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Estudos Literários:
correntes teórico - críticas
EaD
EaD
EaD UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA
PRESIDENTE DA
REPÚBLICA
Dilma Roussef
MINISTRO DA EDUCAÇÃO
Fernando Haddad
Estudos Literários:
correntes teórico - críticas
EDUNEB
Salvador
2012
© UNEB 2012
Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida ou gravada, por qualquer meio eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros,
sem a prévia autorização, por escrito, da Coordenação UAB/UNEB.
Depósito Legal na Biblioteca Nacional
Impresso no Brasil 2012
DIRETORA
Maria Nadja Nunes Bittencourt
COORDENADOR EDITORIAL
Ricardo Baroud
COORDENAÇÃO UAB/UNEB
COLABORADORES REVISORES
Carla Honorato
SUPERVISÃO DE MATERIAL DIDÁTICO
Sheila Rangel
Andréa Santos Tanure
Flávia Souza dos Santos
NORMALIZAÇÃO
Tatiane Nogueira Nunes
Susane Barros
O conteúdo deste Material Didático é de inteira responsabilidade do(s)/da(s) autores (as), por cuja criação assume(m) ampla e total responsabilidade
quanto a titularidade, originalidade do conteúdo intelectual produzido, uso de citações de obras consultadas, referências, imagens e outros elementos
que façam parte desta publicação.
CDD: 801
Estamos começando uma nova etapa de trabalho e para auxiliá-lo no desenvolvimento da sua aprendizagem
estruturamos este material didático que atenderá ao Curso de Licenciatura em Letras, Língua POrtuguesa e Literaturas
na modalidade de educação à distância (EaD).
O componente curricular que agora lhe apresentamos foi preparado por profissionais habilitados, especialistas da
área, pesquisadores, docentes que tiveram a preocupação em alinhar conhecimento teórico-prático de maneira
contextualizada, fazendo uso de uma linguagem motivacional, capaz de aprofundar o conhecimento prévio dos
envolvidos com a disciplina em questão. Cabe salientar, porém, que esse não deve ser o único material a ser
utilizado na disciplina, além dele, o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), as atividades propostas pelo Professor
Formador e pelo Tutor, as atividades complementares, os horários destinados aos estudos individuais, tudo isso
somado compõe os estudos relacionados a EaD.
É importante também que vocês estejam sempre atentos as caixas de diálogos e ícones específicos que aparecem
durante todo o texto apresentando informações complementares ao conteúdo. A idéia é mediar junto ao leitor, uma
forma de dialogar questões para o aprofundamento dos assuntos, a fim de que o mesmo se torne interlocutor ativo
desse material.
São objetivos dos ícones em destaque:
Sua postura será essencial para o aproveitamento completo desta disciplina. Contamos com seu empenho e
entusiasmo para juntos desenvolvermos uma prática pedagógica significativa.
ÁREA DE AMBIENTAÇÃO
Nome:
Telefones: E-mail:
Residência:
Município/Pólo do curso EaD:
Apresentação da disciplina
Caro Aluno,
Bons Estudos!!!
Andréa Beatriz Hack de Góes
Anotações
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1 - Teoria Literária – definição geral no âmbito da cultura
1.1. O surgimento e desenvolvimento da Teoria da Literatura ou Estudos Literários
1.1.1 O Dadaísmo e a vanguarda literária
1.1.2 Principais características - Dadaísmo
CAPÍTULO 2 - Apresentação e análise das principais correntes teórico-literárias
2.1. Formalismo – definição, contextualização e exemplos
2.2. Estilística – definição e contextualização
2.2.1 Charles Bally e a Estilística
2.3. New Criticism – definição e contextualização
2.4. Estruturalismo – definição e contextualização
2.5. Pós-estruturalismo – definição e contextualização
2.6. O fim das metanarrativas e dos falsos consensos universais
CAPÍTULO 3 - Historicidade do texto literário e sua expressão social
3.1. O conceito de literatura e os Estudos Literários hoje
3.2. O conceito de literatura e os Estudos Literários hoje
3.3. As novas e emergentes correntes literárias contemporâneas
3.3.1. Desconstrução
3.3.2. Teoria Feminista
3.3.3. Psicanálise
3.3.4. Teoria Pós-Colonial
3.3.5 Discurso das Minorias
3.3.6 Queer Theory
REFERÊNCIAS
Anotações
Teoria Literária –
definição geral no
âmbito da cultura
CAPÍTULO 1
EaD
EaD UNIVERSIDADE
UNIVERSIDADE DO
DO ESTADO
ESTADO DA
DA BAHIA
BAHIA
Anotações
Essa apropriação e uso estético e ao mesmo tempo possibilidades expressivas da arte, e assim, apelou para
crítico que a arte literária faz da linguagem diz respeito a irreverência e desconstrução de tudo o que era consi-
a sua pretensão de abolir a separação entre arte e vida, derado tradicional, enfatizando o espírito modernista da
desejo esse já expresso em movimentos literários de primeira metade do século.
vanguarda, surgidos no início do século, como o “Da-
daísmo”, e que retornam com fôlego à cena literária nas
décadas de 60 e 70, com os movimentos da contra-
-cultura e a pop art americana. Agora, leia com atenção o poema abaixo, que expressa bem o espírito
rebelde e inquieto do modernismo:
dadá (brinquedo, cavalo de pau). Daí observa-se a falta A minha glória é esta:
de sentido e a quebra com o tradicional deste movimento. Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
_Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
1.1.2 Principais características - Dadaísmo: Com que rasguei o ventre a minha Mãe.
- Os objetos comuns do cotidiano são vistos de outro Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
modo, e colocados em um contexto artístico;
Se ao que busco saber nenhum de vós responde,
- ênfase para a chamada “irreverência artística”; Por que me repetis: “vem por aqui”?
