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História, memória e ficção:

o caso Dr. Antônio

Jury Antonio Dall’Agnol


Mestrando PPGH/UFSC
Bolsista CNPq
jurydallagnol@gmail.com

Resumo
O romance “Memórias de um rato de hotel” de 1912 é o núcleo de uma série de relatos de
um dos mais célebres gatunos do início do século XX: Artur Antunes Maciel, vulgo, Dr.
Antônio. João do Rio entre um misto de reportagem, memória e ficção elabora, através
das reminiscências do ladrão de casaca, um romance que salta aos olhos pelo excesso de
detalhes históricos, do personagem e da sociedade da época. No entanto, por trás destas
linhas muito bem escritas pairam dúvidas: até que ponto as memórias do rato de hotel são
verídicas ou totalmente de sua autoria? Como perceber os fios que entretecem história,
memória e ficção no romance? A escrita imaginativa de João do Rio e as memórias paródi-
cas de Artur Antunes Maciel estabelecem cada um a seu modo, um instigante diálogo com
a história brasileira. É a partir destes diálogos que se desenrolará este artigo.
Palavras-chave: história, memória, literatura, cidades, João do Rio

Abstratc
The novel “Memórias de um rato de hotel” in 1912 is the core of a series of reports from
one of the most famous thieves of the early twentieth century: Artur Antunes Maciel, aka,
Dr. Antônio. João do Rio between a mix of reportage, fiction and memory shall, through
the reminiscences of the thief in tails, a novel that jumps out the excess of historical detail,
character and society of the time. However, behind the lines very well written questions
loom: how far has the memories of rat hotel is true or entirely of his own? How to find the
threads that interweave history, memory and fiction in the novel? The imaginative writing
of João do Rio and the memories of Artur Antunes Maciel parodic set each in its way, a
provocative dialogue with Brazilian history. It is from these conversations that will unfold
this article.
Keywords: history, memory, literature, cities, João do Rio

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A memória é o espelho em que vemos os ditismo que assolava o Rio de Janeiro em
ausentes. meados do século XX, foi ir às colunas
Joseph Joubert
policiais de jornais e revistas do perío-
do estudado. Entre tantas que li, há uma
Post-mortem do “Dr. Antônio”
nota intitulada A Morte do Dr. Antonio,
que foi redigida por escritor desconheci-
Até o presente momento, minhas
do em 16 de março de 1912, na Revista
pesquisas sobre a vida do célebre rato
Careta, e que, pois, de forma um tanto
de hotel Artur Antunes Maciel, de epíte-
concisa, conta a história de Artur Antu-
to “Dr. Antônio”, me levaram por vários
nes Maciel (1865-1912). Transcrevo-na
caminhos, alguns frutíferos outros nem
na íntegra com o intuito de melhor situ-
tanto.1 O certo é que Dr. Antônio real-
ar o leitor acerca da história do bandido.
mente existiu fora da narrativa literária
Que ela própria fale por si.
de João do Rio e verdadeiramente tor-
nou-se famoso por meio de seus furtos Quando Careta publicou, no seu ultimo
fraudulentos, astutos e, por vezes, carre- numero, a série de 5 retratos do Dr. An-
gados de grande periculosidade e dificul- tonio, estava longe de suppor que 6 horas
dade. Quiçá, por isso, o grande interesse depois seria elle cadáver. De facto, o nos-
so celebre “rato de hotel” falleceu ás 2 ho-
de João do Rio pela figura criminosa de
ras da tarde de sabbado ultimo, num dos
Artur Antunes Maciel.
cubículos da Casa de Detenção. Arthur
Mas, não só o autor do romance Antunes Maciel era um gatuno intelligen-
que versa sobre a história do rato de te e hábil, insinuante no trato e mesmo
hotel acompanhava a vida vertiginosa sympathico. Trabalhava com um sangue
do gatuno, nessas idas e vindas atrás de frio admirável e com uma grande astu-
cia. Durante toda a sua triste carreira de
material biográfico mais palpável sobre
profissional do crime commetteu roubos
a experiência histórica do golpista en-
e furtos na importancia de mais de 800
trevistado por João do Rio, deparei-me contos, segundo elle proprio confessou,
com alguns artigos jornalísticos que, e alguns roubos por elle praticados eram
para além da eloquência descritiva so- revestidos de circumstancias as mais pe-
bre o Dr. Antônio, também explicitavam rigosas e diffíceis. Póde-se dizer que foi o
autor de quase todos os principaes rou-
sobre outros criminosos que atentavam
bos commettidos nos hoteis desta cidade.
contra a lei e a ordem da então capital
Morreu com 45 annos.2
federal do Brasil.
Assim, a melhor maneira que en-
É possível, tendo em vista a fama
contrei para penetrar no assunto do ban-
do gatuno como indivíduo que não usava
de meios violentos e sim da sagacidade
1
Este artigo apresenta alguns resultados parciais da
pesquisa de minha dissertação de mestrado intitu-
lada Cenários da modernidade: memórias de um
trapaceiro sobre a plasticidade da cidade do Rio 2
A Morte do Dr. Antonio. Careta, Rio de Janeiro,
de Janeiro no início do século XX (1889-1912). Anno V, n. 198, p. 18, 16 de março de 1912.

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para cometer os furtos, que João do Rio isso, apenas isso que importa ao repór-
entrevistando o famoso ladrão de casaca, ter-escritor. Não se trata de saber se a
tenha visto a chance de explorar através atividade do cidadão é do mal ou do bem,
da memória da personagem criminosa, a o que realmente importa é que ele é o
escrita de uma construção narrativa que melhor no que pratica.
foca-se as várias faces da marginalidade João do Rio ficou famoso por seus
urbana, mostrando, desse modo, os con- múltiplos olhares sobre a cidade que se
trastes e as singularidades da cidade mo- urbanizava. Em suas obras registrou os
derna, cosmopolita e urbana. diferentes tipos de subempregos bem
como seus obreiros mais afamados:
João do Rio e a paixão pelo que vai
pelas ruas [...] ladrões, prostitutas, malandros, de-
sertores do exército, da Marinha e dos
navios estrangeiros, ciganos, ambulan-
Sucesso, luxo e ruína. Três pala-
tes, trapeiros, criados, serventes de re-
vras que podem expressar a trajetória partições públicas, ratoeiros, recebedo-
de Artur Antunes Maciel, o sagaz ladrão res de bondes, engraxates, carroceiros,
de hotel que João do Rio exprime como floristas, bicheiros, jogadores, recepta-
o “representativo do roubo inteligente” dores, pivetes [...]. E, é claro, a figura
tipicamente carioca do capoeira, cuja
e que figura como protagonista da obra
fama se espalhara por todo o país [...].5
Memórias de um rato de hotel.3 E por-
que tal título a um homem que afana sem
culpa? Porque, segundo João do Rio, o Adotara como temática fundamen-

