Você está na página 1de 7

( 15 (

Capítulo 1
Características Gerais da
Cafeicultura no Estado do Acre

Claudenor Pinho de Sá
Celso Luis Bergo
Michelma Neves de Lima
Ozanira Ferreira
( 16 (
Introdução exportado pelo agronegócio, ficando
atrás do complexo soja, carnes, produtos

A s maiores produções de café do


Brasil estão nos estados de Minas
Gerais, Espírito Santo, São Paulo, Bahia,
florestais e sucroalcooleiro. Na região
Norte, Rondônia é o maior produtor com
84.734 toneladas, seguido pelo Acre
com uma produção de 2.229 toneladas
Rondônia, Paraná e Goiás (IBGE, 2015). (IBGE, 2015). No Estado do Acre a
atividade tem importância pelo potencial
No período entre 2005 e 2012, a produção produtivo, sendo economicamente viável,
de café no Brasil aumentou 42%, e pela condição de agregação de valor ao
crescendo a uma taxa aproximada de 5% produto, além da expressiva capacidade de
ao ano (IBGE, 2015), entretanto, entre geração de emprego no campo.
2012 e 2015, apresentou uma retração
anual de 13% (IBGE, 2015). Entre 2005 Registros antigos relatam que já na década
e 2015, o consumo per capita no Brasil de 1930, Cruzeiro do Sul e Mâncio Lima
cresceu a uma taxa de 1,8% ao ano e no produziam e exportavam café para alguns
mesmo período as exportações brasileiras municípios do Amazonas. Após 1944
aumentaram a uma taxa de 1,4% ao ano. houve um declínio dessa cafeicultura
Em 2015 o consumo per capita foi de tendo como principal causa a corrida
4,90 kg/habitante por ano de café torrado para a extração do látex por parte dos
e moído, o equivalente a 20,5 milhões de rurícolas do Juruá, por ocasião do advento
sacas. Segundo dados do Ministério da da 2ª Guerra Mundial (Oliveira, 1981).
Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Ainda segundo esse mesmo autor o
em 2015 foram exportados 37,1 milhões desenvolvimento e a expressividade da
de sacas de 60 kg. Nesse sentido, o café cafeicultura no Acre ocorreram a partir de
contribuiu com U$$ 6,1 bilhões na geração 1976, quando a Secretaria do Fomento
de divisas na balança comercial, com uma Econômico distribuiu cerca de um milhão
participação de 6,9% no agronegócio de mudas de café das variedades Catuaí e
brasileiro (Associação Brasileira das Mundo Novo a produtores financiados pelo
Indústrias de Café, 2015). Em 2017, o Banco do Estado do Acre (Banacre).
consumo interno de café foi estimado em
21,5 milhões de sacas, precedido apenas Porém, a maior expansão da área cultivada
pelos Estados Unidos que consomem em ocorreu a partir de 2001, alcançando
torno de 25,8 milhões de sacas (Ferreira; 4.598 ha em 2004. Esse crescimento foi
Santos, 2018). atribuído ao apoio financeiro, por meio
do crédito, especialmente pelo Programa
A cafeicultura brasileira se destaca Fundo Constitucional do Norte (Santos,
como uma atividade econômica geradora 2001).
de divisas, sendo o quinto item mais
( 17 (
Na série histórica das áreas cultivadas épocas de preços baixos (Santos, 2008).
com café no Estado do Acre, no período Também contribuiu para essa redução a
de 2001 a 2010 (Figura 1), nota-se um forte estiagem em 2005, especialmente
declínio acentuado da área plantada de no setor sudoeste do Amazonas, atingindo
4.598 hectares em 2004 para 1.271 o Estado do Acre (INPE, 2005). Nessas
hectares em 2010, representando uma regiões as consequências da estiagem
redução de 72,4% (IBGE, 2015). foram severas para as áreas cultivadas
com café, com grande mortalidade de
Os fatores desse decréscimo foram as
plantas, baixa produtividade e destruição
flutuações cíclicas dos preços do café no
de lavouras pelas queimadas (Miranda et
mercado que resultaram no abandono das
al., 2006; Gonzaga, 2010).
lavouras pelos pequenos produtores nas

Figura 1. Evolução da área cultivada com café (ha) no período de 2001 a 2010.
Fonte: IBGE (2015).

