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Fundamentos de análise sociológica

Raízes históricas do público e do privado no Brasil

Professor: Sílvio Salej Higgins – Departamento de Sociologia - UFMG


Retomada:
é preciso entender as interseções

Sociedade civil

Estado Interesse
público
Família
Interesse
corporativo
das burocracias
Por que é persistente que o interesse
público seja engolido?

Estado
Interesse
público
Interesse
corporativo
das burocracias
Por que é persistente que o interesse
público seja engolido?

Sociedade civil
Empresariado
Interesse
público
Interesse
privado
Por que é persistente que o interesse
público seja engolido?

Família
Interesse
público
Interesse
privado
Vamos examinar dois capítulos (II e
V) deste clássico da historiografia
brasileira
As raízes do Brasil
Sérgio Buarque de Holanda

Capítulo II

Trabalho & Aventura


O argumento
está construído
sobre uma
hipótese
contrafatual

Mapa do Brasil (Pedro Reinel,1519)


Colonização Inglesa

O que teria
acontecido com Colonização Ibérica

o Brasil se a
colonização
Dutch tivesse
vingado?
Colonização Dutch

Mapa do Mundo (Nicolas Dieslens,1566)


Sergio Buarque identifica dois tipos puros ou conceitos polares
(Inspira-se no método do sociológico alemão Max Weber das
extrapolações por abstração)

• A ética do trabalho: detesta a imprevidência, a


irresponsabilidade, a instabilidade, a vagabundagem
e a audácia.
Max Weber 1864-1920
• A ética do aventura: exalta a recompensa imediata e
detesta os esforços de longo prazo.

• São tipos puros: na realidade o que existe é uma misto


de ambos em grau variável.

Sérgio Buarque 1902-1982


A herança ibérica: colonização de
aventura

 A Europa ibérica do século XVI foi o berço de uma cultura


ancorada na visão religiosa do mundo da cristiandade
(hoje mais conhecida como catolicismo) refratária aos
valores da modernidade do racionalismo.

 Monarquias sem representação do poder Aristocrático


num parlamento.

 Os empreendimentos econômicos dependiam do


investimento do Estado monárquico
A herança Dutch: colonização do
trabalho
 A Europa protestante do século XVI foi o berço de uma cultura
ancorada na visão religiosa do mundo que submete o poder
da Igreja ao Príncipe, “em tudo deve ser obedecido o
príncipe, menos em questões de fé” (Martinho Lutero)

 A revolta Dutch das províncias unidas de Holanda contra o


império da Espanha marcou o começo de uma forma de
governo federalista (1640).
*
 As Províncias Unidas criam a primeira Joint Venture global: A
West Indian Company – East Indian Company, de investimento
privado e não estatal.

 A Reforma Protestante foi uma grande ruptura cultural que


abriu passagem ao racionalismo científico.
* Curiosamente, Sérgio Buarque filia a tradição inglesa com a
ética da aventura.
O raciocínio que inspira a análise de
Sérgio Buarque

 A Reforma Protestante aduba o chão de uma nova cultura


racionalista:

Ciência: raciocínio experimental, cálculo meio-fim

Economia: capitalismo racional, busca do lucro por meios pacíficos

Religião protestante: ética do trabalho, o trabalho é uma vocação


de santificação
As sociedades herdeiras do protestantismo

A riqueza agrada a Deus e é o signo de sua benção.

A vida frugal, não perdulária, austera permite acumular


excedentes.
Como aparece na história do Brasil a
separação entre o público e o privado?
Quais são as hipóteses de Sérgio Buarque?

Hipótese 1
Há uma trajetória histórica pautada por um
ethos (costume ou hábito coletivo)
Sergio Buarque identifica dois tipos puros ou conceitos polares
(Inspira-se no método do sociológo alemão Max Weber das
extrapolações por abstração)

• A ética do trabalho: detesta a imprevidência, a


irresponsabilidade, a instabilidade, a vagabundagem
e a audácia.
Max Weber 1864-1920
• A ética do aventura: exalta a recompensa imediata e
detesta os esforços de longo prazo.

• São tipos puros: na realidade o que existe é uma misto


de ambos em grau variável.

