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ARTIGO ARTICLE
On the history of public health: ideas and authors
Abstract The aim of this report is to outline Resumo O trabalho tem como objetivo tra-
a first approach on the studies dealing with çar uma primeira aproximação com os estu-
public history in Brazil. This presentation does dos que tratam da história da saúde pública
not intend to embrace all the literature on this no Brasil. Não pretende abarcar toda a litera-
subject, either regarding diseases or institu- tura que trata da saúde pública em sua ver-
tions. Reports were limited to those emphasiz- tente histórica, mas enfatizar os trabalhos, que
ing historical periods and presenting a gener- ao destacar períodos históricos, oferecem um
al view of the public health development. Af- panorama geral da saúde pública, sem deta-
ter considering the installation of Brazilian so- lhar estudos sobre doenças ou instituições. Após
cial medicine project – from colonial periods tratar de como se instaura o projeto da medi-
to the first decades of nineteenth century – we cina social brasileira, desde o período colonial
analyzed studies comprising the public health até as primeiras décadas do século XIX, traba-
history from 1870-1930. The period from 1889- lha-se com os estudos que abarcam a história
1930, also known as Old Republic, with very da saúde pública entre 1870 e 1930. Destaca o
specific characteristics in Brazilian socioeco- período de 1889-1930, também conhecido co-
nomic and public history, has been stressed. mo República Velha, que tem características
Key words Social Medicine; Public Health, específicas na história socioeconômica e polí-
History; Historical Studies; Brazil; XIX-XX tica brasileira.
Centuries Palavras-chave Medicina Social; Saúde Pú-
blica; História; Estudos Históricos; Brasil; Sé-
culos XIX-XX
1 Departamento
de Medicina Preventiva
e Social, Faculdade
de Ciências Médicas
da Universidade
de Campinas, Cidade
Universitária Zeferino Vaz,
13081-970, Campinas, SP
rnunes@correionet.com.br
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Nunes, E. D.
bre as decisões governamentais, no que se re- tanto, “Enquanto projeto de medicina que se
fere à saúde pública. Ela irá apresentar um am- ocupa do espaço urbano, sua atenção estará
plo programa que se estende desde a higiene voltada principalmente para a força de traba-
à medicina legal; educação física das crianças; lho urbano”. Como afirmam Machado e cola-
a questão dos enterros nas igrejas; denunciará boradores (1978) “No momento de sua cons-
a carência de hospitais; estabelecerá regula- tituição, a medicina social brasileira não é uma
mentos sobre as farmácias; medidas para me- medicina do trabalho ou do proletariado, mas
lhorar a assistência aos doentes mentais; de- uma medicina urbana”.
nunciará também as casas insalubres e reple- Facilmente pode-se constatar que este tra-
tas de pessoas; e dará destaque ao saneamento. balho continua a tradição inaugurada por Mi-
Era necessário, como escreve Oliveira (1983), chel Foucault, não somente em relação à orien-
“um discurso que desse conta das condições tação “arqueológica” por ele criada e desen-
de saúde nos centros urbanos, que já nessa volvida (Foucault, 1978), mas na sua interpre-
época havia alcançado uma importância cres- tação das origens da medicina social européia
cente, no comércio e na produção, além de ser (Foucault, 1979). Em especial, quando este au-
a sede do poder do Estado, um importante con- tor analisa o processo de medicalização e con-
servador das doenças”. seqüente disciplinarização da vida social no
Destaca-se que o conhecimento do meio é que denominou, no caso da França, de “me-
básico, para o qual concorre a influência da dicina urbana”. Carvalho e Lima (l992), depois
teoria miasmática. De um modo geral, esse de uma aprofundada análise do binômio ci-
pensamento irá ser permeado por duas cate- dade/saúde e da força explicativa que assumiu
gorias de análises: o natural e o social. Assim, na historiografia européia e posteriormente
“diagnosticada a desordem urbana, a medici- estendeu-se aos países do Terceiro Mundo, ou
na compreendeu que era determinada por cau- seja, a associação causal entre “doença” e “cida-
sas naturais – a situação geográfica em geral e de massiva”, passam a levantar alguns proble-
os acidentes geográficos como pântanos e mon- mas quanto ao estudo de Machado e colabo-
tanhas – e sobretudo, como provenientes de radores.
