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EMANCIPAÇÃO FABRICADA:
A FAMÍLIA E A NOVA ORDEM SEXUAL.
SÃO PAULO
2018
RODRIGO MORMILLO FERRARI
EMANCIPAÇÃO FABRICADA:
A FAMÍLIA E A NOVA ORDEM SEXUAL.
SÃO PAULO
2018
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer
meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que
citada a fonte.
EMANCIPAÇÃO FABRICADA:
A FAMÍLIA E A NOVA ORDEM SEXUAL.
BANCA EXAMINADORA
___________________________________
___________________________________
___________________________________
RESUMO
INTRODUÇÃO ................................................................................................... 6
CAPÍTULO 1 – O CAMINHO DA REIFICAÇÃO ................................................ 8
1.1 Tradições e costumes ........................................................................ 13
1.2 A família ............................................................................................. 16
CAPÍTULO 2 – CONSIDERAÇÕES SOBRE A FUNÇÃO E A HISTÓRIA DO
MATRIMÔNIO .................................................................................................. 18
2.1 Supressão de casamentos clandestinos na Inglaterra:
o Marriage Act de 1753 ............................................................................ 19
2.2 O sentimento de família ..................................................................... 23
2.3 A família moderna .............................................................................. 26
2.4 O matrimônio pós-moderno ............................................................... 30
2.5 O lar intacto e as novas formas familiares ......................................... 33
CAPÍTULO 3 – O LIVRE-MERCADO DAS RELAÇÕES SEXUAIS
CONTEMPORÂNEAS ..................................................................................... 40
3.1 Razão sexual ..................................................................................... 40
3.2 Teoria do capital erótico ..................................................................... 49
3.3 Amor líquido e a transformação da intimidade ................................... 53
3.4 A sociedade de consumidores de Bauman ........................................ 55
3.5 Vida a crédito e a economia da dívida ............................................... 57
CAPÍTULO 4 – DESIGUALDADE SOCIAL E MATRIMÔNIO NOS ESTADOS
UNIDOS ........................................................................................................... 59
4.1 Moynihan Report................................................................................ 59
4.2 Os mercados matrimoniais ................................................................ 62
4.3 O coração da questão ........................................................................ 65
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 72
REFERÊNCIAS ................................................................................................ 73
APÊNDICE A – Novos valores têm pernas curtas ....................................... 87
APÊNDICE B – Concubinato estratégico na Inglaterra ............................... 93
6
INTRODUÇÃO
1Do original: “Any reflection on culture which at this critical moment can come to grips with the
present period and thereby with earlier ones as well, must be concerned with the role of particular
cultural spheres and their changing structural interrelationships in the maintenance or dissolution
of given forms of society”.
8
CAPÍTULO 1
O CAMINHO DA REIFICAÇÃO
Assim como ele diz que todas as pessoas influentes na Inglaterra de seu
tempo eram “em certa medida socialistas” (HAYEK, 2017, l. 399), hoje no Brasil
é possível afirmar que todos são em certa medida neoliberais.
10
Mas não se pode mais falar de Marx sem mencionar sua décima primeira
tese sobre Feuerbach, que já abusou demais da hospitalidade dos acadêmicos
ocidentais: “Os filósofos têm apenas interpretado o mundo de maneiras
diferentes; a questão, porém, é transformá-lo” (MARX, 2005, p. 120). Essa ideia
foi se transformando em carta branca para todo o tipo de falácia e, por isso, como
Slavoj Zizek costuma dizer, talvez seja hora de invertê-la: “Os filósofos até agora
têm tentado transformar o mundo de maneiras diferentes; hoje, no entanto, é
preciso interpretá-lo” (ZIZEK, 2015).
É por isso que o presente trabalho não traz propostas, soluções ou
conclusões formais, porque é preciso romper com a tendência messiânica da
crítica social contemporânea. Só com uma abordagem minimamente
desinteressada será possível compreender de que forma “o passado hoje se
prolonga pela destruição do passado”, na famosa fórmula de Adorno e
Horkheimer (2006) e o sentido desta ideia peculiar de Zizek:
1.2 A família
16
CAPÍTULO 2
CONSIDERAÇÕES SOBRE A FUNÇÃO E A HISTÓRIA DO MATRIMÔNIO
4 Do original: “How often”, demanded the Attorney General, Sir Dudley Ryder, “have we known
the heir of a good family seduced, and engaged in a clandestine marriage, perhaps with a
common strumpet? How often have we known a rich heiress carried off by a man of low birth, or
perhaps by an infamous sharper?”
