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MAURO AKERMAN

Introdução
ao Vidro e sua
Produção
PRODUÇÃO INDUSTRIAL
A expansão do Ensino Técnico no Brasil, fator importante para melhoria de
nossos recursos humanos, é um dos pilares do desenvolvimento do país. Esse
objetivo, dos governos estaduais e federal, visa à melhoria da competitividade de
nossos produtos e serviços, vis-à-vis com os dos países com os quais mantemos
relações comerciais.

Em São Paulo, nos últimos anos, o governo estadual tem investido de forma
contínua na ampliação e melhoria da sua rede de escolas técnicas - Etecs e Classes
Descentralizadas (fruto de parcerias com a Secretaria Estadual de Educação e com
Prefeituras). Esse esforço fez com que, de agosto de 2008 a 2011, as matrículas do
Ensino Técnico (concomitante, subsequente e integrado, presencial e a distância)
evoluíssem de 92.578 para 162.105.

A garantia da boa qualidade da educação profissional desses milhares de jovens


e de trabalhadores requer investimentos em reformas, instalações/laboratórios,
material didático e, principalmente, atualização técnica e pedagógica de professores
e gestores escolares.

A parceria do Governo Federal com o Estado de São Paulo, firmada por


intermédio do Programa Brasil Profissionalizado, é um apoio significativo para
que a oferta pública de ensino técnico em São Paulo cresça com a qualidade
atual e possa contribuir para o desenvolvimento econômico e social do estado e,
consequentemente do país.

Almério Melquíades de Araújo


Coordenador de Ensino Médio e Técnico
Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza
Diretora Superintendente
Laura Laganá
 
Vice-Diretor Superintendente
César Silva
 
Chefe de Gabinete da Superintendência
Luiz Carlos Quadrelli
 
Coordenador do Ensino Médio e Técnico
Almério Melquíades de Araújo

REALIZAÇÃO

Unidade de Ensino Médio e Técnico


Grupo de Capacitação Técnica, Pedagógica e de Gestão - Cetec Capacitações

Responsável Cetec Capacitações


Lucília Felgueiras Guerra

Responsável Brasil Profissionalizado


Silvana Maria Brenha Ribeiro

Coordenador de Projetos
Ana Maria Aoki Gonçalves

Parecer Técnico
Luciano Carbone

Revisão de Texto
Yara Denadai

Projeto Gráfico
Diego Santos
Fábio Gomes
Priscila Freire

Projeto de formação continuada de professores da educação profissional do


Programa Brasil Profissionalizado - Centro Paula Souza - Setec/MEC
Sumário

1 - Objetivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg.8

2 - Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg.8

3 - História . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg.10

4 - Estrutura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 17

5 - Elaboração . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 20

6 - Propriedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 25

7 - Matérias primas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg.30

8 - Processo produtivo industrial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 35

8.1 – Usina de composição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 36

8.2 – Fornos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 37

8.2.1 – Refratários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 39

8.3 – Processos de conformação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 40

8.4 – Recozimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg. 42

9 – Transformação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg.42

10- Bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . pg.52 


1 - Objetivo
O objetivo deste documento é proporcionar uma noção introdutória ao material
vidro, suas características e propriedades, etapas de elaboração e conformação
nos principais processos industriais vidreiros, a pessoas que não necessariamen-
te possuam formação técnica.

2 - Introdução
Aprendeu-se mais a respeito do vidro e de seu processamento nos últimos 40
anos do que durante toda a história precedente da tecnologia. Os vidros são
hoje utilizados em quase todos os aspectos das atividades humanas; em casa,
nas janelas, lâmpadas e luminárias, sistemas de aquecimento solar, fornos e ge-
ladeiras, utensílios de mesa, decoração, etc. Na ciência, nos microscópios e teles-
cópios constituindo as lentes, nos frascos dos laboratórios, etc.; na indústria nos
reatores, visores, instrumentos, etc., e mesmo em arte, pois eles podem ter suas
propriedades ajustadas às suas finalidades, assumindo infinitas cores e formas.

Uma utilização muito adequada das excelentes propriedades do vidro é o seu


uso como embalagem. Algumas embalagens podem ser seguras. Muitas podem
ser recicladas. Outras são reutilizadas. Pureza e assepsia, transparência, versatili-
dade e impermeabilidade são outras características encontradas isoladamente
nas embalagens. Entretanto, especialistas e designers vêm reiteradamente re-
conhecendo que o vidro é o único material que reúne todas essas qualidades. A
8 tecnologia desenvolvida e aplicada ao vidro permitiu que ele adquirisse novas
vantagens em relação a outros materiais. O peso das embalagens, por exemplo,
foi sensivelmente reduzido, ao mesmo tempo em que se tornaram mais resisten-
tes. E como embalagem, o vidro é o único material que corresponde plenamente
Introdução ao Vidro e sua Produção

a duas características essenciais das embalagens modernas: preserva a natureza,


pois o vidro é completamente reciclável, uma vez que um quilo de vidro usado
dá origem a um quilo de vidro novo, e protege o consumidor, não contaminando
o produto embalado, não exigindo a adição de conservantes aos alimentos e
bebidas e além disso, deixando visível o seu interior.

Alguns vidros podem ser utilizados em temperaturas extremas, enquanto ou-


tros só têm utilidade porque se fundem a baixas temperaturas. Algumas peças
conservam suas formas mesmo submetidas a mudanças extremas de tempera-
tura como entre o fogo e o gelo, outras podem conduzir ou bloquear a luz. Os
vidros podem ter diversos graus de resistência mecânica, ser densos ou leves,
impermeáveis ou porosos. Em suas muitas finalidades, eles podem filtrar, conter,
transmitir ou resistir às radiações pertencentes a quase todas as faixas do espec-
tro eletromagnético.

As propriedades dos materiais são ditadas pelo tipo de ligações dos átomos que
os constituem. Devido à vastíssima, quase infinita, faixa de composição química
dos vidros, onde a maioria dos elementos da tabela periódica pode ser incorpo-
rada, eles apresentam uma ampla variação de propriedades mecânicas, ópticas,
térmicas, elétricas e químicas. Apesar de não serem usualmente apresentados
como tal, os vidros podem ser considerados como um subgrupo dos materiais
cerâmicos. Entretanto, devido à sua estrutura peculiar (ausência de organi-
zação cristalina), e diferença na sequência de operações de fabricação (o vidro
inicialmente é fundido no forno e depois é conformado, enquanto as cerâmicas pri-
meiro são conformadas e depois passam por forno a alta temperatura), os vidros
são geralmente tratados como um grupo à parte da cerâmica.
O vidro, que no passado era invariavelmente considerado de pouca resistência
mecânica, pode hoje ser usado em novas aplicações, nunca imaginadas há pou-
cas décadas. As técnicas de têmpera térmica e química são responsáveis pelas
excelentes propriedades das janelas de meios de transporte, vidros à prova de
balas e lentes de óculos.

