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GETÚLIO VARGAS NA ÓTICA DO JORNAL O GLOBO (1953-1954)

O de Getúlio Vargas a presidência da república, na década de 1950, já foi


intensamente explorado pela historiografia. Sendo assim, não existe a pretensão de revisitar o
período de forma tradicional, pelo contrário, a partir de um corte específico, compreendido
entre agosto de 1953 e agosto de 1954, e da observação de um veículo de imprensa em
especial, tem-se o objetivo de apresentar novas perspectivas a respeito de um momento tão
complexo da História do Brasil.
A escolha do jornal O Globo como parâmetro para a análise do período proposto, leva
em consideração algumas características apresentadas que o colocaram em uma posição
singular frente a outros periódicos.
Conhecer a trajetória do jornal O Globo, a partir da sua origem, mostra-se fundamental
para compreender a narrativa construída pelo veículo, a respeito do presidente Getúlio
Vargas, e como ela mostrou-se longe de uma pretensa isenção defendida pela direção do
periódico como uma das suas principais virtudes.
Inicialmente, O Globo, tratava-se de um periódico vespertino, tendo posteriormente se
tornado matutino, fundado em vinte nove de julho de 1925. A tarefa coube a um triunvirato
composto por Irineu Marinho, antigo diretor do jornal A Noite1, Herbert Moses e Justo de
Morais. Segundo os dados coletados junto ao DHBB, a proposta do jornal era renovar os
padrões dominantes da imprensa carioca. O nome foi uma sugestão do jornalista Elói Pontes e
foi ratificado através de concurso popular.
Vale destacar as diretrizes propostas por O Globo para pautar a sua linha de atuação
expressa logo em seu primeiro número. Nas palavras de Irineu Marinho, “o dever ineludível
em que nos vimos de continuar a consagrar-nos, tanto quanto nos consinta a nossa reduzida
capacidade, à defesa das causas populares que nos empolgaram e nos dominam há (sic) bem
mais de duas décadas2”.
Ainda nesse número inaugural, houve uma preocupação por parte dos redatores em
deixar claro o posicionamento independente de O Globo em relação a qualquer tipo de
interferência externa. É nesse sentido que:

1
A Noite Jornal carioca diário e vespertino, fundado em 18 de junho de 1911 e extinto em 27 de dezembro de
1957.
2
Conforme Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro.
(...) O novo jornal declarava-se ainda totalmente independente, na medida
em que não desejava a intervenção de nenhuma força externa a seus próprios
quadros: isento de afinidade com governos, livre de interesses conjugados
com os de qualquer empresa, o jornal tampouco se ligaria a grupos
capitalistas ou a plutocratas isolados3.

Ao observar o trecho, percebe-se que, pelo menos como discurso externo, O Globo,
assumia um posicionamento de independência frente a qualquer tipo de pressão. Fazia questão
de exaltar uma pretensa neutralidade, em relação aos poderes constituídos, sejam de grupos
econômicos nacionais, ou ainda, da ação de interesses exteriores.
Não seria surpresa se essas diretrizes, ao longo dos anos posteriores, à fundação do
jornal, tenham sofrido alguma flexibilização. Dessa maneira, foram adaptando-se às
necessidades, sobretudo, econômicas que se apresentaram de acordo com a ocasião.
Como empresa privada, o jornal, tem por objetivo primário a evolução econômica do
negócio, onde o principal produto é a informação. Dessa forma, é possível entender que as
notícias publicadas cumpram um papel muito além de, apenas, informar aos leitores, existem
outras motivações envolvidas. Sendo assim, acreditar na neutralidade de O Globo na
transmissão de notícias seria uma atitude, no mínimo, ingênua.
O Globo esteve, desde sua fundação, integrado à nova tendência assumida pela
imprensa a partir do século XX, em que a informação submete-se ao negócio em si. O jornal
adotou um modelo de funcionamento que o transformava em uma empresa voltada, em
muitos sentidos, para a rentabilidade econômica. Dentro dessa perspectiva, a veiculação de
notícias assumia uma característica singular, convergindo para os interesses do próprio jornal,
muitas vezes, escalonando o noticiário de acordo com sua conveniência, longe então de uma
ideia de neutralidade na transmissão do noticiário. O novo panorama abriu espaço para outras
motivações, que concorreram para a obtenção de capitais destinados ao negócio que se
transformou o empreendimento jornalístico.
A ideia da informação como produto, que pode ser modelada de acordo com as
necessidades do negócio, ou de um sistema econômico específico, através da empresa
jornalística ganha maior sustentação a partir do entendimento de que,
(...) nas sociedades capitalistas modernas, o papel das comunicações está em
conectar o sistema produtivo, baseado na propriedade privada, ao sistema
político que pressupõe uma cidadania cuja participação social efetiva
depende, em parte, do acesso à maior gama possível de informação (1997 :
311). O problema estaria em equacionar como um sistema de comunicações

3
Conforme Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro.
dominado pela propriedade privada poderia garantir a diversidade de
informação requerida para uma cidadania efetiva4.

A nova imprensa, da qual o Globo fazia parte, estava conectada com esta nova lógica
para a transmissão de notícias, Sendo assim, sobre a pretensa neutralidade do jornal, é
possível deduzir tratar-se de uma artimanha, cujo objetivo seria conferir credibilidade, e
porque não dizer aceitação, para as posições defendidas pelo periódico. A isenção usada como
recurso para ressaltar que os direcionamentos assumidos, por O Globo, estavam além das
paixões políticas, logo, apenas voltadas para os interesses gerais da nação. Entretanto, basta
um olhar atento às edições do jornal para perceber o discurso de isenção apenas como
retórica. Talvez essa seja a principal singularidade encontrada no periódico, apresentar-se
como neutro, quando muitos jornais assumiam posições claras de acordo com suas afinidades
econômicas e políticas. Vender a imagem de isenção era bom para os negócios da família
Marinho.
A expressão “Família Marinho” ajuda a identificar O Globo como um veículo de
comunicação atrelado a uma família em específico. Irineu Marinho, co-fundador do jornal,
morreu pouco tempo depois de sua fundação, ainda em 1925, o que, a princípio, abriria
espaço para uma sucessão familiar para a direção do periódico, algo que na prática não
ocorreu. Em teoria seu filho mais velho, Roberto Marinho, seria o sucessor natural na
condução do jornal, mas diferente do imaginado, o jovem Marinho, só veio assumir a direção
do Jornal em maio de 1931, quando do falecimento de Eurícles de Matos5.
Durante esse hiato de tempo o herdeiro de Irineu Marinho não se afastou do jornal,
pelo contrário, exerceu outras funções dentro da estrutura do periódico como, por exemplo,
repórter e copidesque6. Antes de comandar o jornal, de fato, Roberto Marinho procurou
conhecê-lo melhor por dentro.
A atitude adotada por Roberto Marinho, de passar por diferentes setores do jornal
antes de assumi-lo, permitiu ao jornalista conhecer melhor a empresa que iria comandar no
futuro. O caminho seguido por ele vai de encontro ao raciocínio elaborado por Antônio
Gramsci, em que “seria preciso partir do princípio de que todo redator ou repórter deve ser
posto em condições de redigir e de dirigir todas as partes do jornal, assim como, de imediato,

4
SANTOS, 2006, p. 22.
5
Editor chefe do jornal , O Globo, que assumiu sua direção quando do falecimento de Irineu Marinho.
6
Segundo o Dicionário Houaiss, o copidesque seria uma espécie de “faz tudo” na editoração, ou seja, faria o
papel que normalmente se atribui ao revisor, ao preparador e também ao editor.
todo redator deveria adquirir as qualidades do repórter, isto é, dar toda sua atividade ao jornal,
etc...7“.
Roberto Marinho, seguindo a orientação recebida de seu pai e fundador do jornal,
Irineu Marinho, procurou traçar um perfil independente para o periódico, agora dirigido por
ele. Isso significava dizer sem maiores aproximações com os governos, mantendo assim, os
compromissos assumidos pelo jornal em seu primeiro número.
Todavia, a observância da diretriz não impediu que O Globo, através da ação firme de
Roberto Marinho, assumisse algumas posições fortes frente a certos acontecimentos,
inclusive, em algumas situações alinhando-se vigorosamente ao governo. A posição do jornal,
assim, era pendular, sempre de acordo com suas próprias convicções. Seria possível encampar
pautas governamentais, desde que elas não representassem risco aos interesses do jornal.
O Globo identificava-se como um jornal conservador em essência. Esta característica
mostrava-se evidente através de duas posições assumidas entre as décadas de 1930 e 1950.
A partir dos anos de 1930 foi desenvolvido um forte sentimento de oposição ao
comunismo, que se manteve presente e fortemente expresso nos anos posteriores. Tal
evidência pode ser comprovada a partir do trecho a seguir onde,
(...) Ao noticiar os levantes armados de 1935, o jornal O Globo, sob censura
como os demais órgãos da imprensa brasileira, mas de modo contrastante
com o tom sóbrio utilizado pelos demais periódicos, empregou, em suas
manchetes, expressões alarmistas de cunho claramente xenófobo, como
“invasão vermelha” ou “Moscou confessa”, divulgando que o Partido tinha
planejado uma revolta armada no Brasil, orientados e diretamente
influenciados pela Internacional Comunista8.

A forma de apresentação das notícias, relativas aos levantes armados de 1935,


evidenciam como o comunismo era visto por O Globo. Os termos utilizados, Além das
mensagens alarmistas, foram responsáveis por criar um clima, para os leitores, de profunda
aversão a tudo que estivesse relacionado à ideologia comunista, de certa forma apresentando
os brasileiros, defensores do comunismo, mais identificados com Moscou do que com o
próprio Brasil.

Na década seguinte, após a redemocratização, foi possível verificar como o jornal


comandado por Roberto Marinho aproximou-se, ideologicamente, de um dos partidos

7
Gramsci, 2001, p. 213.
8
VALENTINI, André Alexandre. Os levantes armados de 1935 na visão do O Globo, como prática de uma
campanha anticomunista.
autorizados a atuar em 1945. Este partido era a União Democrática Nacional9 (UDN), cujo
apoio, não de forma explícita, O Globo forneceu nas eleições presidenciais de 1945, assim
como nas de 1950, onde mostrava simpatia pelo candidato da legenda, nas duas ocasiões o
Brigadeiro Eduardo Gomes.
As posições defendidas pela UDN estavam afinadas com a ideia de nação encampada
pelo jornal. Entretanto, isso não significava que O Globo era um porta-voz do partido. Não
foram raras as oportunidades em que o posicionamento do periódico divergiu da postura
assumida pela legenda. Um caso exemplar diz respeito aos resultados da eleição presidencial
de 1950. A vitória de Vargas no pleito era questionada a partir da alegação de que o candidato
não havia obtido 50 % dos votos, logo não poderia ser declarado vencedor. A tese firmemente
defendida pelos udenistas, relutantes em aceitar a derrota, não reverberou nas páginas de O
Globo, nem junto ao Tribunal Superior Eleitoral. O caminho para a posse, e diplomação, de
Vargas estava aberto do ponto de vista legal, e a forma como a questão foi tratada pelo jornal,
apenas, demonstraria o compromisso assumido, nesse caso em específico, de respeito às
instituições e a legalidade. Mas também demonstra outro dado, o de que os interesses do
negócio suplantavam as possíveis afinidades ideológicas.
É possível, a partir das primeiras impressões, definir o perfil do jornal O Globo em
relação ao período analisado. Um jornal familiar, identificado com o novo modelo de empresa
jornalística – característico desse momento –, com forte sentimento anticomunista e de caráter
conservador. Assim poderia ser definido o jornal que trouxe uma narrativa, a princípio, de
acordo com o próprio entendimento de sua direção, singular sobre Getúlio Vargas, já que
afastava-se daqueles periódicos cujo objetivo era depreciar a figura do presidente,
exemplificado pelo “Tribuna da Imprensa10” de propriedade de Carlos Lacerda11; assim como