21
A oposição a essa lei argumentava que ela fazia parte de uma trama para
monopolizar todas as herdeiras ricas do reino. Diziam que a riqueza era o sangue
do corpo político, e precisava circular livremente, sendo para isso necessário que
os casamentos não fossem baseados em cálculo racional e sim em amor e
atração sexual. Condenavam qualquer mudança que aumentasse a idade
mínima necessária para que as jovens pudessem casar, pois a flor da juventude
(o auge da beleza) das mulheres seria entre os dezesseis e os vinte e um anos
de idade e, portanto, era nesse intervalo que ela teria maiores chances de
garantir o casamento mais vantajoso para si sem o consentimento de pais
mercenários (na expressão de um dos presentes no debate, o visconde Charles
Townshend), que iriam querer garantir um casamento mais vantajoso para eles.
Diziam também que os homens comuns não deliberavam antes de casar, pois,
se fossem dirigidos apenas pela sabedoria e racionalidade, jamais casariam; “é
sob a influência irresistível e ingovernável das paixões que as pessoas se
propagam”, afirmava o conde Robert Nugent5.
Dessa discussão, o principal elemento que precisamos resgatar para os
dias de hoje é a questão do elo entre a mobilidade social e as regras de
funcionamento da instituição do matrimônio. Os argumentos que condenam o
casamento por conveniência, ou golpe do baú, evidenciam o interesse dos
proprietários em garantir que suas posses não sejam irracionalmente divididas
com gente mais pobre simplesmente pelas paixões de seus herdeiros. Essa
consideração em especial é muito relevante porque no cenário atual é possível
observar esse efeito da concentração da riqueza por meios semelhantes. Ao
mudar as regras do jogo matrimonial de forma a garantir que as pessoas tomem
suas decisões amorosas e familiares da maneira mais racional possível, ou mais
vantajosa possível para si, o efeito inevitável é a concentração das riquezas.
Basta que cada um se esforce para identificar o que é mais vantajoso para si em
cada situação e será muito fácil observar como a maioria das pessoas concluirá
que casar com pobre é um mau negócio.
Assim, a condenação dos matrimônios por impulso (ou qualquer outra
paixão irracional que submeta um dos noivos a um mau negócio) tem o efeito de
5Robert Nugent, poeta e político irlandês, que já servia a House of Commons de 1741, e que,
em 1782, se torna Father of the House por ser o membro com o maior tempo servido
continuamente na casa.
22
7 Louis Gabriel Ambroise (1754-1840), ou Louis de Bonald, foi um dos principais tradicionalistas
franceses de sua época, conhecido principalmente por seu monarquismo e suas críticas aos
filósofos iluministas. Hyppolyte Taine (1828-1893) foi um historiador francês de grande influência,
e o é até hoje. Um notável crítico dos ideais igualitários da Revolução Francesa e das políticas
jacobinas de concentração de poder, é considerado uma das principais influências do
naturalismo francês e do Positivismo do século XIX.
28
Por volta de 1960, o núcleo das relações amorosas deixa de ser o filho. O
sexo é dissociado da reprodução com a consolidação dos avanços tecnológicos
que permitiram o controle total da mulher sobre seu ventre e sobre a procriação
e se torna o cerne de toda relação. Sexo antes do casamento passa a ser parte
da experiência representativa da pessoa média e não só se torna normal ter
filhos fora do casamento como a própria existência de filhos vai sendo cada vez
mais vista como uma inconveniência, um elemento externo ao casal que é
frequentemente prejudicial a ela.
Para Harold James, o casamento hoje é apenas mais uma extensão da
busca do consumidor por satisfação: “se eu tenho prazer em comprar um relógio
caro para depois jogá-lo no chão e destruí-lo, o pior de que posso ser acusado
é excentricidade...” (JAMES, 2010, l. 1303). Os casamentos passam a ser
tratados da mesma forma ao dependerem unicamente das vontades transitórias
dos cônjuges. Os filhos passam a ser vistos como qualquer outro objeto de
consumo.
Shorter afirma que “entre as estudantes universitárias por toda a
sociedade ocidental na década de 1960, a virgindade dissolveu-se como a
crisálida em redor de uma borboleta” (SHORTER, 1975, p. 125). Na
Universidade sueca de Upsala, a porcentagem de mulheres que haviam
“participado de relações sexuais” foi de 40% em 1960 para 65% em 1965,
aumentando 5% por ano. A sondagem Gallup, nos Estados Unidos, revela
mudanças drásticas também nas crenças da população: em 1969, 68% dos
entrevistados afirmaram acreditar que “as pessoas não devem ter relações
sexuais antes do casamento”; em 1973, esse número já havia chegado aos 48%,
tendo caído 20 pontos em apenas quatro anos (SHORTER, 1975, p. 126).