Os vidros ópticos são nossos conhecidos nos microscópios, binóculos e máqui-


nas fotográficas. Outras espécies de vidros ópticos são sensíveis à luz ultravioleta
e podem ser usados para tomadas fotográficas, desenvolvendo a imagem por
tratamento térmico posterior.

Outra maravilha tecnológica dos nossos dias são as fibras ópticas, utilizadas tan-
to pela engenharia, para telecomunicações, como na medicina, para realização
de procedimentos minimamente invasivos. Nesse caso aparentemente parado-
xal, onde a luz parece acompanhar as curvaturas das fibras, a luz pode seguir as
mais tortuosas curvas levando imagens e informações, com extrema eficiência e
rendimento.

A fibra de vidro é empregada na produção de lã extremamente isolante, térmica


e acústica, utilizada em construção civil, geladeiras, fogões e também como re-
forço de plásticos utilizados na confecção de carrocerias de automóveis, botes,
piscinas, etc. Também se presta como reforço de cimento utilizado em caixas de
água e telhas.

Na área da saúde e da biologia os vidros modernos encontram aplicação, além


das funções clássicas, “passivas”, a que estamos acostumados (ou seja, frascos, 9
placas e outras vidrarias e acessórios estéreis, para manipulação de microorga-
nismos e uso em análises clínicas). Vidros antibacterianos são usados em hospi-

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tais em revestimento de paredes reduzindo os riscos de infecções hospitalares.

Recentemente, foram desenvolvidos os vidros de dissolução controlada ou vidros


biodegradáveis. Tais vidros podem liberar certos elementos químicos na terra, na
água, na corrente sanguínea ou no sistema digestivo, em quantidades constantes e
predeterminadas, ao longo de períodos que podem variar desde minutos até anos.
A utilização desses materiais em agricultura, biologia e medicina apresentam um
potencial vastíssimo. Uma das mais impressionantes aplicações biológicas dos vidros
são implantes ortopédicos, dentes artificiais e pequenas partes ósseas dos chamados
«bio-vidros”, isto é, vidros compatíveis com o crescimento de tecidos vivos.

Uma das propriedades tecnologicamente mais importantes dos vidros é a alta


durabilidade química de certas composições. Vidros milenares são conhecidos
sem apresentarem sinais de deterioração. Seu uso como recipientes de reagen-
tes químicos e produtos farmacêuticos, em vidraria de laboratórios e tubulações
de indústrias químicas está diretamente relacionado a essa característica. Seu
emprego para a imobilização de resíduos radioativos, provenientes das usinas
nucleares, é devido basicamente à sua alta durabilidade química por longos pe-
ríodos de tempo.

Numa lista indicando as 10 maiores inovações tecnológicas para o futuro, lista


preparada em 1983, através de uma consulta às 100 maiores empresas do Ja-
pão, e onde convivem desenvolvimentos fantásticos como biotecnologia e su-
percomputadores, três itens são diretamente relacionados a vidros e cerâmicas:
fibras ópticas, cerâmicas especiais e novos materiais. Para orientação, vale a
pena lembrar que o preço médio de venda de recipientes de vidro é da ordem
de R$1,00/Kg, enquanto as fibras ópticas para telecomunicação podem custar
acima de R$100,00/Kg.

3 - História
O vidro começou a ser empregado pelo homem desde a pré-história há cerca de
75.000 anos. O material se constituía de um vidro natural, existente na natureza
como mineral, e era usado por uma característica que muitas vezes atribuímos
como defeito que é o seu poder de corte.

Este mineral denomina-se obsidiana e era esculpido para produzir ferramentas e


armas com grande capacidade de corte. Lembre-se de que o homem ainda não
dominava a técnica de produzir metais naquela época.

As obsidianas, pela sua capacidade de gerar lâminas finíssimas, são empregadas


em ferramentas de corte de precisão, como nos bisturis que até recentemente
eram empregados em cirurgias do globo ocular.

A Figura 1 mostra peças encontradas, em sítios arqueológicos, produzidas com


obsidianas e utilizadas como armas e ferramentas.

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Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 1: Artigos em obsidianas, vidro natural, produzidos na pré-história.

Apesar de empregar o vidro há muito tempo o homem só começou a produzir


este material em torno de 4.500 anos atrás. Há várias teorias de como esse pro-
cesso tenha se iniciado. Uma delas é que seria a partir da escória da produção de
metais e outra dos “vidrados” que já se empregavam em cerâmicas para que as
mesmas tivessem uma superfície lisa e livre de porosidade.

Porém, a história preferida dos vidreiros é a de que naquela época mercadores


atravessavam o deserto da região do oriente médio, onde hoje se encontra o Ira-
que, com uma carga de natrão. O natrão é um mineral constituído de carbonato
de sódio, e mais adiante vamos ver que é uma das matérias-primas empregadas
na elaboração de vidro. O natrão também era usado por suas características an-
tissépticas nas mumificações.

Estes mercadores pararam para montar o acampamento durante a noite e se vi-


ram com dificuldade de encontrar onde apoiar a panela para cozinhar o jantar. A
solução encontrada foi empregar pedaços do natrão que transportavam, sobre
a areia do deserto. A união do calor do fogo com as principais matérias primas
produtoras de vidro fez surgir um material viscoso que escorreu e, ao esfriar, as-
sumiu um aspecto brilhante que encantou aos mercadores. Descobriu-se como
fazer vidro. A Figura 2 representa a descoberta.
Figura 2: Descoberta acidental do vidro

Nos primeiros mil anos após a descoberta de como elaborar vidro, este só foi em-
pregado com finalidade estética na confecção de jóias e artigos de decoração.
Somente por volta de 1500 AC, no Egito, foi que se iniciou o emprego do vidro
em artigos utilitários, na forma de embalagens.

Para fazer essas primeiras embalagens, o vidreiro colocava na ponta de uma has-
te metálica uma porção de argila que viria a se constituir a parte interna da em-
balagem. Em seguida mergulhava este núcleo em uma panela cerâmica onde es-
tava o vidro fundido. O vidro se esfriava em torno do núcleo de argila que depois
era retirada permanecendo a embalagem de vidro. Este processo esta ilustrado
na Figura 3. Notar que a produção do vidro só foi possível por já existir o conhe-
cimento da cerâmica.
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Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 3: Fabricação da primeira embalagem de vidro – Egito 1500 AC

Na figura 4 se encontram algumas peças expostas em museus que foram produ-


zidas naquela época. Notar que o vidro era muito colorido e não transparente.

