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SOCIOPATIA

R.H.Hodara

Equality in spite of evident nonidentity is a somewhat sophisticated concept and

requires a moral stature of which many individuais seem to be incapable. They


rather

deny human variability and equate equality with identity. Or they claim that the
human

species is exceptional in the organic world in that only morphological characters are

controlled by genes and all other traits of the mind or character are due to "condi-

tioning " or other nongenetic factors. Such authors conveniently ignore lhe results of

twin studies and of the genetic analysis of nonmorphological traits in animais. An

ideology based on such obviously wrong premises can only lead to disaster. Its

championship of human equality is based on a claim of human identity. As soon as it

is proved that lhe latter does not exist, the support for equality is likewise lost.

-Ernst Mayr (1963, p. 6Ct9)

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Introdução

O senhor L é um paciente de 43 anos de idade. Foi encaminhado pelos


conselhos tutelares acusado de ter praticado abuso físico contra seu filho e de
apresentar conduta muito violenta ou sociopática. Seu caso é particularmente
interessante.

Talvez seja um caso interessante pelo simples fato de que o senhor L não é,
de fato, o paciente. O senhor L é o pai do paciente que seria a vítima. Será mesmo?
Afinal, talvez não se deva considerar seu filho como “paciente”, pois o mesmo jamais
se considerou como tal, não se tratando – também como veremos – de um neurótico
e nem de um psicótico que não tem consciência de sua própria doença. Quem, então,
seria o nosso real paciente?

Fig. 1 OS FATORES DE RISCO PARA TPA (ALTAMENTE GENÉTICOS) SÃO ESTÁVEIS


DURANTE O DESENVOLVIMENTO A PARTIR DA ADOLESCÊNCIA.

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A verdade é que L foi encaminhado com um possível diagnóstico de
“sociopatia”, embora isso jamais tenha ocorrido formalmente devido a possível falta
ou inexistência de psicólogo gabaritado (?) naquela instituição.

A nós, da equipe e a mim em particular, cabia a tarefa de diagnosticá-lo da


forma mais exata possível. A partir do diagnóstico deveríamos encaminhar o pai de
volta à tutela do filho.

Mas afinal, o que é a psicopatia e a sociopatia? Qual sua relação com


Transtorno de Personalidade Anti-Social?

A maioria das pessoas é incapaz de entender como uma personalidade anti-


social e criminosa, tal como a de um "serial killer" (assassino serial), é possível, num
ser humano como nós.

O conceito de TPA (Transtorno de Personalidade Anti-Social) engloba


diversos tipos de fatores e superfatores de personalidade e seus comportamentos
associados numa ampla (máxima) combinação de mundos sociais possíveis. A TPA
é bastante abrangente: por exemplo, nem todo TPA é necessariamente criminoso,
nem todo TPA é um psicopata, psicótico anti-social ou sociopata, embora qualquer
um destes sistemas últimos se inclua, necessariamente, dentro do guarda-chuva
que é o conceito geral de TPA.

Não são apenas os assassinos seriais, afinal, mas uma grande proporção de
criminosos violentos em nossa sociedade (em torno de 50% dos prisioneiros) que
mostram muitas características do que a psiquiatria chama de "sociopatia" ou
“psicopatia” e psicose anti-social. A DSM-IV, o importante manual de diagnóstico
usado por psicólogos e psiquiatras, define um distúrbio mais geral, denominado mais
apropriadamente, "distúrbio da personalidade antisocial" (a já citada TPA) e lista
suas principais características, que podem ser facilmente reconhecidas em
indivíduos afetados.

A Organização Mundial de Saúde também definiu sociopatia em sua


classificação de doenças CID-10, usando o termo "distúrbio da personalidade

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dissocial".

Fig. 2 O CÉLEBRE ESTUDO DA DINAMARCA (RECENTEMENTE CONFIRMADO POR


DAVID LYKKEN E OUTROS) MOSTRA QUE A GENÉTICA DO COMPORTAMENTO CRIMINAL É
MAIS FORTE NA CONTENÇÃO DESSE COMPORTAMENTO QUE NA SUA PRODUÇÃO
DESENVOLVIMENTAL.

Os sociopatas são caracterizados pelo desprezo pelas obrigações sociais e


por uma falta de consideração com os sentimentos dos outros.

Eles exibem egocentrismo patológico, emoções superficiais, falta de auto-


percepção, pobre controle da impulsividade (incluindo baixa tolerância para
frustração e limiar baixo para descargas de agressão), irresponsabilidade, falta de
empatia com outros seres humanos, possuem atração por situações de perigo e
risco, possuem menor sensibilidade ao medo e QI ligeiramente abaixo da média (9
pontos), ausência de remorso, ansiedade e sentimento de culpa em relação ao seu
comportamento anti-social.

