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PÓS-GRADUAÇÃO

LATO SENSU EM

TEOLOGIA DO NOVO TESTAMENTO

CRISTIANISMO CONTEMPORÂNEO

Andre Moreira
Pindamonhangaba / SP – 2021
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ÍNDICE

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 3
1. O QUE VEIO ANTES ............................................................................................................................... 5
1.1 As noventa e cinco teses ................................................................................................................ 5
1.2 Depois de Lutero ............................................................................................................................ 9
2. PRINCIPAIS CORRENTES TEOLÓGICAS CONTEMPORÂNEAS............................................................... 19
2.1 O Liberalismo teológico ................................................................................................................ 19
2.2 Neo-ortodoxia .............................................................................................................................. 26
2.3 Teologia da Esperança.................................................................................................................. 32
2.4 Rudolph Bultmann ....................................................................................................................... 34
2.5 Teologia da libertação e Missão Integral ..................................................................................... 37
3. PRINCÍPIOS ÉTICOS E A CONTEMPORANEIDADE ............................................................................... 41
3.1 Fé: instrumento do social ............................................................................................................. 42
3.2 Cultura Cristã e sociedade ............................................................................................................ 48
4. DESAFIOS DA CONTEMPORANEIDADE ............................................................................................... 53
4.1 Desafios internos .......................................................................................................................... 54
4.2 Desafios externos ......................................................................................................................... 57
CONCLUSÃO ........................................................................................................................................... 64
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................... 65
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INTRODUÇÃO

O protestantismo e as guerras de religião do século XVI provocaram, sem


dúvida alguma, uma crise profunda na sociedade europeia. É nesse momento, que
por vezes parece tão distante, que nasceu aquilo que hoje chamamos de
contemporaneidade. Ideias como as propaladas pelo liberalismo protestante ou pela
neo-ortodoxia começam a ser trabalhadas muito antes do seu próprio surgimento, por
vezes comprometendo princípios e valores que foram muito caros aos pais da
Reforma. O liberalismo do século XIX e o socialismo do século XX oferecerão à Igreja
momentos de conflitos. O Estado liberal submete tudo ao interesse do indivíduo
retirando todos os entraves intermediários, a única instância passa a ser o Estado que
seria o protetor dos direitos dos indivíduos. No caso do socialismo, a Igreja é vista
como uma burguesia que é preciso destronar.

Apesar dos grandes desafios do século XX, é possível afirmar que, depois das
duas grandes guerras, a Igreja da primeira metade do século XX ganha um grande
prestígio, pois teve um papel importante na paz. Do conflito se passa à simpatia, a
Igreja vai ganhando espaço, as vocações sacerdotais são abundantes. Isso explica
porque há tantos pensadores no século XX, a cultura mais exegética, os estudos
patrísticos e muita gente dedicada a estudar. Contudo, a segunda metade do século
XX será um tempo de revisões efervescidas pelos acontecimentos sociais de nossa
época.

Assim, nesse contexto tão intenso e dinâmico é que elaboramos a disciplina


“Cristianismo Contemporâneo”, que dividimos em quatro grandes seções da seguinte
maneira:

 Unidade 1 – O que veio antes: uma unidade inteira seria pouco para
tratarmos tudo que veio antes dos séculos XX e XXI, mas se faz
necessário um esforço de compreensão dos momentos e pensamentos
que antecederam a atualidade para que possamos compreender os dias
atuais;
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 Unidade 2 – Principais Correntes Teológicas: como o próprio nome diz,


buscaremos compreender os principais movimentos teológicos e
pensadores da teologia contemporânea;
 Unidade 3 – Princípios éticos: traremos à tona as reflexões éticas que
incomodam o cristianismo e quais são seus pressupostos norteadores;
 Unidade 4 – Desafios da contemporaneidade; se aprendemos sobre os
princípios éticos, precisamos conhecer também quais são os principais
desafios da fé contemporânea.

Esperamos que, ao término dos estudos, o aluno dessa disciplina consiga identificar
de maneira consistente as marcas do pensamento contemporâneo, bem como quais
são suas fontes de influência.

Bons estudos!

Prof. Andre Moreira.


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1. O QUE VEIO ANTES

Em linhas gerais, para se compreender os temas relevantes do Cristianismo


Contemporâneo precisamos compreender como se desenvolveu a Teologia
contemporânea. O Cristianismo Contemporâneo e os temas que o cercam são fruto
do movimento teológico contemporâneo. Movimento esse que surgiu no começo do
século XX com o pensamento de Karl Barth (trataremos desse autor na seção 2.2
desse Guia Didático), e consolidou-se após a primeira Guerra Mundial.

Mas antes de compreender a Teologia Contemporânea, precisamos voltar um


pouco mais no tempo, estudando e entendendo o pano de fundo em que se
desenvolveu e amadureceu a Reforma Protestante. Tal esforço se faz necessário para
que possamos compreender as motivações teológicas atuais e como elas evoluíram
até o presente momento. Nessa unidade daremos especial atenção às principais
ideias e momentos decorrentes da Reforma Protestante. É possível que
ocasionalmente ao longo dessa leitura você sinta que está revendo alguns conteúdos
familiares, no entanto faremos nossa investigação com um enfoque especial nos
principais pontos e valores que movem a Teologia Contemporânea, e começaremos
falando da própria Reforma encabeçada por Lutero.

1.1 As noventa e cinco teses

O brado inicial de protesto foi emitido de maneira bastante silenciosa, em forma


de noventa e cinco teses escritas e expostas à entrada de uma grande catedral, uma
Scholosskirche (castelo-igreja), na cidade de Wittenberg, na Alemanha; bem longe de
Roma (Itália) e de Avignon (França), cidades palco das disputas pelo poder, pela
soberania e pelo domínio sobre a Igreja do Senhor Jesus Cristo.
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Martinho Lutero (1483-1546), um monge alemão, foi o cisne prenunciado por


John Huss, momentos antes de ter sua voz calada pelas chamas de uma fogueira em
Constança, em 6 de julho de 1415, um século antes, quando disse: “Podem matar um
ganso, mas daqui a cem anos surgirá um cisne que não poderão queimar”. (BLAINEY,
2012, p.187)

Martinho Lutero nasceu a 10 de novembro de 1483, na cidade de Eisleben, na


Alemanha. Tornou-se bacharel em artes em 1502, e mestre em artes em 1505, pela
Universidade de Erfurt. Em obediência ao pai, que sonhava ter um filho advogado,
entrou para a faculdade de direito. Em pouco tempo, porém, interrompeu os estudos
e entrou no claustro dos eremitas agostinianos em Erfurt, onde, decidido a seguir a
carreira eclesiástica, foi consagrado padre em 1507.

Deixando o mosteiro, passou a proferir palestras sobre filosofia na Universidade


de Wurtemberg, onde também ensinava teologia. Em 1512, tornou-se doutor em
teologia e fazia conferências sobre as Escrituras, especializando-se nas cartas aos
Romanos, Gálatas e Hebreus. Foi durante o período que estudava a teologia paulina,
que ele pôde perceber os erros da Igreja Católica Romana, à luz daqueles
documentos que foram fundamentais para o cristianismo primitivo.

Devido o seu elevado nível intelectual, Lutero galgou várias e elevadas


posições no clero romano. Em 1515, foi nomeado vigário responsável pela liderança
de 15 mosteiros. Foi então que se envolveu em controvérsias em torno da venda de
indulgências, a qual se tornara uma verdadeira fábrica de dinheiro para a Igreja
Católica Romana. Nessa ocasião, Lutero travava uma árdua batalha espiritual, pois
nem sua carreira eclesiástica e nem sua vida monástica, lhe proveram respostas
satisfatórias acerca da salvação pessoal. Suas aflitivas indagações só encontraram
resposta quando se deparou com a enfática declaração de Paulo em sua carta aos
Romanos quando afirma: “O justo viverá pela fé” (Romanos 1.17). Essa maravilhosa
descoberta deixou Lutero ainda mais aflito e inseguro quanto à sua própria salvação.

Considerando que a Igreja Católica Romana vendia indulgências como


credenciais para adentrar ao céu, Lutero, agora também intrigado, pôs-se a meditar
sobre suas condições espirituais, as quais, fundamentadas nos ensinamentos da
Igreja, não lhe davam nenhum passaporte para a eternidade. A partir de então, a nova
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descoberta tornou-se o tema principal em suas conferências, nas quais passou a


criticar o domínio da filosofia sobre a teologia católica romana.

Em 1516, Martinho Lutero fez publicar um livro devocional intitulado Theologia


Deutsch, (teologia germânica) de autoria dos místicos alemães. Posteriormente,
tornou-se pároco da igreja em Wittenberg, tornando-se um pregador popular de
grande erudição e eloquência, proclamando e ensinando o que julgava ser a
verdadeira fé ensinada nas Escrituras. Ele combatia com veemência os ensinos
eclesiásticos sobre as indulgências, que afirmavam que ao comprar as indulgências,
o indivíduo tinha garantido o perdão dos pecados, bem como a entrada no céu. Não
havia necessidade de conversão e nem mesmo de arrependimento, pois o preço da
salvação já estava pago, através da compra de indulgências. Quem coordenava essa
indústria monetária era Johan Tetzel, um frade dominicano (BLAINEY, 2012).

Tetzel proferia seus convincentes discursos, induzindo o povo a se livrar da


perdição, sem necessidade de um novo nascimento, bastando apenas pagar o preço
que era cobrado. Enquanto ele discursava, seus agentes distribuíam as indulgências
e recolhiam o dinheiro. As indulgências eram cobradas, tendo seu preço avaliado de
acordo com as condições do comprador.

Em 1517, Tetzel, o agente contratado pelo arcebispo Alberto para coordenar a


venda das indulgências, começou seu trabalho em Jüterborg, localidade próxima de
Wittenberg. Esse fato provocou indignação em Lutero e seus seguidores, o qual, não
suportando mais ver o povo sendo enganado e explorado por aquela atitude extorsiva
e nefasta das autoridades eclesiásticas, escreveu seu protesto em forma de 95 teses
que criticavam os abusos do sistema eclesiástico e demonstrava o profundo interesse
e a intenção de reformar todo o sistema.

Suas teses foram fixadas na entrada da Scholosskirche (castelo-igreja) e


também foram enviadas cópias não só para as autoridades eclesiásticas, mas
também para toda a Alemanha. Finalmente teve início a reforma que todos buscavam,
mas que o poderio eclesiástico conseguira impedir até então.

Myconius, historiador contemporâneo de Lutero fez a seguinte observação: “As


teses, em apenas 15 dias percorreram quase toda a cristandade, como se os anjos
fossem os mensageiros”. Inicialmente o papa achou graça nas teses de Lutero,
dizendo “Um alemão embriagado escreveu-as”. Entretanto, muito rapidamente teve
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que mudar de ideia e a agir contra o que ele chamou “monge rebelde”; (apud
OLIVEIRA,1984).

Começou-se logo a perseguição a Lutero que tinha não só o apoio dos cristãos,
como também de toda a nobreza alemã. Uma bula papal circulou por toda a Alemanha
convocando Lutero e seus seguidores a se retratarem, sob pena de excomunhão. Em
1520, Felipe Melanchton, professor de grego, com todas as suas forças se colocara
ao lado de Lutero e fizera publicar um anúncio em Wittenberg, convocando estudantes
e toda a população para assistirem a queima, em praça pública, de todos os escritos
papais, com seus decretos, bem como a obra dos teólogos escolásticos.

Em janeiro de 1521, depois de muitas tentativas frustradas e muitas ameaças


contra Lutero, foi publicada a sentença papal, na qual Lutero fora excomungado por
heresia e condenado a sofrer todas as consequências por seus atos. Entretanto, para
que o réu fosse condenado à morte, a sentença precisava ter o aval das autoridades
civis. Essa primeira dieta do imperador Carlos V aconteceu em Worms. Embora seus
amigos tentassem impedi-lo de comparecer à dieta, Lutero caminhou de cabeça
erguida para enfrentar seus algozes, mesmo estando certo de que caminhava para a
morte.

Lutero trouxera à lembrança de seus amigos a situação de John Huss um


século antes, o qual, mesmo tendo um salvo-conduto imperial, fora condenado à
fogueira, afirmando a seguir que mesmo que houvesse em Worms tantos demônios
quanto as telhas dos telhados, ele ali estaria.

Lutero foi condenado à morte e a sentença deveria ser cumprida em breve.


Contudo, como que se cumprindo a profecia de John Huss, de que eles não
conseguiriam calar o cisne que surgiria, o inesperado aconteceu. Altas horas da noite,
enquanto Lutero era conduzido de volta a Wittenberg, o príncipe da Saxônia,
simulando um sequestro, assaltou a escolta e o arrebatou das mãos, levando-o para
o seu castelo em Wartburgo. Ali, durante muito tempo, Lutero viveu disfarçado,
adotando o nome de cavaleiro Jorge, enquanto o mundo julgava que ele estivesse
morto. Nesse refúgio acolhedor, Lutero escreveu muitas obras, que ao se tornarem
de conhecimento público, denunciavam para o mundo que o reformador escapara da
morte e estava vivo em algum lugar.
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Um presente que Lutero deu ao seu povo foi traduzir a Bíblia para o alemão e
torná-la acessível para toda a população alemã. Martinho Lutero veio a faleceu em 18
de fevereiro de 1546, em Eisleben e foi sepultado na Igreja do Castelo, em Wittenberg.

Não era propósito de Martinho Lutero, nem de nenhum dos reformadores,


provocar uma divisão na Igreja, tornando-a dividida entre Católicos e Protestantes. O
propósito, como o próprio termo diz, era promover uma reforma total, principalmente
em seus bastidores. Entretanto, não aconteceu o esperado e, àqueles que
protestaram e a seus seguidores, deu-se o nome de protestantes. Por isso, o nome
do movimento iniciado por Martinho Lutero ganhou o título de Reforma Protestante. O
brado de Lutero ressoou por quase toda a Europa, inspirando outros pensadores
como Zuínglio e Calvino.

1.2 Depois de Lutero

Ulrich Zuínglio (1484-1531), natural de Wildhaus, St. Gallen, na Suíça, estudou


na Universidade de Basiléia onde influenciado pela Reforma adotou a nova fé cristã e
passou a crer na autoridade exclusiva das Escrituras e na salvação pela graça, por
meio da fé em Jesus Cristo. Seu protestantismo era uma variação mais racionalista
da teologia de Lutero, de cuja crença passou a duvidar, enquanto debatia com os
teólogos alemães acerca da Ceia do Senhor, na qual, segundo a crença de Lutero,
havia a presença real de cristo no sacramento da comunhão.

Ao conhecer a fé evangélica, Zuínglio passou a combater o sistema medieval


de penitências e relíquias. O momento culminante da Reforma ocorreu em 1519,
quando, ao iniciar um de seus cultos em Zurique, Zuínglio declarou sua intenção de
se manter fiel às Escrituras, em detrimento do regime eclesial dominante. Outro
detalhe importante é que Zuínglio, a exemplo de Lutero, também combatia o ensino
da Igreja Romana de que Pedro teria sido o primeiro papa ou fundador do papado.
Ele escreveu várias obras e folhetos para promover o avanço da Reforma, a qual se
consolidou em 1523.
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Zuínglio contribuiu na elaboração de vários credos, ou confissões, dentre os


quais se destacam as Dez Teses de Berna, além de estabelecer um sólido
relacionamento com outros reformadores. Devido a nobreza de seu caráter, e seu
compromisso com a autoridade das Escrituras, aliados à sua diligência na promoção
e propagação da Reforma em seu País, Zuínglio se destacou como o terceiro maior
reformador da história da Reforma Protestante.

A exemplo de João Calvino, Zuínglio também aderiu à doutrina da


predestinação em sua teologia, mas confessava não possuir tanta percepção
escriturística quanto Calvino possuía. Zuínglio buscava respaldo bíblico em suas
práticas teológicas. A Ceia do Senhor, por exemplo, era uma ocasião para relembrar
e testemunhar os benefícios comprados por meio da morte de Cristo na cruz. Em
1527, Zuínglio fez remover o órgão da grande catedral de Zurich, onde era pastor, sob
a alegação de que não havia apoio nas escrituras para se utilizar aquele instrumento.
Entretanto, ele se embaraçava todo, quando os anabatistas lhe cobravam respaldo
bíblico para a prática do batismo de crianças.