homem representativo é “aquele que em tal o sentimento de entrada na moder-

qualquer ramo da atividade humana se nidade. O enfoque era o progresso me-

mostra o primeiro, comparável, senão tropolitano através das observações da

melhor, que os das outras terras”.4 E é miséria, o que causava certo desconforto
na elite da cidade, pois, esquivava-se da
face civilizadora a qual pregavam. Po-
3
A primeira edição de Memórias de um rato de
hotel surgiu em 1912, em formato de folhetim, no rém, seu modelo preferido para a criação
jornal Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro, peri- era justamente esse lado contrário: a face
ódico onde João do Rio era colaborador. Oitenta
e oito anos após a primeira versão das memórias destruidora dos tempos modernos que
do afamado gatuno, a Dantes Editora, ressuscita separa e distingue.
Dr. Antônio através de uma segunda edição, con-
juntamente com uma nota prévia de Plínio Doyle, Unindo os fragmentos de uma cida-
“De como surgiram as memórias de um rato de
de em transformação, na qual coabitam
hotel, do Dr. Antônio, edição de 1912”, um arti-
go de autoria de João do Rio publicado no jornal personagens e espaços inseridos em um
A Notícia, no Rio de Janeiro, em 20 de agosto de
1911 sob o título de “O representativo do roubo
novo projeto de cidade civilizada, o au-
inteligente”, e um posfácio de João Carlos Rodri-
gues intitulado, “Um mistério literário”.
4
RIO, João do. O representativo do roubo inteli- 5
CARVALHO, J. M. Os bestializados: o Rio de Ja-
gente. A Notícia, Rio de Janeiro, p. 03, 19-20 de neiro e a república que não foi. 3ª ed. São Paulo:
agosto de 1911. Companhia das Letras, 1998. p. 18.

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tor granjeia palco na escrita sobre aspec- Destarte, não só o criminoso ganha
tos contrários desta “civilidade”, deste o respeito de João do Rio, mas todo o
modo, ganha vez o símbolo e o estigma mundo “encantador” das ruas. Desde as
dos males sociais, ou seja, a cidade do alamedas que abordam as pequenas pro-
vício. fissões dos biscateiros que perambulam
Criava-se, então, a partir de sua pela cidade na virada do século e que
obra, um imaginário peculiar sobre a po- carecem de compreensão e vivência até
pulação da capital federal, imagens estas os hotéis de luxo que hospedam a figu-
que percorrem até os dias de hoje, e que ra mística do rato de hotel. São diversos
podem ser analisadas através do brilho criminosos e distintas formas de atuar no
de sua escrita. Nicolau Sevcenko fixa a crime. Entretanto, nada que contemple a
importância dessa literatura do início do classe e a astúcia do “Dr. Antônio”.
século XX para compreensão do período Artur Antunes Maciel surge como
da seguinte forma: um novo desafio para a escrita de João
do Rio. O notável gatuno habita dois
As décadas situadas em torno da tran- mundos particularmente distintos den-
sição dos séculos XIX e XX assinalaram tro da sociedade, ele é ao mesmo tempo
mudanças drásticas em todos os setores
a miséria em suas dimensões econômico-
da vida brasileira. Mudanças que foram
registradas pela literatura, mas sobretu- sociais e também morais, como também
do mudanças que se transformaram em a finesse, a riqueza e os bons costumes
literatura. Os fenômenos históricos se re- impostos pelas elites dirigentes brasi-
produziram no campo das letras, insinu- leiras no novo projeto de modernidade.
ando modos originais de observar, sentir, Perambula pelas ruas com dupla perso-
compreender, nomear e exprimir. A rapi-
nalidade: a imagem de doutor e ladrão
dez e profundidade da transfiguração que
devassou a sociedade inculcou na produ-
escondida na mesma carcaça simpática e
ção artística uma inquietação diretamen- sagaz. E, o boom urbano que o Rio de Ja-
te voltada para os processos de mudança, neiro presencia nas últimas décadas do
perplexa com a sua intensidade inédita, século XIX e que culminaria nas refor-
presa de seus desmandos e ansiosa de mas urbanísticas do governo de Rodri-
assumir a sua condução. Fruto das trans-
gues Alves (1902-1906) só vem a ajudar
formações, dedicada a refletir sobre elas
e exprimi-las de todo o modo, essa litera- nas manobras furtivas do “Dr. Antônio”.
tura pretendia ainda mais alcançar o seu Com a cidade abalroada por novas confi-
controle, fosse racional, artística ou poli- gurações urbanas em algumas regiões, a
ticamente. Poucas vezes a criação literá- crescente imigração em massa e a ideia
ria esteve tão presa à própria epiderme fixa de que o Rio de Janeiro “civilizava-
da história tout court.6
se” através do potencial progressista
6
SEVCENKO, Nicolau. Literatura como missão:
da República recém-estabilizada, o Dr.
tensões sociais e criação cultural na primeira Re- Antônio incorpora o ritmo da metrópo-
pública. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras,
2003. p. 286-287. le moderna e nela encontra, ao mesmo

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tempo, a sedução e a ameaça. Como ele Como fiz isso?
próprio nos conta: Não sei dizer. Posso afirmar que uma
vontade superior me impelia como em
estado de hipnose. É um outro ser que
Então procurava aturdir-me no exercí-
toma conta de mim. O “Dr. Antônio” en-
cio de trabalhos ou em prazeres. Gastava
trava no corpo de Artur Maciel. Não tive
assim enormemente. Só poderia passar
a menor inquietação, nem saí do hotel. O
despercebido numa cidade como o Rio,
homem parece que não percebeu a falta
um homem gastando o que eu gastava
do dinheiro. À vista disso, uma madru-
em carros, hotéis, mulheres e teatros
gada passei pelo quarto dele e vendo a
– naquela época, que era a do Encilha-
porta cerrada, entrei e mesmo no escu-
mento. Nesse período de papelada, os
ro, abri a gaveta e senti no mesmo lugar
cocheiros e os copeiros amanheciam mi-
o dinheiro. Levei todo e dormi tranquilo.
lionários. O meu ar solene dava-me mes-
Só dois dias depois o coitado deu por fal-
mo um aspecto consolidado, de fortuna
ta. Era um imbecil.
do interior, que só sabe gastar a renda.
Aproveitei outros hóspedes que se mu-
Mas eram prodígios que eu executava,
davam, pondo culpas para o pessoal do
para manter a linha dandy, a linha com-
hotel, e mudei-me para o Carson’s Ho-
me il faut. Só no Carson’s dera o nome
tel. Então, já não era eu. Era um dandy
de “Dr. Antonio”, o nome que devia ficar
tranquilo, com um anel de médico no
como o do meu outro eu, executava-me
anular, o sorriso no lábio tranquilo, era
de modo a poder em Niterói ser bem
o “Dr. Antônio”.
familiar. Ia a bailes, freqüentava o Club
Como foi isso?
Santa Rosa, assinava subscrições para
Não sei. Ia começar a minha epopéia.
festas ao Dr. Portela e dava-me muito
Tomei um carro de cocheira, enveredei
com o delegado de polícia. Decidida-
por um alfaiate de primeira ordem e en-
mente não nasci para viver com a cana-
trei na grande vida.8
lha. Só me sinto bem ao lado de gente de
posição social.7
É possível que, assim que soube
Porém, sua personalidade dupla das peripécias do rato de hotel pelos
oscila entre a canalha e a fina flor social. hotéis da capital federal, João do Rio
Enquanto Artur Antunes Maciel esbanja enxergou nele um sujeito distinto da-
um ar aristocrático em meio a essa gente queles que até então ele descrevia em
de posição social, sua sombra, “Dr. An- seus contos, crônicas e romances. Con-
tônio”, maquiavélica e criminosa, opera temporâneos de um período onde a ci-
em pensamentos o próximo roubo. Por dade crescia através de novos padrões
muitas vezes, no decorrer da narrativa, o e os habitantes multiplicavam-se rapi-
relator das memórias em questão expõe damente, onde as “massas” exerciam
esse fato de ser conduzido por duas per- cada vez mais uma tensão instauradora
sonalidades diferentes: da “multidão” na experiência urbana,
o jornalista, com os olhos sensíveis do