9
A UDN caracterizou-se essencialmente pela oposição constante a Getúlio Vargas e ao getulismo, contradições
e cisões acompanharam a trajetória udenista. Coexistiram na UDN teses liberais e autoritárias, progressista e
conservadoras. O partido que vota a favor do monopólio estatal do petróleo (1953) e contra a cassação dos
mandatos dos parlamentares comunistas (1947) é o mesmo que se opõe à intervenção do Estado na economia,
denuncia a “infiltração comunista” na vida pública e contesta os resultados quando perde as eleições. O partido
ficou marcado pela vinculação com os militares e as aspirações das camadas médias urbanas, identificando-se,
também extrapartidariamente, com o udenismo. O udenismo caracterizou-se pela defesa do liberalismo clássico,
o apego ao bacharelismo e ao moralismo e o horror aos vários “populismos”.
10
Jornal carioca diário e vespertino, fundado em 27 de dezembro de 1949 por Carlos Frederico Werneck de
Lacerda. Em 1962, foi adquirido por Hélio Fernandes, seu atual diretor. Deixou de circular em papel em 2 de
dezembro de 2008, mantendo, porém, uma edição online.
11
Jornalista; dep. fed. DF 1955 e 1956-1960; gov. GB 1960-1965.
os defensores acríticos, segundo algumas interpretações, do “Pai dos Pobres”, como era o
caso do “Última Hora12”, dirigido por Samuel Wainer13.
Entre agosto de 1953 e agosto de 1954 o Globo exerceu forte papel de ator político. O
alcance do jornal e suas posições o tornavam um forte representante do pensamento
conservador. Apesar de, como já destacado anteriormente, assumir uma postura de isenção,
colocando-se acima das paixões políticas, sempre em defesa dos interesses nacionais em
primeiro lugar. Mas como defender a ideia de isenção e ao mesmo tempo representar uma
importante voz dos conservadores? A solução era simples, O Globo não raras vezes
terceirizava opiniões, selecionando aquelas convergentes a sua linha editorial, a respeito de
questões de interesse nacional, sempre oferecendo um contraponto as posições assumidas por
Vargas, quando era do interesse do jornal. Ou seja, tratava como informação o que muitas
vezes representava oposição, não declarada, ao governo. Para atingir esse objetivo, recorria a
alguns expedientes bem definidos.
O Globo nas suas edições diárias apresentava uma coluna cujo título era “Legislativo
em Ação”. Ao contrário do que poderia se especular, não era um espaço de noticiário sobre o
legislativo (Câmara dos deputados, Câmara dos vereadores e Senado) brasileiro. Na verdade
aparecia como tribuna onde, de forma sutil, O Globo pontuava a sua posição, ora favor ora
contra, em relação à atuação do governo Vargas. Para esse fim, utilizava as vozes dos
representantes do legislativo, justamente daqueles cuja opinião ia de encontro às posições do
jornal. Nesse ponto, algo já discutido antes se mostrava presente, no caso, a pretensa isenção e
neutralidade do periódico.
Outro recurso utilizado por O Globo consistia em dar voz a personagens de grande
apelo junto à sociedade. Nessa linha, para defesa das posições do jornal, figuras como Carlos
Lacerda, Octávio Mangabeira14 e Eurico Gaspar Dutra15 compartilhavam suas opiniões sobre
temáticas relativas aos interesses nacionais, através das páginas do periódico. Os dois
primeiros eram utilizados pelo periódico com o objetivo de atacar Vargas; já em relação ao
ex-presidente, suas impressões eram solicitadas quando o interesse do jornal estava voltado

12
Jornal diário e vespertino fundado no Rio de Janeiro em 12 de junho de 1951 por Samuel Wainer. A partir de
1952, passou a ser igualmente editado em São Paulo.
13
Jornalista fundador do periódico “Última Hora”.
14
Político baiano filiado a UDN. Foi governador da Bahia, além de exercer forte oposição ao presidente Getúlio
Vargas.
15
Militar; comte. 1ª RM 1935-1936; min. Guerra 1936-1945; pres. Rep. 1946-1951.
para o respeito e manutenção da ordem institucional, mesmo que isso representasse a defesa
de Getúlio Vargas, como ocorreu em janeiro de 195116.
É possível enquadrar as opiniões de Lacerda, Mangabeira e Dutra dentro de uma
mesma categoria. Estas apreciações representariam a prática de um importante recurso
estilístico: a retórica. Nela, de forma mais específica, encontra-se o “argumento de
autoridade”. Sobre o “argumento de autoridade”, cumpre destacar que,
(...) O argumento de prestígio, sobretudo o de autoridade, pertence à prática
comum da retórica. Foi, como observam Perelman e Olbrechts-Tyteca, o tipo
de raciocínio mais atacado por ter sido muito usado contra os avanços
científicos. Apesar dos abusos, ele não pode ser descartado, uma vez que
muitas questões são controversas e a opinião de especialistas pode ser útil
para a persuasão. A jurisprudência, por exemplo, amplamente usada na
argumentação jurídica, não é outra coisa senão um argumento de autoridade.
Levando-se em conta a importância que tem para a retórica a autoridade do
autor, ou orador, será fácil ver o recurso a outros autores como parte da
tática de reforçar a própria autoridade17.

Não foram poucas as oportunidades em que o recurso estilístico foi utilizado para a
construção de uma narrativa de acordo com as interpretações do jornal. Mas uma vez fica
evidente, que a opção assumida pela neutralidade não passava de mais uma figura de retórica,
que tão bem era exercitada por O Globo.
Conhecidos os recursos utilizados, pelo jornal, para a transmissão das notícias, ou seja,
a metodologia aplicada para a construção da narrativa é possível aprofundar no noticiário que
diz respeito à figura do presidente Getúlio Dornelles Vargas.
Não seria nenhum absurdo a afirmação de que O Globo apresentava uma atitude
bivalente em relação a Vargas. Tinha a capacidade de em uma mesma edição do jornal trazer
elogios quanto à gestão econômica, conduzida pelo Ministro da Fazenda Oswaldo Aranha18, e
criticar a condução das relações políticas, que estimularia o enriquecimento ilícito e práticas

16
Em relação ao posicionamento assumido pelo jornal em defesa da estabilidade, ou seja a posse de Getúlio
Vargas, e da conciliação foi observado na edição de três de janeiro de 1951, logo na primeira página o editorial
intitulado “Espadas em continência a Lei”. Nele, o jornal faz ressonância a uma posição do então presidente
Dutra, que defendia a legalidade acima de tudo, e que as Forças Armadas deveriam agir para garantir, de todas as
formas, o respeito à Constituição Federal.
17
CARVALHO, 2000, p.142
18
Deputado Federal pelo RS 1927-1928; Revolução de 1930 Ministro da Justiça 1930-1931; Ministro da
Fazenda 1931-1934; Emb. Brasil nos EUA 1934-1937; Ministro das Relações Exteriores 1938-1944; Emb.
Brasil na ONU 1947; Ministro da Fazenda 1953-1954. Oswaldo Aranha contava com enorme simpatia por do
jornal O Globo, pode-se inclusive constatar que sua presença no Governo Vargas, durante os anos de 1950,
contribuiu para um tom menos belicoso por parte do periódico.
nocivas a nação. Recorrendo a coluna “Legislação em Ação19”, publicada em 25 de agosto de
1953, encontram-se depoimentos de parlamentares confirmando estas duas posições. O jornal
manteve esta prática, pendular, ao longo de todo período analisado.
Entrevistas concedidas por Getúlio Vargas ao jornal O Globo não apareciam como
uma prática usual. Entretanto, o veículo de comunicação da família Marinho não poderia
prescindir das posições do presidente Vargas. A solução encontrada foi recorrer às opiniões
emitidas, pelo presidente, em discursos realizados em ocasiões especiais. Nesses momentos,
Getúlio Vargas tratava tanto do tema principal, que o levava a discursar, como aproveitava a
oportunidade para responder aos seus críticos. A partir do discurso realizado, que muitas
vezes era transcrito na íntegra nas páginas do jornal, O Globo buscava coletar opiniões
diversas sobre a fala presidencial, tanto aquelas que elogiavam as palavras do presidente,
como também daqueles que a criticavam de forma contundente o posicionamento de Vargas.
Para ilustrar essa situação a edição de 8 de setembro de 1953 traz as impressões a
respeito do discurso presidencial realizado em decorrência das comemorações pelo dia da
Independência do Brasil, realizado no dia anterior.
Antes de trazer as opiniões relativas ao discurso, cumpre apresentar um trecho do
mesmo, em que Vargas deixava bastante claro para quem suas palavras eram endereçadas,
seus detratores. Ao mesmo tempo em que conclama a união nacional e o fim dos ataques
improdutivos ao governo. Segundo o presidente,
“No grande dia de hoje recebi da população da capital da República as
demonstrações mais carinhosas de afeto e entusiasmo que profundamente me
comoveram e me alentaram. Não eram as manifestações dos afortunados e
bem vividos, mas as do povo anônimo das ruas, daquele que luta para
sobreviver e que sua o suor de sangue de todos os dias.”
“(...) Se a lição dos anos vividos no serviço da Pátria me assegura serenidade
ante as incompreensões, as injustiças e os ultrajes, lastimo, entretanto, que se
procure dificultar o trabalho construtivo do País e comprometer a confiança
do Povo nos seus dirigentes, quando, mais do que nunca, se impõe a união
nacional20.”

Na página 8 da edição, foram encontrados apanhados desses juízos, sobre a fala


presidencial. Inicialmente, destacaram-se aquelas posições favoráveis a Vargas. Aplaudiram o
discurso do chefe da nação o presidente da Câmara, Nereu Ramos, e o líder da maioria na
Câmara Federal, Gustavo Capanema. Nereu Ramos elogia a clareza com que o presidente

19
O Globo edição de 25 de agosto de 1953, página 9.
20
O Globo edição de 8 de setembro de 1953, página 2.
tratou as responsabilidades que competem a Presidência da República; Já Gustavo Capanema
reitera que apesar da ação dos detratores, os aplausos recebidos, por Vargas, em praça
pública, demonstraram a compreensão do povo, e ainda mais, o respaldo para o chefe da
nação seguir em frente com suas medidas.
As posições contrárias, ao discurso, foram tomadas junto a Aliomar Baleeiro, que o
jornal chama de oposicionista número um da UDN, e de Lopo Coelho filiado ao PSD.
Baleeiro entende que nada mudaria, pelo contrário, os favorecimentos e a corrupção seriam
mantidos, e a tendência era a piora da situação; Lopo Coelho sinaliza que Vargas esquiva-se
de punir os culpados, segundo ele, a preocupação do presidente foi criar polêmica com todos
aqueles que apontariam os erros e a corrupção no governo, apesar do crescimento verificado
no país.
Quando O Globo traz opiniões distintas a respeito do discurso presidencial, reforça
para os seus leitores a ideia de isenção que, em tese, pautaria a narrativa do jornal. Mas o
público conservador, que representava a base daqueles que acompanham as páginas do
periódico, identificavam-se com as posições de Aliomar Baleeiro e Lopo Coelho, por
exemplo.
Já foi sinalizado que O Globo assumiu a função de ator político. Isso ficaria mais
evidente quando se verifica a antecipação do debate para sucessão de Getúlio Vargas na
Presidência da República promovido pelo jornal. As eleições presidenciais só ocorreriam em
outubro de 1955, entretanto, pouco mais de dois anos antes do pleito, a narrativa trazida
enfatizava a necessidade de apresentar alternativas para enfrentar o candidato identificado
com o presidente, ainda que ele não estivesse identificado. Então, é possível enxergar como a
sucessão presidencial aparece, também, como fator que contribui para a instabilidade política
do período. Logo, Alguns nomes, pouco a pouco, tendem a aparecer como eventuais
postulantes a cadeira de Vargas, e por isso ganhariam cada vez mais destaque, seja positivo ou
negativo no noticiário do jornal. O Globo, obviamente, não deixaria de atuar nesse ambiente,
procurando defender os seus próprios interesses, como de costume.
As eleições presidenciais só seriam realizadas em 1955, um ano antes seriam
realizadas as eleições para os governos estaduais e para o legislativo. Mas ainda assim o foco
dado, pelo jornal, era a sucessão de Vargas. Sendo assim, qualquer oportunidade era adotada
por O Globo para construir um discurso que enfraquecesse politicamente o presidente. Por
esse motivo, o grande destaque dado às comemorações do aniversário da Constituição de
1946.
Na edição de 18 de setembro de 1953, duas opiniões serviriam para reforçar, mesmo
que sutilmente, as posições do jornal contra o governo. O deputado Afonso Arinos, por
exemplo, reforça que a data, em questão, deveria ser utilizada pelo governo para refletir sobre
a necessidade de respeitar a Constituição Federal. Octávio Mangabeira, ex-governador da
Bahia, também, não perdeu a oportunidade para atacar o governo, inclusive, sua declaração
ganha maior destaque pela projeção concedida por O Globo, que sempre recorreu ao
conhecido político baiano para direcionar críticas ao governo. Segundo Mangabeira,
referindo-se a constituição de 1946, “eram quase todos marinheiros de primeira viagem e
andavam tateando à luz do sol, pois haviam saído da escuridão do Estado Novo21”.
A lembrança do passado golpista de Vargas era lembrada no momento em que se
comemorava a data que marcava o retorno do Brasil a “democracia”, a partir da promulgação
da constituição de 1946. É evidente que esta ação tem um viés político de ataque ao
presidente, e as suas potenciais ideias de continuidade no poder, nunca assumidas por Vargas,
desrespeitando, assim, a carta constitucional.
Na edição de 6 de outubro de 1953, o jornal traz um importante posicionamento que
demonstra como a sucessão da cadeira presidencial tinha entrado definitivamente na pauta
política. O Globo recorre às observações de Pedro Aleixo, ex-presidente da UDN mineira, que
afirma; se houver um acordo entre os partidos “centristas” para a sucessão de Vargas, o
virtual candidato deveria sair das “forças armadas”. Argumenta que,
“o candidato militar seria o único meio seguro de se evitar qualquer perturbação ao
regime ou por um golpe, ou por tentativa de se impor um candidato ao povo,
hipóteses essas perfeitamente plausíveis, sabendo-se que quem está no poder é o
senhor Getúlio Vargas...22”.

A interpretação de Pedro Aleixo aponta, sobretudo, para o temor existente em certos


setores da sociedade. Primeiro a recorrente ideia de que Vargas estaria disposto a promover
um golpe para manter-se no poder, assim, como fez no passado. Fica subentendido também
que, quando se refere à imposição de um candidato ao povo, ele estaria referindo-se ao
Ministro do trabalho João Goulart, outro potencial candidato capaz de criar calafrios nas
classes conservadoras.