Eles são geralmente cínicos, manipuladores, incapazes de manter uma


relação e de amar. Eles mentem sem qualquer vergonha, roubam, abusam,
trapaceiam, negligenciam suas famílias e parentes, e colocam em risco suas vidas e
a de outras pessoas.

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O senhor L não apresenta a maioria dos fatores supra-citados. Sob diversos
aspectos é uma pessoa “normal” no sentido estatístico relevante. Foi casado três
vezes.

Nas primeiras duas vezes casou-se com duas empregadas domésticas, num
intervalo de cerca de dez anos, e teve com as mesmas duas filhas. Os problemas,
ao que parece, começaram a surgir (ou pelo menos a evoluir no sentido de se
tornarem “propriedade das fofocas da comunidade”, por assim dizer) a partir do
terceiro casamento. Foi nesse casamento, a partir do nascimento de seu filho, que o
senhor L passou a enfrentar problemas que o levaram a perda da guarda do menino.

Fig 3 AQUI SE OBSERVA A IMPORTÂNCIA DO FATOR PARENTAGEM COMO


COMPLEMENTO À TENDÊNCIA GENÉTICA NA PRODUÇÃO DE UM SOCIOPATA. COMO PODE
SE OBSERVAR, A IMPORTÂNCIA DA PARENTAGEM CRESCE NO MEIO DA CURVA NORMAL E
DECRESCE NOS EXTREMOS DA MESMA.

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Como talvez se possa depreender, o senhor L é um homem de baixa renda
que trabalhou como biscateiro, motorista de táxi empregado ou indo ao Paraguai
para trazer “muamba”. Além disso, sua infância apresentou alguns “marcadores” de
sociopatia, como sua incapacidade de freqüentar a escola.

Além desses, sua parentagem não foi satisfatória, tendo sido rejeitado por
pai e mãe, e criado por uma avó. Tais leituras, além de outras a seguir, permitem
deduzir que o sujeito possui fatores genéticos de risco para TPA. No entanto, como
veremos, é no nível do detalhe e da situação “não típica” que o diagnóstico mais
preciso se desenvolve, sendo por isso mesmo o mais difícil.

Sua última esposa, mãe de F., era uma prostituta com a qual ele sempre se
desentendia. Não por acaso, os dois brigavam fisicamente, embora não haja, pelo
que se saiba, maiores danos físicos resultantes desses desentendimentos.

No entanto, num desses desentendimentos, o senhor L, que não possui


nenhuma condenação judicial (embora vários registros na polícia), teve seu filho
retirado à força de dentro de casa, pelos conselhos tutelares e polícia, devido às
denúncias de maus tratos contra o menino.

Essas denúncias foram feitas pela mãe do menino, por parte da comunidade
e por uma de suas professoras. Ao que parece, após um exame do corpo do menino
(feito pelo doutor Renato Flores), todas as denúncias de tortura (eram diversas)
foram consideradas insubstanciáveis. Tanto os aspectos materiais quanto
testemunhais do próprio menino (sete anos de idade), apontavam contra a idéia de
um pai agressor de crianças.

Mais que isso, o próprio menino parecia dar um depoimento realista em


favor do pai, e contrário às afirmações de maus tratos.

Apesar desse fato, desde o término de meu estágio, o garoto continuava


incomunicável em relação a seu pai, colocado num dos diversos abrigos da FEBEM
para meninos “não-infratores”.

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Fig 4 AQUI SE VÊ CLARAMENTE A DIFERENÇA DA IMPORTÂNCIA DA PARENTAGEM
EM RELAÇÃO AOS DEMAIS FATORES DE RISCO DENTRO DOS DIVERSOS SUBGRUPOS DA
TPA (PSICOPATA, SOCIOPATA, “NORMAL”, ETC).

O fato de que o garoto F. (filho de L) tenha se jogado nos braços da


funcionária nos Conselhos Tutelares fez com que as pessoas (sem nível
universitário nem acompanhamento psicológico profissional) deste órgão
desconfiassem ainda mais do senhor L. Nunca, em nenhum momento, passou pelas
cabeças das senhoras daquela instituição de caráter popular, que o garoto estivesse
com medo da mãe – e não do pai.

Tal posição, por parte daquelas “autoridades” “especializadas” no tratamento


dos menores de idade que lá chegam, não é de causar espanto, pois o
comportamento do senhor L é muito estranho e agressivo (apresenta transtorno de
impulso, ligeira taquilalia e tique de língua).

Pelo menos na aparência, considerando suas maneiras brutas, seu linguajar


“sujo” e seus “tiques nervosos” (como o tique de língua, que comentarei mais tarde),

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L aparenta ser um pai possivelmente violento e cruel. Nada mais natural, portanto,
que os conselheiros desconfiassem da veracidade do testemunho do pai, e não da
mãe (ou da comunidade denunciante).

