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ETNOCENOLOGIA E INFÂNCIA: A ESPETACULARIDADE DA CRIANÇA-

BRINCANTE NA CENA CARNAVALESCA EM BELÉM DO PARÁ

Simei Santos Andrade1


Universidade Federal do Pará

Miguel de Santa Brígida Júnior2


Universidade Federal do Pará

RESUMO: O estudo que ora apresentamos faz parte de uma pesquisa mais ampla sobre
as infâncias da Amazônia brasileira, sobretudo a paraense, compondo o mosaico das
infâncias do Brasil. Teve por objetivo compreender a espetacularidade da criança-
brincante na cena carnavalesca em Belém do Pará. O percurso teórico-metodológico
centrou-se numa abordagem qualitativa pautada na Etnocenologia, em virtude de ser esta
a que melhor respondeu às questões concernentes ao fenômeno de estudo. Os
instrumentos de pesquisa foram: observação participante, conversa informal, entrevista
conversada, fotografias, desenhos e vídeos que possibilitaram a compreensão do
fenômeno. O lócus da pesquisa foi a Associação Carnavalesca Bole-Bole, localizada no
bairro do Guamá, Belém-PA. Os participantes foram 12 crianças na faixa etária de 5 a 12
anos e 08 adultos entre 23 a 60 anos, que viveram suas infâncias e ou tiveram experiências
com crianças nas ações desenvolvidas na Associação. O estudo mostrou que no carnaval
as crianças se tornam mestre-sala, porta-bandeira, mestre de bateria, rainha de bateria,
passista, percussionista, entre outros, na medida em que o jogo simbólico, por meio dos
papéis sociais, entra em cena; elas dão o melhor de si; o corpo da criança-brincante que
se pavoneia no carnaval é a sua espetacularidade.

Palavras-chave: Etnocenologia. Espetacularidade. Criança-brincante.

Um canto ecoa a beleza da cultura popular3 - Introdução


Carnaval e infância se constituem em um estudo que buscou compreender como
as crianças se estabelecem no contexto das culturas populares, sobretudo do carnaval, no
bairro mais populoso, o Guamá, da cidade de Belém, capital do estado do Pará (IBGE,
2019). Esse estudo abrange a espetacularidade, enquanto categoria de análise que buscou

1
Professora efetiva da Faculdade de Dança da UFPA. Pós-Doutora em Artes (UFPA/2020). Doutora em
Educação pela (PUC Minas/2018). Mestre em Educação (UNASP/2005). Coordenadora do Núcleo de
Pesquisas Infâncias Amazônicas: Arte, Cultura e Educação de Crianças em diferentes contextos-NUPEIA
(UFPA/CNPq-2019). Membro de Asociación Latinoamericana de Sociologia (ALAS). E-mail:
simeiandrade@ufpa.br
2
Professor efetivo da Escola de Teatro e Dança da UFPA. Pós-Doutor em Artes Cênicas (UNIRIO/2011).
Doutor em Artes Cênicas (UFBA/2006). Mestre em Artes Cênicas (UFBA/2003). Líder do Grupo de
Pesquisa TAMBOR – Grupo de Pesquisa em Carnaval e Etnocenologia (CNPq-2008). Consultor Ad Hoc
CAPES em Etnocenologia e coordenador do GETNO – Grupo de Estudos em Etnocenologia. Coordenador
do GT Etnocenologia da ABRACE (2016-2018). E-mail: miguelsantabrigida@hotmail.com
3
Todos os subtítulos contidos no texto são fragmentos dos sambas enredos da Associação Carnavalesca
Bole-Bole dos anos 2019 (GuamÁfrica) e 2020 (Guamá: o rio que chove poesia), ambos de autoria de
Herivelto Martins e Silva (Vetinho), que foram ajustados especificamente para esse texto.
a compreensão das Práticas e Comportamentos Humanos Espetaculares Organizados
(PCHEO) das crianças-brincantes do carnaval; deste modo, o que nos interessou foi
entender como elas se colocam nessa grande festa popular que congrega a coletividade e
que adentra a vida cotidiana corroborando para o que Bião (2009) chamou de respiração
social. Assim, procuramos mostrar como a cultura popular se entrelaça com as culturas
infantis construídas na cotidianidade, possibilitando a edificação de corpos
etnocenológicos que vão se estabelecendo ao longo de toda a preparação para o desfile
oficial das escolas de samba “numa diversidade de estilo de interpretação que compõem
as [alas], as cenas e os personagens” (SANTA BRÍGIDA, 2014, p. 49 – grifo nosso).
O estudo aborda duas noções que estão no cerne da discussão sobre as infâncias
amazônicas e que dizem respeito a uma infância e a um grupo de crianças que não estão
na floresta, nos rios e não vivem em comunidades tradicionais, mas estão no centro
urbano de Belém-PA. As noções às quais nos referimos trata da infância urbana e da
criança-brincante. Assim, trazemos, neste estudo, a singularidade da infância urbana e as
crianças-brincantes do carnaval, presentes na cena cultural de uma escola de samba,
situada em um bairro da capital paraense, que tem particularidades que as difere das
demais infâncias e crianças de outros estudos já realizados por nós.
A noção de infância urbana, aqui tratada, se caracteriza pela concentração de
crianças nas grandes cidades ou centros urbanos, que vivenciam um ambiente de
mudanças sociais, culturais e econômicas extensas, com pouca ou sem nenhuma
autonomia para tomar certas decisões a respeito de políticas públicas para o seu
desenvolvimento, sendo delegada ao adulto a responsabilidade de fazer a assimilação de
questões políticas pelas crianças, principalmente nas áreas como ambiente, segurança,
políticas urbanistas e lazer, o que mostra o quanto as crianças são renegadas em seus
posicionamentos políticos, no entanto, são imprescindíveis como atores sociais que têm
todas as condições de conduzir ações mais ativas para a democratização social
(FERNANDES, 2018) e garantia de seus direitos básicos estabelecidos na Constituição
Federal de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069/1990,
principalmente.
Criança-brincante foi um conceito que emergiu durante a pesquisa de campo ao
observarmos como as crianças brincavam e demonstravam na cultura popular do
carnaval, os saberes das culturas infantis ligadas ao seu tempo, por conseguinte
conectadas às vivências do local onde residem, o Guamá. As culturas infantis propiciam
“saberes que no momento do carnaval lhes são úteis pois as permitem se localizar em seu
espaço e tempo social e facilita para elas a busca do brincar com os elementos de sua
cultura e seu transitar em meio a diversos saberes comunitários” (AIRES NETO, 2016,
96). Portanto, crianças-brincantes, consideradas nesse estudo, são aquelas que participam
ativamente das ações da escola de samba, e que, mesmo levadas pelos responsáveis,
vivenciam com alegria, dedicação e entusiasmo os ensaios, as festas, os arrastões,
experimentam as fantasias, aprendem e cantam o samba enredo, “compartilham seus
afetos, emoções, frustrações, desejos, saberes” (Idem, p. 20) e se divertem brincando,
dançando, imitando e interagindo com seus pares e a comunidade em geral.

