Você está na página 1de 5

UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO

ESCOLA DE MINAS
DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E URBANISMO
DISCIPLINA: ARQ 105 ARQUITETURA BRASILEIRA II
PROFª: Drª PATRÍCIA JUNQUEIRA

CRISE DO MOVIMENTO MODERNO NO BRASIL

Anos 1970: reavaliação dos paradigmas do passado. Morte de grandes líderes (Charles de
Gaulle, Mao Tsé-Tung) e de grandes nomes da modernidade do século XX (Picasso, Chaplin,
Pablo Neruda).

O conceito de massa perdeu lugar para a valorização do individualismo, da identidade, das


minorias, do meio ambiente e do patrimônio.

A América Latina passava nesse período por um momento de perseguições políticas e


intolerância, empreendidas por governos ditatoriais.

Entre a segunda metade da década de 1960 e início de 1970, o Brasil vivia um momento de
desenvolvimento econômico.

A linguagem da arquitetura moderna se institucionalizou, tornando-se um patrimônio imutável e


definitivo, perdendo assim, sua vitalidade. Independente da tipologia (casa, agência bancária,
edifícios, escolas, etc.) era usado o repertório moderno: estruturas em concreto, grandes vãos,
panos de vidro, concreto aparente, pilares esculturais. Mas esses elementos perderam seu
conteúdo original, transformando-se apenas em cópias.

O sonho dos militares era que o Brasil entrasse para o rol dos países desenvolvidos. E a
arquitetura alimentava essa pretensão. Durante o período conhecido como “milagre econômico”
(final da década de 1960 e início da década de 1970) houve um aumento significativo de projetos
no país.

A arquitetura brasileira dessa fase dialogava menos com o exterior e também havia menos
discussão interna, a principal revista de arquitetura, a Acrópole, saiu de circulação em 1971.

Até 1973, não havia nenhuma revista especializada nacional, quando houve o lançamento da CJ
Arquitetura, que deixou de ser impressa em 1978 e o relançamento da revista Módulo, em 1975.

Segundo Bastos e Zein (2011), pode-se considerar a crise da modernidade brasileira iniciada com
o ciclo de debates “Arquitetura Brasileira após Brasília: Depoimentos”, promovida por um grupo de
jovens arquitetos do Rio nos anos de 1976 e 1977. Um segundo momento foi marcado pelo
lançamento da revista Pampulha, em Belo Horizonte, em 1979 por um grupo de arquitetos
mineiros.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
ESCOLA DE MINAS
DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E URBANISMO
DISCIPLINA: ARQ 105 ARQUITETURA BRASILEIRA II
PROFª: Drª PATRÍCIA JUNQUEIRA

A revista foi divulgada nacionalmente e, considerada por muitos profissionais na época, como um
“sopro de ar fresco” nas discussões sobre arquitetura.

Apesar das referências e de contar com depoimentos e entrevistas de Niemeyer e Lucio Costa em
seu primeiro exemplar, a revista abriu espaço para discussões de outras linhas e outras formas de
pensar arquitetura.

Como produto editorial, Pampulha foi uma revista independente, reunindo os


interesses e a vontade de arquitetos numa difusa e não direcionada discussão
arquitetônica. Era portadora de uma mensagem com linguagem local, bem-
humorada, otimista e nem um pouco compromissada com discursos fechados e
completos – refletindo um coletivo de colaboradores das mais diversas matizes.
Ainda em pleno período da ditadura militar, a revista publicava artigos de
arquitetura, artes plásticas, literatura, ecologia e temas afins com uma serenidade
distanciada da engajada retórica política vigente em São Paulo e Rio de Janeiro.
(SEGAWA, 2002: 194)

O lançamento da revista Projeto, na passagem da década de 1970 para a de 1980, marcou a volta
do debate arquitetônico no país. A revista publicava projetos de arquitetos pouco conhecidos até
então, como Eladio Dieste, promovendo alternativas à arquitetura “oficial”, além dos projetos,
apareciam em suas páginas textos críticos importantes como os de Carlos Nelson Ferreira dos
Santos.