Assim sendo, com a mãe desaparecida – pois a mesma, durante o incidente,


abandonou o lar deslocando-se para fora do estado – ficou o menino a mercê dos
conselhos tutelares e da FEBEM e proibido de sequer ver o pai.

Sem qualquer prova de violência paterna ou mesmo de doença mental


grave, o menino foi privado do pai, da mãe, e dos pares, assim como do ambiente
de moradia ao qual estava, mal ou bem, acostumado.

Fig 5 É VISÍVEL QUE APÓS OS QUARENTA ANOS, O SOCIOPATA PASSA A TER


DIVERSOS FATORES DE RISCO REDUZIDOS OU ELIMINADOS. ASSIM SENDO, UM
DIAGNÓSTICO DE TPA APÓS OS QUARENTA ANOS (COMO NO CASO DE L), DE ALGUÉM
QUE JAMAIS FOI ENCARCERADO OU CONDENADO PELA JUSTIÇA, PASSA A SER UM
DIAGNÓSTICO IMPROVÁVEL.

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Quanto ao “paciente”, o senhor L, sua condição externa era a de um típico
pai revoltado contra a comunidade, a Justiça e os conselhos.

No papel de pai cioso, exigia ver seu filho, alegando que iria entrar de
revólver em punho nos conselhos, para resgatar seu filho aprisionado.

Quando por mim confrontado com essa situação imaginária, relevou que não
atiraria nas pessoas, a menos que as mesmas estivessem, armadas e atirassem
primeiro.

E, de fato, na única vez em que se envolveu em tiroteio, o senhor L foi


baleado diversas vezes devido a “briga por mulher” (sic), reagindo (também à bala)
só após o primeiro ataque.

Levado ao HPS, não foi preso, pois comprovou-se de imediato a legítima


defesa. Até os 43 anos de idade, o senhor L não possui nenhuma condenação
judicial – o que, pelos DSMIV depõe contra um diagnóstico de psicopatia (transtorno
de personalidade anti-social).

De fato, o senhor L satisfaz apenas dois critérios para TPA, razão pela qual
tal diagnóstico foi excluído.

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Fig 6 AQUI SE VÊ A CÉLEBRE CLASSIFICAÇÃO ORIGINAL 16 FATORES DE
CLECKLEY QUE INFLUENCIOU O “CHECK-LIST” PARA PSICOPATIA E OS CRITÉRIOS ATUAIS
DOS DSM E QUE AINDA É CONSIDERADA ESTATISTICAMENTE MAIS “HOMOGÊNEA”
(ESPECÍFICA) COMO PREDITORA PARA TPA.

Internamente, o senhor L (custei a descobri-lo), se identifica massivamente


com seu único filho homem. Por exemplo, não admite que o garoto tenha traços
efeminados (como de fato tem) e que possa vir a não se envolver com
homossexuais na FEBEM.

Essa identificação maciça do senhor L com F. se dá pela via do sentimento


de abandono e solidão. Expressões do tipo “meu pobre filho abandonado”, ou
similares, eram expressões comuns.

Mesclavam-se, muitas vezes, com palavras de baixo calão e palavrões.

Diante dos resultados do protocolo do Inventário Beck que acusaram


depressão muito baixa ou inexistente, fiquei muito espantado quando o L (num único
momento do tratamento) caiu em choro convulsivo, literalmente clamando pelo

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retorno do filho.

Ao que parece, embora possa haver aqui uma certa especulação, o senhor L
está começando a se aperceber do peso da idade e de sua condição social solitária.

Separado das duas esposas anteriores e filhas (que não visita), sem a
presença da última mulher que passou a odiar e afastado à força do filho, o senhor L
também não possui muitos amigos nem uma família extendida (primos, tios, etc)
para a qual possa “retornar”.

Fig 7 O PSICOPATA E SOCIOPATA POSSUEM TANTO UMA REDUÇÃO NA


PERCEPÇÃO PASSIVA DA POSSIBILIDADE DE PUNIÇÃO NA BUSCA DE UM OBJETIVO,
QUANTO UMA ATRAÇÃO MAIS FORTE NA DIREÇÃO DESSE OBJETIVO.

Dessa forma, o sentimento de pertença está enfraquecido, reforçando


as fantasias de ligação afetiva e abandono em relação ao filho retido na FEBEM.

Curiosamente, devido a prováveis aspectos genéticos constitucionais,

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tanto a ansiedade quanto os níveis de depressão em L são baixos.