GUAMÁFRICA, no Bole-Bole vou cantar tua raiz – Percurso Teórico- Metodológico


O estudo se deu por meio de uma abordagem qualitativa, por considerarmos ser
esta a que melhor nos dá base para nos aproximar da compreensão do fenômeno aqui
estudado – a espetacularidade da criança-brincante na cena carnavalesca.
A pesquisa qualitativa “trabalha com o universo dos significados, dos motivos,
das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes” (MINAYO, 2012, p. 21) que se
constituem elementos da realidade social, portanto, o ser humano que vivencia esses
turbilhões de experiências age, pensa e interpreta seus modos de vida e vai além do factual
ao partilhar com o seu semelhante as ações dentro e a partir da realidade vivida. Tais
aspectos são o que o distingue dos demais seres do universo visível.
O estudo centrado na abordagem qualitativa desenvolveu-se mediante
fundamentos da Etnocenologia4 “vertente das etnociências5 de caráter essencialmente
transdisciplinar, que privilegia a inteligência do discurso indissociado da fonte que o

4
Considerado um campo de estudo epistemológico e metodológico (BIÃO, 1998), a “Etnocenologia surgiu
no século XX, em Paris no ano de 1995 a partir da Universidade Paris 8 Saint-Denis, UNESCO, Maison
des Cultures du Monde presidida pelo sociólogo Jean Duvignaud, instituições articuladas para a realização
do Colóquio de Fundação do Centro Internacional de Etnocenologia, tendo como principal propositor Jean-
Marie Pradier, autor do Manifesto da Etnocenologia” (SANTA BRIGIDA, 2016, P. 136).
5
A Etnociência se constitui num campo multidisciplinar de pesquisa científica que admite e respeita a
diversidade cultural humana (BIÃO, 2009). “Posiciona-se como caminho alternativo à rigidez científica,
sem menosprezar nenhuma das metodologias construídas pela ciência ocidental, mas utilizando-se delas
como ferramentas para releituras que propiciem compreensão mais adequada e respeitosa da relação entre
humanidade e natureza. [...]. A Etnociência[s] em sua significação literal é a ciência do outro”
(WIECZORKOWKI; PESOVENTO; TÉCHIO, 2018, p. 154 - grifo nosso), nesse campo estão incluídas a
Etnopsicologia, a Etnomusicologia, a Etnolinguística, a Etnobotânica, a Etnohistória, a Etnopsiquiatria, a
Etnoculinária, a Etnomátemática e a Etonocenologia, entre outras. A afirmação da Etnociência como campo
de pesquisa em diversas áreas de conhecimento “revela a consolidação de um paradigma científico baseado
no conceito de alteridade e na afirmação do multiculturalismo” (BIÃO, 2009, p. 96); o autor ainda destaca
que o prefixo etno incorporados “a essas disciplinas serviu para explicitar uma perspectiva epistemológica
e metodológica (Idem, p.97).
gerou, abrindo um novo caminho para a análise dos fenômenos espetaculares” (SANTA
BRÍGIDA, 2007, p. 199).
O pilar epistemológico, principal eixo norteador das pesquisas realizadas nas
Artes Cênicas, concebido desde os primórdios da criação da disciplina Etnocenologia em
1995, com a publicação do “Manifesto da Etnocenologia”, denomina-se de Práticas e
Comportamentos Humanos Espetaculares Organizados (PCHEO), que tem como um de
seus princípios basilares avalizar a heterogeneidade de fenômenos sociais; é nesse
contexto que se encontra o carnaval, e nele as crianças-brincantes e suas
espetacularidades. Deste modo, o corpo etnocenológico (SANTA BRÍGIDA, 2014) é o
que edifica a Etnocenologia enquanto base epistemológica e metodológica deste estudo.
Nessas dimensões, o corpo é o fenômeno de interesse da Etnocenologia, uma
palavra que se estrutura em três bases da língua e da cultura grega, quais sejam: etno,
ceno e logia, que foram estabelecidas no Manifesto da Etnocenologia6 publicado em
1995, no qual os termos são assim definidos:

Etno, significando o que é pertinente a um grupo social, um povo, uma nação;


ceno, cobrindo um grande conjunto de significados, simultaneamente os
sentidos de abrigo provisório, templo, cena teatral, local coberto onde os atores
punham suas máscaras, banquete sob uma tenda, corpo humano, mímicos,
malabaristas e acrobatas apresentando-se em barracas provisórias em
momentos de festa – todos esses sentidos remetem à ideia de ceno na palavra
etnocenologia; e logia, naturalmente, designa a proposição de estudos
sistemáticos (BIÃO, 2009, 133).

Nesse sentido, a Etnocenologia tem propiciado discussões e debates acerca do seu


objeto, que reside especialmente nos “espetáculos, rituais, cerimônias e interações sociais
em geral” (BIÃO, 1998, p. 17); seguindo este raciocínio, o carnaval se faz presente como
um ritual nacional que se fundamenta na condição “de dramatizar valores globais, críticos
e abrangentes da nossa sociedade” (DAMATTA, 1997, p. 45). Tem contribuído também
para o alargamento das visões teóricas da pesquisa científica e artística, de maneira
abrangente, e, de maneira mais particular, para o trabalho dos pesquisadores que se
debruçam às artes do espetáculo (BIÃO, 2009).