Figura 4: Primeiras peças de vidro fabricadas pelo homem – Egito 1500 AC


Esta era uma maneira muito trabalhosa de produzir embalagens e, por essa ra-
zão, eram pouco usadas e apenas pessoas muito ricas podiam se dar ao luxo de
utilizá-las. Eram empregadas para armazenar cosméticos e medicamentos.

Descoberta do sopro
O grande advento que popularizou o vidro foi a invenção do sopro, que ocorreu
há cerca de 2000 anos, na Síria. Trata-se de colher uma gota de vidro na ponta de
um tubo metálico, denominado “cana”, e soprar uma bolha no seu interior para
constituir a parte oca de um artigo de vidro. Assim começaram a se produzir
embalagens com menor custo e maior produtividade, tornando-o acessível in-
clusive para cidadãos comuns.

Esta foi uma invenção tão marcante que ainda hoje, vinte séculos depois, os pro-
dutores de vidro manual ainda a empregam, e mesmo nas modernas máquinas
de conformação, as embalagens são conformadas por sopro, ainda que por meio
de máquinas sofisticadas. A Figura 5 mostra a colheita do vidro e o sopro realiza-
do de forma artesanal.

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Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 5: Colheita do vidro e o sopro

Cerca de 200 anos depois se começou a fazer vidros planos para vidraças em-
pregando o sopro. Os vidreiros produziam uma grande garrafa usando o sopro e
a gravidade. Cortavam as extremidades e ficavam só com o corpo que formava
um tubo. Em seguida faziam um corte longitudinal neste tubo e reaquecendo-o
abriam e faziam uma chapa.

A Figura 6 mostra este processo que ainda hoje é empregado na produção de


vidros artísticos aplicados em vitrais.

Figura 6: Processo de produção de vidro plano pelo sopro


O problema apresentado por estas chapas é que quando as estendiam no forno,
elas estavam moles e ficavam marcadas, em sua superfície, pelas imperfeições
que havia na sola do forno.

Por essa razão, no século seguinte, passou-se a produzir chapas de vidro a partir
de um recipiente soprado, mas na forma de um disco que se obtinha por centri-
fugação, pelo giro da peça. Primeiramente se produzia um recipiente, como uma
garrafa, transferido para uma ponteira fixada ao fundo desta garrafa, girada e por
meio da força centrífuga e assim se obtinha um disco de vidro. Este vidro chama-
do de “crown”, tinha melhor qualidade óptica porém apresentava limitação de
tamanho. Não se conseguia círculo maior que 1,5m de diâmetro e o centro, onde
se localizava a ponteira de apoio, ficava marcado e deveria ser desprezado.

A Figura 7 mostra o princípio da produção do vidro crown; e a Figura 8, uma foto


de um artesão produzindo este tipo de vidro.

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Introdução ao Vidro e sua Produção


Figura 7: Processo de fabricação de vidro plano tipo “crown”

Figura 8: Artesão produzindo vidro “crown” e peça marcada para recorte.

Nesta época, também se começou a soprar o vidro destinado a embalagens e


artigos domésticos dentro de moldes que imprimiam padrões à superfície. Na
figura 9, o desenho da esquerda representa este processo que perdurou como
o principal na produção de embalagens até o final do século XIX, como se pode
observar na foto da direita, de uma fábrica de embalagens deste período.
Figura 9: Sopro de embalagens de vidro dentro de um molde

Os fornos empregados para fundir o vidro eram aquecidos a lenha e o consumo


chegava a dois quilos de madeira por quilo de vidro produzido.

Uma representação artística dos primeiros fornos se encontra na figura 10. Nesta
figura, também há um corte de um modelo didático deste forno para melhor
compreender seu funcionamento. Em seu interior, há diversos potes de cerâmi-
ca onde se colocavam as matérias primas. Na parte inferior, existia uma câmara
onde a madeira era queimada e, na parte superior, havia saída para a fumaça.

O forno era aquecido para que a composição se fundisse e depois os artesões


14 retiravam o vidro para trabalhá-lo. Estas operações se repetiam ciclicamente
(carregamento das matérias-primas, fusão das mesmas, trabalho do vidro) em
períodos de 24 horas.
Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 10: primeiros fornos empregados na elaboração do vidro

Na idade média, por volta do ano de 1200, os vidreiros foram confinados na ilha
de Murano ao lado de Veneza, na Itália. Uma explicação para esse confinamento
seria para reduzir os incêndios que acabavam ocorrendo devido ao intenso uso
de combustão. Outra explicação seria para que não se espalhassem suas técnicas
que eram passada de pai para filho.

Em Murano ocorreu uma nova descoberta revolucionária: a produção de um vi-


dro muito claro e transparente que foi denominado de “cristallo”, por ter a transpa-
rência de um cristal. Ainda hoje se chamam “cristais” os vidros mais finos de mesa.
Até então os vidros produzidos tinham coloração intensa e baixa transparência.

A partir desse vidro claro e límpido puderam ser criadas lentes e a partir delas, fo-
ram inventados os binóculos (1590), microscópios (1595) e os telescópios (1611),
com os quais o homem começou a desvendar os segredos do universo. Também
nessa época, graças à produção dos recipientes especiais e do desenvolvimento
dos termômetros de laboratório, houve um grande desenvolvimento da Química.

Em 1665, durante o reinado de Luís XIV, foi fundada, na França, a companhia


que viria a ser, nos dias de hoje, a Saint Gobain, com a finalidade de produzir
vidros para espelhos, evitando assim a dependência que os franceses tinham de
Veneza. No início, foi utilizada a tecnologia veneziana de sopro, mas a partir de
1685, através de um método novo, que consistia na deposição da massa líquida
de vidro sobre uma grande mesa metálica. Sobre essa massa, passava-se um rolo,
da mesma maneira como se abre massa de pastel. A figura 11 mostra uma repre-
sentação artística deste processo. O vidro assim obtido devia ser polido para a
produção de espelhos, pois suas superfícies eram muito irregulares.

Figura 11: Processo de produção de vidro plano por laminação


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Com a revolução industrial no século XIX, a demanda de vidro aumentou muito
e processos mais produtivos foram procurados. Em 1902, um engenheiro belga

Introdução ao Vidro e sua Produção


chamado Fourcault lançou um método revolucionário de produção em massa
de vidro plano através da estiragem do mesmo na vertical – Figura 12. Outros
processos evoluíram a partir do Fourcault no século XX, processo Pittsburg de
estiragem na vertical e processo Libbey Owens estirado na horizontal.

