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SEMINÁRIO MARTIN BUCER

CURSO AVANÇADO DE TEOLOGIA

A ELEIÇÃO À LUZ DA BÍBLIA

JEFERSON ALFREDO PEREIRA

Orientadora:
Prof.ª Dra. Cláudia Carioca

Presidente Prudente - SP
2016
SEMINÁRIO MARTIN BUCER
CURSO AVANÇADO DE TEOLOGIA

A ELEIÇÃO À LUZ DA BÍBLIA

JEFERSON ALFREDO PEREIRA

Trabalho de apresentação do 1º Ano do


Curso Avançado em Teologia, Seminário
Martin Bucer, como parte de requisito parcial
para obtenção de nota para a matéria de
Metodologia da Pesquisa Científica.

Orientadora:
Prof.ª Dra. Cláudia Carioca

Presidente Prudente - SP
2016
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.............................................................................................................3

1. O QUE É ELEIÇÃO A LUZ DO TEXTO BÍBLICO?................................................4

2. A BÍBLIA SAGRADA E A DOUTRINA DA ELEIÇÃO.............................................6


2.1 PRINCIPAIS TEXTOS SOBRE A DOUTRINA DA ELEIÇÃO ................................8

3. A ELEIÇÃO E SEUS EFEITOS NA VIDA DO CRENTE.......................................14


3.1 O PRINCÍPIO DE TUDO......................................................................................14
3.2 O CHAMADO.......................................................................................................14
3.3 A REGENERAÇÃO SOBRENATURAL E NECESSÁRIA....................................15
3.4 A MUDANÇA VISÍVEL, A CONVERSÃO.............................................................16
3.5 JUSTIFICADOS, NÃO ORFÃOS..........................................................................17
3.6 NA RETA FINAL, A SANTIFICAÇÃO DOS ELEITOS..........................................19

4 CONCLUSÃO.........................................................................................................20

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................................21
INTRODUÇÃO

O texto a seguir trata a respeito da doutrina da eleição à luz do texto


bíblico. A eleição incondicional é uma doutrina protestante mais intimamente ligada
com as igrejas de linha reformada1. Na teologia sistemática, eleição faz parte da
doutrina da predestinação. Grudem conceitua eleição da seguinte maneira: “Eleição
é um ato de Deus, antes da criação, no qual ele escolhe algumas pessoas para
serem salvas, não por causa de algum mérito antevisto nelas, mas somente por
causa de sua suprema boa vontade”. (GRUDEM 1999, 560 p.)
Este trabalho não tem a pretensão de abranger todas as questões
envolvidas em relação à eleição, muito poderia ser escrito, mas o tempo e o espaço
não fornecem possibilidade para tal empreitada teológica.
McGrath falando sobre a eleição em um sentido mais amplo declara: “[...]
a doutrina da predestinação é muitas vezes considerada como um dos aspectos
mais enigmáticos e complexos da teologia cristã” (MCGRATH, 2005, 530 p.). O
objetivo do presente trabalho é apresentar ao leitor uma introdução que lhe incentive
a procurar saber mais profundamente sobre essa doutrina que é um dos pilares para
esperança de todo cristão verdadeiro.
Outro fator importante é que o leitor esteja preparado para argumentar
com aqueles que questionam sobre salvação, quando suas dúvidas são
concernentes a questões eternas. Sendo assim todo cristão deve atender ao
mandato bíblico que ordena:
“...Estejam sempre preparados para responder a qualquer pessoa que
pedir a razão da esperança que há em vocês”. (1Pe. 3:15 NVI)
“Conheçamos o Senhor; esforcemo-nos por conhecê-lo...”. (Os. 6:3 NVI)

1
Reformado é um conceito usado historicamente para as igrejas da reforma do séc. XVI
influenciadas por Zwinglio e Calvino diferenciando das igrejas luteranas. Essa diferença girou em
torno da compreensão sobre a presença de Cristo na Ceia do Senhor. Hoje, usa-se o termo
reformado para conceituar quem crê nos brados da reforma (Sola Scriptura, Sola Fide, Sola Gratia,
Solus Christus e Soli Deo Gloria, respectivamente, somente as Escrituras, somente a fé, somente a
graça, somente Cristo, somente Deus toda a glória). Os reformados são conhecidos também pela
crença nas doutrinas da graça ou chamados “cinco pontos do calvinismo” (acrostico em inglês TULIP
– Total depravation, Inconditional election, Limited atonement, Irresistible grace, Perseverance of
saints, respectivamente Depravação total, Eleição incondicional, Expiação limitada, Graça irresistível,
Perseverança dos santos) elaborados no Sínodo de Dort na Holanda em 1619 em resposta aos cinco
pontos do arminianismo, ou mais delimitadamente conhecidos pela crença na doutrina da eleição e
predestinação.
1. O QUE É ELEIÇÃO À LUZ DO TEXTO BÍBLICO?

Entre dezenas de doutrinas, uma centena de crenças e outros milhares


de denominações, por que falar sobre eleição?
Quando se usa o termo “eleição”, de pronto vem ao pensamento algo
relativo à escolha, normalmente alguma coisa ligada à política. O termo no meio da
cristandade é constantemente confundido com “predestinação” como se as duas
coisas significassem o mesmo. É bem verdade que em teologia esse tipo de
confusão não é raro – para aqueles que leem superficialmente ou muito rapidamente
temas concernentes a profundas doutrinas – outro exemplo claro é propiciação e
expiação. Não apenas eleição, mas também predestinação possui um local de
destaque na teologia bíblica porque fazem parte do destino de todo ser humano, a
saber, a salvação eterna. Relacionado à eleição, observe o que o Rev. Ryle destaca
a sobre a diferença entre os termos existentes:

“Contudo, há outra eleição, muito mais importante do que qualquer


eleição parlamentar. Uma eleição cujas consequências subsistirão,
mesmo depois que rainhas, reis e camponeses morrerem. Uma
eleição que diz respeito a todas as classes, da mais baixa a mais
alta, a mulheres e a homens. Essa eleição é a que as escrituras
chamam de “Eleição de Deus”. (RYLE, 1961, 6 p.)