causas sociais – tanto no nível macrossocial, Dentre os pontos levantados salientam o
do funcionamento geral das cidades, como no do papel atribuído à medicina como configu-
nível microssocial das instituições” (Oliveira, radora do projeto de higienizar e disciplinar a
1983). Dessa forma, o exame minucioso do ur- cidade e seus habitantes, que é visto “como por-
bano será complementado com a análise dos tador de um sentido que transcenderia a in-
espaços específicos que representam perigo de tervenção médico-sanitária sobre o espaço ur-
doença e de desordem. Medicalizar as institui- bano, constituindo-se em elemento essencial
ções – hospitais, cemitérios, escolas, quartéis, ao desenvolvimento do capitalismo, uma vez
fábricas e prostíbulos – torna-se imperativo. que criaria as condições socioculturais de sua
Ao propor a ordem urbana, não se esque- emergência” (Carvalho e Lima, 1993). Pelo
cia que se estabelecia, também, “uma nova re- pouco esclarecimento das características da
lação: ordem–moral–saúde. Com esta nova re- população urbana e das relações sociais e pe-
lação, tenta-se generalizar e obter o acordo dos lo motivo apontado acima, as autoras são crí-
grupos sociais acerca da ordem e da moral, ne- ticas em relação à transposição do modelo ex-
cessária para a manutenção do poder do Esta- plicativo europeu e também pelo fato de “pri-
do” (Oliveira, 1983). vilegiarem como documento o discurso insti-
Fica claramente demonstrado, no estudo tucional, sem atenção para o contexto onde
de Machado, que o projeto de medicina social esse discurso é elaborado”. Mesmo com essas
que se implanta nesse momento, “tem sob sua críticas, reconhecem que a investigação traz
mira a transformação da cidade – e principal- importante contribuição ao conhecimento do
mente da Corte – promovendo seus habitantes projeto idealizado pelos intelectuais médicos
livres a indivíduos saudáveis e patriotas, per- na segunda metade do século XIX, tendo falta-
feitos cidadãos” (Machado et al., 1978). Oli- do esclarecer quais foram as condições que pos-
veira (1983), ao retomar este trabalho, acen- sibilitaram a sua emergência. De outro lado,
tua o fato deste projeto de medicina social ter não se pode deixar de reconhecer o que há de
sido organizado numa formação social cujo altamente positivo neste estudo, e alguns des-
grupo social mais importante é agrário-expor- ses pontos podem ser sintetizados na apresen-
tador, baseado em mão-de-obra escrava. Por- tação de Costa (1978), quando diz: “Não seria
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poder. Militares contestam o poder e o siste- rariado, como também há crescente aumento
ma hierárquico, etc.” (Moraes, 1983). Em re- do custo de vida e baixa salarial. Constantes
sumo: impunha-se uma estrutura de poder di- rebeliões irão ocorrer: 1912, 1914, 1915, 1930.
ferente da até então vigente – a República. Co- Época marcada por profundas mudanças e
mo escrevem Santos e colaboradores (1964), rupturas, com crescente complexificação da
“a República resultou das lutas travadas pelos vida urbana.
grandes contingentes urbanos das camadas Mehry (1985) lembra que, embora possam
médias apoiados por todos os setores popula- existir diferentes interpretações sobre o pri-
res da nação, da burguesia nascente e fração meiro período da República, “é de consenso,
do latifúndio do café que abandonara o tra- entretanto, que o processo de instauração da
balho escravo”. De fato, nesse momento, a par- República no Brasil reflete especificações pró-
ticipação do operariado, embora tenha esta- prias do desenvolvimento capitalista especifi-
do presente, será pequena, dado a sua insipiên- co nessa sociedade, não reproduzindo os mes-
cia, e o Exército “representou a vanguarda da mos passos do desenvolvimento social dos paí-
classe média e de todas as classes sociais que ses centrais. Portanto, as relações entre capi-
apoiava a mudança do regime”. As formas de tal industrial e agrário, entre burguesia e re-
resistência do operariado irão ocorrer mais in- volução democrática, obedecem a padrões pró-
tensamente no período que se estende de 1917 prios de desenvolvimento”.