Figura 12: Esquema e foto do processo Fourcault, primeiro a existir de vidro estirado

Para se compreender o princípio da estiragem, imagine colocar uma faca dentro


do mel e erguê-la em seguida. O mel que ficou preso à lâmina escoa na forma
de uma fita. Imagine agora que esfriemos esta fita e ela se torna rígida e conti-
nuamos a erguê-la. Mais mel será arrastado e esfriado, formando uma lâmina de
vidro contínua. O vidro era depois destacado em chapas.

Em 1880, inicia-se a produção mecânica de garrafas e, em 1915, é lançada a pri-


meira máquina IS automática até hoje empregada.
Em 1932 se iniciou a produção de vidro plano laminado através da passagem do
mesmo entre dois rolos. Mesmo princípio da produção do macarrão. Este pro-
cesso até hoje é empregado para produzir vidros impressos ou “fantasia”, que
apresentam figuras em relevo em uma das faces, e desta maneira são translúci-
dos, isto é, deixam passar a luz, mas impedem a visão através deles. A Figura 13
mostra o princípio deste processo.

Figura 13: processo de produção do vidro impresso ou “fantasia”

Porém a grande revolução na produção de vidro plano se deu com a invenção


de Alister Pilkinghton, em 1959. Trata-se da produção de vidro flotado sobre um
banho de estanho.

Conta a história que ele teve a idéia enquanto lavava louça. A água estava presa
na cuba da pia e a gordura sobrenadava, não se misturando com a água, criando
uma fina lâmina de faces perfeitamente paralelas.

16 Então ele pensou: será que não há um líquido sobre o qual possa se verter vidro
fundido para que ele forme uma lâmina da mesma maneira que a gordura na
água da pia? Este líquido não poderia nem se solidificar nem se evaporar na faixa
Introdução ao Vidro e sua Produção

de enrijecimento do vidro em torno de 600oC, e deveria ser bem mais denso do


que o vidro, para que este não afundasse. O estanho serviu a este propósito, e
continua sendo utilizado em todo o mundo para a produção massiva de vidro
plano.

Em 1965 iniciou a operação da primeira fábrica float em Saint Helens na Inglater-


ra, e hoje há centenas de fornos deste tipo no mundo, aposentando-se definiti-
vamente os processos de vidro estirado.

No Brasil, a primeira fábrica de vidro float iniciou sua produção em 1982 e hoje
é o único processo empregado na produção de vidros planos (com exceção do
impresso ou “fantasia”). A Figura 14 mostra o principio de funcionamento do pro-
cesso “float”. O Vidro fluido é vertido sobre um banho de estanho fundido e vai
se esfriando até ficar rígido. Este processo é contínuo e uma série de rolos extrai
a fita de vidro.

Figura 14: Principio de formação da chapa de vidro plano flotado.


Durante o século XX, muitas outras aplicações surgiram para o vidro: as fibras
que tanto servem para isolamento térmico e acústico, como para reforço de
outros materiais; as fibras ópticas, que substituem com enormes vantagens os
tradicionais cabos de cobre e alumínio utilizados em comunicações; lâmpadas;
isoladores, etc.

4 - Estrutura do Vidro
Mas o que é o vidro? Para responder a esta pergunta vamos recordar alguns con-
ceitos que todos já vimos na escola.

Toda substância é constituída de átomos. Eles são muito pequenos e impossíveis


de se ver, mesmo com os mais poderosos microscópios, e todas as características
e propriedades dos materiais dependem de como estes átomos se ligam entre si.

Um exemplo que mostra claramente isto são três materiais: o carvão, o grafite e
o diamante, que são constituídos do mesmo elemento químico, o carbono, cujos
átomos em cada um deles se encontram unidos por diferentes tipos de ligação.
Como resultado, estes três materiais têm comportamento e aspecto totalmente
distintos.

Outro conhecimento básico são os três estados em que as substâncias podem


se encontrar: sólido; líquido e gasoso. Cada substância tem uma temperatura ca-
racterística de fusão e evaporação. Abaixo da temperatura de fusão, será sempre
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sólida. Entre a temperatura de fusão e de evaporação, será líquida, e acima da
temperatura de evaporação, passará a ser um gás.

Introdução ao Vidro e sua Produção


Um exemplo clássico é a água: abaixo de 0oC ela é sólida (gelo), entre 0oC e
100oC está líquida e acima de 100oC se transforma em vapor, que é um gás.

Quando a substância está no estado sólido há uma grande força de atração entre
os átomos que ficam presos uns aos outros, e esta força faz com que eles de dis-
ponham de forma organizada, como soldados numa parada militar.

No estado líquido a força que os une é muito fraca e os átomos ficam soltos e o
material pode fluir. Imagine uma lata cheia de bolinhas de gude e que cada bo-
linha seja um átomo. Quando o material está no estado líquido, as bolinhas, ao
serem jogadas ao chão, correm soltas e se espalham, assim como ocorre quando
jogamos a água. As bolinhas soltas rolam umas sobre as outras sem organização.
No estado sólido é como se colássemos cada bolinha com a sua vizinha, forman-
do um arranjo ordenado que se repete ao longo de todo o material. Este arranjo
de átomos organizados é denominado “cristal” e, portanto, um sólido cristalino
é aquele em que seus átomos estão dispostos de forma organizada. A Figura 15
esquematiza o arranjo atômico nesses dois estados
Figura 15: Arranjos atômicos no estado sólido e líquido

Um exemplo de sólido cristalino é o cloreto de sódio, o sal que empregamos para


temperar alimentos. Ele é constituído de dois elementos: o sódio e o cloro que,
quando no estado sólido, apresentam a estrutura representada na figura 16.

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Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 16: Arranjo cristalino dos átomos no sal de cozinha.

Portanto, quando se esfria um material abaixo de seu ponto de fusão, os átomos


que antes estavam desorganizados devem se movimentar entre si para poderem
ocupar os lugares determinados por uma situação de organização.

Esta movimentação esta representada na figura 17.

Figura 17: Movimentação dos átomos na passagem do estado líquido para o sólido

Um material que gera o vidro em alta temperatura também se torna um líquido,


porém apresenta alta viscosidade. A viscosidade é a dificuldade de os átomos se
moverem uns em relação aos outros e, quanto maior ela for, mais dificuldade tem
o líquido de escoar. Um exemplo de líquido viscoso é o mel. Se jogarmos água
e mel sobre uma superfície plana, a água que apresenta baixa viscosidade vai
escorrer com facilidade, mas o mel que é muito viscoso vai escoar bem devagar
e também não vai conseguir se espalhar como a água.

Um material fundido que vai gerar vidro é viscoso e se comporta como o mel e,
à medida em que se esfria, sua viscosidade aumenta cada vez mais, dificultando
ainda mais a movimentação livre dos átomos que não conseguem se organizar
como no estado sólido de outros materiais.