Vale também ressaltar o que Louis Berkhof em sua Teologia Sistemática


trata sobre isso ao dizer que:

“A Bíblia fala de eleição em mais de um sentido. Há (1) a eleição de


Israel como povo, para privilégios especiais e serviço especial, Dt
4.37; 7.6-8; 5: Os 13.5. (2) A eleição de indivíduos para algum ofício,
ou para a realização de algum serviço especial, como Moisés, Êx 3,
os sacerdotes, Dt 18.5, os reis, ISm 10.24; SI 78.70, os profetas, Jr
1.5, e os apóstolos, Jo 6.70; At 9.15. (3) A eleição de indivíduos para
serem de Deus e herdeiros da glória eterna, Mt 22.14; Rm 11.5; ICo
1.27,28; Ef 1.4; 1.4; IPe 1.2; 2Pe 1.10. Esta última é a eleição aqui
considerada como parte da predestinação. Pode-se definir como o
ato eterno de Deus pelo qual ele, em seu soberano beneplácito, e
sem levar em conta nenhum mérito previsto nos homens, escolhe um
certo número deles para receberem a graça especial e a salvação
eterna. Mais resumidamente, pode-se dizer que a eleição é o
propósito de Deus de salvar certos membros da raça humana, em
Jesus Cristo e por meio dele”. (BERKHOF, 2012, p.107)
Nesse sentido, Berkhof enumera as características da eleição: (1) “Uma
expressão da vontade soberana de Deus, (2) É imutável e, portanto, torna segura a
salvação dos eleitos. (3) É eterna, isto é, desde toda a eternidade. (4) É
incondicional. (5) É irresistível. (6) Não merece a acusação de injustiça. (BERKHOF,
2012, P.108)
Um dos textos mais utilizados para o ensino da doutrina da eleição e da
predestinação encontra-se em Romanos, onde Paulo diz:

29 Porquanto aos que de antemão conheceu, também os


predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de
que ele seja o primogênito entre muitos irmãos.
30 E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que
chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses
também glorificou. (Rom 8:29-30 ARA)

Fica clara a união desses termos em várias passagens bíblicas. Em


muitas delas eleição estará intimamente ligada à predestinação, mas são partes
diferentes de um mesmo plano de salvação do Deus soberano. Em suma a
predestinação faz parte dos decretos de Deus que em seu plano maravilhoso elegeu
os salvos. Daí a doutrina da eleição estar intimamente ligada a predestinação. Nas
publicações teológicas muitas vezes o leitor deverá sempre ter em mente que
predestinação e eleição estão intimamente ligadas.

Somado a isso, pode se dizer que Culver possui uma brilhante


argumentação sobre a análise de A. A. Hodge2 quando diz:

“Será novidade para alguns que toda a linha de frente dos


reformadores — a igreja luterana, reformada e da Inglaterra —
defendeu uma forte doutrina da eleição. Uma grande controvérsia a
respeito dela e uma rejeição por um pequeno segmento demoraram
ao menos duas gerações depois de 1517 (as 95 teses de Lutero). Ela
já era uma doutrina da Reforma quase que universalmente
conhecida por quase uma geração antes que Calvino (que tinha
apenas cerca de oito anos de idade quando Lutero tocou os clarins
da Reforma de 1517) produzisse a primeira forma das Institutas na
década de 1530.” (CULVER, 2012, p. 889)

Dessa forma, chega-se a conclusão que o princípio do bem não vem de


nenhum outro senão unicamente de Deus.

2
Culver cita A.A. Hodge, Oulines of Theology Grand Rapids, MI: Eerdmans Publ; 1957, p
215.
2. A BÍBLIA SAGRADA E A DOUTRINA DA ELEIÇÃO.

A Bíblia Sagrada é uma coleção de livros, 66 ao todo 3, perfazendo Antigo


Testamento (AT) e Novo Testamento (NT). No Antigo Testamento – basicamente –
nela se apresenta a história da criação do mundo, a formação do homem, a queda
do homem em pecado e a solução para sua perdição eterna. Durante o AT surgem
os patriarcas e profetas anunciando a vinda daquele que salvaria o mundo de seus
pecados, o Messias! Já no NT observa-se o cumprimento da Palavra de Deus, a
vinda do Messias prometido, sua vida e seus ensinos, seu breve ministério na terra e
sua morte, bem como sua ressurreição sobrenatural. Finalmente dá-se o início da
igreja primitiva e a propagação dos seus ensinos pelos doze apóstolos a
continuidade da formação do cânon com a vinda do Espírito Santo, as viagens
missionárias e a escrita dos demais livros e cartas do Novo Testamento.
Em toda a Bíblia o leitor encontra de Gênesis a Apocalipse a eleição
divina. Se o leitor empreendesse uma rápida pesquisa no Novo Testamento,
procurando saber mais sobre “eleição”, em consonância com “eleitos”, o que poderia
encontrar? Culver responde:

“Esses dois últimos termos são usados (21 vezes no Novo


Testamento, como segue: Eklegõ (eleger), duas vezes acerca da
escolha da escolha de Deus do povo judeu (At 13.17); da escolha de
Maria da “boa parte” (Lc 10.42); finalmente, no maior número de
casos da escolha de Deus (eleição) de indivíduos para a vida eterna
(Jo 15.16) — talvez pertencente a uma das primeiras categorias
acima — ICoríntios 1.27,28; Efésios 1.4; Tiago 2.5. Eklogê (eleição)
aparece só sete vezes: uma vez para a escolha ao apostolado (At
9.15); uma vez abstratamente para a “eleição da graça” (Rm 11.7);
mas em todos os outros casos, refere-se ao ato de Deus escolher o
seu povo para a salvação (Rm 9.11; 11.5,28; lTs 1.4; 2Pe 1.10). Uma
análise linguística de termos relacionados poderia ser introduzida,
mas entendo que já foi apresentado o suficiente para mostrar que
“eleger” e “eleição” são uniformemente usados no Novo Testamento
para a escolha benigna. Por isso sempre será incorreto, biblicamente
falando, dizer que Deus “escolheu” alguém para o inferno. A Bíblia
simplesmente nunca diz isso. Repetindo, a eleição é um termo
soteriológico e deveria ser usado apenas em conexão com a
salvação, não com a condenação, que é o oposto. (CULVER, p. 889)