Mesmo assim, o grande reformador suíço foi distinguido como um dos líderes
mais atraentes da Reforma. A controvérsia com Lutero a respeito da Santa Ceia e as
dificuldades com os anabatistas quanto ao batismo de crianças, não podiam ofuscar
o brilho, o denodo e o zelo de Zuínglio como reformador e promotor da fé reformada
na Suíça alemã. Ele forma, ao lado de Lutero e Calvino, o grande e gigantesco tripé
da Reforma Protestante (BLAINEY, 2012).

João Calvino nasceu em Noyon, França, no dia 10 de julho de 1509. Sua


infância foi amarga, pois perdera a mãe muito cedo numa época em que predominava
o domínio da Igreja Romana com suas crendices e suas tiranias. O povo, incauto,
acreditava e aceitava todo tipo de imposição religiosa que o clero apresentava. Aos
14 anos, já convicto quanto à sua vocação para o sacerdócio, foi enviado a Paris para
realizar seus estudos e se preparar para adentrar à carreira eclesiástica. Cinco anos
depois, por desejo do pai, estudou e se formou em Direito nas Universidades de
Orleans e de Bourges. Ao perder o pai em 1531, se enveredou pela cultura das letras
em Paris, tendo como mestres os mais conceituados humanistas da época.

Em 1533, influenciado pela literatura luterana, se tornou protestante confesso.


Devido à violenta perseguição francesa contra os protestantes, Calvino e alguns
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companheiros tiveram que fugir de Paris e estiveram refugiados por três anos em
Basiléia, onde escreveu sua obra mais importante: As Institutas da Religião Cristã. O
valor e a fama desta obra tem perdurado através dos séculos e tem sido muito
utilizada, não só pelos teólogos reformados, mas por toda a cristandade, em todos os
tempos.

Não vislumbrando nenhuma esperança de reforma em Paris, Calvino decidiu


permanecer em Basiléia até 1541, quando se mudou para Genebra, estabelecendo,
naquela cidade, uma radical teocracia. Ali havia uma verdadeira confusão nos
governos eclesiásticos e político, uma vez que era uma recíproca submissão igreja-
estado, estado-igreja.

Logo ao chegar, Calvino começou a promover uma mudança radical na


situação e punir qualquer atitude moral ou religiosa que ofendesse o padrão de vida
estabelecido pelas Escrituras. Houve, a princípio, certa insegurança, por causa da
rigorosa oposição que se levantou contra Calvino e suas exigências de mudança.

Porém por volta de 1555, já havia uma sólida estabilidade. Apesar da paz
reinante, houve algumas atitudes mais rígidas da parte de Calvino, tanto em questões
morais quanto religiosas. O humanista e professor Sebastião Castellio, por exemplo,
foi impedido de ingressar no ministério e teve que abandonar Genebra por causa de
seus contraditórios comentários acerca do livro de Cantares de Salomão.

A rígida doutrina imposta por Calvino causou outras vítimas. Jacques Gruel foi
decapitado, sob a acusação de blasfêmia; Jerônimo Bolsec foi banido em
consequência de sua oposição à doutrina calvinista da predestinação. O
antitrinitariano Miguel Serveto foi queimado na fogueira em 1553.

A mudança de Calvino para Genebra aconteceu por causa de alguns


contratempos que ocorriam na cidade. A Reforma já havia triunfado sob a liderança
de Guilherme Farel, que conquistara a independência de Genebra derrotando o bispo
local, que também era um senhor feudal. Contudo, Farel reconhecera a necessidade
de uma total reestruturação moral e eclesiástica, que ele mesmo não se sentia capaz
de realizar.

Ainda desorientado quanto ao que fazer, foi informado da presença de Calvino


na cidade naquela noite. Imediatamente, foi ao seu encontro e tentou convencê-lo a
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ficar em Genebra, alegando que Calvino era o homem que a cidade precisava.
Calvino, contudo, não demonstrou nenhum interesse pela situação, alegando estar
muito atarefado em seus estudos e pesquisas. Então Farel, desesperado, apelou
dizendo: “Digo-te, em nome de Deus Todo-poderoso, que estás apresentando os teus
estudos como pretexto. Deus te amaldiçoará se não nos ajudares a levar adiante seu
trabalho, pois doutra forma estarias buscando a tua própria honra em vez da de
Cristo!”

Sobre este enfático apelo, Calvino comentou mais tarde: “Senti como se Deus
tivesse estendido a sua mão do céu em minha direção para me prender... Fiquei tão
aterrorizado que interrompi a viagem que havia programado... Guilherme Farel me
deteve em Genebra” (apud OLIVEIRA, 1984, p. 256). Apesar de tudo, e dos inúmeros
benefícios que sua obra trouxe para Genebra, nem todos estavam dispostos a aceitá-
lo, tampouco a Reforma estabelecida. Como resultado dessa obstinada oposição,
Calvino e Farel foram expulsos da Comunidade.

Dali, foram para Estrasburgo, onde, por três anos, Calvino pastoreou uma igreja
protestante formada por franceses exilados devido às fortes perseguições em Paris.
Entretanto, a situação de Genebra foi se tornando cada vez pior. Então o povo,
desesperado e reconhecendo a importância da obra de Calvino para com a vida
religiosa e política da cidade, apelou para que ele voltasse. Embora com relutância,
Calvino acabou cedendo ao apelo e voltou para Genebra.

Retornando à Genebra, Calvino deu início a uma intensa obra de restauração,


que redundou em diversos benefícios à comunidade protestante. A vida moral se
tornou um exemplo do poder transformador da fé e Genebra se tornou uma cidade-
refúgio para os perseguidos pela contrarreforma. Vindos de vários pontos da Europa,
como: França, Holanda, Alemanha, Inglaterra e Escócia. Genebra foi ainda elevada à
posição de primeiro berço missionário da Reforma para preparação de novos líderes
do protestantismo, espalhando missionários por vários países, dentre os quais
podemos destacar John Knox.

A Escócia do século XVI era um reino independente e a Reforma encontrou ali


uma receptividade surpreendente, apesar da disposição do governo e da Igreja
Católica em perseguir os pregadores e defensores da causa protestante. A causa
reformada da Escócia tinha, em John Knox, o seu principal líder. Em 1546, ele foi
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preso por forças francesas que tinham sido enviadas para auxiliar o governo escocês.
Sua ousadia como pregador do cristianismo reformado foi a causa de sua prisão. Ele
passou dezenove meses sofrendo, acorrentado como escravo nas galés da França.
Por intervenção dos ingleses, Knox foi libertado e foi para a Inglaterra, onde passou
cinco anos (1549-1554) pregando o evangelho (BLAINEY, 2012).

John Knox foi o fundador do puritanismo inglês. Quando a rainha Maria Tudor
subiu ao trono, Knox fugiu para Genebra, onde se juntou a Calvino. Também
pastoreou uma igreja inglesa em Genebra. Posteriormente, retornou à Escócia para
assumir a liderança do movimento reformista, encontrando os escoceses bem
dispostos para a luta. Contudo, a rainha regente contava com forças francesas para
derrotar os protestantes. Knox, então, recorreu ao Cecil, secretário geral da rainha
Isabel, a qual percebeu a importância de ter uma Escócia protestante ao lado de uma
Inglaterra protestante. Em 1560, uma armada e um exército inglês expulsaram os
franceses, deixando a Escócia livre para viver o cristianismo reformado.

Na Inglaterra, o movimento reformista ganhou forma por conta de motivos mais


passionais, graças ao divórcio de Henrique VIII, rei da Inglaterra. Ele se apaixonou
por Ana Bolena e solicitou autorização para se divorciar de Catarina, sua esposa
anterior. Havia uma questão nacional envolvida, já que Catarina não podia conceber,
e o povo inglês jamais aceitaria o governo de uma mulher. O Papa se recusou a
conceder o divórcio, e em 1534 em meio aos conflitos ocorrido por conta do assunto,
a Inglaterra declarou-se protestante, rejeitando por completo a autoridade papal.

Com a morte de Henrique VIII, sua filha Maria conquista o prestígio popular e
assume o poder. Em seu reinado, Maria I liderou uma violenta reação contra o
Protestantismo. Seu objetivo era fazer com que a Igreja voltasse ao domínio do
Catolicismo romano, como era antes de Henrique VIII. Para conseguir seu intento, ela
revogou todos os atos do parlamento e dos reis anteriores, que favoreciam o
Protestantismo. As principais vítimas dos ataques foram os líderes do movimento
protestante inglês. Com a morte de Maria, a Inglaterra tornou-se ainda mais
protestante do que nunca. Sua sucessora Isabel, desde cedo, já demonstrara sua
simpatia pelo Protestantismo. Ela muito contribuiu para a formação de uma Igreja
Nacional Protestante. Com um rápido desenvolvimento político e econômico, a
Inglaterra tornou-se um dos principais baluartes da causa protestante em toda a
Europa e em outras partes do mundo.
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Após o calor das ideias da Reforma no século XVI, houve um arrefecimento da


parte de seus aderentes na segunda e terceira geração após os reformadores. Nesse
contexto surge o pietismo, movimento que se levantou contra a crescente frivolidade
da espiritualidade protestante. O enfoque central da “teologia” pietista era “[...] o
processo subjetivo da nova vida, mais do que a ação de Deus na justificação” (SILVA,
2017, p. 75). O propósito de seus líderes era o de despertar os espíritos acomodados
para uma verdadeira e íntima piedade e vida interior. Eles primavam por um
conhecimento mais direto das Escrituras, obtido através da vida devocional e nunca a
partir de conceitos abstratos e intelectivos.

Não obstante, ainda no século XVIII, outro movimento veio à tona como
contraproposta à ortodoxia engessada do escolasticismo reformado: o racionalismo e
o idealismo filosófico e teológico alemão, que teve como seus luminares homens como
Kant, Fiche, Schelling e Hegel. A premissa a partir da qual todos estes partiam era a
autonomia do espírito crítico, frente à realidade empiricamente verificável. Logo, a
autoridade divina das Escrituras se tornou ancilla rationis sive homini, que pode ser
traduzido como “serva da razão ou do ser humano”.

Desde Platão até o fim da Idade Média, grande ênfase havia sido dada na
capacidade humana de apreender a realidade. Mas o pensamento de Immanuel Kant
propõe uma virada na compreensão das capacidades intelectivas do espírito humano.
Em uma espécie de síntese, Kant explica que tanto o conhecimento sensível quanto
o intelectivo são resultados da atividade conjunta do sujeito e do objeto cognoscível.

O objeto provê ao sujeito cognoscente a matéria; o sujeito, por sua vez, lhe
concede a forma, constituindo, assim, o movimento epistêmico de uma comunhão
entre processos a posteriori e a priori (posteriores à verificação empírica e anteriores
a ela, respectivamente). De acordo com Kant, o conhecimento intelectivo não visa à
coisa em si, mas apenas os fenômenos, quando o espírito humano, por meio da razão
unicamente, tenta ultrapassar os fenômenos e ingressar epistemicamente à coisa em
si, ele se perde em antinomias insolúveis: “são-nos dadas coisas como objetos de
nossos sentidos situados fora de nós, mas nada sabemos sobre o que podem ser em
si mesmos; apenas conhecemos seus aparecimentos”, isto é, aquelas representações
que nos chegam por meio dos sentidos. “[...] a Razão pura não é capaz de outra coisa
que fundar uma necessidade lógico-formal”.
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Em Kant, a ideia de Deus reside na esfera dos números, isto é, para além da
apreensão da Razão e dos eventos fenomenais. A religião, em Kant, visa a moralidade
de um ser humano profundamente agnóstico. Kant é o fundador do chamado
Formalismo Ético, o qual postula, especialmente na Crítica da Razão Prática, que o
critério moral supremo não pode ser derivado da experiência, pois em tal caso ter-se-
ia uma moral subjetiva e contingente, mas em uma forma apriorística e incondicionada
de avaliação dos valores morais, a fim de que se torne possível a possibilidade de
uma moral universalmente válida e intrinsecamente necessária. Há, então, para Kant,
uma lei pura que deve reger as ações do indivíduo, um imperativo categórico que
permite com que os indivíduos ascendam, de uma moralidade subjetivista para uma
moralidade universal e válida para todos, em todos os lugares e em todos os tempos.
A religião, assim, se torna uma auxiliadora manca da moralidade universal de todos
os indivíduos.

Para Schelling e Fiche, sucessores de Kant, a realidade é uma ampliação dos


complexos processos mentais e intra-humanos. Em Fiche, observa-se especialmente
que a tarefa última da religião é tornar-se desnecessária. A religião presta mero apoio
à moralidade, algo que já havia sido esboçado por Kant na Crítica da Razão Prática.
Para Schelling, o Ego está imerso no Absoluto e Deus mesmo está como que sujeito
a um princípio natural de ordem dinâmica. Hegel, entretanto, inicia uma nova
reviravolta na filosofia alemã. Nele, a identidade entre o Espírito e a Natureza
alcançam seu cume.

É difícil aferir o que, de fato, Hegel cria de Deus, mas pode-se afirmar que seu
sistema pode ser identificado como uma espécie de monismo panteísta ou um
evolucionismo de caráter lógico. O ser humano pode ser compreendido como espírito
finito, mas que possui uma certa identidade essencial com o Espírito infinito. É no
desenvolver da mente finita que o Infinito alcança a plena consciência de si mesmo.
A realidade do Absoluto reside na realidade do pensamento finito do sujeito que nele
pensa. A história, assim, passa a ser o processo de autoconsciência do Absoluto e da
Identidade Unificante. Hegel afirma, ainda, que o segredo da identidade dos seres e
que permeia todas as realidades díspares e existentes está na coincidentia
oppositorum (coincidência dos opostos). É na oposição dos contrastes ascendentes
que se deve entrever a realidade una e elevada da Unidade e do Absoluto Todo
Permeante. O Absoluto de Hegel é, pois, o princípio e o fundamento de todo
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desenvolvimento infinito. Deus, assim, realiza-se na história e na natureza e, com o


mundo, desenvolve-se infinitamente sem deixar de ser ele mesmo.

A Reforma Protestante avança pelo tempo e na virada do século XVIII para o


XIX, começa a despontar o que chamamos de Teologia Moderna encabeçada pelo
teólogo alemão Friedrich Schleiermacher. Filho de um capelão do exército,
Schleiermacher nasceu em Bresleu em 21 de novembro de 1768. Após o estudo dos
clássicos, foi profundamente acometido por sentimentos e temores de cunho religioso.
Em 1783 iniciou seus estudos na escola morávia de Niesky, na qual foi intimamente
influenciado pela piedade e devoção dos crentes morávios. Em 1785, iniciou seus
estudos teológicos em Barby. Lá também se envolveu em discussões filosóficas e no
ano seguinte, foi estudar em Halle e aprofundar-se em Kant. Seus conhecimentos da
filosofia grega foram aprofundados também neste período, no qual inicia sua tradução
da obra completa de Platão que se tornou marco para o estudo da filologia clássica
alemã até os dias atuais.

Em 1790, tornou-se pregador da Igreja Reformada Calvinista. Em 1793 passou


a ensinar em Berlim, e em 1796 se tornou pregador do Hospital da Caridade, nesta
mesma cidade. Berlim, nesta época, já se tornara o “quartel-general” do
intelectualismo alemão e iluminista. Em 1798, começou a escrever sua Reden
(Discursos), os “discursos acerca da religião dirigidos às pessoas cultas entre aqueles
que a depreciam”. O início de seu pensamento se caracteriza por uma explosão
romântica e de natureza semipoética. “O dom natural de Schleiermacher estava em
sua capacidade de unir de um modo excepcional a mais apaixonada religião com o
rigor inflexível do pensamento científico”.

Nas duas principais obras filosóficas de Schleiermacher, Dialética e Solilóquios


são apresentados os princípios a partir dos quais ele iria, posteriormente, erigir toda a
sua teologia do sentimento. Nos Solilóquios, Schleiermacher expõe a sua ética
religiosa e filosófica. Segundo ele, o ser humano deve fazer, enquanto tarefa moral,
uma imagem satisfatória em si de toda a humanidade ideal. Nesta obra,
Schleiermacher se levanta contra o imperativo categórico de Kant, e afirma
vigorosamente que o ser humano não é uma existência passiva na moral, mas um
sujeito ativo, que atua a partir de seus próprios recursos. Assim como as plantas, o
ser humano deve crescer e amadurecer, a fim de florescer de maneira livre e
autônoma. Sua tarefa neste mundo é, pois, de libertar-se e de ascender no domínio
17

de si mesmo e de todas as coisas, fazendo com que suas potencialidades sejam


atualizadas de maneira plenamente satisfatória e livre dos embaraços externos a si
mesmo.

