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POLÍTICA NACIONAL DE ALFABETIZAÇÃO (PNA) E A FORMAÇÃO

DE PROFESSORES ALFABETIZADORES: ANÁLISE DE


PROFESSORES E PESQUISADORES1
Alissa Soares Bonifácio Meira2

Resumo

Este artigo tem como objetivo principal identificar por meio da análise realizada por
pesquisadoras em relação a Política Nacional de Alfabetização as implicações dessa política
na formação de professores alfabetizadores. Na busca em responder ao objetivo anunciado
e ao problema de pesquisa: o que as pesquisadoras apontam sobre a PNA e a relação com
a formação dos professores alfabetizadores? Para tanto, selecionamos três textos do dossiê:
“Política Nacional de Alfabetização em Foco: olhares de Professores e Pesquisadores" da
Revista Brasileira de Alfabetização no ano de 2019. Por meio de uma análise crítica pautada
na Teoria Histórico-Cultural, consideramos que os artigos analisados apontam a posição
política, epistemológica e social de professores pesquisadores contribuindo para pensar com
seriedade e compromisso a formação de professores alfabetizadores.

Palavras-chave: Política de Alfabetização. Formação. Professor alfabetizador.

1. Introdução

Este trabalho se utiliza de três artigos do dossiê “Política Nacional de


Alfabetização em Foco: olhares de Professores e pesquisadores” da Revista Brasileira
de Alfabetização, publicado em 2019. Os três artigos: “Apontamentos sobre a política
nacional de alfabetização” - o ponto de discussão é a indicação de um único método;
“A concepção de alfabetização na Política Nacional de Alfabetização/MEC/2019;
Diálogos com o plano nacional de alfabetização (2019): contrapalavras”. são das
seguintes autoras: Claudia Maria Mendes Gontijo, Janaína Silva Costa Antunes, Sara
Mourão Monteiro e Telma Ferraz Leal.
Selecionamos esses três artigos que relatam vários pontos que compõem a
nossa inquietação sobre as implicações que a Política Nacional de Alfabetização -
PNA traz para a formação dos professores alfabetizadores.

1
Utilizamos “professores e pesquisadores” em acordo ao título do dossiê apresentado.
2
Graduanda do curso de pedagogia pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). E-
mail: alissa.soares@ufms.br
2

Ressaltamos que a análise foi com base no que as autoras de cada artigo
tomaram como importante para analisar a partir do documento - PNA, como conceitos,
temas e problemas que constam no documento e nos permite refletir sobre o processo
de alfabetização tendo como preocupação a formação inicial e continuada de
professores alfabetizadores.
Para elaboração deste trabalho nos apoiamos na abordagem histórico-cultural,
cuja vertente crítica nos possibilita pensar o contexto social em que se encontra o
professor, sujeito ativo no processo de formação e de atuação frente à publicação do
documento PNA no ano de 2019.
Como aluna do curso de Pedagogia e possível professora, para adentrar uma
sala de aula de crianças em processo de alfabetização, busco as poucas memórias
que tenho da minha infância e, consequentemente, da minha fase de alfabetização,
pouco resta de lembranças, mas tomei a decisão de escrever sobre alfabetização
quando fiz a disciplina “Alfabetização e letramento”, ministrada pela Professora Lilian
Cristina Caldeira, no ano de 2019.
Ao participar dessa disciplina questionei-me se seria capaz de alfabetizar, pois
percebi que não era um processo tão simples como eu pensava, pois envolve teorias,
metodologias e as especificidades do processo de alfabetização, de espaço e tempo
a ser considerado. A partir dessa inquietação nasce o desejo de compreender o que
pauta o documento selecionado para esta pesquisa.
Posto isso, o presente artigo está organizado em quatro seções: a Política
Nacional de Alfabetização: o que o documento apresenta?; Formação de professores
em interface à alfabetização: pontos de reflexão; metodologia e análises.