Outro momento que contribuiu para a abertura da discussão arquitetônica no país se deu em
1983, com a Exposição Arquitetura Brasileira Atual que aconteceu em Buenos Aires e depois
percorreu várias cidades no Brasil. Foi planejada pela revista Projeto em parceria com o Centro de
Arte y Comunicación de Buenos Aires e contou com a participação de 97 arquitetos e equipes.

Essa exposição proporcionou um mapeamento da produção arquitetônica em todo o país que


passou a ser publicada na revista. Além disso, a publicação também foi incorporando conteúdo
teórico e crítico.

Em 1985, a primeira edição da revista Óculum, organizada por um grupo de recém-formados pela
PUC de Campinas, publica uma entrevista com os arquitetos mineiros Éolo Maia, Jô Vasconcellos
e Sylvio de Podestá, onde se debate, entre outros temas, a pós-modernidade.

Éolo Maia faz o seguinte comentário sobre o assunto:


UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
ESCOLA DE MINAS
DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E URBANISMO
DISCIPLINA: ARQ 105 ARQUITETURA BRASILEIRA II
PROFª: Drª PATRÍCIA JUNQUEIRA

a arquitetura está passando uma fase muito controvertida, de transição, e no


Brasil o pessoal está com medo de discutir o que está acontecendo,
principalmente em São Paulo, pois lá se tem uma linha muito definida, Artigas,
Ruy Ohtake etc., que tem um trabalho muito bom; mas as coisas estão se
modificando um pouco e estão meio confusos – eles não gostam modificações ou
brincadeiras. Mas isso é muito saudável, pois nós estamos muito atrasados com
relação a outras atividades culturais. A música, o teatro, e o cinema evoluíram
muito, a arquitetura ficou meio paradinha. (MAIA apud BASTOS e ZEIN, 2011:
224)

Nessa mesma entrevista, Éolo Maia alerta para a assimilação acrítica dessa linguagem
arquitetônica:

Agora, todo mundo pensa que arquitetura pós-moderna é botar coluna grega,
pórticos... não é só isso, pode até ser... mas não é só isso, é uma coisa ampla,
ninguém sabe direito o que é, essa discussão é até mundial. (...) Antes o pessoal
não discutia arquitetura, era só seguir o modelo; então está se tornando perigoso
porque vai ter muito arquiteto novo que vai pegar essas leituras mais fáceis, e sem
uma maior discussão, e vai começar a fazer... pós-modernoso. (MAIA apud
BASTOS e ZEIN, 2011: 224)

Nos fins dos anos 1980, o alerta de Éolo Maia se tornou realidade e vários arquitetos adotaram
um estilo “pós-modernoso”, em geral, caracterizado pela adoção de elementos clássicos, pelas
superposições e colagens de citações, composição simétrica, entre outros.

Foi o grupo mineiro, responsável pela revista Pampulha, que organizou o XII Congresso Brasileiro
de Arquitetos que aconteceu em Belo Horizonte, em 1985. Este evento aconteceu dentro de um
contexto diferente: maior abertura política, abrandamento da ditadura e recessão econômica.

Neste congresso foi possível o debate sobre arquitetura como disciplina, discussão proibida
dentro das escolas por questões políticas e ideológicas.

A discussão da arquitetura pós-moderna, que até então era pouco expressiva no Brasil, encontrou
espaço na produção mineira, desvinculada da linguagem adotada no Rio e em São Paulo. Esse
grupo era formado por: Álvaro Hardy, Éolo Maia, Jô Vasconcellos, José Eduardo Ferolla, Gustavo
Penna, Joel Campolina, Sylvio Podestá.

Éolo Maia e Sylvio Podestá são considerados os mais livres e ousados, com uma produção mais
próxima do que estava sendo feito no exterior, mas com elementos da tradição mineira.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
ESCOLA DE MINAS
DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E URBANISMO
DISCIPLINA: ARQ 105 ARQUITETURA BRASILEIRA II
PROFª: Drª PATRÍCIA JUNQUEIRA

Não eram apenas os mineiros que estavam incluindo formas regionais em seus projetos. Existem
outros exemplos pelo Brasil, como Moacyr Moojen Marques, João José Vallandro e Carlos Alberto
Hübner. Arquitetos do sul do país, com uma produção onde aparecem referências à imigração
alemã e italiana.