e 1919, através de inúmeras greves, movimen-
to que recebeu detalhada análise por parte de
Soares (1985). Nesse estudo a autora situa, pa- Revendo os estudos
ra o período de 1890 a 1920, as reivindicações
de saúde feitas pelos trabalhadores. Dentro da linha de pesquisas inauguradas por
Das diversas conjunturas que formam a Machado e colaboradores, coloca-se o traba-
República Velha, a primeira, conhecida como lho de Oliveira (1983) que ao abranger o pe-
a “República da Espada”, os historiadores mar- ríodo de 1866-1896, busca esclarecer o papel
cam como sendo o período em que se estabe- dos intelectuais formuladores de discursos
lecem as alianças entre os militares e os cafei- científicos e políticos, em especial aqueles di-
cultores paulistas. Os primeiros, marcadamen- rigidos a promover a intervenção médica no
te positivistas, pretendem dar a característica corpo social. O pressuposto é que se podem
ideológica à República; os cafeicultores que- estudar “os projetos médico-sociais, como uma
riam o federalismo, o liberalismo econômico e das bases sobre a qual se apoiam tentativas de
político, uma nova Constituição; é uma épo- dominação de uma determinada fração ou
ca de crises, com sucessivas rebeliões milita- classe sobre as demais” (Oliveira, 1983). Para
res e quedas de ministros. Se, de um lado, o tal, há necessidade de articular ideologia po-
Exército defende a centralização político-ad- lítica e científica. A fim de tratar estes pressu-
ministrativa, de outro, os cafeicultores viam postos, o autor analisa a maneira como se es-
na descentralização a solução para os proble- truturou o modelo experimental que informa
mas. Em conseqüência, ocorre a ruptura da o sanitarismo no Brasil. Para isso, toma as pro-
aliança. postas desenvolvidas por dois grupos que eram
Esse período, que vai de 1889 a 1894, será contemporâneos: a Sociedade de Medicina e
sucedido por outra conjuntura, na qual os ca- Cirurgia do Rio de Janeiro e a “Escola Tropica-
feicultores aliam-se às oligarquias regionais lista Baiana”.
dominantes, em São Paulo e Minas Gerais, Como explica Oliveira, “No sentido de
com predomínio dos interesses da exploração apresentar o modelo de conhecimento de am-
do café sobre o conjunto da sociedade nacio- bas, tomamos, como exemplo, a ancilostomía-
nal. Esta conjuntura estende-se de 1894 a 1914, se, doença muito freqüente no Brasil. Procu-
no momento em que o Brasil se vê atingido ramos demonstrar como estes dois projetos
pelos efeitos da Primeira Guerra Mundial, com de medicina social, partindo de pressupostos
a diminuição das importações de café e bor- teóricos bastante diversos, ao trabalhar com
racha. A crise do modelo será a principal ca- os mesmos elementos – clima, habitação, cos-
racterística da conjuntura de 1914 a 1930, ou tumes, condições sociais, condições geográfi-
seja, a do modelo agro-exportador. Com ele cas – delineiam objetos e desenvolvem teorias
instala-se não somente um forte controle social também bastante diversas” (Oliveira, 1983).
e institucional das camadas médias e do ope- Outras doenças como o beribéri e o cólera são
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Paulo – “um jornal que tem como compromis- ca em suas diversas áreas, o que levaria os Es-
so apaziguar as contradições e os conflitos so- tados mais capacitados a criarem inúmeros ór-
ciais sem despertar a população para os peri- gãos sanitários. Lembre-se, também, que a po-
gos que a ‘desordem’ representa”. lítica de Oswaldo Cruz deixa de lado a questão
Analisando conjuntamente o papel dos in- da tuberculose, primeira causa de morte du-
telectuais da Academia Nacional de Medicina rante todo o período de 1890 a 1934, e dedica-
e de O Estado de São Paulo, Moraes (1983), se às doenças epidêmicas, como pode ser vis-
conclui que “isolados social e politicamente, to no estudo de Bodstein (1984).
