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ISBN – 978-85-7334-052-5
CDD – 363.69
Plano Piloto 50 anos
Sumário
Apresentação 07
Introdução 09
Capítulo 1 O Patrimônio 19
Bibliografia 103
Plano Piloto - 50 anos
Apresentação
Esta cartilha foi elaborada pela Divisão Técnica
da do Iphan no Distrito Federal com base no
material do curso de Educação Patrimonial
organizado, em 2006, pela arquiteta Vera
Ramos, então Chefe desta Divisão.
ENTENDENDO O PLANO PILOTO DE
BRASÍLIA - DE 1957 A 2007
Arantes,
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Otilia, O pêndulo de Lucio Costa, www.arcoweb.com.br/arqui-
tetura/arquitetura237.asp�
Plano Piloto - 50 anos
a vida, escreveu muito”. Era uma figura O edifício, marco internacional da arqui-
tímida, “parecia querer se ocultar de tudo tetura moderna, foi o primeiro a aplicar
e de todos”, disse seu colega de repartição os cinco pontos da arquitetura postulados
Carlos Drummond de Andrade. Mas nesse por Le Corbusier: planta livre, fachada
aspecto fracassou. Lucio Costa é figura- livre, pilotis, teto-jardim e aberturas ho-
chave da arquitetura moderna no Brasil: rizontais. Foi também o primeiro edifício
mentor de uma reforma no ensino, arti- desse porte a utilizar cortina de vidro e
culador de um dos principais edifícios do brises móveis. Este projeto marca a reve-
movimento moderno, o Palácio Gustavo lação de Oscar Niemeyer, que integrou a
10 Capanema - RJ, autor de textos clássicos equipe como desenhista de Lucio Costa.
da historiografia arquitetônica brasileira e
das normas de preservação do patrimônio Em 1937, quando foi criado o Sphan
histórico nacional. Além disso, é autor de - Serviço do Patrimônio Histórico e Ar-
obras-primas como o Park Hotel São Cle- tístico Nacional, Rodrigo Mello Franco
mente e o Parque Guinle, e é fundamental- de Andrade convidou Costa para traba-
mente, o criador de Brasília, um dos prin- lhar como diretor da Divisão de Estudos
cipais planos urbanísticos do século XX. e Tombamentos. Iniciou-se aí seu traba-
lho no patrimônio, do qual se afastaria
O Ministério da Educação e Saúde Públi- somente em 1972, ao se aposentar. Além
ca, atual Palácio Gustavo Capanema - RJ de criar critérios e normas para classifica-
foi projetado em 1936 por uma equipe ção, análise e tombamento de edifícios no
carioca (Affonso Eduardo Reidy, Carlos Brasil, Lucio Costa desenvolveu projetos
Leão, Ernani Vasconcellos, Jorge Machado para o Sphan, como o museu em São Mi-
Moreira e Oscar Niemeyer), e liderada por guel das Missões - RS, projetado em 1937
Lucio Costa, com a participação direta do e parcialmente construído, e as rampas do
arquiteto Le Corbusier. outeiro da Glória, no Rio de Janeiro.
Cartilha de Preservação de Brasília
No final da década de 1930, Lucio Costa verticais nas faces voltadas para o Parque,
ganhou o concurso para o Pavilhão do que é expressão da graciosidade e delica-
Brasil na Feira Internacional de Nova deza de que a arquitetura brasileira era
York. Surpreendendo a todos, ele convida capaz. Ele utilizou os mais interessantes
Niemeyer (que participara com outra pro- elementos antigos: treliças, muxarabis, te-
posta), para criarem juntos um terceiro lhas de barro, venezianas. Deve-se a Lucio
projeto, apontado pela mídia internacio- Costa, em grande parte, a difusão desses
nal, como dos mais significativos da feira. elementos, que consagraram a arquitetura
de Affonso Reidy, Jorge Moreira, Rino Levi
No final da década de 40, realizou um e Oswaldo Bratke. Ele ainda influenciou 11
conjunto de edifícios residenciais em diretamente inúmeros profissionais como
meio ao bosque em que estava implan- Francisco Bolonha, Alcides da Rocha Mi-
tada a residência da família Guinle, em randa, Sérgio Rodrigues, Zanine Caldas,
Laranjeiras, na cidade do Rio de Janeiro, Delfim Amorim, Luis Paulo Conde e Ja-
denominado Parque Guinle. O conjunto mes Lawrence Vianna, entre outros.
tinha seis edifícios, mas somente os três
primeiros foram construídos. Os prismas Entre 1952 e 1953, Costa fez parte do
ortogonais erguidos sobre pilotis eram, se- comitê de cinco arquitetos junto com (o
gundo o autor, “prenúncio das superqua- alemão Walter Gropius, Le Corbusier, o
dras de Brasília”. sueco Sven Markelius e o italiano Ernesto
Rogers) encarregados de elaborar o pro-
Os edifícios mesclam elementos contem- jeto da sede da Unesco, em Paris. Esse
porâneos, como a fachada em pano de comitê, após rejeitar o projeto do francês
vidro ou escadas em caracol envoltas em Eugène Beaudoin, auxiliou na proposta
caixilharia de vidro, com um rendilhado do trio composto por Marcel Breuer, Pier
de elementos vazados cerâmicos e brises Luigi Nervi e Bernard Zehrfuss. Durante
Plano Piloto - 50 anos
Tal singeleza associada à precisão da proposta do cerrado. A escala gregária, onde se situ-
urbana para a nova capital, mereceu da Comis- am os setores comerciais, bancários, hotelei-
são Julgadora do concurso o seguinte comen- ros e a própria Rodoviária, a qual congrega
tário: “Plano claro, direto e fundamentalmente grande quantidade de pessoas para trabalho
simples. Tem o espírito do século XX: é novo; é e lazer. E finalmente, a escala bucólica que
livre e aberto; é disciplinado sem ser rígido.” se faz sentir na passagem, sem transição, do
ocupado para o não-ocupado. Em lugar de
E assim nasceu Brasília. Esta Brasília na qual muralhas, a cidade se propôs delimitada por
vivem hoje brasileiros de todos os quadrantes áreas livres arborizadas.