Como apresenta transtorno de impulso (vide ficha), conduta anti-social (sem


personalidade anti-social), auto-estima alta e comportamento fortemente assertivo,
os sintomas de depressão são muito raros.

No entanto, não seria absurdo supor que caso ocorra depressão em L no


futuro, a mesma será devastadora e, é claro, ligada a atos tanto explícitos quanto
mascarados de agressão.

Ao final deste relatório, resta a pergunta final: quem é, de fato, o paciente?

O pesquisador canadense Robert Hare, um dos maiores especialistas do


mundo em sociopatia criminosa (como Lykken no estudo de gêmeos), certamente
não caracterizaria o senhor L como foi feito preliminarmente pelos conselhos
tutelares de Porto Alegre.

Hare os caracteriza como "predadores intra-espécies que usam charme,


manipulação, intimidação e violência para controlar os outros e para satisfazer
suas próprias necessidades. Em sua falta de consciência e de sentimento
pelos outros, eles tomam friamente aquilo que querem, violando as normas
sociais sem o menor senso de culpa ou arrependimento."

Os sociopatas são incapazes de aprender com a punição, e de modificar


seus comportamentos (BIS baixo, BAS alto, simultaneamente). Quando eles
descobrem que seu comportamento não é tolerado pela sociedade, eles reagem
escondendo-o, mas nunca o suprimindo, e disfarçando de forma inteligente as suas
características de personalidade.

Por isso, os psiquiatras usaram no passado o termo "insanidade moral" ou


"insanité sans délire" para caracterizar esta psicopatologia.

O indivíduo sociopata geralmente exibe um charme superficial para as


outras pessoas e tem uma inteligência baixa (ao contrário do que Holliwood e a

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maioria dos psiquiatras supõe). Quando o psicopata possui uma inteligência acima
da média é que ele se distingue dos demais (exatamente por existir esse gradiente
no mundo real).

Aquele caso “puro” de psicopata, e que é apenas um subconjunto de TPA,


não mostra sintomas de outras doenças mentais, tais como neuroses, alucinações,
delírios, irritações ou psicoses.

Eles podem ter um comportamento tranqüilo no relacionamento social


normal e têm uma considerável presença social e boa fluência verbal.

Em alguns casos, eles são os líderes sociais de seus grupos. A inteligência


cristalizada (termo usado por Lykken) costuma ser mais alta que a inteligência não-
cristalizada (lógica aplicada a novos problemas, matemática) que costuma ser mais
baixa.

Muito poucas pessoas, mesmo após um contato duradouro com os


psicopatas, são capazes de imaginar o lado oculto, o qual a maioria dos psicopatas
é capaz de esconder com sucesso durante sua vida inteira, levando a uma dupla
existência. Vítimas fatais de sociopatas violentos percebem seu verdadeiro lado
apenas alguns momentos antes de sua morte.

O mais assustador é o fato que entre 1 e 4% da população é psicopata em


maior ou menor escala. Claro, a maioria das pessoas com TPA não é criminosa e é
capaz de se controlar dentro dos limites da tolerabilidade social (pois TPA inclui o
subconjunto dos sociopatas).

Eles são considerados somente como "socialmente perniciosos", ou têm


personalidades odiosas (agridem e “preparam armadilhas” pelas costas), e cada um
de nós conhece alguém que se ajusta a esta descrição.

Políticos corruptos e cínicos, que sobem rapidamente na carreira, líderes


autoritários, pessoas agressivas e abusadoras, etc., estão entre eles. Uma
característica comum é que eles se engajam sistematicamente em enganação e

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manipulação de outros para ganhos pessoais.

De fato, muitos sociopatas não-violentos e adaptados podem ser


encontrados em nossa sociedade. Apenas 47% daqueles que são caracterizados
como tendo TPA têm uma história de processo criminal significativo.

Os eventos mais relevantes para estas pessoas ocorrem na área de


problemas de trabalho, violência doméstica, tráfico e dificuldades conjugais severas.

Muitas pessoas evitam indivíduos com este distúrbio de personalidade


porque eles são irritáveis, argumentadores e intimidadores. Seu comportamento
freqüentemente é rude, impredizível e arrogante.

Fig. 8 AQUI ESTÁ O MODELO MULTIFATORIAL DE HARE (PSL) CONSIDERADO O


ESQUEMA CONFIÁVEL MAIS ANTIGO PARA AVALIZAÇÃO DIFERENCIAL DE SUBCONJUNTOS

DE SUJEITOS DENTRO DO DIAGNÓSTICO DE TPA.

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A sociopatia é reconhecida precocemente em um indivíduo: ela começa na
infância ou adolescência e continua na vida adulta (o diagnóstico é possível em
torno de 15 a 16 anos).