lutam por impor seus projetos, que têm em Mehry (1985) privilegia em seu trabalho o
comum a tutela da sociedade e a possibilida- Estado de São Paulo, que nesse momento já se
de de, com seus saberes e práticas, ajudarem a tornava o pólo econômico e social mais impor-
gerir a sociedade e o Estado. Os projetos médi- tante do Brasil. A proposta é exatamente saber
co-sociais no ESP e na ANM não expressam como o conjunto das práticas sanitárias con-
apenas o autoritarismo e a exclusão de seto- tribuiu para a organização da sociedade, se-
res populares em sua discussão ou imposição; gundo os interesses dominantes da oligarquia
eles têm em comum a busca do poder que de- agro-exportadora, cuja fração hegemônica era
veria acompanhar cada prática e saber”. ligada ao setor cafeeiro em Minas Gerais e São
Novamente, a referência à análise de Car- Paulo (Mehry 1985). Considere-se que esta
valho e Lima (1992) torna-se necessária, quan- perspectiva de análise irá questionar, como es-
do situam que o problema nesse trabalho é “o clarece o autor, as bases metodológicas de um
estabelecimento de correlações imediatas en- dos primeiros estudos sobre a administração
tre os modelos de conhecimento científico e sanitária em São Paulo, escrito por Rodolfo
interesses de grupos e classes sociais, que são Mascarenhas, em 1949. Nesse estudo, como nos
igualmente pouco qualificados”. Acrescentam, de Blount (1971), as práticas no campo da saú-
também, que “uma constante nesses trabalhos de pública são analisadas a partir do tipo de
parece ser a pouca historicidade conferida à conhecimento que se incorpora nas estruturas
noção de cidade no Brasil daquele contexto”. dos serviços e que acabam se concentrando no
Contemporâneos do trabalho de Moraes estudo da obra científica de “grandes” perso-
(1983) são os de Costa e de Mehry, apresenta- nagens históricos, considerados “portadores
dos inicialmente como dissertações de mestra- da ciência”, ou centrados na análise da organi-
do e publicados posteriormente. Ambos vol- zação institucional da saúde pública, ou seja,
tam-se para a análise do saber/práticas sani- passa-se a tentar entender o campo das práti-
tárias/instituições de saúde e suas relações, no cas através de instituições específicas.
espaço criado pelo impacto das transforma- Em resumo: identificar e solucionar os pro-
ções econômicas e políticas das três primeiras blemas sanitários é atribuição das ciências e
décadas deste século, ou seja, de como as polí- de seus portadores, os técnicos. Quando os
ticas de saúde responderam às demandas his- problemas persistem, a culpa é a inexistência
tóricas do capitalismo brasileiro. No caso de de um conhecimento naquele momento, ou se
Costa (1985), para demonstrar como se deu a deve “à irracionalidade da administração dos
ascensão da vertente sanitarista, o autor estu- meios necessários para efetivá-los” (Mehry,
da dois grandes momentos políticos: a “con- 1985). De outro lado, “O avanço histórico de
juntura Oswaldo Cruz”, inaugurando a organi- determinados conhecimentos científicos obe-
zação da saúde e moldes científicos com base dece a um sentido linear e evolutivo”, em es-
na bacteriologia e microbiologia, assim como pecial na medida que as pesquisas se realizam
das ações voltadas para a imanização através no quadro de referência do método científi-
de vacinas; e o período de 1918-1924, marca- co, nos padrões das ciências naturais (Mehry,
do pela criação do Departamento Nacional de 1985). Ou seja, tendo como base “a fé na ciên-
Saúde Pública e pelas Reformas Sanitárias de cia experimental biomédica”, como escreve Luz
Carlos Chagas. Coloca em evidência a ocor- (1982), ao se referir a Oswaldo Cruz e ao seu
rência, nesse período, de um processo de ins- projeto científico, que era também um proje-
titucionalização e rotinização de medidas sa- to político, traduzido no sanitarismo, como já
nitárias com a criação de diversos aparelhos foi referido em outro momento deste traba-
estatais de saúde pública. Deve-se mencionar lho.
que a Constituição de 1891 irá determinar que A base do conhecimento é a bacteriologia
os Estados são responsáveis pela saúde públi- e a personalidade que se destaca é Emílio Ri-
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tro foi promovido pelo movimento sanitaris- especial a criação do Departamento Nacional
ta brasileiro que buscou redefinir, entre 1910 de Saúde Pública (DNSP), em 1919. Como es-
e 1920, as fronteiras entre os sertões e o lito- creve Hochman (1998), ao traçar as considera-
ral, entre o interior e as cidades, entre o Brasil ções finais sobre esse momento da sua análise,
rural e o urbano em função do que considera- “a reforma foi o resultado de um acordo po-
vam o principal problema nacional: a saúde lítico que envolveu um grande número de pac-
pública”. tuantes, os quais abriram mão, gradativamen-
Sem a pretensão de sumarizar o extenso te, de suas posições dogmáticas iniciais, fos-
trabalho feito por Gilberto Hochman, desta- sem baseadas na Constituição, no conheci-
co um aspecto inicial que me parece extrema- mento médico ou na penúria financeira”.