Na verdade, a “verdadeira sociedade tradicional” já havia se desintegrado
por volta de 1850, segundo Shorter (1975). O povo em geral já havia enterrado
a castidade antes do casamento no século anterior. Mas depois dos anos 1960,
a classe média inteira já estava sexualmente proletarizada.
A intensificação da importância da vida erótica do casal injeta uma dose
de material explosivo na relação, tornando-a mais instável e frágil na medida em
31
que a gratificação sensual ocupa o cerne da relação. A família nuclear vai sendo
substituída pelo “casal flutuante”, nos termos de Shorter (1975).
Giddens (1992) chama esse novo tipo de relação entre os sexos de
“relacionamento puro”, definindo-o como:
“benefícios do governo”; conjunção carnal, para ela e daí por diante para a lei
americana, não era mais um componente essencial do matrimônio.
Essa decisão privilegiou a esfera da escolha individual sobre todas as
outras, efetivamente subsumindo o casamento ao direito que cada um deve ter
de encontrar a felicidade. A instituição não é mais da sociedade e para a
sociedade: é apenas mais um produto a ser consumido ou rejeitado
individualmente, segundo seus próprios desígnios. O problema é que o aumento
dessas liberdades em uma geração acaba sendo pago pela próxima.
8 Dados do CDC: Centers for Disease Control and Prevention: Disponível em:
https://www.cdc.gov/nchs/fastats/marriage-divorce.htm. Acesso em: 14 out. 2018.
40
CAPÍTULO 3
O LIVRE-MERCADO DAS RELAÇÕES SEXUAIS CONTEMPORÂNEAS
9
Video do American Enterprise Institute, Instituto para pesquisa de políticas públicas de
Washington DC. Programa apresentado por Christina Hoff Sommers. Campus sexual assault:
Bad statistics don’t help victims / Factual Feminist. 26 de Outubro de 2015. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=q5XMuTAomNk. Acesso em: 20 out. 2018.
Video do American Enterprise Institute, Instituto para pesquisa de políticas públicas de
Washington DC. Programa apresentado por Christina Hoff Sommers. Sexual Assault in America:
Do we know the true numbers? / Factual Feminist. 28 de abril de 2014. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=lNsJ1DhqQ-s. Acesso em: 20 out. 2018.
Video da Prager University, Organização sem fins lucrativos. A “cultura do estupro” existe?. 11
de abril de 2016. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=K0mzqL50I-
w&feature=youtu.be. Acesso em: 20 out. 2018.
41
especificamente só os adultos férteis, os que ainda não têm par, os que não
apresentam incompatibilidades de forma etc.).
Os esforços universitários para a elevação máxima da proporção de
alunas do sexo feminino tiveram efeitos previsíveis, porque atualmente já está
bem estabelecido que os efeitos de alterações na razão sexual em humanos é
consistente com os resultados obtidos em estudos com outros animais. No que
diz respeito à razão sexual operacional em humanos, é preciso acrescentar as
restrições que a lei e os costumes estabelecem (especialmente as que dizem
respeito à idade mínima para casar, pois essa idade varia bastante e afeta
diretamente a razão operacional). E esses estudos explicam não só o que
acontece nas universidades, como também esclarecem consideravelmente a
dinâmica das relações entre homens e mulheres fora delas. Muito do que será
apresentado aqui chega a ser óbvio ou senso comum, mas (ou talvez justamente
por isso) foi amplamente negligenciado tanto por jornalistas quanto pelas
políticas das universidades.
O censo de 201210 aponta que, naquele ano, 5,5 milhões de mulheres e
apenas 4,1 milhões de homens na faixa etária entre os 22 e os 29 anos de idade
estavam matriculados em instituições de ensino superior no país (ou seja, 33%
mais mulheres do que homens). Para os recém-formados com menos de 24
anos, o número é maior ainda, chegando a 39% mais mulheres do que homens
(devido ao alto número de estudantes estrangeiros, predominantemente
homens, que retornam a seus países depois de formados).
A cidade de Nova York tem atualmente um excedente de
aproximadamente 100 mil jovens mulheres com ensino superior quando seu
número é comparado ao dos jovens homens com esse nível de escolaridade. O
padrão se repete em quase todas as regiões do ocidente capitalista
contemporâneo e não mostra sinais de desaceleração. Deve-se observar que,
ao mesmo tempo, o número de mulheres americanas entre os 30 e os 34 anos
de idade que nunca casaram subiu de 865.083 em 2007 para 1.133.956 em
2012, num aumento de 31% em apenas cinco anos. As faculdades privadas dos
10
Dados do Censo de 2012 nos Estados Unidos. Disponível em: https://www.census.gov. Acesso
em: 19 out. 2018.