Na Dialética, o autor constrói sua epistemologia, seguindo a tradição platônica


que o antecedeu. Segundo Schleiermacher, o pensamento que conduz ao
conhecimento verdadeiro e insofismável se dá a partir de duas correspondências:
entre a ideia puramente simples e a realidade múltipla das coisas sensíveis; e entre
as ideias puras e os pensamentos dos demais seres. Com respeito ao primeiro ponto
de tangência, entre o ideal e o real, Schleiermacher postula que deve haver entre o
pensamento e o ser uma relação de identidade originária, a partir da afirmação da
qualidade de certeza do pensamento. Deve existir, assim, uma unidade primária que
permita que os opostos do Ideal e do Real sejam, de alguma forma, correspondentes
entre si. O conhecimento, portanto, é a correspondência ou evento unificante entre as
ideias puras e simples do pensamento e o real múltiplo e sensível. Assim, o
fundamento originário da relação entre o pensamento e a realidade recebe o nome de
Deus e de Mundo.

Em suas obras de cunho religioso ou teológico, Schleiermacher propõe uma


compreensão romântica da fé, para ele a fé é um sentimento de pura dependência do
Absoluto e da Unidade, que é Deus. Logo, seu conceito de religião é marcado por sua
tendência de perceber nas realidades visíveis os traços mais significantes do mundo
transcendente e íntimo da vida religiosa. A religião de Schleiermacher consiste em um
sentimento de dependência absoluta do Todo e da Unidade permeante e última.

O pensamento de Schleiermacher, embebido dos influxos do romantismo


alemão, causou profunda influência na teologia moderna, e até hoje ele é chamado
“pai da teologia moderna”.
18

2. PRINCIPAIS CORRENTES TEOLÓGICAS


CONTEMPORÂNEAS

Prosseguimos nessa unidade com o propósito de conhecer os pressupostos


que fundamentam o Cristianismo Contemporâneo. Assim, antes de conhecer os
principais temas que fomentam o debate cristão no século XXI, precisamos conhecer
alguns dos grandes autores que deram suporte ao pensamento evangélico da
atualidade. A lista de temas e autores aqui apresentada não é exaustiva, porém
fundamental, pois nos conduz a um aclaramento sobre o surgimento de temas
teológicos que nos são tão preciosos nos dias atuais. Compreendê-los é tão ou mais
importante que a compreensão da consolidação da Reforma Protestante para a
modernidade.

2.1 O Liberalismo teológico

Também conhecido como modernismo, esta é a principal mudança no


pensamento teológico que ocorreu no final do século XIX. É um conceito
extremamente evasivo. Existe uma variedade de nuances de pensamento liberal, ele
mudou de caráter com o passar do tempo e as distinções entre o liberalismo na Europa
e na América do Norte são consideráveis. O principal diferencial é o desejo de adaptar
as ideias religiosas à cultura e modos de pensamento modernos. Os liberais se
pautam pela crença de que o mundo mudou desde a época em que o Cristianismo foi
fundado, de modo que a terminologia e os credos bíblicos são incompreensíveis para
as pessoas hoje.

Embora muitos liberais partissem da ortodoxia herdada de Jesus Cristo como


a revelação de um Deus salvador, eles tentam repensar e comunicar a fé em termos
que podem ser compreendidos hoje. Como disse Harry Emerson Fosdick, devemos
19

expressar a essência do Cristianismo, suas “experiências duradouras”, mas não


devemos identificá-las com as “categorias mutáveis” pelas quais foram expressas no
passado. Os liberais afirmam que o Cristianismo sempre adaptou suas formas e
linguagem a situações culturais particulares e os “modernistas” em qualquer época
foram apenas aqueles que foram mais sinceros e criativos ao fazer isso.

Um segundo elemento do liberalismo é a rejeição da crença religiosa baseada


apenas na autoridade. Todas as crenças devem passar nos testes da razão e da
experiência, e a mente deve estar aberta a novos fatos e verdades,
independentemente de sua origem. Nenhuma questão é encerrada ou resolvida e a
religião não deve se proteger de um exame crítico. Como a Bíblia é obra de escritores
limitados por sua época, ela não é sobrenatural nem um registro infalível da revelação
divina e, portanto, não possui autoridade absoluta. A “essência do cristianismo”
substitui a autoridade das Escrituras, dos credos e da igreja. Isso significa que não há
contradição inerente entre os reinos da fé e da lei natural, revelação e ciência, o
sagrado e o secular, ou religião e cultura.

Uma ideia central da teologia liberal é a imanência divina. Deus é visto como
presente e habitando no mundo, não separado ou elevado acima do mundo como um
ser transcendente. Ele é sua alma e vida, assim como o criador. Assim, Deus é
encontrado em toda a vida e não apenas na Bíblia ou em alguns eventos reveladores.
Porque ele está presente e trabalha em tudo o que acontece, não pode haver distinção
entre o natural e o sobrenatural. A presença divina é revelada em coisas como
verdade racional, beleza artística e bondade moral. Embora a maioria dos liberais
tente se apegar a um cerne da doutrina cristã, alguns teóricos defendem o panteísmo
como o fim aceitável do liberalismo.

A imanência contribuiu para crenças liberais comuns como a existência de um


sentimento religioso universal que está por trás das instituições e credos de religiões
particulares e a superioridade das boas obras (tanto em termos individuais quanto
coletivos) sobre as profissões e confissões. Deus é visto como aquele que capacita o
homem a integrar sua personalidade e assim alcançar a perfeição. É claro que isso
exigia a reafirmação de muitas doutrinas cristãs tradicionais. A encarnação foi a
entrada no mundo pela pessoa de Jesus Cristo como força modeladora e redentora
da humanidade, e significou e ratificou a presença real de Deus na humanidade. Sua
personalidade profética é a demonstração mais clara e desafiadora do poder divino
20

no mundo, e ele é a revelação de Deus e o objetivo do anseio do homem. Assim como


a ressurreição de Jesus foi a continuação de seu espírito e personalidade, o mesmo
ocorre com todos os mortais após a morte do corpo físico.

O pecado ou o mal são vistos como imperfeição, ignorância, desajustamento e


imaturidade, não a falha fundamental do universo. Esses obstáculos ao
desenvolvimento da natureza interior podem ser superados pela persuasão e
educação, e a salvação ou regeneração é sua remoção. A religião representa a
dimensão da vida em que os valores pessoais recebem sua expressão mais elevada,
e seu poder possui qualidades espiritualmente terapêuticas. A oração, por exemplo,
aumenta a sensibilidade espiritual da pessoa e confere os benefícios morais de
estabilidade, autocontrole e paz de espírito.

O liberalismo também manifesta um otimismo humanista. A sociedade está se


movendo em direção à realização do reino de Deus, que será um estado ético de
perfeição humana. A igreja é o movimento daqueles que se dedicam a seguir os
princípios e ideais apresentados por Jesus, aquele que forneceu o melhor exemplo de
uma vida de amor altruísta e os membros desta comunidade trabalham juntos para
construir o reino. A escatologia liberal vê a obra de Deus entre os homens como a de
redenção e salvação, não como punição pelo pecado, e esse fim será alcançado no
curso de um progresso contínuo e ascendente.

O liberalismo teológico originou-se na Alemanha, onde uma série de correntes


teológicas e filosóficas convergiram no século dezenove. O pensamento alemão teve
um impacto profundo na teologia britânica e americana, mas os movimentos indígenas
em ambos os lugares, a tradição da Broad Church na Grã-Bretanha e o Unitarismo na
América, moldaram significativamente o desenvolvimento do liberalismo naquele país.

O idealismo ético de Kant e a rejeição de todo raciocínio transcendental sobre


a religião tiveram o efeito de limitar o conhecimento e abrir o caminho para a fé.
Schleiermacher introduziu a ideia de religião como uma condição do coração cuja
essência é o sentimento. Isso tornou a doutrina cristã independente dos sistemas
filosóficos e da fé uma questão de experiência individual de dependência de Deus.
Jesus foi a realização perfeita do ideal de uma nova vida de comunhão espiritual com
Deus, e essa possibilidade também existia para aqueles que foram atraídos para a
comunhão com ele na igreja.
21

Hegel foi em outra direção com seu idealismo absoluto, já que enfatizava a
existência de uma estrutura racional no mundo separada das mentes individuais de
seus habitantes. O que é real é racional, e toda realidade é a manifestação da ideia
absoluta ou da mente divina. Por meio de um processo dialético de vazante e fluxo da
luta histórica, a razão está gradualmente superando o irracional e o bem está
triunfando sobre o mal. As principais contribuições do idealismo hegeliano foram o
apoio à ideia da imanência divina e a promoção da crítica histórica e bíblica.

As ideias de Ferdinand Christian Baur e da Escola de Tubingen sobre as


origens e o desenvolvimento inicial do Cristianismo e do Novo Testamento seguiram
os princípios da evolução histórica hegeliana. O Cristianismo era simplesmente visto
como o cumprimento histórico da religião natural, a autorrevelação culminante do
Espírito imanente. A partir da produção literária do teólogo David Friedrich Strauss,
levada adiante pelo escritor Ernest Renan e pelo historiador John Robert Seeley, a
“vida de Jesus” foi estudada com o intuito de despir as formulações dogmáticas da
Igreja e voltar ao concreto, histórico personagem humano. Eles encontraram
escondido atrás da cortina de fumaça da teologia e da filosofia helenística o ensino de
uma religião ética simples resumida na paternidade de Deus e na fraternidade do
homem. Insistindo em que o Cristianismo deve ser fundamentado no tipo exato de
pessoa que ele era, eles sentiram que era necessário ir do “Cristo dos credos” para o
“Jesus da história”.

A influência de Hegel foi quebrada pelo escritor Friedrich Wilhelm Ritschl, que
enfatizou a importância da fé e da experiência religiosa. Ele apoiou a afirmação do
Cristianismo de singularidade, mas argumentou que a experiência cristã deveria ser
baseada em dados objetivos da história, não em sentimentos pessoais. Ele via o
Cristianismo como uma vida de ação que libertaria o homem das paixões
escravizantes de sua própria natureza e do determinismo de seu ambiente físico.
Declarações religiosas são julgamentos de valor relacionados à situação espiritual de
uma pessoa e têm consequências práticas. Sua teologia de valores morais relaciona
o evangelho a dois polos, a obra redentora de Cristo e a comunhão das pessoas
redimidas (o reino de Deus). No reino, a pessoa atinge a perfeição moral e, portanto,
é como Cristo. Deus é imanente, transcendente e pessoal ao mesmo tempo.

Os liberais receberam bem as descobertas da ciência e prontamente se


acomodaram ao desafio do darwinismo. A evolução vindicou a imanência divina, pois
22

explicava como Deus lentamente construiu o universo por meio da lei natural. Ele
também se revelou por meio de um processo evolutivo, à medida que os israelitas
começaram com ideias retrógradas e sedentas de sangue e gradualmente foram
compreendendo que o Deus justo só poderia ser servido por aqueles que são justos,
misericordiosos e humildes. Por fim, Jesus o retratou como o Pai amoroso de todos
os homens. Assim, a redenção foi a transformação gradual do homem de um estado
primitivo para aquele de filiação obediente a Deus. A abordagem científica foi aplicada
à teologia e à crítica bíblica, e eles foram considerados abertos a toda a verdade.
Assim como o reino físico, a cultura e a religião evoluíram, e não havia antagonismo
fundamental entre os reinos da fé e a lei natural.

O liberalismo prevaleceu também no protestantismo francês, onde Auguste


Sabatier ensinou que a religião deveria ser entendida como vida e não como doutrina.
Deveria ser apreendida por meio da psicologia religiosa e do estudo histórico dos
documentos nos quais a consciência religiosa do passado deixou uma marca. De
acordo com Alfred Loisy, a essência do Cristianismo está na fé contínua da igreja, e
não exclusivamente nos ensinamentos de Jesus, e é constantemente remodelada
pelo presente.

O liberalismo britânico estava relacionado à tradição latitudinária e foi


encontrado entre os membros da Igreja Ampla, como Benjamin Jowett, que enfatizou
uma definição vaga de dogma. O modernismo anglicano era nitidamente britânico,
individualista e transigente, tendendo a combinar a humanidade natural de Jesus com
uma doutrina de sua divindade. Talvez o liberal mais controverso tenha sido Reginald
John Campbell, um pregador do início do século XX conhecido por seu “dualismo
prático” que fazia as pessoas pensarem que Deus está acima e à parte de seu mundo,
em vez de se expressar através de seu mundo. Ele enfatizou a unidade interior de
Deus, homem e universo quase reduzindo sua teologia a uma espécie de panteísmo.
Em geral, o liberalismo britânico tendia a ser teórico e acadêmico e mais moderado
em seu entusiasmo humanístico aberto.

Nos Estados Unidos, a principal fonte de ideias religiosas liberais era o


unitarismo, que já havia modificado as doutrinas da soberania divina, do pecado
humano e da revelação bíblica antes que o pensamento alemão começasse a
despontar. Na década de 1890, a maioria dos principais teólogos havia estudado na
Alemanha, e muitos deles passaram a aceitar os princípios do darwinismo. O
23

liberalismo americano foi caracterizado por um forte senso de ativismo e um


sentimento de que Deus está presente e ativo nos grandes avanços da cultura
humana.

Os teólogos liberais se preocuparam em construir o reino de Deus e promover


o liberalismo aplicado conhecido como evangelho social. Isso enfatizou a necessidade
de modificar a sociedade corrupta que, por sua vez, estava corrompendo o homem.
Os evangelistas sociais falavam do reino onde os homens viveriam como irmãos em
espírito de cooperação, amor e justiça. A igreja deve deixar de salvar pecadores
individuais para a ação coletiva de salvar a sociedade. Alcançar uma vida melhor na
terra substituiu a preocupação com a vida após a morte, e esperava-se que Cristo e
os valores cristãos conquistassem o mundo. O progresso pode ser visto no avanço da
democracia política, o movimento pela paz mundial e os esforços para acabar com a
discriminação racial.

Na época da Primeira Guerra Mundial, o liberalismo havia feito incursões


consideráveis nas igrejas protestantes na Europa e na América do Norte, mas se
apoiava em fundações instáveis. A Primeira Guerra Mundial destruiu o otimismo
inebriante que era seu estoque, enquanto os conservadores contra-atacavam.
Frequentemente chamados de fundamentalistas, confessionalistas ou pietistas, eles
denunciaram o liberalismo por ser, como disse John Gresham Machen, importante
teólogo do começo do século XX, “uma religião que é totalmente diferente do
cristianismo a ponto de pertencer a uma categoria distinta”.

Embora o desafio fundamentalista tenha sido mais ou menos derrotado, uma


ameaça mais séria veio dos sofisticados teólogos da neo-ortodoxia que clamavam
pela recuperação da transcendência divina e por uma doutrina realista do pecado. O
liberalismo, com sua ênfase na liberdade e autodeterminação do homem, deu sanção
religiosa aos esforços do homem moderno para controlar sua vida pela razão
autônoma e melhorar as condições confiando em sua própria bondade, mas tentou
negar o poder esmagador do pecado e do mal que frustra repetidamente as
aspirações humanas. Os neo-ortodoxos sugeriram que os liberais não conseguiram
entender nem a condição real dos homens nem a doutrina de Deus que poderia
fornecer um remédio para isso. O cristianismo foi transformado em um humanismo
ético nobre que ofereceu pouco para aqueles que se envolveram nas angústias da
24

vida moderna e, em seus esforços para não separar o sagrado do secular, identificou
muito intimamente um com o outro.

O liberalismo também se tornou muito dependente de encontrar o Jesus


histórico e, como Albert Schweitzer mostrou, o Jesus que os pesquisadores estavam
descobrindo possuía uma visão de mundo apocalíptica e suposições que eram
bastante diferentes da concepção de seu ensino. A escola de história das religiões
levou a ideia do desenvolvimento histórico ao seu fim lógico e retratou o Cristianismo
como a religião sincrética do antigo Oriente Próximo. Isso significava a negação de
sua distinção e da autoridade do cânon bíblico. O Cristianismo era apenas uma entre
muitas religiões, todas elas relativas à sua época e circunstância e, portanto, não tinha
pretensão de finalidade.