1. A Política Nacional de Alfabetização: o que o documento apresenta?

A educação brasileira traz em sua história diversas problemáticas que


evidenciam fragilidades no ensino, na aprendizagem dos estudantes e na formação
de professores. Um destaque nos últimos anos são as políticas públicas que foram
implementadas na perspectiva de consolidar a formação inicial e continuada de
professores. Entre as questões pautadas nestas políticas públicas encontra-se o
Plano Nacional de Alfabetização – PNA - implementada via o Decreto 9.765 de 11 de
abril de 2019.
3

Este documento traz como marcos históricos as normatizações anteriores, bem


como as políticas e programas que trataram da alfabetização no Brasil, a sua
instituição e implementação, apoiado em documentos como: Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88), Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB n. 9.394/1996), Relatório de Alfabetização Infantil: os novos
caminhos (2003), Programa Brasil mais Alfabetizado (2003), documento de
Aprendizagem Infantil: uma abordagem da neurociência (2011), Pacto Nacional pela
Alfabetização na Idade Certa (PNAIC/2012) e Plano Nacional de
Educação(PNE/2014).
Fica claro que a Política Nacional de Alfabetização, por se tratar de um manual
explicativo lançado em 15 de agosto de 2019, foi intitulado pelo Ministério da
Educação (MEC) como “Caderno da PNA” (2019), cuja intenção é expandir o Decreto
n. 9.765/2019. A Portaria n. 1.460, de 15 de agosto de 2019, institui a Conferência
Nacional de Alfabetização baseada em Evidências (CONABE), tendo como tema: “A
Política Nacional de Alfabetização e o estado da arte das pesquisas sobre
alfabetização, literacia e numeracia”. A Portaria n. 1.461, de 15 de agosto de 2019,
nomeou doze pesquisadores especialistas para compor a CONABE.
A partir dessa conferência, segundo consta no caderno da PNA, a política de
alfabetização foi criada mediante aos níveis insuficientes das avaliações internas e
externas, exemplo da Avaliação Nacional de Alfabetização - ANA, e os resultados do
Programa Internacional de Avaliação dos Estudantes – PISA, no qual o Brasil ocupa
59º lugar em leitura e 65º posição em matemática, num ranking de 70 país, ficando
atrás apenas de países como Kosovo, Líbano, Argélia e República Dominicana.
Diante desse documento quando o assunto é sobre alfabetização e formação
de professores temos desafios para quem está sendo alfabetizado e para quem
alfabetiza, sendo um desafio maior ainda quando se trata de seguir o que a Política
Nacional de Alfabetização indica para os alfabetizadores, pois o documento apresenta
uma estrutura dividida em VI Capítulos e discute a defesa pelo método
fônico por ser, segundo ele, a maneira mais eficaz de alfabetizar uma
criança, baseada nas comprovações da ciência e de experiências
exitosas em outros países. Critica o uso de vários métodos, bem como
a autonomia do professor alfabetizador na escolha de determinado
método para o processo de alfabetização (ALMEIDA, 2022, p. 88).
4

Tendo como foco um único método para efetivar a alfabetização, nos faz refletir,
pois ainda na graduação sempre somos lembrados da importância de não focar
somente em um único método, pois cada aluno está em uma fase de desenvolvimento,
além de ter uma especificidade. Portanto, utilizar somente um método como forma de
alfabetização pode trazer implicações no processo de alfabetizar. Segundo Leal
(2019)
Há muitas evidências de estudos mostrando que é necessário ajudar
as crianças, jovens e adultos a entender o funcionamento do SEA, que
é mais que usar habilidades fonológicas, e desenvolver outras
habilidades de leitura e escrita, igualmente complexas, como as de
elaborar inferências, na leitura, e as de gerar e monitorar o processo
de produção de texto escritos (LEAL, 2019, p. 3).

E ainda de acordo com o apontamento de Leal (2019):


Um primeiro aspecto a ser discutido é sobre a indicação de um método
para alfabetizar crianças em todo o país. Historicamente, temos
defendido que não é papel do MEC indica um método de alfabetização
ou uma única abordagem teórica para se discutir qualquer tema. Ao
indicar um método, o MEC fere a autonomia dos professores, das
secretarias estaduais e municipais de educação. (LEAL,2019, p. 1)

