Balanço dos alpendres e dos ranchos... Parte I Vai e vem nas modinhas langorosas... Vai e vem de embalos e canções... Tic-tac! Tac-tac! Professora de violões... – Rrac... crac... Tipoia dos amores nordestinos... Olá, amigo vento, velha alma familiar e Grande... larga e forte... pra casais... [ chorosa de Casimiro! Berço de grande raça velha gargalhada noctâmbula do salafrário Bocage! Avejão!... (rrac!) S ... vulto branco!... (crac!) U A Tic-tac... S S Ferve, a cem léguas, o mar… uma zelação P N que desabou no mar! E
Parte II Guardadora de sonhos...
Pra madorna ao meio-dia... Crac!... Crac! Grande... côncava... abriram a minha porta! Lá no fundo dorme um bichinho... Quando chega a hora aziaga — ô...ô...ô...ôô...ôôôôôôôôô... e o horror no coração primitivo — Balança o punho da rede pro menino durmir... do primeiro pastor que viu a primeira estrela [ no céu, enorme, In: Livro de poemas de Jorge Fernandes. Natal: tic... tic... o coração é um relógio – tic... tic... EDUFRN, 2007. p.52. tic...! “Aviões” hora sem nenhum pavor dos corujões rasgando [ a mortalha das horas Novecentos e cinquenta cavalos suspensos nos ares... sobre o sono dos pequeninos, — Besouro roncando: zum... zum... umumum... centos de filisteus com plumagens índias, Aonde irá aquele Rola-Titica parar? carregando uma urna de esmeralda, enflorada de corais e algas, E os olhos dos cabocos querem ver os Marinheiros a cabeça luminosa e gotejante de Gonçalves Dias, Os peitados vermelhos das Oropas... berram, mudos, epopeias americanas... E a marmota vai: ron... ron... – cevando o vento – Ferve, a duzentas léguas para o Ocidente: o mar! Por cima dos coqueiros, varando as nuvens... e foi quando os espectros de todas as poesias abriram a minha porta! Depois desce no Rio Grande numa pirueta danisca [...] Desimbestado, espalhando a água... E fica batendo o papo, cansado de voar... Parte IX In: Livro de poemas de Jorge Fernandes. Natal: E eu, dentro da cidade que dorme, EDUFRN, 2007. p.44. vigiada pela vigília inexorável das [ horas assombradas, 3. PALMYRA WANDERLEY (1894-1978) e pelo cão danado do vento sul, que é um bandido e devasta o peito dos meus “Alecrim” irmãos varredores das ruas, [...] eu estou vivo! É o bairro do samba, da folia, e vejo o FANTASMA! Das adivinhações e da magia, tic... tac!... Das promessas de fitas, o fantasma!... Dos fandangos, dos leilões... crac! crac!... [...] o fantasma! Alecrim é o bairro operário, dos meus próprios pensamentos. A tecer noite e dia. É a aranha operosa que faz a teia e fia. Mastiga fumo cortado a remoer, […] Cravo, pimenta; É o bairro da lida, da função, E deixa a baba fedorenta É o bairro da feira domingueira, Pela boca, sem dentes, escorrer. Numa algazarra louca! Vestida de algodão, numa sujeira, É bem ali, no fim da ladeira, esquecido, Arrastando tamanco entre as barracas, Pobre enjeitado! Dando empurrão, Não é bairro, não é nada, é um refugo. A tocar berimbau e realejo de boca, Ainda é tempo de mudar de vida, Mascando alho, dizendo palavrão. Pecador de tanto pecado. […] [...] Embalado no ninho, Como o filho da humilde cigarreira, In: Roseira brava. Natal: FJA, 1965. p.41-42. Dorme, embalado no seio Da pobre mãe, tão consumida e pobre! 4. CÂMARA CASCUDO (1898-1986) A voz vai se sumindo, ali, na casaria, Quase rente com o chão... “Não gosto de sertão verde” (1926) […] E ela, a pobrezinha, já tão penada, Não gosto de sertão verde Com a voz perra de sono, Sertão de violeiro e de açude cheio Já tão cansada de trabalhar, vai repetindo muito Sertão de rio descendo devagar, l A arrastar, a arrastar, e A cantiga do povo n [...] t o In: Roseira brava. Natal: FJA, 1965. p. 36-38. largo, limpo. Sertão de sambas na latada, “Passo da Pátria” harmônio, bailes e algodão Sertão de canjica e de fogueira É um antro de miséria, Capelinha de melão é de São João É um passo de dor! Sertão do poço da ingazeira Parece que os apaches de outras terras onde a piranha rosna feito cachorro Nascem dali. Que horror! e a tainha sombreia de negro n’água quieta Quando medo me mete! onde as moças se despem É, com certeza, daquele lodo d Que se gera o amor da apachinete, e Bebendo com a desgraça v O próprio amor. a Mata com um beijo, crava o punhal, g Disputa a sorte no jogo de trinta e um, a Dança a dança da morte r No lamaçal, Prefiro o sertão vermelho, bruto, bravo Dá estalos com a língua com o couro da terra furado pelos serrotes Amarga, pecaminosa, hirtos, altos, secos, híspidos Sentindo o travo do mal. e a terra é cinza poalhando um sol de cobre e uma luz oleosa e mole Passo da Pátria é a tasca do vício, e Do pecador impenitente. s Tem um cheiro ruim de maresia c E uma bafo, muito forte, de aguardente. o r Mendigo maltrapilho e esfaimado, r Quase a morrer de fome e abandono, e Aproveita migalhas, como sobejo, como o óleo amarelo de lâmpada de igreja. Veste trapos, roupas velhas, Teima no vício, In: Cartas de Câmara Cascudo a Mário de Andrade. Fuma ponta de cigarro, já fumado, São Paulo: Global, 2010. p. 107. De arrependimento, não há indício.