6
O Manifesto da Etnocenologia é um documento que foi “redigido pelo Centro Nacional de Etnocenologia
em 17 de fevereiro de 1995, na França. Tal manifesto é resultado de uma parceria entre a Maison de Cultures
du Monde presidida na época por Jean Duvignaud –, a Unesco – então coordenada por Chérik Khaznadar
– e o Laboratório Interdisciplinar de Práticas Espetaculares da Paris 8-Saint Denis – então coordenado pelo
professor Jean-Marie Pradier” (BARRETO, 2014, p. 43). Parte deste documento foi traduzida para a língua
portuguesa, disponível no livro: TEIXEIRA, João Gabriel L. C. (Org.). Performáticos, performance e
sociedade. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1996.
A Etnocenologia enquanto disciplina e método científico se consolida no espaço
amazônico com especificidades próprias e culturas singulares que emergem de todos os
locais da região “marcada por grandes linhas de forças como a natureza, as [comunidades]
indígenas e sua cultura, as manifestações de arte popular, a arte plumária, a cerâmica, as
embarcações, as casas, os rios, as ruas” (LOUREIRO, 2002, p. 133 – grifo nosso), dando
origem a uma Etnocenologia Amazônica (SANTA BRÍGIDA, 2015; CARVALHO,
2014).
A investigação foi realizada no bairro do Guamá, espaço geográfico exaltado nos
enredos da Associação Carnavalesca Bole-Bole, lócus de vários estudos científicos7, local
de resistência sociopolítica e também de explosão da cultura popular, sobretudo na
passagem Pedreirinha, onde se concentram vários ambiente que desenvolvem ações
culturais de cunho religioso, artístico, recreativo e lúdico, também é nesta via que se
localiza a sede da escola de samba8. Dias Júnior (2009) destaca em seus estudos sobre a
cultura popular no bairro do Guamá que este espaço geográfico, o Guamá, se constitui
num local

[...] de bastante movimento, com uma sementeira humana, que desabrocha


todos os dias nas ruas, nas feiras, nas escolas, indo e vindo para o trabalho, se
articulando de diversas formas, participando de eventos lúdicos e festas
religiosas. Enfim, um espaço específico da urbe, que guarda algumas
características que lhe dão singularidade, determinando o nível de
identificação de seus moradores com o espaço (DIAS JÚNIOR, 2009, p. 38).

No Guamá, embora seja considerado de grande vulnerabilidade social, as


manifestações culturais afloram na cotidianidade da comunidade; neste sentido, Modesto
(2017) ressalta o esforço e luta dos guamaenses para manter de pé

[...] seus bois-bumbás, cordões de pássaro e pássaros junino, escolas de samba,


cantigas de ladainha, festividades culturais, afrorreligiosas e religiosas,
quadrilhas juninas, instituições religiosas e afrorreligiosas, que se constituem
em espaços de agregação de cultura antiviolência para os que vivem no bairro
(MODESTO, 2017, p. 73).

Nessa cotidianidade, Talles Miléo enfatiza a importância que a cultura tem no


bairro como mecanismo de enfrentamento dos problemas sociais existentes. É por meio

7
Podemos destacar os estudos de Ramos (2002), Dias Júnior (2009), Ferreira (2012), Palheta (2012), Gordo
(2015) e Modesto (2017).
8
A sede da Associação Carnavalesca Bole-Bole está localizada na Avenida José Bonifácio, passagem
Pedreirinha, 143, Guamá.
dela que as crianças e jovens têm a possibilidade de mudar o curso de suas vidas, tão
penalizadas pela pobreza, violência de toda ordem, especialmente pelos homicídios de
pessoas jovens na faixa etária de 16 e 17 anos, preconceito racial (MODESTO, 2017),
entre outros. Na entrevista conversada Talles dispara que a arte e a cultura são ecos que
reverberam a voz da liberdade; segundo ele,

E a arte num contexto geral, ela te oportuniza criar, ela te dá voz. Então
através da cultura, através do carnaval, eu percebo que as pessoas
podem gritar e dizer: não! Eu não sou isso. Eu não quero ser isso. O
meu mundo não se restringe a números de violência, a casos de
agressão, a uma história que já aconteceu. Ah! O bairro do Guamá tem
muita violência. Tem muita violência, mas também é um bairro hoje,
que se você for parar pra pesquisar, é um dos que mais têm grupos
folclóricos e parafolclóricos no estado do Pará e talvez no Brasil. E
então você percebe que isso são os gritos de: não, eu não quero isso pra
mim. Eu não quero ser estigmatizado, eu não quero sofrer com algo que
alguém me disse. Eu quero ter a minha própria voz (TALLES MILÉO,
ENTREVISTA 20/01/2020).

Nessa ótica percebe-se que o Guamá se coloca como espaço de sociabilidade,


aquele “espaço humilde onde se exprimem tantas alegrias e desapontamentos, aí, nesse
espaço onde se joga tanto afeto e onde têm lugar tantas conversas, constitui-se pouco a
pouco a sólida trama social” (MAFFESOLI, 2001, p. 92), que tem a aparência, a
expressão, o cheiro e o jeito dos elementos e sujeitos que compõem este lugar.
Portanto, o Guamá como espaço de sociabilidade traz na sua trama social a
multiplicidade das manifestações da cultura popular ali presente. Nesse contexto, fizemos
um recorte das distintas manifestações e nos debruçamos na realização de uma análise
compreensiva sobre o carnaval realizado pela Associação Carnavalesca Bole-Bole.
O estudo teve a participação de 12 (doze) crianças, na faixa-etária de 5 a 12 anos,
atuantes nas atividades da Associação Carnavalesca Bole-Bole (ensaio coletivo, arrastão
cultural, ensaio de ala, escolha de figurino, estudo e apresentação do samba-enredo, entre
outros), dos quais 83,3% moram no bairro do Guamá e as demais em bairros limítrofes,
na sua maioria estudantes de escolas públicas, cerca 91,6%. Quando nos referimos à
atuação direta, estamos falando das crianças-brincantes que estiveram presentes desde o
início da investigação participando ativamente das ações propostas e estavam na Bole-
Bole em grande parte dos eventos realizados. A escolha dessa faixa etária deve-se ao fato
de se considerar, com bases nos estudos da Sociologia da Infância, que dominam, de certa
maneira, a linguagem oral, podendo expressar de forma objetiva as ideias sobre suas
vivências no carnaval, bem como expressar suas espetacularidades. Os instrumentos de
pesquisa com este grupo geracional foram conversa informal, entrevista conversada,
fotografias, vídeos e desenhos.
A pesquisa também contou com a participação de 8 (oito) adultos, na faixa etária
de 23 a 60 anos, pessoas que viveram suas infâncias na Bole-Bole e ou que desenvolveram
alguma experiência com as crianças no carnaval na escola, como ex-integrantes de
projetos sociais, dirigentes e ex-dirigentes, pais, brincantes e envolvidos com algumas
alas da escola. Com este grupo realizamos conversa informal e entrevista conversada que
serviu para complementar nossa compreensão daquilo que vivenciamos durante dois anos
de pesquisa sobre carnaval e infância na Associação.