7
RIO, João do, op. cit., p. 70-71. 8
Idem, p. 63.

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flâneur, entendeu que a vida metropo- indivíduo na metrópole é fundamen-
litana permitia ao “Dr. Antônio” exer- tal, pois é assim que ele pode entrar
cer uma liberdade que inquietava a po- e sair livremente dos mais variados
lícia da época. A “multidão”, com todo ambientes, misturando-se a todos eles
o seu caráter homogêneo e compacto, como um possível simpatizante, cliente
permitia ao ladrão de casaca se infiltrar ou prosélito”.10 À porta dos hotéis, “Dr.
no burburinho da cidade moderna e Antônio”, como um flâneur de aura cri-
cosmopolita, usufruindo de várias fa- minosa, dedica-se ao exercício de adivi-
cetas, nomes e profissões sem nem ao nhar as profissões, os hábitos diários, o
menos ser indagado quanto à veracida- dinheiro e as jóias escondidas dentro das
de de seus outros “eus” fictícios. A pro- malas e das carteiras dos hóspedes de
va dessa liberdade consta nas linhas da cada hotel onde seus vários “eus” estão
narrativa memorialística: registrados. É uma espécie de mania se-
creta, que a menor oportunidade, treme
Estas memórias são uma confissão e não de febre e comete crimes.
um romance. No momento em que gas- Entretanto, esse mesmo anonimato
tava com Lúcia e ia quase todos os dias
que é desfrutado por todos os compo-
ver a família Guimarães, a S. Januário,
eu era apenas oito cavalheiros, porque nentes da multidão, de acordo com Mar-
habitava ao mesmo tempo o Carson’s, o cos Guedes Veneu, “[...] é ele que faz a
Estrangeiros, o Vitória, a Pensão Muller, massa e a rua a um tempo protetoras
a Ville Moreau, o Vista Alegre, o Santa e perigosas”.11 A metrópole moderna,
Teresa e o Giorelli. Tinha, além disso, que “civiliza-se” sob a égide de uma eli-
um quarto, onde às vezes mudava de
te que crê no “triunfo das luzes” sobre as
roupa, numa casa de cômodos da Rua
do Lavradio. Numa cidade como o Rio, “trevas”, vê-se constantemente ameaça-
que sempre foi uma grande aldeia, essa da pelo ir e vir da irracionalidade e dos
quantidade de nomes com a mesma cara vícios mundanos pelas novas avenidas
conservando-se solta, tinha do prodí- floridas. A cidade civilizada, a Cosmó-
gio.9 polis, por mais que granjeie palco sob as
luzes da modernidade, ainda contém em
Nosso personagem nem ao mesmo seu seio, serpenteante, a “decadência” e
se furta ao papel de se esconder, a mul- a “selva”. Uma dessas ameaças chama-
tidão permite a ele que os seus modos se “Dr. Antônio”. E, visto que todo mal
adandinados, suas constantes trocas de deve ser remediado, a cidade civilizada
corte de cabelo e barba o integre a um também criou um lugar para corrigir,
determinado grupo sem ser notado ou ou seria melhor dizer, esconder os males
lembrado. Como bem lembra Marcos
Guedes Veneu, “[...] o anonimato do
10
VENEU, Marcos Guedes. O Flâneur e a Vertigem
– Metrópole e Subjetividade na Obra de João do
Rio. Estudos Históricos, vol. 3, n. 6, 1990. p. 239.
9
Idem, p. 129. 11
Idem, pp. 239-240.

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que assolavam seus sonhos de civilização É preciso ser bom na Correção.12
e modernidade. O atraso, o crime e a mi-
séria por vezes se encontravam na Casa De tal modo, tentar compreender a
de Detenção, onde Artur Antunes Maciel visão de um rato de hotel ou de um en-
pode presenciar o desvario que é uma carcerado da Casa de Detenção, é, talvez,
prisão: enxergar nitidamente a cidade protago-
nista do desenvolvimento sob os olhos
— É preciso ser bom na Correção. É pre- dos personagens que andam à margem
ciso ser humilde, tratar com doçura, ser esquerda, pelos meandros do corpo ur-
sempre de acordo com aquele que cheira
bano. Problematizar a escrita de João do
a autoridade. Senão é pior. Espancam-
Rio com os acontecimentos históricos do
nos. Há a solitária. Há o raio, uma cela
que foi construída com sal e dessora início do século XX é, correlacionando
uma eterna umidade... com as ideias de Sandra Jatahy Pesaven-
É preciso ser bom na Correção. E entre- to, admitir:
tanto na Correção os homens tornam-se
feras. [...] que a literatura é fonte de si mes-
Feras positivamente. Temei aquele que ma enquanto escrita de uma sensibili-
esteve na Correção. Não sai homem, sai dade, enquanto registro, no tempo, das
jaguar. Se matou, quererá matar mais; razões e sensibilidades dos homens em
se estuprou, um ódio convulso o enro- um certo momento da história. Dos seus
dilhará em malefícios contra os mais; sonhos, medos, angústias, pecados e vir-
se roubou mais roubará. Esse sai. Sair! tudes, da regra e da contravenção, da or-
Sair! Mas há outros que não têm mais dem e da contramão da vida. A literatura
esperança de sair. registra a vida. Literatura é, sobretudo,
— Aquele tão feroz? impressão de vida.13
— Coitado! 30 anos...
É preciso ser bom na Correção. Todos
Talvez nenhum outro escritor bra-
são maus. São maus, porque é impossí-
vel deixar de o ser. Contra a fúria, a fú- sileiro tenha utilizado com tanta consci-
ria. Contra a violência, a violência. Um ência o olhar flanêur como João do Rio.
homem condenado a um tempo enor- Andava pelas ruas captando não só os
me, que entra moço para sair velho (se aspectos físicos, mas também a aura dos
sair!), que não vê mais a rua, que não
sujeitos e dos lugares através de seu va-
sente mais a liberdade, perde o amor à
guear ocioso. Segundo Antonio Candido,
vida e torna-se chacal. Para contê-lo é
preciso ser o domador com a ponta do João do Rio revelou-se um flâneur com
ferro em brasa. Eu vi negros assassinos princípios detetivescos, um “[...] inespe-
rebelarem de repente contra os guardas,
cedendo apenas aos canos dos revolvers
para passar 15 e vinte dias de solitária,
12
RIO, João do. op. cit., p. 180-181.
13
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História & Litera-
eu vi cenas espantosas, que os meus tura: uma velha-nova história. In: COSTA, Clé-
olhos não esquecerão jamais. lia Botelho da; MACHADO, Maria Clara Tomaz
(Org.). Literatura e história: identidades e fron-
teiras. Uberlândia: EDUFU, 2006. p. 23.