21
O Globo edição de 18 de setembro de 1953.
22
O Globo edição de 6 de outubro de 1953.
O pensamento de Pedro, Aleixo sobre a presença de militares na política nacional, não
era algo isolado. Identificados, os militares, com a ideia de força e ordem, não é de estranhar o
conforto que eles ofereceriam aos setores conservadores da sociedade, visto que são
encarados como mantenedores da estrutura social. Não por acaso, O Globo nutria forte
simpatia pelos representantes das Forças Armadas.
No dia 20 de outubro o jornal, mais uma vez, levanta a questão da sucessão
presidencial, onde informa aos seus leitores sobre a entrevista que seria concedida pelo
presidente da UDN, Arthur Santos. A notícia antecipa todos os temas que serão abordados
pelo presidente da legenda, em que defende sim a antecipação do debate sobre a sucessão, e o
entendimento por parte dos partidos políticos de sua função na sociedade, e que em nenhuma
hipótese devem se furtar a essa responsabilidade.
O Globo era defensor da antecipação desse debate. Suas matérias frequentemente
dedicam atenção ao tema, sempre com um olhar no futuro, tentando desqualificar qualquer
atitude política que ofereça um projeto de país que ameace seus interesses, por isso, retardar
as discussões relativas à sucessão de Vargas é vista com reservas e preocupação.
Outro detalhe, o conglomerado Globo é muito generoso ao oferecer as páginas do
jornal ou os microfones da rádio aos opositores de Vargas. Entretanto, existiria espaço para
fala de certas figuras da cúpula governamental, Tancredo Neves e Oswaldo Aranha, por
exemplo. Mas os dois contariam com simpatia ou tolerância por parte do grupo, por
apresentarem tendências mais próximas daquilo que converge para a visão de mundo
defendida pelo jornal.
“Plano de subversão do regime à vista23” está é a manchete de capa da edição do dia
21 de outubro. Ela faz alusão à entrevista concedida por Arthur Santos, presidente da UDN, a
Rádio Globo, onde o deputado udenista alertaria sobre “os que pretendem usar das massas
sindicais como instrumento de seus intuitos de domínio político”.
É inegável o poder das palavras, a retórica é uma arte, e a forma de sua utilização,
principalmente, por políticos experientes não era praticada ao acaso. Então, quando em uma
mesma frase são utilizadas as palavras “massas” e “domínio” pode-se intuir uma alusão ao
totalitarismo. Tal ideologia não deixou de ser associada a Vargas, e também não deixaria de
ser associada aos seus herdeiros políticos, como João Goulart. O Ministro, sempre era

23
O Globo edição de 21 de outubro de 1953.
apresentado como fomentador do enfrentamento entre as classes, e estimulador da
sindicalização dos trabalhadores, em prejuízo a ordem social.
O clima de campanha eleitoral antecipado foi prejudicial ao desenvolvimento do país.
De forma crítica, o clima belicoso estimulado por setores da sociedade, em relação à sucessão
presidencial, nada contribuiria para o bom andamento do Brasil, muito pelo contrário. As
discussões importantes são relegadas a um segundo plano, dedica-se mais tempo em
acusações e negativas do que pensar efetivamente em um projeto de nação, a preocupação
maior debruça-se em diferentes projetos de poder.
Personalidade recorrente nas páginas de O Globo, quando sempre tem uma palavra
desabonadora em relação ao governo, ainda reflexo do passado de Vargas, Octávio
Mangabeira é o principal chamariz para a capa. Em sua fala a imprensa, publicada em vinte
três de outubro, realizada na capital paulista, destaca-se a percepção de Mangabeira que, no
Brasil, há clima propício para golpes. Atesta que o momento vivido deve-se em muito a
“ditadura” que se abateu sobre o país durante 15 anos. Alerta que quando o povo deserta da
vida política, segundo sua percepção o que estaria acontecendo, o espectro da ditadura volta a
rondar a sociedade, e por isso mesmo a participação política precisa ser mais efetiva.
Nesta mesma entrevista, Mangabeira, foi bastante generoso nos louvores a duas
personalidades paulistas: Lucas Garcez e Jânio Quadros. Identificou em Garcez uma grande
reserva moral para nação, mas foi sobre Jânio Quadros que dedicou mais palavras elogiosas.
Segundo Mangabeira, Jânio Quadros era o que o Brasil precisava “a união do proletariado
com a elite. É um homem que não sendo um analfabeto nem aventureiro, mas pertencendo a
elite, porque formado, sabe falar ao povo. Porque sente os seus anseios, conhece suas
dificuldades, tem vocação da vida pública24”.
Octávio Mangabeira através de suas considerações não só defende a antecipação do
debate sobre a sucessão presidencial, como alerta do perigo para aqueles que ainda teimariam
em negligenciá-lo, sob risco de um possível retorno da “ditadura”, que para ele surgiria como
um perigo real. Também aponta duas possibilidades viáveis para a sucessão de Vargas,
representadas por Jânio Quadros e Lucas Garcez. Podemos notar como no panorama que se
apresentava São Paulo tinha grande importância.
A edição do dia 24 de outubro apresentaria as principais colocações do presidente do
PL, Raul Pila, aos microfones da Rádio Globo. Entrevista esta noticiada na edição anterior do
24
O Globo edição de 23 de outubro de 1953.
jornal. Raul Pila mantém a linha de raciocínio exposto por Arthur Santos, em que é preciso
sim discutir a sucessão presidencial, tema que urge ser debatido. Raul Pila também informa
que estaria em elaboração na câmara um projeto para a implantação do parlamentarismo no
país, acreditava que em breve a reforma parlamentarista triunfaria no Brasil.
O golpe, temido por Octávio Mangabeira, poderia acontecer de diferentes maneiras, e
não necessariamente partiria do governo. Não deve ser ignorado que a proposta de emenda
parlamentarista poderia ser uma dessas possibilidades. As classes conservadoras receavam
que um candidato afinado com as classes trabalhadoras, viesse suceder Vargas na presidência,
e que dessa forma colocasse em risco o status quo. Por isso, a emenda parlamentar, seria uma
salvaguarda para essas classes conservadoras, uma forma de reduzir o poder do presidente da
República.
A edição do dia 29 de outubro faz louvação ao evento ocorrido, nessa mesma data,
oito anos antes. A notícia refere-se à deposição de Getúlio Vargas em 1945, quando os
militares forçaram a saída do atual presidente do poder. O Globo relata que todos os
parlamentares ouvidos foram unânimes em reconhecer a importância do movimento realizado
pelas classes armadas. Os mesmos parlamentares indicariam que, sem a ação dos militares, o
regime iniciado em 1937 ainda vigoraria no país.
Ao exaltar a data em questão, comemoração pelo fim do “Estado Novo”, o jornal
criaria um nítido constrangimento ao Presidente da República, mantendo para o seu público
leitor, a lembrança da faceta “ditatorial” de Vargas. Algo que seria aproveitado politicamente
por aqueles que faziam oposição ao presidente, já que a corrida eleitoral já havia sido, de
forma conveniente, antecipada.
A antecipação da corrida pela sucessão de Vargas teve tanto sucesso, que os próprios
integrantes do governo não tiveram como fugir do tema, já abordavam com naturalidade a
questão. Podemos constatar como a articulação de algumas figuras, como Octávio
Mangabeira, apoiadas pela imprensa, no caso O Globo, foram felizes no seu intuito. Com
mais de dois anos de governo pela frente, Vargas se viu obrigado a atuar em duas frentes. De
um lado no exercício de seu mandato procurava administrar os desafios representados pela
difícil tarefa de conduzir o país; ao mesmo tempo devia lidar com a questão sucessória,
interagindo com uma oposição ávida por assumir o poder no país.
Em 18 de novembro de 1953, identifica-se um recurso utilizado por O Globo, que
pode ser visto como de grande valia, tratava-se do “Ineditorial25”. Este recurso era a forma do
jornal, objetivamente, terceirizar uma opinião. Ou seja, emitir um juízo de valor sem
comprometer as suas próprias convicções, e ainda ganhar financeiramente com isso. O
“Ineditorial” transcrito da edição de 14.11.1953 de "O Jornal", periódico de Assis
Chateaubriand, traz o título “Ilusão dos lucros excessivos” e tratava de uma análise sobre o
plano econômico de Oswaldo Aranha, e as suas perspectivas na taxação sobre os lucros.
Para comprovar a importância do “Ineditorial”, a edição do dia dezenove trouxe outro
exemplo, só que agora publicado originalmente no “Correio da Manhã” no dia anterior. O
tema também foi diferente, agora tratando da situação relativa ao grupo de Samuel Wainer e
os inquéritos que sobre o grupo recaíram.
Como o “Ineditorial” envolve transação financeira, podemos concluir que O Globo
lucra duplamente. A primeira, de forma evidente, com os ganhos auferidos pela cessão do
espaço, o outro pelo poder de penetração junto ao público leitor, que demonstrava de forma
clara a força do jornal.
O “Ineditorial” mostra-se um recurso formidável já que, no caso particular do jornal O
Globo, permitiria ao periódico exercitar o seu mais destacado papel, o de veículo neutro. A
“opinião publicada”, nos casos verificados nas edições, apresentaria-se uma narrativa que
coaduna-se com as ideias defendidas pelo jornal, ou seja, reforça um discurso já existente nas
suas páginas, ao mesmo tempo que garante para os leitores a ideia de isenção.
Em 21 de novembro de 1953 foram publicadas as impressões do presidente do
Supremo Tribunal Federal, José Linhares, em que o magistrado mostrava-se favorável à
iniciativa do jornal O Globo em consagrar uma data ao Congresso Nacional. O objetivo dessa
iniciativa era exaltar o Congresso, “tributando, assim, ao regime democrático o apreço e a
consideração do povo brasileiro”. O objetivo do jornal seria transformar esta iniciativa em
realidade, e para isso contava com o apoio de expressivas personalidades do país. Nas
palavras de José Linhares uma ação que merece aplausos e que se mostraria fundamental para
fortalecer o regime representativo, que é a “pedra angular da nossa vida democrática”.
Também com mensagem elogiosa o ministro do supremo Luís Gallotti, que, seguindo a
mesma linha de José Linhares, acentuou a importância do legislativo, “de onde emanam as