Ponto importante de destaque da autora, trata-se da necessidade de autonomia


do professor pois o MEC não só fere a autonomia dos professores, mas também
deposita neles a culpa pelo fracasso na alfabetização de seus alunos.
É importante destacar alguns fatores como os professores recém-formados que
possuem dúvidas e receios, muitos ainda não estão seguros o suficiente quando se
trata de alfabetizar uma criança, já que para isso ele precisa compreender o processo
de alfabetização, as teorias que o embasam, os conhecimentos práticos que muitas
vezes só os estágios obrigatórios não conseguiram dar conhecimento suficiente para
esse professor.
Ser responsável por uma turma de crianças em fase de alfabetização e ainda
suportar a pressão e anseio dos pais dos alunos para um professor recém-formado
ainda é mais difícil, pois sempre existirá o receio de não suprir as altas expectativas
dos pais e alcançar êxito na formação das crianças.
Portanto, ao trabalhar com alunos que estão em fase de alfabetização não se
trata somente de escolher um método para ensinar o aluno, são muitas lacunas que
devemos preencher para evitar o fracasso escolar e a desvalorização e
desencorajamento do professor alfabetizador. Assim, sendo, podemos perceber como
5

os rumos das políticas educacionais impactam na prática dos professores, pois não
se trata de qualquer documento, mas sim, de um documento que está norteando o
ensino e a aprendizagem da alfabetização das crianças brasileiras.
O caderno da PNA (2019) menciona que a alfabetização deve visar um
desenvolvimento integral da criança, isto é, desenvolver os aspectos físicos,
cognitivos, sociais, morais, emocionais e linguísticos, assumindo a necessidade de
utilizar práticas multissensoriais, além disso ressalta que é preciso encontrar um meio
que estimule a aprendizagem, a atenção, os conhecimentos musicais e artísticos, bem
como um ambiente de caráter lúdico e proporcionador de momentos de leitura com a
família e as bibliotecas na escola.
De acordo com o exposto, pode-se afirmar que a criança que convive em
ambiente leitor contribui para a sua alfabetização, no entanto não podemos deixar de
afirmar que é papel da escola garantir que a sua alfabetização seja consolidada.
Mas é importante frisar que nem todas as famílias brasileiras têm condições de
usufruir de tempos de leitura com os seus filhos, pois trabalham em tempo integral e
às vezes nem consegue comprar um livro para ler com o seu filho, pois todo o salário
é destinado às necessidades básicas.
Além disso, a PNA (2019) assume o professor como agente central da
alfabetização, de modo que a valorização da carreira docente e o aprimoramento da
formação inicial e continuada dos docentes, baseado nas evidências científicas,
tornam-se elementos fundantes desse processo.
Porém, o mesmo documento enfatiza que a alfabetização deve ser dotada de
um único método. O que vai na contramão de estudiosos que apontam
[...] a alfabetização deve estar estreitamente ligada a processos
educativos desenvolventes que cumpram seu papel de instrução das
convenções da língua e da comunicação, como uma condição para a
integração de todos na vida social e profissional, promovendo
humanização das funções psíquicas em sua conversão em funções
culturais, isto é, superiores. (DANGIÓ; MARTINS, 2018, p. 59).

Nessa mesma direção, as autoras (2018) também apontam que:


[...] o fim primeiro da educação escolar é a alfabetização de todos o
fim último é a transmissão-assimilação do saber sistematizado
devendo ocorrer por meio do trabalho pedagógico, similar a
denominado por Saviani (2005, p. 18) de “saber escolar”, traduzido em
um planejamento dosado e sequenciado “de modo que a criança
passe gradativamente do seu não domínio ao seu domínio”. Isso não
é qualquer coisa, mas a garantia da apropriação, por todos os alunos,
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das máximas elaborações e criações culturais da humanidade.


(DANGIÓ; MARTINS, 2018, p. 61).

É nesse sentido que compreendemos que a alfabetização deve promover a


emancipação humana dos indivíduos, assim como a apropriação dos conhecimentos
artísticos, filosóficos e científicos produzidos pela humanidade, de modo que seja
possível a síntese das múltiplas determinações que contribuem para o constante
processo ético do indivíduo.
Mortatti (2019, p. 26) expõe que:
A tentativa de apagamento por meio de silenciamento/ocultação de
“marcos indesejáveis” em relação a políticas públicas incide também
no conhecimento científico sobre o assunto, expondo critérios
tendenciosos, e em nada científicos, para negar fatos do passado e
tentar reescrever a história, desconsiderando ser também científico o
conhecimento produzido no Brasil e no exterior com base em outras
evidências também científicas, de outras matrizes teórico-
epistemológicas diferentes das escolhidas como referência para a
PNA.

