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AVALIAÇÃO NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO: CONCEPÇÕES

E PRÁTICAS DE PROFESSORAS DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO


DE NOSSA SENHORA DO SOCORRO/SERGIPE

Melissa Araújo de Souza1


Tereza Cristina Cerqueira da Graça2

GT 1 – Educação de Crianças, Jovens e Adultos

RESUMO
Este artigo trata das atividades de avaliação no processo de alfabetização dos primeiros anos do
Ensino Fundamental de escolas da rede municipal de Nossa Senhora do Socorro – SE. A partir da
literatura sobre o tema e das orientações do Pacto Nacional de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC),
analisa a adequação dessas atividades às concepções e práticas defendidas pelas correntes pedagógicas
do Construtivismo e da Ciência Cognitiva da Leitura. Conclui que as práticas avaliativas oscilam entre
as duas correntes, com prevalência do construtivismo por conta das orientações preconizadas no
PNAIC.

Palavras-chave: Alfabetização. Avaliação. Ciência Cognitiva da Leitura. Construtivismo. PNAIC.

ABSTRACT
This article describes evaluation activities in the literacy process with children from schools in the
municipal network of Nossa Senhora do Socorro - SE. From the literature on the subject and the
guidelines of the National Pact of Literacy in the Right Age (PNAIC), it analyzes the adequacy of
these activities to the conceptions and practices defended by the pedagogical currents of
Constructivism and the Cognitive Science of Reading. It concludes that the evaluation practices
oscillate between the two currents, with prevalence of constructivism due to the guidelines
recommended in the PNAIC.

Keywords: Literacy. Evaluation. Cognitive Science of Reading. Constructivismo. PNAIC.

1
Concludente do Curso de Pedagogia da UNIT. Professora-estagiária da Rede Municipal de Ensino de Nossa
Senhora do Socorro/Sergipe. E-mail: melissinha_araujo@hotmail.com
2
Doutora em Educação pela PUCRS-DINTER. Professora do Curso de Pedagogia da UNIT. E-mail:
tccgraca@ahoo.com.br
1
INTRODUÇÃO

Este trabalho analisa materiais avaliativos produzidos e aplicados por professoras


alfabetizadoras dos primeiros anos do Ensino Fundamental da Rede Municipal de Nossa
Senhora do Socorro – Sergipe. Em suas análises, leva em conta reflexões de alguns autores
sobre a avaliação no processo de alfabetização, assim como as orientações do Pacto Nacional
pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC).
O interesse por essa temática surgiu porque percebemos que muitas crianças não
logram bons resultados nos testes padronizados propostos pelo Ministério da Educação
(Provinha e Prova Brasil). Muitas vezes, a criança tem dificuldade em entender o que se pede
nas questões pela falta de exercícios semelhantes no cotidiano da sala de aula ou porque não
conseguiu apreender os processos de decodificação relativos à leitura e de codificação
relativos à escrita. Como resultado dessas dificuldades, muitos alunos chegam ao 4º ou 5º
anos do Ensino Fundamental sem saber ler ou escrever.
Diante do fracasso da alfabetização em nosso país, os sucessivos governos têm
empreendido programas de capacitação para os professores, na perspectiva de suprir as
deficiências da formação inicial e das práticas inadequadas e descontextualizadas da realidade
dos estudantes; principalmente das crianças de famílias pobres, com baixo nível educacional e
pouco envolvimento com a educação escolar dos filhos. Nessa direção, o ambiente escolar
reflete a formação que estes educadores tiveram: carentes de uma boa fundamentação teórica
e didática para trabalhar nessa fase tão importante na formação escolar da criança.
O texto está dividido em cinco itens. No primeiro, apresentamos algumas
reflexões sobre o problema da avaliação no processo de alfabetização, com destaque para as
contribuições de Cagliari (1998), Esteban (2004), Ferrero (2000), Freire (1983), Luckesi
(1999), Oliveira (2005), Soares (2004), Teberosky (2016). No segundo item enfocamos as
orientações do PNAIC quanto à alfabetização e os processos avaliativos; no terceiro,
destacamos as atividades e avaliações que recolhemos junto às professoras do 1º ao 3º ano.
No último item, buscamos analisar as atividades e avaliações aplicadas face as teorias e às
orientações do PNAIC. Nas conclusões tecemos alguns comentários gerais sobre o tema
abordado.