Crianças sociopatas manifestam tendências e comportamentos que são


altamente indicativos de seu distúrbio. Por exemplo, eles são aparentemente imunes
a punição dos pais, e não são afetados pela dor.

Nada funciona para alterar seu comportamento indesejável, e


consequentemente os pais geralmente desistem, o que faz a situação piorar.

Os sociopatas violentos mostram uma história de torturar pequenos animais


quando eles eram crianças e também vandalismo, mentiras sistemáticas, roubo,
agressão aos colegas da escola e desafio à autoridade dos pais e professores.

No entanto, apenas uma pequena fração dos sociopatas se desenvolve em


criminosos violentos, estupradores e assassinos seriais.

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Instinct Theory

Agressive Agressive
instinct behavior

Drive Theory

Agressive
Frustration
behavior

Social Learning
Theory
Aversive Dependency
Experiences

Achievement
Emotional
Resignation
Arousal
Agressive
-------------------- behavior
Antecipated Psychosomaticization
Consequences
Drugs and alcohol
Constructive
Incentive problem solving
Inducements

Fig 9 GENTILMENTE ENVIADO EM CORRESPONDÊNCIA PESSOAL PELO


PROFESSOR BANDURA DE STANFORD. UM DOS MOTIVOS QUE LEVOU ALBERT BANDURA,
NOS ANOS CINQUENTA, A DUVIDAR DO CONCEITO PSICANALÍTICO DE FRUSTRAÇÃO
COMO EXPLICAÇÃO DA AGRESSIVIDADE ANTI-SOCIAL HUMANA, ERA QUE O MODELO
PSICANALÍTICO NÃO ERA DISCRIMINATIVO. O PRÓPRIO MODELO DO APRENDIZADO
SOCIAL ACABOU FRUSTRANDO AS EXPECTATIVAS TAMBÉM. O DEBATE BANDURA-
PSICANÁLISE ENCERROU A ETAPA DA PSICOLOGIA NA QUAL SE BUSCAVA AS
EXPLICAÇÕES OU ATRAVÉS DAS VIVÊNCIAS EDIPIANAS NA INFÂNCIA OU ATRAVÉS DOS
CONDICIONAMENTOS SOCIAIS.

Em casos mais severos, a doença pode evoluir para canibalismo e rituais


sádicos de tortura e morte, de natureza bizarra.

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Fig 10 AQUI É BEM VISÍVEL COMO O PSICOPATA SE VÊ EM TERMOS DE MEDO E DE
NEUROTICISMO. O NÍVEL DE AUTO-PERCEPÇÃO E DESCRIÇÃO É ALTO QUANDO
COMPARADO A PSICOMETRIA INDEPENDENTE.

Há um amplo consenso que estas formas extremas de sociopatia violenta


são intratáveis e que seus portadores devem ser confinados em celas especiais para
criminosos insanos por toda a vida.

Um psicopata típico foi retratado por Dr. Hannibal "O Canibal" Lecter no filme
O Silêncio dos Inocentes e por Hitchcock no filme Psicose em que Norman Mailer é
inspirado na verdadeira história do assassino psicopata Ed Kemper. Aliás, a criação
de Hitchcock é “fichinha” se comparada com o Ed Kemper da vida real.

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Em nenhum momento, é claro, estes assassinos psicopatas mistos para
psicose podem se comparar ao assassino psicopata comum (tipo assassino
pescador de Rio Grande, ou ao assassino da tatuagem no Rio, ou ao assassino do
parque) – mas essa é uma diferença apenas de grau. Todos eles apresentam
delírios e sistemas de crença que diferem apenas em grau.

Maior é a diferença entre sociopatas e psicopatas, pois o sociopata teria


condições de ser socializado se houvesse havido alguma mudança na epigênese de
seu desenvolvimento infantil (por exemplo, boa parentagem e uma vizinhança com
líderes de grupo de pares não violentos).

Ou seja, quanto mais típico ou diferenciado é o psicopata, mais


profundamente genética é a alteração em seu modus operanti, em seu cérebro e
modo de vida.

Quanto aos sociopatas, a própria auto-definição e identidade muda bastante.

Os próprios sociopatas se descrevem como "predadores" e geralmente são


orgulhosos disto. Isso não é tão comum entre psicopatas, pois estes últimos
parecem ser mais discretos.

Os sociopatas não têm o tipo mais comum de comportamento agressivo,


que é o da violência acompanhada de descarga emocional (geralmente raiva ou
medo) e nem ativação do sistema nervoso simpático (dilatação das pupilas, aumento
dos batimentos cardíacos e respiração, descarga de adrenalina, etc).

Seu tipo de violência é similar à agressão predatória, que é acompanhada


por excitação simpática mínima ou por falta dela, e é planejado, proposital, e sem
emoção ("a sangue-frio").