do país. A Brasília simples, e pouco entendi- 13
da até mesmo por seus moradores. A Brasília Uma peculiaridade é a predominância da se-
das quatro escalas que definem a ocupação torização de usos dada aos imóveis. Assim, a
do seu espaço. área habitacional é destinada exclusivamente
a esse uso que é complementado por peque-
A escala monumental, reservada para os nos usos comerciais, de lazer ou culturais. Já
prédios públicos mais importantes da Re- a escala gregária tem seu uso predominan-
pública: os Ministérios, o Congresso Nacio- temente comercial ou de lazer, este último,
nal, o Poder Judiciário e a Sede do Governo. até hoje, pouco desenvolvido. Desmandos
A escala residencial na qual os blocos de técnicos e políticos associados ao parco co-
moradia se assentam sobre pilotis e amplos nhecimento que existe sobre a cidade têm,
espaços gramados e cujo objetivo dessa dis- freqüentemente, alterado o projeto original.
posição é dar ao morador e àqueles que ali Cite-se as áreas hoteleiras à beira do lago, já
transitam, uma sensação de liberdade de projetadas para se transformarem em mo-
movimentos entremeada pela visão de áreas radias permanentes, a não construção das
ajardinadas cheias de árvores e de folhagens unidades de vizinhança, principalmente de
de menor porte para amenizar o clima seco clubes e bibliotecas, a ocupação indiscrimi-
Plano Piloto - 50 anos
nada dos pilotis e áreas públicas, assim como De acordo com Lucio Costa:
a alteração de uso e do aumento de potencial
construtivo dos lotes. “A cidade não será, no caso, uma decor-
rência do planejamento regional, mas a
Na maioria das vezes, tais fatos ocorrem por- causa dele.”
que tanto as autoridades governamentais,
como boa parte da população, desconhecem Nesta frase está a chave do que Brasília
que Brasília (o Plano Piloto), foi projetada deveria ser. Uma cidade no território do
para ser a capital da República Federativa do Distrito Federal, com características es-
14 Brasil. Não se trata, portanto, de uma cidade peciais de capital nacional, protegida por
qualquer, assim como não se trata da capital um processo de desenvolvimento regional.
de um estado ou da sede de um município. Este desenvolvimento jamais ocorreu.”
Este é um espaço desenhado cuja atividade
principal é abrigar o governo da nação. É uma Hoje, pergunta-se por que Brasília não tem
cidade com população limitada que, ao mes- estacionamentos, por que não possui espa-
mo tempo, pertence a todos os brasileiros. ço para o comércio, por que o trânsito é
insuportável? Paralelamente exigem-se mu-
Por isso o Plano Piloto de Brasília é hoje uma danças da estrutura da cidade para abrir-se
área tombada e, definitivamente, não pode mais espaços para supermercados, hospitais,
constituir-se como uma cidade comum, cujo colégios, igrejas; mudam-se os usos, como se
crescimento e ocupação se dá freqüentemen- fossem esses, apenas um capricho de Lucio
te de forma aleatória. Costa e se alteram leis e disposições urba-
nísticas ao bel prazer das circunstâncias. O
resultado e as conseqüências dessas ações
2
Costa, Maria Elisa, Com a palavra, Lucio Costa, Aeroplano Editora, Rio
de Janeiro, 2001
Cartilha de Preservação de Brasília
ainda é o maior empregador da região porque to constante; sua concepção pretendeu criar
aqui se concentra a atividade de governo, e, uma cidade administrativa para o Governo
também, o maior volume da construção civil Federal, e não um centro metropolitano para
em áreas ainda desocupadas. o DF. O Plano Piloto foi tombado por reunir
todos os princípios do modernismo em seu
O fato de que 80% da atividade econômica e plano urbanístico, arquitetônico e artístico. E
quase 70% dos empregos do DF se concentra- são esses princípios que devemos preservar.
rem no Plano Piloto, é a prova cabal da falta
de planejamento da região. Os custos sociais As quatro escalas que caracterizam a cidade
16 disso são altíssimos: quanto mais baixa é a devem ser integralmente preservadas, pois
renda, maior é à distância percorrida de casa são a base do projeto de Lucio Costa e, por
ao trabalho e maior é o tempo gasto na via- isso, não podem ser alteradas. Entretanto, o
gem. O emprego que deveria ser deslocado tipo de solicitação mais freqüente que chega
para mais perto da mão de obra se mantém a esta Superintendência são as mudanças do
distante, enquanto os índices de pobreza e uso destinado dos lotes. Exemplificando:
criminalidade crescem em proporção assus-
tadora nas cidades satélites. Se um terreno é comprado para a construção
de uma escola, é comum que o proprietário
Tivemos recentemente um gesto do Governo solicite a alteração de uso para construir uma
do Distrito Federal de grande significado: a igreja, uma universidade ou até um super-
mudança do Centro Administrativo para mercado que, segundo ele, poderá ocupar
Taguatinga. Resta agora seguir com políticas o mesmo espaço. Vários casos como esse
nesse sentido. já ocorreram e o resultado são os enormes
engarrafamentos de trânsito, riscos para os
O Plano Piloto torno a dizer, não foi concebi- pedestres e o conseqüente prejuízo da quali-
do para ser uma metrópole com crescimen- dade de vida dos moradores da cidade (um
Cartilha de Preservação de Brasília
supermercado grande, por exemplo, pode ge- Inclua-se você leitor numa cruzada da cidadania
rar um fluxo de até 1.600 carros por hora). As brasiliense pela preservação desse bem nacional.
invasões em área pública são corriqueiras. Reaja cidadão, não admita que sua cidade, que a
Os puxadinhos são outro caso exemplar. Boa capital de todos os brasileiros seja descaracteri-
parte deles existe há mais de 20 anos e são zada. Brasília, o Plano Piloto, é um patrimônio
o resultado de uma fiscalização sistemati- de todos os brasileiros. Leia esta cartilha e saiba
camente omissa que foi ajudada por uma sobre seus direitos de morador de Brasília. Não
legislação deletéria que permitiu que esse admita violações gratuitas ao projeto de Lucio
comércio ocupasse espaço público mediante Costa, ao sonho de Juscelino Kubitschek, à Ca-
o pagamento de uma “módica” quantia legal- pital da Esperança. Proteste, reclame a todas as 17
mente estipulada. O resultado foi a faveliza- instâncias - federais e distritais - use o telefone,
ção do fundo desses blocos comerciais onde o e-mail, as cartas. Ligue para os jornais, para a
hoje o comércio de drogas e a prostituição televisão, para as rádios. Faça valer seus direitos,
proliferam. Enquanto isso, a W3 fenece dian- não desanime nunca, exija a presença de fiscais
te da ausência de políticas de planejamento e do GDF, pois só assim poderemos recuperar
econômicas em seu favor. nossa cidade do estado de negligência ao qual
foi atirada por décadas.