No Acre os municípios mais afetados inicial foi a implantação de 1.000 hectares


pelas queimadas foram Sena Madureira, com a cultura do café com cultivares
Bujari, Porto Acre, Acrelândia, Rio Branco, melhoradas de Canéfora, visando ampliar
Senador Guiomard, Plácido de Castro, a área plantada. A evolução da área
Capixaba até Xapuri, Brasileia e Assis cultivada com café no período de 2011 a
Brasil, que possuem as maiores áreas 2015 é observada na Figura 2. Dezesseis
plantadas com café. dos 22 municípios do Acre cultivam café
e Acrelândia detém mais de 60% da área
A partir de 2012, com a evidência de bons
total cultivada no estado, apresentando
preços do café nos dois últimos anos, o
as maiores médias de produtividade
governo do Estado do Acre em parceria
(IBGE, 2015). Em 2016 foi observada
com produtores, instituições bancárias,
uma queda na produção de 2,69% em
de pesquisa e de extensão rural vêm
relação a 2015, passando de 2.229 para
estruturando um programa estadual de
2.169 toneladas de grãos beneficiados. O
fomento à cafeicultura no Acre. A meta
Acre apresenta a maior produtividade de
( 18 (
café Canéfora da região Norte com média em sua maioria, pequenos produtores,
de 26 sacas de café limpo por hectare, uma vez que 84% das propriedades
além de ocupar a 3ª posição no ranking que produzem café não ultrapassam 10
nacional em 2015, sendo superado apenas hectares (Gonzaga, 2010).
pelos estados da Bahia e São Paulo, com
produtividades de 34 e 29 sacas por A preferência pelo café Canéfora no Acre
hectare respectivamente. ocorre porque existem características
climáticas do estado favoráveis para o seu
O café mais cultivado comercialmente no desenvolvimento e a colheita se inicia mais
Brasil é o da espécie Coffea arabica, com tardiamente (a partir de maio) coincidindo
cerca de 77% da produção nacional, e com o período de estiagem. No caso do
Coffea canephora, conhecida popularmente café Arábica a colheita ocorre ainda no
como “Conilon” ou “Robusta” e que neste final do período chuvoso, dificultando a
livro será chamada de Canéfora, com 23% secagem dos grãos em terreiros, haja vista
(IBGE, 2016b). No Acre, a totalidade dos que os pequenos produtores não dispõem
cafeicultores cultivam o Canéfora e são, de secadores.

Figura 2. Evolução da área cultivada com café (ha) no período de 2011 a 2015.
Fonte: IBGE (2015).