Isto está correlacionado com um senso de superioridade, de que eles podem


exercer poder e domínio irrestrito sobre outros, ignorar suas necessidades e
justificar o uso do que quer que eles sintam para alcancar seus ideais e evitar
consequências adversas para seus atos.

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O fato dos sociopatas possuirem pouca empatia para o sofrimento dos
outros tem sido demonstrado experimentalmente em muitos estudos, os quais têm
mostrado que eles exibem um processamento anormal de aspectos emocionais da
linguagem, e que geralmente eles possuem resposta fisiológica fraca (no sistema
nervoso autônomo) a imagens, palavras e situações de alto conteúdo emocional.

Como acontece com os predadores, os sociopatas são capazes de uma


atenção extremamente alta em certas situações.

O distúrbio sociopático também está altamente associado com a incidência


de abuso de drogas e alcoolismo. De fato, esta associação piora os aspectos do
comportamento sociopático, assim considera-se que eles são mutuamente
reforçadores.

Sociopatas violentos ocasionam um alto preço para a sociedade


humana. Nos EUA, mais da metade dos policiais mortos por criminosos foram
vítimas de sociopatas.

O TPA é comum entre dependentes de drogas, mulheres e crianças,


gangsters, terroristas, sádicos, torturadores, etc. Além disso, os psicopatas são
aproximadamente três vezes mais propensos a recidivar e quatro vezes mais
propensos a recidivar violentamente do que os não sociopatas.

Citando novamente Hare: "É enorme o sofrimento social, econômico e


pessoal causado por algumas pessoas cujas atitudes e comportamento
resultam menos das forças sociais do que de um senso inerente de autoridade
e uma incapacidade para conexão emocional do que o resto da humanidade.
Para estes indivíduos - os psicopatas - as regras sociais não são uma força
limitante, e a idéia de um bem comum é meramente uma abstração confusa e
inconveniente".

Além disso, sob situações de stress, tais como em guerras, pobreza geral e
quebra da economia, surtos epidêmicos ou brigas políticas, etc., os sociopatas
podem adquirir o status de líderes regionais ou nacionais e sábios, tais como Adolf

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Hitler, Stalin, Saddam Hussein, Idi Amin, etc. Quando eles alcançam posições de
poder, eles podem causar mais danos do que como indivíduos.

Qual é a causa da sociopatia? Como o cérebro está envolvido? Como isto


pode ser prevenido e tratado?

O cérebro do psicopata é realmente diferente. São emocionalmente


insensíveis, possuem uma percepção de medo diminuída e são capazes de suprimir
a “dor esperada” (mediante uma expectativa planejada conscientemente) com muito
mais intensidade que uma pessoa normal.

Ou seja, são capazes de suprimir a dor esperada com mais intensidade –


isto acontece tanto por ação consciente quanto automaticamente.

Os sociopatas e psicopatas, além disso e como já vimos, possuem BAS alto


e BIS baixo – o que não deixa de nos fazer lembrar o que Freud dizia, originalmente,
sobre o princípio do prazer e da realidade.

No entanto, tais características parecem ser adquiridas num inconsciente


cerebral altamente vulnerável a trends genéticos durante a embriogênese. Nesse
caso, o “inconsciente”, por assim dizer, depende de fatores “realmente
inconscientes”. Ou seja, não há a necessidade de se supor memórias reprimidas
para se evocar a existência do fenômeno exposto.

Muitas das características da personalidade dos psicopatas poderiam ser


explicadas por déficits emocionais a partir das características acima. Além disso, o
sociopata e psicopata também possui maior atração por “perigo e risco”.

Diante de uma situação de susto ao assistirem filmes de terror com som


elevado, psicopatas não apresentam maior reação. Ou seja, sob uma exposição de
background de stress, e tendo o stress aumentada mediante “susto”, o chamado
gradiente de stress não possui o mesmo efeito num psicopata que numa pessoa
normal.

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Ou seja, para qualquer background de stress sensorial, o psicopata e o
sociopata reagem a qualquer aumento no estressor como sendo algo muito mais
natural (e menos perceptível) que você ou eu.

Pode-se acrescentar, portanto, que o psicopata e o sociopata possuem


maior resistência a qualquer tipo de stress! Esta boa característica, é claro, não
significa que os que sofrem de TPA possam ser caixas de banco ou pilotos de
veículos de transporte de valores (profissões de alto stress)... – e é fácil de imaginar
porquê!

Fig 11 AQUI SE VÊ, COM CLAREZA, AS VARIAÇÕES DE REAÇÕES AUTONÔMICAS


GERADAS PELO CÉREBRO DO PSICOPATA E SOCIOPATA NA COMPARAÇÃO COM O GRUPO
CONTROLE NÃO-PSICOPATA.