3
O autor do artigo se reserva no direito de citar aqui o Cânon sagrado protestante. Os
leitores da ICAR certamente protestarão porque a coleção de seus livros incluem os
deuterocanônicos ou livros apócrifos.
Quando a Bíblia Sagrada fala a respeito de Esdras, no capítulo 7 de seu
livro, observam-se três características em sua vida: (1) Ele queria aprender mais
sobre o Senhor e sobre as Sagradas Escrituras. Na época a Torá. Esdras tinha a
disposição para além de aprender, (2) viver a palavra de Deus, cumprindo em seu
dia a dia e finalmente tinha por certo o desejo de (3) ensiná-la ao seu povo.
O leitor pode estar se perguntando: “Por que devo investir meu tempo
procurando aprender sobre a eleição segundo a Bíblia?”. Sturz relata que:

“A soteriologia, doutrina da história da salvação, é essencial para


nosso entendimento das Escrituras e de nosso lugar no universo. De
uma perspectiva puramente humana, essa doutrina justamente
explica o porquê e o para quê da revelação que Deus faz de si
mesmo e de suas obras. Sem ela, o restante da teologia seria no
máximo uma recitação soturna da perdição do homem. A salvação é
central para nossa fé crista e provê o fundamento para a
possibilidade de fé e prática. Assim, sem a redenção, não haveria
uma teologia cristã”. (STURZ, 2012, 389 p.)

Partindo desse princípio, a declaração de Sturz enfatiza que para


entender bem a Bíblia, deve-se compreender corretamente a doutrina da eleição.
Vale também ressaltar a declaração do autor do livro “Imperativo Confessional”, Dr.
Carl Trueman, defendendo que: “a longa doutrina da eleição se inicia em Gênesis e
vem se desenrolando por toda a Bíblia”. Spurgeon em seus sermões afirmava
veementemente a necessidade de se pregar sobre a eleição incondicional.
Sendo assim, é chegada a conclusão de que nos tempos pós-modernos,
doutrinas verdadeiramente bíblicas estão sendo deixadas de lado enquanto a igreja
se ocupa com discussões e distrações de menor valor.
Muitos são os textos bíblicos que falam sobre a eleição. O leitor já deve
estar ciente a essa altura que embora os termos sejam parecidos – predestinação e
eleição – é importante apontar que ambos fazem parte de uma área da teologia
sistemática chamada soteriologia que significa:

“Soteriologia (a doutrina da salvação): [...] inclui o plano, a execução


e a aplicação, e os efeitos gloriosos da salvação dos homens. Isso
abrange a Cristologia (a doutrina sobre Cristo): a encarnação, a
constituição da Pessoa de Cristo, sua vida, morte e ressurreição,
juntamente com a obra própria do Espírito Santo, os meios de graça,
a Palavra de Deus e os sacramentos”. (FERREIRA, 2007, 36 p.).
2.1 PRINCIPAIS TEXTOS SOBRE A DOUTRINA DA ELEIÇÃO.

A seguir será apresentada uma breve exegese4 de alguns textos da Bíblia


Sagrada no NT que tratam da eleição.
A Bíblia diz na primeira carta de Paulo aos Tessalonicenses:
“...reconhecendo, irmãos, amados de Deus, a vossa eleição”. (1Ts 1:4 ARA).
Champlin (1998, 169 p.) diz que os crentes são irmãos, membros da
mesma família divina, que compartilham de elevadíssima eleição e chamada, para
que sejam transformados segundo a imagem do irmão mais velho Jesus Cristo. Um
dos mais graves problemas do ser humano nos dias atuais é perda de sua
identidade. Mais do que nunca é necessário resgatar o sentido de “família de Deus”.
Independente das inúmeras denominações que compõe o cristianismo, deve se
fazer o possível para que os cristãos se respeitem e possam conviver em paz diante
das diferenças teológicas. É sabido que os eleitos de Deus foram eleitos por Deus e
para Deus.
Somado a isso, Hendriksen (2007. 62 p.) enumera o ensino de Paulo
sobre eleição dessa maneira:

(1) A eleição é desde a eternidade (Efésios 1:4-5) “...assim como nos


escolheu, nele, antes da fundação do mundo, para sermos santos e
irrepreensíveis perante ele; e em amor nos predestinou para ele, para
a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito
de sua vontade, (Ef. 1:4-5 ARA)

A escolha é soberana e provém do Senhor que predestinou para si


mesmo os seus, mais uma vez enfatizando sua vontade bendita.

(2) Ela se toma evidente na vida (lTs. 1.4). Isso não significa que
alguém tenha o direito de se achar melhor do que alguém. Os eleitos tem a
evidência da graça de Deus sobre suas vidas. Deve ser evidente no passar dos dias
que eles pertencem ao Senhor.

4
Obtenção do significado de uma passagem bíblica ao extrair o significado do próprio
texto, em vez de inseri-lo ali.
(3) Ela é soberana e incondicional; isto é, não está condicionada em
obras predeterminadas nem em fé prevista (ICo. 1.27,28; 4.7; Ef.
1.4;2.8). “...pelo contrário, Deus escolheu as coisas loucas do mundo para
envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo para envergonhar as
fortes; e Deus escolheu as coisas humildes do mundo, e as desprezadas, e aquelas
que não são, para reduzir a nada as que são; (1Co. 1:27-28 ARA). Observa-se, que
a escolha é de Deus. Quem ele escolhe é decisão unicamente dele, não de méritos
que possamos ter ou desenvolver em algum momento. Observe essa verdade com o
seguinte texto: “Pois quem é que te faz sobressair? E que tens tu que não tenhas
recebido? E, se o recebeste, por que te vanglorias, como se o não tiveras
recebido?”. (1Co. 4:7 ARA) O que o cristão tem em suas mãos que não tenha vindo
de Deus? A Bíblia declara toda glória ao Deus trino. Pai, Filho e Espírito. (Sl. 115:1)