Percebemos, dessa maneira, que no documento são tratadas de forma


superficial as questões econômicas, sociais e culturais, atribuindo o fracasso escolar
à escola e a família. Nesse sentido, há uma tentativa de homogeneizar todas essas
questões fundantes para o processo educativo, pois nas palavras de (FRANCO;
MARTINS, 2021, p. 71) “[...] não há produção do conhecimento apartada de prática
social”.
Segundo contribuições de Mortatti (2021), a face mais visível do campo de
disputas encontra-se na querela dos métodos de alfabetização, que, nesse momento
histórico, apresenta um polêmico debate em torno do método fônico, abordagem
amplamente defendida e difundida pelo MEC por meio de programas e ações. Tal
perspectiva é disseminada pela esfera Federal à sociedade civil com o falacioso
discurso de que a PNA (2019) inaugura um novo momento na história brasileira, cuja
inserção do método fônico constitui-se como solução para erradicar todos os
problemas relacionados ao histórico fracasso da alfabetização.
Falaciosos pois incidem em retrocesso, uma vez que os debates e as
discussões referentes aos métodos pareciam estar resolvidos. De acordo com Mortatti
(2019), os problemas da alfabetização no Brasil são oriundos de diversos fatores
educacionais, sociais, econômicos e políticos, responsáveis pelas desigualdades
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sociais e pela não priorização de educação de qualidade, especialmente em


decorrência da falta de investimentos prioritários na escola pública e gratuita.

1.1 Formação de professores em interface à alfabetização: pontos de reflexão

Fundamentados na teoria Histórico-cultural realizamos a análise da formação


de professores em interface com a alfabetização como dois elementos interligados
que hoje apontam desafios à formação de professores inicial e continuada tendo em
vista um documento que não traz em sua essência a totalidade social, ao contrário
aponta a contradição inerente à sociedade de classes, isto é, os complexos fatores
sociais, históricos e políticos que a sustentam.
De acordo com Almeida (2022), embora a PNA intencione dar novos ares para
a política educacional no país, observa-se que em 2003, com a 1ª edição do “Relatório
Alfabetização Infantil: novos caminhos” (2003, 2007, 2019), as propostas que hoje
constituem a PNA já tentavam adentrar no Congresso Nacional desde esse período.
As proposições apresentadas no relatório buscavam a necessidade de revisar os
conceitos de alfabetização adotados no Brasil até então.
Em outras palavras, já se buscava encontrar brechas nas legislações vigentes
para adentrar com esse projeto. Diante do documento e de suas condições teóricas
e metodológicas a PNA materializa o retrocesso da educação, reduzindo o processo
de alfabetização ao método fônico como única metodologia eficaz para a
aprendizagem inicial da leitura e escrita. Desse modo, evidencia-se a concepção
fragmentada de leitura e escrita como um conjunto de competências autônomas e
apartadas de um significado cultural.
Além de apresentar o método fônico como única metodologia

evidentemente científica, a PNA impõe um modelo prescritivo ao


professor em sala de aula, limitando o seu fazer pedagógico e
restringindo a sua autonomia em sala de aula. Quanto a essa
afirmativa, compreendemos que, ao adentrar em sua sala de aula, o
docente organiza suas aulas conforme as necessidades de sua turma.
No entanto, na PNA, quando se propõe a reorganizar a formação
inicial e continuada com os programas de alfabetização e iniciativa no
âmbito do MEC, observamos a tentativa de alienação dos professores
expropriando-os do produto do seu trabalho. (ALMEIDA, 2022, p.135).
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Para Almeida (2022, p.136) a PNA acarreta implicações na formação inicial e


continuada de professores, frente ao:
esvaziamento da profissão docente e a secundarização dos
conhecimentos artísticos, filosóficos e científicos, corroborando
uma formação fragmentada e mecânica, que cerceia o
pensamento crítico e o desenvolvimento das máximas
capacidades já elaboradas pelos seres humanos”.