No entanto, o liberalismo não morreu. Um grupo de “liberais evangélicos” nos


Estados Unidos, começou a pregar um Deus que era imanente e transcendente, que
Jesus, a Bíblia e o Cristianismo eram únicos, e que Jesus deveria ser aceito como
Senhor da vida de alguém. Uma nova geração de “neoliberais” criticou o velho
modernismo por sua preocupação excessiva com intelectualismo, sentimentalismo,
um conceito diluído de Deus e acomodação ao mundo moderno que o impedia de
lançar um ataque moral contra a corrupção humana.

Na Alemanha, a erudição liberal foi dominada por gigantes como Bultmann,


com sua ênfase na crítica da forma e desmitologização do NT para que o homem
moderno pudesse entender o que é a fé cristã, e Paul Tillich, que estava preocupado
com o último, a base do ser, e sugeriu que Deus não pode ser descrito em símbolos
que duram de era em era, mas só podem ser encontrados pela experiência. Dietrich
Bonhoeffer apresentou a ideia de um cristianismo sem religião, onde a igreja deve se
preocupar com Cristo e não com as ideias religiosas. Vivemos em um mundo que
atingiu a maioridade e devemos rejeitar o caminho da religião, que é uma muleta
psicológica. Os cristãos devem dar um passo de fé e seguir aquele que é “o homem
para os outros” em um discipulado caro.

Na década de 1960, a maioria dos liberais havia abandonado o otimismo


humanista, o imanentismo cultural progressivo e o sonho de um reino terreno, mas
não deram nenhuma base à interpretação não literal da Bíblia. Muitos tinham um
interesse renovado pela teologia natural e enfatizaram a importância da mudança
25

social. Os teólogos “radicais” e “seculares” falaram sobre o conceito tradicional de


Deus como estando “morto” nesta era secular e glorificado no Deus que vem a nós
nos eventos de mudança social. Eles estavam otimistas quanto às possibilidades
criativas abertas ao homem secular, consideravam o amor a norma suficiente de
comportamento ético e reafirmavam o senhorio de Cristo e seu chamado ao
discipulado.

2.2 Neo-ortodoxia

O século XX foi um tempo de muitas incertezas. As verdades fundantes da


sociedade foram eclipsadas e, com isso, um subjetivismo tomou conta da mente de
muitos. Não o subjetivismo romântico alemão do século XVII, mas uma espécie de
culto ao absurdo da existência, na qual a objetividade da verdade e a
sobrenaturalidade do transcendente foram lançadas para a distante periferia das
consciências individuais, enquanto se buscava um sentido intra-histórico e imanente
para o imediatismo que se punha diante de todos.

E sob este pano de fundo que se pode perceber o nascimento de uma forma
de compreender o mundo, uma nova cosmovisão que permitiu ver na fé, não mais
uma simples vindicação ética ou uma exteriorização das impressões interiores e
afetivas dos seres humanos, mas uma fé que possui um objeto determinado e próprio:
a Palavra divina par excellence (por excelência), encarnada na Pessoa de Jesus
Cristo. Nesse contexto, dois autores se destacaram: Karl Barth e Emil Brunner.

Karl Barth era filho de Fritz Barth, um ministro reformado e professor na


Universidade de Bern e Anna Sartorius. Como membro da Igreja Reformada Suíça,
recebeu sua educação inicial de seu pastor, Robert Aeschbacher. Após passar pelas
universidades de Bern, Berlim e Tübingen, recebeu em 1909 seu bacharelado. Após
seus estudos serem concluídos, foi enviado a uma paróquia reformada em Genebra
para ser pastor assistente. Em 1911, passou a pastorear uma igreja reformada em
Safenwill, no interior da Suíça. Deparando-se com a realidade precária e deficitária do
26

povo, passou a se envolver com questões profundamente sociais. Não obstante, com
o início da Primeira Guerra Mundial, contemplou sua fé marcantemente liberal e
influenciada por Adolf Von Harnack (1851-1930) ser drasticamente abalada.

Durante quatro anos, após Barth perceber que sua teologia de cunho liberal em
nada podia auxiliar o povo pobre de sua cidade, estudou o filósofo Kierkegaard,
enquanto seu amigo, Eduard Thurneysen (1888-1977) estudava as obras românticas
de Dostoievski. Acompanhado de Kierkegaard, grande influência exerceram os
escritos de Lutero e Calvino sobre Barth. E como resultado de tais estudos, Barth
publicou, em 1919, a Der Römerbrief (Carta aos romanos), com uma edição
totalmente reformulada em 1922. Tem-se aqui o início do que ficou conhecido como
Teologia Dialética, a qual enfatiza o paradoxo da fé (conceito recebido diretamente de
Kierkegaard), na qual duas ideias ou proposições de fé são aceitas enquanto
antinômicas e verazes.

A dialética barthiana é a dialética das ideias que conversam entre si, sem,
porém, chegarem em um “acordo” ou síntese, no sentido hegeliano do termo. Assim,
o Deus que era totalmente outro se fez carne e fraqueza; o ser humano justificado
permanece pecador (ideia recebida de Lutero, simul justus et peccator,
simultaneamente justo e pecador); Jesus Cristo é Deus e homem verdadeiramente
em uma única e simples subsistência; a Trindade é Una e Trina na diversidade das
subsistências e unidade da essência. Assim, para Barth, a fé só poderia ser
compreendida por meio dos paradoxos antinomistas, e a teologia só poderia atuar em
um ambiente como este: de profunda reverência ante o misterium tremmendum
(mistério tremendo), para utilizar-se do conceito de Rudolf Otto.

“Jesus Cristo, nosso Senhor”: este é o evangelho e


o sentido da história; neste nome encontram-se e
separam-se dois mundos; interceptam-se dois
planos. Um conhecido e outro desconhecido.
Nós temos que começar com a admissão de que,
nós mesmos, não sabemos o que dizemos quando
dizemos “Deus”, isto é, que tudo que achamos que
sabemos quando dizemos “Deus” não O atinge e O
compreende a Ele a Quem é chamado “Deus” no
símbolo [...]
[...] Deus como Pai não é apenas manifesto a nós
em revelação, nos é manifesto apenas como o Deus
que permanece escondido de nós mesmos em Sua
revelação e, ali no revelar a Si mesmo, oculta a Si
27

mesmo; no ficar próximo a nós, permanece longe de


nós.
Em 1922, Barth foi convidado a ser preletor de Teologia Reformada na
Universidade de Göttingen, e ao preparar suas preleções sobre a teologia dos
reformadores, houve o que Franklin Ferreira chama de uma “verdadeira renascença
no estudo de Calvino”. Em 1931 publica Fides Quarens Intellectum (Fé em busca de
Compreensão), obra na qual comenta o Proslogion (diálogo) de Anselmo de
Cantuária. É nessa época que ele começa a se distanciar de seus colegas Emil
Brunner (1886-1966) e Rudolf Bultmann (1884-1976) por conta das divergências de
pensamento. Nesta obra, Barth elaborou a sua conhecida Teologia da Palavra. A
tarefa do teólogo é, assim segundo Barth, litúrgica, pois é feita em um ambiente de
humildade frente ao mistério divino em Jesus Cristo, a Palavra Divina. A ênfase de
Barth não mais estava na distância infinita entre a criatura e o criador, mas, na
verdade, do conhecimento de Deus unicamente possível em Cristo, o Verbo feito
humano. A teologia, para Barth, era, pois, uma cristologia. Assim, a Palavra divina foi
identificada com o Cristo e toda a teologia deveria, como em um caudal, desembocar
no conhecimento de Deus em Jesus Cristo.

Em 1927, Barth publicou o primeiro volume de sua Die Christliche Dogmatik


(Dogmática Cristã). Após ser criticado reiniciou seu trabalho em 1932 com o novo
título Die Kirchliche Dogmatik (Dogmática Eclesiástica), obra monumental em quatro
grandes partes, porém, incompleta, visto ter Barth falecido antes de finalizá-la, mas
que compreende o ápice de seu pensamento e reflexão teológica em o mais alto grau
de desenvolvimento.

Para Barth, a questão decisiva na discussão sobre o relacionamento entre


Palavra divina e proclamação da Igreja está no evento. A igreja realiza sua real
atividade no ato da proclamação. A Palavra de Deus surge na proclamação da igreja
como a pressuposição de sua existência, implicando quatro coisas: que a palavra de
Deus é um comissionamento; que a Palavra de Deus será o tema da proclamação;
que a palavra de Deus será o parâmetro de juízo da proclamação e, que a Palavra
será um evento na proclamação, visto que na palavra humana a Palavra divina se faz
presente.

A exposição segue a tratar da Palavra escrita, que, para Barth, envolve a


proclamação, visto que o ato de proclamar da igreja não se dá em um vácuo, mas
28

repousa na coleção de revelação já disponível na Igreja – o cânon bíblico. Embora as


Escrituras sejam partes da proclamação como testemunhas da Revelação por
excelência, elas são por sua apostolicidade, também reguladoras da proclamação da
comunidade que realiza a sua existência no proclamar. As tradições não formam um
conteúdo subsistente por si para a proclamação da igreja, pois se a parte das
Escrituras falam por si deixam de estar em diálogo com a Palavra e se tornam um
monólogo infrutífero para o uso da comunidade. As Escrituras, por sua vez não
formam uma entidade mecânica, mas uma realidade dinâmica em virtude de seu
conteúdo e de suas possibilidades como evento revelacional – evento em que se
aceita a Escritura como Palavra de Deus pela fé.

A terceira e última forma analisada é a Palavra Revelada que manifesta o


próprio Deus em evento único e singular. Para Barth, a Escritura aponta para a
realização de tal evento e se torna um com o evento mesmo. Para o autor, a revelação
“abrange” a Escritura como evento revelacional e dirige o olhar daquele que se
aproxima do texto com fé, para além, para o Deus revelatur (Deus revelado) que se
dá a conhecer em evento. Por fim, em sentido absoluto a revelação é encarnação
atestada pela Escritura e pela proclamação da igreja.

Barth ainda reserva algumas reflexões concernentes à unidade das formas da


Palavra divina. A Palavra não se dá a conhecer em separado, mas como unidade
perfeita de operações distinguidas. Em analogia com a Trindade, sempre na
proclamação haverá atestação com a revelação e na revelação atestação da
proclamação.

Emil Brunner (1886-1966) foi um teólogo suíço que esteve em profundo contato
com Karl Barth e que pode ser considerado, acompanhado de Barth, o precursor da
teologia dialética, chamada por ele de Teologia da Crise. Após o rompimento com Karl
Barth por volta de 1931, Brunner se torna o maior representante da Teologia da Crise
na era moderna.

A doutrina da revelação de Brunner é estabelecida sobre os alicerces de sua


epistemologia. Para Brunner, “utilizando-se do próprio conhecimento, o homem pode
apoderar-se apenas do mundo”. (BRUNNER, 2020, p 87, 2 v). Deus, entretanto, não
é o mundo, mas o transcende infinitamente. É necessário, portanto, que haja um
movimento de descida, de “encontro”, a fim de que o ser humano possa apreender
29

algo acerca de Deus, e que não pode ser realizado pelo indivíduo, mas somente pelo
Eterno. O conhecimento de Deus só é possível no âmbito de uma auto manifestação
dele próprio. A verdadeira doutrina sobre Deus procede, dele mesmo e aponta para
além de si mesma, para a realidade supra histórica e supramundana da vida divina.

Essa revelação, por se tratar da descida de Deus ao mundo dos seres


humanos, não pode ser confinada às categorias humanas, mas só pode ser uma
Pessoa: Jesus Cristo encarnado. A realidade da encarnação se encontra na base de
toda a manifestação divina ao mundo. Logo, a “Palavra de Deus”, a “[...] decisiva
autocomunicação de Deus, é uma Pessoa, uma existência humana, um homem em
quem o próprio Deus nos encontra”. Deus encontra o ser humano em Jesus Cristo, e
esse encontro pode ser considerado a revelação propriamente dita: quando a fé do
crente se encontra, no Filho de Deus encarnado, o Deus que se dá a conhecer ao
crente, aqui reside o conceito de revelação de Brunner.

Em um apêndice ao capítulo XIV de seu primeiro volume de sua Dogmática,


Emil Brunner trata da Transcendência divina e da analogia entis (analogia do ser),
polêmica comum dos teólogos dialéticos, e cabe ao pesquisador analisar
panoramicamente a compreensão de Brunner de tal conceito filosófico e sua
implicação para a teologia cristã.

Brunner inicia diferenciando os conceitos de “transcendência da essência” e


“transcendência do ser”. Segundo ele, a “transcendência da essência” significa que o
existir de Deus é completamente diferente da existência das criaturas, assim como a
essência do Sujeito Criador difere da essência do Sujeito Criado. A “transcendência
do ser”, conceito adotado por Karl Barth, compreende que Deus é infinitamente
separado do mundo, pois o ser divino não possui nenhum contato com o ser das
naturezas criadas. Brunner, entretanto, afirma que a “transcendência do ser” conduz,
erroneamente, a uma ideia deísta extremada da divindade.

O autor admite uma possível abordagem da analogia entis (analogia do ser)


que vê no ser divino uma semelhança com o ser dos entes criados. Ele compreende
que as Escrituras testificam do fato de uma certa analogia entre o Criador e as
criaturas, pois “[...] Deus, o Criador, estampou a marca de Sua natureza sobre Sua
criação” (BRUNNER, 2020, p 127, v 3). Barth, na opinião de Brunner, se equivocou a
postular uma analogia fidei (analogia da fé) prescindindo de uma analogia entis
30

(analogia do ser). “Fé é certamente a pressuposição do correto conhecimento; mas a


própria analogia, desde a, e através da Criação, está nas criaturas em si” (BRUNNER,
2020, p 127, v 3).

E quanto às Escrituras? Brunner entende a Bíblia como a testemunha fiel da


revelação, pois a “comunidade dos próprios fiéis [...] não é a religião de um Livro”. As
Escrituras testemunham da revelação divina e somente em sentido secundário podem
ser chamadas de a Palavra divina. Brunner aponta, por fim, para o fato de que é na
multiplicidade dos testemunhos escriturísticos que se pode entrever a unidade da fé
na Palavra divina humanada em Jesus Cristo. Somente em Jesus Cristo Deus se torna
“para os crentes” strictu sensu (em sentido estrito), enquanto Deus favorável ao ser
humano. Brunner compreende a revelação em palavra escrita como sinônimo de
revelação na Antiga Aliança. E nisto ele vê o duplo aspecto desta revelação antiga: o
aspecto positivo, em que a linguagem humana se torna elemento distintivo, a fim de
expressar a pessoalidade do Revelador e de sua auto manifestação; e em seu aspecto
negativo, em que nem a palavra e nem a linguagem estão “adequadas ao mistério de
Deus enquanto Pessoa” (BRUNNER, 2020, p 96, v 2). Por isso, Brunner vê no mistério
da encarnação da Palavra divina o evento revelacional por excelência. A Bíblia como
testemunho apostólico é como que a palavra fiel que aponta para a Palavra, sem a
qual toda a linguagem é nula.

2.3 Teologia da Esperança

Falar da Teologia da Esperança é falar da teologia de Jürgen Moltmann. Jürgen


Moltmann é um dos teólogos mais respeitados e influentes do mundo contemporâneo,
possui uma teologia expressiva. Como ressalta Battista Mondin (2003), talvez seja a
figura mais representativa da teologia protestante contemporânea, depois de grandes
líderes anteriores como Barth, Tillich e Bonhoeffer (MONDIN, 2003). É de confissão
cristã reformada, nascido em 18 de abril de 1926 na cidade de Hamburgo, Alemanha.
Logo cedo, aos dezessete anos, após ver a sua cidade destruída em julho de 1943 e,
também, por ser soldado recém-incorporado, foi convocado para o front do exército
31

alemão, no qual, depois de seis meses, foi feito prisioneiro e levado ao campo de
concentração de Northon Camp, na Inglaterra.