AVALIAÇÃO NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO: O QUE DIZEM OS


AUTORES

2
Neste item, apresentaremos suscintamente algumas considerações sobre
alfabetização e avaliação de duas das principais tendências pedagógicas presentes na escola
brasileira hoje. Trata-se da vertente construtivista e da corrente da ciência cognitiva da leitura.
Para a corrente construtivista, a escrita e leitura é algo muito importante e só faz
sentido num contexto de uso real. As crianças vivenciam situações de interação com a cultura
letrada, de modo que ela própria inicia seu aprendizado, independentemente da escola e do
professor. Nesse sentido,

Se pensarmos que a criança aprende só quando é submetida a um ensino


sistemático, e que a sua ignorância está garantida até que receba tal tipo de
ensino, nada poderemos enxergar. Mas, se pensarmos que as crianças são
seres que ignoram que devem pedir permissão para começar a aprender,
talvez comecemos a aceitar que podem saber, embora não tenha sido dada a
elas a autorização institucional para tanto. (FERRERO, 2000, p. 34).

A partir do momento que a criança começa a interagir no meio social se inicia a


construção da sua bagagem de aprendizado. Sendo assim, “alfabetizar letrando significa
orientar a criança para que aprenda a ler e a escrever levando-a a conviver com práticas reais
de leitura’’ (SOARES, 2004). Entretanto, a aprendizagem só acontece quando as atividades de
alfabetização são bem planejadas pelo professor e ele é capaz de avaliar seu próprio trabalho.
Nessa perspectiva,

[o] professor deve se basear no momento inicial de aprendizagem de cada


aluno, verificando o que ele conquistou em determinado período. Além do
mais, a avaliação passa pela análise do próprio trabalho: o professor tem
condições materiais e estruturais para ensinar? Ele criou um ambiente
alfabetizador favorável à aprendizagem e necessidades de usar a língua
escrita? (TEBEROSKY, 2016, p. 76).

O professor precisa ter estratégias eficientes para a alfabetizar de verdade os seus


alunos, tornando eles indivíduos críticos na sociedade atual. De acordo com Freire,
alfabetizar:
É construir um conhecimento. Alfabetizar-se é adquirir uma língua escrita
através de um processo de construção do conhecimento com uma visão da
realidade. A criança é o sujeito do processo educativo, não havendo
dicotomia entre o aspecto cognitivo e afetivo, mas uma relação dinâmica,
prazerosa, dirigida para o ato de conhecer o mundo. (FREIRE, 1983, p. 49).

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O professor deve ter suporte necessário para notar o que ficou vago no aluno
sobre determinado tipo de conteúdo trabalhado na sala de aula. A avaliação de aprendizagem
no ambiente alfabetizador de crianças de escola pública pode ser um meio constante de
fornecer suporte ao educando. Assim, torna-se

[...] importante continuar discutindo a avaliação como parte de um processo


mais amplo de discussão do fracasso escolar, dos mecanismos que o
constituem e possibilidades de reversão desse quadro com a construção do
sucesso escolar de todas as crianças, especialmente das crianças das classes
populares, as que efetivamente vivem cotidianamente o fracasso.
(ESTEBAN, 2004, p. 7).

A alfabetização e avaliação tem uma relação estreita com o sucesso/fracasso


escolar, e isso causa muita preocupação, especialmente quando estamos lidando com o futuro
de milhares de crianças das camadas populares. Sobre isso, alerta Oliveira:

O caráter seletivo do sistema escolar é um fenômeno já constatado por vários


modelos teóricos e pesquisas empíricas, pelo menos, nas duas últimas
décadas, tornando-se objeto de estudo de pesquisadores de várias áreas do
conhecimento. Dentre os fatores que contribuem para a permanência desse
caráter seletivo, tem merecido destaque as dificuldades apresentadas na
aprendizagem da língua materna, pelos alunos da escola pública, com
origem concentrada nas camadas da população, que, em grandes maioria,
estão excluídos do acesso aos bens matérias e culturais, produzidos na
sociedade contemporânea (OLIVEIRA, 1997, p.79).