O que impõe ao professor seguir normas e regras estabelecidas em uma única


fonte: o método fônico, o que faz o apagamento de toda uma discussão anterior e da
própria formação do professor.
A mesma autora sinaliza que essas questões resultam no empobrecimento dos
conteúdos escolares e esvaziamento da profissão docente, decorrente das aceleradas
mudanças exigidas pelo neoliberalismo, das quais a formação inicial deverá se
incumbir para formar um profissional que atenda ao desenvolvimento das capacidades
necessárias para adequar-se às demandas do capital.
De acordo com Martins (2015, p. 11):
Grande parte dos estudos vistos neste trabalho que versam sobre o
professor parece adotar como um pressuposto de importância decisiva
que a sociedade contemporânea passaria por um processo de
profundas e aceleradas mudanças, o que exigiria do professor a
capacidade de acompanhá-las. Nesse sentido, as novas concepções
sobre a formação do professor parecem ter como objetivo central
desenvolver tal capacidade desse profissional.

Conforme abordado esse movimento contraditório de


aligeiramento/aceleramento da sociedade, inserido diretamente na profissão docente,
fica evidenciado nas políticas públicas educacionais, substituídas a cada nova gestão.
No campo do processo formativo, observamos a contínua reestruturação dos cursos
de Pedagogia, a exemplo da Portaria n. 17 de junho de 2021, que institui o programa
de fomento e indução da inovação da formação inicial e continuada e promove, dentre
outras obrigatoriedades, a adequação dos cursos de licenciatura, em especial a
Pedagogia à Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (2017) e BNC (2019),
alinhando toda a Educação Básica aos interesses do mercado.
Nessa direção, Mortatti (2021), em seus estudos apontou a complexa relação
entre a modernidade e a alfabetização, constituindo, desde o século XIX, importante
instrumento de escolarização das massas, a fim de atender a determinado projeto
dominante.
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Tanto naquela como em nossa época, a alfabetização é apresentada


como um dos instrumentos privilegiados de aquisição de saber e,
portanto, de esclarecimento das massas. Torna-se, assim, necessário
implementar o processo de escolarização das práticas culturais da
leitura e escrita, entendidas de um ponto de vista de um certo projeto
(neo) liberal, como fundamentos de uma nova ordem política,
econômica e social. (MORTATTI, 2021, p. 36).

Portanto, considerando as discussões aqui apresentadas, aponta-se apoiados


em Almeida (2022) algumas implicações apresentadas pela PNA (2019) em relação à
formação de professores:

• Uma educação pautada em interesses de mercado, com


empobrecimento dos conteúdos escolares destinados às crianças,
jovens e adultos da classe trabalhadora;
• Aprendizagem inicial da leitura e da escrita fragmentada, tendo em
vista que o método fônico possui limitações na sua execução;
• Retirada da autonomia do professor ao impor a utilização do método
fônico, destituindo outras possibilidades teóricas e metodológicas;
• Processo de alfabetização restrito ao mero “saber-fazer”, pautado em
um método prático e imediato, que cerceia o pensamento crítico do
professor
• O empobrecimento dos conteúdos, a secundarização do
conhecimento do professor e o esvaziamento da consciência crítica
nas escolas;
• A falácia de que a imposição do método fônico é nova, considerando
os estudos já realizados por um grupo de especialistas, tentando
assim “enterrar” a história de expoentes brasileiros estudiosos na área
de alfabetização. (ALMEIDA, 2022, p.132).

Diante dessas questões entendemos que ao implementar uma política de


alfabetização com essas pontuações sugere pensar a formação de professores
alfabetizadores, inicial e continuada, pois tais questões trazem implicações na forma
como o professor se posiciona diante de um processo tão importante para o
desenvolvimento infantil.