Com a ampliação da área de cultivo A população do Acre em 2014 era de 793


ocorreu aumento da oferta do produto no mil pessoas com projeção calculada para
mercado interno, exigindo maior análise 2015 de 810.763 habitantes (População...,
do comportamento do mercado, ou seja, 2014). Assim, pode-se estimar, com base
estimar o consumo mínimo no estado na metodologia de Freitas (2011), que
e fazer algumas considerações sobre a o consumo mínimo e máximo de café
quantidade de café importado em grão torrado e moído, com 5% de umidade,
verde e café torrado e moído. é de aproximadamente 2.959.285 kg e
5.918.570 kg, respectivamente. Esses
( 19 (
valores correspondem a aproximadamente praticados são superiores em
56.367 e 112.735 sacos de 60 kg de café aproximadamente 50% aos do café
beneficiado. Canéfora. Isso pode viabilizar os
investimentos em infraestrutura de
A produção acriana de café beneficiado secagem para proporcionar uma melhor
em 2015 foi de 37.150 sacos de 60 kg de qualidade do café.
café Canéfora em grão verde, valor bem
abaixo do consumo estimado acima (IBGE, No comércio varejista de Rio Branco,
2016a). Dados da Secretaria da Fazenda Acrelândia, Senador Guiomard e Plácido
Estadual do Acre, também referentes ao de Castro foram identificadas 13 marcas
ano de 2015, mostram uma importação de café produzidas no Acre, com preços
de aproximadamente 5.500 e 2.592 sacas mais acessíveis ao consumidor final,
de 60 kg de café Canéfora e Arábica, quando comparados com os das marcas
respectivamente. importadas de outros estados. Esse fato
provavelmente contribui para preferência
Usualmente o café Canéfora é utilizado dos consumidores por marcas locais.
em blends, ou seja, misturado com o
Arábica na composição da produção de A produtividade do café no Acre é uma
café torrado e moído pelas torrefadoras, das maiores entre os estados produtores
assim como na produção de café da região Norte, fazendo com que as
solúvel no qual o Canéfora tem maior empresas de torrefação do Acre comprem
participação. O Canéfora em blends tem a matéria-prima a preços menores, quando
crescido nos últimos anos no mercado comparados com os preços praticados
nacional e de acordo com o Conselho dos pelos cafeicultores de Rondônia por
Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) exemplo. Observa-se que os cafeicultores
esse crescimento está em torno de 50% do Acre recebem uma remuneração
a 55%, superando os 20% dos 12 anos compatível com o custo de produção,
anteriores (Castro, 2013). Já a Associação não comprometendo a atividade, fato
Brasileira da Indústria de Café (Abic) que oportuniza a agroindústria do Acre
calcula que a participação do Canéfora a concorrer no mercado local, com
alcança cerca de 40%. No Acre esse possibilidades de expansão.
percentual é bem maior do que os citados
acima, em razão da baixa produção e Assim, a cafeicultura no Acre apresenta
importação do café Arábica. perspectiva de crescimento, respaldada
pelo incentivo à expansão da área de
A expansão de novas áreas de café cultivo, assim como incremento da
Arábica representa uma grande produção e da produtividade com base
oportunidade para os cafeicultores na introdução de novas cultivares com
acrianos, uma vez que os preços alto potencial produtivo a exemplo das
variedades clonais.
( 20 (
Apesar da superioridade das variedades município mais apropriado para o cultivo
clonais em produtividade e qualidade final do Canéfora. É bem provável que novos
na produção em relação às cultivares plantios estejam em áreas inapropriadas,
propagadas por sementes (Bragança et e o Zoneamento edafoclimático para
al., 2001), a quase totalidade dos novos o cultivo do café Canéfora no Acre,
plantios de Canéfora no Acre é feita com ora proposto, poderá minimizar tais
mudas oriundas de material seminal, ou imprecisões.
seja, via sementes melhoradas. Embora a
utilização de mudas oriundas de sementes
possa ser justificada, principalmente para Referências
pequenos agricultores, por apresentarem
maior estabilidade de produção (Fonseca ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS
et al., 2008), a tendência é que plantios INDÚSTRIAS DE CAFÉ. Indicadores
futuros sejam realizados com mudas da indústria de café no Brasil. 2015.
clonais de materiais superiores já testados Disponível em: <http://www.abic.com.
no Acre. Será uma alternativa para br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.
superar a desuniformidade apresentada htm?sid=61>. Acesso em: 6 jun. 2016.
por lavouras oriundas de sementes,
pois a propagação vegetativa do café BRAGANÇA, S. M.; CARVALHO, C. H.
Canéfora mantém as características S.; FONSECA, A. F. A.; FERRÃO, R. G.
genéticas da planta mãe, o que garante ‘Emcapa 8111’, ‘Emcapa 8121’, ‘Emcapa
a homogeneidade da lavoura. Com isso é 8131’: variedades clonais de café Conilon
possível obter precocidade de produção, lançadas para o Estado do Espírito Santo.
altas produtividades, maior tamanho de Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 36,
frutos, maior uniformidade de maturação n. 5, p. 765-770, 2001.
dos frutos e melhor qualidade do grão
(Espindula et al., 2015). CASTRO, D. S. de. Estima-se que o café
Robusta, estigmatizado pela qualidade
Ações nesse sentido, em parceria com a inferior, já seja usado em metade dos
Embrapa Rondônia e o Instituto Capixaba blends de cafés industrializados no Brasil.
de Pesquisa, Assistência Técnica e Fev. 2013. Disponível em: <http://
Extensão Rural (Incaper), vêm sendo www.afe.com.br/noticia/7689/uso-do-
realizadas no Acre com avaliações de cafe-conilon-em-blends-tem-crescido-no-
clones elite quanto ao seu valor de cultivo mercado-nacional>. Acesso em: 12 jul.
e uso tanto em cultivo irrigado como em 2016.
sequeiro.
ESPINDULA, M. C.; MAURI, A. L.;
Verifica-se que nos novos plantios RAMALHO, A. R.; DIAS, J. R. M.;
realizados no estado ainda persistem FERREIRA, M. das G. R.; SANTOS, M. R.
dúvidas quanto ao melhor solo, clima e A. dos; MARCOLAN, A. L. Produção de
( 21 (
mudas. In: MARCOLAN, A. l.; ESPINDULA, INPE. Seca na Amazônia em 2005.
M. C. (Ed.). Café na Amazônia. Brasília, Out. 2005. Disponível em: <http://
DF: Embrapa, 2015. p. 127-157. www.inpe.br/noticias/noticia.php?Cod_
Noticia=492>. Acesso em: 7 jun. 2016.
FERREIRA, L. T.; SANTOS, J. Brasil
consome 21,5 milhões de sacas de café MIRANDA, E. E. de; MORAES, A. V.
em 2017. 2018. Disponível em: <http:// de C. de; OSHIRO, O. T. Queimadas na
abic.com.br/brasil-consome-215-milhoes- Amazônia Brasileira em 2005. Campinas:
de-sacas-de-cafe-em-2017/>. Acesso em: Embrapa Monitoramento por Satélite,
10 fev. 2018. 2006. 19 p. (Embrapa Monitoramento por
Satélite. Comunicado técnico, 18).
FONSECA, A. F. A.; FERRÃO, R. G.;
FERRÃO, M. A. G.; VOLPI, P. S.; VERDIN OLIVEIRA, V. H. de; OLIVEIRA, V. H.
FILHO, A. C.; FAZUOLI, L. C. Cultivares de de. Histórico sobre o desenvolvimento
café Robusta. In: CARVALHO, C. H. (Ed.). da cultura do café no Acre. Rio Branco,
Cultivares de café: origem, características AC: EMBRAPA-UEPAE Rio Branco, 1981.
e recomendações. Brasília, DF: Embrapa 19 p. (EMBRAPA-UEPAE Rio Branco.
Café, 2008. p. 255-279. Documentos, 1).