- As formas de arte institucionalizadas são combati- Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
das com veemência; Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
- O movimento estabelece uma ferrenha crítica ao A ir por aí...
consumismo capitalista;
Se vim ao mundo, foi
- Exploração de temas e conteúdos sem lógica, Só para desflorar florestar virgens,
absurdos; E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
- São empregados vários formatos de expressão, O mais que faço não vale nada.
como sons, poesias, jornais, músicas, objetos do
Como, pois sereis vós
cotidiano para a composição de obras de arte plástica, Que me dareis impulsos, ferramentas, e coragem
todas pautadas por pessimismo e ironia, principalmente Para eu derrubar os meus obstáculos?...
no que se refere aos acontecimentos políticos mundiais. Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Fonte: TUFANO, Douglas. Estudos de Literatura Brasileira. 4. ed. São Paulo: Eu amo o Longe e a Miragem,
Moderna, 1988.
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
Ide! tendes estradas,
O Dadaísmo, assim como outros movimentos Tendes jardins, tendes canteiros,
culturais do século XX, representaram e expressaram Tendes pátrias, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios.
o desejo por mudança, renovação, da vida e da arte,
Eu tenho a minha Loucura!
livre de teorias e de modelos pré-estabelecidos. Esse Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
movimento em particular propõe a criação de uma nova E sinto espuma, e sangue, e cântico nos lábios...
linguagem para expressar a nova realidade e as infinitas
ATIVIDADE 2
ATIVIDADE 3:
Fonte:http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/c/c7/Vinicius_de_
Moraes.jpg
data de acesso: 01/05/2011.
Anotações
Apresentação e
análise das principais
correntes teórico-
literárias
CAPÍTULO 2
EaD
EaD UNIVERSIDADE
UNIVERSIDADE DO
DO ESTADO
ESTADO DA
DA BAHIA
BAHIA
Anotações
Neste capítulo, apresentaremos as mais significati- Seu sucesso intelectual só aconteceu quando um professor
vas correntes teórico-críticas que surgiram ao longo do dinamarquês leu sua obra “Assim falou Zaratustra” e passou a divulgá-
século XX, e que movimentaram o cenário não apenas la. Esse livro, hoje um clássico, Nietzsche começara a escrever em
1882, dando início a uma intensa produção que foi interrompida por
no que se refere à produção literária e sua crítica, mas
uma “crise de loucura”. Essa crise, que o colocou sob tutela da mãe e
que trouxeram grandes inovações culturais, como a da irmã, durou até sua morte, em 1889. Estudos recentes afirmam que
teoria da recepção, que abre espaço e dá importância a causa da morte do filósofo foi um cancro no cérebro, que poderia ser
inusitada ao leitor. de origem sifilítica.
Leia mais sobre Nietzsche, sua vida e sua obra em: http://pensador.
Conforme aponta Vince Brewton (2006), talvez a
uol.com.br/autor/Fridrich_Nietzsche/biografia Acesso em 05/02/2011.
maior influência que veio modificar e trazer novas for-
mas de se pensar e entender o mundo, o conhecimento
e a própria cultura, num âmbito geral e não apenas no
contexto da Literatura, foi a suspeita epistemológica
lançada pelo filósofo alemão Friedrich Nietzsche de que
“os fatos não são fatos até serem interpretados”, ou
seja, o conhecimento, que até então era considerado, NIETZSCHE, Friedrich. A genealogia da moral. Trad. A. A. Rocha. Rio
de um modo geral, como dado, natural, na verdade é de Janeiro: Ediouro, s/d.
Friedrich Nietzsche
Nietzsche é um dos filósofos mais conhecidos, lidos e admirados
na atualidade. Natural de Röcken, Alemanha, nasceu em 1844 em
uma família luterana, que pretendia torná-lo pastor. Na adolescência,
abandonou a fé, sendo que os estudos de Filologia contrastavam os
conceitos de Teologia aprendidos. Desenvolveu sua vocação filosófica
na universidade de Leipzig, onde foi um aluno brilhante. Aos 25 anos foi
nomeado professor de Filologia na universidade de Basiléia.
FONTE:http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/2/23/
Nietzsche1882.jpg
Data de acesso: 01/05/2011.
Russo” pois nasceu no Círculo Linguístico de Moscou O objetivo de Stálin era transformar a URSS em uma grande potência
(1914-15) e durou até 1924-25, tendo suas pesquisas industrial, e para tanto, ele perseguiu os camponeses e donos de terra,
bruscamente interrompidas pela patrulha ideológica sendo que muitos fazendeiros foram mortos, pois era da agricultura
stanilista, que chegou a fuzilar o linguista Polivanov. que deveriam vir os recursos para construir as indústrias. Os operários,
Nessa época foi fundada a “Associação para o Estudo por sua vez, não podiam mudar de emprego e foram proibidos de fazer
greve. Essa ditadura, conhecida como “regime de terror” estendeu-se
da Linguagem Poética” – Opoiaz. até a morte de Stálin, em 1953.
A seguir, leia algumas importantes informações
históricas sobre a grande revolta russa e o período do Leia mais em: www.ebah.com.br/a-revolucao-russa-e-o-stalinismo-
doc-a14423.html.
stalinismo, o que o ajudará a entender o quadro de forte
agitação e problemas políticos e sociais que assolaram a
Rússia a partir do início do século XX, frutos dos abusos FIGURA 5 - LÊNIN
e descaso do regime czarista para com a população
camponesa do país, ou seja, sua maioria:
Os formalistas negavam que a literatura fosse um moderna, a linguagem demonstra a classe social numa
reflexo da sociedade, que poderia funcionar como um soma de elementos intelectuais, emocionais e sociais, e
lugar de luta de classes ou disseminação de ideias. sua teoria constitui uma ciência bem construída.
No entanto, a crítica que pesa sobre eles diz respeito Mais tarde, a estilística se desenvolveu como ciência
ao excesso de concentração na forma, ou linguagem, da expressão e como crítica dos estilos individuais, sem-
desconsiderando o papel e a importância de áreas como pre levando em conta que a linguagem, ou discurso, na
História, Psicologia, Sociologia, as quais consideravam terminologia formalista, não é exterior ao sujeito falante,
como “extraliterárias”, mas que hoje são localizadas pois linguagem e vida social se identificam, ou mesmo
de maneira inconteste nos textos literários. O equilíbrio se fundem. De acordo com essa teoria, não existe ade-
consiste em valorizar tanto as ideias que são expressadas quação da ideia à forma, ou a ideia brotando da forma.
nas obras quanto a forma de linguagem que as comu- O que acontece é uma forma espontânea da ideia.
nica. Conforme Roger Samuel, a arte reside na forma, A estilística estudou o estilo, que se trata de um fenô-
o que não quer dizer que a forma se constitua no único meno individual de natureza psíquica, uma germinação
elemento. E, como já dizia Mallarmé, a literatura não se necessária da qual, segundo Roland Barthes, o autor
faz com grandes ideias, mas com palavras. não pode fugir.