Chega um momento, em uma determinada temperatura, que a viscosidade é


tão alta que os átomos não conseguem mais se movimentar de forma alguma
e a estrutura de líquido com os átomos desorganizados, fica congelada em um
material com todas as características de um sólido.

Todas as características e propriedades do vidro devem-se a esta estrutura desor-


denada de suas moléculas.

Dessa forma,muitas vezes o vidro é chamado de líquido. Porém isso não é ver-
dade. O vidro é um sólido que apresenta a estrutura semelhante à de um líquido,
isto é, seus átomos não estão organizados na forma de cristais como acontece
com a maioria de substâncias sólidas que conhecemos.

Estrutura do vidro e Processo produtivo


Uma consequência da estrutura desordenada do vidro é que uma mesma massa 19
deste material ocupa um volume maior do que se seus átomos estivessem na
forma cristalina.

Introdução ao Vidro e sua Produção


E na prática, quando produzimos o vidro a partir do esfriamento de um líquido
viscoso, dependendo da velocidade em que se dá o resfriamento, pode-se ter
uma pequena organização.

Falando de outra maneira, quanto mais rápido se esfria, maior é a desordenação


dos átomos e, portanto, maior o volume ocupado.

Podemos fazer um paralelo quando saímos para viajar de férias. Ao preparar a


mala, escolhemos com cuidado todas as roupas que pretendemos levar, estão no
armário, bem passadas e dobradas e as colocamos com cuidado na mala. Desta
maneira a mala fecha sem dificuldade.

No retorno das férias, as roupas já foram todas usadas, foram deixadas em algum
lugar sem o cuidado de serem dobradas e, como estamos tristes porque as férias
acabaram, fazemos a mala rapidamente, sem paciência, apenas com a intenção
de levar tudo de volta, afinal, terá mesmo de ser lavado.

Resultado: a mala da volta, mesmo contendo as mesmas roupas da ida, fica mais
volumosa e eventualmente até difícil de fechar.

Com o vidro acontece algo semelhante: se ele é esfriado rapidamente seus áto-
mos ficam mais “bagunçados” do que se ele for esfriado lentamente e, portanto,
ocupa um volume maior.

Quando fazemos a conformação de qualquer vidro, por exemplo, uma chapa


sendo laminada entre dois rolos metálicos, partes deste vidro se esfriará mais
rápido que outra, neste caso a pele em contato com os rolos, do que o vidro do
centro da chapa que vai se esfriar mais lentamente e, portanto, seus átomos po-
derão ter uma maior organização que, no fina,l ocupará volume menor. Porém,
tudo isso será uma chapa única, e estas diferenças de volumes gerarão tensões
que podem quebrar o vidro, ou pelo menos fragilizá-lo. A Figura 18 mostra a
evolução de tensões surgidas na laminação.

Figura 18: Desenvolvimento de tensões durante a laminação de uma chapa de vidro

Na produção de garrafas e outros artigos conformados em moldes metálicos,


o mesmo fenômeno acontece exigindo que todo produto de vidro, após a sua
conformação, sofra um processo de aliviamento de tensões denominado reco-
zimento.

Portanto, após a conformação, sempre é necessário efetuar um recozimento do


20
vidro, isto é, se aquece até a viscosidade diminuir e permitir a acomodação des-
tas tensões, seguido de esfriamento lento, por igual em todo o corpo da peça,
para evitar tensões residuais.
Introdução ao Vidro e sua Produção

5 - Elaboração do Vidro
Para se ter vidro, portanto, é necessário um material que quando fundido tenha
uma alta viscosidade, e que esta viscosidade aumente muito antes de chegar
ao ponto de solidificação, impedindo a ordenação dos átomos (que se chama
cristalização).

Não são todos os materiais que se prestam para gerar vidros. A água, por exem-
plo, é uma delas, pois sua viscosidade é praticamente a mesma, e muito baixa,
ente a sua temperatura de fusão (0oC) e sua temperatura de evaporação (100oC).
Portanto não importa quão rápido se esfrie a água, sempre seus átomos poderão
se movimentar entre si para gerar um cristal (átomos ordenados).

Porém várias substâncias não são assim. Por exemplo: o açúcar. Na temperatura
ambiente ele é um cristal. Cada grão é um pequeno cristal. Se o aquecermos
eles se fundem, tornam-se um líquido, formando o caramelo. Se jogarmos este
caramelo na superfície fria da pia ele se solidifica sem se cristalizar, formando,
portanto, um vidro. (Sim, bala de açúcar é um vidro!)

Aliás, vidro de açúcar é empregado no cinema para que nas cenas de quebra de
vidraças não haja risco de acidente com os atores, porém não podemos instalá-lo
em nossas janelas, pois com a chuva e lavagem eles desapareceriam, dissolvidos
na água.
A Figura 19 mostra a “fabricação” de vidro de açúcar

Figura 19: “Fabricação” de vidro de açúcar

O material mais empregado, e que gera vidro da mesma maneira que o açúcar, é
a sílica ou óxido de silício (SiO2), muito abundante na natureza. Ela é nossa velha
conhecida na forma da areia que há nas praias ou na areia empregadas nas cons-
truções. A Figura 20 mostra algumas formas de sílica encontradas na natureza.

21

Introdução ao Vidro e sua Produção


Figura 20: Alguns materiais encontrados na natureza e constituídos de sílica.

Se pudéssemos observar os átomos de um grão de areia, veríamos que eles se


organizam formando cristais, que são disposições organizadas e com formação
repetitiva. Se fundirmos estes grãos a organização acaba; se esfriarmos rapida-
mente (e nem precisa ser muito rapidamente), os átomos não conseguem se
reorganizar, permanecem amorfos (sem organização), gerando o vidro com pro-
priedades e características muito boas para as nossas aplicações, diferentemente
do vidro de açúcar.

A Figura 21 mostra uma unidade estrutural da sílica que; constitui-se de um áto-


mo de silício rodeado de quatro átomos de oxigênio, formando um tetraedro
(figura de quatro faces sendo cada uma um triângulo) Esses átomos se unem
pelos oxigênios formando uma rede tridimensional, que é a estrutura do vidro.
Figura 21: Unidade estrutural da sílica e como estas se unem formando uma rede espacial que é a estrutura básica do vidro.

Na figura 22 estão representadas a estrutura molecular de uma sílica cristalina,


como é encontrada na natureza e a mesma estrutura quando transformada em
vidro. Podemos fazer uma analogia onde cada molécula de sílica é um tijolo. Na
forma cristalina, os tijolos estão ordenados como numa parede. No vidro, os mes-
mos tijolos, estão em desordem, como se tivessem sido jogados ao acaso em
algum lugar.