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rado observador da miséria, podendo, a Gerais. Vítima da desconfiança mineira,
seus momentos, denunciar a sociedade o gatuno fora pego em flagrante em mais
com um senso de justiça e uma coragem um grande ato. O autor da coluna mani-
lúcida que não encontramos nos que festou nas linhas do jornal a defesa do
se diziam adeptos ou simpatizantes do meliante, onde afirmava aos quatro ven-
socialismo e do anarquismo [...]”.14 No tos que um ladrão da envergadura de Dr.
entanto, por outro lado, o autor também Antônio não devia ser encarcerado, mas
ligava as classes miseráveis e despos- sim, posto as ruas novamente. Tudo por-
suídas a periculosidade que rondava os que afirmava veementemente que “só no
tempos modernos, alimentando assim, a gênero crime patente é que o Brasil não
ideia de que a população pobre estava es- tinha representativos”16, desse modo,
tritamente ligada a população perigosa. não podíamos nos privar do único que
No caso do “Dr. Antônio”, João do havia.
Rio, se por algum momento contribui na Um ano depois, já de volta ao Rio
escrita das memórias do ladrão, de for- de Janeiro, Artur Antunes Maciel é no-
ma alguma toma partido para denegrir vamente preso. Desta vez, seu maior
ainda mais a imagem do gatuno, pelo fã, João do Rio, vai visitá-lo na cadeia e
contrário, em artigo do jornal A Notícia propõe-lhe que relate sua vida de crimes:
de agosto de 1911 intitulado “O represen-
tativo do roubo inteligente”, João do Rio Estava assim, há dias, desolado, na en-
fermaria, quando vieram chamar-me.
assim se refere ao célebre “Dr. Antônio”:
O Sr. Administrador apresentou-me um
cavalheiro. Olhei-o temendo um inimi-
Olhei-o com respeitoso carinho. Só o
go, um desses terríveis inimigos que me
saber que enganava os outros, sem que
fizeram a mais ruidosa das celebridades.
a polícia o pudesse prender, dava-lhe
O homem disse-me:
uma auréola de superioridade mental.
— Tenho por você a maior admiração.
Que diferença entre um grande artista,
— Por quê?
um grande político e um grande gatuno?
— Porque você é um ladrão inteligentís-
Mas, no ponto de vista da finura para a
simo.
realização de uma obra precisa, nenhu-
Essa palavra “ladrão” sempre me causou
ma.15
uma sensação esquisita. Baixei os olhos
e tentei colocá-lo na verdade comum.
Quando este artigo saiu no A Notí- — O Sr. engana-se.
cia do Rio de Janeiro, Dr. Antônio recém — Meu caro, não me engano e peço que
havia sido preso em Juiz de Fora, Minas não me desiluda. Considero você um
homem inteligente, fora do comum. Se
resolver negar o que está provado em
14
CÂNDIDO, Antônio. Radicais de ocasião. In: vinte anos de jornais, como um simples
CÂNDIDO, Antônio, Teresina etc. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1980, p. 89.
batedor de carteira, ficarei.
15
RIO, João do. O representativo do roubo inteli-
gente. A Notícia, Rio de Janeiro, p. 3, 19-20 de
agosto de 1911. 16
Idem, p. 3.

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— Mas, que quer o senhor de mim? solvida e identidades fragmentadas e
— Quero que conte a sua vida para o contraditórias”18. Desse modo temos
meu jornal.17
que considerar o processo subjetivo da
memória tanto no rato de hotel quanto
É verdade que o olhar de João do
no próprio João do Rio.
Rio oscila, contudo, entre duas atitudes
Dali até o fim, a narrativa encontra-
ideológicas dessemelhantes e incoeren-
se permeada por tal caminhar. As me-
tes entre si, mas também é inegável que
mórias buscam o retorno ao ontem, às
ele havia adotado uma admiração singu-
origens, aos lugares, porém, “a composi-
lar pela carreira do rato de hotel, desse
ção, por ser baseada em bloqueios e ex-
modo, a escrita das memórias do ladrão
clusões, nunca é plenamente alcançada;
pode de algum modo ter-se “amoldado”,
é constantemente ameaçada, abalada,
“conectado” as impressões do jornalis-
despedaçadas”19.
ta e pronto: o que antes era visto como
De acordo com o que vimos até
crimes infames, atentados contra o bem
aqui, a proposta inicial de uma narra-
estar da sociedade, começa a ter píncaros
tiva sobre as memórias de Dr. Antônio
de inteligência e heroísmo. Assim sendo,
partiu única e exclusivamente de João
neste momento, começa a pairar a pri-
do Rio. Pelos miolos do célebre ladrão
meira suspeita sobre as supostas recor-
nunca havia passado tal ideia, fato que
dações do ladrão famoso: Até que ponto
ele mesmo confirma nas linhas iniciais
as memórias do rato de hotel são verídi-
do primeiro capítulo: “Nunca pen-
cas ou totalmente de sua autoria?
sei em escrever memórias. Nunca fui
dado à literatura e à fantasia, sendo
No entrecruzar de memórias:
muito limitado o número de livros que
ladrão e repórter tecem a trama
tenho lido. Escrever memórias não se-
ria coisa que me passasse pela imagi-
Bom, talvez não tenhamos porque
nação em nenhuma hipótese”20.
desconfiar de seus relatos, à primeira
Se, Dr. Antônio era um sujeito que
vista parecem todos muito coesos com
nunca foi dado à leitura, tampouco a es-
a época e com as situações, no entanto,
crita, como que, com base em suas me-
estas memórias não são escritas de pu-
mórias, surge um romance beirando tre-
nho próprio por Dr. Antônio, mas sim,
zentas páginas?
ditadas a João do Rio. Além do mais,
como afirma Alistair Thomson, “[...] nos- 18
THOMSON, Alistair. Recompondo a memória:
sas tentativas de compor um passado questões sobre a relação entre a história oral e as
memórias. In: Ética e História Oral. Projeto His-
nunca são inteiramente bem-sucedidas, tória. Revista do Programa de Estudos Pós-Gra-
e o resultado é uma ansiedade não re- duados em História e do departamento de Histó-
ria da PUC-SP. São Paulo, v. 15, p. 13-49, 1997, p.
58.
19
THOMSON, Alistair, loc. cit.
17
RIO, João do, op. cit., p. 33-34. 20
RIO, João do, op. cit., p. 33.