Conforme Cagliari (1998), nenhum método de ensino garante, por si só, o sucesso
da aprendizagem de todos os alunos. Em suas palavras: “Nenhum método educacional garante
bons resultados sempre e em qualquer lugar; isso só se obtém com a competência e o estudo
ao qual o educador se dedica’’. Esse autor reconhece a má formação dos professores,
especialmente na área da alfabetização, onde todo o restante do processo escolar estará
seriamente comprometido, caso não se consiga alfabetizar as crianças no tempo correto
(CAGLIARI, 2009, p. 36).
A avaliação é inclusiva quando, a partir dela, o professor constata o que não foi
apreendido e busca, junto com o aluno, alternativas para suprir suas dificuldades. Assim, a
atividade de avaliar, no âmbito escolar, caracteriza-se como um meio de ajudar o aluno na
construção de um resultado positivo. Sobre esse tipo de avaliação que não comporta
julgamento, mas acolhimento e colaboração, Luckesi (1999, p. 172) afirma que

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Avaliação, por si, é um ato acolhedor, integrativo, inclusivo. Para
compreender isso, importa distinguir avaliação de julgamento. O julgamento
é um ato que distingue o certo do errado, incluindo o primeiro e excluindo o
segundo. A avaliação tem por base acolher uma situação, para, então (e só
então) ajudar a sua qualidade, tendo em vista dar-lhe suporte de mudança, se
necessário. Podemos entender avaliação escolar como uma ato amoroso, na
medida em que a avaliação tem por objetivo diagnosticar e incluir o
educando, pelos mais variados meios, no curso da aprendizagem satisfatório,
que integre todas as suas experiências de vida.

A corrente denominada de Ciência Cognitiva da Leitura, tem como principal


defensor no Brasil e professor João Batista e Oliveira. Segundo esse autor, a elaboração de
avaliações adequadas depende da definição que se tem de alfabetização. Alegando que as
definições de alfabetização no país diferem das presentes nos periódicos de maior circulação
internacional, e tomando por base os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), Oliveira
(2005) afirma que esse documento confunde leitura com compreensão e escrita com produção
de textos.
Trata-se de um problema elementar de lógica: um aluno que sabe ler pode
não responder a uma pergunta de compreensão porque não sabe ler, e não
porque não a compreenda. Da mesma forma, um aluno pode não produzir
um texto simplesmente porque não consegue escrever as palavras de forma
legível ou ortográfica, e não porque não possua as competências intelectuais
para produzir um texto. (OLIVEIRA, 2005, p. 376)

O autor argumenta que mesmo considerado alfabetizado por dominar as


competências básicas acima citadas, o aluno ainda precisa desenvolver a fluência de leitura e
escrita, embora, numa segunda fase, ele já possa usar a leitura e a escrita para aprender, ao
invés de aprender a ler e escrever. A compreensão e a capacidade de produção de texto,
segundo Oliveira (2005), são competências que nem começam nem terminam na escola, pois,
ao longo da vida aumentamos nossa capacidade de compreender e de escrever em razão do
nosso desenvolvimento mental e dos conhecimentos que construímos. Mesmo antes de ler e
escrever, as crianças são capazes de compreender textos complexos e produzir textos
oralmente. Pessoas adultas analfabetas também, existindo indivíduos que exprimem seu
pensamento de forma eloquente e têm muita facilidade de compreender e relacionar
informações. No que se refere à avaliação, o autor assevera que

O aluno pode ser capaz de pensar e ditar um texto razoavelmente estruturado


e elaborado. Mas, se não souber escrever com legibilidade e fluência, não
pode “produzir um texto” – muito menos dentro de um tempo

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funcionalmente adequado. Portanto, se o avaliador não se assegurar, de
forma independente, que o aluno possui competências de produção de texto
– embora saiba escrever no sentido próprio da palavra – ou porque não
possui as competências básicas da escrita. Nesse caso, o teste foi inútil, pois
não avaliou nem uma coisa nem outra. (OLIVEIRA, 2005, p. 380).