42
Estados Unidos chegam a ter 50% mais mulheres do que homens, numa
proporção de três mulheres para cada dois homens (GUTTENTAG; SECORD,
1983; BIRGER, 2015).
A questão fica mais clara quando se compara os números relativos a cada
território: na região do Sillicon Valley (Santa Clara), por exemplo, 33% das
mulheres entre 22 e 29 anos estavam casadas em 2012, enquanto em
Manhattan, esse número não passa de 13% (onde as coisas não vão bem para
elas). Segundo as pesquisas do Pew Research Center, a região de Santa Clara
apresenta de longe a maior proporção de homens empregados para cada mulher
solteira do país: 114 homens empregados para cada 100 mulheres solteiras.
Santa Clara é também a número 1 no ranking de renda familiar (household
income) do país (BIRGER, 2015, l. 649), e será demonstrado que isso não é por
acaso.
Num contexto social e jurídico que removeu todas as regras e convenções
de viés monogâmico que restringiam as interações sexuais, o comportamento
humano se tornou mais próximo do comportamento animal. A racionalidade
humana passou a servir os instintos, que determinam os fins individuais
previamente estabelecidos pela tradição. Ao invés de ter uma família e uma casa
própria, o sonho americano vai se tornando “aproveitar a vida”, “comprazer-se”
etc. Acontece aqui o que Adorno e Horkheimer (2006) alertaram sobre o
esclarecimento: o processo de racionalização do mundo para dominar a
natureza leva paradoxalmente a uma submissão maior à natureza.
Enquanto as normas irracionais da tradição proibiam o homem de usar
seu intelecto livremente para servir fria e calculadamente seus desejos, as
rédeas da razão ainda estavam nas mãos de princípios civilizados. Mas no
momento em que se descobre que esses princípios são superstições tolas, todo
sacrifício do desejo em nome deles parece intolerável. Hoje, só se pode justificar
um desejo em nome de outro desejo, e a hierarquia de apetites acaba
substituindo a hierarquia de valores.
BIRGER (2015) escreveu sobre o impacto dessas alterações na
proporção sexual, citando como exemplo um estudo sobre o comportamento das
tilápias (peixes de água doce) quando se altera, para um lado ou para outro, as
proporções de fêmeas e machos num ambiente fechado (BIRGER, 2015, l. 659).
Elas tendem tipicamente à monogamia nas temporadas de acasalamento, mas,
43
com isso, pois coincide com uma alteração demográfica sensível nas proporções
sexuais da população americana: entre os anos 1960 e 1970, o país deixa de ter
um excesso de homens e passa a ser composto majoritariamente por mulheres.
Além disso, como as mulheres antes da década de 1960 casavam com homens
em média três ou quatro anos mais velhos que elas, o baby-boom após a
Segunda Guerra Mundial significou que o número de mulheres nascidas em
1946, 1947 e 1948 foi muito maior do que o de homens nascidos antes do baby-
boom, em 1943, 1944 e 1945. Essa alteração nas proporções coincide com a
libertação sexual, dando mais crédito à teoria de que o que se passa entre
humanos é análogo ao que acontece com outros animais nessa questão.
Enquanto em 1960 havia 111 homens legalmente aptos a casar para cada 100
mulheres na mesma situação, em 1970 o mercado consistia em apenas 84
homens para cada 100 mulheres, como demonstraram Guttentag e Secord em
seu estudo pioneiro no assunto das proporções sexuais (BIRGER, 2015, l. 659).
Guttentag e Secord (2015), após analisarem esses paralelos estatísticos,
afirmaram que toda cultura sexual de um grupo é determinada majoritariamente
pela questão da proporção entre os sexos: nas sociedades em que há mais
homens do que mulheres, prevalece o romantismo, o compromisso é valorizado
e as relações matrimoniais são mais estáveis. Quando há mais mulheres do que
homens, ao contrário, os homens desdenham do compromisso. Aumenta o custo
relativo dos sacrifícios que deve fazer ao jurar fidelidade enquanto suas
oportunidades abundam, especialmente nos primeiros e estressantes anos de
um bebê. Os autores chegam a afirmar, com base nessas evidências, que essas
circunstâncias são precisamente o que levou as mulheres americanas a buscar
mais independência, mais poder econômico e mais poder político (BIRGER,
2015, l. 659): suas chances de obter uma vida satisfatória eram objetivamente
maiores arriscando a sorte numa carreira do que na busca por um marido.