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Uma das explicações possíveis é o Torna-se então mais interessante e
entrecruzar de memórias entre o ladrão pitoresca a obra do repórter, principal-
e o repórter. João do Rio a partir da me- mente quando ele esmiúça os personagens.
mória individual de Artur Antunes Ma- O autor através do entrelaçar de memórias
ciel tece um romance que, para além das individuais e coletivas consegue com ri-
reminiscências do ladrão, capta também queza de detalhes decodificar cada figura
todo o imaginário popular da época acer- dramática ante suas relações com a vida,
ca da criminalidade. Ou seja, o autor usa com o amor, com o trabalho, com a políti-
dos atributos da memória coletiva para ca, enfim, com as vicissitudes que assolam
enquadrar as memórias individuais do as pessoas no decorrer de suas existências.
rato de hotel. De tal modo, exprime na obra:
Como bem coloca Maurice Halbwa-
chs, “a consciência individual é apenas Era em 1895. Tinha 3 ½ anos a cumprir
de pena. O crime de 1892, de que saíra
o lugar de passagem dessas corren-
com fiança, tinha o processo em anda-
tes, o ponto de encontro dos tempos
mento. Fui condenado em 1896 por essa
coletivos”21. As correntes que aqui Hal- suspeita de quatro anos antes.
bwachs põe em questão são: Advogados, agentes, todos exploravam-
me. Eu negava. Puseram na Detenção
[...] as correntes do pensamento pro- um agente fingindo de preso no mesmo
priamente dito ou da memória: as pri- cubículo que eu. Levou assim quatro
meiras estão estreitamente ligadas ao dias a ponto de eu pensar que ele era
nosso corpo, não nos fazem sair de nós mesmo ladrão.23
mesmos, mas também não nos abrem
qualquer perspectiva sobre o passado; História, memória e ficção se unem
as segundas têm sua origem e a maior
em um trabalho árduo de reconstituição,
parte de seu curso no pensamento dos
diversos grupos aos quais nos ligamos.22 de reelaboração de vida, de lembranças
que muitas vezes fogem do perímetro in-
Portanto, o ponto central na obra dividual e só são encontradas no circuito
de Halbwachs consiste na afirmação de do coletivo.
que a memória individual existe sempre Compreende-se deste modo que, a
a partir de uma memória coletiva, posto partir destas ideias, podemos notar que
que todas as lembranças são constitu- o debate acerca das questões referentes
ídas no interior de um grupo. A origem à história, a literatura e a memória evo-
de várias ideias, reflexões, sentimentos, cadas e aproveitadas por João do Rio na
paixões que atribuímos a nós são, na ver- obra Memórias de um rato de hotel são
dade, inspiradas pelo grupo. pertinentes para entender a composição
do trabalho em questão. Michael Pollack
alerta acerca do tema:
21
HALBWACHS. Maurice. A Memória Coletiva.
São Paulo: Centauro, 2004, p. 128.
22
Idem, p. 129. 23
RIO, João do, op. cit., p. 229.

104 Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v.23, n.1, jan./jun. 2010


Assim como uma “memória enquadra- suas obras, o gênero jornalístico/literário
da”, uma história de vida colhida por chamado de fait divers25. Usando dos arti-
meio da entrevista oral, esse resumo
fícios do flâneur, o autor vagava pela cida-
condensado de uma história social indi-
de captando o tom mundano e indefinido
vidual, é também suscetível de ser apre-
sentada de inúmeras maneiras em fun- do cotidiano, registrando os personagens e
ção do contexto no qual é relatada. Mas espaços para depois, com perícia literal em
assim como no caso de uma memória suas narrativas, revelar uma série de trans-
coletiva, essas variações de uma história formações da vida do Rio de Janeiro. Isto
de vida são limitadas. Tanto no nível in-
fica bem claro observando o fragmento da
dividual como no nível do grupo, tudo se
crônica As Mariposas do Luxo:
passa como se coerência e continuidade
fossem comumente admitidas como os
sinais distintivos de uma memória crível Já passaram as professional beauties,
e de um sentido de identidade assegura- cujos nomes os jornais citam; já volta-
do.24 ram da sua hora de costureiro ou de joa-
lheiro as damas do alto tom; e os nomes
condecorados da finança e os condes
É um tema proveitoso, porém com-
do Vaticano e os rapazes elegantes e os
plexo para o historiador. O retrato de um deliciosos vestidos claros airosamente
momento histórico de uma determinada ondulantes já se sumiram, levados pelos
sociedade requer demarcar ações, cos- “autos”, pelas parelhas fidalgas, pelos
tumes, comportamentos e evoluções na bondes burgueses.26
tentativa de explicar um acontecimento.
Nesse contexto, História e Literatura po- Escrevia assim, através da formu-
dem ser um meio de reflexão na medida lação de uma psicologia urbana que
em que refletem sobre os problemas so- fecundou o imaginário carioca através
ciais e mostram os interstícios de uma do reflexo tumultuário que o projeto
outra História, geralmente marginaliza- modernizador de uma elite dominante
da e esquecida pela historiografia oficial, que, visava indubitavelmente, cami-
e que na obra de João do Rio pode ser nhar em direção a uma ordem e um
vista na singularidade com que descreve progresso.
os fatos, as pessoas. Surge então o segun- Mesmo enfrentando a problemática
do questionamento deste artigo: como da (i)legibilidade da cidade que se mo-
perceber os fios que entretecem história, dernizava sob os auspícios dos donos da
memória e ficção no romance? República, João do Rio, fundindo fato e
Como profissional da imprensa, João ficção, conseguiu relatar uma série de ti-
do Rio trabalha numa simbiose de docu- pos sociais e estigmas que apareciam es-
mental e ficcional, realizando assim, em tereotipados no Rio de Janeiro do início

24
POLLACK, Michael. Memória, Esquecimento, Si- 25
Fait divers é a realidade contada com recursos do
lêncio. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 2, melodrama.
n. 3, p. 3-15, 1989. p. 11. 26
Idem, 2007, p. 63.

Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v.23, n.1, jan./jun. 2010 105


do século XX, e que percorriam o imagi- das ruas ele assim se refere sobre a rela-
nário da época. ção indivíduo/rua:
O “Dr. Antônio” é um destes tipos
sociais. Jovem rico, de uma boa famí- Nós somos irmãos, nós nos sentimos
parecidos e iguais; nas cidades, nas al-
lia da capital do Rio Grande do Sul; um
deias, nos povoados, não porque sofra-
bon vivant dos pampas que, depois de
mos, com a dor e os desprazeres, a lei e
um malogrado roubo contra seu pai, ato a polícia, mas porque nos une, nivela e
que foi descoberto logo em seguida, par- agremia o amor da rua. É este mesmo
te fugido para o Rio de Janeiro, berço o sentimento imperturbável e indisso-
da modernidade e do desenvolvimento lúvel, o único que, como a própria vida,
resiste às idades e às épocas. Tudo se
urbano. Seu comentário, prontamente a
transforma, tudo varia — o amor, o ódio,
sua chegada na capital federal, dá uma
o egoísmo. Hoje é mais amargo o riso,
ideia do espanto que a cidade originava mais dolorosa a ironia, Os séculos pas-
a quem chegava: “A impressão que o Rio sam, deslizam, levando as coisas fúteis
causava no provinciano era de transtor- e os acontecimentos notáveis. Só per-
nar a cabeça. Ir ao Pascoal e ao Cailteau siste e fica, legado das gerações cada vez
maior, o amor da rua.28
à tarde, ir aos teatros à noite, ver o luxo,
as mulheres, aquela gente animada”27.
Todo esse alvoroço de pessoas das mais Sem dúvida que esta dimensão do

variadas classes sociais, vida noturna, autor para com a rua poderá ser contes-

dândis esbanjando dinheiro, tudo isso se tada, sob o argumento de que não só a

configurava num prato cheio para o céle- rua participava da construção do indi-

bre rato de hotel. víduo, mas também a família, as insti-

Entretanto, Artur Antunes Ma- tuições escolares, a igreja, entre outros.

ciel, de alcunha “Dr. Antônio”, é somente Porém, o que João do Rio quer dizer, é

um dos personagens que caminhavam que a rua exerce fascínio sobre todos nós,

nas ruas iluminadas pelas primeiras lu- e de uma forma ou de outra, através das

zes da modernidade. Como o bon vivant situações da vida, nos modela perante a

gaúcho, outros aportaram na cidade mul- sociedade.

tifacetada, fascinante e efervescente que Nesse sentido, analisar a obra do

era o Rio de Janeiro no início do século autor é desvendar, ainda que em meio a

XX. Personagens amantes das ruas, que uma (i) legibilidade da cidade, as repre-

aos olhos sensíveis de João do Rio eram sentações urbanas na capital federal do

a própria essência da modernidade. Para início do século XX. Porém o foco prin-

ele, quem construía a figura do homem cipal da obra aqui citada está justamente

moderno era, pois, o espaço urbano, a naquele que a elite letrada e civilizada

rua. Em sua obra a Alma encantadora mais temia: o criminoso. Através das

27
RIO, João do, op. cit., p. 62. 28
RIO, João do, idem, 2007, p. 24.

106 Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v.23, n.1, jan./jun. 2010


recordações do rato de hotel é possível Entretanto, não só o “Dr. Antônio”,
compreender as diferentes possibilida- personagem de João do Rio com ausên-
des de se ver o crime e o criminoso na cia de escrúpulos e habilidade para o
escrita da cidade, composição essa que furto nasceu com a República, também
João do Rio exerce muito bem no decor- várias transformações rápidas e cruciais
rer da trama. nas instituições e no estilo de vida da
As reminiscências de Artur Antu- população brasileira vieram à tona com
nes Maciel e a escrita aguçada e carre- a derrubada do regime monárquico. O
gada de olhares sobre as experiências Rio de Janeiro, então capital federal e
de vidas das ruas do repórter-ficcionis- materialização tropical da Belle Époque,
ta transformam o romance em ques- passava por mudanças bruscas e se via,
tão num emaranhado de fatos, letras, agora, atormentada com um forte movi-
lembranças e imaginação. Um trabalho mento migratório que adentrava o país
meticuloso, onde até mesmo o patoá para substituir a mão de obra escrava.
dos detentos da Correção fica gravado A derrubada do então Imperador do
para a história. E, isto acontece, quan- Brasil Dom Pedro II e a acidentada cons-
do o “Dr. Antônio”, cumprindo senten- trução de novas formas de autoridade civil,
ça, compõe um dicionário com os jar- a expansão do consumo de artigos produ-
gões dos encarcerados: zidos pelas indústrias europeias e norte-
americanas, associada ao incipiente sur-
Depois, como conversava com os presos, gimento de um parque industrial, mudou
eu que até então não conhecia o calão hábitos e costumes no então ex-Império do
dos criminosos, eu, o fino “Dr. Antônio”,
Brasil. A população cresceu rápido e diver-
comecei a compor um dicionário do Ar-
got usado entre criminosos e funcioná- sificadamente, alimentada pelas correntes
rios da polícia venais. Encontro o escor- migratórias nacionais e estrangeiras, mo-
ço entre os meus papéis. Publico-o para dificando assim a face das cidades. Segun-
mostrar como é possível acompanhar o do José Murilo de Carvalho:
Dr. Vicente Reis nos seus trabalhos po-
liciais. Alterou-se a população da capital em
Ei-lo: termos de número de habitantes, de
Amarrar — Corrente. composição étnica, de estrutura ocupa-
Afanar o mudo — Roubar dinheiro de cional. A abolição lançou o restante da
igreja. mão-de-obra escrava no mercado de tra-
Acampanar — Vigiar ou acompanhar balho livre e engrossou o contingente de
de longe. subempregados e desempregados. 30
Achacador — ladrão de conto-do-vigá-
rio. [...].29
Poucos escritores conseguem ligar
essas mudanças radicais a suas obras