Leo Spitzer define estilo como a forma de operar
Estilística – definição e contextualização metodicamente os elementos formais da língua, a
A Estilística surgiu com a publicação de um livro maneira de se utilizar do material oferecido pela língua,
que logo veio a se tornar um clássico: Tratado de estilís- seja escrevendo ou falando. Assim, podemos entender
tica francesa, de Charles Bally, que veio complementar as “estilo” como escolha e seleção, expressão subjetiva
pesquisas do Sumário de estilística. Os dois livros saíram de uma coletividade. Essa escolha pode se dar de
do Seminário de francês moderno, na Universidade de maneira aleatória ou intencional (no caso da literatura),
Genebra. mas sempre expressa algo inerente à cultura e contexto
O Tratado é um livro didático, que estuda o valor socio-histórico do indivíduo ou grupo.
emotivo dos fatos da linguagem e a ação dos fatos Alguns autores estabelecem uma distinção entre
expressivos que concorrem para formar o sistema de a estilística da língua (enquanto sistema, idioma) e a
meios de expressão de uma língua, ou seja, é o estudo estilística do discurso (a língua viva, falada, quando
da emoção da linguagem, sua expressão através dos utilizada pelo usuário).
meios linguísticos, e é essa teorização de Bally que
fundamenta a crítica estilística.
A linguagem expressa sentimentos e fatos sociais,
trazendo consigo ainda uma quantidade variável de
elementos intelectuais e emotivos. Diferente do rigor da No Brasil, a estilística produziu excelentes estudos, dentre os quais
forma imposto pelo Formalismo Russo, a estilística de sugerimos dois títulos para leitura e aprofundamento do assunto:
Bally não é formal, pois ele logo percebeu na linguagem GARCIA, Othon Moacyr. Esfinge rara: palavra-puxa-palavra em Carlos
Drummond de Andrade. Rio de Janeiro: Ed. São José, 1955, sobre a
a expressão dos fatos sociais, constatando que não
poética de Drummond; e:
existe pensamento puro, dissociado das condições GOMES, Eugênio. O enigma de Capitu. Rio de Janeiro: José Olympio,
fundamentais da vida, que sempre estarão presentes 1967, sobre o grande romance de Machado de Assis, Dom Casmurro.
na linguagem, de maneira direta ou indireta, mais evi-
dente ou menos evidente. Isso porque a linguagem não
se configura apenas como um fato psicológico, mas
social, sendo que ela se dinamiza mesmo, cumpre seu
papel mais essencial dentro das relações humanas de
troca e convivência, onde expressa os conflitos entre
os sentimentos sociais dentro da sociedade burguesa.
Para Charles Bally, que fora discípulo e sucessor de
Ferdinand de Saussure (1857-1913), o pai da linguística
TEXTO 2:
Noite morta
Conforme vimos, a estilística tem a ver com escolhas, o que em
um texto escrito se expressa no léxico, figuras de linguagem e de Noite morta.
expressão, emotividade, pragmatismo, entre outros elementos, que Junto ao poste de iluminação
variamde autor para autor. Observe nos dois poemas sobre a “noite”, Os sapos engolem mosquitos.
as diferenças de estilo de dois grandes poetas brasileiros, Carlos
Drummond de Andrade e Manuel Bandeira: Ninguém passa na estrada.
Nem um bêbado.
TEXTO 1:
A noite dissolve os homens
No entanto há seguramente por ela uma procissão de sombras.
A noite desceu. Que noite!
Já não enxergo meus irmãos. Sombras de todos os que passaram.
Os que ainda vivem e os que já morreram.
E nem tão pouco os rumores que outrora me perturbavam.
O córrego chora.
A noite desceu. A voz da noite . . .
Nas casas, nas ruas onde se combate,
nos campos desfalecidos, a noite espalhou o medo e a total (Não desta noite, mas de outra maior.)
incompreensão.
Petrópolis, 1921
A noite caiu. Tremenda, sem esperança...
Os suspiros acusam a presença negra que paralisa os guerreiros. FIGURA 7 - NOITE
Havemos de amanhecer.
O mundo se tinge com as tintas da antemanhã
e o sangue que escorre é doce, de tão necessário para colorir tuas
pálidas faces, aurora.
Mas o “New Criticism” não ficou restrito aos Estados 2.4 Estruturalismo – definição e
Unidos. Os ingleses I.A. Richards e William Empson, contextualização
entre outros, se interessavam pelo mecanismo psicoló-
gico que determina a reação do leitor à obra, elemento
que mais tarde passou a ser estudado como a “Estética
Da mesma forma como a “Nova Crítica” ou New
da Recepção”.
Criticism, também o Estruturalismo buscou estabelecer
Conforme aponta Rogel Samuel (2002), os adeptos critérios objetivos, científicos para a análise a partir de
da “Nova Crítica” lutaram contra a sociologia e a antro- um novo rigor intelectual dentro dos estudos literários.
pologia cultural, dizendo que a crítica marxista reduzia a Nesse sentido, o Estruturalismo pode ser considerado
literatura, entendendo-a como um simples conjunto de uma extensão ou continuação do Formalismo, pois tanto
normas sociológicas e políticas, cujo conteúdo estaria um quanto o outro focaram sua atenção na forma literária
necessariamente relacionado a uma causa externa. (ou seja, na estrutura), desconsiderando o conteúdo
Para o crítico literário René Wellek (1971), a litera- social ou histórico. Essa estrutura configura-se em
tura é uma instituição social que utiliza como meio de um sistema de relações, individualizado por meio de
expressão outra instituição, também social: a linguística. simplificações através das quais se realiza um estudo.