(4) Ela é justa (Rm. 9.14,15). “Que diremos, pois? Há injustiça da parte
de Deus? De modo nenhum! Pois ele diz a Moisés: Terei misericórdia de quem me
aprouver ter misericórdia e compadecer-me-ei de quem me aprouver ter compaixão”.
(Rm. 9:14-15 ARA) O termo de quem me aprouver denota novamente a soberania
de Deus em ser justo e ele mesmo escolher dentre uma massa caída alguns para a
salvação. Ainda que haja contestações referentes à “bondade de Deus” o texto
bíblico não permite outra interpretação. Igualmente, Sam Storms diz:

“Se a eleição acontece segundo o beneplácito soberano de Deus,


então Deus fica feliz por ter escolhido alguns e não todos. Agradou-
lhe escolher alguns para a salvação dentre a massa de pecadores
merecedores do inferno. A escolha de Deus não foi impulsionada por
forças externas a Ele. Deus não estava agindo de acordo com
alguma regra externa a qual ele era obrigado moralmente. Muitas
pessoas simplesmente não gostam da ideia de que o motivo para as
escolhas de Deus reside inteiramente no íntimo de Deus. Elas
querem justificar a sua decisão, explica-la apelando para leis ou
princípios comuns a todos nós. Querem racionalizá-la, fundamentá-
la, justificá-la apontando para A, B ou C em algo que não seja Deus,
ou preferencialmente para X, Y ou Z em nós, dando sentindo ao
porquê de Deus ter feito o que fez. Elas querem apelar para
determinada qualidade ou certo traço de personalidade, ou para
alguma virtude que uma pessoa possua e outra não, como o motivo
da decisão de Deus”. (STORMS, 2014, p. 39)
Para a maioria das pessoas é difícil compreender esse “senso de justiça”
de Deus. Diante desse desafio; caso o leitor também esteja dizendo: “Como pode
Deus ser justo, elegendo apenas algumas pessoas?” Storms responde prontamente:

“Uma das objeções à eleição incondicional que ouvimos com mais


frequência é que ela impugna a justiça de Deus. O arminiano5 afirma
que Deus é desleal e injusto se trata as pessoas diferentemente ou
concede a alguns um favor que nega a outros. Mas essa é,
certamente, uma maneira estranha de definir justiça. A justiça é o
princípio em virtude do qual uma pessoa recebe o que lhe é devido.
Negar a uma pessoa o que ela merece ou o que a lei exige que ela
receba é agir injustamente. Como pode, então, ser injusto negar a
uma pessoa o que ela não merece? Se você me deve e eu exijo
pagamento, dificilmente se pode dizer que agi injustamente. De
semelhante maneira, se você não me pagar, como é obrigado por lei,
a justiça exige que você sofra as consequências. Toda a humanidade
tem uma dívida infinita para com Deus, tendo sido condenada
justamente a sofrer as consequências penais que o pecado merece.
Ninguém pode afirmar legitimamente que merece misericórdia ou
clemência divina, porque “não há ninguém que faça o bem, não há
nem um sequer” (Rm. 3.12). O veredicto das Sagradas Escrituras é
“culpado das acusações”, sem base para novo julgamento ou
recurso. Nenhuma acusação legítima pode ser movida contra o
tribunal se o "Meritíssimo” entregar imediatamente toda a raça de
Adão à morte eterna. Não há recurso cabível para os réus, nem na
lei nem em si mesmo. Nenhum detalhe técnico do desenvolvimento
processual do julgamento ou testemunha de caráter em favor do
acusado pode ser reivindicado. Ao contrário dos juízes terrenos que
podem ser confundidos por advogados de raciocínio rápido ou
subornados por partidários inescrupulosos, Deus pesa todas as
provas e julga com absoluta imparcialidade. O veredicto é o mesmo
para todos: Culpado! A punição é a mesma para todos: Morte Eterna!
Deus não tem obrigação de salvar a ninguém, e é inteiramente justo
em condenar a todos. O seu perdão a alguns se deve inteiramente à
graça livre e soberana. Assim, “a maravilha das maravilhas”, diz
Benjamin Warfield, não é Deus, em seu infinito amor, não ter elegido
todos desta raça culpada para serem salvos, mas ter elegido alguns.
O que realmente precisa ser reconhecido — embora reconhecê-lo vá
muito além do que nossa imaginação possa conceber — é como o
Deus santo poderia consentir salvar um único pecador sem ir contra
a sua natureza. Se sabemos o que é o pecado, o que é a santidade e
o que é a salvação do pecado para a santidade, isso é o que
enfrentaremos. Vejo-me obrigado a confessar que a pergunta que
assombra meu coração não é “Como pode Deus ser justo?”, mas
“Como pode Deus ser misericordioso?” Não é “rejeitei Esaú” que me
incomoda, mas “amei Jacó” que me surpreende absolutamente.
(STORMS, 2014, 176 p.)

Se analisado alguma outra maneira, outro modo de “justiça” que não seja
essa. Ainda se chamaria justiça? O ser humano conseguiria escolher melhor?

5
Seguidor do “Arminianismo”, que nega a predestinação e a eleição incondicional.
(5) Ela não se limita aos gentios; em cada era um remanescente dos
judeus também está incluído (Rm. 11.5). “Assim, pois, também agora,
no tempo de hoje, sobrevive um remanescente segundo a eleição da graça.
(Rom 11:5 ARA). Segundo a graça de Deus, o mesmo Deus não esqueceu do povo
de Israel, outrora eleito para ser representante do amor e do poder de Deus sobre a
terra. Hoje participante, assim como todos os demais eleitos, da graça maravilhosa
de Cristo que alcança aqueles que o Senhor desejou salvar.