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Fig 12 ESTE GRÁFICO DO LYKKEN ILUSTRA O MEDO COMO FATOR DE PRIMEIRA
RELEVÂNCIA NA DEFINIÇÃO DO PSICOPATA E O SOCIOPATA.

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Fig 13 REAÇÃO DE SOCIOPATAS E PSICOPATAS DIANTE DE CHOQUES ELÉTRICOS
REALMENTE DOLOROSOS VERSUS GRUPO NORMAL (ESTUDANTES DE PSICOLOGIA
VOLUNTÁRIOS). A REAÇÃO “SEM MEDO” DOS PSICOPATAS E SOCIOPATAS ABAIXA O “HR”
TANTO APÓS O CHOQUE QUANTO O ELEVA ANTES DO CHOQUE “PREVISÍVEL”, REDUZINDO
A PRÓPRIA SENSAÇÃO DE DOR E COMPORTAMENTO DE EVITAÇÃO. NOTA: AQUI, AO
CONTRÁRIO DA CONHECIDA EXPERIÊNCIA DE MILGRAM, OS CHOQUES SÃO REAIS.

Os psicopatas não mostram alteração nestes parâmetros quando são


submetidos ao stress ou a imagens desagradáveis (parâmetro “HR”, ver figura).

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Estas alterações também não aparecem quando os sujeitos são avisados
antecipadamente por um flash de luz quando eles vão receber um estímulo
estressante (por exemplo, um desagradável sopro de ar em suas faces ou ruído
alto).

Esta é a razão porque os sociopatas mentem tão bem e porque eles não são
detectados pelos equipamentos de detecção de mentiras. Para eles, isso é natural,
ou seja, natural para a arquitetura preexistente de seus cérebros. Em relação a
mentira, eles são bons atores, por assim dizer, ao natural.

Entretanto, tudo isto não significa que os sociopatas não tenham emoções.
Eles têm, mas em relação a eles mesmos, não em relação aos outros.

E o que é mais impressionante, é que à semelhança dos autistas de alto


desempenho, eles são capazes de escrever longas, sinceras e completas
autobiografias, repletas de insights reais sobre seus próprios motivos e sentimentos,
sem que haja a menor capacidade (i.e. necessidade) de “enxergar” todos aqueles
sentimentos e detalhes psíquicos nos outros.

Ou seja, como no caso dos grandes autobiógrafos autistas (que também não
possuem “cérebro social”), tudo indica que a capacidade para a empatia reside num
módulo cerebral que não necessita de qualquer espelhamento nos outros ou modelo
cognitivo para traçar paralelos.

Isso sugere, pois, que os módulos necessários ao autoconhecimento são de


natureza independente em relação aos módulos necessários ao conhecimento e
empatia social!

De fato, tais indivíduos na forma mais grave são incapazes de sentirem


emoções "sociais" tais como simpatia, empatia, gratidão, etc.

Isto pode explicar porque os sociopatas são tão desejosos de inflingir


sofrimento e dor em outras pessoas sem sentir qualquer remorso. Para eles, as
emoções de outras pessoas não têm qualquer importância; não tem qualquer

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paralelo com suas próprias emoções (já que eles são capazes apenas de
compreender e enxergar as primeiras) – eles são, por conseguinte, cognitivamente
(“visceralmente”) "incapazes de construir uma similitude emocional do outro".

Mas quais são os tipos de emoções que o sociopata tem? Aparentemente,


eles reagem a tudo, e rapidamente, com sentimentos agressivos, são muito irritáveis
e também sensíveis a qualquer coisa que provoque vergonha ou humilhação. Nesse
aspecto, como já é bem conhecido, o psicopata pode lembrar o narcisista e vice-
versa.

Com relações às emoções positivas, eles obtém prazer através da sensação


de dominância e sentem satisfação por isto, ou seja, são do tipo que luta
desesperadamente por hierarquia e liderança.

Fig 14 A MAIOR PARTE DOS CIENTISTAS, COMO PSICÓLOGOS COGNITIVOS,


NEUROCIENTISTAS E GENETICISTAS, NÃO ACEITAM DEFINIÇÕES OU EXPLICAÇÕES DE
PSICOPATIA COMO ESTA ACIMA.

Hanna Damasio (que teve a bondade de enviar-me material impresso sobre


esse assunto) é uma neurologista que trabalha, principalmente, no estudo do lobo
frontal. O casal Damasio produziu uma teoria que poderia explicar porque pacientes
com distúrbios provocados por lesões no cérebro frontal ventromedial (e, por
extensão, sociopatas) têm estes problemas emocionais.