Ele considera os próprios processos literários, como a Essa estrutura, apesar de indefinível, tem um caráter de
métrica e os símbolos, de natureza social, como con- organização total, de coesão e interdependência dos
venções e normas sociais, e a literatura como um todo elementos, de dinâmica interna. Toda estrutura faz uma
representa a vida social, mesmo a subjetiva. organização sistemática, com funções específicas, onde
O poeta, o artista que faz literatura é também membro a mudança de um elemento altera o todo, visto que todos
da sociedade, e nesse lugar, como artista da linguagem, os componentes são interligados e dependem uns dos
recebe um certo grau de consideração e recompensa, e outros.
dirige-se a um público, ainda que hipotético (visto que, Segundo Jonathan Culler (1999), a meta principal do
ao dar a público o que escreve, não escreve para si Estruturalismo, diferente da Fenomenologia, que bus-
mesmo, e assim deixa de possuir seu texto, ao menos cava descrever a experiência, é identificar as estruturas
em exclusividade). Wellek (1971) reconhece ainda a subjacentes que tornam a experiência possível. Ainda
função social da literatura, que não é individual, sendo que as duas correntes tenham em comum o interesse
que a maioria das questões que aborda são questões em descobrir e analisar a maneira como o sentido é
sociais, relativas à tradição e à convenção, às normas produzido, enquanto que na Fenomenologia se faz uma
e aos gêneros, aos símbolos e aos mitos, os quais a descrição da consciência, o Estruturalismo procura
literatura visita, reitera, critica, representa, desconstrói analisar as estruturas que atuam inconscientemente,
ou mesmo rechaça. como as da linguagem, da psique e da sociedade (as
Assim como as demais instituições estéticas, tam- quais as pessoas usam ou nelas se inserem sem per-
bém a literatura é uma instituição social. Ainda que ceber ou se dar conta). Nesse sentido, o Estruturalismo
discorde do marxismo estreito, o crítico reconhece que muitas vezes tratou o leitor como um mero espaço de
a literatura nasce num contexto social, sendo, portanto, códigos subjacentes que tornam o sentido possível e
parte de uma cultura. Porém, salienta que a mesma não como agente do sentido.
substitui nem deve ser confundida com a sociologia ou Basicamente o Estruturalismo vive de dois pares de
a política, já que possui justificação e objetivos próprios, conceitos, tomados da Teoria Linguística Estrutural,
específicos. desenvolvida por Ferdinand de Saussure: significante –
significado e diacronia – sincronia. A sincronia se baseia
na crença de que existe uma certa imobilidade no tempo;
já a diacronia faz o contrário: representa o processo
histórico como uma sucessão de formas. Assim como
Platão, Sausurre considerava o signo (palavras, sinais,
símbolos) como um elemento arbitrário, desvinculado
do conceito ou significado que carregava. Dessa forma,
segundo Brewton (2006), a partir do modo como uma mas a estrutura única através da qual são produzidos
sociedade em particular utiliza a linguagem e os sinais, todos os contos populares russos.
o significado se constitui de um sistema de diferenças Contudo, esse projeto, que consistia em oferecer
entre unidades da língua. Não interessavam os significa- uma explicação sistemática do discurso literário, não
dos particulares, e sim, as estruturas que compunham vingou na Grã-Bretanha nem na América. Nessas frentes,
a significação como um todo e tornavam o próprio conseguiu, no máximo, trazer novas ideias a respeito da
significado possível. Nesse sentido, o Estruturalismo literatura, tornando-a uma prática significativa entre as
seria uma metalinguagem, ou seja, uma linguagem sobre demais, abrindo caminho para leituras sintomáticas das
linguagem, utilizada para decodificar línguas existentes obras literárias. Ao mesmo tempo, incentivou os Estudos
ou sistemas de significação. Os estruturalistas acredi- Culturais, que na época ainda tomavam fôlego, a buscar
tavam que através das atividades estruturais poderiam explicação para os procedimentos significativos das
recompor um “objeto” e nessa reconstrução definir suas diferentes práticas culturais.
regras de funcionamento, as “funções” desse objeto. Conforme alerta Jonathan Culler (1999), o Estrutu-
Nesse sentido, a estrutura funcionaria como um modelo ralismo muitas vezes é confundido com a Semiótica, a
da realidade, uma imitação do objeto. ciência geral dos signos, que inicia em Saussure e vai
Enquanto corrente teórica, o Estruturalismo designa até o filósofo norte-americano Charles Sanders Peirce.
um grupo de pensadores, em sua maioria franceses, que No entanto, diferente do Estruturalismo francês e seus
nas décadas de 50 e 60 do século XX resolveram aplicar segmentos, marcados pela especulação filosófica e
os conceitos da linguística estrutural desenvolvida por crítica cultural, a Semiótica consiste em um movimento
Saussure ao estudo dos fenômenos sociais e culturais. O internacional interessado em incorporar o estudo cien-
Estruturalismo se desenvolveu primeiro na Antropologia, tífico do comportamento e da comunicação.
com Claude Lévi-Strauss e sua pesquisa sobre os mitos,
FIGURA 8 – VLADIMIR PROPP
e depois nos estudos literários e culturais, a partir da
obra do formalista Roman Jakobson, já mencionado,
Roland Barthes, Tzetan Todorov, A.J. Greimas e Gerard
Genette. Vladimir Propp analisou os contos populares
russos, procurando identificar uma estrutura única pela
qual seriam produzidos todos eles.
Na psicanálise, temos Jacques Lacan, na história
intelectual Michel Foucault e na teoria marxista, Louis
Althusser. Apesar desses pensadores jamais terem
formado uma “escola teórica” propriamente dita, seu
trabalho recebeu o rótulo de “Estruturalismo”, e sob
tal designação foi importado e lido na Inglaterra, nos
Estados Unidos e em outros lugares, como no Brasil
(já mais tardiamente) no final das décadas de 60 e 70. Fonte:http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/d/d8/Vladimir_Pro-
pp_%281928_year%29.jpg, acesso em 01/05/2011.