Nessa mesma direção, Katherine Trent e Scott South, sociólogos da
University of Albany, mostraram que os índices de casamento são mais altos e
os índices de divórcio são mais baixos em países onde há mais homens do que
mulheres (UECKER; REGNERUS, 2010;). O psicólogo evolucionista Nigel
Barber acrescenta que, além disso, os países em que sobram homens
apresentam índices menores de gravidez na adolescência; em ainda outro
estudo, Barber analisa os dados sobre criminalidade da Interpol e encontra
46
11 “Oh, boy: are lopsided migrant sex ratios giving Europe a man problem?”. The Economist, 16
de janeiro de 2016. Disponível em: https://www.economist.com/europe/2016/01/16/oh-boy.
Acesso em: 16 out. 2018.
12
Termo utilizado pelas organizações internacionais para designar refugiados de guerra ou
exilados políticos, em oposição aos “economic migrants”, que migram em busca de
oportunidades de emprego ou uma vida melhor de forma geral.
13 Pesquisa do Pew Research Center: Number of refugees to Europe surges to record 1.3 million
responsável pelos seus pais e mães idosos até o fim de suas vidas, enquanto as
mulheres não têm responsabilidade alguma estipulada por lei de sustentá-los.
Só podendo ter um filho, a escolha mais racional fica evidente.
De qualquer forma, isso torna a região toda mais instável e violenta,
segundo a análise de Hudson e outros especialistas (HUDSON et al., 2009;
HESKET; MIN MIN, 2012), para os quais hoje não há dúvida alguma sobre a
relação entre o aumento da violência e o desequilíbrio da razão sexual na direção
do excesso de homens, da formação de um exército de reserva de homens em
condições desesperadas (HUDSON, 2010) o suficiente para que, enquanto
solteirões condenados ao celibato involuntário, tenham na violência um dos
únicos meios, senão o único, de sucesso reprodutivo. O caso extremo desse
fenômeno é o da adesão a grupos terroristas (que para se aproveitar desse
cenário incorporam à sua campanha de recrutamento a disponibilidade de
escravos sexuais – mulheres e crianças – para seus soldados).
Hudson (2010) levanta estudos mostrando também que tanto em animais
quanto em humanos há uma forte tendência, quando a situação é de recursos
escassos, a privilegiar sucesso reprodutivo e laços de grupo (especialmente
grupos com forte hierarquia, no caso dos mamíferos, porque hierarquias de
dominância em geral aumentam sua probabilidade de sobrevivência). Ou seja,
os dois problemas que as organizações terroristas – e talvez também o
populismo de apelo nacionalista – estão prontas para resolver.
O quarto capítulo desta dissertação voltará a essa questão para
apresentar mais detalhadamente os efeitos de alterações na razão sexual
operacional em humanos, pois é uma questão que requer bastante
detalhamento.
forma que investe em seu capital intelectual. Por isso, investigar o funcionamento
dessa dinâmica das preferências sexuais pode ser útil.
Catherine Hakim, socióloga especializada em questões de gênero da
London School of Economics e do Civitas, parte dos conceitos de Pierre
Bordieu14 em sua teoria do capital simbólico para elaborar uma teoria do capital
erótico (HAKIM, 2010).
O capital erótico é o quarto capital que complementa a antiga tríade
(capital econômico, capital cultural e capital social) de Bordieu. Seus elementos
são: a) beleza estática, englobando simetria facial, tom de pele, e especialmente
a beleza do rosto; b) atratividade sexual, que é a sensualidade do corpo em
movimento; c) a habilidade na interação social, no sentido do charme, da graça
e também do flerte; d) vivacidade, que aparece, por exemplo, na dança ou na
prática de esportes, mas que ela também relaciona ao bom humor; e) a
apresentação, a forma de se vestir, de se maquiar, o estilo do cabelo, as
fragrâncias dos perfumes e cosméticos utilizados, e os complementos externos
acrescentados (como joias, chapéus etc.); f) competência sexual, imaginação
erótica, a habilidade de satisfazer sexualmente o outro, que inclui tanto a
predisposição nata quanto a experiência e o treino para se tornar bom nisso. Ela
relaciona essa competência também com libido, que serve de incentivo natural
para o desenvolvimento dessas habilidades; g) fertilidade, ou capital reprodutivo,
que é evidentemente uma exclusividade feminina e possui hoje muito menos
valor do que tinha em sociedades agrícolas mais antigas (HAKIM, 2010, p. 505).