2 AVALIAÇÃO NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO: ORIENTAÇÕES DO


PNAIC

O Caderno do PNAIC, Avaliação no Ciclo de Alfabetização: reflexões e sugestões,


preconiza uma concepção progressista de ensino e avaliação que compreende processos,
desenvolvimentos, percursos de formação que se efetivam do início ao fim da escolarização. Assim

Uma ação didática consistente pressupõe necessariamente uma atividade


diagnóstica para que o professor possa conhecer melhor os estudantes e reorganizar
seu planejamento em função de suas necessidades. Essa atividade diagnóstica
permite ao professor compreender o momento da aprendizagem do aluno, no início
do processo avaliativo, que deve ser orientada pelos objetivos de aprendizagem
previamente definidos, em função dos conhecimentos e habilidades que precisam
ser construídos. Mas é necessário, também, que a avaliação seja contínua, isto é,
não ocorra apenas no início do processo, mas durante todo o período letivo, a fim
de que haja planejamento em ação, ou seja, definição de estratégias ao longo do
processo. (MEC/PNAIC. 2012, p. 8)

O documento indica que para esse diagnóstico a Provinha Brasil, que deve ser
aplicada em turmas do 2º ano do Ensino Fundamental, é um instrumento avaliativo que
pretende diagnosticar o nível de conhecimento da leitura e da apropriação do sistema de
escrita. Entretanto, outros instrumentos podem ser elaborados e aplicados pelos professores
(MEC/PNAIC, 2012, p. 8). Reconhece que os professores têm encontros de formação,
recebendo materiais didáticos para facilitar as aulas, mas que, ainda assim, as crianças estão
sendo avaliadas de forma incorreta pelos seus professores.

A escola também precisa ser avaliada, pois a organização interna da unidade


educacional e o monitoramento das ações, pautados a partir do projeto
político pedagógico construído coletivamente, têm impacto sobre a
aprendizagem das crianças. Por meio do Projeto Político Pedagógico,
podem-se definir coletivamente as prioridades de ensino, as estratégias
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didáticas e os projetos a serem elaborados coletivamente. (MEC/PNAIC,
2012, p. 11)

O professor deve investigar e perceber o aluno e seu desenvolvimento não apenas


nas suas dificuldades em dominar ou não as atividades propostas, mas também suas reações,
seus anseios e suas inseguranças.

As avaliações em larga escala e as avaliações padronizadas não possibilitam


esse olhar para as singularidades de cada estudante. Em virtude disso, o
professor pode planejar situações de avaliação mais investigativas que
possam, não apenas identificar o que o aluno aprendeu ou não aprendeu, mas
também buscar as razões para a aprendizagem ou não aprendizagem.
(MEC/PNAIC. 2012,p.12)

Toda criança tem direito à aprendizagem no processo de alfabetização, e a


avaliação é de suma importância nesse processo.

Delimitando o que as crianças precisam aprender, torna-se mais clara a ação


avaliativa. Ainda assim, é preciso se pensar em quais são as estratégias de
avaliação a serem adotadas e quais tipos de instrumentos favorecem mais a
identificação do que os estudantes aprenderam em relação a determinado
conteúdo. Sobre tais temas trataremos a seguir. (MEC/PNAIC. 2012,p.13)

Conforme o documento do PNAIC (p. 17), as capacidades de leitura propostas


para os três primeiros anos do Ensino Fundamental incluem: reconhecimento da finalidade do
texto, localização de informações, identificação de tema e sentido do texto e elaboração de
inferência. Para o 3º ano são propostas:

Estabelecer relação entre partes do texto, por meio e pistas que retomam
coesivamente o que já foi escrito (pronomes pessoas, sinônimos e
equivalente); compreender o sentido de expressões/palavra do texto e
estabelecer relação e intertextualidade. (MEC/PNAIC, 2012, p. 17).

Passaremos a descrever algumas questões propostas no documento do PNAIC de


forma resumida, objetivando dar ao leitor uma ideia do que se pretende desenvolver e avaliar
as crianças em processo de alfabetização.
A primeira questão constante no documento expõe um cartaz de vacinação, onde o
aluno irá identificar a utilidade desse texto marcando uma das alternativas (avisar as pessoas;