No que se refere aos Estudos Literários, a proposta do
Estruturalismo era identificar e analisar as convenções
que tornam possíveis as obras literárias, não apresen-
tando novas interpretações para elas, mas procurando
compreender como elas podem ter os sentidos e efeitos
que têm. Enquanto que no campo da Antropologia Lévi-
-Strauss ocupou-se de identificar e analisar os mitos, na
linguística e literatura temos como exemplo estruturalista
o trabalho de Vladimir Propp com os contos populares
russos. Assim, de acordo com a metodologia do Es-
truturalismo, o pesquisador busca identificar e mapear,
descrever não apenas a estrutura de um único conto,
Vassilissa, a formosa
Há muito, muito tempo, num certo reino distante, vivia um rico
mercador, com sua mulher e uma única filha. A menina chamava-
se Vassilissa, e era bonita e meiga como uma flor. Mas um dia
quando Vassilissa tinha apenas 8 anos, sua mãe ficou muito
doente, e, sentindo que ia morrer, chamou a filha, tirou de sob
as cobertas uma pequena boneca e lhe entregou dizendo:
teóricas pós-estruturalistas à linguagem, proclamando de opostos binários, e é reformulada por Derrida como
“a morte do autor”. De acordo com essa definição, a um jogo infinito de presença em espaço e tempo) dá
escrita, ou registro, dado a público, implica na destruição origem a um novo modelo de crítica textual, a partir da
da “voz” (autor) que a gerou, ou originou. Da mesma linguagem, não do conteúdo. Esse modelo sugere um
forma, aplica um ponto de vista similar ao leitor, afirman- reexame crítico das ciências humanas e das relações
do que o mesmo não tem história, nem biografia, nem entre linguagem e verdade, erro, conhecimento, poder,
psicologia, mas é aquele em cujo único campo possui razão, desejo e o falante.
todos os traços que constituem um texto. Assim, a teoria da “desconstrução” provocou um
Brewton (2006) esclarece que o Pós-Estruturalismo profundo impacto na crítica literária, sendo que propõe
é menos unificado como movimento teórico do que o modificar o campo inteiro de análise acabando com a
Estruturalismo, já que as obras de pensadores relaciona- divisão entre ficção e teoria, literatura e filosofia, ler e
dos a ele tem em comum o signo da “Desconstrução”. escrever, o crítico e o escritor.
Assim, o advento de teorias como a Semiótica (estudo
dos sinais linguísticos de interface com o Estruturalis-
FIGURA 10 – JACQUES DERRIDA
mo), a teoria da “Resposta do Leitor” (EUA) e “Teoria
da Recepção” (Europa), a “Teoria do Gênero”, conce-
bida pelos psicanalistas Jacques Lacan e Julia Kristeva
constituem áreas de análise e estudo identificadas com
o Pós-Estruturalismo.
A idéia da “Desconstrução”, criada pelo filósofo
Jacques Derrida, que embasou teoricamente o Pós-
-Estruturalismo, dando uma nova concepção teórica
para o “signo” e o “significado” de Sausurre, entendidos
agora como conceitos culturais, que se referem a uma
realidade empiricamente certificável e não são mais
garantidos pela linguagem.
A perda das referências, antes fornecidas pela meta-
narrativas (veja o fragmento de texto em “Saiba Mais”,
p. 45) é denunciada pela “Desconstrução”, segundo a
qual essa perda resulta num adiamento infindável do
significado. Derrida afirmou que já não é mais possível
sair do texto, ou seja, os significados, quando possíveis
e identificáveis, não são mais fixos ou estáveis.
De acordo com Jonathan Culler, desconstruir uma
oposição implica em demonstrar sua condição de pro-
duto, a partir de discursos que se apóiam nele. Fonte:http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/99/Derrida-by-
-Pablo-Secca.jpg , acesso: 01/05/2011.
Derrida critica a estrutura enquanto campo fechado,
que não admite nenhum lugar secreto e nenhum limite
extra. Na linguística estruturalista, a desconstrução de Para Michel Foucault, outro filósofo francês de
Derrida se volta contra os textos fundadores do sujeito grande influência na Teoria Literária pós-estruturalista,
de Saussure e Lévi-Strauss, denunciando a exterioridade o Estruturalismo representa a tentativa de apresentar o
superficial da linguagem e até mesmo da filosofia, que mundo para a consciência como se ele fosse algo para
tratavam seus pensamentos e textos como estáveis, ser lido pelo homem. Nesse sentido, ele acredita ser
espontâneos e acessíveis. Esse teórico, no início de seus essa uma última ilusão do Estruturalismo, que apesar
estudos, ocupou-se em reler a filosofia observando sua de admitir a morte do sujeito, não percebeu a morte do
relação com a linguística. Sua análise sobre o signo e a discurso do sujeito. E é justamente quebrar essa falsa
significação (que em Saussure não passava de um jogo estabilidade a tarefa do Pós-Estruturalismo, em vários
de seus objetos. A crítica de Foucault a respeito da Em resumo, o que aconteceu após a década de 70,
construção do conhecimento teve papel fundamental depois do Pós-Estruturalismo, é que a teoria de um modo
no desenvolvimento da perspectiva pós-moderna, que geral, e a Teoria Literária em particular, passou a adotar
abrange o Pós-Estruturalismo. De acordo com sua teoria, uma postura crítica em relação a tudo o que até então
o conhecimento não é transmitido através do discurso fora pensado como natural, assumindo a concepção de
– mas é o próprio discurso, que se encontra dentro que aquilo que era dado como natural não passa de uma
do texto. A partir do estudo e análise da genealogia do construção da linguagem, sendo, portanto, um produto
filósofo alemão Nietzsche (que já vimos anteriormente, histórico, cultural, submetido a forças e pressões his-
no início deste capítulo), Foucault tenta desconstruir a tóricas e culturais tanto no momento de sua produção
operação não reconhecida do poder e do conhecimento quanto no de sua recepção. Essa questão, por outro
para revelar as ideologias que fazem a dominação de lado, implica na perda da referencialidade.