2. Metodologia

Para responder ao problema de pesquisa: o que as pesquisadoras apontam


sobre a PNA e a relação com a formação dos professores alfabetizadores?
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Resgatamos o dossiê “Política Nacional de Alfabetização em Foco: olhares de


Professores e pesquisadores3” publicado na Revista Brasileira de Alfabetização –
vinculada a Associação Brasileira de Alfabetização – ABALF4- no ano de 2019,
lançado pelas pesquisadoras: Isabel Cristina Alves da Silva Frade e Sara Mourão
Monteiro.
As autoras justificam o dossiê tendo em vista
os diferentes posicionamentos ajudam a construir uma avaliação
coletiva, elaborada por autores que também pesquisam a
alfabetização e são protagonistas da ação pedagógica de formar
alfabetizadores.” (FRADE, MONTEIRO, 2019, p.11).

Complementam que
Cientes dos problemas que a alfabetização enfrenta no Brasil,
sobretudo porque os resultados são associados à herança de
desigualdades sociais, também esperamos que a alfabetização seja
um direito de todos, ampliando o horizonte de expectativas dos
cidadãos e a participação de crianças, jovens e idosos na sociedade.
(FRADE, MONTEIRO, 2019, p.11).

Nessa perspectiva, o Sumário apresenta vinte três artigos, entre esses,


selecionamos três, sendo eles: “Diálogos com o Plano Nacional de Alfabetização
(2019): contrapalavras” de autoria de Claudia Maria Mendes Gontijo, Janaína Silva
Costa Antunes; “A concepção de alfabetização na Política Nacional de
Alfabetização/MEC/2019” de “Sara Mourão Monteiro”; Apontamentos sobre a Política
Nacional de Alfabetização 2019” de Telma Ferraz Leal, para discutir a alfabetização e
para responder a nossa indagação inicial.
O ponto de partida para a nossa análise foi uma leitura minuciosa dos três
artigos, com ênfase em nosso problema de pesquisa e na busca por responder ao
objetivo principal: Identificar por meio da análise realizada pelas pesquisadoras em
relação a Política Nacional de Alfabetização as implicações na formação de
professores alfabetizadores. E, como objetivos específicos: Selecionar três artigos do
dossiê Política Nacional de Alfabetização em foco: Olhares de Professores e
Pesquisadores; analisar o que as pesquisadoras apontam sobre a PNA e a relação
com a formação de professores alfabetizadores.

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https://alb.org.br/abalf-associacao-brasileira-de/
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Definimos como critério para escolha dos artigos as inquietações que a PNA
traz para formação de professores alfabetizadores, uma vez que todos os textos têm
como objetivo analisar a Política Nacional de Alfabetização e suas consequências no
processo de alfabetização das crianças e jovens brasileiras e, portanto, na atuação,
formação e práticas dos professores alfabetizadores.
A leitura minuciosa dos artigos foi realizada à luz da teoria histórico-cultural,
para a compreensão do sujeito professor, abordagem que nos permite compreender
o sujeito em seu meio e as condições a ele impostas pela sociedade. Frente a
abordagem em questão as análises visam compreender os fatos em vista as
contradições e tensões que circulam o objeto em análise.

3. Análises: O que dizem as pesquisadoras?

A leitura dos três textos selecionados tem o objetivo de compreender o que


Frade e Monteiro questionam e apontam ao desenvolver e elaborar o dossiê em
pauta.

Reforçando o compromisso em defesa da alfabetização como direito


de todo(a)s, e no intuito de continuar contribuindo com os debates
sobre alfabetização e formação de professora(e)s, vários
pesquisadores e professores brasileiros com competência científica a
experiência acumulada na pesquisa, formulação e execução de
políticas públicas de alfabetização se manifestaram por meio da
Associação Brasileira de Alfabetização (ABALF). Ao ler seus textos,
verifica-se que foram levantados problemas políticos, epistemológicos,
conceituais, pedagógicos e metodológicos. Qual a concepção de
evidências foi adotada na PNA? Qual o conceito de alfabetização
contido no documento? Por que o apagamento de conceitos, como o
de letramento? Por que não foram considerados mais de 40 anos de
pesquisas e projetos de formação de alfabetizadores sobre o tema, no
Brasil? Por que a adoção de um caminho metodológico e teórico,
quando há vários caminhos com os quais a pedagogia e a política
teriam que dialogar? Que outras evidências de pesquisa e
experiências válidas para tornar a discussão mais qualificada e
complexa não foram consideradas? Quem foram os especialistas
escolhidos para escrever os documentos? Quais as possíveis
repercussões da PNA para os sistemas e redes de ensino e para a
produção de materiais? Que expectativas são criadas para as famílias
com a ideia de literacia familiar? (FRADE; MONTEIRO, 2019, p.10-
11).
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No artigo de Telma Ferraz leal - “Apontamentos sobre a política nacional de


