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Vaquejada: Uma perspectiva histórico-ambiental e a necessidade de

sua evolução

No dia 06.10.2016 o STF, enquanto Guardião da Constituição , proferiu decisão na


ADI 4983, que tramita desde 18.06.2013, e tem por objetivo declarar a
Inconstitucionalidade de Lei do Estado do Ceará que busca um enquadramento da
Vaquejada como atividade Desportiva e Cultural, declarando aquela, por 6x5,
incompatível com a Constituição  da República de 1988.
Em que pese a possível rispidez do termo e o entendimento pelos seus adeptos e
defensores, a Vaquejada é um subproduto das manifestações ligadas à atividade do
Vaqueiro, este sim elemento intrínseco da cultura nordestina, tal qual o caboclo de
lança, o papangu de Bezerros, os Caretas de Triunfo e a burinha de padre, que
remontam a estruturação do Nordeste.

O Vaqueiro é uma figura intimamente ligada a pecuária primitiva e, por assim dizer,
artesanal, que exercia papel fundamental nas Festas de Apartação, sendo facilmente
identificado pela utilização de uma vestimenta toda de couro característica e muito
valorizada em todo o Nordeste, que são a perneira (calça), o gibão (dolmâ ou jaqueta,
sobretudo), o chapéu (abas largas dobradas no meio), o peitoral (avental de couro), as
luvas e botas.

Este personagem típico da caatinga sempre tratou com muito respeito e zelo o gado,
somente fazendo a derrubada do mesmo para retomar o domínio dos bovinos fujões
(nomeados marueiros ou barbatões), pratica que ficou conhecida por Pega de Boi, a
qual se desenvolvia em terreno aberto e por dentro da vegetação.

O problema ambiental e de proteção animal, assim como a Vaquejada, começaram a


surgir na década de 1940, na Bahia e Ceará, quando surgiram as Corridas de
Morão/Mourão onde, por questões ligadas tão somente a disputa de Egos, vaqueiros
passaram a se desafiar e fazer a derrubadas dos bois dentro dos currais, numa querela
de maior destreza.
A recente decisão do STF não criminaliza o Vaqueiro, nem tampouco indica que o
mesmo não faz parte da história do Nordeste. Ela tão somente fez o contraponto,
quando da análise da legislação cearense, entre preceitos culturais e socioambientais,
entendendo pela inconstitucionalidade das normas que buscam regulamentar a prática
naquele estado.

Este enfrentamento já foi realizado pela Suprema Corte noutras ocasiões, firmando
entendimento similar onde a Proteção Ambiental é dotada de maior relevância para a
Sociedade em detrimento de questões culturais, desde que, caracterizados maus tratos.

Os defensores da Vaquejada como prática desportiva e Manifestação Cultural (como


já delineado, a mesma se trata tão somente de um espetáculo que arranha
superficialmente a verdadeira Cultura do Vaqueiro), buscam através do PLC 24/2016
sua legalização, fundamentando sua defesa na minimização do sofrimento animal
existente na Vaquejada Moderna e no impacto econômico que o fim do Espetáculo irá
gerar.

Esses argumentos se esvaziam diante do entendimento já pacificado no STF quanto a


defesa Ambiental (não sendo tolerado sofrimento/degradação imposta ao animal por
ação direta/indireta do homem, caracterizando maus tratos), em Instrução Normativa
do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, bem como orientação do
Conselho Federal de Medicina Veterinária.

Analisada a História da Humanidade, é perceptível que práticas altamente lucrativas e


fomentadoras de toda uma cadeia econômica, quando verificada uma mudança do
paradigma social, foram substituídas, modificadas ou extirpadas.

Assim, para que a Vaquejada seja considerada como uma festividade cultural e
esportiva, como pretende o PLC 24/2016, ela tem de se tornar uma prática que siga a
Instrução Normativa 03/2000 da MAPA e se alinhe a Constituição da República de
1988, sendo, portanto, necessário uma grande revisão do atual modelo da Vaquejada,
acabando com qualquer possibilidade, ainda que mínima, de sofrimento, modificando
sua estrutura de modo que a proteção animal seja absoluta.
Gilmar de Araújo Pimenta

Advogado, Conselheiro da OAB Caruaru e Conservacionista .

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