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ensinar um jogo; ensinar uma comida; divertir as pessoas), pede também que ele marque a
alternativa que diz o tema do texto (Dia da Vacinação). Outra questão apresenta, em letras
maiúsculas, um pequeno texto de duas linhas sobre o Bicho-Preguiça. Depois, faz duas
perguntas; numa delas o aluno escreverá a palavra ‘árvore’. (MEC/PNAIC, 2012, p. 19 e 20).
Para o 2º ano, no que ser refere a avaliação de leitura de textos, o documento
coloca um texto de 10 linhas, escrito em letras maiúsculas, solicitando ao aluno que responda
quatro questões, com perguntas diretas. As questões 5 e 6 são relativas a um cartaz sobre o
comportamento correto com o descarte do lixo que seguem a mesma lógica interpretativa do
texto sobre o Dia da Vacinação. (MEC/PNAIC, 2012, p. 21-22).
Para o 3º ano, é proposto um texto maior e mais complexo, escrito na língua
padrão, com o uso de letras maiúsculas e minúsculas, cuja extensão toma quase uma página
inteira (O Pato Poliglota, de Ronaldo Simões Coelho). Desse texto surgem 5 perguntas, sendo
3 de escrita corrente e 2 objetivas; a última questão permite a livre manifestação do aluno: “Se
você fosse dono(a) do cachorro e do gato, também teria matriculado na Escola do Pato
Poliglota? Por que?” (MEC/PNAIC, 2012, p. 26-27). As páginas seguintes trazem exercícios
interpretativos com textos menores e questões sobre suas utilidades e identificação dos temas.
Sobre atividades de avaliação de produção de textos, o documento apresenta três
exemplos de como o professor pode propor aos alunos que escrevam um texto. No primeiro
ano, se propõe a criança um relato sobre um dia em que esteve doente; no segundo e terceiro
anos, propõe um relato sobre uma coisa engraçada que aconteceu. (MEC/PNAIC, 2012, p.
32).
Para o desenvolvimento e avaliação da oralidade, o documento sugere ao
professor utilizar a contação de história, entrevistas, debates e seminário escolar. Argumenta
que é necessário um roteiro de observação, com registro da turma, para facilitar o
planejamento de situações didáticas que abordem o eixo oral. (MEC/PNAIC, 2012, p. 35 e
36).
Referente avaliação dos conhecimentos sobre o Sistema de Escrita Alfabética
(SEA), o trabalho no eixo da apropriação da escrita alfabética deve ser realizado no ciclo de
alfabetização de forma progressiva. Espera-se que, a cada ano, seja dada ênfase em
conhecimentos diferentes, para que, ao longo dos anos, os alunos venham a se apropriar de
todos os direitos de aprendizagens progressivamente. (MEC/PNAIC, 2012, p. 44).
Para isso, é necessário que saibamos, além do perfil de cada criança, o que fazer
com cada aluno, para que progrida na sua aprendizagem sobre a escrita alfabética, devendo
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esse perfil vir a nortear os conteúdos e atividades que precisam ser priorizados na prática de
alfabetização. As atividades avaliativas precisam buscar, detectar, dentre outros aspectos: se a
criança já conhece as letras; se as identifica e as usa no registro das palavras; se ao escrever
palavras, já faz alguma correspondência entre letras e sons; enfim, precisamos perceber o que
já sabem sobre o Sistema de Escrita Alfabética. (MEC/PNAIC, 2012, p. 45).
Para avaliar tais conhecimentos, o documento nos explica que podemos em nossa
prática cotidiana de alfabetização, usar diferentes atividades, tais como: bingo de letras e
palavras, formação de palavras com alfabeto móvel, escrita espontânea de palavras,
identificação de palavras que rimam ou que começam com o mesmo som, completar palavras
com letras ou sílabas, cruzadinhas etc. A realização de atividades que envolvem a escrita
espontânea de palavras é fundamental, pois por meio dela podemos perceber, por exemplo, se
as crianças usam letras, se há variação no repertório de letras, se há correspondência entre as
letras e a pauta sonora das palavras, se há marcação de sílabas completas e de diferentes
estruturas etc. (MEC/PNAIC, 2012, p.46).
Para avaliar a avaliação, o caderno mostra que o domínio ortográfico do aluno
pode acontecer de várias formas como, por exemplo, na escrita espontânea. A avaliação da
ortografia em atividades de produção de textos precisa ser feita com cautela, de modo não
comparativo. (MEC/PNAIC, 2012, p. 47). O documento mostra outra forma de avaliar
ortografia que é por meio de ditados de textos. Nesse caso, é possível controlar as convenções
ortográficas a serem demonstradas pelas crianças, mas é preciso ter cuidado para não criar
textos artificiais, que impliquem em impor às crianças uma concepção distanciada do que é
um texto e do que é um processo de interação por meio dele (MEC/PNAIC, 2012, p. 47).
Recomenda o ditado de palavras como forma de diagnosticar os conhecimentos
das crianças sobre ortografia, argumentando que essa estratégia permite mapear de forma
precisa as correspondências fonográficas, foco do interesse do professor. A avaliação do
sistema de escrita e da ortografia possibilita rever planos e traçar metas, de acordo com a
realidade da turma. (MEC/PNAIC, 2012, p. 48).

