularmente
iniciado na Maçonaria.
Na Escócia que tem referências a lojas profissionais desde o século XIV, foi criado,
no final do século XVI, um modelo de organização das lojas, centrado em torno de
lojas-mães regionais, que regulavam a profissão da construção em cantaria, em
conjunto com as guildas. E que procediam a iniciações baseadas num ensinamento
esotérico sobre as colunas do Templo de Salomão, o que é conhecido por
documentos do século XVII. Da Irlanda, quase não há documentação escrita, porque
os irmãos a destruíam para manter o segredo.
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A partir de 1600, há registos de que lojas escocesas admitiam pessoas que não eram
profissionais da construção interessados nos mistérios maçónicos e de lojas
constituídas maioritariamente por não-profissionais, como a loja de Aberdeen, na
qual, em 1670, apenas um quinto dos membros trabalhava na construção. Algumas
delas deixaram de ser apenas reguladoras locais da profissão com os seus ritos
esotéricos (lojas profissionais – maçonaria), passando a ser sobretudo organizações
de prática de ritos esotéricos (lojas simbólicas – Maçonaria), desligadas da regulação
da profissão, mesmo quando constituídas por profissionais.
Em Iorque, a loja da catedral, referida desde o século XIV, terá continuado até hoje,
havendo documentação significativa dos finais do século XVII e princípios do XVIII.
Esta loja, que recebia também não profissionais, era a loja-mãe da Antiga e
Respeitável Sociedade e Fraternidade dos Francomaçons, que deu origem à Grande
Loja de Toda a Inglaterra, existente entre 1725 e 1792.
Devido a estes conflitos religiosos, a maçonaria terá sofrido alterações que são mal
conhecidas, notando-se, por exemplo, que alguns Antigos Deveres deixaram de ter
referências expressamente católicas ou, pelo contrário, passaram a condenar
expressamente a heresia.
Esta primeira Grande Loja publicou «As Constituições dos Franco-Maçons» em 1723
(um texto de Antigos Deveres refundido e recortado ao gosto dos intelectuais
protestantes da Royal Society que a dominavam), atraindo as elites científicas,
culturais e sociais da capital inglesa, mas provocando uma reacção de repúdio dos
maçons mais antigos, que acusaram os «doutores» de ignorarem o essencial da
Maçonaria.
Estes modernos seguiam uma visão iluminista de fé na ciência, e eram quase todos
protestantes empenhados. Os Antigos, que recusavam as alterações e amputações
feitas pela primeira Grande Loja inglesa, mantinham uma visão mais tradicional da
Maçonaria e dos seus ritos, e eram geralmente católicos e protestantes moderados.
A notícia da primeira loja em Portugal é de 1728 e passou à história pelo nome que
a Inquisição lhe deu – Loja dos Hereges Mercadores – denotando a sua composição
de mercadores protestantes ingleses e escoceses.
A terceira loja portuguesa, filiada na Grande Loja de Londres, foi formada sobretudo
por mercadores franceses católicos. Foi também destruída pela inquisição.
Em 1802 foi fundado o Grande Oriente Lusitano, reconhecido pela Grande Loja de
Inglaterra. Houve ainda perseguições pontuais no final do século XVIII e no começo
do século XIX, ao sabor da política da época, até que a implantação da monarquia
constitucional permitiu aos maçons trabalharem sem percalços.
Desde então, e até hoje, nunca mais houve qualquer perseguição à Maçonaria por
parte dos poderes públicos, embora maçons tenham sido perseguidos por razões
políticas que nada têm a ver com a Maçonaria.