25
Segundo o site “Nossa Língua Portuguesa” o termo diz respeito à parte do jornal vendida para publicação de
informação de terceiros.
leis que disciplinam vida da nação”, e por esse motivo os brasileiros deveriam abraçar essa
ideia.
Percebe-se que a ideia de um dia em homenagem ao Congresso Nacional, além de
toda importância atribuída à iniciativa, cumpre um objetivo, enfraquecer o culto a
personalidades políticas, como João Goulart e Getúlio Vargas, por exemplo. Fortalecer o
legislativo significaria, em contrapartida, o enfraquecimento do Executivo, e
consequentemente o poder do presidente da República. Potenciais candidatos à sucessão de
Vargas, com forte apelo popular, como Goulart, diante das mudanças na legislação que
estavam em gestação, teriam sua margem de atuação consideravelmente reduzida. Com
certeza, um alento para as forças conservadoras.
O Globo atua como agente histórico quando trabalha para criação de um dia em
homenagem ao Congresso Nacional. Fortalecer o Legislativo com o objetivo de minar as
ações do executivo está longe de representar a postura de um elemento neutro. Pelo contrário,
existe uma clara pretensão de ingerência do periódico nos assuntos de Estado, a prática
apresenta-se muito distante do discurso do jornal.
Uma notícia registrada na página dois da edição de 17 de dezembro de 1953 é de
grande importância para identificar para quem O Globo, principalmente, fala, e porque não
dizer representa interesses.
A notícia cujo título é “Papel da Imprensa Livre” relata um almoço que,
frequentemente, é realizado entre os representantes da indústria de tecidos, onde são
discutidos assuntos de interesse “comum” (?), em que O Globo foi convidado a participar. No
almoço foi valorizado o papel da “imprensa independente”, e como ela é fundamental para o
progresso do país. Os industriais vão mais além, pregam uma união mais estreita entre as
forças produtoras e a imprensa em benefício da “coletividade”. A imprensa, segundo a fala
dos industriais, tem um papel que vai muito além de informar, sua ação efetiva através da
advertência ou censura tem a força para evitar prejuízos à economia coletiva. Ao final da
explanação, O Globo é apresentado como um exemplo dessa imprensa “independente” e
“combativa” que tão bem faria ao país.
Uma nota aparentemente despretensiosa, mas que ilustrava de forma clara aqueles para
com quem o jornal apresentaria maiores compromissos. É possível afirmar que era uma
situação ambígua vivida pelo jornal. É saudado como defensor da liberdade e da democracia,
mas ao mesmo tempo as suas posições defendem a manutenção do status quo, que muitas
vezes representaria combater e criticar certas conquistas das classes trabalhadoras, que vieram
a partir das práticas realizadas por Vargas.
Na última edição de 1953 publicada em 31 de dezembro, onde encontra-se a coluna de
José Lins do Rêgo, em que o autor aborda o desalento dos brasileiros, independente da classe
social, em relação à cena política, principalmente, no que tange a sucessão de Vargas.
Descreve como poucos homens na politica, realmente, se importam em encontrar soluções
para resolver os problemas da nação. Enxerga a ação de muitos cuja preocupação maior é
dividir, e não encontrar um caminho conciliatório para o benefício de todos. O ceticismo de
suas palavras, a respeito do momento político nacional, tem como ponto conclusivo um aviso
ao presidente, de quem se diz amigo. José Lins do Rêgo previne; “Presidente, os demônios da
perdição andam soltos por aí. Germens da dissolução atacam o grande e inerme corpo da
nação. Vamos meditar sobre a morte, como os trapistas, para ver se salvamos a vida de todos
nós26”. Talvez José Lins do Rêgo não pudesse imaginar como suas palavras teriam um
inabalável sentido premonitório.
Apesar de todo clima de instabilidade que foi possível constatar, no segundo semestre
de 1953, era difícil imaginar que em poucos meses a trajetória de Vargas na política brasileira
fosse abreviada de forma tão traumática, atingindo níveis elevados de dramaticidade.
Os meses a seguir representaram a continuidade dos problemas verificados no ano
anterior. O embate entre a tentativa do Presidente da República conduzir o país, e o seu
governo, até o final de seu mandato constitucional e os setores que desejavam o encerramento
antecipado do seu governo foi uma tônica do período.
Na primeira edição de 1954 é possível constatar as reações contrárias, por parte das
“classes produtoras”, a proposta de elevação do salário mínimo. Alegavam que o novo piso
levaria um aumento generalizado dos preços, o que traria sérios problemas para a economia e
para a sociedade em geral. Uma observação faz-se necessária, o que o jornal chama de
“classes produtoras”, na verdade representaria os patrões. É inegável a construção, por parte
de O Globo, de uma narrativa contrária à medida para implantação do novo piso salarial. O
leitor a enxergaria, segundo a mensagem do veículo, na classe patronal a verdadeira geradora
de riqueza para o país, que não poderia ser penalizada com um reajuste além de suas
possibilidades. Nessa discussão, não é difícil perceber para onde se inclinaria a simpatia do
jornal.
26
Edição O Globo de 31 de dezembro de 1953.
O Globo um jornal com viés conservador, e que muitas vezes se declarou, “defensor
da harmonia entre as classes” defendia que esta não deveria ser ameaçada por ações
demagógicas do governo. Quando a questão referente ao aumento dos índices do salário
mínimo chegou as suas páginas, a postura adotada pelo jornal foi refratária à proposta do
governo, pois segundo o periódico, esta ação potencializaria o embate entre as classes
trazendo a desarmonia entre elas. É importante destacar que não havia contrariedade em
relação ao aumento em si, mas sim quanto ao percentual de 100%, que era visto como
demagógico e com fins eleitoreiros. Também é preciso apontar que os interesses do jornal e
dos seus leitores não estava em consonância com a maioria que seria beneficiada pelo
reajuste.
Na edição de 7 de janeiro de 1954, o jornal colheu impressões do presidente do
Sindicato dos Lojistas, José da Silva Oliveira, que citaria como aumento de 100% do salário
mínimo seria responsável por duplicar o custo de vida. Apontaria os inúmeros problemas que
esta medida causaria para economia do país, leiam-se as “classes produtoras”, e acreditava na
capacidade do Chefe da Nação, de acordo com suas prerrogativas, vetar o aumento. Evitando,
assim, potenciais prejuízos, que impactariam sobre a sociedade como um todo.
A elevação do salário mínimo, ainda não efetivada, serviu de base para um editorial27
publicado pelo O Globo em 8 de janeiro. Nele encontra-se um ataque duro a medida,
atribuindo a ela um caráter demagógico, que traria sérios problemas para a classe
trabalhadora. Diz que o governo aumentaria o salário sem olhar as consequências,
demonstrando pouco comprometimento com os interesses nacionais. Entende a atitude como
subversiva, um verdadeiro ato de traição à pátria, uma ação que estaria mais de acordo com o
reacionarismo dos “vermelhos”. O desemprego, em massa, representaria uma das
consequências desse ato, entendido pelo editorial, irresponsável.
A função principal do editorial, no momento em questão, seria criar desconforto para o
governo, leia-se Vargas, e criar um clima de hostilidade, que o obrigasse rever a medida.
Apesar de citar como os trabalhadores seriam os principais prejudicados por esta medida
“demagógica”, a classe trabalhadora, não seria ouvida em nenhum momento.
Ao longo do mês de janeiro o novo piso para o Salário Mínimo foi uma constante nas
páginas de O Globo. Como destacado, o jornal assumiu, outra vez, uma postura tendenciosa.
Longe de cumprir com seu compromisso de veículo de comunicação isento, o periódico
27
O Globo edição de 08 de janeiro de 1954.
cederia espaço quase exclusivo para a voz dos patrões a respeito da questão salarial.
Entretanto, no dia 21 de janeiro o jornal foi, digamos, generoso com os trabalhadores, ao
ceder um pequeno espaço na página sete da edição. Nela noticia a “marcha pelo salário
mínimo28” em que trabalhadores do comércio e da indústria se direcionariam ao Palácio do
Catete e as sedes dos governos estaduais, com o intuito de protestar contra a oposição da
classe patronal em relação ao aumento de salário mínimo.
No dia 3 de fevereiro o jornal apresentaria um novo editorial29. O texto abordaria a
entrevista concedida pelo Ministro da Justiça, Tancredo Neves, ao jornal “Tribuna da
Imprensa”. Tancredo Neves criticou a forma de agir da oposição, cuja forma de atuação seria
questionável, não assumindo uma postura crítica, e que seu interesse era direcionado para
cargos e para exercer diretamente o poder, mesmo que isso representasse prejuízos ao país.
O editorial, entre outras críticas, colocaria o ministro da justiça como o intérprete do
pensamento de Getúlio Vargas, ou seja, o presidente utilizou-se da figura de Tancredo Neves
para expressar suas posições a respeito da oposição. Sendo assim, o principal interesse seria
desacreditar os setores oposicionistas, apontando que muitos dos problemas enfrentados, pelo
país, resultariam de um tipo de oposição pouco construtiva, que não agregava e impediria o
governante de atuar em prol do desenvolvimento do país. Segundo o editorial, a fala do
Ministro da Justiça tencionaria o constrangimento da oposição, enfraquecendo suas pautas.
Alerta aos setores oposicionistas para ficarem preparados, pois, caso contrário, seriam
vitimados por mais um ardil perpetrado por Vargas.
A publicação desse último editorial confirma uma tendência. A postura do jornal, em
relação ao presidente, ganhava maior agressividade, com críticas cada vez mais explícitas. Os
movimentos de O Globo não são aleatórios, podem ser entendidos como resultado do
momento vivido pelo país, e da defesa dos seus próprios interesses.
Em 13 de fevereiro, a presença de Getúlio Vargas acompanhado de João Goulart, em
um evento na cidade de Petrópolis, motivou o protesto de operários locais contra o aumento
do custo de vida. Entretanto, as reivindicações dos trabalhadores versaram também a respeito
da aprovação dos novos índices do salário mínimo e da aposentadoria integral para os
industriários. Em nome de Vargas, João Goulart, declarou que as reivindicações locais,
também eram de todos os trabalhadores do país. Garantiu que a finalização dos estudos, sobre

28
O Globo edição de 21 de janeiro de 1954.
29
O Globo edição de 3 de fevereiro de 1954.
o novo salário mínimo, já chegavam a um termo conclusivo, e que em breve seguiria para
sanção do presidente da República.
O contato direto, com os trabalhadores, mais do que apontar um risco, representava
uma oportunidade fundamental do presidente, e de seu Ministro do Trabalho, aproximar-se
desse importante segmento da população. Diante de tantas posições contrárias, o momento
político não era favorável a Vargas, encontraria nessa classe um porto seguro, uma força
capaz de referendar as ações do governo. Qualquer apoio, nesse cenário conturbado, era bem
vindo.
É com grande ênfase que O Globo, em 16 de fevereiro, retrataria o “Manifesto da
UDN Paulista30”. O documento divulgado pelos udenistas “denunciaria” que a intervenção de
Vargas no processo eleitoral em São Paulo, com ação direta do Ministro do Trabalho,
representaria o primeiro passo para o, imaginado, “golpe continuísta” que Vargas pretenderia
realizar. Teriam, inclusive, os comissários do ministério do Trabalho atuado junto a elementos
“comunistas” para sublevação dos trabalhadores. A própria questão relativa à elevação do
piso salarial faria parte do estratagema pensado por Vargas e seu séquito. No manifesto, o
exemplo do que fez Vargas em 1937 era relembrado. A UDN, segundo o documento,
cumpriria um papel cívico ao alertar São Paulo, e a toda a nação, sobre o terrível “plano”
arquitetado pelo Presidente da República.
Poucos dias antes da apresentação do “Manifesto da UDN paulista”, oficiais das
Forças Armadas apresentaram um documento à alta hierarquia militar. O conteúdo estava
repleto de queixas e posicionamentos políticos contrários à condução dos rumos do país.
Deixava explicita a insatisfação nos meios militares em relação ao governo Vargas. O
“Memorial dos Coronéis31” contribuiria para acirrar os ânimos na cena política nacional, e
pode ser encarado como determinante para a publicação do “Manifesto da UDN paulista”. Os
udenistas não deixariam passar a oportunidade, principalmente, se for considerado o peso
político dos militares no Brasil.
O Globo destacou em sua primeira página, na edição de 17 de fevereiro, o apoio de
capitães e tenentes ao “Memorial dos Coronéis”. O jornal relataria que das guarnições de todo

30
O Globo edição de 16 de fevereiro de 1954.
31
Segundo o DHBB também conhecido como “Manifesto dos Coronéis” foi o documento também conhecido
por Memorial dos coronéis, assinado por 42 coronéis e 39 tenentes-coronéis e dirigido em fevereiro de 1954 à
alta hierarquia militar, em protesto contra a exigüidade dos recursos destinados ao Exército e a proposta
governamental de elevação do salário mínimo em 100%.
país chegaram mensagens de solidariedade ao ato realizado pelos coronéis. O alto comando
militar encerraria o caso com uma advertência a todos aqueles que subscreveram o
documento, todavia sem maiores consequências em relação a prejuízos em relação a
promoções ou outras atitudes punitivas.
O “Memorial dos Coronéis” surgiria como mais um potencial elemento para
instabilidade política no Brasil. Pode ser entendido que o governo tentou uma conciliação,
advertindo os envolvidos, sem, no entanto, recorrer a maiores punições. Não era inteligente
alimentar mais um foco de insatisfação, ainda mais proveniente das forças armadas.
Na edição do dia 18 de fevereiro, com habitual destaque para situações como esta, o
jornal informaria que a UDN Nacional apoiava o manifesto da seção paulista. Referendando
tudo o que foi exposto no documento. Ressaltava que Vargas pretenderia uma reforma
constitucional, além de promover a luta de classes, onde o salário mínimo seria uma parte do
processo.
É pertinente apresentar a posição do presidente da UDN sobre o “Manifesto” da
sucursal paulista. Disse Arthur Santos, “não só pela idoneidade da direção da UDN paulista,
como também pelos fatos denunciados, alguns públicos e notórios, o Diretório Nacional deu
sua solidariedade à seção bandeirante do partido”.
A pauta do jornal nos últimos dias alternava-se. Ora em relação ao “Manifesto da
UDN Paulista”, ora debruça-se sobre o “Memorial dos Coronéis”. No dia dezenove O Globo
publica o primeiro grande reflexo da ação dos coronéis. A edição noticia que o presidente
Vargas aceitara a demissão do Ministro da Guerra Ciro do Espírito Santo Cardoso. Após
entregar o relatório, ao presidente, sobre o “caso dos coronéis”, apresentou em caráter
irrevogável sua carta de demissão, prontamente aceita por Vargas.
A resposta de Vargas a crise, que levou a queda do Ministro da Guerra, deveria ser
rápida. Era urgente evitar que ganhasse maiores proporções e comprometesse ainda mais a
difícil tarefa de governar o país naquele momento.
No dia 20 de fevereiro O Globo noticiava o convite ao general Zenóbio da Costa para
assumir como novo Ministro da Guerra. Em suas primeiras declarações, prometeu ação firme
contra o que ele chamou de “sabotadores da ordem legal” e que a questão dos coronéis já era
caso superado, e não havia razão para continuar a falar sobre o tema. Uma característica do
general Zenóbio, que se mostrava bastante adequado era sua forte atitude anticomunista. Um
atributo muito conveniente para o momento em questão, e uma forma de resposta ao
“Manifesto da UDN”, já que um Ministro da Guerra contrário ao comunismo não deixaria de
ser um alento para os conservadores.
Um assunto citado de forma superficial, em edições anteriores, ganharia materialidade.
Diz respeito a questão relativa a demissão do Ministro João Goulart. O que era especulado, ou
insinuado, agora ganharia destaque na primeira página, também no dia 20. O Globo sugere
que a, possível, demissão de Goulart estaria relacionada ação realizada pelos coronéis.
A edição do dia 22 retoma os temas já ressaltados no dia 20. Focaria em Zenóbio da
Costa e em João Goulart. O primeiro sobre o controverso convite, já que Vargas não realizou
a nomeação do General a pasta Guerra, mas afirmaria não ter vetado a escolha do general.
Ficaria a impressão que a opção por Zenóbio não foi uma escolha pessoal do presidente. O
segundo confirmando-se a especulação a respeito da saída de João Goulart do Ministério do
Trabalho. Goulart confirmaria a sua condição demissionária, e que entregaria sua carta de
renúncia ao Presidente da República.
Não é possível ignorar que a pressão das chamadas classes conservadoras, amparadas
pela UDN e pelos militares, feriu gravemente o Governo Vargas. As saídas dos ministros da
Guerra e do Trabalho foram muito sintomáticas das dificuldades enfrentadas pelo governo. A
saída de Goulart da pasta do Trabalho ainda teria reflexos na corrida pelo Palácio do Catete e
nas eleições para os governos estaduais.
As últimas edições do mês de fevereiro apresentariam um cenário político complexo,
com a UDN apontando a ação dos militares como reflexo da incapacidade do governo Vargas
em conduzir de forma adequada os rumos do país. Mostraria também as articulações políticas
com os entendimentos entre o PSD e a UDN para a disputa eleitoral no Rio de janeiro. Assim
como uma entrevista concedida por Vargas, em Caxias do Sul, em que o presidente abordaria
o caso dos coronéis, reiterando que era um caso superado e também sobre a saída de João
Goulart que, para ele Vargas, foi uma surpresa. Afirmou ainda que o ex-ministro contava com
sua admiração e confiança.
A capa da edição de 4 de março destacava-se por apresentar a declaração do general
Zenóbio da Costa, Ministro da Guerra, em resposta ao secretário da Viação do Rio Grande do
Sul, Leonel Brizola. Afirmava, o ministro, que os militares não conspirariam para derrubar o
presidente Getúlio Vargas. Segundo Leonel Brizola, a queda de João Goulart teria sido
determinada pelas “maquinações do poder econômico e das forças mais reacionárias do nosso
país (...)32”, acrescentou ainda que “se juntou o pronunciamento de um grupo de militares que
o poder econômico soube explorar em seu benefício, tal a forma como encaminhou e
procurou interpretar o chamado memorial dos coronéis33”.
Zenóbio da Costa afirmava que sua nomeação, para a pasta da Guerra, não era oriunda
de nenhum tipo de conchavo, e que acima de tudo os militares defenderiam os interesses da
nação contra os seus inimigos. Não deveriam ser encarados como uma ameaça à ordem
institucional, logo, não seriam, os militares, massa de manobra nas mãos de qualquer classe.
A edição do dia 16 de março apresentava, em sua primeira página, o posicionamento
do ministro da justiça, Tancredo Neves, sobre as agitações que abalavam o país. Relatou que
não enxergava nada de anormal, já que o período que precede as eleições é caracterizado por
articulações e enfrentamentos que têm por objetivo o alcance dos cargos eletivos. Para
Tancredo Neves, nada mais natural, inclusive, demonstraria como as instituições estariam em
pleno funcionamento.
É possível conceber que a linha de raciocínio apresentada pelo ministro Tancredo
Neves, sobre o momento vivido pelo país, era de que não existiria crise de fato, sendo o clima
eleitoral responsável pelo acirramento de certos ânimos. Em todo caso, alguns setores foram
capazes de potencializar os radicalismos, contribuindo para o clima de incertezas e ameaças
golpistas, de parte a parte, que ameaçariam a ordem institucional no país. Pode ser entendido
que a imprensa, em específico O Globo, tenha contribuído para essa situação turbulenta.
A edição publicada em 18 de março transcreveu, na íntegra, o discurso do presidente
Vargas durante a abertura da sessão legislativa do ano de 1954. Ao mesmo tempo apresentaria
as impressões, sobre esse pronunciamento por parte, principalmente, da oposição. Podemos
constatar duas visões de país expostas através das páginas de O Globo. Uma positiva,
encontrada na fala presidencial, apontando que o Brasil estaria superando os desafios; o país
caminharia em uma direção onde o desenvolvimento econômico seria uma realidade em um
futuro próximo. Embora ressaltasse os sucessos de sua gestão, não deixou de pontuar a ação
demagógica e oportunista da oposição, que em nada contribuiria para a democracia e para o
aperfeiçoamento das instituições. Já a oposição enxergaria um “desgoverno” praticado por
Vargas, onde promessas deixaram de ser cumpridas, e a nação seria vítima desse estado de