3 ATIVIDADES E AVALIAÇÕES DAS PROFESSORAS ALFABETIZADORAS

Antes de descrevermos o conteúdo das avaliações e atividades elaboradas e


aplicadas pelas professoras alfabetizadoras, cabe-nos apresentar o município de Nossa

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Senhora do Socorro. O município tem um território de 156,8 km² e contava, em 2010, com
160.829 habitantes e tem como limites os municípios de Laranjeiras, São Cristóvão e a
capital Aracaju, sendo considerado zona metropolitana da Grande Aracaju. O sistema
municipal de educação conta com quarenta escolas que atendem desde o Jardim de infância
até o 9º ano do Ensino Fundamental foi de 13.220 alunos, sendo 7.317 dos primeiros anos do
Fundamental. (MEC/INEP. Matrículas. Consulta).
Na pesquisa de campo, recolhemos junto a professoras de três escolas da rede
municipal atividades e provas nos anos iniciais da alfabetização de 1º ao 3º ano, com intuito
de compatibilizar esses instrumentos com as recomendações dos autores citados neste
trabalho e com as orientações do Pacto Nacional de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC).
Sem identificar as escolas ou as professoras que nos cederam esses materiais,
passaremos a discorrer sobre o conteúdo desses instrumentos avaliativos, expondo-os por
ano/série.

3.1 Atividades do 1º Ano do Ensino Fundamental

Numa atividade do 1º ano, a professora solicita aos alunos que complete a


primeira letra de palavras iniciadas por vogais, colocando a figura correspondente. Ex: ...
BACAXI. São apresentadas aos alunos nove palavras, todas começadas por vogais. Uma
prova aplicada junto as crianças desse ano, pede para juntar sílabas formando palavras;
escrever a família silábica do P; copiar as letras do alfabeto; circular as silabas que tenham a
letra P. Esta prova também traz silabas mais complexas, como: dra; pin; len; por. Nesse caso,
a criança é desafiada somente a juntá-las, retirando-as das nuvenzinhas desenhadas.
Uma atividade de ortografia propõe ao aluno completar palavras com as letras V e
F e, depois, separar em sílabas palavras apresentadas num quadro desenhado. Não
encontramos nas atividades ou provas desse ano nenhum texto ou mesmo frase com sentido,
de onde palavras seriam retiradas para as atividades propostas aos alunos.