(6) Ela é imutável e eficaz; os eleitos realmente alcançarão o céu


final. Obtêm a salvação (Rm 11.7). A “corrente” de Deus não pode ser quebrada
(Rm 8.28-30; cf. 11.29; 2Tm 2.19). “Que diremos, pois? O que Israel busca, isso não
conseguiu; mas a eleição o alcançou; e os mais foram endurecidos, (Rm 11:7 ARA)
É a obra de Deus que alcança os eleitos, isso pode ser visto no capítulo oito de
Romanos onde Paulo declara: “Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem
daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito.
Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem
conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos
irmãos. E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a
esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou. (Rom 8:28-
30 ARA). Chamados por seu propósito, pois de antemão haviam sido conhecidos
pelo Senhor que os predestinou entre muitos. A Ordo Salutis6 oferece um panorama
ideal dos processos após a eleição do crente. Grudem enumera:

1. Eleição (Deus escolhe as pessoas serem salvas)


2. O chamado do evangelho (proclamar a mensagem do evangelho)
3. Regeneração (nascido de novo)
4. (Fé e arrependimento) Conversão
5. Justificação (posição legal correto)
6. Adoção (tornando-se membros da família de Deus)
7. Santificação (conduta correta na vida)
8. Perseverança (permanecendo como cristãos)
9. Morte (para ir viver com o Senhor)
10. Glorificação (recebendo um corpo de ressurreição)
Devemos observar aqui que os passos 2-6 e parte da 7 estão todos
incluídos no processo de "se tornar um cristão." Os números 7 e 8 ter
lugar na vida, o número 9 ocorre no final da vida, eo número 10
ocorre quando Cristo retorna. (GRUDEM, 1999, 559-560 p.)

6
A lista de eventos em que Deus aplica a salvação às vezes é chamada pela frase em
latim, “Ordo Salutis”, que significa "ordem da salvação".
(7) Ela afeta a vida em todas as suas fases. Não é abstrata. Embora a
eleição faça parte do decreto de Deus desde a eternidade, toma-se uma força
dinâmica no coração e na vida dos filhos de Deus. A eleição produz frutos tais
como a adoção de filhos, a vocação ou chamamento, a fé, a justificação, etc.
Veremos ainda nesse trabalho quais são os efeitos da eleição na vida do crente. Por
isso a introdução da Ordo Salutis, para estabelecer o conceito de que existe todo um
processo que se inicia a partir da eleição incondicional.

(8) Ela diz respeito a indivíduos (Rm 16.13; Fp 4.3; cf. At 9.15). “Saudai
Rufo, eleito no Senhor, e igualmente a sua mãe, que também tem sido mãe para
mim. (Rom 16:13 ARA). Rufo possuía o comportamento do crente eleito no Senhor.
Possuía as credenciais daquele que nasceu de novo devido a verdadeira conversão.
As mesmas características que Paulo vai endossar ao escrever aos Filipenses: “A ti,
fiel companheiro de jugo, também peço que as auxilies, pois juntas se esforçaram
comigo no evangelho, também com Clemente e com os demais cooperadores meus,
cujos nomes se encontram no Livro da Vida”. (Fp 4:3 ARA). Aqueles que são eleitos
possuem seus nomes escritos no Livro da Vida. E finalmente Lucas registra em Atos
a respeito do próprio Paulo: “Mas o Senhor lhe disse: Vai, porque este é para mim
um instrumento escolhido para levar o meu nome perante os gentios e reis, bem
como perante os filhos de Israel”; (At 9:15 ARA).

(9) Ela compreende esses indivíduos “em Cristo”, de modo que são
realmente considerados como um só corpo (Ef 1.4; 2Tm 2.10).
“...assim como nos escolheu, nele, antes da fundação do mundo, para sermos
santos e irrepreensíveis perante ele; e em amor (Ef 1:4 ARA) Os eleitos constituem
“um povo” escolhido, espalhado pelo mundo. “Por esta razão, tudo suporto por
causa dos eleitos, para que também eles obtenham a salvação que está em Cristo
Jesus, com eterna glória. (2Tm 2:10 ARA). Paulo tinha a responsabilidade sobre a
igreja de Cristo – como pastor – e vivia diante das necessidades e demandas dos
eleitos. Dessa forma, ser eleito não é ser perfeito, ser eleito é fazer parte do Corpo
de Cristo chamado igreja. Como igreja deve-se viver de maneira santa, graças ao
Espírito Santo para a glória de Deus.
(10) Ela não só é uma eleição para a salvação, como certamente
também é (como um elo na corrente) para o serviço (Cl 3.12).
“Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de ternos afetos de
misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de longanimidade.
(Cl 3:12 ARA). Os eleitos devem ser revestidos ou seja, devem viver uma vida “de
dentro para fora” e “de fora para dentro” com os aspectos e comportamento dignos
de filhos de Deus. A igreja chama isso de “testemunho de vida cristã”.

(11) Ela é ensinada não somente por Paulo, mas também pelo
próprio Jesus (Jo 6.39; 10.11,14,28; 17.2,9,11,24). “E a vontade de quem me
enviou é esta: que nenhum eu perca de todos os que me deu; pelo contrário, eu o
ressuscitarei no último dia. (Jo 6:39 ARA) Os eleitos pertencem a Jesus. A escolha é
dele, bem como a obra e os “seus”. O apóstolo João, inspirado pelo Espírito Santo
continua registrando as palavras de Jesus que diz: “Eu sou o bom pastor. O bom
pastor dá a vida pelas ovelhas [...] Eu sou o bom pastor; conheço as minhas
ovelhas, e elas me conhecem a mim, [...] Eu lhes dou a vida eterna; jamais
perecerão, e ninguém as arrebatará da minha mão. (Jo 10:11,14,28 ARA)

(12) Ela tem como alvo principal a glória de Deus, e é obra do seu
beneplácito (Ef 1.4-6) “assim como nos escolheu, [...] em amor nos
predestinou para ele, [...] segundo o beneplácito de sua vontade, para louvor da
glória de sua graça, [...] (Ef 1:4-6 ARA). O senhor é glorificado, afinal ele venceu a
morte e o inferno, resgatou seu povo através do sacrifício do seu filho na cruz do
Calvário, todas essas etapas estavam implícitas antes da fundação do mundo
quando elegeu os seus. Como já apresentado na Ordo Salutis, a eleição é o fator
primário e essencial para toda a obra da salvação na vida da pessoa. Entretanto,
não é a pessoa eleita o alvo da glória, a glória pertence àquele que operou
poderosamente todo esse processo sobrenatural e impossível para o homem.
Sozinho o ser humano estaria totalmente perdido e arruinado devido a depravação
total do pecado.
3. A ELEIÇÃO E SEUS EFEITOS NA VIDA DO CRENTE.