32
O Globo edição de 4 de março de 1954.
33
Idem.
coisas, e do populismo do presidente, sem medidas efetivas para solução dos problemas que
afligiriam os brasileiros.
Duas visões conflitantes, mas que na realidade precisariam ser analisadas dentro do
contexto eleitoral que são encontradas. O governo não era modelo de eficiência, apresentava
pontos positivos, mas ainda era preciso muito mais para a construção de um país melhor.
Assim como, a narrativa da oposição que realçava os problemas, não era condizente com a
verdade. O Brasil não era uma terra arrasada, onde as instituições não funcionavam; Vargas
não planejava, a todo o momento, mais um golpe para manter-se no poder. O choque retórico,
entre oposição e governo, obscurecia a verdadeira visão sobre o país.
A manchete do dia 23 de março acrescentaria um fato novo. No já turbulento
momento político nacional, a câmara é conclamada a promover o impeachment do Presidente
Getúlio Vargas. O responsável por esta conclamação é Odilon Braga importante figura nos
quadros da UDN. Ao conceder entrevista ao jornal, emite esta posição acentuando que o
povo, de acordo com sua leitura, já está farto de Getúlio Vargas. Utilizava como recurso para
embasar sua argumentação, sobre a necessidade de impeachment, o texto atribuído a Perón.
Segundo o entendimento de Odilon Braga, Vargas tencionaria implantar uma ditadura no
Brasil. A oposição, de acordo com Braga, deveria aproveitar a oportunidade e as evidências
para promover a ação de destituir o presidente da República.
Não foi surpresa que o tema impeachment fosse abordado na edição seguinte do
jornal. Desta vez a entrevista foi concedida pelo líder do Governo Gustavo Capanema, onde
descartaria a possibilidade de impeachment de Vargas, levando-se em conta que o governo
contaria com uma base considerável para barrar tal medida. Logo, não existiria possibilidade,
segundo Capanema, de sucesso na empreitada sugerida por Odilon Braga. Além disso,
ressaltava a excepcionalidade para um processo de impeachment, e que o presidente Vargas
não apresentou nenhuma atitude que gerasse a necessidade de medida tão extrema.
Gustavo Capanema procurou refutar a ideia de impeachment em dois pontos. Por um
lado o governo contava com uma base forte no congresso para barrar a iniciativa, e por outro
lado, não existiriam razões palpáveis para esse tipo de ação contra o presidente. Mas do que
um perigo real, a hipótese de impedimento do presidente surgiria como mais uma tentativa de
desacreditar Vargas, e influenciar as articulações para a sucessão presidencial.
O jornal trouxe, em 3 de abril, uma extensa entrevista com o ex-chanceler, do governo
Vargas, João Neves. A entrevista apresentava-se como uma oportunidade para atacar o
presidente Vargas. João Neves destacaria as relações, por ele chamadas de subterrâneas, entre
o governante brasileiro e o presidente Argentino. Indicaria que enquanto permaneceu no
governo, apesar de contrariado com o tipo de relação entre os presidentes, buscou diminuir os
prejuízos ao Brasil e a solidariedade continental. Inclui nesta trama também o antigo ministro
da pasta do Trabalho, João Goulart, que seria um habitual frequentador da Casa Rosada 34.
Deixava claro que, desde o primeiro dia do governo de Getúlio Vargas, a aliança entre os
presidentes estaria posta em prática. Ressaltava que Perón, e seus objetivos, representaria um
risco para a estabilidade nas relações entre os vizinhos.
Não causa estranheza à exploração, pelo O Globo, da repercussão da entrevista do ex-
chanceler, João Neves, ao jornal. É inegável que as palavras do ex-ministro foram utilizadas,
sobretudo, pela oposição para referendar os seus objetivos, como a ideia de impeachment.
Muitas vozes da UDN levantaram-se favoráveis a deposição do presidente, aproveitando o
conteúdo da entrevista para criar o “clima”, que segundo Gustavo Capanema não existia, para
o impeachment de Vargas.
Se Vargas encontrava sérios problemas para lidar com as questões internas, onde a
oposição explorava qualquer possibilidade para causar constrangimento ao governo, é
possível afirmar que as declarações combinadas de Perón e Neves trouxeram para o debate
político a questão da política externa, e o “perigo”, segundo os opositores do governo,
representado pela aproximação entre Vargas e Perón. A disputa pelo poder no Brasil ganharia
mais um importante ingrediente, nele o chefe da nação acabaria por ganhar uma nova alcunha:
“Traidor da Pátria”.
Na primeira página, da edição de 8 de abril, O Globo apresentaria em destaque a
manchete “Cartas de Perón” em que expôs o conteúdo das seis cartas escritas por Perón a
Getúlio Vargas. Nelas, como atesta o próprio jornal, não foi encontrado nada que trouxesse
algum episódio que denunciasse relações comprometedoras entre os presidentes.
A repercussão da entrevista de João Neves obrigou o governo brasileiro a agir, no
intuito de diminuir o clima hostil que se instalava. Foi divulgada uma nota do Itamarati,
publicada pelo O Globo, em que procurava esclarecer a questão. A nota buscava ressaltar que
as relações entre Brasil e Argentina não fogem ao estabelecido com outras nações, onde
reitera a inexistência de tratados secretos com o país vizinho e nega o estabelecimento de
compromissos políticos com o governo argentino. O pronunciamento do governo, publicado
34
Sede da presidência da República Argentina, localizada em Buenos Aires.
na edição de oito de abril, procurava mostrar como naturais as tratativas entre os dois
governos.
Cabe ressaltar que o destaque dado as “Cartas de Perón”, na primeira página, não foi
concedido ao pronunciamento do governo a respeito das declarações de João Neves. A nota
do governo sem o devido realce encontrava-se, timidamente, publicada nas páginas internas
da edição.
No dia dez de abril, O Globo, publicou um editorial35, em que aborda as declarações
de João Neves. O texto inicia-se destacando que o transcorrer dos dias permitiu uma avaliação
mais serena acerca do conteúdo divulgado pelo antigo chanceler. Defendeu, João Neves, das
acusações de levantar falso testemunho sobre os fatos narrados, desqualificando aqueles que
se posicionaram contra suas palavras. Reconhece que nenhum indicativo de relações
suspeitas, entre Perón e Vargas, tenha sido encontrado, mas não deixou de sinalizar como as
ligações entre a “Casa Rosada” e o “Palácio do Catete” não eram aconselháveis, e por isso
deveriam ser vistas com cuidado.
Sem nenhuma comprovação das acusações levantadas por João Neves, o editorial
procurou relativizar o que foi exposto. Protege o ex-chanceler e ressalta o caso como
exemplar para o debate político, tendo em vista que permitiu ao governo se posicionar sobre o
caso, apresentando dados que excluíam a possibilidade de “traição” de Vargas. Para O Globo
o episódio reforçou as instituições democráticas, embora, o interesse em desqualificar Vargas
mostrava-se mais relevante que o respeito à biografia do presidente.
Em dezenove de abril, chama atenção uma notícia que abordaria o lançamento de um
livro de autoria do presidente Getúlio Vargas. Intitulado “O Governo Trabalhista do Brasil”
era uma coletânea de discursos pronunciados pelo governante entre setembro de 1951 e maio
de 1952, incluindo ainda a mensagem enviada ao congresso, em razão da abertura dos seus
trabalhos no ano de 1952.
A abordagem sobre obra lhe atribuía grande importância documental, ainda mais em
razão do autor ser precisamente o governante da nação, logo o mais abalizado para tratar dos
temas apresentados. Destacava a linguagem acessível e concisa do texto, em relação condução
que faz de sua administração.

35
O Globo edição de 10 de abril de 1954.
A notícia publicada, assim podendo ser entendida, tratava-se de matéria paga, no
sentido que o texto “vende” o produto de forma bastante elogiosa, contrastando com a atitude
geral tomada em relação ao presidente Vargas.
A respeito do pronunciamento realizado por Vargas em Ouro Preto, em razão da
comemoração do dia vinte um de abril, O Globo trouxe mais um editorial crítico ao
presidente. Atribuiu ao presidente uma atitude oportunista ao comparar-se ao mártir
“Tiradentes”, e rebate a posição do presidente frente ao que ele julga perseguição dos
oposicionistas. O texto colocava que as críticas eram justas e de total responsabilidade do
presidente, que não foi capaz de tomar atitudes capazes de sanar os problemas. Mas em
atitude conciliatória, critica os excessos cometidos, como as ofensas a honra do presidente,
condenando esta prática. Mas no geral, o conteúdo é bastante agressivo a administração
realizada por Vargas.
Um recurso bastante interessante praticado pelo jornal diz respeito ao fato do leitor
tomar contato primeiro com o editorial do jornal, apresentado na primeira página, e só a
seguir, mais precisamente, na página dois ter acesso aos pontos abordados pelo presidente em
seu pronunciamento. Nesse caso, a leitura particular sofre uma interferência externa, um
direcionamento claro, que em última instância pode exercer influência sobre o julgamento do
leitor.
Nas duas últimas edições do mês de abril, 29 e 30 de abril, a questão do salário
mínimo teve grande realce. A divulgação, oficial, do novo piso, que, em tese, sofreria
algumas variações, se realizaria em primeiro de maio, por pronunciamento do Presidente da
República.
O Globo obteve declaração do Ministro da Fazenda, Oswaldo Aranha, a respeito dos
índices relativos ao salário mínimo. Segundo o ministro, mais do que o valor quantitativo em
si, o que se deve ponderar eram dois fatores: assiduidade e produtividade. Esses deveriam ser
entendidos como a mola mestra para que os objetivos econômicos do país pudessem ser
alcançados, bem como para estabelecer uma “relação harmônica” entre empregados e
empregadores.
A manchete do dia trinta mostra como o pensamento do ministro vai de encontro ao
que a linha editorial do jornal julga como adequada. Estamparia na primeira página em letras
garrafais: “Salário mínimo só com assiduidade integral36”. Ainda nesta edição, aponta a
inclinação do presidente da República em manter o valor de Cr$ 2400,00 para o salário
mínimo no Distrito Federal. Este valor que foi motivo de tantas querelas e discussões nos
meses anteriores. Não por acaso, O Globo trouxe um editorial abordando o tema.
Intitulado “Demagogia, contra todo bom senso37” o editorial acusava Getúlio Vargas
de contrariar a opinião das “classes produtoras”, leiam-se patrões, e do parecer técnico do
Ministro da Fazenda para elevar os níveis do salário mínimo a patamares absurdos. Segundo o
editorial, longe de promover alento para os trabalhadores, o novo índice, seria responsável por
trazer sérios problemas econômicos e sociais. Textualmente afirma que o “novo salário
mínimo” é mais que um erro, apresentava-se como um crime contra a estabilidade do país.
Por fim, o editorial se encerra alertando que a atitude do presidente pode-se configurar em um
golpe contra os trabalhadores e contra a própria nação.
Esse último editorial não trouxe nenhuma novidade em relação à posição do jornal
frente ao novo salário mínimo. Manteve o tom acusatório e alarmista com que tratou o tema
em outras ocasiões. Continuava a atribuir a medida, que ainda não havia sido assinada, do
presidente como populista e contrária aos interesses gerais da nação. Colocava os
trabalhadores e patrões como “vítimas” das pérfidas ações de Getúlio Vargas, cujo objetivo
seria, apenas, perpetuar-se no poder. A utilização da palavra “golpe”, ao final do texto, não foi
feita de forma aleatória.
A primeira edição do mês de maio foi publicada apenas no dia três. E como não
poderia deixar de ser, traria, com muito alarde, as impressões sobre o novo salário mínimo
implantado no país, anunciado dias antes no discurso de “Primeiro de Maio”. Os destaques
dados, pelo jornal, apresentariam para qualquer pessoa, distante da realidade do país, um
assustador cenário de “terra arrasada”. A primeira página exibiu notícias como “Consequência
imediata do salário mínimo: fecharam todas as fábricas de Barbacena38” ou “Preparando a
catástrofe que o arrastará consigo39”, esta última, repetida pelo deputado Raul Pilla em
referência ao ato de Getúlio Vargas. Fica nítida a linha adotada pelo jornal para apresentar a
nova medida seguida pelo governo, na prática, apenas manteve um discurso coerente com o
ponto de vista seguido nos meses anteriores.