3.2 Atividades do 2º Ano do Ensino Fundamental

Uma prova aplicada junto ao 2º ano trabalha Gramática, com conceitos de


sinônimos e antônimos e substantivos. Os antônimos trazem desenhos e quadradinhos para
colocar a palavra (prato cheio/prato vazio). Quanto aos sinônimos apresenta apenas uma
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frase, com a palavra esbugalhou. No gênero do substantivo (homem/mulher). Onde solicita
diminutivos e aumentativos coloca quadro conforme o exemplo: amigo – amiguinho/amigão
e, quanto aos plurais coloca também desenhos: casa/casas. Esta prova não tem nenhum texto,
trabalhando somente questões gramaticais, com desenhos ilustrativos.
Uma atividade aplicada junto a essa série apresenta um pequeno texto O
casamento na Mata, pedindo aos alunos para colorir no texto os masculinos de vermelho e
os femininos de azul, e, depois, separem em dois grupos as palavras masculinas e as
femininas retiradas do texto. Observamos que esta atividade avalia a leitura e a escrita, além
da diferenciação das palavras masculina e feminina – parte gramatical.
Outra atividade relativa a esta série, avalia a aprendizagem dos alunos quanto aos
substantivos próprios e comuns, solicitando aos alunos que formem palavras e identifiquem se
essas se caracterizam como substantivos próprios ou comuns. Essa atividade não apresenta
anunciado, dificultando o entendimento do aluno; além disso, trazem algumas imagens soltas
que podem confundir os alunos.
Uma prova desta série centra no aprendizado da gramática, pedindo que os alunos
acentuem corretamente as palavras usando o acento agudo ou circunflexo. Outra questão pede
a classificação das palavras (monossílaba, dissílaba ou polissílaba), uma terceira propõe a
separação de sílabas e outra para classificar palavras quanto aos substantivos (próprios ou
comuns). Trabalhando a escrita, pede que os alunos escrevam os nomes das figuras ilustradas
na prova.
Uma atividade desta série, apresenta a letra da música Soldadinho de Papel,
solicitando as crianças que pintem os pares de rimas em cada estrofe, usando cores diferentes
e ainda que circulem palavras que têm el e ol. Ainda propõe que escolham uma palavra da
atividade anterior e elaborem uma frase, completem a letra da música com as palavras que
faltam e recorte-as, colocando no lugar correto. A atividade tem três questões, trabalhando as
famílias silábicas el e il, com as estrofes da música e ilustrações. Outra atividade desta serie
pede que os alunos escrevam os nomes das figuras apresentadas em desenhos, a exemplo de
tatu, apito, pipa....
Um denominado Texto Divertido pede que as crianças observem a legenda e
escreva uma historia, substituindo os símbolos por palavras e, depois que deem um título.
Trata-se de uma atividade de produção de texto, onde os alunos vão criar uma historia a partir
das figuras (chamadas de símbolos). Ainda dentro da produção de texto, um exercício traz
desenhos de duas crianças cozinhando, talvez, fazendo um bolo, com linhas para a criança
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escrever um texto sobre as figuras. Entretanto, seu enunciado diz Faça uma produção, ao
invés de pedir simplesmente crie uma história ou descreva o que as crianças estão
fazendo.

3.3 Atividades do 3º Ano do Ensino Fundamental

Com um texto de título O Pato de Edu, a atividades traz cinco questão de


interpretação com perguntas que os alunos vão retirar do texto, a exemplo de: Qual é o nome
da história? Do que se trata a história? Por último apresenta uma questão onde o aluno irá
escrever a história que ele leu no caderno. Observamos que essa atividade foi copiada de um
livro didático.
Para avaliar Ciências, a atividade pede que os alunos escrevam as parte do corpo
indicado por numerais. Atrás de um desenho do corpo humano os alunos irão colocar o nome
das partes do corpo ao lado, indicado por números de 1 a 10. A atividade não contém
cabeçalho, somente a primeira pergunta.
Uma prova aplicada junto a essa série avalia noções de ordem crescente e
decrescente, onde se pede que o aluno pinte com lápis azul os números pares e com a cor
verde os números impares. Esta prova também avalia: antecessor e sucessor; noções de
centena, dezena e unidade e traz pequenas contas de adição e multiplicação. Essa avaliação
não traz imagens ou texto.
Com o texto Classificados Poéticos, se propõe quatro questões de interpretação e
avalia gramática, trabalhando sinônimos, diminutivo e aumentativo, ortografia com o uso das
letras M e N, acento agudo e circunflexo, ordenação de sílabas e singular e plural. Esta prova
contém 13 (treze) questões.
A avaliação de Matemática traz quatro questões com probleminhas envolvendo
subtração, onde os alunos vão subtrair de 10 em 10 (dezenas) de acordo com o número
apresentado no primeiro quadrinho; depois de 5 em 5 e de 2 em 2. Essa atividade também é
xerocada de livro e não tem anunciado.

