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DISCURSO DE GOULART NO COMÍCIO DE 23 DE AGOSTO DE 1963 DO CGT PELO

ANIVERSÁRIO DA MORTE DE VARGAS (TRANSCRIÇÃO DO CORREIO DA MANHÃ)


(...)
Nada mais justo e democrático – salientou – do que a presença, também aqui, da mocidade estudantil de
nosso país. Os estudantes que confiaram em Vargas, que confiaram nos seus ideais porque confiam no
futuro do Brasil. O povo da Guanabara também aqui está e não se encontra sozinho nesta homenagem:
milhões e milhões de brasileiros prestam igualmente, nesta data, seu preito de gratidão e homenagem
àquele que, cada dia que passa, merece respeito e admiração da Nação.
Frisou, o Sr. João Goulart que só não entendem o sentido cívico desta homenagem aqueles que nada tem
do povo, que não acreditam no povo, que imaginam e idealizam um tipo de democracia sem povo e sem
trabalhadores – Mas, os que seguem Vargas – frisou – os que lutam pelos seus ideais, acreditam no povo,
somente aqueles que ainda vivem alimentando ódios e paixões podem pretender deturpar o alto sentido
cívico-democrático e popular desta extraordinária homenagem que a Guanabara presta a Getúlio Vargas.
Aqui estão os trabalhadores – continuou – para prosseguirem na caminhada encetada em 1930, com a
Revolução Industrial, e continuada em 1950, com a campanha pela emancipação, de que a Petrobrás é
símbolo vivo. Emancipação que se completará através das reformas democráticas, que, mudando as
estruturas arcaicas, alterando as estruturas obsoletas, irão atender melhor as reivindicações do povo,
disposto a transpor a barreira do subdesenvolvimento.
Assegurou o Sr. João Goulart que nada adianta uma grande indústria, em meio a um crescimento
populacional explosivo, se os brasileiros, principalmente do interior, não puderem adquirir aquilo que os
seus irmãos trabalhadores constroem e fabricam nas grandes cidades. De nada adiantaria uma poderosa
indústria têxtil, por exemplo – enfatizou –, se os trabalhadores rurais não pudessem vestir-se, como não
podem, pois apenas cobrem-se de trapos. Nada mais justo, nesta hora, que os trabalhadores
comparecerem a uma homenagem, para dizer também ao Presidente da Republica que desejam com
urgência que sejam transportadas para a realidade as reformas de base. Especialmente a reforma agrária
que constitui uma das aspirações mais legítimas, não apenas dos trabalhadores, mas de toda a Nação
brasileira. Disse mais: ao lado da reforma agrária que se impõe como imperativo para a tranqüilidade do
país, reclama igualmente a classe operária a reforma bancária, pois o crédito é patrimônio da Nação e não
poderia estar a mercê de interesses de grupos.
Em outro trecho, o chefe do governo afirmou que o comício constituía mais um brado de alerta àqueles
que se obstinam ainda a impedir a marcha da própria história, impedindo uma reforma reivindicada por
todo o povo brasileiro. Têm razão – assegurou - as figuras expressivas da política nacional e internacional
quando afirmam que aqui, na América Latina, ou se modificam as velhas e arcaicas estruturas que não
mais atendem aos imperativos do progresso e do desenvolvimento, e elas serão feitas praticamente dentro
da lei, ou correremos o risco de que a classe faça à margem da lei, pela vontade e pela disposição do
povo. Nada mais oportuno nesta data que o povo da Guanabara – que Getúlio Vargas tanto amou – venha
a esta praça para dizer-lhe “aqui estamos”, contra aqueles que imaginam que nós aqui não estivéssemos.
Estamos aqui, pacificamente, dando uma demonstração de que o povo brasileiro está mais politizado e
esclarecido do que imaginam aqueles que não acreditam no povo ou aqueles que não permitem que o
povo se manifeste. Aqui está o povo da Guanabara em uma vibrante demonstração democrática de
respeito e de fé, ante a memória de um homem que dedicou toda a sua vida ao povo, que viveu pelo povo,
que sofreu pelo povo e que morreu ao lado do povo. Neste dia – afirmou adiante – da homenagem que a
Guanabara presta a este grande e inesquecível líder, quero afirmar ao lado da Guanabara, parcela viva e
consciente do povo brasileiro, a certeza de que teremos forças e não nos faltará inspiração para
prosseguirmos na caminhada traçada pelo gênio imortal do grande presidente. É uma estrada que há de
nos conduzir ao Brasil que temos o dever de legar aos nossos filhos; ao Brasil aonde as riquezas nacionais
só pertençam ao povo brasileiro; ao Brasil aonde a vontade da maioria, a vontade do povo, seja o rumo a
seguir, para alcançar os altos destinos da nossa Pátria; ao Brasil, enfim, aonde todos possam se entender,
todos possam conviver, mas aonde todos possam também viver com dignidade.
Ainda há pouco – acentuou – um dirigente sindical afirmava que o povo não mais agüentava a elevação
do custo de vida. Na verdade, de nada adianta uma política artificial de combate aos efeitos da carestia,
quando as grandes causas estão nas estruturas arcaicas que não agüentam mais os impactos do
desenvolvimento. Há momentos ocupou esta tribuna o Governador do Rio de Janeiro, estado que, apesar
de possuir terras férteis, como por exemplo, na Baixada Fluminense, continua com a sua produção
desorganizada, sem que os camponeses tenham pedaços de terra, sequer para cultivar. O Estado do Rio é
um Estado hoje praticamente loteado pelos especuladores que exploram as dificuldades populares. É
inexplicável que os gêneros produzidos nas regiões mais afastadas do Brasil cheguem aos centros de
consumo por preços mais altos do que os gêneros que deveriam ser produzidos nestas mesmas áreas
férteis, ao lado dos grandes mercados manipulados pela especulação. Estas áreas, amanhã, terão de ser
postas a serviço da coletividade brasileira, pois é a própria Constituição da República que diz que a
propriedade deve ter finalidade social.
(...)

Fonte: Correio da Manhã, 24 ago. 1963.

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