Dentre os prisioneiros deste campo destacavam-se alguns professores de


teologia, através dos quais, depois de forte experiência, teve a possibilidade de iniciar
seus estudos teológicos, cujas esperanças foram se manifestando e se construindo.
Já em 1948 voltou à Alemanha e decidiu por prosseguir seus estudos em Göttingen
até 1952, ano em que os concluiu. Academicamente, ensinou História dos Dogmas e
Teologia Sistemática na Kirchiliche Hochschule de Wuppertal, onde foi colega de
Wolfhart Pannenberg. Ali permaneceu de 1958 até 1963, ano em que foi chamado
para a Universidade de Bonn. Mais tarde, desde 1967, tornou-se professor na
Universidade de Tübingen. Também no período de 1967-1968 foi convidado na
condição de professor visitante a Duke University, EUA. Jürgen Moltmann é casado
com Elizabeth Moltmann-Wendel, também doutora em teologia, escritora e
professora.

O ponto inicial de sua carreira teológica e que marca a sua ligação com a
corrente teológica citada acima é com a publicação de sua obra Teologia da
Esperança (Theologie der Hoffnung), em 1964. Nela, o tema da esperança aparece
como elemento hermenêutico, levando-a, assim, ao centro da teologia, conforme suas
palavras: “já não mais teorizava sobre a esperança, mas a partir dela” (MOLTMANN,
1991, p. 56). Ou também: “O todo da teologia em um único enfoque” (MOLTMANN,
2011, p. 79). É um teólogo que possui uma grande aceitação no meio católico, pelo
seu comportamento ecumênico e possui um importante diálogo com a Teologia da
Libertação.

Ao dizer isso, Moltmann nos insere dentro do contexto de sua obra. Como ele
mesmo diz, ele não é apenas o único autor, mas como todos os leitores, ele foi
influenciado por ela. Em algumas vezes, durante os anos que se seguiram após a
obra, ele mudou de posturas em relação à esperança, fato que ocorreu pelo retorno
que sua obra lhe trouxe quando entrou em contato com outros horizontes e com outras
visões hodiernas da teologia. Por estas visões hodiernas da teologia entendemos os
movimentos e correntes teológicas que o autor manteve diálogo ao longo de sua vida,
conforme ele mesmo destaca várias vezes: a Teologia da Libertação, a Teologia
Política, a Teologia Negra, a Teologia Feminista etc.
32

Sem falar das constantes mudanças no cenário político mundial, que provoca,
por parte da Igreja e por parte da teologia, uma postura de atitude concreta. Sobre
essas questões, ele as descreve como algo positivo, o que demonstra uma teologia
aberta aos novos descobrimentos, além de um constante diálogo com o mundo
contemporâneo.

A esperança sempre fez parte da vida do autor, sobretudo no período de guerra


e pós-guerra (KUZMA, 2008). No entanto, o surgimento da Teologia da Esperança,
de maneira mais sistemática, ocorre entre os anos de 1958 e 1964, quando se discutia
entre os editores do periódico Evangelische Theologie as controvérsias existentes
entre a Teologia do Antigo Testamento, de Gerhard von Rad e, a Teologia do Novo
Testamento, de Rudolf Bultmann, com o objetivo de chegar a uma teologia sistemática
que fosse biblicamente fundamentada. A questão central da discussão era a
compreensão da história. “O que estava em jogo era nada menos do que a superação
do existencialismo generalizado do período pós-guerra, visando à obtenção de
perspectivas de futuro para um mundo mais justo, mais pacífico e mais humano”
(MOLTMANN, 2011, p. 105).

2.4 Rudolph Bultmann

Frequentemente, o nome de Bultmann é associado ao campo da exegese.


Esse entendimento é correto, mas insuficiente. Acima de tudo, Bultmann queria ser
teólogo. No entanto, antes de se especializar como tal, teve que se formar em várias
disciplinas filosóficas, históricas e teológicas, nas quais predominavam várias
correntes do protestantismo liberal. Consequentemente, o interesse predominante em
seu trabalho científico foi dominado pela questão de como reconciliar história e fé. É
nesse quadro que se enquadram seus cuidadosos estudos exegéticos.
33

Bultmann, depois de aceitar as críticas de Barth ao protestantismo liberal e sua


interpretação kierkegaardiana de Paulo, deixou de ser o fiel seguidor da escola da
história das religiões que fora antes. No entanto, rejeitou a identificação barthiana da
Palavra de Deus com as Escrituras (que a seu ver não levava em consideração o
caráter falível do autor humano) e, ao aplicar métodos críticos à Bíblia, orientou sua
pesquisa e seu pensamento teológico sobre a existência humana por meio de uma
teoria da história e da existência. Ele tirou essa teoria primeiro da teologia
protoexistencialista de seu antigo professor em Marburg, o teólogo neokantiano
Wilhelm Herrmann. Mais tarde, ele o esclareceu lendo Dilthey e Graf Yorck, e o refinou
em extensas discussões.

O fato de que Bultmann estava principalmente preocupado com o problema do


conhecimento de Deus é importante, porque para falar de sua concepção do homem
é necessário primeiro falar do que era a teologia para ele. Este é um ponto de
interesse especial, uma vez que a afirmação de que Bultmann reduz a teologia a uma
antropologia é quase lugar-comum. Estamos diante de uma questão delicada, já que
esta é uma das acusações mais difundidas contra o teólogo alemão (daí Barth, que
acusa Bultmann de negar a transcendência radical de Jesus Cristo, introduzindo-a em
esquemas puramente antropológicos). Certamente, nem todos compartilham dessa
crítica, a começar por ele mesmo, que rejeitou expressamente tal acusação. No
entanto, não há dúvida de que os limites não são totalmente claros, e, pelo menos,
confusos. Bultmann concorda com Barth que o sujeito da teologia é Deus, e
acrescentou com a tradição luterana que a teologia fala de Deus “quando fala de o
homem como ele está diante de Deus; portanto, da fé” (BULTMANN, 2019, p 84). Mas,
para Bultmann, falar de Deus só é possível quando se fala de nós mesmos. Sua
afirmação fundamental é esta: “Se a teologia não deve especular sobre Deus, nem
falar do conceito de Deus, mas do Deus real, então, ao falar de Deus, deve falar ao
mesmo tempo do homem” (BULTMANN, 2019, p 84). Para compreender esse
aparente paradoxo, devemos partir do conceito que Bultmann tem de Deus. Deus é
para ele o outro completamente que transcende o mundo. Portanto, nunca pode ser
um objeto do pensamento humano, porque se limita aos objetos encontrados no
mundo, na história. Se Deus se tornasse algo que a mente humana pudesse conceber,
naquele mesmo momento ele deixaria de ser Deus:
34

Falar sobre Deus de forma significativa é tão


impossível quanto falar sobre amor. Com efeito,
também não é possível falar de amor, a não ser que
o que se diz a respeito seja ato de quem ama.
Qualquer outra linguagem sobre o amor não é falar
sobre o amor, uma vez que está situado fora do
amor... [Amor] não pode ser mais do que uma
determinação da própria vida; Eu só existo na
medida em que amo ou sou amado, não ao lado ou
em segundo plano. O mesmo acontece com a
relação de paternidade e filiação. (BULTMANN,
2019, p 84)
Se não se pode falar de amor e, portanto, conhecer o amor, visto que só se
pode amar e ser amado, muito menos se pode falar de Deus. Surge então a questão:
como é possível que Deus seja a principal preocupação da teologia se está além da
mente humana? Bultmann considera que para dar uma resposta adequada a esta
questão é necessário focalizar o homem a partir desta outra questão: o que é que o
homem pode pensar? Bultmann dirá que, entre outras coisas, ele pode pensar sobre
a existência humana e, especificamente, sobre a existência humana no mundo.
Portanto, embora Deus não possa ser o objeto do pensamento humano, Deus pode,
no entanto, ser conhecido pela existência humana como aquele que determina essa
existência. Embora Deus transcenda radicalmente o mundo, Ele determina a
existência do homem no mundo. Em outras palavras, embora não se possa falar de
Deus, o homem pode encontrá-lo no imediatismo e na intimidade. No momento desse
encontro, conhece-se a Deus como Senhor da própria existência, e a partir desse
momento pode-se falar sobre Deus porque se pode falar da própria existência
determinada por Ele. O encontro com Deus como o “completamente outro” representa
o homem determinado de além de si mesmo. Existe algo que não é em si. O Deus
que é algo completamente diferente é um ídolo; só o Deus que me encontra como
aquele que é completamente outro é Deus. Somente quando alguém se conhece
como alguém a quem Deus se dirigiu em sua própria vida, faz sentido falar de Deus
como o senhor da realidade:

Não podemos dizer nada sobre a nossa existência,


porque nada podemos dizer sobre Deus; e não
podemos dizer nada sobre Deus, porque não
podemos dizer nada sobre nossa existência. Só
poderíamos fazer um se pudéssemos fazer o outro.
Se pudéssemos falar de Deus por meio de Deus,
também poderíamos falar de nossa existência e
vice-versa. Em qualquer caso, nossas palavras
sobre Deus, se possível, também devem ser
35

palavras sobre nós mesmos. Portanto, permanece


em vigor que, quando se pergunta como é possível
falar de Deus, é necessário responder: apenas
falando de nós mesmos. (BULTMANN, 2019, p.
93)
Só a ideia de Deus que pode encontrar, que pode
procurar e encontrar, o incondicional no condicional,
o além no aqui, o transcendente no presente que
está disponível, como possibilidade de encontro, é
possível ao homem moderno. O que resta para si
mesmo é permanecer aberto a qualquer momento
para encontrar Deus no mundo, no tempo. Não é o
reconhecimento de uma imagem de Deus, sempre
tão correta, que é a verdadeira fé em Deus; antes, é
a prontidão para o Eterno nos encontrar a qualquer
momento do presente, a qualquer momento nas
várias situações de nossa vida. A prontidão consiste
na abertura para permitir que algo nos encontre
realmente e não nos deixe só, o eu que se encerra
nos seus propósitos e planos, mas no encontro com
aquele que se destina a nos transformar, a nos fazer
novos eu. (BULTMANN, 2019, p. 102)
Portanto, não podemos falar de Deus ou de nossa existência, porque Deus
determina nossa existência. Se fazemos de nossa existência um objeto de reflexão,
também fazemos de Deus um objeto de reflexão e perdemos Deus. Deus nunca é
algo que se veja de fora, algo à nossa disposição, “objetivo”. A revelação de Deus não
seria a revelação de Deus se falássemos dela em afirmações gerais, “com afirmações
e verdades gerais, que não se relacionam com a situação existencial concreta do
locutor”.

Essa convicção é clara para Bultmann, na medida em que afirma que o Novo
Testamento nunca fala de Deus de uma maneira e do homem de outra completamente
diferente. Deus então não pode ser conhecido como aquele que determina a
existência humana por meio da filosofia. Mas apenas por meio da fé cristã. A filosofia
pode analisar a existência humana em sua realidade e potencial, mas não pode
analisá-la como determinada por Deus. Só a fé pode fazer isso, pois só a fé pode
conhecer a Deus como aquele que determina a existência humana. Visto que o
homem de fé ainda é um homem, ele não pode, mesmo como um homem de fé,
conhecer a Deus como o objeto de seu pensamento; ele só pode conhecer a Deus
como o determinante de sua existência. Você só pode conhecer a Deus nesses
termos. Consequentemente, para o homem que deseja fazer teologia, sua
preocupação central será Deus como aquele que determina sua existência humana
36

no mundo; o objeto direto de seu pensamento é a existência humana no mundo


conforme determinado por Deus. Sintetizando, podemos dizer que para Bultmann a
preocupação central da teologia é Deus, não o homem; mas Deus é conhecido por
determinar a existência humana no mundo. No entanto, o objeto de uma análise
existencial do homem é o homem; e, da mesma forma, o homem é o objeto da teologia
(BULTMANN, 2019).

2.5 Teologia da libertação e Missão Integral

Começaremos essa seção tratando da Teologia da Libertação. A Teologia da


Libertação é um movimento que reúne e mescla diversas teologias cristãs
desenvolvidas no Terceiro Mundo a partir dos anos 70 do século XX, fundamentada
na opção pelos pobres, contra a pobreza e pela libertação. Ela se desenvolve
primeiramente na América Latina.

De acordo com Francisco Catão (1986), “a Teologia da Libertação é a resposta


à problemática pastoral da Igreja, especialmente colocada no contexto latino-
americano, em que a luta pela libertação constitui uma exigência fundamental do
Evangelho e uma antecipação do Reino de Deus”. E para tanto deve ser explorada e
discutida com afinco diante das questões que encabeçam o nascimento da Teologia
da Libertação.

Segundo Schall (2020), a Teologia da Libertação nasce na América Latina num


contexto histórico bem definido. Schall acrescenta ainda que três pontos são cruciais
para o desenvolvimento desta teologia: a situação política, econômica e social do
continente, que no momento de sua gênese estavam gestados em regimes militares
que governavam países do continente; o desenvolvimento do marxismo como
instrumento de análise social; e as mudanças no âmbito da Igreja Católica, que, do
ponto de vista católico, possibilitaram então o surgimento da Teologia da Libertação
(SCHALL, 2020, p. 38).
37

Para ficar ainda mais claro Leonardo Boff, ao falar dessa “nova” teologia, diz
que “não se trata de uma outra fé, mas da fé dos apóstolos e da Igreja articulada com
as angústias e as esperanças de libertação dos oprimidos” (BOFF, 1979, p. 18).

No ano de 1979 o processo de regulamento da Teologia da Libertação continua


em ascensão através de uma Conferência do Episcopado latino-americano, realizado
em Puebla no México: “Em Puebla, a Igreja, encarregada de anunciar o Evangelho,
colabora, mediante uma radical conversão à justiça e ao amor, na transformação das
estruturas injustas da sociedade” (CATÃO, 1986, p. 22).

Dentre os nomes que se destacam na Teologia da Libertação podemos citar


Gustavo Gutiérrez e Leonardo Boff. Cada um, ao seu modo, engajou-se na luta pelas
massas pobres que não tinham voz e vez na América Latina”. Eles empregaram a
teologia como “um meio que pudesse fazer uma análise crítica da sociedade latino-
americana e assim reestruturar a Igreja Católica a partir de uma práxis afirmativa de
que o reino de Deus já estava se fazendo valer na América Latina, especialmente
entre os oprimidos.

Em paralelo a esse movimento católico, desenvolve-se uma teologia autóctone


de caráter reformista e evangélica, empenhada com o que chamavam de missão
integral da Igreja, e que foi delineada primariamente em discussões dos Congressos
Latino-Americano de Evangelização. O primeiro Congresso Latino-Americano de
Evangelização – CLADE I, (Bogotá, 1969) foi organizado pela Associação
Evangelística Billy Graham e sua principal discussão foi a prática da fé evangélica
com a realidade latino-americana.

O primeiro CLADE foi composto por diversos teólogos latino-americanos que


buscaram ajustar temáticas de evangelização e discussões acerca dos problemas
sociais da América Latina. Foi no CLADE I, que René Padilla, Samuel Escobar,
Orlando Costa, e outros, concordaram com a criação de uma fraternidade de teólogos,
que então proporcionaria um grupo de discussão e reflexão teológica isenta da
influência de teologias estrangeiras e pautada pela realidade social e econômica dos
povos latino-americanos.

Percebemos que, apesar de surgidas na mesma época e região e, apesar de


defenderem uma valorização das camadas sociais mais vulneráveis, a Teologia da
Libertação e Missão Integral são bem distintas entre si. Primeiro porque são
38

movimentos teológicos de tradições diferentes e segundo por conta da base em que


cada uma se projetou. A primeira centra-se na leitura marxista, na filosofia de grandes
pensadores, e no engajamento de lutas revolucionárias que circundavam a América
Latina e, a segunda se utiliza, basicamente apenas da Bíblia como referencial para
delinear a missão da Igreja, expressando-se com ações efetivas de evangelização e
responsabilidade social.

Sobre a Teologia da Libertação, Mendonça afirma que:

Numa voz mais aberta promove entre outras, a idéia


de um alavancamento da Igreja Católica dentro do
cenário político, apoiando para tanto as ideologias
marxistas. Dentro da dialética marxista, tal processo
passou a ser denominado “progressista”, em
oposição ao “conservadorismo”, [...]. O nome
libertação denota a libertação do ser humano de toda
e qualquer desigualdade social, hierárquica e
mesmo moral, não deixando de ter seu caráter
anárquico. (MENDONÇA, 2008, p 33)
A centralidade, portanto, dessa Teologia repousa na libertação do ser político
e social em meio as adversidades apresentadas no contexto da pobreza na América
Latina. Boff, um dos grandes nomes desse movimento, declara: “quando falo em
libertação eu entendo concretamente isso: acabar com o sistema de injustiça que é o
capitalismo. É libertar-se dele para criar em seu lugar uma nova sociedade, digamos
assim, uma sociedade socialista” (BOFF, 1979, p. 51). Nitidamente seus escritos
versam a libertação de um homem político.