Outros sociólogos e psicólogos (HAKIM, 2010) demonstram como esse
poder erótico é sempre um elemento crucial nas dinâmicas internas de cada
relacionamento, tendo frequentemente mais influência nas relações de poder e
controle que o sucesso profissional (para o desagrado dos homens ricos e feios
casados com mulheres pobres e atraentes).
Além disso, inúmeros autores, como Malo de Molina (1992) concordam
com Hakim quando ela afirma, junto com o senso comum, que a demanda sexual
masculina excede significativamente a feminina, gerando um desequilíbrio entre
oferta e procura por sexo, que se revela de várias formas: a masturbação regular
é três vezes mais frequente em homens (HUNTER, 2010); os clientes dos
14 Pierre Bordieu (1930-2002), francês, foi filósofo e importante sociólogo do século XX.
51
Como, aliás, o desejo poderia se fixar, uma vez que não tem certeza
de poder conservar o que o atrai? Pois a anomia é dupla. Do mesmo
modo como o indivíduo não se dá definitivamente, ele não possui nada
definitivamente. A incerteza do futuro, aliada à sua própria
indeterminação, condena-o portanto a uma eterna mobilidade. De tudo
isso resulta um estado de perturbação, de agitação e de insatisfação
[...] (BAUMAN, 2008, p. 32).
15
Site da empresa “Marido de Aluguel”: http://www.maridosdealuguelsp.com.br/.
57
não contribui para o PIB nem está sujeita a impostos, é uma oportunidade
perdida.
Por isso, o governo neoliberal deve sempre agir sobre a sociedade,
apropriando-se de processos sociais para criar condições que abram espaço
para a competição, permitindo que os negócios colonizem cada território social.
Só assim a economia da dívida, ou a vida a crédito, pode prevalecer sobre toda
a forma de voluntarismo: tornando, mediante manipulação voluntária ou
involuntária das condições do ambiente, cada vez mais irracional, a decisão de
cooperar espontaneamente com qualquer outra pessoa – até com os próprios
cônjuges e filhos, no estágio mais avançado.
O que Lazzarato (2012) chama de Economia da Dívida (Debt Economy)
é o arranjo que une uma multiplicidade de mecanismos sociais, políticos e
econômicos e os canaliza numa determinada direção que promove o
endividamento coletivo. A unidade não é sistêmica, mas operacional; constitui
uma política que produz ora uma composição, ora outra, mas sempre
aumentando a demanda por bens e serviços.
Um século após Rosa Luxemburgo antever que o capitalismo dependia
de “economias não capitalistas” para se expandir sobre elas, explorando-as e
colonizando essas “terras virgens”, Bauman afirma que:
CAPÍTULO 4
DESIGUALDADE SOCIAL E MATRIMÔNIO NOS ESTADOS UNIDOS
16"Leis de Jim Crow" é uma expressão usada para designar diversas leis estaduais distintas que
institucionalizavam a segregação racial em espaços e serviços públicos (escolas, trens, ônibus
etc.) no Sul dos Estados Unidos. Vigoraram entre 1876 e 1965, quando foram abolidas pelo Civil
Rights Act, de 1964.
61
mulheres foram se tornando cada vez mais inacessíveis para a maioria dos
homens de sua região (GILDER, 1986; TIGER, 1999; MURRAY, 2013).
Gilder (1986), Murray (2013) e outros autores acreditam que o matrimônio
e a família sempre serviram à função social de civilizar, domesticar e até docilizar
os homens. É apenas depois de casado que ele passa a ser um membro
completo da sociedade, preocupado com sua estabilidade, seu futuro etc. Só
assim, segundo eles, o homem deixa de ser um bárbaro incivilizado. Se isso for
verdade, mesmo que apenas em certa medida, um número cada vez maior de
homens acabou sendo marginalizado dessa influência civilizadora desejável (do
ponto de vista da ordem social, não dos próprios homens, necessariamente, é
claro).