A preservação do Plano Piloto não é apenas um
problema do Iphan ou do GDF. Ela só existirá e
será efetiva na medida em que a população dela
participe. É a comunidade brasiliense, que vi-
vencia os problemas do dia a dia da cidade que
deve acionar os meios de comunicação, o Iphan, Alfredo Gastal
o GDF, o Ministério Público e a própria Polícia Superintendente do Distrito Federal
Federal para coibir e corrigir os desmandos
contra esse bem que pertence à nacionalidade.
Plano Piloto - 50 anos
Capítulo 1
O Patrimônio
18
O que é Patrimônio Cultural?
igrejas, casas, palácios, obras de arte e acer- descaracterizados. O Tombamento pode ser
vos documentais, utiliza-se o Tombamento. aplicado aos bens de natureza material, como
Para os de natureza imaterial, como celebra- edificações, objetos (bens móveis e/ou inte-
ções, danças, lugares e formas de expressão, grados), núcleos urbanos, jardins e paisagens.
utiliza-se o Registro. Ambos os instrumentos
são implementados pelo Poder Público em O que é Registro e o que pode ser registrado?
nível municipal, estadual e federal.
Ato Administrativo realizado pelo Poder
Porém não são esses os únicos meios de reco- Público com o objetivo de preservar bens de
20 nhecer e preservar nosso Patrimônio. Existe natureza imaterial, que tenham como refe-
uma série de medidas pelas quais podemos rência a continuidade histórica e relevância
preservar nossa cultura. Elas vão desde pes- nacional para a memória, a identidade e a
quisas e inventários, realizadas por institui- formação da sociedade brasileira. O regis-
ções públicas e privadas, até a vontade indi- tro pode ser aplicado aos bens de natureza
vidual ou coletiva de preservar o Patrimônio, imaterial, como os fazeres, as celebrações, as
objetivando garantir sua existência para as cantigas, os lugares que lhe são associados e
gerações futuras. todo tipo de manifestação transmitida por
meio de gerações que represente a identida-
O que é Tombamento e o que pode ser Tombado? de cultural de determinado grupo.
O que é o Iphan?
Capítulo 2
Antecedentes de Brasília
e sua Modernidade
22
A construção de Brasília ocorreu após a rea-
lização de várias experiências de renovação
urbana em diversas cidades brasileiras. Rea-
lizações essas que visavam o remodelamento
das cidades tradicionais, ou a criação de no-
vas cidades a partir de modelos adequados à
nova realidade do mundo industrializado do
início do séc. XX.
Pilotis
Cartilha de Preservação de Brasília
25
Eixos Tesourinhas
Plano Piloto - 50 anos
- Organizar a cidade por setores de acordo com as funções morar, trabalhar e lazer - daí os
diferentes setores da nossa cidade;
26
Morar Trabalhar
Lazer
Cartilha de Preservação de Brasília
- Definir as áreas residenciais com equipamentos para nos atender localmente, daí nossas
Unidades de Vizinhança e nossos Comércios Locais.
27
Unidade de Vizinhança
Comércio Local
Plano Piloto - 50 anos
Torre de Televisão
Cartilha de Preservação de Brasília
Capítulo 3
O Plano Urbanístico de Brasília
30
Nossa cidade foi a realização inédita do pro-
grama modernista, na escala de uma Capital
Nacional, tornando-se, por isso, um marco
na história mundial.
Croquis -
Relatório do Plano Piloto
Plano Piloto - 50 anos
Esse
documento
foi produzido
por solicitação do
então Governador do
Distrito Federal José
Aparecido de Oliveira,
32 para que o autor do projeto
fizesse suas ponderações
a respeito da evolução e
preservação da cidade
antes da publicação de
nova legislação específica
do Distrito Federal para
protegê-la (Dec. n° 10.829/1987).
Nesse relatório, Lucio Costa,
definiu as denominadas escalas
urbanas nas quais se baseia o
tombamento de Brasília:
Escala Monumental
Escala Residencial
Escala Gregária Mapa de escala predominante por área
Escala Bucólica
Cartilha de Preservação de Brasília
34
Escala Gregária
A Escala Residencial é protegida por parâmetros urbanos baseados na volumetria e nos usos
permitidos nas Superquadras. Sua função é necessariamente residencial. As construções com-
plementares, cinemas, bibliotecas, comércio, igrejas etc., são apoio ao uso residencial. As Uni-
dades de Vizinhança são os conjuntos de quatro Superquadras, que se repetem ao longo das
Asas Sul e Norte.
Capítulo 4
A Proteção do Conjunto
Urbanístico de Brasília
36
O conjunto urbanístico de Brasília está legal-
mente protegido em três instâncias:
O que é prejudicial ao tombamento de Brasília? - fechamento dos pilotis dos prédios residenciais.
40
42
Palácio do Planalto
Palácio da Justiça
43
Capítulo 5
Legislação e Patrimônio
44
Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 (texto parcial)
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES
INDIVIDUAIS E COLETIVOS
DOS DIREITOS E
GARANTIAS FUNDAMENTAIS
Decreto-lei nº 25
de 30 de novembro de 1937
CAPÍTULO I
DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO
48 E ARTÍSTICO NACIONAL
fica, ameríndia e popular, e bem assim as nal, mas deverá ser notificado à entidade a
mencionadas no § 2º do citado art. 1º. quem pertencer, ou sob cuja guarda estiver
a coisa tombada, afim de produzir os neces-
2) no Livro do Tombo Histórico, as coisas de sários efeitos.
interêsse histórico e as obras de arte histórica;
Art. 6º O tombamento de coisa pertencente à
3) no Livro do Tombo das Belas Artes, as coi- pessôa natural ou à pessôa jurídica de direito pri-
sas de arte erudita, nacional ou estrangeira; vado se fará voluntária ou compulsóriamente.