Já na Teologia da Missão Integral, a igreja busca o desenvolvimento do ser,


através de e de uma teologia que abraça o envolvimento sociopolítico. Esse
envolvimento sociopolítico deve vir acompanhado de uma evangelização fiel e
relevante ao seu contexto, capaz de evidenciar claramente a preocupação holística
de Deus com todas as pessoas, bem como com a justiça. Eles buscam uma releitura
da Bíblia à luz do seu próprio crescimento, processo de reorganização e emergência
pública.
39

3. PRINCÍPIOS ÉTICOS E A CONTEMPORANEIDADE

Dentro de sua política social, o cristianismo tem em seus princípios, o cuidado


com o outro, incentivando os mais supridos utilizem suas posses para auxiliarem os
mais humildes e mais carentes, possibilitando a todos os seres humanos a terem os
mesmos direitos básicos de sobrevivência como: alimentação, moradia, roupas e o
mais importante, o direito de ser tratado com igualdade. Assim, dentre muitas práticas
cristãs, deveríamos aprimorar a prática da generosidade e da afetividade, construindo
um sentimento humano de ajuda ao outro e de resgate da dignidade humana, no qual
os mais fortes estendem as mãos para os mais fracos, possibilitando a todos os
mesmos direitos.

Os que são detentores de mais recursos e posses podem, através de seus


recursos, servir os que se encontram em situação desfavorável para a sobrevivência
com dignidade. O ser humano precisar ativar seu interesse em ajudar os
desfavorecidos de sua sociedade.

Tendo Deus como fonte maior de inspiração, o cristão busca estabelecer em


sua proposta de vida um formato de interação social que possibilite, de forma indireta
e direta, uma intervenção social sem nenhum tipo de favoritismo, ou busca de
recompensa, pois, para Lutero, o cristão age de modo alegre e “livremente, não para
juntar muitos bons méritos e boas obras, mas por ser para ele um prazer agradar a
Deus dessa maneira” (LUTERO, 2018, p. 83).

A conduta de vida de uma pessoa praticante da filosofia e da fé cristã, a prepara


para desenvolver um senso ético-moral de convívio social, pois é parte integrante de
sua fé. Tal entendimento parte do pressuposto de que a prioridade pela dignidade do
indivíduo como ser humano, imagem de seu criador, a saber Deus, por isso a sua
principal fonte geradora de princípios e valores, além das tradições das comunidades
de fé, é o próprio Deus.
40

3.1 Fé: instrumento do social

Sendo a fé um instrumento pessoal, as pessoas passam a lidar com um


sentimento interno que poderá se tornar uma ferramenta muito eficaz contra as
situações imorais que impregnam a sociedade.

O cristianismo, através do entrelaço que a fé “conseguiu” constituir em sua


comunidade, estabeleceu parâmetros eficazes de pensamento que possibilitaram às
pessoas, o entendimento da importância do outro em sua particularidade e na vida
social. Isso nos remete à importância do processo histórico da fé cristã e sua teologia,
para nortear princípios éticos de valores que poderão corroborar com construção de
uma filosofia e uma crença de vida pautada na valorização e priorização da existência
do ser humano. Assim, percebemos o papel importante que a igreja exerce na
sociedade; seus valores e princípios eclesiásticos podem contribuir para construção
de uma comunidade eticamente mais capaz de discutir as realidades sociais de forma
mais humanas, através de uma teologia cristã.

Todo o processo de estruturação social requer também uma intervenção


educacional. Podemos perceber isso também na modalidade de vida proposta pelo
cristianismo, onde as pessoas passam a ser reeducadas e inseridas na comunidade.
Esse processo não acontece como numa escola normal, mas acontece de forma
paulatina, onde o processo social, é modificado por sequências. Essas etapas
implicam em mudanças que por vezes são radicais, mas que precisam ser
administradas aos poucos, e assim ocorre no sistema do cristianismo, quando uma
pessoa aceita a filosofia e crença cristã, ela se alinha em conformidade com as novas
realidades por ela percebida, que anteriormente não a atingia. Agora ela se sente
responsável pelo outro e constrói um ideal de vida que trabalhará também em prol dos
seus semelhantes, pois ela entende ser uma vontade participante de sua nova
natureza, como ser humano a serviço de Deus, que tem como ideal,
desinteressadamente trabalhar em benefícios de outras pessoas.

Uma estrutura de reformulação das atitudes foi criada pela comunidade cristã
para atender suas práticas e princípios éticos de percepção do outro na esfera social.
41

Isso é muito significante, pois implica em mudanças, primeiro no próprio indivíduo e,


segundo, no meio onde interage. Talvez seja um caminho que possa contribuir para
uma mudança moralmente instituída de valores que o indivíduo aplica primeiro para
si e depois traz para os outros, através de suas ações sociais, possibilitando uma nova
forma de interagir com o outro. Esse princípio se aplica a todos os aspectos da vida
de uma pessoa que constrói suas relações sociais com fundamentação nos princípios
de vida cristã, atingindo também a esfera dos bens materiais, pois era uma
característica primordial para os valores da comunidade cristã que a pessoa fosse
desapegada aos bens materiais, claro que não era proibido ter riquezas ou patrimônio,
mas o princípio era de que tudo foi concebido com a autorização de Deus, e, portanto,
os bens materiais deveriam também serem disponibilizados para auxiliar a outros.

A busca por instrumentos que possibilitem igualdade para todas as pessoas em


nossa contemporaneidade é louvável, porém, a discussão se fundamenta em teorias
sociais que permeiam todos os tipos de especulações, são diversos fatores que
permeiam os problemas sociais, mas precisamos admitir que os problemas sociais só
existem porque o ser humano existe, depois porque interagem entre si em suas
relações sociais, os demais são influências que atingem seu formato racional de
entender a vida social, talvez seja um ponto crucial combater não somente as ações
imorais das pessoas mas combater os princípios que sustentam tais ações.

Evidentemente que o ser humano prioriza e cria objetivos individualistas que


procura alcançar, mesmo que tenha que romper com princípios e valores éticos e
morais já estabelecidos, traindo a si mesmo. O ser humano é infiel a si mesmo,
colocando objetivos e metas materialistas em primeiro lugar, quando deveriam ser
ideais secundários, encabeçados pelo respeito e a valorização do caráter e a
dignidade do ser humano frente ao seu semelhante, construindo critérios de vivência
social que possibilite uma avaliação positiva frente a qualidade de vida para si e para
os demais.

Ao estabelecer valores e princípios baseados na experiência e interação com


o meio em que vive, o ser humano constrói uma conduta que distinguirá valores e
juízo frente as diversas realidades por ele encontradas, principalmente as realidades
oriundas de interação com o outro mediante a esfera social, o problema é que se torna
cada vez mais flexível a conduta das pessoas na contemporaneidade, elas procuram
acompanhar tendências sociais apresentadas por diversas realidades que não são as
42

suas, mas de outras culturas e povos diferentes, devido à acessibilidade quase


instantânea de informações e de práticas de outras pessoas que estão inseridas em
outras realidades. Tal implicação produz instabilidade na estrutura moral e ética das
pessoas, pois produz instabilidade no senso de juízo e valores já definidos e estáveis,
possibilitando uma mudança constante nas práticas do indivíduo. Talvez, por não
haver um formato cultural estabelecido, as pessoas não se encontram estabilizadas o
suficiente para construir um pensamento sólido, sobre uma conduta que oriente
princípios e valores, capaz de guiá-las para decisões e práticas, eticamente mais
seguras e estáveis. Assim, se percebe que um parâmetro fixo de conduta pode
contribuir melhor para a construção de critérios mais sólidos, capazes de estabelecer
um juízo avaliativo mais ético e morais, frente à sociedade e o semelhante.

As regras sociais, são flexíveis e constantemente mudadas para se adequar a


uma nova realidade ou necessidade que as pessoas de determinado grupo social
possam ter, por isso é pouco provável que a sociedade contemporânea possa obter
das próprias demandas sociais fundamentos que possam contribuir para uma
construção mais eficaz de parâmetros éticos que venham mudar radicalmente
algumas realidades sociais, pois o ser humano, quando condicionado e alienado a
algumas realidades, não consegue por ele mesmo, extrair soluções. Se precisa
alcançar outras diversidades sociais, que se apresente além da obrigação social
comum. Talvez, a filosofia social cristã, possa contribuir para criar alguns princípios
éticos e morais, que possam estabelecer uma conduta e um senso de juízo mais sólido
e menos mutável, tornando as relações sociais mais estáveis e confiáveis.

A preocupação com a realidade social do semelhante é um princípio


estabelecido nas regras sociais cristãs, assim, seria um dos passos a serem seguidos
pelas demais comunidades, elevando seu apreço pelo outro, contribuindo para com a
mudança de vida, e se aproximando mais dos mais necessitados e desamparados da
comunidade. Fica evidente com tais ideais, a necessidade de uma formatação na
conduta e nos princípios éticos e morais dos que aderem à filosofia de vida cristã.

A cultura cristã não se constitui independente da sociedade, pois todos os que


participam e partilham da filosofia e da crença cristã são também participantes do
sistema social, pois a cultura e a prática social cristã são construídas sobre o amparo
da igreja que, por sua vez, proporciona um espaço mais adequado para que as
pessoas possam expressar de forma mais aberta sua vida religiosa. A igreja se torna
43

um símbolo de extraordinário poder para a interação entre a fé e vida social, pois a


mesma incentiva os membros colocarem em prática a filosofia de vida humanista
cristã na sociedade, externalizando sua cultura, princípios e valores, Dessa forma o
cristianismo, contribui com sua cultura, de forma significativa, através de sua ideologia
e filosofia de vida correta.

Essa tal vida correta, por sua vez é ensinada na igreja, produzindo uma forma
de educação ética e moral, capaz de constituir uma cultural interna que poderá
proporcionar às pessoas não participantes da filosofia social cristã, uma influência
através de ações, pensamentos e práticas cristãs, conquistando interessados pelo
referido estilo de vida, possibilitando que uma cultura da minoria possa influenciar a
cultura da maioria através das relações sociais e das práticas que ligam a ambas.

Mesmo o ser humano vivendo numa época de explosão da tecnologia e das


novas tendências pós-modernas, não se pode esquecer que todas as tendências e
influências que atingem e modificam constantemente a cultura e as práticas sociais
do ser humano em suas esferas culturais de povos e nações diferentes não são
oriundas de um outro mundo, a não ser o próprio mundo humano. Ou seja, somente
o próprio ser humano tem o poder de manifestar mudanças e criar parâmetros de
convivência social para si mesmo. Mediante às constantes e, muitas vezes, radicais
mudanças sociais, que se tornam cada vez mais flexíveis e tolerantes, pois as
necessidades das pessoas, estão sendo mais consideradas como um direito inato,
sem poder ser contestado, tornando muitas vezes assuntos sociais, culturais e
religiosos em conflitos, desviando o diálogo principal, pela defesa da ética e da
moralidade social, desconstruindo valores e princípios estabelecidos pelo senso e
pensamento humano de moralidade e dignidade. Assim, o estabelecimento de valores
como amor, justiça, honestidade, generosidade, fraternidade, misericórdia e
principalmente a liberdade, são constantemente distorcidos em prol de uma ansiedade
para atender diversas necessidades humanas que não são reais, fúteis e superficiais,
estabelecidas em prol de uma luta constituída por diversos setores da sociedade,
estabelecidos nas mais diversas esferas como a política, a empresarial, econômica e
a social, vinculada a diversos grupos de interesses, culturas e práticas sócias
diferenciadas.

Os que partilham da fé e da filosofia e estilo de vida cristão, não são melhores


ou detentores dos valores humanos, tão pouco é o cristianismo o criador de valores
44

como os já citados acima, porém seus objetivos agregam um princípio que prioriza o
cuidado com os valores vinculados à dignidade do ser humano, o cristianismo vivifica
tais valores, solidifica e compartilha os valores e princípios, tornando-se uma realidade
mais constante na convivência e na prática social.

Não é o cristão o inventor do amor ou da generosidade, mas sim o defensor


praticante de tais valores, que não tem o cristianismo como o inventor da honestidade
ou da misericórdia, pois são valores de propriedade de todo o ser humano
independente de crença ou de qualquer outra cultura, mas o cristianismo estabelece
em suas bases os valores fundamentais do ser humano, como forma de zelar pelo
caráter e dignidade do ser humano. Os valores pelos quais os cristãos se empenham,
não são exclusividades cristãos, antes, são valores que são seguidos e praticados por
muitos, porém convergem para a postura cristã. Ao se tratar de fato dos princípios e
objetivos sociais do cristianismo pode-se perceber que é prioritário um cuidado e um
zelo pelo semelhante, priorizando de forma muito forte os valores que sustentam a
ética e moralidade do ser humano, o colocando com prioridade máxima.

O ser humano tem em seus princípios básicos sociais, a proteção pela


integridade física e moral, e assim se coloca numa postura de defesa moral, sendo na
maioria de interesse particular, uma forma individual de se proteger, que talvez pareça
egoísta, porém está impressa na personalidade humana, então cada pessoa procura
por princípios e valores que a proteja dos outros, tornando sua relação social
sistemática e muitas vezes formal, porém vinculada às realidades do cotidiano social.

Cada valor estabelecido em prol do bem-estar social está vinculado às


necessidades das outras pessoas. Isso implica em julgamento pessoal, no qual
existem valores maiores e menores, tornando alguns valores humanos primários,
como o respeito pela vida e pela integridade humana, devido a alguns interesses
secundários, colocados acima dos fundamentais.

Ao ver pessoas em situação de fome, miséria, pobreza, humilhação e


degradação, em situação de sobrevivência degradante, paralelo a outras pessoas
abastadas com uma quantia exagerada de bens, capital e conforto, gerando um
espírito de superioridade, enquanto os outros se sentem humilhados por não terem
condições de terem uma vida no mínimo digna o suficiente para um ser humano. Isso
é visto por muitos como luta de classes, má distribuição da riqueza ou desigualdade
45

social, mas, além disso, a filosofia de vida cristã vê tais situações como uma distorção
da dignidade e da imagem do ser humano, fazendo de suas bases uma ideologia
produtora da igualdade humana, enquanto seres iguais em imagem e semelhança, ou
seja, todos tem a mesma origem, as mesmas necessidades, assim nenhum interesse
material e individual pode vir primeiro, pois para o cristianismo o semelhante deve
ocupar um lugar superior aos interesses materiais. Claro que o respeito ao semelhante
não pode impedir os projetos individuais de cada pessoa, sejam profissionais ou
pessoais, desde que respeitem os limites da moralidade e da ética.

Considerando a continuidade das futuras gerações, no intuito de construir uma


responsabilidade séria para transmitir princípios e valores capazes de se sustentarem
dentro dos sistemas sociais futuros, considerando sua constante reconstrução e
flexibilidade, é preciso conservar princípios éticos e morais capazes de nortear as
realidades e práticas sociais, que priorizem a dignidade do ser humano.

As características que modelam a realidade social na pós-modernidade são


intrigantes e preocupantes, pois não existe um formato, modelo ou princípio a ser
apontado como referência de vida, as pessoas convivem diariamente com realidades
cada vez mais mutáveis e flexíveis. O conceito de vida social para o contexto pós-
moderno, não está firmado em raízes ou culturas adjacentes, mas em modelos e
avanços cada vez mais rápidos.

3.2 Cultura Cristã e sociedade

As pessoas seguem um estilo de vida inteiramente complexo e vulnerável.


Infelizmente, a economia e o capitalismo são principais balizadores, nas relações
sociais da pós-modernidade. Os vínculos afetivos e religiosos existem somente como
princípios voltados à esfera do pessoal e espiritual, não sendo mais uma questão
balizadora e comunitária, para a cultura pós-moderna. O individualismo se mostra
predominante nas relações sociais contemporâneas, as pessoas procuram vínculos
que lhes ofereçam benefícios, construindo uma cultura egoísta, movida por interesses
46

pessoais. Princípios humanos como, generosidade e altruísmo são cada vez menos
utilizados entre as pessoas, pois prevalecem os interesses econômicos e políticos.

