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Resumo
Resumen
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Professora da Faculdade de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (Rio de Janeiro/Brasil). Bolsa Jovem Cientista do Nosso Estado da Fundação Carlos Chagas Filho
de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). rosanne_dias@uol.com.br
Revista Investigación Cualitativa
Dias, R. (2017). Currículo, Docência e seus Antagonismos no Espaço Iberoamericano. Investigación Cualitativa, 2(2) 100-114.
DOI: http://dx.doi.org/10.23935/2016/02028
Dias, Currículo, Docência e seus Antagonismos no Espaço Iberoamericano
Abstract
In the Iberoamerican context, the year of 2021 was projected as a milestone for
the development of policies that succeed in overcoming the inequalities in the
educational field. All through the 2000's different publications pointed toward
policies that understand teaching and the curriculum as the fundamental aspects to
improve the quality in educations on different levels and modalities. These
productions are being disseminated by international organizations (such as
UNESCO and OEI) and involving nation-state education ministers as well as
important leaders of the educational community in the region. Teachers training
and practice, as well as the curriculum and their relations with evaluation are the
highlighted focus of the goals in those documents. This article is developed based
on three aspects: Ernesto Laclau's Theory of Discourse, an analysis of the
antagonisms that involve curriculum policies and teaching within the
Iberoamerican space. We emphasize the presence of ambivalence in discourses
disseminated about a teaching and curriculum.
Introdução
No escopo deste artigo, interpretamos os discursos que são disseminados pela OEI e
OREALC/UNESCO em duas diferentes dimensões: a de representações de ministros de Estado
da Educação dos países envolvidos e a de lideranças do campo da formação de professores nos
textos políticos disseminados pelas publicações desses organismos internacionais. Assim,
entendo discurso como ―uma prática articulatória que constitui e organiza as relações sociais‖
(Laclau e Mouffe, 2015, p. 167). Considerando esse papel na produção e disseminação de
políticas, influenciando e sendo influenciado por discursos de Estados-Nação, organizações não-
governamentais, comunidades epistêmicas entre outros atores políticos atuam na produção das
políticas em diferentes escalas. Considero fundamental analisar a produção dos organismos
internacionais como importante dimensão para o entendimento das políticas. Para compreender
como esse discurso vem sendo forjado analisamos essa produção, no período de 2001 a 2016,
focalizando os vínculos que estabelece entre currículo e docência e os antagonismos presentes na
articulação discursiva. Reconhecemos a impossibilidade de representação de todas as posições
expressas nesses textos políticos dada a expressão das diferenças, marcados pela contingencia e
precariedade das proposições que se fazem presentes na articulação da política, como nos faz
compreender a teoria do discurso de Laclau (1996, 2005). Portanto, na interpretação dos
discursos disseminados pelos textos políticos selecionados buscamos entender a heterogeneidade
constitutiva do campo discursivo que ―atraviesa toda identidad, todo elemento, demanda, etc.;
cruza el campo de representación en cuanto tal, limitándolo‖ (Biglieri, 2017, p.253).
Devemos, portanto, olhar cuidadosamente para os sentidos que vêm sendo produzidos
pelos antagonismos que mobilizam as políticas voltadas ao currículo e à docência. Um deles se
reporta ao modelo curricular para a formação de professores ao defender modalidades de
integração curricular a partir de uma oposição ao currículo disciplinar, muito presente nos cursos
das universidades. Ainda podemos verificar o antagonismo que se expressa na relação entre
desempenho dos alunos e dos professores, associando o bom professor como aquele que garante
o êxito em contraposição aquele que não demonstra o desempenho compatível com as
expectativas do sistema educacional. Na defesa do protagonismo docente também identificamos
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Processos de articulação e produção de sentidos nas políticas curriculares de formação de professores (2010-2013);
Discursos nas políticas curriculares para a formação de professores no espaço ibero-americano (2013-2017) e
Discursos sobre Avaliação nas Políticas de Currículo para a Formação e o Trabalho Docente no Espaço Ibero-
americano (2016-2018). Todas com financiamento público do CNPq e da FAPERJ.