36
O Globo edição de 30 de abril de 1954.
37
O Globo edição de 30 de abril de 1954.
38
O Globo edição de 3 de maio de 1954.
39
Idem.
Enquanto a oposição, e as classes patronais, apontavam o como “demagógica” a
medida adotada por Vargas, o presidente contra-atacava afirmando que, aqueles contrários ao
reajuste, eram na verdade contra a classe trabalhadora, interessados na manutenção do mesmo
estado das coisas. Ou seja, o debate sobre o novo salário mínimo apenas expusera os dois
projetos de país que estavam em jogo naquele momento, e as eleições, que se aproximavam,
acirravam ainda mais esse embate.
As edições dos dias 24, assim como, do dia 25 do mês de maio levantariam questões
fundamentais para o cenário político brasileiro. No dia vinte e quatro a manchete destacava o
posicionamento do ex-presidente Eurico Gaspar Dutra, em que defende o respeito à carta
Constitucional, pois somente desta maneira seria possível coibir golpes. Já no dia seguinte, o
tema de maior relevância diz respeito à fala do líder do governo na câmara, Gustavo
Capanema, repudiando a existência de atividades subversivas dentro do governo. Tal
afirmação é uma resposta à pretensão do deputado Joel Presídio de instaurar uma Comissão
Parlamentar de Inquérito para apurar ação antidemocrática do Executivo. Apelaria, ao
deputado Presídio, que o instrumento da CPI não deveria ser banalizado, tendo vista que,
segundo Capanema, tais ações não existiriam dentro do governo.
Durante o mês de maio, o jornalista Nestor Moreira40 foi vítima de uma ação
desproporcional41 por parte polícia, que teve grande repercussão no jornal, ainda mais quando
do seu falecimento42 em razão dos ferimentos sofridos. O peso do acontecimento foi tão
grande, que envolveu inclusive o Presidente Getúlio Vargas, que se viu obrigado a responder
a situação de maneira enérgica e apresentar os responsáveis pelo crime. Vargas, inclusive,
chegou a receber a imprensa para tratar do tema. O crime, longe de representar um problema
de responsabilidade do governo, não deixou de ser aproveitado para ataques ao presidente.

40
Repórter do Vespertino A Noite.
41
Na noite do dia 12 o repórter Nestor Moreira saindo bêbado de uma festa no Drink’s Bar, pegou um táxi, ao
chegar em sua residência discordou do preço da corrida e exigiu que o motorista seguisse com ele para o 2
Distrito Policial em Copacabana. Ao chegarem, lá foram recebidos pelo guarda civil Paulo Ribeiro Peixoto,
vulgo Coice de Mula. Este ao perceber quem era o queixoso, opositor do governo em várias matérias no jornal,
conduziu-o com truculência ao xadrez onde foi revistado não sem antes ter sua carteira tomada. Após a revista e
ser liberado o repórter deu falta de mil cruzeiros, ao se queixar com Coice de Mula, foi derrubado ao chão e
espancado a botinadas na vista do motorista e por outro guarda, que nada fizeram. Tendo sido então
encaminhado ao Comissário de Polícia como um criminoso, na base da gravata, ao chegar no gabinete do mesmo
reclamou com o comissário da violência sofrida. O comissário reconheceu o repórter e o liberou imediatamente,
pagando do próprio bolso a diferença da corrida de táxi, mas nada fazendo em relação a agressão sofrida e contra
o agressor.
42
O Jornalista Nestor Moreira faleceu, em decorrência dos ferimentos, em 22 de maio de 1954.
A atitude crítica de Nestor Moreira, em relação ao governo Vargas, foi utilizada pela
oposição para politizar o episódio, transformando o acontecimento em um ato de
revanchismo. A violência praticada contra o jornalista, que acabou por levá-lo a óbito, seria
resultado direto de suas posições políticas. Esta era a narrativa que os opositores do presidente
pretendiam que prevalecesse.
Não foi casual, na edição de 26 de maio, o Chefe da Casa Militar da Presidência da
República, Caiado de Castro, conceder entrevista a O Globo. Segundo Castro, havia uma
evidente tentativa de politizar um crime brutal, com o único objetivo de constranger o
Presidente da República. Afirmou que o governo tomou todas as medidas possíveis para punir
os responsáveis, pela ação desastrosa, não existindo motivos para críticas ou acusações por
parte da oposição.
O turbulento mês de maio encerrou-se mantendo a temperatura política elevada no
país. Foram noticiadas as trocas de acusações entre o Ministro da Justiça e a UDN. Além das
turbulências internas no governo, que colocariam em xeque a permanência de Oswaldo
Aranha a frente do Ministério da Fazenda. As especulações, a esse respeito, foram sempre
acompanhadas de negativas por parte do Ministro. Mas era inquestionável que o ambiente
dentro do governo não era dos melhores, as divergências entre Vargas e Aranha eram cada
vez mais evidentes, e O Globo sempre que possível explorou esta situação.
O principal assunto discutido na primeira página do jornal, em 2 de junho, diria
respeito ao início da discussão sobre o Impeachment do presidente Getúlio Vargas. A base
para acusação de crime de Responsabilidade, do Presidente da República, estaria relacionada
aos casos da “Comissão Central de Preços43” e “Última Hora”, os dois geraram CPI’s que
foram presididas pelo deputado Castilho Cabral. O jornal indicaria que a questão
proporcionaria um duelo de oratórias, onde as partes tentariam da melhor forma possível fazer
com que seu ponto de vista prevalecesse.
A pauta a respeito do impeachment continuava a ser um dos principais assuntos
abordados pelo jornal no dia 4. A linha seguida pelo jornal, na apresentação desse noticiário,
enfatizou o embate entre o governo e oposição, cada qual defendendo suas posições. O
presidente era o alvo preferencial da oposição, com ataques diretos a sua pessoa. Da mesma

43
Órgão criado em 1946, subordinado ao Ministério do Trabalho, indústria e Comércio, cuja competência seria
evitar a elevação do custo de vida no país e providenciar para a redução ou fixação aos preços. Tabelar os preços
máximos de serviços essenciais ou da venda de gêneros ou utilidades essenciais, entre outras atribuições.
forma os deputados governistas, em contrapartida, voltavam as suas atenções para atacar a
UDN, acusada de conduzir uma farsa. Nesse momento a retórica, talvez fosse, a principal
arma utilizada pelos parlamentares.
O editorial “APELO AO BOM SENSO44” publicado em 5 de junho traria uma posição
objetiva, talvez até definitiva, do jornal frente ao processo de Impeachment. Entre outras
coisas reconhece que a iniciativa não teria sucesso, em última análise representaria uma
aventura, que não produziria benefícios para o país. O Globo evocou o seu caráter imparcial, e
acima das paixões políticas, para decretar que o momento, às vésperas das eleições, não
deveria ser desperdiçado em querelas sem sentido, mas sim em renovar o congresso e criar
condições saudáveis para a realização das eleições no ano seguinte. É possível dizer que, o
jornal, no caso do impeachment não pouparia criticas a oposição e nem ao governo, que
seriam responsáveis pelos descaminhos vividos no atual cenário.
O conteúdo do editorial demonstrava com clareza a repulsa, por parte do jornal, em
relação à teoria do impeachment, apesar das contrariedades em relação a Vargas, esta linha,
que poderia ser entendida como “golpista”, não foi abraçada pelo jornal. O Globo indicaria
que a direção a ser seguida era a de respeito à ordem institucional. Era aceitável contribuir
para a queda de ministros, mas, até o presente momento, não a de presidentes.
Eurico Gaspar Dutra era uma figura utilizada pelo jornal O Globo quando pretendia
fazer valer determinado ponto de vista. A reconhecida autoridade e influência do velho
Marechal era bastante conveniente em momentos chave do debate político. Não foi por outro
motivo que as vésperas da votação do processo de impeachment, em onze de junho, o ex-
presidente concedeu entrevista ao jornal, em que de maneira categórica se coloca contra o
impeachment. Apesar da posição contrária, em relação ao impeachment, defende que os
deputados tenham autonomia em seu voto, mas ainda assim reiterou que “conversaria” com
deputados amigos sobre a sua leitura a respeito do episódio.
Ao recorrer à posição do Marechal Dutra, O Globo trabalhava em prol da tese de que o
impeachment era um equívoco, e por isso não deveria ser levado adiante. O jornal não
ofereceu duas opiniões a respeito da questão, forneceu aos seus leitores uma orientação clara
de que o processo de impeachment deveria ser rejeitado.
Na mesma edição, o editorial publicado trata das eleições de três de outubro. Mostrava
como as eleições representariam uma oportunidade para passar o país a limpo. Também
44
O Globo edição de 5 de junho de 1954.
aproveitava o espaço para criticar as atuações tanto do governo, aqui em todas as esferas, e da
oposição no processo eleitoral. Segundo o editorial, o ponto chave a ser seguido seria o
respeito ao funcionamento das instituições, o país não deveria ficar sujeito a aventuras
“golpistas” sejam de que lado for.
A manchete do dia 15 de junho relataria o fim da chamada “Batalha do Impeachment”,
com a vitória da tese defensora da manutenção de Vargas na Presidência da República.
Prevaleceu entre os deputados, mesmo aqueles contrários ao presidente, a visão de respeito à
ordem institucional, ou seja, Vargas deveria ser “tolerado” na Presidência da República.
Partidários de Vargas aproveitaram o momento para atacar, sobretudo, a UDN como
articuladora de um “golpe branco” para depor Getúlio Vargas. Encerrada a questão do
impeachment, a disputa eleitoral retornaria com toda força.
Em 5 de julho, O Globo relataria a apreciação do Supremo Tribunal Federal sobre o
mandato de segurança impetrado pela Indústria sobre o novo salário mínimo, e que a decisão
a respeito do tema se daria em breve. Ainda nesta mesma edição, o jornal apresentaria um
editorial em que à relação de Vargas com o seu ministério é o centro da análise.
O editorial intitulado “Instabilidade Ministerial45” procuraria demonstrar como as
constantes trocas ministeriais, realizadas por Vargas, prejudicariam o bom andamento dos
projetos governamentais. Defendeu os ministros ao afirmar que, na maioria dos casos, eram
homens de grande capacidade técnica e intelectual, mas que tiveram sua atuação prejudicada
pelo método de trocas constantes realizadas por Vargas, que segundo o jornal, atenderiam aos
interesses pessoais do presidente. O jornal ainda alerta que após as eleições de outubro uma
nova ciranda ministerial seria realizada, em grande prejuízo a nação.
Em dezenove de julho, a primeira página do jornal traria uma notícia no mínimo
pitoresca. Com o título “Escolhido um getulista para candidato da UDN46” tratava-se da
indicação de João Cleofas como candidato da UDN ao governo de Pernambuco. Este caso,
noticiado nas edições anteriores, foi visto pela UDN, de outras regiões, como um ato de
traição de alguns adeptos da sigla na seção pernambucana.
Dois pontos mereceram desenvolvimento aqui, primeiro as rusgas internas dentro da
UDN, que estava longe de representar um bloco coeso contra o “getulismo”, muito pelo
contrário, como bem lembrou em outro momento o ministro Tancredo Neves. A UDN era