Através do avanço tecnológico, foram criadas diversas ferramentas e


instrumentos para auxiliarem o desenvolvimento humano, porém, estão de forma lenta
e perspicaz, trazendo em seu bojo de benefícios, uma gama de outras realidades
prejudiciais que, a longo prazo, serão irreparáveis, a saber, a internet e o capitalismo
globalizado, que estão de forma assombrosa transformando constantemente a
realidade do ser humano. Não encontramos na realidade contemporânea, tecnológica
e capitalista, um princípio que realmente coloque o ser humano como bem maior, pois
o que se percebe, é um ser humano objeto ou mercadoria a ser utilizada,
transformando pessoas em simples produto.

A ética enfrenta uma enorme tarefa, frente aos avanços científicos,


tecnológicos e sociais, pois os propósitos de construir instrumentos que viabilizam o
desenvolvimento de novas realidades na cultura humana, também vêm carregados
de diversas implicações sociais, éticas e morais. Com as constantes mudanças
sociais, política, econômica e tecnológica que, se fazem de forma tão rápida, o ser
humano se deixa levar por seus desejos e anseios, constituindo necessidades e
objetivos muitas vezes desnecessários e transitórios, afetando a estabilidade cultural
e social.

O consumo é usado como ferramenta de igualdade, porém isso não é real, o


consumismo é instigado pela mídia, fazendo com que as pessoas enxerguem uma
forma errônea de poder. A sensualidade e o erotismo estão cada vez mais fortes na
cultura pós moderna, possibilitando as pessoas priorizarem seus desejos e anseios
eróticos e sexuais, construindo um conceito de autonomia individual sobre o corpo,
estimulando as práticas eróticas na sociedade de forma aberta e explícita. O conceito
de pudor e moralidade estão modificados, pois as pessoas reivindicam o direito de
liberdade de forma individual, sem responsabilidades para com os outros.

O desejo de viver de forma quase instantânea e frenética, sem impedimentos,


torna alguns conceitos tradicionais nulos, pois as pessoas não têm mais interesse em
viver uma cultura enraizada, pelo contrário, a cultura predominante é a de vida flexível,
livre e instantânea, impossibilitando dessa forma, a existência de vínculos duradouros.
Os vínculos afetivos se modificaram, as famílias são cada vez mais diferentes. Os
47

modelos de família, não seguem mais um padrão ou um modelo, pois tem surgido
diferentes formas de se constituir famílias. Cada vez mais, são positivadas normas e
leis, na tentativa de amenizar os conflitos e diferenças sociais, porém as questões
sociais, de fato não são trabalhadas por políticas igualitárias que possam promover a
inclusão das diferentes classes.

A pobreza e as desigualdades sociais instigam a violência que, estão cada vez


mais impregnadas na sociedade, pois são oriundas das desigualdades econômicas e
política da atual sociedade, devido à diversidade cultural, e o poder aquisitivo que
existe na sociedade distribuído de forma desigual e desequilibrada. A necessidade de
construir uma ética social, capaz de nortear as ações e o crescimento dos sistemas
tecnológicos, econômicos, político e cultural, na contemporaneidade, se torna cada
vez mais imprescindível para o bem-estar da sociedade. Para tanto, é preciso contar
com novas propostas e instrumentos que possibilitem e priorizem a construção de
uma nova realidade que viabilize a transformação e restruturação do formato de
pensamento dos indivíduos pós-modernos. O princípio para uma ética e uma moral
social, voltadas para a humanização de todo o sistema pós-moderno, precisa partir de
uma consciência pessoal e individual de cada pessoa. Os reajustes precisam partir
das práticas culturais das pessoas, que são fundamentais para suas ações morais e
éticas na sociedade.

Podemos perceber que, existem diversas realidades que emergem da


diversidade cultural e social que, contribuem para a existência das desigualdades.
Pensar em instrumentos e propostas que venham se mostrar igualitário e capaz de
reconfigurar o formato de pensamento da sociedade, ajudando-a, a construir uma
consciência, voltada para o zelo e o cuidado com o bem-estar da coletividade, é uma
tarefa primordial para a transformação social contemporânea. Fica evidente que, não
podemos esperar que somente o sistema político-social instituído pelo Estado, seja o
responsável pelo combate às desigualdades e as desumanidades existentes em
nossa realidade social contemporânea. Cada pessoa é incondicionalmente
responsável por cuidar do bem-estar da comunidade onde se encontra inserido.

A consciência e o formato de compreender as necessidades coletivas precisam


estar em comunhão com as necessidades individuais de cada pessoa, por isso
encontrar uma proposta de convívio social que, possibilite as pessoas conviver com
suas diferenças, se torna fundamental para a construção de uma ética voltada à
48

valorização do ser humano como principal objetivo para as relações sociais. Dentre
diversas propostas, podemos destacar a cristã, que prioriza o convívio social
comunitário, com vários princípios que podem corroborar para com a existência de
ações benéficas voltadas para a sociedade em geral.

Percebemos que o ser humano não está em conectividade com as realidades


que o cerca. Focado em um formato de vida flexível e individualista, as pessoas se
tornam desinteressadas em conhecer os problemas que afligem os outros. A busca
por uma ética voltada para a compreensão dos males que atingem os outros, não
pode ser realizada por um sistema social, impregnado pela lógica e a racionalidade
tecnológica e científica, é preciso partir de um pressuposto mais humano. O ser
humano precisa aprender o caminho do desprendimento material e econômico, em
que está mergulhado.

Um dos males que afetam a realidade contemporânea se mostra no desejo


constante que as pessoas têm de constituir poder e riqueza. O conceito de sociedade
capitalista transforma as pessoas, em mera mercadoria a disposição dos objetivos e
necessidades materiais do indivíduo pós-moderno. Partindo do princípio de que todas
as pessoas são oriundas da mesma fonte de vida e criação, o cristianismo apresenta
uma proposta de existência de um Deus criador e mantenedor que, criou a vida e tudo
que existe, sendo o ser humano proprietário de nada, apenas um ser criado para
desfrutar de toda a criação. Os cristãos desenvolveram um sistema de convivência
comunitária, onde todos, os ricos, pobres, livres e até mesmo escravos se tornam
iguais, pois foram movidos por uma concepção de fé que, afirma ser Deus o criador e
mantenedor de toda a vida, tornando o ser humano um necessitado do favor divino
para sobreviver. A consciência de que, todos são dependentes de um Ser supremo,
institui um nivelamento social de igualdade.

No princípio da igualdade cristã, encontramos alguns aspectos interessantes,


pois o caráter, a honestidade, a generosidade e o cuidado com os outros é
fundamental. Nos ensinamentos cristãos, os bens materiais são bênçãos de Deus,
mas só tem sentido real se forem usados em favor dos mais pobres.

O sentido de vida, encontrado pela pessoa que pratica o princípio cristão de


convivência social se torna uma contra proposta ao sentido imposto pela sociedade
49

pós moderna. Enquanto os princípios da ética pós-moderna instigam o indivíduo a ser


individualista, o princípio cristão o incentiva a compartilhar.

O princípio tecnológico da sociedade pós-moderna, através das ferramentas da


internet, leva as pessoas a serem surreais, o princípio cristão de comunidade e
partilha, incentiva as pessoas a conviverem no mesmo espaço desfrutando e
compartilhando das coisas reais. No mundo pós-moderno e tecnológico, a ética
permite que, as pessoas busquem laços afetivos por interesses materiais e
econômicos, porém na proposta cristã, as pessoas buscam se relacionar afetivamente
por um propósito maior de interesse coletivo, a saber a esperança na vinda de um
mundo melhor e a salvação. Não queremos afirmar que, a proposta cristã seja a única
a ter algo para oferecer, para construção de uma ética voltada para a valorização das
pessoas, mas que podemos nos apropriar de vários princípios cristãos, para praticá-
los na sociedade, incentivando as pessoas a terem uma vida social mais humana e
igualitária. Assim como os cristãos acreditam na vinda de um mundo melhor, as
pessoas também precisam de motivação para acreditarem na construção de mundo
melhor, despido do egoísmo e do individualismo.

Construir uma cultura, voltada à valorização do mundo real, não descartando a


internet, mas priorizando os laços reais, compartilhando os espaços de convívio e
contato real entre as pessoas. Com os ensinamentos cristãos, aprendemos que, não
precisamos cultuar o corpo e também não precisamos usá-lo de forma banal como se
fosse somente um instrumento de prazer, pelo contrário, aprendemos que o nosso
corpo é santo e perfeito, podendo ser usado com ética, moralidade e respeito.

Nosso questionamento de que, poderia o cristianismo e sua ética, contribuir


para a construção de uma realidade melhor no mundo pós-moderno, obtém aqui uma
resposta razoável, interessante e satisfatória, pois encontramos na proposta cristã,
uma ética que tem muito a contribuir para com a reconfiguração de diversas realidades
do mundo pós-moderno, possibilitando a promoção da igualdade e a diminuição de
vários males que afligem a sociedade contemporânea.
50
51

4. DESAFIOS DA CONTEMPORANEIDADE

Durante o século passado, a tendência na sociedade '‘cristã’' ocidental não era


a de uma “negação de Deus”, como afirma Robins (1913, p. 1), mas um
“enfraquecimento de um sentido vívido dele” (ROBINS, 1913, p. 1). No entanto,
embora haja aqueles que têm dificuldade em considerar Deus como uma pessoa a
quem possam orar, “muitos têm voltado com confiança renovada à ideia cristã de Deus
como o Pai de nossas almas, uma concepção francamente não filosófica e ética”,
(ROBINS, 1913, p. 1). De acordo com a visão anedótica de Crosby (2017, p. 1),
“Cristianismo contemporâneo é a modificação constante da religião do Novo
Testamento para atrair os cristãos carnais e não regenerados, agradando a carne e
sendo relativamente aceitável para o mundo”.

Livingstone (2000, p. 1) afirma que os “dois grandes oponentes dos valores


cristãos e da espiritualidade que hoje enfrentamos são dois impulsos que militam
contra a tradição cristã. Estou chamando isso de síndrome secular e impulso de
idolatria”. Em outras palavras, o que Livingstone (2000, p. 1) aponta é que há dois
aspectos nas tendências contemporâneas que desafiam o Cristianismo, um interno e
outro externo. A pressão recai sobre o Cristianismo para adotar novas interpretações
teológicas; ainda assim, isso levará a uma modificação das experiências de vida da
igreja, afetando a adoração coletiva, bem como a devoção pessoal cristã.

Enquanto as tendências eclesiásticas contemporâneas internas desafiam a


essência do Cristianismo, os desafios externos são colocados por uma questão radical
relacionada às necessidades do mundo que exigem ética, moral e consciência. A
resposta que o Cristianismo dá às necessidades e problemas do mundo é relevante
em áreas como o alívio da pobreza e a provisão para necessidades básicas. Além
disso, o cristianismo também fornece liderança para a moderação e resolução de
situações conflitantes. No entanto, como Budiselic (2014, p. 1) coloca, “o cristianismo
é uma religião do testemunho, e em nosso mundo contemporâneo o testemunho
cristão se depara com sociedades secularistas e pós-modernistas que não aceitam
reivindicações religiosas como válidas e normativas”. Portanto, trataremos aqui dos
52

desafios acima mencionados, tanto internos quanto externos como fontes de pressão
que desafiam o Cristianismo.

4.1 Desafios internos

O cristianismo está mudando globalmente, conforme indicado pelas várias


tendências modernas, como profundas alterações na adoração na igreja, bem como
no ethos cristão individual e no estilo de vida. Essas tendências não estão mais
localizadas em uma determinada região ou país; em vez disso, como Wachege (2012,
p. 1) afirma, “As tendências têm uma propagação geográfica universal”. Além disso,
Wachege (2012, p.1) aponta que, além das várias causas que desencadeiam essas
tendências,

Cada continente… seleciona e acentua os mesmos


temas doutrinários cristãos de acordo com as
necessidades históricas, as situações de vida e de
vivência, as aspirações e a consciência crítica de seu
próprio povo com a disposição para com os de outras
regiões para o enriquecimento mútuo e a
solidariedade. (WACHEGE, 2012, p. 1)
Segundo Wachege (2012), entre as tendências do cristianismo global moderno
encontramos a adoção de pensamentos teológicos “inspirados em bênçãos e
bênçãos, maldições e maldições”. O cristianismo também retrata tipos de eclesiologia
“baseadas no modelo da Igreja vista como povo de Deus / família de Deus”, Wachege
(2012, p. 1). Às vezes, há no Cristianismo misticismos teológicos infundidos “com o
pecado como um item moral crítico” (WACHEGE, 2012, p. 1). Além disso, há
tendências para enfatizar excessivamente as “questões do casamento” (WACHEGE,
2012, p. 1) que não estão alinhadas com a Palavra de Deus, bem como os
movimentos cristãos que se voltam para as “teologias feministas... [e] de libertação
das mulheres” (WACHEGE, 2012, p. 1). Ele acrescenta que outra tendência
encontrada no Cristianismo contemporâneo é uma ênfase exagerada no assunto da
“demonologia” (WACHEGE, 2012). Também existem problemas encontrados no
53

cristianismo relacionados à ética e ao comportamento cristão, “graça e conversão”


(WACHEGE, 2012, p. 1), bem como a necessidade de decisões éticas em relação ao
aborto e em relação à eutanásia (WACHEGE, 2012).

Essas tendências cristãs incluem a alteração dos símbolos de adoração, como


o uso de instrumentos musicais variados, como bateria e violão, em vez do uso
tradicional do piano ou órgão ou tecnologia para projetar as canções no serviço em
vez do uso do tradicional hinário ou ainda incluindo dança na igreja.
Consequentemente, os serviços coletivos podem agora incluir uma mistura de
tendências culturais mundanas com elementos tradicionais de adoração cristã. Como
Jones (2021, p. 1) aponta:

É axiomático que nossa metodologia de adoração


reflete nossa teologia. Além disso, nossa
metodologia frequentemente define nossa razão de
ser para nos reunirmos corporativamente para
buscar a adoração. O que não é declarado
explicitamente com relação ao propósito da igreja na
adoração corporativa é revelado implicitamente nas
formas que ela escolhe em sua busca pela adoração.
(JONES, 2021, p. 1)
Jones ainda complementa:

Em igrejas nas quais as “necessidades sentidas” da


congregação são o principal determinante na
escolha dos meios de adoração, encontra-se uma
abordagem antropocêntrica em relação à adoração
em vez de uma abordagem teocêntrica.
Consequentemente, ipso facto, Deus não está
recebendo toda a devida honra, glória e devoção,
que deveria ser a preocupação preeminente ao se
engajar na adoração. As inclinações
antropocêntricas são frequentemente uma indicação
de deficiências em relação à busca e prática da
verdade teológica pela igreja. Em outras palavras, a
adoração centrada no homem reflete uma
compreensão pobre ou mal definida de quem é
Deus. (JONES, 2021, p. 1)
Os símbolos de adoração coletiva cristã estão se conformando com as novas
tendências culturais mundanas que apresentam o problema de criar uma mistura,
alterando assim a verdadeira essência da adoração bíblica. No que diz respeito a
misturar a cultura mundana com o culto cristão coletivo, tal mistura apresenta desafios
teológicos e práticos internos, uma vez que os símbolos religiosos tendem a mudar
com ela.
54

Além disso, a mudança de paradigmas dos símbolos religiosos em novos rituais


e cerimoniais, bem como as mudanças de sentimentos de reverência e medo podem
trazer angústia ao Cristianismo”. Novas interpretações teológicas levam a uma
modificação das experiências de vida da igreja, afetando também a devoção pessoal
cristã. Em essência, o que realmente está mudando no cristianismo global são seus
símbolos religiosos, cuja importância, no culto cristão coletivo é explicada por Giddens
(2011, p. 522-523),

As religiões implicam um conjunto de símbolos, que


exigem sentimentos de reverência e medo, ligados a
rituais ou cerimoniais (como serviços religiosos),
realizados por uma comunidade de fiéis(...) A
existência de cerimoniais coletivos é geralmente
vista pelos sociólogos como um dos fatores que
distinguem religião de magia. (GIDDENS, 2011, p.
523.
Além disso, os símbolos religiosos tradicionais que são mais profundos do que
os símbolos de adoração previamente discutidos de uma comunidade cristã em
particular, são constantemente desafiados por novas tendências contínuas de efeitos
culturais mundanos que produzem alterações e desvios no culto coletivo cristão. Os
membros das comunidades cristãs são simultaneamente membros da sociedade, o
que significa que estão sujeitos a uma pressão social contínua em direção à mudança
cultural. Consequentemente, Senkbeil (2014, p. 1) é da opinião “que teremos de nos
afastar primeiro da nossa cultura se quisermos abraçá-la verdadeiramente e ligá-la a
Cristo e à sua palavra”.