alfabetização” - o ponto de discussão é a indicação de um único método. Leal (2019)
afirma que ao indicar o método fônico como um método para professores que
trabalham com alunos que estão em fase de alfabetização o MEC está ferindo a
autonomia não só das secretarias de educação, mas também dos docentes.
De acordo com a autora esse método não é defendido em nenhum documento
curricular brasileiro e há pesquisas que mostram que o MEC aponta contradições ao
dizer que se baseia em evidências científicas para utilizar do método fônico, a autora
aponta alguns estudiosos como Emília Ferreiro e Ana Teberosky que falam sobre
consciência fonológica e alfabetização, e também alguns resultados de estudos
relacionados a esse tema em que é mostrado que tem muita evidência científica, ao
contrário do que diz o governo e o documento (PNA) que foi analisado pelos
pesquisadores.
Leal (2019, p. 82) ainda afirma que: “Embora a consciência fonológica faça
parte do processo de aprendizagem do Sistema notacional, ela não é suficiente”. A
autora nos lembra que é importante que os alunos entendam o funcionamento do
SEA5 para que não se tornem analfabetos funcionais, pois é importante que um aluno
saiba ler e escrever, mas também é de extrema importância que ele/a compreenda o
que leu e saiba produzir um texto.
Em relação à formação de professores a autora faz uma dura crítica a PNA
como um documento que faz essa indicação do método fônico, afirmando que a
formação continuada pode ser prejudicada e a autonomia dos professores retirada.
Isso pode prejudicar os cursos de formação de professores fazendo com que
considerem somente um determinado método/abordagem no decorrer das formações.
Durante a graduação os futuros professores aprendem sobre os diferentes métodos,
e que cada aluno possui sua especificidade.
No texto “A concepção de alfabetização na Política Nacional de
Alfabetização/MEC/2019" a autora Sara Mourão Monteiro aponta como discussão e
análise o conceito de alfabetização e literacia. Utilizando o que a PNA propôs como
“correto” - a autora ressalta e nos lembra que o conceito de alfabetização não é algo
novo e sem base na educação, e do destaque para a pesquisadora Magda Soares
que dedicou anos de estudo sobre alfabetização e letramento.

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SEA – Sistema de Escrita Alfabética.
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De acordo com a autora a PNA tenta ignorar todo avanço que houve a partir
do que foi publicado e compartilhado utilizando esses dois conceitos, e tenta afirmar
que o termo literacia é o mais correto e que esse termo é reconhecido
internacionalmente, mas se olharmos o significado deste termo podemos observar
que ele possui a mesma definição de alfabetização. Questões como estas interferem
na formação de futuros professores e de professores que já atuam, pois há um
retrocesso nas concepções já consolidadas.
Outro fator que é alvo da análise dessa autora são os Programas de
alfabetização familiar que segundo a sua análise, ao tratar de literacia familiar a PNA
se equivoca ao afirmar que esses programas vão evitar o fracasso escolar porque
foram feitos com base em evidência científica, ela afirma que são poucos os materiais
sobre o assunto fora do país e também aqui no Brasil, em escolas públicas e ressalta
um ponto negativo importante sobre essa inclusão das famílias na alfabetização de
seus filhos, onde o fracasso deles pode recair sobre os pais, e a ainda de acordo com
autora podendo criar uma falácia de desinteresse ou o êxito dos pais diante da
educação de seus filhos.
O terceiro texto:” Diálogos com o plano nacional de alfabetização (2019):
contrapalavras” das autoras Claudia Maria Mendes Gontijo, Janaína Silva Costa
Antunes, discutem as Empresas privadas/ privatização da educação e a relação com
a distorção idade/série. As autoras trazem um ponto bem importante que é a questão
da privatização da educação, como os políticos fazem para que as empresas privadas
recebam os seus milhões para “ajudar” na melhoria da educação e dos gráficos e
dados sobre esse problema que é o baixo alfabetismo.
As autoras ressaltam que essas empresas privadas não passam por nenhuma
avaliação para saber se realmente vão conseguir ajudar a suprir as necessidades da
educação naquele determinado momento. O estado tenta corrigir o problema da
correção do fluxo escolar contratando essas empresas privadas, mas não é o que
acontece, pois, as autoras mostram através de um gráfico que essas empresas estão
longe de conseguir resolver a distorção idade/série.
Além de evidenciar essa questão também mostram que as evidências
científicas/ progresso científico e metodológico revelam que os especialistas que
formularam o Plano Nacional de Alfabetização se equivocam muito quando o assunto
são as evidências científicas, não só as autoras deste artigo, mas as outras duas,
sendo a Sara Mourão Monteiro e a Telma Ferraz Leal que utilizamos para análise,
14