29
RIO, João do, op. cit., p. 163-164. 30
CARVALHO, J. M., op. cit., p. 16.

Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v.23, n.1, jan./jun. 2010 107


quanto Paulo Barreto, ou, como ele mes- marginalização e a miséria das camadas
mo se designou: João do Rio. Seus ro- populares são fatos que se entrecruzam
mances, contos e novelas são a porta de com as vivências íntimas de João do Rio,
entrada para o fascínio e também para e tornam-se material para a escrita. Um
a desorientação que as transformações testemunho ocular que na “[...] reconsti-
desta época causaram nas pessoas. tuição da memória é subjetiva”.32
Para Walter Benjamim todos somos
Recurso e risco: a obra literária e historiadores, pois todos produzimos
os historiadores histórias. A ação de se narrar uma histó-
ria faz com que esta seja conservada do
A literatura de João do Rio certa- esquecimento. Assim, protegendo-a da
mente ocupa um lugar de destaque no amnésia, cria-se a possibilidade dela ser
conjunto de estudos que buscam desven- contada novamente, e de outras manei-
dar as mudanças sociais e políticas que ras que não aquela. O significado dessa
a modernidade causou na população da história só se torna admissível no olhar
cidade do Rio de Janeiro no início do sé- do outro e na analogia que faz com outras
culo XX. A presença da massa urbana na histórias.
escrita do autor acende diferentes inter- Segundo Benjamin, é a partir das
pretações sobre as sensibilidades que se contexturas feitas a partir do presente,
atravancavam nos anos iniciais do Nove- que se forma e que se configura a me-
centos brasileiro. mória. É o presente que nos chama em
Tanto a escrita ficcional literária relação ao passado, e nos faz “viajar”, é
quanto a memória e a história estão pre- somente através dessa navegação pelos
sentes na obra do autor, é um exemplo túneis da memória que é possível trazer
claro da fusão real-imaginário. A obra Me- a tona às sequências da nossa história,
mórias de um rato de hotel possui resquí- da nossa vida, ou da vida de outro. Um
cios de subjetividade e objetividade que se recorrer ao passado que é essencial, im-
misturam e reinventam uma nova forma perdível, imprescindível.
de contar a história do Brasil. Segundo Voltamos ao passado, no experi-
Mônica Pimenta Velloso a história serviria mento de esquadrinhar o presente no
“[...]como matéria inspiradora para a fic- qual nossa história se desenvolve, apre-
ção, reinvenção da realidade”. 31 sentando assim às linhas, os feixes que
Os reflexos da abolição, a queda permaneciam “deslembrados” no tempo.
da monarquia, a república, a moderni- A narrativa segue o fluxo da vida,
dade, as dissensões políticas e sociais, a ela não se ilustra à parte da história, uni-
camente escoa-se. Na medida em que a
31
VELLOSO, Mônica P. A literatura como espelho
história é contada, os episódios apare-
da Nação: a crítica literária no Estado Novo. Re-
vista de Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 1,
n. 2, p. 239-263, 1988. p. 259. 32
Idem, p.259.

108 Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v.23, n.1, jan./jun. 2010


cem acompanhando a memória “[...] que fidelidade de dados. No entanto, para um
não se preocupa com o encadeamento historiador que procura indícios sobre
exato de fatos determinados, mas com a a época da qual o autor participou, sua
maneira de sua inserção no fluxo inson- obra literária, pode ser de grande valor.
33
dável das coisas” . Como bem lembra Sandra Jatahy Pesa-
Assim o autor, João do Rio, parte de vento:
uma referência histórica vivida para es-
crever sua ficção, da sua ocupação como A sintonia fina de uma época fornecendo
uma leitura do presente da escrita pode
flanêur para oferecer um “retrato” de
ser encontrada em um Balzac ou em um
época. Essa captação do passado na obra
Machado, sem que nos preocupemos
de João do Rio denota a compatibilidade com o fato de Capitu ou do Tio Goriot e
entre história, memória e literatura, sem de Eugène de Rastignac terem existido
que sejam negligenciadas as especificida- ou não. Existiram enquanto possibili-
des dos respectivos discursos. Segundo dades, como perfis que retraçam sensi-
bilidades. Foram reais na “verdade do
Pesavento:
simbólico” que expressam não no acon-
tecer da vida. São dotados de realidade,
História e Literatura correspondem a
porque encarnam defeitos e virtudes
narrativas explicativas do real que se re-
dos humanos, porque nos falam do ab-
novam no tempo e no espaço, mas que
surdo da existência, das misérias e das
são dotadas de um traço de permanên-
conquistas gratificantes da vida, porque
cia ancestral: os homens, desde sempre,
falam das coisas para além da moral e
expressaram pela linguagem o mundo
das normas, para além do confessável,
do visto e do não visto, através das suas
por exemplo.36
diferentes formas: a oralidade, a escrita,
a imagem, a música.34
Portanto, a leitura dos anos iniciais

Também Paul Veyne lembra que, do século XX na obra literária de João do

“como o romance, a história seleciona, Rio pode ser percebida através:

simplifica, organiza, faz com que um


[...] do “efeito de real” fornecido pelo
século caiba numa página [...]”.35 Dessa
texto literário que consegue fazer seu
forma o historiador também se aproxima leitor privilegiado – no caso, o historia-
da ficção, reinventando o tempo. dor, com o seu capital específico de co-
João do Rio não era um historiador, nhecimento – divisar sob nova luz o seu
nem tampouco sua obra objetivava des- objeto de análise, numa temporalidade
passada. Nesta dimensão, o texto literá-
crever os acontecimentos com máxima
rio inaugura um plus como possibilida-
de de conhecimento do mundo.37
33
BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e polí-
tica: ensaios sobre literatura e história da cultu-
ra. 7ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 209.
34
PESAVENTO, op. cit., p. 13-14.
35
VEYNE, Paul. Como se escreve a história. Brasí- 36
PESAVENTO, op. cit., p. 15.
lia: UnB, 1992. p. 11. 37
Idem. p. 22.

Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v.23, n.1, jan./jun. 2010 109


Tal caminho de investigação dis- na narrativa literária, muito mais do que
para um minucioso entendimento sobre em outro tipo de documento.40

as diferentes possibilidades de leitura


da obra de João do Rio. A obra escolhi- Para além das reminiscências do
da para esta pesquisa dá acesso através protagonista sem escrúpulos e que ex-
das lembranças do afamado golpista às trapola aventuras no romance de João
formas e as sensibilidades de se ver ou- do Rio, temos, também, na novela jor-
tro tempo. Como afirma Pesavento, “o nalístico-policialesca, uma extensa e co-
texto literário revela e insinua as ver- lorida gama de memórias coadjuvantes.
dades da representação ou do simbólico Algumas, notadamente, adquirem re-
através de fatos criados pela ficção”. 38 levância vez ou outra, mas de resto são
Desse modo, a temática insere-se assim, lembranças coletivas que o autor colheu
nos domínios da história cultural que, a por suas andanças a Casa de Detenção ou
partir de Roger Chartier entende-se “[...] nos Cafés da Rua do Ouvidor. Circulando
por principal objeto identificar o modo por um espaço coletivo e participando de
como em diferentes lugares e momen- sua composição, sejam prisões ou hotéis
tos uma determinada realidade social é de luxo, cortiços ou salões, João do Rio
construída, pensada, dada a ler”.39 faz transitar em seu livro não somente
Essa lógica nos leva a compreender “o rato de hotel”, mas sim “os ratos de
através da escrita da cidade, as experi- hotéis” que perambulavam pelo Rio de
ências e choques entre as camadas da Janeiro e pelo Brasil.
população que metamorfoseavam e cria- Se Memórias de um rato de hotel é
vam seus espaços. Formas que vigora- marcadamente a história de Artur Antu-
vam naquela sociedade e que para João nes Maciel não se pode afirmar, no en-
do Rio era o laço de afeto entre ele e sua tanto, o livro condiz integralmente com
escrita. A Belle Époque tropical permitiu parte da história carioca e brasileira.
ao autor interpretações sobre as sensibi- Através de uma figura deformada pelo
lidades da época, interpretações que no cinismo, pelo riso e pela falsificação,
caso desta obra em discussão se configu- mas ainda humana, João do Rio insere
ra como a forma de: o leitor no picadeiro das contestações e
divergências de sua atualidade, onde a
[...] capturar a impressão de vida, a ener- modernidade a qual correspondia o pro-
gia vital, a enargheia presente no passa- jeto de construção de uma nova ordem
do, na raiz da explicação de seus atos e na sociedade brasileira da virada do sé-
da sua forma de qualificar o mundo. E
culo XIX para o XX é colocada, portanto,
estes traços, eles podem ser resgatados
como uma indeterminação, como uma
incerteza onde os sujeitos e personagens
38
Idem, ibdem.
39
CHARTIER, Roger. A história cultural – Entre
práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990. p.
16-17. 40
PESAVENTO, op. cit., p. 23.