1) o Serviço do Patrimônio Histórico e Ar- Art. 10. O tombamento dos bens, a que se re-
tístico Nacional, por seu órgão competente, fere o art. 6º desta lei, será considerado pro-
notificará o proprietário para anuir ao tom- visório ou definitivo, conforme esteja o res-
bamento, dentro do prazo de quinze dias, a pectivo processo iniciado pela notificação ou
contar do recebimento da notificação, ou concluído pela inscrição dos referidos bens
para, si o quisér impugnar, oferecer dentro do no competente Livro do Tombo.
mesmo prazo as razões de sua impugnação.
Parágrafo único. Para todas os efeitos, salvo a
2) no caso de não haver impugnação dentro disposição do art. 13 desta lei, o tombamento
do prazo assinado. que é fatal, o diretor do provisório se equiparará ao definitivo. 51
Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional mandará por símples despacho que CAPÍTULO III
se proceda à inscrição da coisa no competen- DOS EFEITOS DO TOMBAMENTO
te Livro do Tombo.
Art. 11. As coisas tombadas, que pertençam à
3) se a impugnação for oferecida dentro do União, aos Estados ou aos Municípios, inalie-
prazo assinado, far-se-á vista da mesma, den- náveis por natureza, só poderão ser transferi-
tro de outros quinze dias fatais, ao órgão de das de uma à outra das referidas entidades.
que houver emanado a iniciativa do tomba-
mento, afim de sustentá-la. Em seguida, in- Parágrafo único. Feita a transferência, dela
dependentemente de custas, será o processo deve o adquirente dar imediato conheci-
remetido ao Conselho Consultivo do Serviço mento ao Serviço do Patrimônio Histórico e
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Artístico Nacional.
que proferirá decisão a respeito, dentro do
prazo de sessenta dias, a contar do seu recebi- Art. 12. A alienabilidade das obras históricas
mento. Dessa decisão não caberá recurso. ou artísticas tombadas, de propriedade de pes-
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sôas naturais ou jurídicas de direito privado viço do Patrimônio Histórico e Artistico Nacional,
sofrerá as restrições constantes da presente lei. dentro do mesmo prazo e sob a mesma pena.
Art. 13. O tombamento definitivo dos bens Art. 14. A. coisa tombada não poderá saír do
de propriedade partcular será, por iniciativa país, senão por curto prazo, sem transferência
do órgão competente do Serviço do Patrimô- de domínio e para fim de intercâmbio cultural,
nio Histórico e Artístico Nacional, transcrito a juízo do Conselho Consultivo do Serviço do
para os devidos efeitos em livro a cargo dos Patrimônio Histórico e Artistico Nacional.
oficiais do registro de imóveis e averbado ao
52 lado da transcrição do domínio. Art. 15. Tentada, a não ser no caso previsto no
artigo anterior, a exportação, para fora do país,
§ 1º No caso de transferência de proprieda- da coisa tombada, será esta sequestrada pela
de dos bens de que trata êste artigo, deverá União ou pelo Estado em que se encontrar.
o adquirente, dentro do prazo de trinta dias,
sob pena de multa de dez por cento sôbre o § 1º Apurada a responsábilidade do proprie-
respectivo valor, fazê-la constar do registro, tário, ser-lhe-á imposta a multa de cincoenta
ainda que se trate de transmissão judicial ou por cento do valor da coisa, que permanece-
causa mortis. rá sequestrada em garantia do pagamento, e
até que êste se faça.
§ 2º Na hipótese de deslocação de tais bens, de-
verá o proprietário, dentro do mesmo prazo e § 2º No caso de reincidência, a multa será
sob pena da mesma multa, inscrevê-los no regis- elevada ao dôbro.
tro do lugar para que tiverem sido deslocados.
§ 3º A pessôa que tentar a exportação de coi-
§ 3º A transferência deve ser comunicada pelo ad- sa tombada, alem de incidir na multa a que
quirente, e a deslocação pelo proprietário, ao Ser- se referem os parágrafos anteriores, incor-
Cartilha de Preservação de Brasília
rerá, nas penas cominadas no Código Penal tombada, fazer construção que lhe impeça
para o crime de contrabando. ou reduza a visibílidade, nem nela colocar
anúncios ou cartazes, sob pena de ser man-
Art. 16. No caso de extravio ou furto de qual- dada destruir a obra ou retirar o objéto, im-
quer objéto tombado, o respectivo proprietário pondo-se nêste caso a multa de cincoenta
deverá dar conhecimento do fáto ao Serviço por cento do valor do mesmo objéto.
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional,
dentro do prazo de cinco dias, sob pena de Art. 19. O proprietário de coisa tombada,
multa de dez por cento sôbre o valor da coisa. que não dispuzer de recursos para proceder
às obras de conservação e reparação que a 53
Art. 17. As coisas tombadas não poderão, mesma requerer, levará ao conhecimento do
em caso nenhum ser destruidas, demolidas Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico
ou mutiladas, nem, sem prévia autorização Nacional a necessidade das mencionadas
especial do Serviço do Patrimônio Histórico obras, sob pena de multa correspondente ao
e Artistico Nacional, ser reparadas, pintadas dobro da importância em que fôr avaliado o
ou restauradas, sob pena de multa de cinco- dano sofrido pela mesma coisa.
enta por cento do dano causado.
§ 1º Recebida a comunicação, e consideradas
Parágrafo único. Tratando-se de bens perten- necessárias as obras, o diretor do Serviço do
centes á União, aos Estados ou aos municípios, Patrimônio Histórico e Artistico Nacional
a autoridade responsável pela infração do pre- mandará executá-las, a expensas da União,
sente artigo incorrerá pessoalmente na multa. devendo as mesmas ser iniciadas dentro do
prazo de seis mezes, ou providenciará para
Art. 18. Sem prévia autorização do Serviço que seja feita a desapropriação da coisa.