rebatem o que esses especialistas afirmam. Eles indicam métodos de alfabetização


que não tem muitas ou quase nada de evidências científicas, ignoram os conceitos
que são utilizados há anos sobre alfabetização e letramento, e autora ainda afirma
que eles tratam as crianças como objetos ao basear-se no modelo das ciências exatas
e naturais, limitando e impedindo a ação e autonomia das crianças.
Para Almeida e Piatti (2021, p.648)
a educação deve propiciar a busca pelo conhecimento crítico e
problematizador e, por isso, a ampla divulgação das pesquisas
científicas possibilita aos professores a problematização da condição
atual, o desenvolvimento de uma consciência crítica, considerando
que se criem instrumentos para superação e, consequente, uma
possível transformação da realidade imposta.

Todas essas questões levantadas aqui, não possibilitam uma transformação da


realidade imposta, pois diante das leituras dos textos selecionados foi possível
perceber que para as pesquisadoras a PNA aponta para um retrocesso na formação
dos professores, pois as implicações dessas imposições na PNA, tornam as práticas
desenvolvidas por professores alfabetizadores mais desafiadoras e favorecem a
ausência de autonomia nas decisões referentes a como conduzir os processos de
alfabetização em sala de aula, e a adoção de uma falsa concepção de que o método
fônico é a solução para as mazelas da não alfabetização da criança no tempo
adequado.

5. Considerações finais

Neste trabalho buscamos responder a indagação inicial: o que as


pesquisadoras apontam sobre a PNA e a relação com a formação dos professores
alfabetizadores? Nosso objetivo foi analisar criticamente os artigos que compuseram
o dossiê em pauta para ter conhecimento do que os professores e pesquisadores
apontaram sobre a PNA implementada no Brasil em 2019.
Analisando os três artigos que selecionamos, pudemos compreender que para
as pesquisadoras há um retrocesso ao que se pesquisou e constatou sobre a
alfabetização no Brasil em décadas. O que os pesquisadores julgam com
“improcedente” pois o documento incide em retroceder na formação inicial e
continuada dos professores alfabetizadores.
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O MEC ao afirmar no documento que o método fônico tem


consistência/evidência científica que comprove seus excelentes resultados ignora os
pesquisadores brasileiros, os resultados das pesquisas já realizadas por autores
brasileiros que há décadas vem se debruçando sobre as questões que permeiam a
alfabetização.
Mesmo com a afirmativa advinda do documento intencionando dar novos ares
à política educacional no país, as propostas que constituem a PNA são conforme
apontam as autoras de cunho conservador e retira, exclui e desconsidera a história da
alfabetização no Brasil.
Importante compreender que a aprendizagem acontece na interação com os
demais indivíduos pertencentes a uma dada cultura e, desse modo, a alfabetização
ocorre na mediação entre professor/aluno, que consiste num processo dialético
permeado de relações sociais.
Tais relações acontecem no interior da escola, no processo de alfabetizar, em
que professor e aluno, imbuídos, nesse processo, o de ensinar o conhecimento
sistematizado (professor) e o outro de aprender (aluno) que se consolida em um
movimento entre professor/aluno de forma intencional, planejada que se reverbera em
prática social.
Dessa forma os artigos analisados apontam a posição política, epistemológica
e social que contribui para pensar com seriedade e compromisso a formação de
professores alfabetizadores.

6. Referências

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