Fantasias verdadeiras da Menina Guajarina: a espetacularidade da criança-


brincante na cena carnavalesca
Durante o carnaval, nos arrastões culturais e nos desfiles oficiais a presença do
grupo “Meninos do Pandeiro do Guamá”, composto por adultos e crianças, se destacou
realizando movimentos acrobáticos, exibindo suas espetacularidades. O corpo dos
tocadores de pandeiros é um corpo lúdico que atrai gritos, palmas e muitos olhares. Os
artistas “levam para a rua seus conhecimentos [...] apresentados como brincadeiras, que
para eles significam uma prática cultural comunitária” (GOMES, 2007, p. 61).
O grupo organiza ações corporais criadoras, desconstrói os arquétipos e práticas
comuns, apostando num novo ou em outras formas que saiam da rotina cotidiana e se
estabeleçam em outro patamar, o da extracotidianidade, como bem observado na imagem
a seguir, destacando a figura de Francisco de Xavier de Lima Neto, 12 anos, componente
do grupo:

Imagem 1 – Grupo Meninos do Pandeiro do Guamá, o destaque são as crianças


realizando acrobacias, Carnaval 2020.
Fonte: Simei Andrade, 2019 e Josué Jastézio Rúbio, 2020.

O entusiasmo dos Meninos do Pandeiro do Guamá aumenta à medida que


percebem que estão sendo ovacionados; quando isso ocorre, as apresentações acontecem
num tempo menor, aumentando assim as variações dos movimentos que refletem “a
alegria, o protesto político, o deboche, a crítica social” (GOMES, 2007, p. 62).
De todas as alas existentes na Bole-Bole, a bateria é a que congrega o maior
número de crianças-brincantes. Segundo Mestre Mini9 isso se deve ao fato do “trabalho
de renovação que fazemos aqui na escola, a nossa intenção aqui é transformar ritmistas
em músicos, inclusive a gente tem uma safra muito grande de músicos, graças a Deus
que hoje em dia não virou só ritmista e sim virou músico, que saiu daqui. A Bole-Bole é
uma grande referência que a gente tem aqui em Belém no sentido de ter preparado muitos
músicos para a cidade” (ENTREVISTA CONVERSADA, 30/01/2020).
A respeito da importância da Bole-Bole para o cenário artístico musical,
principalmente do carnaval em Belém do Pará, Hélio Martins10 destaca que “a Bole-Bole
não importa a mão de obra de lugar nenhum [...] hoje o Rancho tem diretor de bateria
que saiu da Bole-Bole, não é o titular, mas é uma pessoa importante lá. O Rancho
contratou um cara do Guamá, o Quem São Eles tem um diretor de bateria que saiu da
Bole-Bole, que é o meu filho, tá! O Piratas da Batucada tem um diretor de bateria que
saiu da Bole-Bole, a Matinha tinha um diretor de bateria que saiu da Bole-Bole, só pra
você ver que aquilo que a gente implantou lá em 1984 com muita dificuldade hoje tem
resultado, hoje tem frutos, a gente não tem a mínima possibilidade na nossa cabeça de
ter que contratar um diretor de bateria lá fora [...] não precisa porque a nossa mão de
obra é demais qualificada [...]” (ENTREVISTA CONVERSADA, 17/01/2020).
A escola oferece durante o decorrer do ano cursos preparatórios de música,
sobretudo de percussão, que já vai preparando as crianças e jovens para se tornarem
ritmistas da Bole-Bole, na bateria que foi batizada de “Audaciosa”. No entanto, Hélio
Martins salienta que a escola de samba desde o seu início sempre foi um espaço educativo
de formação de crianças e adolescentes para a criação artístico-cultural, embora nos
primeiros anos de criação da escola de samba essa ideia de formação não estivesse
perceptível para o grupo pioneiro: “a gente criou a escola de samba Bole-Bole do Futuro,
os garotos faziam tudo na escola, eles faziam as músicas, eles faziam as alegorias, eles
ensaiavam as suas baterias [...] eles faziam tudo lá, depois se criou o Boi Malhadinho,
que foi uma base fundamental para o Pavulagem, o Arraial do Pavulagem tá aí com toda
a sua pompa, os músicos do comando do Boi Pavulagem é tudo de fora, mas eles foram

