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Na série norte-americana “ Hierarquia”, narra-se a trajetória de emprego da

personagem Ingrid, de forma a salientar seu esforço contínuo para alcançar uma vaga na
sociedade de um escritório de advocacia. Contudo, ao longo da trama, nota-se que seu
trabalho árduo é apenas explorado pelas pessoas que já possuem influência, os quais negam
sua contratação, embora a protagonista seja a funcionária mais qualificada, demonstrando
imparcialidade, vide a candidata ser uma mulher e ter descendência asiática. Nesse sentido, a
obra audiovisual, ao destacar o mito da meritocracia como mantenedor das discrepâncias
sociais, apresenta equivalência com a conjuntura brasileira, em que os habitantes menos
abastados são induzidos acreditarem na potencialidade de ascensão social, apesar do
panorama desigual do país. Dessa maneira, a manipulação da realidade pelos mais favorecidos
e a inoperância estatal frente à irregularidade, ao contribuírem para o quadro, devem ser
analisadas.
Diante desse cenário, é crucial pontuar que, desde a dominação hostil dos
portugueses sobre o território nacional, houve uma notória distinção de classes, situação que,
mesmo com mudanças superficiais ao longo dos anos, manteve como base a desigualdade
estagnada, de modo que os mais privilegiados não só monopolizam a contemporaneidade,
como também definem a versão dela difundida. Tal questão pode ser ratificada dado que a
classe alta presente no país possui substancial influência perante as grandes mídias, dentre
outros meios de conexão interpessoal, circunstância que limita a história e a informação
compartilhada a uma experiência unilateral, propagando, por exemplo, o discurso ensaiado do
sucesso pelo mérito entre os mais vulneráveis. Paralelamente, Karl Marx, sociólogo
reconhecido mundialmente, discorre quanto ao conceito de ideologia, o qual se determina
pelo protagonismo dos ideais das parcelas dominantes, que distorcem a realidade para que
haja a manutenção de seus poderes. Com efeito, testemunha- se essa noção ante o óbice
discutido, o que limita a cidadania e as perspectivas dos cidadãos marginalizados.
Outrossim, a ausência de interferência pelo Estado sobre esta estrutura
hierárquica é outra vertente que favorece sua perpetuação. Em face disso, a simplificação da
escolha de profissionais para cargos diversos à análise de habilidades, haja vista a cultura
elitista que gere a maioria das posições de administração e desqualifica subjetivamente
indivíduos específicos, valida o sistema estigmatizante vigente no Brasil, de forma que a
equidade de oportunidade é descartada. Análogo a isso, está o exemplar literário “Eu sei
porque o pássaro canta na gaiola“, livro autobiográfico da escritora Maya Angelou, a qual
retrata sua dificuldade de ser aceita em um emprego apenas por sua cor de pele, sendo sujeita
a constante minimização cidadã. Consequentemente, percebe-se, através da narrativa e do
convergente cotidiano nacional, a importância de políticas e de ações afirmativas que reparem
os estigmas presentes coletivamente, posto que sua carência vulnerabiliza essas pessoas, além
de as impedir de gozarem de uma vida digna respaldada por direitos.
Portanto, é indubitável a ilegitimidade do discurso meristocrata quando se reflete
quanto às divergências populacionais e aos preconceitos dominantes territorialmente. À vista
disso, compete ao Ministério da Educação, órgão propulsor do conhecimento, junto à mídia,
reverter o caráter idealizada das propagandas sobre sucesso pessoal, mediante campanhas
digitais e televisivos que politizem a população sobre as disparidades vividas e a importância
de reconhecer o cenário, a fim de que não haja manipulação da realidade. Ademais, cabe ao
Ministério da Cidadania, conectado ao do Trabalho, criar políticas públicas que equilibrem a
divergência de oportunidades entre etnias, gêneros, classes e outros, por meio de projetos que
exijam de empresas públicas e privadas uma porcentagem significativa de pessoas
marginalizados atuantes, visando a equidade. Espera-se, assim, desmistificar o sucesso e
garanti-lo a todos, em oposição a série “Hierarquia”.

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