110 Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v.23, n.1, jan./jun. 2010


das histórias contam o seu tempo através como romances e contos, é imprescindí-
da vivência da experiência urbana. vel também que se contemple os textos
Seu livro é, a um só tempo, recurso não ficcionais como artigos, crônicas,
e risco para os historiadores, um quebra- correspondências, diários e memórias,
cabeças com peças falsas e verdadeiras justapondo-os e interpretando-os à luz
que envolve o que cada um busca falar dos contextos sociais, econômicos, polí-
sobre o mundo. Desse modo, memória e ticos e culturais dos quais fazem parte.
história, realidade e ficção, são elemen- Desse modo, novamente diferentemente
tos que se tecem com artimanha e com da literatura, buscamos não prescindir
arte, por meio de novas reinvenções e das fontes documentais, pois são nossas
de leituras possíveis acerca do que titu- bases para que, apresentada a interpre-
lamos de realidade. Nesse viés, a obra tação devida, possamos identificar o que
literária, como qualquer outra fonte é ou não historiografia. De acordo com
empregada pelos historiadores, é produ- esses pressupostos, compartilho aqui das
zida num contexto histórico onde cabe ideias de Sidney Chalhoub e Leonardo
ao pesquisador colocá-la diante dos vá- Pereira quando afirmam que:
rios movimentos da sociedade esquadri-
nhando nela plausíveis representações [...] a disposição de se apropriar da li-
teratura sem a maior sem-cerimônia –
do passado, tal como praticamos com os
despudoramente, se nos permite dizer
documentos.
assim. Diante dos poetas e prosadores
Através de documentos ou textos do Olimpo das letras, não passamos
literários, cabe ao historiador buscar com o chapéu à mão, curvando-nos
através destas representações textuais respeitosamente. Chapéu à banda,
do passado a construção de uma versão passamos gingando. Por obrigação de
ofício, historiadores sociais são profa-
provável dos acontecimentos. Ou seja,
nadores.
investigar o passado com a intenção de
reconstruí-lo tal como poderia ter sido.
[...] a proposta é historicizar a obra li-
Nesse sentido, a bibliografia de João do terária, inserí-la no movimento da so-
Rio pode ser muito importante para se ciedade, investigar as suas redes de in-
compreender o texto literário também terlocução social, destrinchar não a sua
como um organismo permeado por cate- suposta autonomia em relação à socie-
dade, mas sim a forma como constrói ou
gorias históricas que lhe deram origem.
representa a sua relação com a realidade
De fato, pois, constituem-se como obras
social – algo que faz mesmo ao negar
de ficção, contudo nem por isto desobri- fazê-lo. Em suma, é preciso desnudar o
gadas de certa lógica social, cuja iden- rei, tomar a literatura sem reverências,
tificação e explicação são pressupostos sem reducionismos estéticos, dessacrá-
indissociáveis do exame histórico. liza-la, submetê-la ao interrogatório sis-
temático que é uma obrigação do nosso
Assim, por mais que dedique gran-
oficio. Para historiadores a literatura é,
de parte da análise aos textos ficcionais,

Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v.23, n.1, jan./jun. 2010 111


enfim, testemunho histórico. 41 CÂNDIDO, Antônio. “Radicais de oca-
sião”, em CÂNDIDO, Antônio, Teresina
Deste modo, a análise de Memórias etc., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1980.
de um rato de hotel, como relato escrito
por João do Rio ou Artur Antunes Maciel, CARVALHO, J.M. Os Bestializados: o
ou ambos, faz-se sob o intento de buscar Rio de Janeiro e a república que não foi.
um levantamento das representações da 3ª ed. São Paulo: Companhia das letras,
cidade do Rio de Janeiro sob os auspícios 1998.
do novo século XX. Estudar as relações
entre memória, literatura e experiência CHALHOUB, Sidney e PEREIRA, Leo-
urbana na narrativa literária da obra em nardo Affonso de Miranda. “Apresen-
questão é considerar além do enfoque tação”. In: ______ (Orgs.). A História
literário, a configuração histórica, bem contada: capítulos de história social
como a representação da marginalidade da literatura no Brasil. Rio de Janeiro,
que rodeia a modernização da cidade. Nova Fronteira, 1998. p. 07-13.
Modernidade esta invocada nos finais
do século XIX e que adentra o século XX CHARTIER, Roger. A história cultural –
servindo de cenário literário para João Entre práticas e representações. Lisboa:
do Rio que, com certo abuso, usa o olhar Difel, 1990.
flâneur para desvendar a infinita gama
de símbolos criada no íntimo da urbe HALBWACHS. Maurice. A Memória Co-
moderna. É um texto que, povoado por letiva. São Paulo: Centauro, 2004.
certo olhar irônico e crítico, nos fornece
uma interessante compreensão da época. PESAVENTO, Sandra Jatahy. História &
Literatura: uma velha-nova história. In:
Bibliografia COSTA, Clélia Botelho da; MACHADO,
Maria Clara Tomaz (Org.). Literatura e
A Morte do Dr. Antonio. Careta, Rio de história: identidades e fronteiras. Uber-
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arte e política: ensaios sobre literatura de Janeiro, vol. 2, n. 3, p. 3-15, 1989.
e história da cultura. 7ª ed. São Paulo:
Brasiliense, 1994. RIO, João do. A alma encantadora das
ruas:  crônicas.  São Paulo (SP): M. Cla-
41
CHALHOUB, Sidney e PEREIRA, Leonardo Affon-
ret, 2007.
so de Miranda. Apresentação. In: A História con-
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Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998. p. 7. ______. Memórias de um rato de hotel.

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Submetido em: 14 de Julho, 2010


Aprovado em: 8 de Setembro, 2010

Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v.23, n.1, jan./jun. 2010 113


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