Os arquitetos da região amazônica também tendem a introduzir elementos locais associados a


uma preocupação ecológica.

Nas grandes metrópoles como Rio de Janeiro e São Paulo, os grandes escritórios de arquitetura
atendem às demandas de empresas nacionais e multinacionais que procuram por eficiência
tecnológica e pela construção de uma imagem empresarial de padrões internacionais. Alguns
desses famosos escritórios: Croce, Aflalo & Gasperini, Carlos Bratke, Königsberger Vannucchi,
Rino Levi Arquitetos Associados, Botti e Rubin.

A discussão da pós-modernidade trouxe um aumento da tolerância com a diversidade, mais


sensibilidade, apreensão e compreensão de novas formas. Outras consequências foram: fim da
crença de que certas soluções seriam válidas em quaisquer circunstâncias, ampliação do diálogo
com o contexto urbano e natural, admissão da história como referência projetual, adoção da
postura de preservação através da intervenção em edifícios históricos.

Os arquitetos passam a levar em consideração o usuário.

Mudança de uma postura determinista para uma postura mais flexível.

Essas questões são encontradas nos trabalhos de vários jovens arquitetos a partir da década de
1980, com uma sutil participação de alguns profissionais mais experientes.

Surgimento do conceito de regionalismo na arquitetura.

Outra questão com que os arquitetos têm que lidar nesse momento é a intervenção em áreas
históricas, com a preocupação de dar função a essas edificações reintegrando-as ao contexto
urbano.

Alguns exemplos de obras bem-sucedidas são: o SESC Pompéia de Lina Bo Bardi, André Vainer
e Marcelo Ferraz, o restauro do Mercado Modelo em Salvador e da Fábrica Danneman também
na Bahia de Paulo Ormindo David de Azevedo, a adaptação do antigo Hotel Majestic na Casa de
Cultura Mário Quintana, em Porto Alegre por Flávio Kiefer e Joel Gorski.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
ESCOLA DE MINAS
DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E URBANISMO
DISCIPLINA: ARQ 105 ARQUITETURA BRASILEIRA II
PROFª: Drª PATRÍCIA JUNQUEIRA

Em meados da década de 1980, o debate do pós-moderno já havia sido assimilado pelos


profissionais brasileiros que apresentam, a partir daí, uma postura anti modernista. Assim, críticas
às obras de Oscar Niemeyer, à construção de Brasília e às teorias de Vilanova Artigas tornaram-
se frequentes. O que antes era sinônimo de qualidade, nesse momento passa a ser visto com
desconfiança.

Na visão pós-moderna era inconcebível a crença dos anos 1920 na reformulação da sociedade,
na construção de um novo mundo através do desenho e do projeto. As formas geométricas e o
formalismo caíram em desuso, sendo substituídos por “contextualismo”, “citações”, enfim, pela
diversidade. Porém, essa reavaliação segundo critérios pós-modernos não significa a implantação
de uma arquitetura pós-moderna no Brasil.

A contestação da arquitetura moderna no Brasil é dirigida a seus mitos e não a seus princípios. É
uma crítica válida em vários aspectos, mas que não apresenta uma alternativa real com conceitos
consistentes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BASTOS, Maria Alice Junqueira, ZEIS, Ruth Verde. Brasil: Arquitetura após 1950. São Paulo:
Perspectiva, 2011.
BILL, Max. O arquiteto, a arquitetura, a sociedade. In XAVIER, Alberto. Depoimento de uma
geração. São Paulo Cosac Naify, 2003. (Disponível no drive da disciplina)
BRUAND, Yves. Arquitetura contemporânea no Brasil. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 1992.
SANTA CECÍLIA, Bruno L. Coutinho. Complexidade e contradição na arquitetura brasileira: a
obra de Éolo Maia. Belo Horizonte, 2004. Dissertação (mestrado em arquitetura e urbanismo)
UFMG. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/RAAO-72KNZC
SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. São Paulo: EDUSP, 1997.

Você também pode gostar