Algumas décadas atrás, parecia que o Cristianismo estava desaparecendo; no


entanto, este não é o caso agora, pois o número de pentecostais e carismáticos está
aumentando exponencialmente e atingiu nas últimas décadas mais de meio bilhão de
crentes que atualmente representa 25% da membresia cristã no mundo (SMITH,
2011).

Enquanto a civilização ocidental está mudando rapidamente, o cristianismo


parece estar se remodelando para ser capaz de lidar com os desafios que, por sua
vez, alterarão o curso do mundo e o futuro da civilização ocidental. A este respeito,
Walsh (1950) afirma,

Muitos dos pensadores avançados apontam que o


impacto do Cristianismo está em declínio nos últimos
séculos. Talvez o triste estado atual da civilização
55

ocidental surja em grande parte do enfraquecimento


e rejeição total do Cristianismo. Nesse caso, um
retorno ao Cristianismo pode ser o preço que um
mundo relutante terá de pagar se quiser alguma
civilização. (WALSH, 1950, p. 202).
A tendência no cristianismo é a polinização cruzada, incluindo novas ideias
comuns e projetos internacionais em um espírito generoso. No entanto, o Cristianismo
enfrenta sérios desafios internos conforme discutido acima e externamente há a
questão radical para o Cristianismo hoje e o futuro que implica ética, moral e
consciência, conforme discutido a seguir.

4.2 Desafios externos

A questão radical que o Cristianismo enfrenta hoje é colocada pelo que o mundo
precisa e espera das religiões. Essa expectativa é baseada no pressuposto “Que a
religião tem o objetivo de participar da cura do mundo”, como Sinn e Trice (2015, p. 1)
afirmam. O mundo em constante mudança cria necessidades e expectativas
constantes, mas também expressa frustração em relação a organizações religiosas e
cristãos, bem como a membros de outras religiões.

A realidade sócio-histórica da situação atual global, inclui o uso indevido dos


princípios da fé cristã (bem como aqueles de outras religiões) como cifras e elementos
para disseminar “ou reforçar o conflito” (Sinn, Trice, 2015, p1). Membros das três
religiões monoteístas abraâmicas continuam a nutrir discórdias que constituem um
sério desafio à perspectiva dos verdadeiros valores, ethos e significado do
Cristianismo. É responsabilidade do Cristianismo encontrar respostas para os
problemas do mundo por causa das exortações bíblicas como "ame o seu próximo"
(Marcos 12.31), que fundamenta o comportamento ético. O processo para encontrar
essas respostas requer a identificação dos padrões de fome e necessidade e, em
seguida, descobrir que tipo de nutriente falta (Sinn, Trice, 2015, p. 1).O remédio cristão
para os males do mundo pode ser, por exemplo, providenciar paz para as populações
que estão em conflito. Consequentemente, Sinn e Trice (2015) argumentam que “se
56

sim, então nossa questão radical para nossa época é: como a religião do Cristianismo
em particular e seus adeptos se tornarão instrumentos relevantes de paz no século
XXI? Esta questão de relevância religiosa para a paz é certamente essencial para
nós” (Sinn, Trice, 2015, p. 1). Mesmo que a paz seja uma das maiores necessidades
de nosso mundo, Sinn e Trice (2015, p. 1) afirmam “que existe um nutriente mais
imediato para nós que subestimamos, e que, no entanto, podemos juntos localizar em
nossa fé como um espírito de generosidade”.

O mundo desafia o Cristianismo (bem como as outras religiões abraâmicas) a


se beneficiar do “Espírito de generosidade que judeus, muçulmanos e cristãos
compartilham do coração de suas comunidades, que é fundamental para a
humanidade e o mundo no século XXI” (Sinn, Trice, 2015, p. 1). Guerras, fome e secas
causam dor e necessidade; no entanto, eles também podem causar mudanças
positivas profundas na sociedade.

A forma como o cristianismo responde aos desafios colocados pelo mundo


determina e molda suas características atuais, bem como seu futuro. Em caso de
guerra, as Igrejas Cristãs são chamadas a servir como mediadores, pacificadores e
árbitros (KASTFELT, 2005). Uma observação interessante sobre o papel social das
igrejas é discutida a seguir,

Um último papel social que as igrejas


desempenharam em Ruanda e Burundi é como
árbitros em conflitos. Essa função de árbitro para
resolver disputas entre partidos divididos é aquela
que os religiosos de todo o espectro ideológico
podem apoiar. Os vinculados ao regime não perdem
a relação com as autoridades políticas ameaçadas
por tal papel, ao mesmo tempo que torna a igreja
relevante para a população (KASTFELT, 2005, p.
122).
A citação acima implica que igrejas e cristãos são parceiros sociais relevantes
em situações dramáticas como guerra, fome e seca. Para isso, os cristãos usam
agências missionárias e ONG’s para aliviar a pobreza, ou para abordar a questão da
dependência de drogas e seus problemas sociais relacionados, que é apoiada por
igrejas evangélicas e pentecostais em muitos países. Esses são apenas dois
exemplos de como o Cristianismo é caracterizado pelo amor divino, compaixão e
generosidade; refletindo a natureza de Deus que expressou tal generosidade em seu
ato inicial de criação mencionado em Gênesis 1.1, evidente na seguinte citação,
57

Esse ato divino inicial de criação é, antes de mais


nada, um ato supremo de generosidade para com os
seres humanos e o mundo, pelo qual a própria
criação, como o chamado divino à ordem das coisas
a partir do nada, é o primum movens, ou primeiro ato
do Deus que se entrega à própria criação (SINN;
TRICE, 2015, p. 22).
O cristianismo é, portanto, desafiado pelas necessidades do mundo, o que
requer a demonstração de compaixão e também de generosidade amorosa. No
entanto, a necessidade de formação da consciência e o consequente
desenvolvimento moral também são desafios que o mundo coloca para o Cristianismo.

O cristianismo é considerado uma fonte de moral aplicada que requer a


intervenção ativa da consciência. A formação de uma consciência cristã, tanto em
nível individual quanto coletivo, é o objetivo da vida devocional e dos ensinamentos
bíblicos que as igrejas promovem ativamente. O mundo precisa de meios práticos
para encontrar uma solução para seus problemas sociais, que exigem uma ação ética
e também elevados níveis de consciência ativa. Algumas das necessidades do mundo
são mencionadas por Singer (1999, p. 7),

O tratamento das minorias étnicas, igualdade para


as mulheres, o uso de animais para alimentação e
pesquisa, a preservação do meio ambiente, aborto,
eutanásia e a obrigação dos ricos de ajudar os
pobres [por exemplo],(SINGER, 1999, p. 7)
Singer (1999) acrescenta que existe uma ligação entre religião e ética que o
Cristianismo está determinado a difundir. Embora a ética cristã possa ser vista como
subjetiva, os males do mundo requerem respostas objetivas e razoáveis. A razão é
chamada a atuar para as decisões éticas de acordo com as normas bíblicas que atuam
na consciência cristã.

O Cristianismo é chamado a fornecer aos indivíduos e comunidades diretrizes


mentais sólidas que oferecem aos membros da Igreja e à sociedade as normas para
a consciência operar, “para fazer um julgamento moral, ou discutir sobre uma questão
ética, ou viver de acordo com os padrões éticos” (SINGER, 1999). Spohn (2000,
p.124) descreve a consciência como

Aquela voz mansa e delicada que faz você se sentir


ainda menor... A consciência não é uma faculdade
separada da mente. É um processo humano de
avaliação e julgamento e não a voz autorizada de
Deus. O Vaticano II observa corretamente que "sua
58

consciência é o núcleo mais secreto das pessoas e


seu santuário. Lá eles estão sozinhos com Deus,
cuja voz ecoa em suas profundezas. (SPOHN, 2000,
p. 124).
Além disso, a consciência humana é moldada pela voz de Deus, que precisa
ser ensinada a partir de uma perspectiva bíblica. Spohn (2000, p. 124) explica que

A voz de Deus pode adicionar ressonância às


nossas reflexões mais profundas, e jamais as ignora.
A consciência não é meramente uma construção
social... Este conhecimento moral é autorreflexivo e
socialmente conectado, sabendo que é responsável
por meu eu mais profundo, pelas comunidades
humanas e, em última instância, por Deus. (SPOHN,
2000, p. 124).
O mundo espera que os cristãos aprendam na Igreja como adquirir a habilidade
de determinar apropriadamente entre o que é certo ou errado, bem como aprender
como aplicar a consciência em “um processo prático” (Spohn, 2000). O próximo
estágio no qual se espera que os cristãos sejam ensinados é no processamento de
pensamentos seguindo as diretrizes da consciência para os julgamentos, que são
explicados como as “decisões de consciência de todo o coração quando alcançamos
um equilíbrio reflexivo e totalmente congruente da razão, intuição e emoção” (SPOHN,
2000, p. 125).

A importância dos ensinamentos bíblicos na formação de uma consciência


cristã é ilustrada na citação abaixo,

Quando Martinho Lutero se apresentou à Dieta de


Worms e foi convidado a se retratar, ele declarou ao
mundo que assistia: ‘Não posso me retratar. Minha
consciência é mantida cativa pela Palavra de Deus.
E agir contra a consciência não é certo nem seguro.
Compreender o papel da consciência e sua relação
com a lei de Deus é extremamente importante”
(SPROUL, 2012, p. 12).
O mundo desafia o Cristianismo a fornecer as diretrizes normativas para a
consciência de indivíduos e comunidades, bem como a fornecer às pessoas essa
experiência e devem ser exemplos morais práticos de comportamento ético, como a
falecida Madre Teresa de Calcutá.

Pode ser necessário que crentes como a citada Madre Tereza, contribuam com
uma liderança sólida para a sociedade e até mesmo que se envolvam como
pacificadores quando surgem situações conflitantes. A base para as operações de
59

uma consciência cristã são intrinsecamente bíblicas e descritas como ligadas à


“justiça” (Jó 27.6), bem como baseadas nos “pensamentos secretos” (Romanos 2.14-
16) para os quais o apóstolo Paulo usou a palavra grega syneidesis, traduzida
literalmente como consciência. Um problema sério é identificado no Cristianismo
quando há crentes que parecem estar comprometidos com a prática dos princípios
éticos dos Evangelhos, mas não concordam com o ethos, valores e significados
cristãos em seus corações.

Além disso, Swenson (2016) aponta que também existe um desafio ecológico
para o Cristianismo, pois as populações tendem a aumentar e a natureza é forçada a
produzir recursos. O mundo está cada vez mais preocupado com as questões
planetárias relacionadas aos avanços tecnológicos que resultam na poluição da terra,
da água e do ar, o desmatamento e o consequente aquecimento global. Como
resultado, (Swenson (2016) afirma que a questão ética ecológica colocada ao
Cristianismo é: “Neste cenário de degradação ecológica em evolução, qual é o papel
da religião em geral e do Cristianismo em particular?” O problema tradicional do
Cristianismo é que suas doutrinas tendem a ser “antropocêntricas e sobrenaturais”
(SWENSON, 2016, p. 48); isto é, “[No] reino da doutrina o Cristianismo não se presta
facilmente a se tornar uma espiritualidade da natureza” (SWENSON, 2016, p. 48).

Ao longo da história cristã, os teólogos se preocuparam com a transcendência


de Deus e quase ignoraram Sua imanência na natureza. No entanto, a ordem de Deus
para Adão, conforme registrada em Gênesis 2.15, é: “Então o Senhor Deus tomou o
homem e o colocou no jardim do Éden para cuidar e cuidar dele”. Esse comando pode
ser interpretado como conferir aos seres humanos a necessidade de um
comportamento responsável em relação à natureza. A História da Igreja explica que o
cristianismo tendeu a evitar uma ecoteologia como uma reação às doutrinas
relacionadas à natureza do gnosticismo herético e do maniqueísmo. Swenson, (2016,
p. 57) ) afirma,

Os primeiros pensadores cristãos tentaram se


defender contra os dualismos extremos do
gnosticismo e do maniqueísmo, mas a herança do
pensamento dualista de Agostinho (Cidade de Deus
/ Cidade do homem, a depravação do corpo sexual
e a vontade humana contra a graça de Deus)
influenciou profundamente a história cristã
subsequente. Até mesmo a famosa doutrina católica
da graça baseada na natureza era sobre a natureza
60

humana, não sobre a natureza dos rios, pássaros e


montanhas. (SWENSON, 2016, p. 57).
Portanto, tem havido uma tendência constante entre os teólogos cristãos de
evitarem o assunto da ecoteologia. No entanto, a necessidade de respostas aos
problemas ambientais em uma escala global desafia as tradicionais “dimensões dos
ensinamentos cristãos resistentes à ecologia” (SWENSON, 2016, p. 58).

O desafio ecológico ao Cristianismo é inevitável e requer uma abordagem


teológica que mudará o pensamento e o comportamento. Além disso, há também o
impacto da tecnologia, da mídia e da Internet na vida da igreja. Dentro das Igrejas
Evangélica e Pentecostal, os jovens não trazem mais suas Bíblias para o culto; em
vez disso, eles usam aplicativos da Bíblia em seus telefones celulares ou tablets.
Imediatamente o pregador faz uma referência bíblica ou uma declaração teológica, os
jovens (assim como os adultos) procuram rapidamente por um significado na Internet,
resultando em uma rápida formação de uma opinião que pode não estar baseada na
Bíblia. Isso faz com que a ética se torne uma escolha inteiramente pessoal, que exclui
as normas tradicionais da Igreja baseadas na eclesiologia bíblica.

Outra área que compete com a vida da igreja é a Televisão Cristã, que oferece
programas de transmissão e tende a substituir os serviços da Igreja. Isso coloca o
problema de crentes que carecem de comunhão bíblica e fraternidade. Além disso, a
televisão secular também confronta as consciências e desafia o Cristianismo. Na
opinião de Ignatieff (1985, p. 94);

A televisão confronta as consciências do Ocidente


com o sofrimento do Terceiro Mundo. Através de
suas transmissões de notícias e espetáculos como
‘Live Aid’, a televisão se tornou o meio privilegiado
pelo qual as relações morais entre estranhos são
mediadas no mundo moderno. No entanto, os efeitos
das imagens televisivas e as regras e convenções da
coleta eletrônica de notícias sobre tais relações
morais raramente são examinados. (IGNATIEFF,
1985, p. 94).
As barreiras tradicionais de divisão moral levantadas por raça, religião,
geografia e cidadania estão sendo destruídas pela televisão, bem como pela mídia
em geral, que também desafia o Cristianismo (IGNATIEFF, 1985).
61
62

CONCLUSÃO

A bibliografia e a temática que fundamentam o pensamento cristão


contemporâneo são por demais extensos e nesse trabalho nos limitamos a citar
apenas alguns poucos pensadores e trabalhos intelectuais partindo de uma visão que
não deixa de ter como pano de fundo uma análise da história do pensamento teológico
protestante como um todo. Percebemos que a teologia do século XX está fortemente
influenciada pelos autores alemães, que buscavam a renovação da teologia assim
como seu patrono Lutero.
Mesmo sabendo e mencionando alguns desses pensadores, é fato que não
tocamos mais do que a superfície do tema cristianismo contemporâneo; pouco
exploramos aqui assuntos polêmicos como sexualidade e aborto, antes contudo nos
preocupamos em evidenciar como a contemporaneidade pode afetar a igreja e como
a igreja pode impactar os dias atuais.
É possível que nossa leitura de contemporaneidade ainda esteja embotada por
estarmos inseridos nesse tempo; fica difícil ao teólogo falar de modo imparcial sobre
sua vida no mundo, mas cabe-nos o grande esforço da assumir tal empenho, restando
ao futuro o juízo sobre nossas reflexões.
.
63

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