9
José Fabrício Oliveira Meireles, conhecido popularmente como Mestre Mini, 41 anos, nasceu e vive até
hoje no Guamá, na passagem Pedreirinha. É Mestre de Bateria da Bole-Bole, participou das primeiras
oficinas na escola, posteriormente se tornou monitor na escola de samba e em outras instituições educativas
do bairro. Aos 12 anos de idade se tornou o primeiro chefe de bateria mirim de Belém.
10
Hélio João Martins e Silva, 54 anos, Engenheiro Civil e Advogado, nasceu no Guamá, vem de uma
família de músicos e ligados à cultura popular do bairro. Foi o primeiro Diretor de Bateria da Bole-Bole.
Hoje se diz que colabora como ritmista da Bateria Audaciosa.
beber lá na fonte do Guamá porque lá nós tínhamos uma base humana e cultural pra dar
suporte. [...] a gente não fazia isso com essa leitura de formação, a gente ia fazendo meio
que na marra” (ENTREVISTA CONVERSADA, 17/01/2020).
As narrativas de Hélio Martins nos apontam que a escola de samba Bole-Bole tem
uma ligação firmada com a comunidade, e trazê-la para dentro do espaço físico e
desenvolver ações sociopolíticas com crianças, jovens e adultos foi a forma que
encontraram de avalizar a “convivência e consolidar a base comunitária como garantia da
manutenção das raízes e perpetuação da agremiação” (GORDO; SILVA, 2017, p. 178).
Portanto, os cursos, as oficinas, os processos de criação desenvolvidos pela escola
constituem ações intensas “que congregam as pessoas fortalecendo os laços identitários
delas com a escola de samba a que pertencem (Idem).
Nas ações da escola, como ensaios e arrastões culturais, as crianças eram presença
certa, com seus corpos em fase de crescimento; o esforço para segurar um instrumento
como o surdo, de dimensões avantajadas, provocava desequilíbrio e alguma dificuldade
para movimentar-se, porém, nada disso tirava delas, das crianças-brincantes, a vontade
de estar no meio da folia com os adultos. No período em que estivemos acompanhando a
escola observamos que na bateria a “criança e o adolescente vêm pra dentro da escola
pra ele aprender não só a música, mas [...] pra ele aprender a respeitar o próximo e ter
compaixão com o próximo. Isso ai já é uma coisa que contribui demais no seu
desenvolvimento” (ENTREVISTA CONVERSADA, 30/01/2020), ressalta Mestre Mini.
Na batera Audaciosa, como alguns denominam a bateria da escola, a
espetacularidade dos ritmistas crianças se mostram nos “efeitos e gestos [...] envolvidos
pelo padrão cultural (ethos) que suscita as formas de sua sensibilidade, a gestualidade, as
atividades perceptivas, e desenha assim o estilo de sua relação com o mundo” (LE
BRETON, 2012, p. 8), corroborando para a compreensão da espetacularidade como única
de cada criança-brincante, ou melhor, a relação que os sujeitos estabelecem com o mundo
é exclusiva, o que implica na maneira como a espetacularidade emerge em cada corpo,
como podemos comprovar nas imagem que se seguem.

Imagem 6 (sequência de imagens) – Crianças e adolescentes, ritmistas da Bateria


Audaciosa da Bole-Bole.
Fonte: Simei Andrade, 2019/2020.

O ritmo pulsante que a bateria de uma escola de samba produz e leva para a rua
estimula as crianças a participarem ativamente do carnaval. Handrei Serrão Barbosa, 11
anos, ritmista da escola, afirma que toda a movimentação que o carnaval provoca no
bairro dá “um ânimo pra sair na avenida” (CONVERSA INFORMAL, 6/02/2020).
Corroborando com a afirmação de Handrei Serrão, Vetinho Martins assevera que “aqui
tem aquela coisa das crianças ficarem maravilhadas com o ritmo, com o grupo. Eles
ficam, será que eu posso? Aí de repente o instrutor, o Fabrício, diz: pode! Aí pega esse
chocalho aqui e bora vê, a gente vai ensinando” (ENTREVISTA CONVERSADA,
20/03/20202). Esse conjunto de ideias, das pessoas que fazem a Bole-Bole, reafirma o
que Maffesoli (1996) anuncia que o espetáculo, no nosso caso o carnaval, assegura uma
função de comunhão, todos compartilham seus saberes e unem forças para mudança
social do bairro do Guamá.
A espetacularidade, mesmo sendo própria de cada sujeito social, só terá sentido
“quando relacionada ao conjunto de dados da simbologia própria do grupo social” (LE
BRETON, 2012, p. 9) no qual está inserida.
Durante a pesquisa de campo observamos que crianças menores de 5 anos, nas
imagens que se segue temos Lívia Sophia Lima Alencar, 4 anos e Aylla dos Santos Silva,
4 anos, que não faziam parte da bateria da Bole-Bole, se encantavam com os instrumentos
e com o som provocado pelas batidas, principalmente do surdo; eram irmãos, filhos,
sobrinhos dos ritmistas ou vizinhos da escola. Bastava os instrumentos serem colocados
à vista de seus olhos para que corressem para perto deles. Seus corpos tão pequenos se
tornavam ainda menores diante do tamanho dos instrumentos, o sorriso estampado era o
primeiro sinal indicativo de estarem participando do carnaval, as mãos iniciavam a
descoberta do objeto, em pouco tempo deles se apropriavam e o corpo, na sua totalidade,
exibia um percussionista com muitas habilidades; “este participar alimenta a sensação de
pertencimento e também instrumentaliza a criança para que em outro momento possa
utilizar estes saberes em outras ocasiões” (AIRES NETO, 2016, p. 111). As imagens a
seguir alicerçam nossos argumentos.

Imagem 7 – O encantamento das crianças, Lívia Sophia Alencar e Aylla dos Santos
pelos instrumentos de percussão.
Fonte: Simei Andrade, 2019.