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacio-
nal, não se poderá, na vizinhança da coisa § 2º À falta de qualquer das providências
Plano Piloto - 50 anos
Art. 25. O Serviço do Patrimônio Histórico e Art. 28. Nenhum objéto de natureza idêntica
Artístico Nacional procurará entendimentos à dos referidos no art. 26 desta lei poderá ser
com as autoridades eclesiásticas, instituições posto à venda pelos comerciantes ou agentes
científicas, históricas ou artísticas e pessôas de leilões, sem que tenha sido préviamente
naturais o jurídicas, com o objetivo de obter autenticado pelo Serviço do Patrimônio His-
a cooperação das mesmas em benefício do tórico e Artístico Nacional, ou por perito em
patrimônio histórico e artístico nacional. que o mesmo se louvar, sob pena de multa de
cincoenta por cento sôbre o valor atribuido
Art. 26. Os negociantes de antiguidades, de ao objéto.
56 obras de arte de qualquer natureza, de ma-
nuscritos e livros antigos ou raros são obri- Parágrafo único. A. autenticação do mencio-
gados a um registro especial no Serviço do nado objeto será feita mediante o pagamento
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, de uma taxa de peritagem de cinco por cento
cumprindo-lhes outrossim apresentar semes- sôbre o valor da coisa, se êste fôr inferior ou
tralmente ao mesmo relações completas das equivalente a um conto de réis, e de mais cin-
coisas históricas e artísticas que possuírem. co mil réis por conto de réis ou fração, que
exceder.
Art. 27. Sempre que os agentes de leilões ti-
verem de vender objetos de natureza idên- Art. 29. O titular do direito de preferência
tica à dos mencionados no artigo anterior, gosa de privilégio especial sôbre o valor pro-
deverão apresentar a respectiva relação ao duzido em praça por bens tombados, quanto
órgão competente do Serviço do Patrimônio ao pagamento de multas impostas em virtu-
Histórico e Artístico Nacional, sob pena de de de infrações da presente lei.
incidirem na multa de cincoenta por cento
sôbre o valor dos objetos vendidos. Parágrafo único. Só terão prioridade sôbre o
privilégio a que se refere êste artigo os cré-
Cartilha de Preservação de Brasília
Getúlio Vargas.
Gustavo Capanema
Plano Piloto - 50 anos
I. a Praça dos Três Poderes fica preservada V. nos terrenos do canteiro central verde
como se encontra nesta data, no que diz res- são vedadas quaisquer edificações acima do
peito aos Palácios do Planalto e do Supremo nível do solo existente, garantindo a plena vi-
Tribunal Federal, ao Congresso Federal, bem sibilidade ao conjunto monumental;
como aos elementos escultóricos que a com-
plementam, inclusive o Panteão, a Pira, o VI. a Esplanada dos Ministérios ao sul e ao
Monumento ao Fogo Simbólico, construídos norte do canteiro central, à exceção da Ca-
fora da praça, mas que se constituem parte tedral de Brasília, será de uso exclusivo dos
integrante dela; Ministérios Federais, sendo entretanto ad-
mitidas, tal como constam do Plano Piloto,
II. também ficam incluídas para preservação edificações de acréscimos com um pavimen-
as sedes vizinhas dos Palácios Itamaraty e da to em nível de mezanino e sobre pilotis, para
Plano Piloto - 50 anos
instalação de pequeno comércio e serviços II. nas duas alas, sul e norte, nas seqüências de
de apoio aos servidores, no espaço compre- Superquadras numeradas de 102 a 116, de 202
endido entre o meio dos blocos e a escala ex- a 216 e de 302 a 316, as unidades de habitações
terna posterior. conjuntas terão seis pavimentos, sendo edifica-
das sobre piso térreo em pilotis, livre de quais-
VII. as áreas compreendidas entre a Espla- quer construções que não se destinem a acessos
nada dos Ministérios e a Plataforma Rodo- e portarias;
viária ao sul e ao norte do canteiro central,
e que constituem os Setores Culturais Sul e III. nas duas alas, sul e norte, nas seqüências de
60 Norte, destinam-se a construções públicas Superquadras duplas numeradas de 402 a 416,
de caráter cultural. as unidades de habitações conjuntas terão 03
(três) pavimentos, sendo edificadas sobre pisos
Art. 4º A escala residencial, proporcionando térreos em pilotis, livre de quaisquer constru-
uma nova maneira de viver, própria de Bra- ções que não se destinem a acessos e portarias;
sília, está configurada ao longo das alas Sul e
Norte do Eixo Rodoviário Residencial e para IV. em todas as Superquadras, nas alas sul
sua preservação serão obedecidas as seguin- e norte, a taxa máxima de ocupação para a
tes disposições: totalidade das unidades de habitações con-
juntas é de quinze por cento da área do terre-
I. cada Superquadra, nas alas sul e norte, con- no compreendido pelo perímetro externo da
tará com um único acesso para transporte de faixa verde;
automóvel e será cercada, em todo o seu perí-
metro, por faixa verde de vinte metros de largu- V. além das unidades de habitações con-
ra com densa arborização; juntas serão previstas e permitidas pequenas
edificações de uso comunitário, com, no má-
ximo, um pavimento;
Cartilha de Preservação de Brasília
VII. as áreas entre as Superquadras, nas alas Art. 7º Para a preservação da escala gregária
sul e norte, denominadas entrequadras, des- referida no artigo anterior, serão obedecidas
tinam-se a edificações para atividades de uso as seguintes disposições:
comum e de âmbito adequado às áreas de
vizinhança próximas, como ensino, esporte, I. a Plataforma Rodoviária será preservada 61
recreação e atividades culturais e religiosas. em sua integridade estrutural e arquitetônica
original, incluindo-se nessa proteção as suas
Art. 5º O Eixo Rodoviário Residencial, nas praças atualmente implantadas defronte aos
alas sul e norte, terá respeitadas suas carac- Setores de Diversões Sul e Norte;
terísticas originais, mantendo-se o caráter
rodoviário que lhe é inerente; II. os Setores de Diversões Sul e Norte serão
mantidos com a atual cota máxima de co-
Parágrafo único - O sistema viário que serve roamento, servindo as respectivas fachadas
às Superquadras manterá os acessos existen- voltadas para a Plataforma Rodoviária, em
tes e as interrupções nas vias L1 e W1, con- toda a altura de campo livre, para instalação
forme se verifica na ala sul, devendo ser o de painéis luminosos de reclame, permitin-
mesmo obedecido na ala norte. do-se o uso misto de cinemas, teatros e ca-
sas de espetáculos, bem como restaurantes,
Art. 6º A escala gregária com que foi concebi- cafés, bares, comércio de varejo e outros que
do o centro de Brasília em torno da intersec- propiciem o convívio público;
ção dos Eixos Monumental e Rodoviário, fica
Plano Piloto - 50 anos
tas na Lei Santiago Dantas (Lei nº 3.751/60) e Parágrafo único - Nos terrenos contíguos à
no Decreto nº 10.829/87 do GDF que a regu- Esplanada dos Ministérios só serão admiti-
lamenta e respalda a inscrição da cidade no das as edificações necessárias à expansão dos
Patrimônio Cultural da Humanidade. serviços diretamente vinculados aos Minis-
térios do Governo Federal, não podendo ser
Art. 10 Será mantido o acesso público à orla ultrapassada a cota máxima do coroamento
do lago em todo seu perímetro, à exceção dos dos anexos existentes.