Investigación Cualitativa 2(2) 2017
http://ojs.revistainvestigacioncualitativa.com/index.php/ric 103
Dias, Currículo, Docência e seus Antagonismos no Espaço Iberoamericano
epistêmica educacional, com ênfase no campo do currículo e da docência. Ao longo das duas
décadas do século XXI, Conferências foram realizadas no âmbito da região e políticas vêm
sendo forjadas normatizando o currículo e a docência, tendo como demanda a universalização da
educação básica de qualidade com a garantia de equidade, com o lema: ―una educación con
inclusión social y de calidad para todos‖ (OEI, 2016, p.9). O enunciado das Metas para a região
tem como horizonte o ano de 2021 ―la educación que queremos para la generación de los
Bicentenarios‖, com o argumento de que nesse ano, a maior parte dos países da região estará
comemorando o bicentenário de suas independências. Em avaliação mais recente, a OEI redefine
sua agenda visando a ―ampliar la mirada más allá de los plazos originalmente previstos e iniciar
una reflexión sobre las prioridades y estrategias para la concreción de las Metas en el periodo
2021-2030‖ (OEI, 2016, p.9). Tal decisão foi adotada para acompanhar a UNESCO em sua
Agenda da Educação 2030 no contexto dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS),
após a Conferência Mundial nas Nações Unidas, em setembro 2015. Um arco mais amplo de
alianças se constitui a partir de então na tarefa de atender as Metas para a região.
No que tange ao movimento das lideranças da área educacional, venho analisando sua
atuação como parte de comunidades epistêmicas (Antoniades, 2003; Lopes, Dias, Abreu, 2011)
que se organizam em processos de articulação em torno de demandas com o propósito de
constituir propostas hegemônicas (Laclau, 2005). As comunidades epistêmicas atuam em
processos de formação de agenda e difusão de conhecimento, em escala global/regional/local, em
especial, na produção de consenso como base para a coordenação de políticas, extrapolando o
conhecimento técnico-científico. Essas comunidades são também conhecidas como coletivos de
pensamento (Carvalheiro, 1999). Comunidades epistêmicas difundem de vários modos as ideias
sobre determinada política em seminários, conferências, consultorias, publicações, acesso à
mídia, debates, palestras e aulas públicas, entre outras atividades (Antoniades, 2003; Ball, 1998).
Os organismos internacionais se constituem em conhecidas estruturas institucionais que
sustentam a disseminação das ideias políticas, em suas redes sociais e políticas.
(...) la configuración misma de una demanda está en relación con otro, siempre es
relacional. No se trata de átomos de sentido o de considerar a la demanda cerrada y dada
en y por sí misma. Sino de elementos relacionales que, desde el vamos, están atravesados
o contaminados por la otredad‖ (Biglieri e Perelló, 2007, p.23).
Já não é possível pedir aos sistemas educativos que formem mão-de-obra para
empregos industriais estáveis. Trata-se, antes, de formar para a inovação pessoas
capazes de evoluir, de se adaptar a um mundo em rápida mudança e capazes de
dominar essas transformações. (Delors, 2001, p. 72)
cultura pode ser sintetizada como um princípio de eficácia que atua como uma forma de controle
indireto ou à distância, que substitui a intervenção e a prescrição pelo estabelecimento de
objetivos, pela prestação de contas, pela comparação e pelo desempenho – da reciclagem
permanente, do aprender a aprender, dos processos de formação continuada dirigidos à docência,
tão defendidos nos textos políticos da Ibeoamérica. A cultura performática utiliza-se de métodos
de mensuração e controle e os discursos de responsabilidade que, a despeito de permitirem maior
controle social de uma determinada política, na verdade, colaboram para a instauração de
métodos de vigilância e controle sobre o conhecimento e seus usos na sociedade, especialmente
nas instituições educacionais. Assim, importa menos (apesar do discurso em contrário) o
conteúdo ou a informação, em constante mudança no mundo, do que a aplicabilidade do
conhecimento.