22
Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 22: comparativo entre a sílica na forma cristalina e na forma vítrea

Vidros industriais
A sílica sozinha produz um excelente vidro com ótimas propriedades, porém
com um grave problema: seu ponto de fusão é muito alto, requerendo fornos es-
peciais e muito consumo de energia e, consequentemente, apresenta alto custo
de produção.

A solução encontrada para contornar este problema foi a de incorporar elemen-


tos fundentes à sílica, que baixam a temperatura de elaboração, mas mantêm
características adequadas para os produtos. Estes fundentes são o óxido de
sódio e o óxido de cálcio os quais, em conjunto com a sílica, produzem a família
de vidro denominada silico-sodo-cálcico ou simplesmente sodo-cálcico.

Ação dos Fundentes


A estrutura básica dos vidros à base de sílica é uma rede formada de silícios liga-
dos cada um a quatro oxigênios, e cada oxigênio liga dois átomos de sílica, como
mostrado na Figura 23. Esta figura é apenas esquemática, pois está nos dois pla-
nos do papel, mas na realidade a rede da sílica é tridimensional. Estas ligações
são muito fortes, razão do alto ponto de fusão dos cristais de sílica, e mesmo no
estado líquido elas continuam a agir provocando a alta viscosidade.

Figura 23: Esquema das ligações dos átomos em um vidro de sílica

Quando se adiciona o sódio à sílica, os átomos de sódio que têm muita afinidade
com o oxigênio unem-se a ele; e os oxigênios que se unem aos sódios, deixam
de ficar ligados ao silício, fazendo desta maneira um corte na rede. Quanto mais
sódios se adicionam, mais cortes na rede se apresentam e mais fraca ela fica. Isto
na prática se traduz com viscosidade mais baixa e menor temperatura de elabo-
ração do vidro. A Figura 24 mostra o efeito da introdução de sódio na estrutura
do vidro de sílica.

23

Introdução ao Vidro e sua Produção


Figura 24: Representação esquemática do efeito da adição de sódio ao vidro de sílica.

A introdução de sódio ao vidro traz um novo problema. Ele aumenta a solubili-


dade do vidro, isto é, quanto mais sódio se adiciona, mais o vidro fica próximo ao
vidro feito de açúcar, conforme já citado,

Por essa razão, introduz-se o sódio até determinado limite, e como neste limite o
vidro ainda se encontra muito viscoso para ser elaborado e trabalhado em tem-
peraturas industrialmente razoáveis, introduz-se um segundo fundente, que é
o cálcio.

O cálcio como o sódio se une aos oxigênios liberando ligações entre este e a
sílica, mas como ele é bivalente, cada átomo de cálcio se une a dois átomos de
sódio.

Por ele gerar uma nova ligação para cada duas destruídas, ele não é tão eficiente
como o sódio,;porém por ser muito pouco solúvel em água, pouco afeta a resis-
tência do vidro à solubilidade.

O efeito da introdução do cálcio ao vidro esta esquematizado na figura 25.


Figura 25:Representação esquemática do efeito da adição de cálcio ao vidro de sílica.

A estrutura de um vidro sodo-cálcico pode ser representada pela figura 26 que


mostra a rede de sílica interrompida pela presença de átomos de sódio e cálcio.

Observar que como o vidro não apresenta estrutura ordenada cristalina, por
exemplo, a do sal de cozinha da Figura 16, pode receber diferentes quantidades
de cada um dos fundentes, assim como de diversas outras substâncias e, portan-
to apresentar um leque infinito de propriedades

24
Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 26: Esquema da estrutura molecular de um vidro sodo-cálcico

Vidros sodo-cálcicos são empregados para a maioria das embalagens, vidraças,


lâmpadas, artigos domésticos, entre outros, participando com mais de 90% de
todo o vidro produzido no planeta.

A Figura 27 mostra exemplos de aplicações de vidros sodo-cálcicos e a faixa de


composição química em que eles se situam.

Figura 27: Exemplos de produtos produzidos a partir do vidro sodo-cálcico


e faixa de composição química em que eles se encontram.
6 - Propriedades dos vidros
As propriedades do vidro variam de acordo com a sua composição química.
Como a composição do vidro não é fixa e vários componentes podem ser adicio-
nados, em diferentes proporções, obtém-se vidros com propriedades variando
dentro de determinadas faixas.

Com o conhecimento do efeito de cada componente na estrutura do vidro é pos-


sível se projetar composições de vidros apropriadas para cada processo produti-
vo e aplicação final.

Um exemplo disso é a cor. É possível obter vidro isento de cor, mas também com
infinitas tonalidades desde a total transparência até a total opacidade. Isso se
consegue adicionando determinados componentes na massa de vidro.

Vamos agora descrever algumas das principais propriedades deste material.

Viscosidade
Esta é a propriedade mais importante para a produção do vidro. Viscosidade é a
dificuldade de um líquido de escoar e é o inverso de fluidez. Por exemplo, o mel
é mais viscoso que a água e a água é mais fluida que o mel.

O vidro para existir, já vimos, tem que apresentar alta viscosidade para impedir
a cristalização de suas moléculas. Quando um material se cristaliza, ao se esfriar,
perde a estrutura desordenada de líquido e não se torna um vidro.
25
A temperatura do forno de fusão é regulada para que o vidro atinja uma visco-
sidade suficiente para que a massa se homogeneíze e as bolhas presas no seu

Introdução ao Vidro e sua Produção


interior possam ser liberadas.

Para fabricar uma peça de vidro, isto é, conformá-la no seu desenho final, a visco-
sidade tem papel fundamental.

No início da conformação, deve-se ter uma viscosidade suficientemente alta


para poder formar uma gota. Se estiver muito fluido, como a água, por exemplo,
é impossível dar forma, pois ela escoa muito facilmente. Por outro lado, se a
viscosidade estiver excessivamente alta, o vidro estará muito duro e será difícil
imprimir forma.

Durante o processo de conformação, o vidro vai se esfriando e ficando mais vis-


coso. Ao se chegar à forma final desejada, ele deve estar viscoso o bastante para
não continuar a fluir, pois se isso ocorrer, ele escoa e se perde a forma necessária.
Por outro lado, ele não pode ficar demasiadamente viscoso enquanto se está fa-
zendo a conformação, pois fica difícil de trabalhar e pode-se chegar a um ponto
no qual ele já está rígido, mas a forma final não foi atingida.

Depois de conformada, a peça de vidro possui tensões devido ao esfriamento


desigual que sempre ocorre durante qualquer processo de conformação e deve
ser recozida. O recozimento consiste em aquecer o produto até uma tempera-
tura na qual a viscosidade seja baixa o suficiente para que microscopicamente
o vidro flua e alivie as tensões existentes na massa, mas não se pode esquentar
demais, baixando em demasia a viscosidade, sob pena de fazer o vidro escoar
pela força de seu próprio peso e se perder a forma necessária.
Ajustando a composição química, pode-se alterar a viscosidade adaptando-a ao
processo de conformação empregado.