terrenos, inscritos em Cartório de Registro de
Imóveis com acesso privativo à água. Art. 12 Para efeito de aplicação do disposto
nesta Portaria, são considerados setores ins- 63
Art. 11 Com objetivo de assegurar a perma- titucionalizados todas as partes da cidade de
nência no tempo da presença urbana con- Brasília referidas no Memorial do Plano Pi-
junta das quatro escalas referidas nos artigos loto ou criadas pela Administração durante
anteriores desta Portaria, em todas as áreas já a implantação da Capital e consagradas pelo
ocupadas no entorno dos dois eixos e contidas uso popular.
no perímetro delimitado nos parágrafos 1º e
2º do artigo 1º desta Portaria, ficam mantidos Art. 13 Esta Portaria entra em vigor na data
os critérios de ocupação aplicados pela admi- da sua publicação, revogadas as disposições
nistração nesta data, sendo que nos terrenos em contrário.
destinados à recreação e esporte, nenhuma
edificação poderá ultrapassar a cota máxima
do coroamento de 7 (sete metros), à exceção
dos ginásios cobertos e nos terrenos destina-
dos a hotéis de turismo, onde nenhuma edi-
ficação poderá ultrapassar a cota máxima de Jayme Zettel
coroamento de 12m (doze metros).
Plano Piloto - 50 anos
Dereto n° 10.829,
de 14 de outubro de 1987/GDF
Regulamenta o art. 38 da Lei n° 3.751 de 13 jeto de autoria do Arquiteto Lucio Costa, es-
de abril de 1960, no que se refere à preserva- colhido como vencedor pelo júri internacio-
ção da concepção urbanística de Brasília. nal do concurso para a construção da nova
Capital do Brasil.
O GOVERNADOR DO DISTRITO FEDE-
RAL, no uso das atribuições que lhe confere § 1° - A realidade físico-territorial correspon-
o art. 20, II, da Lei n°- 3.751, de 13 de abril de ao Plano Piloto referido no caput deste
de 1960; considerando que o Art. 38 da Lei n° Artigo, deve ser entendido como o conjunto
3.751, de 13 de abril de 1960, preserva o Plano urbano construído em decorrência daquele
64 Piloto de Brasília, tal como apresentado por projeto e cujas complementações, preserva-
Lucio Costa; considerando que, para a exata ção e eventual expansão devem obedecer às
aplicação do art. 38, da Lei n° 3.751, de 13 de recomendações expressas no texto intitulado
abril de 1960, faz-se oportuna a edição de nor- Brasília Revisitada e respectiva planta em es-
ma regulamentar que explicite o conceito do cala 1/25.000, e que constituem os anexos I e
bem cultural por ela protegido, DECRETA: II deste Decreto.
III - Nos demais setores referidos no artigo an- daqueles onde é prevista expansão predomi-
terior o gabarito não será uniforme, sendo que nante residencial em Brasília Revisitada.
nenhuma edificação poderá ultrapassar a cota
máxima de sessenta e cinco metros, sendo per- § 1° - Nas áreas referidas no caput deste Ar-
mitidos os usos indicados pela denominação tigo onde prevalece a cobertura vegetal do
dos setores de forma diversificada, ainda que se cerrado nativo, esta será preservada e as de-
mantenham as atividades predominantes pre- mais serão arborizadas na forma de bosques,
conizadas pelo Memorial do Plano Piloto. com particular ênfase ao plantio de massas
de araucária, no entorno direto da Praça dos
68 CAPÍTULO V Três Poderes.
DA ESCALA BUCÓLICA
§ 2° - Nas áreas non-aedificandi poderão ser
Art. 9° - A escala bucólica, que confere à Brasília o permitidas instalações públicas de pequeno
caráter de cidade-parque, configurada em todas porte que venham a ser consideradas neces-
as áreas livres, contíguas a terrenos atualmente sárias, desde que aprovadas pelo CAUMA.
edificados ou institucionalmente previstos para
edificação e destinadas à preservação paisagísti- Art. 11º - Será mantido o acesso público à orla
ca e ao lazer, será preservada. observando-se as do Lago em todo o seu perímetro, à exceção
disposições dos Artigos subsequentes. dos terrenos, inscritos em Cartório de Regis-
tro de Imóveis, com acesso privativo à água.