Inúmeras mudanças ocorrem na vida do ser humano devido sua eleição


incondicional. Observa-se como a eleição é incondicional, não fomos eleitos por algo
que já fizemos ou que iríamos fazer, mas salvo algum caso extraordinário, o eleito
deverá por certo, demonstrar em seu viver os frutos advindos dessa escolha divina.
É o resultado do crescimento de sua vida em Cristo Jesus, em uma linguagem
bíblica, pode-se afirmar que são os frutos que evidenciam que o ramo está ligado à
videira verdadeira. Para isso, normalmente, a vida do eleito será guiada por algumas
etapas.

3.1 O PRINCÍPIO DE TUDO.


A eleição acontece antes da criação, por causa do seu bendito amor e
soberana vontade, Deus escolhe algumas pessoas da massa perdida para serem
salvas.

3.2 O CHAMADO.

Deus convoca pessoas para si mesmo através da proclamação humana


do evangelho e eles respondem com fé salvadora. Alguns textos que demonstram
isso:
“Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis
minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até
aos confins da terra”. (At 1:8 ARA).
“Então, ele foi e começou a proclamar em Decápolis tudo o que Jesus lhe
fizera; e todos se admiravam”. (Mc 5:20 ARA).
“Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de
propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos
chamou das trevas para a sua maravilhosa luz; vós, sim, que, antes, não éreis povo,
mas, agora, sois povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia, mas, agora,
alcançastes misericórdia”. (1Pe 2:9-10 ARA).
O eleito é chamado para fora, como verdadeiro convertido é chamado
“igreja”. Tem como missão proclamar as grandezas do amor de Deus que antes da
fundação do mundo já havia traçado um plano de salvação e redenção aos seus.
Muitos autores escrevem sobre o “poder”, sobre a “unção”, como foi visto
nos textos anteriores, todo esse poder e unção foram outorgados aos eleitos por
apenas um motivo: Pregar a mensagem do evangelho. Falar do amor de Cristo. E
assim os eleitos serão “chamados” para um propósito específico. Esse chamado
pode ter sido um letreiro, um folheto evangelístico, uma música, um convite, etc. Mas
o eleito foi chamado, e esse chamado deve-se a vontade soberana de Deus
revelada na eleição incondicional.

3.3. A REGENERAÇÃO SOBRENATURAL E NECESSÁRIA.

Como visto, o eleito foi chamado e conheceu a verdade conforme o


apóstolo João descreve no capítulo 8 de seu evangelho: “conhecereis a verdade e a
verdade vos libertará!”. (Jo. 8:32 ARA). Mas como o indivíduo constatou que era a
verdade? Afinal todos estavam: “...mortos em nossos delitos...” mas graças a
regeneração o Senhor “...nos deu vida juntamente com Cristo...” (Ef. 2:5 ARA)
Como disse Spurgeon em seu sermão na noite do Domingo, 29 de
novembro de 1874, a respeito da necessidade de regeneração:

“Mas o que é nascer de novo? Eu já disse que eu não posso explicar


como o Espírito de Deus opera sobre os não regenerados, tornando-
os novas criaturas em Cristo Jesus. Eu sei que Ele geralmente opera
por meio da Palavra através da proclamação da Verdade do
Evangelho” (SPURGEON, 1874, 4 p.)

É imprescindível que se tenha o correto conceito a respeito da


regeneração, que diz: “Deus secretamente e soberanamente dá vida espiritual para
aqueles que têm sido chamados”. Um morto não pode decidir por salvar-se, como
faria? Não tem vida em si para isso. Sendo assim, constata-se a necessidade da
vivificação espiritual como obra divina com resultado eficaz na “carne”. O Dr. Walter
A. Elwell em sua Enciclopédia Teológica declara:

“Não pode haver salvação que não seja uma salvação da "carne", e
quando Ezequiel antevê o ato divino da regeneração, declara que
Deus "tirará de vós o coração de pedra e vos darei coração de carne"
(36.26). Nisto, ele deixa subentendido aquilo que Paulo declara: que
a carne se perverteu, e Deus planeja para a humanidade aquilo que
aprendemos a chamar de "ressurreição do corpo".(ELWELL, 2009,
235 p.)
Como disse Spurgeon em seu sermão sobre a Regeneração:
“[...] verdadeiros cristãos são como são porque foram regenerados, e cristãos
formais são como são porque não são regenerados. O coração do cristão foi
verdadeiramente mudado” .

3.4. A MUDANÇA VISÍVEL, A CONVERSÃO.

Entre todos os processos provenientes da eleição incondicional, o ponto


principal e muitas vezes interpretado como o ápice nessa jornada é a conversão do
indivíduo. Fulano converteu-se ao evangelho! Alguém disse. Lembra daquele
cidadão, bravo como um raio? Pois é “ele virou crente!”. Vários silogismos tem sido
usados para ilustrar a conversão. Uma das principais nos dias pós modernos é se
dizer que “aceitou Jesus como Senhor e Salvador!”. Infelizmente nem sempre
aceitar a Cristo, faz com que a pessoa realmente demonstre as mudanças
necessárias provindas do caminho que temos traçado até o presente momento. Ao
analisar o que foi apresentado até aqui sobre eleição, constata-se que aquele que
escolhe soberanamente é Jesus e não o contrário. O capítulo quinze do evangelho
de João relata essa verdade imutável proferida pela boca do próprio Messias
quando Jesus Cristo diz: “Não fostes vós que me escolhestes a mim; pelo contrário,
eu vos escolhi a vós outros e vos designei para que vades e deis fruto, e o vosso
fruto permaneça...”. (Jo. 15:16 ARA). Sendo assim, conversão é ato quando o ser
humano voluntariamente responde ao chamado do evangelho, arrependido do
pecado e colocando a fé em Jesus Cristo para a salvação.
É interessante retornar ao conceito do Dr. Elwell com respeito à
conversão:
“Conversão é um conceito integral na Bíblia, embora nem sempre
apareça com este nome nas traduções. No AT está diretamente
relacionado com o hebraico sub, o décimo- segundo verbo na ordem
de frequência do uso, que significa "voltar atrás", "retornar" ou
"voltar". Está associado também com o hebraico niham, que significa
"lastimar-se" ou "lamentar". No NT, as duas principais palavras que
representam "voltar" são epistreptiõ e metanoéõ. Este último verbo,
com seus cognatos, indica uma renovação de mente e coração, o
arrependimento do fundo do coração. Uma passagem-chave nos
evangelhos é Mt.18.33: "Se não vos converterdes e não vos
tornardes como crianças, de modo algum entrareis no reino dos
céus". A Bíblia Viva começa assim: "Se vocês não voltarem..."
(ELWELL, 2009, 353 p.)
Destaca-se que aquele que andava errante no pecado, agora, vai em
busca de outros, assim como ele mesmo foi encontrado.
Acredita-se que, os efeitos externos e visíveis da eleição incondicional
são mais evidentes agora do que nunca. O eleito passa a pertencer a uma igreja,
começa a participar de uma comunidade, assumi uma posição eclesiástica, em seu
viver diário verbaliza para todos que agora é: “Presbiteriano”, ou “Batista” ou ainda
“Assembleiano”. Conclui-se que Deus é aquele que elege, mas a diversidade de
denominações cristãs em nosso Brasil – para não dizer o mundo inteiro – faz com
que esse “convertido” agora se torne membro professo de uma igreja local. O eleito,
participante da igreja militante local, também é biblicamente membro da igreja
triunfante que um dia Cristo irá buscar! Ao proclamar o evangelho, automaticamente
ele proclamará também a comunidade de que faz parte.
Outros detalhes que demandam tempo poderiam ser tratados aqui, tais
como: testemunho, serviço cristão, boas obras, etc. Por ora com os últimos efeitos
da eleição na vida do cristão.