45
O Globo edição de 5 de julho de 1954.
46
O Globo edição de 19 de julho de 1954.
incapaz de fazer uma oposição construtiva, e na prática era afeita a cargos na administração
pública. Outra questão diz respeito à capacidade de articulação e atração exercida por Getúlio
Vargas, capaz de produzir desavenças no seio do principal partido de oposição ao seu
governo, à capacidade de articulação do presidente era algo que saltava aos olhos e
atemorizava os seus inimigos.
Em vinte de julho de 1954, O Globo, através de um editorial aborda a questão
envolvendo Vargas, UDN e o candidato ao governo de Pernambuco. No texto, com uma clara
referência a situação pernambucana, envolvendo João Cleofas, o intervencionismo de Vargas
no processo eleitoral é severamente criticado. Acusando o presidente de práticas que atentam
contra a moral, e com artimanhas que produziriam traições como a de Cleofas. Mais do que
tudo, o editorial era um forte documento que visava, diante da aproximação de três de
outubro, intervir no cenário das eleições, em favor dos opositores do presidente Vargas.
O episódio envolvendo João Cleofas foi tão relevante, nesses dias de julho, que
ganhou um editorial específico no dia vinte e um. Novamente, o personagem central é tratado
como traidor. Dessa forma, assim como seus seguidores, deveria ser expurgado do partido.
Não restam dúvidas que os acontecimentos em Pernambuco representariam a oportunidade
para O Globo reforçar a necessidade de uma UDN forte e coesa para que tivesse reais
possibilidades de obter um saldo positivo nas eleições, derrotando assim as articulações do
presidente Vargas. Não custa lembrar que os resultados das eleições de 1954 teriam grande
peso político na eleição presidencial do ano seguinte.
Um novo editorial, abordando a condenação de João Cleofas por seu partido, foi
publicado na edição de 28 de julho. Identificava-se a satisfação pela atitude tomada pela
direção da UDN, que condenou João Cleofas, assim como inviabilizou sua candidatura ao
governo de Pernambuco. Segundo o texto, ao agir de maneira exemplar, a UDN, recuperou a
credibilidade dos “homens de bem” no partido, demonstrando que o mesmo não se submeteria
a acordos e subterfúgios para chegar ao poder.
O caso João Cleofas possibilita identificar o “udenista” como “corrupto” e Getúlio
Vargas como “corruptor”. Figuras sinistras responsáveis por comprometer a lisura do
processo eleitoral. Com a atitude tomada, a UDN apresentava-se como frontalmente contra a
essa forma de fazer política, contribuindo, com sua atitude, para oxigenar a política nacional.
Bem pelo menos era essa a ideia que o jornal, com seus editoriais e suas reportagens sobre o
episódio Cleofas buscava passar para seus leitores.
O primeiro número de O Globo no mês de agosto, publicado no dia dois, tinha em sua
capa um editorial47, cujo conteúdo aproveitaria uma fala de João Goulart, empenhado na
campanha para sucessão estadual no Rio Grande do Sul, para tecer críticas contundentes ao
presidente Vargas. Citaria como João Goulart alertava sobre a apatia dos trabalhadores
gaúchos em relação ao processo eleitoral, evocando a necessidade de maior empenho e
participação. A partir daí, o editorial montaria uma argumentação cuja explicação para a
apatia seria resultado das práticas de Getúlio Vargas, responsáveis pelo aumento do custo de
vida e pelo descrédito em relação aos políticos. Criticaria Vargas por apresentar-se como o
verdadeiro responsável pela salvação nacional, onde os acertos, no governo, eram fruto de sua
habilidade administrativa, já os fracassos seriam fruto da incompetência de seus auxiliares,
fato relacionado à constante troca de ministros. Ainda no texto é possível identificar a repulsa
a uma posição de João Goulart, que atribuiria às dificuldades do país a atuação nociva do
legislativo que, segundo Goulart, impediria a plena realização dos planos de Vargas. De
acordo com o editorial, esta argumentação serviria, apenas, para proteger o “seu chefe”,
Getúlio Vargas, tirando dele as suas responsabilidades.
Na mesma edição, o jornal tomaria uma atitude aparentemente contraditória, levando-
se em conta o oportunismo das disputas políticas verificadas a época, mas, pelo que é possível
observar, constitui uma atitude de fidalguia do jornal, e de respeito às instituições, inclusive à
da Presidência da República.
A matéria cujo título era “A figura do Presidente” cita como o presidente Vargas, nas
instalações do Hipódromo da Gávea, foi vítima de manifestações de desapreço por parte dos
presentes no local. O jornal assumiria a postura de respeitar as manifestações de aprovação ou
desaprovação praticadas pelos cidadãos. Ressaltava que na democracia esse tipo de atitude era
totalmente válida. Entenderia, entretanto, que em certas ocasiões, os titulares de determinados
postos deixam de ser meros políticos, para figurarem como verdadeiros representantes,
delegados do país, e como tais deveriam ser respeitados. Sendo assim, apesar dos equívocos,
segundo a notícia, cometidos por Vargas ele ainda era o titular da mais alta posição da
República, e por isso mereceria respeito. O local, repleto de personalidades internacionais,
não se apresentava como espaço adequado para exposição, não do presidente, mas do próprio
país. A matéria é encerrada lembrando que o lugar ideal para a manifestação contra o
presidente, e os políticos em geral, seriam as urnas, durante as eleições de três de outubro.
47
O Globo edição de 2 de agosto de 1954.
O jornal procurava demonstrar profundo respeito pelo cargo de Presidente da
República, independente de quem fosse o ocupante. Quem lá estivesse mereceria todo
respeito que a posição oferece ao ocupante. Ao mesmo tempo, a matéria representava mais
uma oportunidade para estimular a participação eleitoral, contra Vargas e seus representantes,
nas próximas eleições.
No dia cinco de agosto, a manchete do jornal retrataria de forma marcante, talvez, o
primeiro passo para o ocaso definitivo do Presidente Getúlio Vargas. Tratava-se do atentado
contra a vida do jornalista Carlos Lacerda, uma das principais vozes de oposição ao
presidente. Apesar de não ter sido vitimado fatalmente, o episódio produziu o óbito de um
militar da aeronáutica, que acompanhava o combativo diretor da “Tribuna da Imprensa”.
Além das imagens do jornalista vitimado pelo atentado, a primeira página dedicou-se
por completo a uma minuciosa descrição de como o crime foi planejado e executado.
Incluindo um esboço da ação realizada pelos criminosos, apontando, desde o primeiro
momento, que os criminosos teriam ligações com o Palácio do Catete. Esse fato deixava
subtendida a participação do próprio Presidente da República, ou pessoas a ele ligadas, no
trágico atentado.
Como não poderia deixar de ser a edição de seis de agosto traria um editorial
abordando o atentado contra a figura do jornalista Carlos Lacerda. O editorial, após abordar o
crime em si, concentraria a sua atenção no Presidente da República. De antemão descartava a
possibilidade de participação do chefe da nação no atentado. Apesar dos erros
administrativos, de acordo com a interpretação do jornal, e das divergências de O Globo com
o governante, o editorial procurava isentar Vargas de responsabilidades pelo crime. Ao
mesmo tempo cobraria, para eliminar quaisquer dúvidas sobre a sua inocência, a necessidade
de uma ação firme para elucidação do atentado. Solicitava que a chefia das investigações
fosse entregue a alguém com grande reconhecimento da “opinião pública”, e não ficando a
cargo de agentes do Poder Executivo. O presidente, de acordo com o editorial, encontrava-se
em uma encruzilhada: ou atendia os clamores por justiça e tomava ações efetivas em relação
ao acontecido na Rua Toneleros, ou só lhe restaria uma saída a “renuncia aos deveres e
compromissos contraídos com o povo nas urnas de 1950”.
Mesmo que de forma sutil, o atentado ao jornalista Carlos Lacerda foi responsável
por uma mudança na relação entre O Globo e o presidente da República. Ao longo da
investigação, nos exemplares do jornal, ficaram claras as divergências entre a visão de Estado
do jornal e do presidente da República, inúmeras foram às vezes em que Vargas e alguns de
seus auxiliares foram severamente criticados. Entretanto, não havia nessas críticas menção a
qualquer tipo de abreviação do mandato presidencial, havia o claro desejo de respeito à ordem
institucional. Todavia agora, no editorial do dia 6 de agosto, diante da forma como Vargas
desse encaminhamento à investigação do caso, o jornal, pela primeira vez, cogitaria que o
presidente deveria renunciar ao seu cargo. Percebe-se então como o crime teve um impacto
devastador na sociedade brasileira, e como a sua elucidação tornava-se vital para o futuro
político de Getúlio Vargas.
Além do editorial, a primeira página da edição do dia 6 de agosto traria inúmeras
informações sobre o atentado e dos primeiros elementos a respeito da investigação. Também
traria a declaração do líder da maioria, Gustavo Capanema, em nome do governo para isentar
o presidente de responsabilidades em relação ao crime. Assim como, seu desejo para rápida
elucidação do caso. Foi encontrada no jornal ampla possibilidade para o governo, entenda-se
Vargas, defender-se das acusações que ligavam o Palácio do Catete ao atentado.
Em 7 de agosto, o jornal apresentou declarações do presidente Getúlio Vargas assim
como do Ministro da Justiça Tancredo Neves. A manchete do jornal deixaria clara a posição
do chefe da nação, dizia ela: “Esses assassinos são os meus inimigos48”. É nítido como, para o
presidente, o crime cometido traria para si sérios problemas políticos, e contribuiriam para
tornar ainda mais difícil as ações do governo. Afirmaria Vargas “esses agressores vieram
perturbar a paz pública e provocar contra a minha pessoa e o meu governo essa onda de
suspeições tão injustificáveis49”. Já Tancredo Neves declararia que “o maior interessado na
apuração do crime é o governo50”.
Na edição de 10 de agosto O Globo publicaria um duro editorial, onde apontaria que o
crime cometido contra Carlos Lacerda seria na verdade o ápice de uma sucessão de erros
cometidos por Vargas desde seu retorno ao Palácio do Catete. Indicaria que a recondução de
Vargas a presidência da Republica representaria uma oportunidade de reparar os erros
cometidos no passado, mas o que se viu, segundo o editorial, foi um governo titubeante, que
aliciou políticos e foi conivente com a corrupção. Criticou a guarda pessoal de Getúlio
Vargas, de onde teriam saído responsáveis pelo atentado a Carlos Lacerda, apontando a

48
O Globo edição de 7 de agosto de 1954.
49
Idem nota 157.
50
Idem nota 157.
contradição de um presidente caracterizado pela calma e prudência, contar com um aparato de
segurança digno de ditadores e não de um presidente constitucional. Reconheceria a atitude de
Vargas em extinguir a guarda presidencial, e por fim sinalizaria que o conturbado momento
não poderia colocar em risco o funcionamento das instituições, e por isso mesmo todas as
garantias deveriam ser dadas para a realização das eleições de três de outubro.
Nesse editorial, em específico, acompanhamos um ataque político frontal a Vargas. O
atentado ocorrido na Rua Toneleros serviria de base para que o jornal reforçasse sua posição
crítica ao governo Vargas. Ficaria claro que acima de tudo era interesse do jornal estimular a
derrota eleitoral de Vargas, sem recorrer a nenhum artifício golpista, ou de natureza
conspiratória que enfraquecesse a ordem institucional vigente. Aparentemente, o jornal
percebeu que a deposição de Vargas, forneceria ao mesmo a condição de construir uma
narrativa em que se colocaria como vítima de conspirações das forças conservadoras. Acima
de tudo Vargas precisava ser derrotado nas urnas, mesmo que em três de outubro de 1954 não
fosse ele o candidato.
Em editorial publicado em 12 de agosto com o pitoresco título “O feixe das varas e a
união das classes armadas51” O Globo procurou ressaltar o papel das forças armadas na crise
política que afligiria a nação, e que a união dos militares era fundamental para resguardar a
ordem. Clama para que os militares, unidos, não se submetessem a vontade de políticos, e
cumprissem o seu dever constitucional para com o Brasil. Nesse ponto os militares não
deveriam enveredar por um caminho que conduzisse a aventuras golpistas de parte a parte.
Entretanto, o último parágrafo acabou por soar contraditório, pois afirmaria que “O feixe de
varas é ainda um símbolo para a redenção do Brasil nestes dias difíceis”. Entende-se, então,
que para o jornal seria aceitável a quebra da ordem institucional, desde que fosse praticada
pelos militares, foi essa a impressão passada.
O dia 13 de agosto apresentaria outro editorial de O Globo. Dessa vez, a abordagem
do texto trataria do discurso proferido por Vargas em sua visita a Minas Gerais. Segundo o
editorial, Vargas recorreria a uma prática contumaz de atacar para se defender, atribuindo a
oposição o “clima de anarquia” reinante no país. Acusaria o presidente da inversão dos
papéis, em que as vítimas seriam transformadas, pelo chefe da nação, nos verdadeiros réus.
Caracterizava a guarda pessoal do presidente como um antro de criminosos liderados pelo

51
O Globo edição de 12 de agosto de 1954.
“Tenente Gregório52”, o chefe da extinta guarda, que com seu depoimento complicou ainda
mais a situação do governo. O editorial lembraria aos leitores os compromissos do jornal com
a apuração do crime, mas também com o respeito às instituições brasileiras. Por esse motivo,
repudia a atitude do presidente que ao invés de trazer palavras de tranquilidade torna, com sua
oração, o momento ainda mais turbulento e incerto para o país.
Não restam dúvidas que nesse momento observamos um duelo de retórica entre o
governo e os seus oponentes. As palavras ditas, ou escritas, são minunciosamente pensadas
para atingir o respeitável público. Essa constatação ganharia mais força, quando o editorial
apontava a capacidade do brasileiro em não aceitar mais qualquer tipo de argumentação, em
clara referência a capacidade de Vargas “hipnotizar” as pessoas com seu discurso. Atestaria o
editorial, que Vargas precisaria entender “que está falando a uma nação no pleno gozo da sua
maioridade, com um senso crítico apurado e atento aos menores movimentos de baixo e de
cima53”.
Apesar das negativas do presidente, do compromisso de punir os culpados, não
importando a proximidade junto a sua pessoa, as evidências indicavam um difícil caminho
para o chefe da nação. Era, praticamente, impossível dissociar a participação de Vargas no
crime contra o jornalista Carlos Lacerda. Nesse ponto, o noticiário do jornal ofertaria a
oposição, um extenso material para realizar ataques ao presidente, que se encontrava em uma
posição defensiva, e sem muitas perspectivas de reverter o quadro.
Em 17 de agosto a primeira página do jornal foi dedicada, integralmente, a noticiar a
prisão de Climério Eurides de Almeida. Com grande espetacularização do ocorrido,
concederia ares de epopeia à ação, conferindo dramaticidade a todos os passos da prisão.
Na mesma edição, o senador Aloísio de Carvalho colocaria em pauta a necessidade de
renúncia do presidente. Alude à constituição de 1891, que criou um dispositivo, chamado de
válvula de segurança democrática, que seria a instituição da vice-presidência. Ou seja, o vice-
presidente não seria um cargo meramente decorativo, pelo contrário, representaria uma forma
de garantir o bom funcionamento do sistema político. Sendo assim, caberia a Getúlio Vargas a
dignidade de renunciar ao seu cargo, permitindo que a nação seguisse o seu caminho, sem
maiores constrangimentos. O senador faz questão de ressaltar que não se tratava de um “golpe