Sérgio Buarque 1902-1982


A herança ibérica: colonização de
aventura

 A Europa ibérica do século XVI foi o berço de uma cultura


ancorada na visão religiosa do mundo da cristiandade
(hoje mais conhecida como catolicismo) refratária aos
valores da modernidade do racionalismo.

 Monarquias sem representação do poder Aristocrático


num parlamento.

 Os empreendimentos econômicos dependiam do


investimento do Estado monárquico
As raízes do Brasil
Sérgio Buarque de Holanda

Capítulo V

O homem cordial
O que esconde o mote de que o brasileiro-a
é “o homem ou a mulher cordial?

 Há um conflito latente e não reconhecido

Antígona vs Creonte (Tragédia grega de Sófocles)


 Impessoalidade da lei , das normas da Cidade, da Polis, do Estado.

Cidade-
Família
Estado

 Laços pessoais da família e o parentesco.


“Iguais perante a lei”

Isso significa o que?


 Sérgio Buarque, quem escreveu as Raízes do Brasil na década do trinta do século
XX, aponta que o Estado brasileiro ficou refém do familismo patriarcal.

 Buarque invoca, novamente, conceitos do sociólogo alemão Max Weber (“A


política como vocação, 1919”)

Tipos puros de Estado (Max Weber, 1918)


T

Apropriação dos meios Tipo de regra Mérito e função


de administração
O funcionário é Obediência às regras Burocrata/tecnocrata
Estado burocrático expropriado dos meios impessoais do serviço que ingressa por
de administração concurso público

Os meios Obediência ao arbítrio Despachante sem


administrativos são do Senhor, Monarca perícia indicado a
Estado patrimonial incorporados ao ou Coronel dedo ou por nexos de
patrimônio da casa do nepotismo
Senhor, Monarca ou
Coronel
O funcionário usufrui os Despachante sem
benefícios do cargo ou Obediência ao arbítrio perícia indicado a
Estado prebendário função, paga-se com do Senhor, Monarca dedo ou por nexos de
as rendas do cargo ou Coronel nepotismo
A cordialidade como caráter do Brasil
 A cordialidade como legado ao mundo desse fundo patriarcal e familista da
cultura brasileira.
 O convívio deve estar cimentado num fundo emotivo. Buarque cita o caso de
um negociante da Filadelfia que ficava espantado, falando do Brasil, pois
para fazer um freguês tinha necessidade de fazer dele um amigo.

Cordialidade Polidez
“Bonitinho” Mr Higgins
“Queridinho” O Sr. a Sra.
O “Chico” Ritual frio
O “Dudú” Formas do respeito que guardam as
VS
Emocionalidade distâncias
Desejo de intimidade Soberania do indivíduo
Aversão à formalidade
Evasão do pavor que causa a
responsabilidade individual
Templo católico
Estilo barroco MG –Século XVII

Cordialidade
e
religiosidade
Templo protestante

Cordialidade
e
religiosidade
A ritualização dominante
no Brasil é de tipo religioso
e católica
 A intimidade com os santos e com o menino Jesus são
índices do homem cordial.

 O horror da distância é o traço mais específico do


espírito brasileiro.
 No Japão, o ritualismo invade o terreno da conduta
para dar-lhe mais rigor. No Brasil é precisamente o
rigorismo do rito que se afrouxa e se humaniza.

 No Brasil o culto religioso é um ritualismo intimista sem


obrigações.

 A religiosidade atenta à pompa exterior e ao colorido


das cerimônias não podia produzir qualquer moral
social poderosa.

 As elaborações políticas foram feitas desde fora dessa


religiosidade que só apelava para os sentimentos e os
sentidos e quase nunca para a razão e a vontade.
Hipótese 2
A cordialidade é um ethos (um traço dos
costumes e do caráter nacional)que busca
personalizar pela amizade, e pela intimidade
emocional, as responsabilidades coletivas
inscritas na impessoalidade da lei.
Consequências práticas

 O amiguismo e o familismo impedem que nos assumamos como


iguais perante a lei e as normas sociais. “Para os amigos tudo, para
os inimigos a lei”.

 O cordialismo é reativo, só concebe um pacto político de direitos.

 A ética pública, fundamentada na impessoalidade da lei,


fundamenta um pacto político de direitos e deveres. O interesse
público é a consciência de que as minhas obrigações com o
coletivo são o escudo protetor de meus interesses pessoais.

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