3.5 JUSTIFICADOS, NÃO ORFÃOS.

Uma das mais incríveis bênçãos de Deus, que não poucas vezes é
subestimada pelos cristãos, por falta de ensino a respeito da mesma é a justificação
pela fé. O Catecismo de Westminster (VOS, 2007, 195 p.) na sua septuagésima
questão ensina que: “Justificação é um ato da livre graça de Deus para com os
pecadores, no qual Ele os perdoa, aceita e considera justas as suas pessoas diante
dele, não por qualquer coisa neles operada, nem por eles feita, mas unicamente
pela perfeita obediência e plena satisfação de Cristo, a eles imputadas por Deus e
recebidas só pela fé”. (Rm. 3:22-25, e 4:5; 2Cor. 5:19, 21; Ef. 1:6-7; Rm. 3:24, 25,
28, e 5:17-19, e 4:6-8, e 5:1; At. 10:43). Após a justificação em nossa vida, ocorre a
“adoção7” que é um ato da livre graça de Deus, em seu único Filho Jesus Cristo e
por amor dele, pelo qual todos os que são justificados são recebidos no número dos
filhos de Deus, trazem o seu nome, recebem o Espírito do Filho, estão sob o seu
cuidado e dispensações paternais, são admitidos a todas as liberdades e privilégios

7
Ibid, 209 p.
dos filhos de Deus, feitos herdeiros de todas as promessas e co-herdeiros com
Cristo na glória.
1 João 3:1; Ef. 1:5; Gal. 4:4-5: João 1:12; II Cor. 6:18; Apoc. 3:12; Gal.
4:6; Sal. 103:13; Mat. 6:32; Rom. 8:17.
Esse é o divisor de águas quando se observam nas sagradas escrituras
os termos: “Criação de Deus” e “filhos de Deus”. São seus filhos aqueles que lhe
pertencem, logo, aqueles que lhe pertencem são os que foram eleitos. Portanto,
santificai-vos e sede santos, pois eu sou o SENHOR, vosso Deus. (Lev 20:7 ARA)

3.6 NA RETA FINAL, A SANTIFICAÇÃO DOS ELEITOS.

Ser santo. O alvo de todo cristão verdadeiro! Deus asseverou no AT:


“Portanto, santificai-vos e sede santos, pois eu sou o SENHOR, vosso Deus”
(Lv 20:7 ARA). Essa área na vida do cristão é tão importante que o apóstolo Pedro
reitera o mesmo texto no NT em sua primeira carta: “porque escrito está: Sede
santos, porque eu sou santo” (1Pe 1:16 ARA).
É interessante notar que a santificação é um trabalho progressivo de
Deus e do homem ao longo da vida. O agente “operacional” é o Espírito Santo que
santifica os eleitos. Calvino tratando sobre santificação, alega que a ausência da
mesma é uma demonstração da reprovação de Deus sobre aquela pessoa. Os
réprobos, ele afirma, são privados do conhecimento da palavra e da santificação
realizada pelo seu Espírito, anunciando assim seu destino final. (CALVINO, 2006, 42
p.) Ser santo, em essência, é ser separado para algo. No contexto de eleição, os
eleitos são separados para Deus, escolhidos por ele para um propósito. Propósito
este que já foi demonstrado no decorrer deste trabalho. Nem todos os teólogos
concordam com santificação como um processo na vida do crente. Observe Reid:

“Em Hebreus, “santificar” em geral significa não a operação de


melhoria moral progressiva, mas perdão (Hb 2.11; 9.13; 10.10,29; cf.,
contudo, Hb 12.14). Os que creem foram santificados “uma vez por
todas” por meio do oferecimento do corpo de Jesus Cristo (Hb
10.10). Essa santificação é nada mais que o perdão dos pecados (v.
Hb 10. 2,1 8). (REID, 2012, 328 p.)

O Dr. Reid insere em sua obra outro comentário que afirma:

Indubitavelmente, a convicção de que Deus é santo constitui um


elemento importante no relato paulino da salvação e está por trás de
seu argumento, em ITessalonicenses 4.3-8, de que seus leitores
devem manter distância das práticas imorais e atender ao chamado
divino para levar uma vida de “santificação” (ITs 4.7). Para Paulo, no
entanto, isso só é possível se recorrermos à provisão divina do dom
do Espírito Santo (ITs 4.8), que é o agente santificador na redenção
(cf. 2Ts 2.13). (REID, 2012, 388 p.)