52
Gregório Fortunato chefe da guarda pessoal responsável por proteger o presidente Getúlio Vargas.
53
O Globo edição de 13 de agosto de 1954.
branco”, mas algo previsto dentro da carta constitucional, diante da falta de condições,
segundo o senador, para Vargas permanecer no seu posto.
Cada vez mais era enfatizada a falta de condições de Vargas manter-se no poder. Não
era o caso mais de derrota-lo nas eleições, aparentemente, ele já se encontrava derrotado. A
saída mais digna, para o chefe da nação, seria exatamente renunciar ao cargo. Para muitos,
esta surgiria como a alternativa mais digna para Getúlio Vargas abandonar o poder.
Em editorial54 publicado em 20 de agosto O Globo criticaria a postura do líder da
maioria, Gustavo Capanema, que não se dobrava as evidências e não admitia a renuncia do
presidente Getúlio Vargas. Destacava que o líder assumiu uma postura de guardar o mandato
do chefe da nação, desconsiderando os apelos da oposição em prol do seu afastamento. A
alegação de Capanema, criticada pelo editorial, é que não existiria unanimidade nem na UDN
para ser considerado o afastamento de Vargas. Para o líder da maioria era prioritária a
apuração de todos os fatos relativos ao atentado, antes disso, falar em renúncia seria uma
precipitação. A análise de O Globo caminhava no sentido de que Capanema agiria mais como
um líder partidário, mais preocupado na defesa do presidente do qualquer outra coisa.
O Globo defenderia a ideia de que a melhor saída para a situação consistia na renuncia
de Getúlio Vargas. Entendia-se que o afastamento do presidente não deveria ocorrer por um
golpe, recorrendo-se aos militares para depor Vargas, por exemplo. Um golpe poderia gerar
uma situação favorável ao presidente, pois poderia capitalizar a seu favor a simpatia de
muitos, e fortalecer a ideia que a ordem democrática foi rompida. Todos os esforços deveriam
ser feitos para que a renúncia se tornasse a única opção para Getúlio Vargas.
Se nas edições anteriores do jornal a ênfase no atentado marcava as manchetes, na
edição de 23 de agosto, a manchete tratava de forma categórica da renuncia de Getúlio
Vargas, sobre diferentes perspectivas. Podemos constatar que Vargas, nesse momento, não era
mais o senhor da situação, e apesar de rejeitar a renuncia, como uma possibilidade, o
desenrolar dos acontecimentos não indicavam outra possibilidade.
Em alto relevo o jornal destacaria a sugestão do vice-presidente, Café Filho, de uma
dupla renúncia que abriria caminho para uma solução negociada, e que, em tese, encerraria a
crise. Ainda na primeira página apareceram indicativos de que Vargas não considerava esta
possibilidade. “O Presidente da República recusa-se a renunciar55” deixava para todos a

54
O Globo edição de 21 de agosto de 1954.
55
O Globo edição de 23 de agosto de 1954.
impressão de que a posição de Vargas era firme, e aparentemente não estava sujeita a
mudança. A declaração do Ministro da Guerra reforçaria ainda mais esta constatação, disse
ele que “O Getúlio só renunciará depois de morto56”. Os acontecimentos futuros confirmaram
às palavras do ministro.
Com o editorial “O Momento de pensar o Brasil”, publicado na versão vespertina do
jornal 23 de agosto, O Globo, destacou que manteve a firme defesa da ordem jurídica e que
não se deixou levar pelas paixões como acontecera com tantos políticos experientes. A partir
daí, o texto demonstraria a impossibilidade da permanência de Getúlio Vargas no poder, e de
forma explicita garantiria que o presidente sairia do posto voluntariamente ou coagido, não
havendo outra possibilidade. Sinaliza que Café Filho, vice-presidente, contaria com total
respaldo para conduzir o país, estando plenamente amparado pelos trâmites constitucionais.
Por fim, sugere a Vargas, em um gesto de grandeza, aceitar a proposta de renuncia conjunta
proposta por Café Filho, abrindo espaço para que, de forma indireta, o congresso escolhesse
um novo presidente até o final do mandato.
O editorial procurava demonstrar que o clima de “acefalia” no governo fazia com que
a saída de Vargas fosse um fato não consumado, mas irreversível. A mensagem passada aos
leitores era de que todas as instituições funcionavam perfeitamente; o legislativo e as Forças
armadas, por exemplo. A única instituição que não estava funcionado de forma adequada era
exatamente a presidência da República, logo trocar o presidente seria fundamental para que o
país fosse recolocado no caminho certo.
No dia 24 de agosto de 1954 O Globo nos apresentaria o ápice da campanha que
incentivava Getúlio Vargas a deixar o Governo, da forma como havia previsto dias antes o
Ministro da Guerra, o presidente realmente abriu mão de seu cargo, e O Globo com grande
destaque noticiou com a seguinte manchete “SUICIDOU-SE O SR. GETÚLIO VARGAS – O
CHEFE DO GOVERNO DESFECHOU UM TIRO NO CORAÇÃO NOS SEUS
APOSENTOS57”.
O jornal traria uma série de informações a respeito da tragédia. Apresentou
declarações do, agora, presidente Café Filho, a nota oficial e a revelação de uma carta deixada
por Getúlio Vargas. A famosa “Carta Testamento” foi publicada pelo O Globo em sua
primeira página. No documento, Vargas, procurava fazer um roteiro de suas realizações e dos

56
Idem.
57
O Globo edição de 24 de agosto de 1954.
grupos que contra ele trabalharam, bem como contra o povo brasileiro. Assumir-se-ia como
mártir, já que sacrificaria a própria vida em nome de uma causa, e que dessa forma eternizaria
o seu nome na história.
Sobre a nota oficial publicada no jornal, ela trataria de que o presidente, em comum
acordo, com seus ministros, teria aceitado licenciar-se do cargo, passando o cargo ao seu
substituto legal, com a condição de que fosse “mantida a ordem, respeitando os poderes
constituídos e honrados os compromissos solenemente assumidos perante a nação pelos
oficiais-generais de nossas Forças armadas”. Vargas completaria a nota reforçando, de certa
forma, o conteúdo da “Carta Testamento” relataria que caso as condições não fossem
cumpridas “persistiria inabalável no seu propósito de defender as suas prerrogativas
constitucionais com o sacrifício, se necessário, de sua própria vida”.
Os dois documentos nos demonstram que o suicídio, de acordo com as evidências, não
seria fruto de uma atitude intempestiva, mas fruto de uma reflexão profunda de Getúlio
Vargas. A saída negociada, licença da presidência, que possibilitasse o seu retorno ao cargo,
talvez não tivesse sido aceita por alguns setores, logo, percebendo que a sua retirada seria algo
definitivo, ele não teria possibilidade de ser reconduzido a presidência. Entendeu que para a
preservação de sua honra e da sua biografia, o suicídio aparecia como alternativa mais viável.
Entende-se que esta era uma possibilidade plenamente aceitável, e a nota oficial além da
“Carta testamento” foram fundamentais para esta conclusão.
Todas as ações praticadas para retirar Getúlio Vargas do poder, ou pelo menos
enfraquecê-lo, politicamente, ao longo do período de um ano, o que tão bem puderam ser
acompanhadas através das páginas do jornal O Globo, não tiveram sucesso. Vargas, apesar
das dificuldades, manteria a sua ascendência política e capacidade de intervir nas eleições
tanto para o governo dos estados como a presidencial. Mas os insucessos, de um ano, nas
tentativas de retirar o presidente do jogo eleitoral foram “compensadas” pelos acontecimentos
do dia cinco de agosto, que representaram um “terremoto” no país e permitiram a oposição
assumir uma posição de prevalência, sobre o presidente, nunca antes vista. Esse novo cenário
não deixou alternativas para Vargas, e o levaram a enveredar pelo caminho da eternidade no
coração dos brasileiros, saindo da vida para entrar na História.
O acompanhamento de inúmeras edições do jornal O Globo, ao longo do período de
um ano, possibilitou conhecer um pouco mais do “modus operandi” do periódico. Entender
suas motivações e também seus interesses em relação ao negócio, bem como o modelo de
Estado que entendia como adequado para o país.
Desde o princípio é possível constatar um compromisso, do jornal, com o respeito à
ordem institucional, algo que não pode ser ignorado. Apesar da narrativa que assumia uma
postura mais próxima aos setores oposicionistas, em relação a Vargas no poder, inclusive
identificando-se com o chamado “campo conservador”, procurou sempre manter o respeito à
questão da legalidade. Se em 1951, adotou posição de defesa em relação à diplomação e a
posse de Getúlio Vargas, também defendeu, até onde foi possível, a manutenção do mandato
presidencial até a sua conclusão, prevista para o ano de 1956. Esta posição só foi alterada a
partir da sucessão de eventos que eclodiram durante o mês agosto de 1954.
O conglomerado capitaneado por Roberto Marinho exerceu forte influência no cenário
político nacional durante o período 1953-1954. Para isso, além do jornal, a Rádio Globo foi
um recurso importante para expressar as posições e defender as teses do grupo jornalístico.
Havia uma simbiose entre o jornal e a rádio, entrevistas e comentários de personalidades
políticas, na maioria dos casos oposicionistas, eram divulgadas pelo jornal, antecipando temas
que seriam desenvolvidos pela Rádio Globo. O alcance nacional da rádio possibilitava
ampliar o debate político, bem como a “força” do grupo jornalístico comandado por Roberto
Marinho. Também contribuiu para o fortalecimento do campo de oposição a Getúlio Vargas.
Não seria coincidência o fato do jornalista Carlos Lacerda, diretor do jornal “Tribuna
da Imprensa”, e ferrenho crítico do presidente da República, assumir, frequentemente, os
microfones da Rádio Globo, como convidado, para tecer seus comentários ácidos sobre a
política nacional, sempre com o mesmo foco; Vargas e suas ações.
Certo pragmatismo pode ser atribuído a O Globo, uma vez que não se furtou a dar voz
a um jornalista de um jornal concorrente para referendar suas posições. Lacerda, como já
citado, tinha assento frequente na Rádio Globo, mas não deixou de ter espaço também no
próprio jornal de Roberto Marinho, sendo muitas vezes saudado como referência jornalística e
grande defensor da “liberdade de imprensa”.
Não restam dúvidas que longe de representar um veículo de comunicação neutro,
muito longe disso, O Globo apresentava-se como um ator político importante e com grande
influência no país. Suas posições reforçaram uma perspectiva de mundo associada com um
grupo social específico. Não por acaso, o jornal, era identificado como o veículo de
preferência de muitas figuras ligadas ao campo conservador. Recebendo, inclusive,
felicitações por parte de elementos ligados ao setor patronal pela sua forma de atuação. A
identidade do jornal por essas breves observações nos parecem claras. Estava longe dos
setores mais populares, seus interesses estavam mais afinados com as camadas mais altas da
pirâmide social. Daí a percepção do porque assumiu posição contrária a Vargas,
principalmente quando as ações do presidente se voltavam para os setores mais humildes da
população. Entretanto, não exercitou uma oposição marcada pelo sensacionalismo ou pelo
disse me disse, mais do que isso. O Globo como jornal oposicionista, de acordo com os
indícios, procurava exercer esse papel de forma consciente. Buscava, acima de tudo,
transmitir a ideia de “farol da nação”, cujo único interesse era o bem estar dos brasileiros.
Logo, estaria acima de partidos e governos, dessa forma, o que era publicado em suas páginas
representava a verdade, e o melhor caminho a ser seguido por todos.
Quando o jornal posicionou em defesa da posse de Vargas, em 1951, e mais tarde
assumiu posicionamento contra o projeto de impeachment do presidente, em 1954, passou aos
seus leitores a ideia de defesa da ordem institucional, apesar de politicamente crítico ao
governo. Em agosto de 1954, em virtude da sucessão dos eventos deflagrados pelo crime da
Rua Toneleros, adotou a defesa pela renúncia de Vargas, exatamente, para resguardar o bom
funcionamento das instituições. Em todas as situações apresentadas existe uma, certa,
coerência por parte do periódico, essa ideia é passada. Nunca poderia ser dito que O Globo
perseguia o presidente, apesar da sua declarada oposição, como outros veículos o faziam, mas
não há como negar que a saída de cena de Vargas tenha sido reconfortante para as pretensões
do jornal, no final das contas, o objetivo do jornal foi atingido. Manteve-se a “lenda” do
compromisso com a isenção e a neutralidade, como foi destacado na primeira edição no
longínquo ano de 1925. Ao que parece a “lenda” continua a ser repetida até os dias de hoje, e
muita gente ainda acredita nisso!
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