um grupo por outro parecer natural. As investigações Nesse contexto, Richard Freadman e Seumas Miller,
desse filósofo sobre o discurso e o poder nele embutido em Re-pensando a teoria (1994) elaboram um crítica
forneceram uma nova e revolucionária forma de examinar às diversas concepções contemporâneas que geraram
a história e analisar textos, antes tidos como estáticos e a chamada “crise da teoria da literatura”. No entanto,
imutáveis, que ficou conhecida como “Novo Historicis- essa crise nada mais é do que o reflexo específico de
mo”, a respeito do qual falaremos mais adiante. uma crise muito mais ampla, deflagrada a partir do Pós-
-Estruturalismo dos anos 70, a crise epistemológica de
FIGURA 11 – MICHEL FOUCAULT
paradigma. Na tentativa de oferecer uma saída para essa
crise, no que diz respeito à Literatura, eles reafirmam
A especificidade da literatura como um modo distinto
de discurso sobre o mundo; que nenhuma teoria pode
ser totalmente determinante da prática crítica; e que nem
a teoria nem a prática crítica a ela associada podem
fornecer uma descrição totalmente completa de qualquer
texto. (FREADMAN, MILLER, 1994, p. 17)
Como fechamento de uma época, a desconstrução
pressupõe a noção de limiares, sendo que o Pós-Estru-
turalismo se coloca como um movimento de descen-
tramento e de desconstrução da metafísica ocidental,
o que reverte a nossa maneira de olhar para aquilo que
pensávamos ser a “realidade” enquanto algo natural,
dado, irreversível, na constituição de uma ordem, um
poder, um saber. Assim, podemos concluir que a crise diz
respeito à constatação da impossibilidade de se apropriar
do real, face à descoberta de que o campo da linguagem
(e da interpretação, de texto em texto) é infinito, tanto
quanto transitório, instável e múltiplo.
Assim, se há hoje uma crise que também atravessa
e abala a Literatura enquanto disciplina, campo de co-
nhecimento e saber, ela nada mais é do que o reflexo de
uma crise mais ampla das teorias de um modo geral,
que estão questionando os valores estabelecidos que
orientaram as ciências por séculos. Segundo Barthes,
a Literatura desestabiliza os saberes instituídos, e assim
Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/7d/Foucault1. permite que os mesmos se renovem constantemente.
jpg, acesso: 01/05/2011.
Estudos Culturais, História, Psicologia..., expressando Leia o texto, ouça a música, e procure identificar os trechos que trazem
seu caráter polimorfo e indeterminado, em constante mais contundentemente essa idéia de crise, de quebra de paradigmas,
reconstrução. de instabilidade e desafios no contexto brasileiro (onde, diga-se de
passagem, tudo chega bem mais tarde). Cabe lembrar que em 1988
No próximo capítulo examinaremos a situação da
foi escrita a nova Constituição Brasileira.
Teoria da Literatura em relação a sua historicidade e
expressão social. Ideologia
Cazuza/ Roberto Frejat - 1988
Meu partido
É um coração partido
E as ilusões
Estão todas perdidas
DERRIDA, Jacques. Gramatologia. São Paulo : Perspectiva, 1973
Os meus sonhos
______. Escritura e a Diferença. São Paulo: Perspectiva,
Foram todos vendidos
1971
Tão barato
FOUCAULT, Michel. Arqueologia do Saber. Rio de Janeiro: Forense,
Que eu nem acredito
1987.
Ah! Eu nem acredito...
______. A Ordem do Discurso. São Paulo: Loyola, 1995.
(...)
LYOTARD, Jean-François. A condição pós-moderna. São Paulo: José
Pois aquele garoto
Olympio, 2002.
Que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Agora assiste a tudo
Em cima do muro
Em cima do muro...
Meus heróis
Morreram de overdose
Meus inimigos
Estão no poder
Ideologia!
Eu quero uma pra viver
Ideologia! Pra viver...
FIGURA 12 - CAZUZA
Fonte:http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/b/bb/Cazuza_flickr.
jpg, acesso: 01/05/2011.
Anotações
Historicidade do
texto literário e sua
expressão social
CAPÍTULO 3
EaD
EaD UNIVERSIDADE
UNIVERSIDADE DO
DO ESTADO
ESTADO DA
DA BAHIA
BAHIA
Anotações
Neste capítulo, iremos observar as relações de mais lida como literatura; o que antes representava um
correspondência e equivalência (ou não) entre a Litera- contexto real, hoje é entendido apenas como um outro
tura enquanto expressão artística e social e o contexto texto. Para Compagnon, a história não tem um sentido,
histórico no qual ela surge e se apresenta, terminando uma narrativa unificada. Ela própria é uma construção,
mesmo por dialogar com ele. Conforme aponta Antoine que coloca em cena tanto o presente quanto o passado,
Compagnon, em O demônio da teoria, 2001, a literatura sob determinada ótica.
acompanha de certa forma o movimento da história, mu- m suma, não existe mais história na qual a litera-
dando junto com ela, e ao mesmo tempo expressando-a. tura possa se apoiar, pois os próprios contextos de sur-
Porém, um questionamento pode nos provocar: cabe gimento das obras não passam eles mesmos de textos,
à literatura imitar a ideologia social vigente, representado- construções narrativas, relatos unilaterais, representa-
-a, ou confrontá-la, modificá-la? A literatura deve ser ções, ou seja, há “somente textos”, conforme aponta
considerada como reflexo, espelho de seu contexto o New Historicism americano, conjugando a noção de
histórico de surgimento, ou paradigma? Conforme intertextualidade, que considera a “historicidade dos
Compagnon (2001), há quem acredite que a literatura textos” e a “textualidade da história”.
não só pode como deve ser explicada e entendida a
partir de causas históricas; já outros contestam tal ideia
afirmando que a mesma desconsidera, ou mesmo fere a
3.1 Conceito de Intertextualidade
especificidade literária que a faz transcender a história.