A bateria, como uma das alas mais concorridas pelas crianças, tem suas
singularidades e particularidades que arrebatam as crianças-brincantes, mesmo aquelas
que não estão oficialmente na bateria. Segundo normas de proteção à criança, não é
permitida a presença de menores de 12 anos no desfile na avenida do samba, o que gera
certa frustração nessas crianças, como explica Margarida (Guida) Gordo11: “a gente tem,
por exemplo, um problema sério, todo ano com a bateria, que é pegar autorização pra
menor, tudo isso é empecilho, por que a autorização é a partir de 12 anos, a gente já
deixou crianças frustradas aqui, chorando por que não ia desfilar na Bole-Bole.”
(ENTREVISTA CONVERSADA 30/01/2020).
Mesmo que não possam participar oficialmente, encontraram outra forma de
“fazerem parte” da bateria da Bole-Bole. Acompanhavam a escola, nos arrastões e ensaios
na sede com seus instrumentos, os tamborins, se colocando sempre ao lado do grupo, fora
da ala. Elas seguiam os comandos do mestre de bateria, aprenderam os compassos e
executavam o samba enredo com maestria.
As crianças-brincantes, de certa maneira, desacatam as regras estabelecidas
socialmente, ao que Arenhart (2007) chama de transgressão. Em seus estudos, a autora
levanta o seguinte questionamento: por que as crianças transgridem? Ela nos responde,
afirmando que as crianças buscam satisfação no tempo hoje, imediato, sem levar tanto
em consideração os motivos de causa e efeito que estão centrados na lógica do adulto;
desse modo, a transgressão é a saída encontrada por elas para vivenciar essa satisfação do
tempo presente. Ao “desobedecerem” às regras impostas pelos adultos, as crianças
estabelecem com outros atores sociais a possibilidade de fazer diferente daquilo que o
sistema lhes impõe, além de construírem as culturas infantis.
Duas delas acompanhavam a escola com seus tamborins, as baquetas serviam para
bater em vários lugares e objetos para dali tirarem algum tipo de som que possibilitasse a
contagem do tempo do samba, “o tempo é intimamente ligado ao ritmo e aqui a criança
aprende a observá-lo e acompanhá-lo apara depois ter o domínio do instrumento e do
samba” (AIRES NETO, 2016, p. 111).
O tempo e o ritmo passam da oralidade para a corporeidade, a criança-brincante
“bate a baqueta no corpo, repete a contagem em voz baixa, bate com as mãos, com os pés
e, aos poucos, o próprio corpo vai encontrando o ritmo, vai incorporando-se a magia do
carnaval” (Idem), como nos mostram as imagens de Gustavo Xavier da Silva, 6 anos e
Enzo Gabriel Hervey e Sousa, 4 anos a seguir:

11
Margarida do Espírito Santo Cunha Gordo, 48 anos, Profª da EAUFPA, faz parte da direção da Bole-
Bole. Está na escola desde 1993.
Imagem 8 – As crianças-brincantes, Gustavo Xavier e Enzo Gabriel Souza, e seus
tamborins contagiantes.

Fonte: Simei Andrade, 2019/2020.


Um dos eventos da Bole-Bole que acompanhamos foi o desfile oficial em 2019,
na Aldeia Amazônica, noite que foi marcada por um acontecimento de suma importância
para este estudo, que trata da espetacularidade da criança na cena carnavalesca, sendo
necessário o registro neste ensaio.
As crianças-brincantes estão sempre ávidas a conhecer e interagir com pessoas e
objetos, desde que lhes chame a atenção, não importando em que lugar, em que momento
ou a quem pertença, elas vão buscar conhecer, sentir, ver, ouvir. Na imagem a seguir,
várias crianças, entre 4 e 7 anos, em plena avenida do samba, no momento da
concentração, em que alguns integrantes da bateria da Bole-Bole iniciam a afinação dos
instrumentos, crianças se deslocam de vários pontos e observam concentradas os acordes
da bateria.
Após esse breve ensaio, os instrumentos são deixados na via até que de fato o
desfile comece; nesse momento as crianças vão se aproximando dos instrumentos de
maneira tímida, talvez receosas de serem repreendidas; aos poucos vão se chegando e se
concentram em um instrumento musical, o surdo, aquele que foi deixado no chão e não
há ninguém cuidando dele. As pequenas mãos começam a sentir, a acariciar o
instrumento, à medida que percebem que nenhum adulto os repreendeu por estarem ali,
as cinco crianças se sentem à vontade para manusear aquele objeto. Elas dão batidas leves
e fortes, com cada uma tendo sua vez de bater no instrumento; conseguem conversar entre
si, depois todas juntas produzem um som só, como se estivessem criando outra música,
que só elas podiam ouvir e compreender. “O corpo se organiza para o espetáculo por meio
de um sistema de signos que define as possibilidades expressivas do corpo nas
manifestações culturais” (GOMES, 2007, p. 175).
Os corpos das crianças se movimentam em todos os sentidos, as mãos
freneticamente sobem e descem, os pés marcam a batida no chão, é “a junção de corpo e
instrumento” (AIRES NETO, 2016, p. 114). Considera ainda o autor que o corpo da
criança-brincante é um “instrumento de aprendizagem e comunicação” (Idem, p. 130).
Observe-se que as crianças, com exceção de uma que se veste de super-herói, não
estão caracterizadas com roupas que lembrem carnaval, embora estejam num ambiente,
dentro do espaço da bateria, em que todos vestem uma fantasia, mas nem por isso se
sentem envergonhadas ou tímidas, pelo contrário, a imagem mostra a interação do grupo.
Neste sentido, Del Priore (2000, p. 73) destaca que “a infância é expectadora dos festejos,
mas neles entra também como protagonista”.
Imagem 4 – Crianças na avenida do samba, junção de corpo e instrumento.

Fonte: Simei Andrade 2019.

As crianças criam outras lógicas para viverem as infâncias, são capazes de


(re)criarem outros mundos, da fantasia, da imaginação, do brincar... que dão sentido à
vida.
Na Bole-Bole, as crianças-brincantes estão presentes em todos os espaços,
incluindo aquele à frente da bateria da escola de samba, como rainha. É neste lugar que
encontramos Tharcylla Caroline Matos Monteiro, uma menina de 6 anos, participante dos
eventos e ações da Bole-Bole, filha e neta de pessoas envolvidas nos trabalhos da sede e
do barracão; é uma brincante simpática, risonha, falante, e ao som dos primeiros acordes
dos tambores seu corpo se mexe num frenesi só. Observamos que Tharcylla Caroline
imprime em seus movimentos gestos que imitam os da rainha da bateria. Nos arrastões
culturais, momento dos ensaios, em que a bateria da escola puxa uma multidão de pessoas,
ela sempre ficava próximo à rainha, que a convidava, algumas vezes, a dançarem
conjuntamente na frente da bateria.
Na representação fotográfica, Tharcylla Caroline se mostra com a
espetacularidade de uma rainha coroada, como demonstra sua postura corporal: tronco
levemente para frente, braços abertos, pés em posição de quem está pronta para o samba
e com um leve sorriso que demonstra que aquele lugar lhe faz bem. O mais interessante
é que esta criança-brincante está no meio da bateria, no meio dos instrumentos, portanto,
no espaço da animação, de levar alegremente o samba, não deixando o compasso cair;
neste sentido “o corpo é aqui o veículo, a estrutura para a experimentação da criança”
(AIRES NETO, 2016, p. 111). A ludicidade está aí presente, nos modos de brincar e
experimentar o carnaval, nos saberes que as crianças vão incorporando e ressignificando,
como podemos observar a seguir:

Imagem 9 – Rainha de Bateria, Tharcylla Caroline, um mundo aos seus pés.