Art. 10º - São consideradas áreas non-aedifi-
candi todos os terrenos contidos no períme- CAPÍTULO VI
tro descrito nos parágrafos 1° e 2° do artigo 1° DAS ÁREAS JÁ OCUPADAS NO
deste Decreto que não estejam edificados ou ENTORNO DIRETO DOS DOIS EIXOS
institucionalmente destinados à edificação,
nos termos da legislação vigente, à exceção Art. 12º - Com o objetivo de assegurar a per-
Cartilha de Preservação de Brasília
70
Lucio Costa
Cartilha de Preservação de Brasília
INTRODUÇÃO
der civil que a gerou - Brasília preenche suas de sentido ainda desbravador nos moldes da
áreas ainda desocupadas e quer se expandir. tradição colonial. E o que se indaga é como,
no entender de cada concorrente, uma tal ci-
Não menos evidente é o fato de que - por to- dade deve ser concebida.” (introdução à me-
das as razões - a capital é histórica de nascen- mória descritiva do plano-piloto)
ça, o que não apenas justifica mas exige que se
preserve, para as gerações futuras, as caracte- Assim, o plano-piloto (como de resto as ou-
rísticas fundamentais que a singularizam. tras propostas apresentadas) foi, na realida-
de, uma concepção já traduzida em termos
72 É exatamente na concomitância destas duas de projeto urbano, e não apenas uma defini-
contingências que reside a peculiaridade do ção preliminar de partido e diretrizes gerais
momento crucial que Brasília hoje atravessa: relativas a uso e ocupação do solo, e isto por-
de um lado, como crescer assegurando a per- que o objetivo era a transferência da capital -
manência do testemunho da proposta original, e não a elaboração de projeto - em três anos.
de outro, como preservá-la sem cortar o im-
pulso vital inerente a uma cidade tão jovem. “Se a sugestão é válida, estes dados, con-
quanto sumários na sua aparência, já serão
A liberação do acesso ao concurso reduziu suficientes, pois revelarão que apesar da
de certo modo a consulta àquilo que de fato espontaneidade original, ela foi, depois, in-
importa, ou seja, a concepção urbanística tensamente pensada e resolvida.” (memória
da cidade propriamente dita, porque esta descritiva do plano piloto.)
não será, no caso, uma decorrência do pla-
nejamento regional, mas a causa dele, a sua CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS
fundação é que dará ensejo ao ulterior de- DO PLANO-PILOTO
senvolvimento planejado da região. Trata-se
de um ato deliberado de posse, de um gesto 1 - A interação de quatro escalas urbanas
Cartilha de Preservação de Brasília
rização densa da faixa verde que a delimita e Rio de Janeiro, por exemplo, na época, en-
lhe confere cunho de “pátio interno” urbano. tenderá talvez melhor a vontade de desafogo
viário, a idéia de se poder atravessar a cidade
A escala gregária surge, logicamente, em tor- de ponta a ponta livre de engarrafamentos.
no da interseção dos dois eixos, a Plataforma
Rodoviária, elemento de vital importância O que permanece incompreensível é até hoje
na concepção da cidade e que se tornou, não existir - pelo menos na área urbana - um
além do mais, o ponto de ligação de Brasília serviço de ônibus municipal impecável, que
com as cidades satélites. No centro urbano, a se beneficie das facilidades existentes (ape-
74 densidade de ocupação se previu maior e os nas a título de exemplo: as pistas laterais do
gabaritos mais altos, à exceção dos dois Seto- Eixo Rodoviário - Residencial - destinadas
res de Diversões. prioritariamente ao transporte coletivo - tem
mão nos dois sentidos; no entanto sua uti-
E a intervenção da escala bucólica no ritmo e lização pelos ônibus só se faz numa direção
na harmonia dos espaços urbanos se faz sen- em cada uma delas). Bem como não se ter
tir na passagem, sem transição, do ocupado ainda introduzido o sistema de “transferên-
para o não-ocupado em lugar de muralhas, a cia” que se impõe para que o passageiro não
cidade se propôs delimitada por áreas livres seja onerado indevidamente.
arborizadas.
A estrutura viária da cidade funciona como ar-
2 - A estrutura viária cabouço integrador das várias escalas urbanas.
4 - Orla do lago
76
30 renques: 15 duplos e 15 singelos
Cartilha de Preservação de Brasília
77
80
Cartilha de Preservação de Brasília
Muito atenciosamente,
Lucio Costa 31/III/86
Plano Piloto - 50 anos
Nas pracinhas que articulam as Quadras fi- Os apartamentos de 60m² tanto podem aten-
cam o comércio local e pequenas oficinas, e der a famílias de baixa renda como à classe
ao longo da via de distribuição, ou voltados média baixa e média-média, e à gente moça
para a área rural, se localizam as escolas, de um modo geral. O projeto dos aparta-
mercados, postos de saúde, templos e demais mentos menores responde às condições
equipamentos de interesse comunitário. reais e à maneira de viver da faixa social a
que se destina. Assim, quando seu primeiro
ocupante melhorar de vida e puder
morar num apartamento maior, o
84 novo ocupante será, normalmen-
te, outra pessoa da mesma faixa de
renda que ele era.
Cartilha de Preservação de Brasília
Como a intenção é misturar as várias grada- A extensão total de vias por Quadra é de 844m,
ções sociais, cada Quadra deverá ter metade dos quais 684 com 6m de largura e 160 com
dos blocos com apartamentos de 30m² e me- 7m, ou seja, 1.50m/unidade residencial (com-
tade com apartamentos de 60m² distribuídos putando exclusivamente os apartamentos, mas
sempre de forma alternada, de modo a impe- atendendo a todas as demais edificações).
dir a segregação dentro da própria Quadra.
A extensão das redes de drenagem de águas
O custo da infra-estrutura urbana é conside- pluviais, esgotos, distribuição de água potável
ravelmente menor do que o de uma implan- e energia incidem na mesma proporção.
tação rasteira para a mesma população. 85
Plano Piloto - 50 anos
zadas de recreio e outras comodidades, além extensas glebas para uso exclusivo de granjas
do apoio comercial adequado a populações e lavoura, evitando-se assim os inconvenien-
não motorizadas. tes do espraiamento suburbano.”