A noção de intertextualidade, (sobre a qual já falamos
No entanto, o que podemos concluir, por enquanto, é
mais no início de nosso texto), foi introduzida na Teoria
que, apesar de não ser propriamente possível explicar a
Literária por Julia Kristeva em 1966, por influência da
literatura a partir, ou através da história, por outro lado,
noção de dialogicidade desenvolvida por Mikail Baktin em
não se pode negar que a literatura possui uma dimensão
seu livro Estética da Palavra. Segundo ele, o texto está
histórica.
em diálogo com a tradição e com uma comunidade co-
Cabe lembrar que o ímpeto de relacionar literatura municacional. Julia Kristeva expande a noção de Baktin,
e história está estreitamente ligado à maneira como se aplicando-a à literatura como um todo. O importante na
costumava analisar as obras literárias, desde o século XIX concepção da literatura como intertextualidade é o ques-
até boa parte do XX (no Brasil, até pouco tempo atrás): tionamento das visões tradicionais de obra e de autor:
descrevendo e interpretando dados da vida do autor.
1) Critica-se a visão de obra literária como algo ab-
Nesse sentido, o autor representaria o elo de ligação entre
solutamente original e encerrada em si mesma;
o texto artístico e seu contexto de produção – histórico.
2) Assim sendo, desmistifica também a ideia do
Porém, não podemos esquecer o paradoxo dessa
“poeta-gênio”, considerando que poeta é simplesmente
convenção, já que a obra de arte – no caso, a literária,
alguém capaz de produzir uma versão mais criativa das
é ao mesmo tempo eterna e histórica. Mesmo definindo-
potencialidades literárias da língua e da cultura, e não
-se e descrevendo-se particularidades de seu contexto
necessariamente um ser superior aos demais.
de surgimento e da vida de seu autor, esses elementos
não influenciam necessariamente o texto, tampouco o Tal concepção de intertextualidade já estava presente
limitam, sendo que ele, mesmo após décadas ou sé- na visão tradicional de literatura, só que mais reservada,
culos, continua a proporcionar uma emoção estética. ou a gêneros específicos (como a sátira, a paródia, a
E também pode ser considerado como um documento tradução, o comentário, a crítica, o plágio), ou a certas
histórico por refletir a ideologia e a sensibilidade de uma partes do texto (citações, notas, alusões, epígrafe).
época. A questão é que o contexto e os antecedentes de Na pós-modernidade a noção de intertextualidade
uma obra devem ser considerados e estudados enquanto ganha impulso não apenas com as concepções ditas
condições de sua produção, e não como suas causas. estruturalistas e pós-estruturalistas da literatura (sobre-
Outro fator de grande relevância é que, com o advento tudo de Gerard Genette, de Paul de Man e de Jacques
da Pós-modernidade, que colocou as grandes narrativas Derrida) mas também com novos fenômenos textuais
em cheque, a própria noção de história modificou-se “multimidiáticos”, tais como o hipertexto e a Internet.
profundamente, sendo que atualmente ela é cada vez
pelo “cânone literário”, também conhecido como “alta Tal questão abriu precedente para outras contro-
literatura” – os clássicos – como afirmam alguns. Isso vérsias, bastante consistentes, por sinal, que dizem
porque os próprios estudos literários nunca permane- respeito a um possível abandono dos padrões literários
ceram estáticos em uma única concepção daquilo que tradicionais ante o estudo generalizado desses textos
faziam, muito pelo contrário, e como já enfatizou Evelina anteriormente desconsiderados. O que passou então
Hoisel. Desde seu surgimento e organização enquanto a ser questionado foi se essas obras que agora tinham
disciplina, ou, numa perspectiva mais abrangente, “te- vez e voz estavam sendo estudadas por serem também
oria”, eles sempre foram contestados e controversos, consideradas como “literatura”, ou por sua represen-
e prova disso são as diversas escolas e movimentos tatividade social ou cultural? O que está determinando,
teóricos que tentaram explicá-los e, de alguma forma, atualmente, a escolha de obras a serem analisadas é o
apropriarem-se deles, sem sucesso, conforme vimos desejo “politicamente correto” de conceder representa-
até aqui. Assim, em resumo, podemos afirmar que não ção artística e cultural às minorias, ou critérios literários?
há porque temer qualquer controvérsia entre os estudos No entanto, o que a experiência mostrou até agora
culturais e os literários, pois estes não estão compro- é que a tão proclamada “excelência literária” nunca
metidos com um objeto literário a ser repudiado pelos determinou quais obras deveriam ser estudadas; cada
primeiros. A diferença é que a abordagem empreendida professor seleciona textos de acordo com algo que re-
pelos Estudos Culturais é mais ampla, e considera di- presentam e ele deseja estudar com seus alunos. O que
ferentes artefatos culturais como “textos” a serem lido. mudou hoje em dia é que, além das formas literárias, a
Dessa forma, eles podem é contribuir para redimensionar escolha das obras é também orientada pelas experiên-
o objeto dos estudos literários, relacionando-o a outros cias sócias e culturais que representam, o que termina
discursos e tornando o estudo da literatura um fenôme- abrindo espaço para textos considerados secundários,
no intertextual complexo, pelo viés da linguagem, e em e até mesmo para expressões culturais populares até
consonância com o contexto sociocultural onde própria então nem vistas como literatura, ou depreciadas como
literatura circula.. “baixa literatura”.
O temor, ou pelo menos a desconfiança sobre um
possível “estrago” que os Estudos Culturais poderiam
promover no consagrado “cânone literário”, mediante o
estímulo ao estudo de filmes, televisão e outras formas
culturais populares, em substituição às tradicionais aná-
SILVA, Tomaz Tadeu da. O que é, afinal, Estudos Culturais? 2ª Ed.
lises de clássicos mundiais ainda persiste. No entanto, Autêntica: Belo Horizonte, MG, 2000.
o que se observa até agora é um revigoramento desse
mesmo cânone, através da abertura para diferentes e Sinopse
instigantes maneiras de se ler as chamadas “grandes
Este livro reúne uma série de ensaios que constituem uma introdução à
obras”. Os textos de Shakespeare, por exemplo, têm sido
influente área de investigação e de intervenção conhecida como Estudos
estudados como nunca, sob todos os ângulos possíveis: Culturais. Os Estudos Culturais tomam como seu objeto qualquer
pela perspectiva feminista, marxista, psicanalítica, histo- artefato que possa ser considerado cultural, sem fazer distinção
ricista, desconstrucionista... Culler observa que, dentro entre ‘alta’ e ‘baixa’ cultura- das exposições de museu, passando
do contexto dos Estudos Culturais, a literatura ensinada pela literatura e pelo cinema e chegando aos programas de televisão
e à publicidade, nada é considerado estranho às preocupações das
hoje abriu espaço para textos de mulheres e de outros
análises e das críticas dos Estudos Culturais.
grupos historicamente marginalizados, como negros,
asiáticos, latinos, etc. E esses textos, antes delibera-
damente negligenciados e sistematicamente ignorados,
costumam ser estudados como representações da
experiência e cultura desses grupos. Ao mesmo tempo,
eles levantam a instigante questão: “em que medida a
literatura cria a cultura que se diz que ela expressa ou
representa”, ou em outras palavras, “a cultura é o efeito
de representações ao invés de ser sua fonte ou causa?”