Fonte: Simei Andrade, 2020.


As crianças-brincantes produzem formas de comportamentos espetaculares que
“expressam a maneira de ser, de se comportar, de se apresentar de forma distinta do
cotidiano’ (GOMES, 2007, p. 61), o que se constitui numa espetacularidade associada ao
mundo lúdico das crianças nas tradições culturais.

Olha aí sou eu: o desenho como produção simbólica da criança


O desenho como expressão simbólica da criança se constituiu num importante
instrumento de compreensão de sua espetacularidade na cena carnavalesca. Sarmento
(2011) considera que o desenho feito pela criança não representa somente a realidade que
lhe é exterior, mas conduz “no gesto que a inscreve, formas [...] de apreensão do mundo”
(SARMENTO, 2011, p. 29). Neste sentido, o desenho produzido por crianças é de uma
abrangência sociológica que as considera sujeitos concretos e quando desenham
mobilizam “saber, vontade, capacidade físico-motora, destreza técnica, emoções e afectos
que identificam o sujeito como realidade singular e como produtor cultural único” (Idem).
As experiências humanas só se efetivam de fato quando são expressas, diz Bião
(2009). Continua o autor afirmando que “Não há expressão sem experiência, nem há
experiência sem expressão” (p. 126). Nessa continuidade, durante a pesquisa de campo
foi oportunizado às crianças-brincantes se expressarem por meio de desenhos que
fizessem relação com aquilo que vivenciavam no carnaval. Considerando que o desenho
da criança nos conta fatos de sua vida, diz de seus modos de se relacionarem com a
dinâmica social dos espaços geográficos onde estão imersos, foi possível trazer a
produção simbólica de como se percebem no contexto carnavalesco. Assim, o desenho
que se segue, de Geovana Pinho, 12 anos, traz traços de uma menina que está passando
da fase de criança para a adolescência, considerando o que diz o Estatuto da Criança e do
Adolescentes (ECA, 1990)12. Seus traços carregam a história de uma porta bandeira
mirim que, imbuída das culturas populares, faz um auto desenho; aquilo que ela expressa
são componentes sociais, ou seja, “testemunhos singulares de uma cultura que se exprime
na materialidade dos produtos em que se comunica” (SARMENTO, 2011, p. 36).
Geovana traz uma expressão repleta de experiências, construída e vivenciada na
Bole-Bole, mostrando os ritos e as rotinas cotidianas vividos, porém de maneira reflexiva,
o que “ocorre quando se quebra o fluxo desses ritos, quando algo extraordinário acontece”
(BIÃO, 2009, p. 127).

12
O ECA em seu art. 2º discorre que “considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos
de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade” (BRASIL, 1990).
Figura 1 – Desenho como produção simbólica da criança. Feito por Geovana Pinho,
Porta Bandeira Mirim da Associação Carnavalesca Bole-Bole.

Fonte: Coleta de dados (2020).

Neste ato de desenhar o seu rosto, Geovana revela aspectos da espetacularidade que
se traduz no adorno da cabeça, na pintura do rosto, num olhar marcante, numa produção
elaborada para o olhar do outro, daquele que irá apreciar seu desenho. Embora apresente
apenas uma parte de um corpo espetacular, a cabeça, a imagem diz muito, pois se mostra
em interação com o mundo (BAKHTIN, 1987).

Mãe preta, me leva! No teu colo me ajeita, me deleita o teu amor! O cuidado com as
crianças
O cuidado dos pais e ou responsáveis com as crianças é perceptível em qualquer
evento carnavalesco no bairro, de vez que elas nunca estão sós, há sempre um adulto ao
redor. Em todos os lugares (quadra, arrastões, eventos, ensaios etc.) as crianças estavam
acompanhadas de perto por algum membro do seu convívio familiar, embora tenhamos
observado que em grande parte dos eventos eram as mulheres cuidadoras dos menores
(avó, mãe, tia, prima, madrinha, irmã). Sobre esse aspecto, Chodorow (1990) alista dois
fatores: o primeiro está relacionado à proximidade espacial, parentes morando achegados
ou no mesmo espaço, o que possibilita que os cuidados com as crianças sejam
compartilhados. O segundo fator diz respeito ao fato de mães biológicas, por motivos
diversos, não estarem com seus filhos; neste caso, outras mulheres, e não homens,
assumem seu lugar.
Outro aspecto importante diz respeito aos cuidados alimentares a elas dispensadas
pelos responsáveis durante os eventos (arrastões, ensaios e desfiles), lanches e líquidos
(água, sucos, refrigerantes), além de picolé e chopinho (também chamado de geladinho)
eram oferecidos a todo tempo às crianças. O cuidado vinha desde a preparação e
embalagem dos alimentos e das garrafinhas de água e sucos em casa, levados em mochilas
e sacolas, carregadas pelos adultos, contendo também toalha, sombrinha e boné. Tudo
para que as crianças pudessem brincar o carnaval e se alimentar com menos ricos à saúde
e os pais gastarem menos com elas na rua. Neste sentido, Palheta (2012, p. 24) salienta
que “as mães carregavam sacolas com sanduiches de pão e queijo cuia e pão com
picadinho (carne moída), além de sombrinhas e plásticos, por conta da chuva sempre
presente no carnaval de Belém”. As imagens que seguem mostram que crianças e adultos
estão juntos e conectados, constituindo partes de um todo dessa dinâmica social brincante:

Imagem 10 – Responsáveis carregando alimentos e água para nutrição dos menores


durante os arrastões no bairro do Guamá.
Fonte: Simei Andrade, 2019/2020.