mente importante. Este aspecto refere-se ao A seguir, o autor analisa “o poder central
ponto de partida deste trabalho que está cal- como solução dos problemas sanitários” e co-
cado na compreensão do movimento da refor- mo os estados aderiram prontamente à polí-
ma da saúde pública, nas primeiras décadas tica do DNSP, avaliando que “os custos da alo-
do século XX, “como um dos elementos mais cação de atividades de saúde pública no Go-
importantes no processo de construção de verno central – perda de autonomia – pode-
uma ideologia da nacionalidade, com impac- riam ser toleráveis, diante dos benefícios ad-
tos relevantes na formação do Estado brasilei- vindos dela – saneamento e profilaxia rural –
ro”. Como diz o autor, embora muitos estu- e dos custos da doença transmissível” (Hoch-
diosos, como Costa (1985), Mehry (1985), Ri- man, 1998). Sem dúvida, é neste capítulo que
beiro (1993) partilhem desta interpretação o autor exemplifica toda a construção analíti-
mais geral, seus trabalhos enfatizam aspectos ca que sustenta a sua argumentação: da inter-
específicos das políticas de saúde: interesses dependência sanitária e os benefícios e os cus-
das classes dominantes, associados “à dinâmi- tos, como diz, “percebidos e experimentados”
ca do capitalismo, tanto do ponto de vista do- pelos estados brasileiros na estatização da saú-
méstico como internacional” e “consideram de, cujo contraponto é dado pelo Estado de
os principais atores públicos, especialmente São Paulo. Para Hochman (1998), as análises
os sanitaristas e dirigentes da saúde pública, que destacam São Paulo “como o caso mais
como intelectuais subordinados aos interes- bem-sucedido na implantação de serviços sa-
ses dos grupos dominantes, nacionais e estran- nitários estaduais, discutiram a especificida-
geiros” (Hochman, 1998). Vários são os mo- de paulista, sem relacioná-la com os dilemas
delos e conceitos que orientaram o autor: o nacionais que a tornaram possível” (....) “Mi-
crescimento da interdependência social e da nha hipótese é que São Paulo foi singular não
tomada de consciência a seu respeito de De porque se tenha alijado voluntariamente da
Swaan; o conceito de poder despótico e poder questão sanitária nacional, mas justamente
infra-estrutural, de Mann; o neoinstituciona- por se ter constituído como uma resposta aos
lismo histórico, de Skocpol e Immergut. problemas de interdependência sanitária en-
De outro lado, são básicas para este traba- frentados pelas elites brasileiras”.
lho as idéias desenvolvidas por Elisa Reis em
relação às políticas econômicas, como tam-
bém, as de Luís Antônio de Castro Santos, so- Considerações finais
bre o movimento sanitarista na Primeira Re-
pública. Da identificação da doença, como um Tendo tomado como orientação geral traçar
elo de interdependência social, à sua transfor- um quadro da produção que vem se elaboran-
mação em problema político, o autor salienta do sobre a história da saúde pública, o desta-
que “as propostas de minimização dos efeitos que foi em relação aos trabalhos que tratam do
negativos da interdependência indicam que a tema até os anos 30. Ficam para uma próxima
centralização administrativa e a autonomia revisão aqueles estudos que analisaram a his-
técnica eram consideradas soluções lógicas pa- tória nos anos que se seguiram à década de
ra o problema” (Hochman, 1998). Assim, o au- 1930, período que apresenta características
tor expõe de forma detalhada a organização bastante específicas. Nesse sentido, deve-se
sanitária do início da República até meados adiantar que a partir de 1930 “emerge e toma
da década de 1910, data em que se institui a forma uma política nacional de saúde, mais
Liga Pró-Saneamento do Brasil, e as propos- precisamente, instalam-se os aparelhos neces-
tas de reforma sanitária entre 1918 e 1920, em sários a sua efetivação” (Braga e Paula, 1981).
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