FREITAS, M. L. G. Metodologia de cálculo POPULAÇÃO do Acre é de 790 mil


do consumo de café no Brasil, jul. 2011. habitantes, estima IBGE. Disponível
Disponível em: <http://www.coffeebreak. em: <http://g1.globo.com/ac/acre/
com.br/noticia/47909/Metodologias-de- noticia/2014/08/populacao-do-acre-e-de-
calculo-do-consumo-de-cafe-no-Brasil. 790-mil-habitantes-estima-ibge.html>
html>. Acesso em: 11 jul. 2016. Acesso em: 12 jul. 2016.

GONZAGA, D. S. de O. M. Agricultura SANTOS, J. C. dos; OLIVEIRA, M. A.


familiar e transferência de tecnologias: de; VEIGA, S. A. Diagnóstico tecnológico
o caso dos cafeicultores do Projeto de e socioeconômico do café no Acre. In:
Assentamento Dirigido Pedro Peixoto, SIMPÓSIO DE PESQUISA DOS CAFÉS DO
Acre. 2010. 142 f. Dissertação (Mestrado BRASIL, 2., 2001, Vitória, ES. Anais...
em Sistemas de Produção Agrícola Brasília, DF: Embrapa Café, 2002. v. 1.
Familiar) - Universidade Federal de Pelotas, 6 p.
Pelotas.
SANTOS, J. C. dos. Sustentabilidade
IBGE. Produção Agrícola Municipal 2015. socioeconômica e ambiental de sistemas
Disponível em: <https://sidra.ibge.gov.br/ de uso da terra da agricultura familiar
Tabela/1613#resultado>. Acesso em: 11 no Estado do Acre. 2008. 259 f. Tese
nov. 2016. (Doutorado em Economia Aplicada) -
Universidade Federal de Viçosa, Viçosa,
MG.

Você também pode gostar