Em trabalhos anteriores (Dias, 2013, 2016), pude verificar na produção discursiva dos
organismos internacionais Iberoamericanos, posições distintas sobre modelos de organização
curricular e processos de avaliação da formação e do trabalho docente. Em algumas dessas
posições a presença de um discurso que atribui grande responsabilização ao professor no
desempenho de seus alunos, associado a uma meta de responsabilização docente aos resultados
da educação, cada vez mais apoiada em exames de avaliação de larga escala nos diferentes
países. Nesses discursos entendemos que se projetam papéis para a docência envolvendo não
apenas o cotidiano do trabalho, como currículos para a sua formação inicial e continuada.
Embora alguns desses textos políticos se dediquem centralmente à crítica do currículo da
formação de professores inicial e continuada entendo que ao buscar formas de controle da
atuação docente também fica afetado o currículo da escola básica, especialmente quando o
professor sofre constrangimentos e pressões para desenvolver o currículo em um contexto de
avaliação padronizada.
La teoría y la práctica de la educación indican que uno de los elementos que más
incide en el processo de aprendizaje de niños y jóvenes tiene que ver con lo que
creen, pueden y están dispuestos a hacer los docentes. Minimizar o tratar con ligereza
este punto supone restringir y, de hecho, desviar la comprensión del problema y la
búsqueda responsable de soluciones. (Medrano e Vaillant, 2011, p. 11)
Nos discursos sobre políticas de currículo para a formação docente está presente o
antagonismo que, impede a fixação de sentidos, o que significa dizer a impossibilidade de
fechamento completo de um determinado sentido do discurso (Mendonça, 2003), acentuando a
presença de posições diferentes que pretendem se legitimar e constituir a hegemonia. A presença
do antagonismo, portanto, nos coloca diante das questões que envolvem disputas no campo da
significação da política. Nos perguntamos: a que vem se antagonizando os discursos sobre
modelos de organização curricular e processos de avaliação do trabalho docente nos textos
políticos analisados? Entre as possibilidades de expressar o antagonismo nessas políticas
podemos destacar os excertos a seguir
Explorar diseños de carrera profesional, cuyo eje central sea la calidad del
desempeño docente. La experiencia y el perfeccionamiento relevante y de calidad
deben ser valorados en la medida en que se traduzcan en aprendizajes profesionales.
Es importante, en consecuencia, evaluar y luego recompensar el desempeño
profesional efectivo, tanto en el aula como en su institución educativa, como eje del
ascenso en la carrera. Organizar la carrera docente en torno al desempeño implica
poner atención en los mecanismos de evaluación de la labor profesional, cuestión
ciertamente compleja pero indispensable de abordar. (UNESCO, 2012, p. 138)
O campo da docência nos apresenta muitas questões que que merecem debate em
diferentes níveis e por diferentes atores políticos. Concepções de atuação docente, presentes nos
textos políticos interpretados, nas quais o professor é apresentado como protagonista para
assegurar o sucesso escolar, o alcance de metas de qualidade na educação estão pari passu a
concepções que entendem ser necessário capturar um determinado modo de exercer a docência e
de garantir a qualidade da formação e atuação do professor, fixando-o a partir de processos de
padronização e de avaliação do desempenho. Embora no discurso se valorize a formação
continuada no espaço escolar e do conhecimento da prática há um silenciamento sobre a
importância dessa formação se pautar no conhecimento das experiências dos professores nas
escolas e comunidades nas quais atuam. Tais posições discursivas configuram o quadro de
ambivalências sobre as políticas de currículo para a formação e atuação dos professores no
espaço Iberoamericano.
Considerações Finais
Referências
UNESCO, (2004). O Perfil dos professores brasileiros: o que fazem, o que pensam, o que almejam.
Pesquisa Nacional.