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4 AS ATIVIDADES AVALIATIVAS FRENTE À LITERATURA E AO PNAIC

Como vimos, o material coletado traz questões de leitura, escrita e interpretação,


algumas com pequenos textos. Observamos que o número de questões interpretativas é
pequeno e elas são pouco desafiadoras no que se refere à capacidade dos alunos de relacionar,
inferir conclusões ou ideias não presentes de maneira óbvia nos textos. Está claro que as
atividades da Língua Portuguesa privilegiam a gramática com ortografia, separação silábica,
substantivos (gênero, número, etc.) O material de Matemática contêm os numerais, as três
operações (soma, subtração e multiplicação), ordem crescente e descrente, entre outros
conteúdos.
Grande parte das atividades que analisamos mostra que as alfabetizadoras utilizam
atividades prontas, retiradas de livros didáticos, do material do PNAIC ou buscadas na
internet; algumas copiadas na íntegra. Como o trabalho com essas séries iniciais requer o uso
constante de ilustrações, desconfiamos que a inabilidade para o desenho leva as professores a
se valerem dessas produções.
Em conversas com outros educadores, inclusive com professores dos últimos anos
de Ensino Fundamental e até do Ensino Médio, constatamos que essa prática de recorrência à
internet para ‘copiar’ exercícios e provas não é exclusividade das professoras abrangidas por
esta pesquisa. Porém, pesquisando os recursos que a internet disponibiliza, constatamos ser
perfeitamente possível recolher e copiar ilustrações sem ter que, necessariamente, copiar as
atividades/questões propostas nessa fonte.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As atividades analisadas revelam que as professoras alfabetizadores enfocadas


nesta pesquisa não praticam uma ou outra metodologia preconizada pelas correntes
pedagógicas. Ora, executam atividades mais aproximadas ao construtivismo, ora, recorrem a
práticas tradicionais, com exercícios de memorização de letras e fonemas (decodificação e
codificação), defendidos pela Ciência Cognitiva da Leitura. No material coletado é notório o
diminuto número de atividades de interpretação textual, já que a maioria das questões de
Língua Portuguesa foca na gramática, revelando a dificuldade das professoras em trabalhar a
gramática e a ortografia a partir de textos.

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No processo inicial da alfabetização (1º ano), as atividades analisadas apontam
para a prevalência da codificação e decodificação muito presente na corrente da Ciência
Cognitiva da Leitura. Não porque os professores optem conscientemente por essa concepção,
mas, porque ela se aproxima do modo tradicional de alfabetização (método analítico-sintético)
que, mesmo partindo de palavras ou pequenas frases, tem no reconhecimento dos grafemas e
fonemas seu mais importante aspecto. Afinal, foi assim que as professoras foram
alfabetizados e essa memória persiste viva na prática docente.
O professor que defende sua autonomia e liberdade de ensino deveria empregar
um maior esforço na elaboração de seus instrumentos avaliativos, evitando a reprodução de
atividades pensadas e propostas por outros colegas, por estudiosos do tema ou por manuais
oficiais. Entretanto, não se trata aqui de culpabilizar apenas o professor, uma vez que isso
também ocorre pela ausência de uma maior e melhor formação do alfabetizador nos cursos de
Pedagogia, assim como pela insuficiência de formações continuadas que deem suporte teórico
e prático ao docente, especialmente aqueles que atuam junto a crianças mais carentes.
Portanto, ainda há um longo caminho a perseguir para que os professores
alfabetizadores dominem teórica e metodologicamente a difícil tarefa de alfabetizar seus
alunos, preparando-os para prosseguirem estudos com competência acadêmica e senso crítico
da realidade em que vivem.

REFERÊNCIAS

BRASIL. MEC/SEB/PNAIC. Avaliação no ciclo de alfabetização: reflexões e sugestões.


Brasília: 2012.

CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetizando sem o Ba, be, bi, bo, bu. São Paulo: SCIPIONE,
1998.

ESTEBAN, Maria Teresa. Ser professora avaliar e ser avaliada. Escola, currículo e
avaliação. São Paulo: Cortez, 2003.

FERREIRO, Emília. Com todas as letras. 7 ed. São Paulo: Cortez, 1999.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 13. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e preposições. 9.


edição. São Paulo, editora CORTEZ, 1999.

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educação. Rio de Janeiro, v. 13, n. 48, jul/set, 2005. p. 375-382.

SOARES, Magda. Alfabetização e letramento. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2004.

TEBEROSKY, Ana. Debater e opinar estimulando a leitura e a escrita. Disponível


em:<http://revistaescola.abril.co.br/lingua-portuguesa/pratica-pedagogica/debater-opinar-
estimulam-leitura-escrita-423497.shtml>. Acesso em: 17 nov. 2016.

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