Por mais fantástica que seja a visão do homem como um bárbaro
selvagem que precisa ser artificialmente civilizado por meio das mulheres e das
crianças, ela parece ser corroborada pelos dados sobre o estado civil dos
prisioneiros americanos: um estudo feito por intelectuais de Harvard e Maryland
(SAMPSON; LAUB; WIMER, 2006), usando um método de “probabilidade
inversa” (IPTW ou “Inverse Probability of Treatment Weighting”), conseguiram
calcular a magnitude da influência do casamento na incidência ou reincidência
de comportamentos criminosos. Segundo os resultados encontrados, ao casar,
o homem passa a ter 35% menos chance de cometer qualquer crime. A pesquisa
é bem interessante e razoavelmente complicada por causa de sua abordagem
contrafactual e da necessidade de acompanhar diversos outros traços
associados à criminalidade para um grande número de homens, durante toda a
sua vida; mas os resultados são interessantes. Eles conduziram também
entrevistas com esses homens para ouvir suas reflexões pessoais, suas próprias
razões, e, após interpretarem as respostas, elaboraram os principais motivos
que encontraram para a existência dessa correlação: a) a formação de laços
sociais por meio do matrimônio torna o membro parte de um “sistema
interdependente de obrigação e suporte mútuo” (SAMPSON; LAUB; WIMER,
2006), que aumenta o “custo” do comportamento criminoso no sentido de que
ele tem mais a perder do que se não tivesse laço social algum; b) a introdução
de uma nova rotina, um novo “estilo de vida” associado à vida do casal (e outros
estudos já demonstraram consistentemente que as atividades diárias, o
cotidiano ou o “estilo de vida” influenciam positiva ou negativamente o
67
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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APÊNDICE A
NOVOS VALORES TÊM PERNAS CURTAS
I.
O Esclarecimento (Aufklarung) de Kant é “a saída do homem de sua
menoridade... A menoridade é a incapacidade de se servir de seu entendimento
sem a direção de outrem” (KANT, 1985). Essa “direção de outrem” representa a
tradição, as opiniões de autoridade etc., e o amadurecimento é o uso racional do
entendimento. Mas Adorno e Horkheimer (2006) enxergam no esclarecimento
uma força muito mais antiga que o Iluminismo de Kant. Ele é o processo pelo
qual o homem vai da interpretação mitológica e supersticiosa do mundo à
compreensão racional e desencantada dele. Ele é “a forma que lida melhor com
os fatos e mais eficazmente apoia o sujeito na dominação da natureza”
(ADORNO; HORKHEIMER, 2006). Mas essa função já era desempenhada pela
mitologia, e é precisamente dela que nasce o esclarecimento. O gérmen de toda
ciência, a alma da tábua das categorias, é a autoconservação do sujeito
esclarecido, a mesma força por trás da mitologia.
O esclarecimento promove a autoconservação do sujeito por meio do
desmascaramento sucessivo de todas as suas ilusões, superstições e tradições;
tudo o que já estava pré-estabelecido nas mentes dos homens, ele chama de
preconceitos e vê como entraves a sua independência, empecilhos ao aumento
de seu poder. Assim, ele vai destruindo uma a uma toda a superstição que a
tradição consolidou e revelando toda a verdade que ela suprimiu, tendo em vista
a dominação da natureza (a sua natureza e a natureza externa, os maiores
inimigos do homem primitivo).
Mas o esclarecimento só pôde existir graças ao que havia antes dele: o
mito, a superstição etc.; e no processo de desmascarar e compreender tudo
racionalmente, ele acaba derrubando até suas próprias condições de existência
– já que pouco sobrevive à força destruidora da razão. O esclarecimento começa
a amedrontar os próprios esclarecedores: “As doutrinas morais do
esclarecimento dão testemunho da tentativa desesperada de colocar no lugar da
religião enfraquecida um motivo intelectual para perseverar na sociedade
quando o interesse falha” (ADORNO; HORKHEIMER, 2006, p. 12).
88
inicial de toda essa história: as paixões (pathos), cuja influência tirânica e nociva
à autoconservação dos organismos era tão grande que o surgimento e a
consolidação das civilizações parecem ter dependido completamente de
mentiras para controlá-las a qualquer custo.
As paixões tomam as rédeas da carruagem da razão depois que a
tradição cai do assento de condutor: é assim que o “tudo é permitido”, de Ivan
Karamazov, na história de Dostoievski, vai se tornando o “Faze o que tu queres
há de ser o todo da Lei”, do Thelema, de Aleister Crowley. A liberdade à liberdade
se transforma em obrigação à liberdade, e se vê como no processo de
dominação da natureza em que o homem faz de si mesmo seu instrumento.
II.
A emancipação do indivíduo, em especial o caso de sua emancipação
sexual, parece um bom caso para se tentar aplicar ao modelo de interpretação
da dialética do esclarecimento.
O movimento de desmistificação e racionalização das relações entre os
sexos – que é uma espécie de esclarecimento sexual, por propor um fim às
ilusões da tradição e uma reordenação racional das relações entre homens e
mulheres, chegou a um ponto em que finalmente começa a corroer suas próprias
condições de existência (mitos, superstições, costumes irracionais etc.). Para se
autoconservar, o esclarecimento sexual vai se transformando num
contraesclarecimento sexual.