Por trás dessas quadras cujos habitantes uti- Lucio Costa, maio 85
lizarão o transporte existente, barateando-
lhe o custo devido à freqüência em todo o
percurso, dantes ocioso, estariam, então, as
87
Plano Piloto - 50 anos
comerciais com instalações para esporte e re- 5. Providenciar as articulações viárias neces-
creio e demais equipamentos de interesse co- sárias para fazer prevalecer na cidade de hoje
munitário, sobretudo escolas públicas desti- a mesma clareza e fluência viárias contidas no
nadas ao ensino médio. Proibir a vedação das risco original e, paralelamente, “arrematar” a
áreas cobertas de acesso aos prédios (pilotis) cidade como um todo (recomendo neste sen-
e dos parqueamentos - cobertos ou não. tido consulta ao trabalho “Brasília 57-85”)
te - Oeste Sul e Oeste Norte - foram previstas cio da Alvorada (área C) surgiu como única
Quadras Econômicas (pilotis e três pavimen- forma realista de, uma vez admitida a fixação
tos) para responder à demanda habitacional da Vila, barrar de fato a gradual expansão de
popular e Superquadras (pilotis e seis pavi- parcelamento em lotes individuais naquela
mentos) para classe média, articuladas en- direção, o que interferiria de forma não ape-
tre si por pequenos centros de bairro, com nas inadequada mas desastrosa com a escala
ocupação mais densa, gabaritos mais baixos monumental tão próxima; à primeira vista, a
(dois pavimentos sem pilotis) e uso misto. presença destas quadras - Quadras Planalto
- pode parecer contraditória com a recomen-
92 A idéia de se implantar um renque de peque- dação de se manterem baixos a densidade e
nas Quadras (240x240m) com gabarito de os gabaritos nas áreas onde é admitida ocu-
quatro pavimentos sobre pilotis ao longo da pação entre o “Plano Piloto” e a orla do lago;
via localizada entre a Vila Planalto e o Palá- na realidade, entretanto, o gabarito uniforme
de quatro pavimentos ao longo de cerca de
Cartilha de Preservação de Brasília
1.000 metros cria uma dominante horizontal Já na área F, muito mais extensa e com topo-
serena que, aliada à presença - indispensável grafia peculiar, a ocupação deve prever Qua-
- dos enquadramentos arborizados das Qua- dras Econômicas ou conjuntos geminados
dras assegura a harmonia do conjunto com para atender à população de menor renda ,
seu entorno. e considerar a eventual possibilidade de fi-
xação, em termos adequados, da atual Vila
A ocupação residencial da quarta área (D) Paranoá, Os demais núcleos de edifícios re-
só é admissível na forma de renque singelo sidenciais devem ser soltos do chão, tendo,
de pequenas quadras (como as Quadras Pla- no máximo, quatro pavimentos e com ga-
nalto, com pilotis e quatro pavimentos) ou barito de preferência uniforme para que se 93
de Quadras Econômicas (pilotis e três pavi- mantenha, apesar da ocupação, a serenidade
mentos). Em razão da localização desta área, da linha do horizonte, sendo cada conjunto,
a fim de evitar interferência negativa com o - desta vez de fato e de saída - emoldurado
Eixo Rodoviário sul, além do gabarito ser por farta arborização. Os centros de bairro,
mais baixo, toda a extensão de terreno com- mais densamente ocupados, devem sempre
preendida entre as novas quadras e o Eixo ter gabaritos mais baixos.
deve permanecer não edificada ou destinada
a usos que impliquem em baixa densidade de Nessas “Asas Novas”, mesmo quando de con-
ocupação, e sempre cobertas de verde para figuração diversificada, deve também preva-
diluir no arvoredo as construções. lecer a mesma conotação de cidade parque,
vale dizer, pilotis livres, predomínio de ver-
A área E - Asa Nova Sul - sugere ocupação li- de, gabaritos baixos.
near, também na forma de pequenas quadras
como as Quadras Planalto, com gabarito Convém ainda destinar parte da Asa Nova
uniforme de quatro pavimentos sobre pilotis Norte a parcelamento em lotes individuais,
e cercadura arborizada. aproveitando os caprichos da topografia, res-
Plano Piloto - 50 anos
B
peitada a proteção arborizada dos córregos e
nascentes. Assim, esta expansão futura aten-
derá às três faixas de renda.
96
Numa área de 320x160m, 504 unidades (2500 Na mesma área a construção de casas térreas
habitantes) em 28 blocos (três pisos sobre pi- germinadas comportará apenas 270 unida-
lotis). Terreno 100% livre para benefício os des ocupando a totalidade do terreno com
moradores (arvoredo, terreiros, áreas distin- grama de 1440m.
tas de recreio (três idades), escola, creche,
centro comunitário, com ponto local. 880m Tudo depende, em última análise, de deci-
de calçamento e de infra-estrutura água, luz, são convicta neste sentido - os meios de fa-
esgoto, etc). zer acabam aparecendo. Como capital, cabe
Cartilha de Preservação de Brasília
sas maiores e coisas menores têm importân- conceito urbanístico, tem filiação certa, não
cia análoga, consideradas cada uma em sua é uma cidade bastarda. O seu “fácies” urbano
escala; é enfrentar os inúmeros problemas é o de uma cidade inventada que se assumiu
do dia a dia com disposição, firmeza e flexi- na sua singularidade e adquiriu personali-
bilidade; é tanto saber dizer não como dizer dade própria graças à arquitetura de Oscar
sim na busca contínua da resposta adequada, Niemeyer e à sua gente.
- tarefa tantas vezes ingrata e inglória para os
técnicos que participam dedicadamente de
sucessivas administrações ; é fazer prevale-
cer o senso comum, fugindo das teorizações 99
acadêmicas e protelatórias, e da improvisa-
ção irresponsável. É lembrar-se que a cida-
de foi pensada “para o trabalho ordenado e
eficiente, mas ao mesmo tempo cidade viva
e aprazível, própria ao devaneio e à especu-
lação intelectual, capaz de tornar-se, com o
tempo, além de centro de governo e adminis-
tração, num foco de cultura dos mais lúcidos
e sensíveis do País.”
102
Cartilha de Preservação de Brasília
Bibliografia
Redação e Revisão
Superintendência do Iphan no Distrito Federal
Os textos do Capítulo 5 foram reproduzidos conforme publicações originais
Fotos
Acervo Iphan
Croquis
Relatório do Plano Piloto de Brasília Lucio Costa
Projeto Gráfico
Inara Vieira
Programação Visual
Gerência de Editoração da Cogeprom:
Inara Vieira, Duda Miranda e Deborah Vilarino (estagiária)