Trata-se da "hipótese do marcador somático", que tem mais ou menos a


seguinte forma:

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Indivíduos normais ativam os chamados "estados somáticos" (alterações na
frequência cardíaca e respiração, dilatação das pupilas, sudorese, expressão facial,
etc.) em resposta à punição associada às situações sociais. Por exemplo, uma
criança quebra alguma coisa valiosa e é punida severamente por seus pais,
evocando estes estados somáticos.

Da próxima vez que ocorrer uma situação similar, os marcadores somáticos


são ativados e a mesma emoção associada à punição é sentida. De modo a evitar
isto, a criança suprime o comportamento indesejado.

Observe-se que não se trata mais de uma teoria behaviorista, pois o


cérebro e sua genética, funcionando com o conceito de mente, estão “por trás”, por
assim dizer, do comportamento registrado e modificado a partir dos inputs do meio
social e familiar.

De acordo com o Dr. Damásio, pessoas com danos no lobo frontal são
incapazes de ativar estes marcadores somáticos. Ela diz:

"isto deprivaria o indivíduo de um dispositivo automático para sinalizar


consequências deletérias relativas a respostas que poderiam trazer a recompensa
imediata". Isto explica também porque os sociopatas e pacientes com danos no lobo
pré-frontal mostram poucas respostas autonômicas a palavras condicionadas
socialmente e imagens com conteúdo emocional social, mas têm respostas normais
a estímulos incondicionados como os Damasio mostraram.

Analisando o comportamento sociopático e suas causas, Damásio sugeriu


em seu livro, "Descartes' Error: Emotion, Reason and the Human Brain" (O Erro de
Descartes: Emoção, Razão e o Cérebro Humano), que a razão e a emoção não são
coisas separadas e antagonistas em nosso cérebro (este foi o erro cometido pelo
filósofo francês René Descartes aludido no título do livro), mas que um é importante
para o outro na construção da nossa personalidade sadia. Indivíduos que são
inteligentes e que são capazes de raciocinar bem, tornam-se monstros sociais
quando eles não sentem "emoção social", que é a base da moral, do sentimento que
está certo ou errado, etc.

26
Fig 15 EMBORA NÃO SE POSSA GARANTIR QUE A “BOA PARENTAGEM” UMA VEZ
RESTABELECIDA SERIA REALMENTE UM FATOR DE CONTENÇÃO NO CRIME E NO
AUMENTO DE JOVENS SOCIOPATAS NO MEIO URBANO, É CERTO QUE OS ÍNDICES DE
CRIMINALIDADE E SOCIOPATIA SUBIRAM NA SOCIEDADE AMERICANA DE UMA FORMA
ALTAMENTE CORRELACIONADA COM A DESINTEGRAÇÃO DA FAMÍLIA (MÃES SOLTEIRAS,
DIVÓRCIOS) E COM A FORMAÇÃO DE “GANGS” COMO SUBSTITUTOS DE SOCIALIZAÇÃO
VIOLENTOS À SOCIALIZAÇÃO TRADICIONAL SOB MAIOR CONTROLE E COM MAIOR
PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA (TANTO NUCLEAR QUANTO EXTENDIDA)

27
Fig. 16 ESTE GRÁFICO DEVE SER LIDO JUNTAMENTE COM O GRÁFICO ACIMA.
ESTE MOSTRA A POSSÍVEL LIGAÇÃO ENTRE MUDANÇA NO PADRÃO DE PARENTAGEM
NOS ESTADOS UNIDOS E CRESCIMENTO DO NÚMERO DE PSICOPATAS E CRIMINOSOS
ENTRE OS JOVENS.

28
Fig. 17 ESTE GRÁFICO DEVE SER LIDO EM FUNÇÃO DOS GRÁFICOS 15 E 16.
ATRAVÉS DE DIVERSAS CORRELAÇÕES, PROCURA SE MOSTRAR QUE EXISTE ALGUMA
PARTICIPAÇÃO PSICOSSOCIAL “PRODUTIVA”, COMPLEMENTAR AOS ASPECTOS
GENÉTICOS, NA GÊNESE DA PSICOPATIA E SOCIOPATIA.

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BIBLIOGRAFIA

Damasio, Antonio - Descarte's Error Emotion, Reason and the Human


Brain", Avon Hearst, New York, 1995.

Hare, Robert D.- "Without Conscience: The Disturbing World of the


Psychopaths Among Us", 1993.

LeDoux, Joseph - The Emotional Brain: The Mysterious Underpinnings of


Emotional Life. Touchstone Books, 1997, Reprint 1998.

David T. Lykken - The Antisocial Personalities. Lawrence Erlbaum Assoc.,


1995.

Mednick Sarnoff - The Biosocial Basis of Criminal Behavior. NY Press, 1977.

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