Logo, apresentam-se aqui, as duas faces de uma mesma moeda. A


santificação proporcionada por Deus através do Espirito Santo é uma constante,
onde Deus oferece ao homem a possibilidade de viver uma vida longe do pecado.
Infelizmente, o ser humano sempre irá falhar e pecar em um momento ou outro em
seu viver diário. Isso também é claro e evidente nos ensinos do NT, principalmente
na primeira carta do apóstolo João onde ele ensina inspirado pelo Espírito Santo:
“Se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós mesmos nos
enganamos, e a verdade não está em nós. [...] Se, todavia, alguém pecar, temos
Advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo”. (1Jo 1:8; 2:1 ARA).
Mas qual o meio que Deus proporciona para que os eleitos permaneçam
santos? A resposta mais eficaz é: Perseverando! A teologia apresenta como efeito
da eleição na vida do cristão, o que é ensinado no Calvinismo como “a perseverança
dos santos”. Sobre isso Sean Michel Lucas conceitua:

“Como Deus operou para a nossa salvação em cada aspecto


certamente ele a levará à consumação para que entremos na
plenitude da vida eterna. Nossa perseverança está ligada à
preservação feita por Deus: "Aquele que começou boa obra em vós
há de completá-la até ao Dia de Cristo Jesus" (Fp 1.6). Nossa
salvação final está nas mãos de Deus, assim como o restante de
nossa salvação. Sendo assim, a salvação é certa, porque está
firmemente baseada no propósito e na promessa de Deus. (LUCAS,
2011, 48 p)

São esses alguns dos efeitos na vida do eleito. Deve-se atentar para o
cuidado de Deus em cada “etapa” de suprir aos seus filhos tudo aquilo que os
mesmos precisam para concluir a obra que se inicia na eleição. É nobre reconhecer
que o ser humano é totalmente dependente de Deus em todas as coisas e que
somente Deus pode oferecer aos eleitos os meios pelos quais se alcança a vida
eterna.
4. CONCLUSÃO.

Conclui-se que a eleição à luz do texto bíblico é uma doutrina que faz
parte daquilo que a teologia também chama de “predestinação”, decorrente dos
decretos de Deus. Sobre isso Watson postula que:

“O decreto da eleição é eterno e imutável e, portanto, não depende


da previsão da fé. “E creram todos os que haviam sido destinados
para a vida eterna” (At 13.48). Não foram eleitos porque creram, mas
creram porque foram eleitos”. (WATSON, 2009, 91 p.)

Calvino (2006, 42 p.) assevera que a eleição é incondicional, quando diz:


“Certamente o apóstolo Paulo, ao os ensinar que “fomos eleitos em Cristo antes da
criação do mundo”, elimina toda a qualquer consideração por nossa dignidade e
merecimento”. Logo não há uma necessidade de que Deus seja auxiliado por seus
filhos na doutrina da eleição. Deus não precisa de ajuda, ele requer obediência.
Como Deus soberano, seu beneplácito demonstra isso. Calvino8 continua dizendo:
“Paulo coloca o beneplácito de Deus em oposição a todos os méritos que se possa
mencionar, porque, onde quer que reine o beneplácito de Deus, nenhuma obra entra
em consideração”.
O Dr. Ryle assegura:

Você não tem como tornar sua eleição ainda mais segura aos olhos
de Deus do que ela já tem sido por toda a eternidade, posto que nele
não há incertezas. Nada que Deus faz para o seu povo é deixado à
sorte ou sujeito a mudanças. Entretanto, o ponto para o qual desejo
que foque toda a sua atenção é que sua eleição pode ficar mais
evidente para você e sua igreja. Lute por essa certeza de que, como
João afirmou: Você conhece a Cristo! (1Jo. 2:3). Esforce-se para
viver nesse mundo de modo que todos saibam que você é um filho
de Deus e não duvidem de que você esteja indo para o céu. (RYLE,
1961, 8 p.)

Dessa maneira a vida do cristão deve ser pautada de acordo com os


ensinos da Palavra de Deus que orienta o viver santo, sempre buscando conhecer
mais a respeito dessa “eleição” tão nobre, ainda que sem merecimento por parte dos
alcançados. Isso tudo se deve a Graça.

8
Ibid, p 43.
REFERÊNCIAS

BERKHOF, Louis. Teologia sistemática. São Paulo: Cultura Cristã,


2012. 107 p.

CALVINO, João. As institutas da religião cristã: Volume 3. São Paulo:


Cultura Cristã, 2006. 42 p.

CHAMPLIN, Russel Norman. O novo testamento interpretado: Versículo


por versículo volume 5. 1 ed. São Paulo: Hagnos, 1998. 169 p.

CULVER, Robert D. Teologia sistemática: bíblica e histórica. São Paulo:


Shedd Publicações, 2012. 889 p.

ELWELL, Walter A.; , . Enciclopédia histórico teológica da igreja


cristã. São Paulo: Vida Nova, 2009. 235 p.

FERREIRA, Franklin; MYATT, Alan. Teologia sistemática. São Paulo:


Vida Nova, 2007. 36 p.

GRUDEM, Wayne. Teologia sistemática: Atual e exaustiva. São Paulo:


Vida Nova, 1999. 560 p.

HENDRIKSEN, William. Comentário do novo testamento: 1 e 2


Tessalonicenses, Colossenses e Filemom. São Paulo: Cultura Cristã, 2007. 62 p.

LUCAS, Sean Michel. O cristão presbiteriano. São Paulo: Cultura


Cristã, 2011. 48 p.

MCGRATH, Alister E. Teologia sistemática: Histórica e Filosófica: uma


introdução à teologia cristã. São Paulo: Vida Nova, 2005. 530 p.

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Acesso em: 21 ago. 2016.

REID, Daniel G.. Dicionário teológico do novo testamento. São Paulo:


Vida Nova, 2012. 328 p.

STORMS, Sam. Escolhidos: uma exposição da doutrina da eleição. São


Paulo: Anno Domini, 2014. 39 p.

STURZ, Richard J.. Teologia sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2012.
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VOS, Johannes Geerhardus. Catecismo maior de westminster
comentado. São Paulo: Os Puritanos, 2007. 195 p.

WATSON, Thomas. A fé cristã: estudos baseados no breve catecismo de


Westminster. São Paulo: Cultura Cristã, 2009. 91 p.

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