3.3.1 Desconstrução
FIGURA 16 - MULHERES
Fonte:http://produto.mercadolivre.com.br/MLB-159283254-o-
-evangelho-segundo-maria-armando-avena-livrousado--_JM, acesso:
01/05/2011.
Fonte:http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/6/64/Via_Campesi-
na.jpg , acesso: 01/05/2011.
3.3.3 Psicanálise
Desde então, a teoria e escrita pós-colonial representa própria cultura como um todo, baseada tradicionalmente
uma tentativa dialógica de intervir na construção da na negação das relações homoeróticas.
cultura e do conhecimento no sentido de “escrever um A questão é quanto ao rumo desses debates que, num
caminho de volta numa história que outros escreveram.” primeiro momento, reivindicam espaço e abertura para
suas questões específicas: essa diferença afirmada deve
3.3.5 Discurso das Minorias ser teórica e culturalmente celebrada e acentuada, ou
esses debates devem servir para contestar as distinções
Na própria esteira do Estudos Culturais (ou Cultural que estigmatizam e discriminam? Ou seria possível, no
Studies), surgidos nos Estados Unidos, o crescimento âmbito da representatividade cultural, conjugar as duas
do estudo das literaturas produzidas por minorias étni- coisas? Tal querela ainda necessita de mais reflexão e
cas constituiu-se em uma verdadeira conquista política amadurecimento, já que uma resposta única de fato não
dentro das instituições acadêmicas norte-americanas. a encerra.
Relacionado em outros contextos com a virada histórica
proposta pela Teoria Pós-colonial, vista antes, esse mo- FIGURA 19 - HOMOSSEXUAL
vimento socioteórico busca resgatar e promover os es-
tudos sobre a escrita negra, latina, asiático-americana e
nativo-americana, visando a afirmação e o fortalecimento
dessas identidades no contexto liberal da diversidade
cultural e do multiculturalismo, hoje em voga. Nesse es-
paço surgem muitas críticas à hegemonia algo autoritária
e arbitrária da teoria tradicional, dita “branca”, acusada
de se impor contra projetos de outros grupos que lutam
para estabelecer seus próprios temas e contextos.
Os críticos e intelectuais latinos, afro-americanos
e asiático-americanos se empenham em desenvolver
o estudo de discursos das minorias que representam,
Fonte:http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/9a/200051_1
estabelecendo seu caráter distintivo e particular em
0150164703565719_601455718_8313848_7885686_n.jpg, acesso:
articulação com as tradições dominantes de escrita e 01/05/2011.
pensamento. E é a partir dessa posição de marginalidade
que esses representantes também expõem, denunciam e
Como pudemos ver, nessa verdadeira “viagem” pelo
questionam os pressupostos do discurso da “maioria”,
território mágico, ainda que nem sempre pacífico e tran-
intervindo em seus debates teóricos.
quilo da Literatura e suas teorias, a expressão literária,
assim como os estudos sobre ela refletem e enaltecem
3.3.6 Queer Theory a riqueza cultural e artística da humanidade, e dessa
forma, também se modifica e evolui continuamente, num
Assim como a Desconstrução e outros movimen- diálogo constante com a sociedade que a um só texto a
tos teóricos contemporâneos, a Queer Theory (o termo produz e é produzida (representada) por ela.
“queer” é uma gíria americana que pode ser traduzida Nosso desejo é que o estudo dessas teorias, a partir
como “bicha” ou “viado”, referindo-se geralmente ao de uma perspectiva histórica e crítica, o ajude a perceber
homossexual masculino) usa o marginal, que foi posto e identificar o valor indescritível das obras literárias en-
de lado como perverso, inadequado, além dos limites, quanto patrimônio cultural da humanidade, e que sempre
para analisar (e criticar) a construção cultural do que se renovam a cada nova leitura, a sua leitura!
é considerado certo, “normal” e ideal: a normativida-
de heterossexual. Os trabalhos de autores como Eve
Sedgwick, Judith Butler e outros fizeram da Queer Theory
um espaço de questionamento produtivo, não apenas no
que tange a construção cultural da sexualidade, mas da
Sites:
www.ifcs.ufrj.br/~fsantoro/...sobre_poetica.htm
http:// greciantiga.org/arquivo.asp?num=0589
www.suapesquisa.com/artesliteratura/dadaismo.
htm.
http://pensador.uol.com.br/autor/Fridrich_Nietzsche/
biografia
www.ebah.com.br/a-revolucao-russa-e-o-stalinismo-
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Gibson, 2006.
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www.scribd.com/doc/6835700/Vladimir-I-Propp-
-Forense-Universitaria-MORFOLOGIA-DO-CONTO-MA-
RAVILHOSO.
www.fichasedesenhos.com/vassilissa-a-formosa-
-um-conto-russo.html
http://educação.uol.com.br/filosofia/filosofia-pos-
-moderna---jean-francois-lyotard-o-fim-das-metanar-
rativas.jhtm
http://educacao.uol.com.br/biografias/ult1789u720.
jhtm
www.sescsp.org.br/sesc/convivencia/oficina/livrovi-
vo/intertextualidade.htm
http://educação.uol.com.br/portugues/ult1693u2.
jhtm
http://aletranapratica.blogspot.
com/2009_06_01archives.html
http://psicanaliselacaniana.vilabol.uol.com.br/.