O artista que faz uma peça manualmente leva mais tempo para conformá-la do
que uma moderna máquina automática, e sempre que o vidro começa a ficar
muito duro, para continuar seu trabalho, deve esquentá-la novamente repetindo
diversas vezes a operação ao longo da conformação até acabar seu trabalho.

A chapa de vidro sobre o banho de estanho deve ter viscosidade suficiente para
escoar e formar a folha, mas ao sair do float deve estar rígida o suficiente pra não
ser marcada pelos rolos responsáveis pelo seu transporte.

Resistência química
Outra propriedade fundamental é a inércia química do vidro, isto é, ele não reage
com quase nenhum componente podendo permanecer numa janela por séculos
com o mesmo aspecto de novo. Da mesma forma, embalagens de vidro não rea-
gem com os produtos que contém.

A foto da Figura 28 é de uma garrafa de cerveja recuperada de um naufrágio,


onde permaneceu por 200 anos no fundo do mar, e mesmo assim, apresenta
aspecto de nova além de ter conservado a cerveja por todo esse tempo, que
inclusive seria estudada por especialistas cervejeiros.

26
Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 28: Garrafa de cerveja recuperada de um naufrágio depois


de permanecer 200 anos no fundo do mar. O conteúdo estava intacto

Da mesma forma, vidros em janelas resistem por séculos mantendo as suas su-
perfícies lisas as quais permitem a passagem de luz.

Impermeabilidade
O vidro também é completamente impermeável, haja vista o exemplo da cerve-
ja, e em janelas protege contra as intempéries, ao mesmo tempo em que deixa
passar a luz. Como ele é formado a partir de um líquido, não possui porosidades,
o que lhe confere essa característica, impedindo a passagem de contaminantes
gasosos ou líquidos.

Resistência mecânica
Há uma grande confusão sobre a resistência do vidro e muitos o julgam um ma-
terial fraco. Um material fraco é aquele que não resiste e se quebra quando apli-
camos uma força ainda que baixa. Por exemplo, um giz é facilmente quebrável e,
de fato, podemos considerá-lo um material fraco. Mas o vidro não é fraco. Imagi-
ne um bastão de vidro do mesmo formato do giz, exige muita força para quebrar.
Ao contrário de ser fraco, o vidro é muito forte.
O vidro por outro lado é frágil, isto é, não é muito resistente a impactos. Hoje já
é comum se empregar vidro em pisos justamente porque ele resiste muito bem
a qualquer pessoa que passe sobre ele. Mas como ele é frágil, e pode quebrar
com uma batida, então estes vidros são laminados, ou seja, são constituídos por
diversas chapas de vidro entremeadas de um plástico de forma que as camadas
internas resistem ao peso. As de fora, se receberem algum impacto, podem até
eventualmente se quebrar, mas não será comprometida a segurança do conjun-
to. É o mesmo princípio aplicado nos vidros à prova de balas. Um exemplo deste
tipo de aplicação pode ser visto nas fotos da Figura 29

Figura 29: Aplicação estrutural de vidros planos laminados.

A quebra do vidro se dá pela conjunção de dois fatores: um defeito na superfície,


que pode se tornar o início de uma trinca, e uma força de tração que tende a abrir
esta trinca. A resistência de qualquer material se dá pela força como suas mo-
léculas estão ligadas. No caso do vidro, estas ligações são muito fortes, porém,
quando há um defeito no vidro, como um risco, na ponta deste defeito ocorre 27
uma concentração de tensões que chega a ser muitas vezes superior à tensão
que se está aplicando à peça de vidro como um todo, e então esta trinca pode

Introdução ao Vidro e sua Produção


abrir um pouco, e aí a tensão em sua ponta aumenta e ela abre mais, e assim
sucessiva e rapidamente, e o vidro se parte. A quebra ocorre quando essa trinca
atravessa toda a peça.

Portanto a resistência mecânica de uma peça de vidro está diretamente ligada ao


estado de superfície. Riscos, mesmos microscópios, lascas nos bordos ou qual-
quer outra imperfeição reduzem significativamente a resistência.

Este princípio é utilizado para cortar chapas de vidro. Com uma ferramenta se
faz um risco no vidro que será o início de uma trinca e depois se flete o vidro,
para gerar tensão de tração neste risco, e a trinca atravessa a chapa dividindo-a
em duas. Na verdade, o termo corte nem seria o mais adequado a esta operação,
mas sim destaque.

A Figura 30 mostra a sequência do processo de corte do vidro.


Figura 30: Sequência de corte de uma chapa de vidro

1 - Chapa original.

2 - Chapa com risco no local do corte.

3 - Chapa apoiada para o corte.

4 - Esforços aplicados e tensão de tração produzida na região do corte.

28 5 - A trinca iniciada no risco se propaga por ação da tensão de tração.

6 - Chapa cortada em duas.


Introdução ao Vidro e sua Produção

O risco para o corte é realizado com uma ferramenta que possui uma pequena
rodinha, como mostrado na figura 31, de um metal muito duro, chamado de ví-
dea, para conseguir riscar o vidro, que também é muito duro.

Figura 31: Ferramenta em vídea para riscar o vidro a ser cortado.

Resistência ao choque térmico


O vidro é um material muito mau condutor de calor. Sua condutividade é
comparada a alguns materiais conhecidos na tabela 1:

Tabela 1: Condutividade térmica do vidro e de outros materiais


Na verdade o vidro é um bom isolante térmico.

Uma consequência disto é que, se um um dos lados de uma vidraça se


aquece, o calor leva certo tempo até atravessar a espessura e aquecer
a outra face, pois o vidro oferece resistência à passagem do calor.

A região que se aqueceu se dilata enquanto a que continua fria permanece inal-
terada. Estas diferenças de “tamanho” geram tensões que, associadas a defeitos
da superfície, podem dar início a uma trinca.

O mesmo pode acontecer com as diferenças causadas pelo aquecimento da par-


te da vidraça exposta ao sol, enquanto as regiões dentro dos caixilhos não se
aquecem.

Fenômeno semelhante ocorre quando se coloca um líquido quente dentro de


um copo. A superfície do vidro em contato com a água se aquece e se dilata.
Enquanto isto, a superfície externa ainda está fria e não “quer” se dilatar. Como
resultado, geram-se tensões de tração na superfície fria externa, e se este valor
for acima do que o vidro pode suportar, ele vai quebrar.