A mesma pressão seletiva que empurrava a sociedade na direção de uma
compreensão mais clara e racional do sexo começa a trazer de volta antigas
superstições, ou cria novas que cumpram a função de uma antiga. Ela faz isso
sob uma retórica modernizada, com novos conceitos e mecanismos, e também
implementa medidas que cumprem precisamente as funções contra as quais ela
se revoltava décadas atrás.
Se, ao invés de pensarmos nas definições das ideias – naquilo que
denotam –, focarmos nos efeitos que elas produzem, ou melhor, nos efeitos
produzidos pelo poder que veste a ideia naquele momento, essas especulações
não parecem mais tão absurdas.
Termos como má-conduta sexual e objetificação sexual, ou a extensão da
abrangência de conceitos como assédio e sexismo, desempenham funções
90
importar com trivialidades filosóficas desse tipo, estão prontas para se readequar
a qualquer solução rápida e fácil que cumpra essas funções necessárias até para
sua vida cotidiana. E a partir daí, o progressismo procede tentando mudar
apenas o que as condições o forçam a modificar, enquanto garante que as
ilusões necessárias sobrevivam na forma de novas utopias que façam a mesma
coisa. Assim, o ingresso das mulheres em massa na força de trabalho provou-
se necessário, mas o resto pode ficar como está.
Nas palavras de Peter Sloterdijk, “todo conhecimento tem de escolher seu
lugar na estrutura de poderes hegemônicos e de contrapotências”
(SLOTERDIJK, 2012), e por isso esse esclarecimento vai se “entrincheirando em
suas posições firmemente esclarecidas” e se tornando um módulo do
stablishment para se autoconservar.
[...] com um salário líquido de dois mil marcos por mês, começa
silencioso o Contra-Esclarecimento; ele aposta que cada um que tenha
algo a perder arranje-se por conta própria com sua consciência infeliz
ou a encubra com “atividades engajadas” (SLOTERDIJK, 2012, p. 35-
36).
APÊNDICE B
CONCUBINATO ESTRATÉGICO NA INGLATERRA
crianças. É claro que o fato não evidencia uma relação causal, mas o trágico é
que a fraude do casal sobre o governo – fingir que não casou para enganar seu
sistema tributário – pode se tornar, nolens volens, uma fraude do governo
direcionada ao casal: ao não casar oficialmente, estão possivelmente se
condenando, estatisticamente, a mais intempéries do que se de fato
enfrentassem a lei e assumissem o seu compromisso.
Mas não é apenas para os amantes, esposos e seus respectivos filhos
que esses números fazem diferença: um número maior de lares menores,
quando comparado a um número menor de lares maiores, consome uma
quantidade de recursos per capita (energia, água, gás etc.) consideravelmente
menor. A fragmentação da população promove mais emissão de carbono, maior
consumo de combustível, elevação no número de carros por pessoa, maior
pressão no consumo de água, maior produção de lixo e outros problemas do
tipo. A tão temida superpopulação, segundo os estudos citados por Morgan (LIU
et al., apud MORGAN, 2007, p. 23), é menos relevante do que a forma de
distribuição dessa população para determinar a pressão ambiental que ela
exerce: um lar em que moram duas pessoas gasta 31% menos eletricidade e
35% menos gás por pessoa do que em lares individuais; lares formados por
quatro pessoas usam até 55% menos eletricidade e 61% menos gás.
Outra preocupação central para alguns é o altíssimo custo, em impostos,
que esse modo de vida causa para os governos: em 1970, um quarto das mães
solteiras havia recebido auxílio de renda por oito anos ou mais, mas, no fim do
século, o número de mães solteiras inglesas que recebiam Family credit ou
income support chegava a 73%; 57% delas receberam benefícios relacionados
à moradia e 62% receberam benefícios sobre seus impostos municipais. Os
números respectivos para casais formalizados por matrimônio e com filhos foram
11%, 8% e 11% (ONS, 2000). Os dados oficiais do Office for National Statistics
mostram que o gasto do governo relativo às crianças aumentou de 10 bilhões de
libras em 1975 para 22 bilhões em 2003 (ajustando os números para os preços
de 2003), sendo que o gasto por criança aumentou mais de duas vezes e meia.
O endividamento da administração pública, portanto, é outra consequência
dessas alterações.
Patricia Morgan também apresenta preocupação com a linguagem dos
documentos oficiais, que deixam de usar os termos referentes ao matrimônio
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