As imagens estão carregadas de elementos demonstrando que o alimento


oferecido no decorrer dos eventos às crianças não é somente um modo de refrescar a sede
ou aliviar a fome, mas nesse ato está a “teatralidade do servir, da convivialidade [...]”
(LIMA, 1998, p. 74), ou seja, a possibilidade do diálogo, do companheirismo, da
participação ativa do adulto na vida dos menores e vice-versa, além da afetividade que a
ação proporciona.

No Bole-Bole em fantasia eu vou renascer: conclusões do estudo

O estudo teve por objetivo compreender a espetacularidade da criança-brincante


na cena carnavalesca em Belém do Pará. Neste sentido, as conclusões a que esta
investigação chegou foram para além da espetacularidade das crianças-brincantes na cena
carnavalesca, pois buscou trazer para este contexto científico as relações que elas
estabelecem com o meio ambiente, com seus pares, com os adultos, com a família e com
seus brincares, dando outro sentido à cultura popular e às culturas infantis.
Os resultados mostram que a Etnocenologia se constitui num método de pesquisa
que respondeu com maior efeito às nossas expectativas no sentido de compreender a
maneira como as crianças expressam suas vivências corporais e trazê-las a outro patamar
– o de atores sociais que (re)constroem suas histórias, inseridos numa dada cultura que
influenciam e pela qual são influenciadas. Na pesquisa com crianças, a Etnocenologia se
mostrou um método que se abre para analogias, aproximação de ideias e noções, o que
possibilitou a percepção de que no carnaval existem os saberes que as crianças trazem do
convívio social e outros são apreendidos nos encontros dos quais elas participavam na
Bole-Bole, saberes sobre ritmo, sobre dança, sobre o corpo, sobre amizade, sobre respeito,
sobre ética, sobre política, sobre a vida que se traduz nas espetacularidades que as
crianças-brincantes mostram no carnaval e que são incorporados na sua existência de
sujeito amazônida, que vivencia uma infância urbana no bairro mais populoso da capital
paraense.
As crianças chegam ao espaço da escola de samba levados pelos adultos (pais,
avós, tios, padrinhos, irmãos, primos e vizinhos) e a todo instante são por eles observadas,
nunca ficam sozinhas na sede, nos cortejos culturais, nos ensaios e até mesmo no desfile
oficial quando são levadas à avenida do samba, a Aldeia Amazônica. Embora a presença
de um adulto seja uma constante a sua volta, isso não as impede de brincar, dançar, cantar
e interagir com outras crianças e adultos, possibilitando que elas exerçam o direito
inalienável de serem livres e viverem suas infâncias de forma plena.
Outro ponto importante que o estudo mostrou está relacionado ao espaço que as
crianças-brincantes ocupam na cultura popular do bairro do Guamá. Apresentam-se não
apenas como brincantes, mas fazem parte, de alguma forma, da organização desses
eventos, embora seu trabalho seja quase imperceptível aos olhos dos adultos. Elas opinam
de forma tímida, dão ideias sobre os assuntos que chamam a atenção, como o figurino,
uma batida diferente para dar ao som do samba, uma pegada mais intimista; estão sempre
à disposição quando solicitadas para alguma tarefa (recados para alguém, pequenas
compras, buscarem encomendas ou alguma pessoas em casa), disponibilizam tempo para
ensinar o que já aprenderam àqueles que ainda estão no estágio inicial da aprendizagem
dos instrumentos musicais, mostrando a batida do som e como isso reverbera no corpo,
na espetacularidade.
Apesar de exercerem funções estratégicas nessa estrutura gigantesca que é o
carnaval, os adultos limitam suas participações ativas e na maioria das vezes, não levam
em conta suas opiniões, escolhas, desejos e seus modos brincantes e espetaculares; ainda
assim as crianças-brincantes conseguem subverter a ordem de que nada sabem. Por meio
de suas culturais infantis associadas às culturas populares elas mostram que têm muito a
nos ensinar, principalmente como ser protagonista da sua própria história que se agrega
às culturas por elas vivenciadas em determinados espaços geográficos; mesmo sendo
criança em um universo adulto que pouco valoriza e respeita as culturas infantis elas
subvertem a lógica adultocêntrica e de maneira sábia colocam em prática seus modos de
SER e ESTAR no mundo, ressignificando seus modos de vida e dando outros sentidos à
cultura popular e (re)criando as culturas infantis.
O estudo também mostrou o quanto as crianças estão presentes nos eventos
relacionados ao carnaval; de maneira participativa, lá estavam elas na apresentação do
samba enredo, nos ensaios da bateria, nos arrastões culturais pelo bairro do Guamá, na
feijoada da comunidade, e até mesmo nas festas à noite na quadra da escola, levadas pelos
adultos, ainda que no meio da festa caíssem no sono. Nos momentos em que estavam nos
eventos, as crianças brincavam, dançavam, imitavam a madrinha da bateria, o mestre-sala
e porta-bandeira, o mestre de bateria, e exibiam o melhor de sua espetacularidade. Neste
sentido, os saberes das crianças, advindos de suas culturas infantis são vivenciados de
forma plena no carnaval; há um entrelaçamento entre a cultura do carnaval e as culturas
infantis, elas demonstram, por meio de seus saberes, respeito a sua história, ao local onde
vivem, à visão do mundo na qual estão inseridas e aos seus modos particulares de vida.
A espetacularidade das crianças-brincantes é marcada pela desenvoltura com que
brincam o carnaval, a ludicidade se constitui elemento singular nesse processo, em que
não há consenso de ideias, ou rotinas estabelecidas, será desta ou daquela forma, mas tudo
são descobertas prazerosas e o corpo se mostra uma totalidade aberta. Nesse sentido, a
espetacularidade das crianças-brincantes não pode ser compreendida apenas pelo corpo
(os gestos, o modo de se vestir, de se alimentar, os hábitos...), mas também pelos valores
e símbolos da expressão cultural das crianças do bairro do Guamá, da Bole-Bole.

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