Desta maneira, podemos afirmar que a capacidade de resistir a choques térmicos


é inversamente proporcional a quanto o vidro se dilata quando aquecido. Ou
seja, quanto maior for a dilatação térmica, menor será a resistência do vidro a
mudanças bruscas de temperatura.
29
A dilatação térmica depende da composição química do vidro. Para os vidros
sodo-cálcicos, peças de 4 a 5 mm de espessura suportam algo em torno de 60oC
de diferença de temperatura. É, portanto desaconselhável colocar água fervendo

Introdução ao Vidro e sua Produção


(100 oC) em um copo de vidro a temperatura ambiente, a não ser que ele seja
temperado.

Quanto mais fina for a peça, ainda que produzida com o mesmo vidro, menores
serão as diferenças de temperatura entre os pontos frios e quentes e portanto
mais resistente ela será ao choque térmico.

A quebra sempre se dá na região mais fria da peça, onde ocorre a tração, e comu-
mente o risco maior de quebra é quando o vidro está quente e sofre um esfria-
mento rápido. Por exemplo: tirar uma peça do forno e colocá-la sob a torneira ou
sobre uma superfície fria.

Por outro lado, se o aquecimento é homogêneo em toda a superfície, como den-


tro de um forno, toda a superfície fica comprimida devido ao aquecimento e não
há quebra.

Para aumentar a resistência de produtos de vidro a choques térmicos, funda-


mentalmente se empregam dois recursos:

1 A têmpera, que deixa a superfície do vidro em compressão, e neste caso, as di-


ferenças de temperaturas devem ser maiores para eliminar o efeito de compres-
são da superfície, ocasionada pela têmpera, e provocar a quebra. A resistência
destes vidros chega até cerca de 200 oC.

2 A mudança da composição do vidro para outra que dilate menos com o aqueci-
mento. É o caso do Pyrex. Trata-se de um vidro borossilicato, que dilata cerca de
60% menos do que um vidro sodo-cálcico para as mesmas temperaturas, e por
isso pode resistir a esfriamentos bruscos de até 150 oC.

Cor
A cor nos vidros é gerada por componentes que são dissolvidos em sua massa
durante sua elaboração. Normalmente são metais que interagem com a luz fil-
trando algumas cores e deixando passar outras.

As cores no vidro, além do aspecto estético, têm a função de filtrar determina-


das radiações de luz que sejam indesejáveis. No caso de embalagem de bebidas
e medicamentos é a radiação ultravioleta que pode deteriorar o conteúdo das
mesmas. É por isso que as cervejas e os vinhos normalmente são envasados em
recipientes verdes ou âmbar.

No caso das vidraças, além da filtragem do ultravioleta, que também desbota


mobiliário e tecido, procura-se evitar a passagem do infravermelho responsável
pelo aquecimento e assim incrementar o conforto térmico e economia de ener-
gia despendida com ar condicionado no interior de veículos e residências.

Matérias Primas
As matérias primas são muito importantes no processo de elaboração do vidro,
pois tudo o que se enforna no forno de fusão, sai na forma de vidro. Não existe
30 recurso de separar algo que foi enfornado errado e todo erro acaba comprome-
tendo a qualidade dos produtos.
Introdução ao Vidro e sua Produção

A qualidade das matérias-primas é muito importante para a obtenção de bons


resultados na produção, pois tudo o que entra no forno vai para o vidro final. Só
para sentirmos o quanto isso é importante, consideremos uma chapa de vidro de
20 metros quadrados e dez milímetros de espessura. Ela pesa 500 quilos, e para
elaborar essa quantidade de vidro são necessários 350 quilos de areia. Se nessa
chapa tiver uma inclusão, um material que entrou como contaminante e não se
fundiu no forno, de 0,5 milímetro de diâmetro, ela será reprovada. Ou seja, um
contaminante de 0,5mm de diâmetro em cada 350 quilos de areia pode reprovar
toda a produção.

Alem disso, a partir do momento em que se resolve o problema gerador do de-


feito, como trocar a areia por outra não contaminada, ainda se levam alguns dias
para se limpar o vidro contaminado que se encontra como lastro dentro do forno.

As matérias-primas são empregadas todas na forma de sólidos granulados com


os grãos variando de 0,1 a 2,0 mm de diâmetro.

Todas devem ser controladas e mantidas dentro de rígidas especificações tanto


no aspecto químico quanto no aspecto granulométrico, ou seja, no tamanho dos
grãos em que se apresentam, e ainda estar isentas de contaminações não fusí-
veis no forno ou que possam afetar alguma propriedade, como cor por exemplo.

Impurezas presentes nas matérias primas podem trazer defeitos, como inclusões
na massa de vidro ou dificuldade na fusão da composição. Grãos muito grandes
podem passar pelo forno sem serem fundidos gerando defeitos. Grãos muito fi-
nos podem ser arrastados pelos gases, atacar os revestimentos dos fornos, entu-
pir os canais de fumaças e se constituir material particulado poluente.
A grande maioria das matérias-primas empregadas na produção do vidro é de
minerais naturais. A extração de minerais é uma atividade controlada pelo De-
partamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) e deve ser executada com
um mínimo de interferência com o meio ambiente. Os locais de extração, ao final
do uso, devem ser entregues recuperados, e tudo isso deve ser muito bem docu-
mentado antes mesmo do início da exploração.

Todos os minerais empregados como matérias primas devem passar por algum
tipo de beneficiamento que garantam o atendimento das especificações. O tipo
de beneficiamento empregado depende das características do produto bruto
original e das especificações exigidas pela produção.

A fornecedora da sílica, a base do vidro, é a areia, encontrada em depósitos, onde


foi acumulada pelo tempo, pela ação da erosão das intempéries sobre as rochas.

A areia é a matéria prima presente em maior volume na composição. Também é


a mais difícil de fundir.

A Figura 32 mostra uma jazida de extração de areia. Neste caso, a própria nature-
za ajudou constituindo um depósito imenso de minério originário do desgaste
de rochas e que se acumulou, quer seja pela ação de ventos ou da água de rios,
já na forma granulada necessária para a introdução das composições vidreiras.
Ainda assim, esta areia deve ser beneficiada para separar os grãos muito finos e
os muito grossos, e livrá-la de componentes prejudiciais ao vidro.
31

Introdução ao Vidro e sua Produção


Figura 32: Jazida de areia vidreira. (Mineração Jundu)

Os fornecedores de cálcio, magnésio e alumina são rochas que devem ser retira-
das como em pedreiras, depois moídas, para chegarem à granulometria adequa-
da. Normalmente são separadas por explosões que formam grandes pedaços
que são moídos até atingirem o tamanho de grãos necessários para a utilização
na composição.

A Figura 33 mostra uma jazida de calcário que é o mineral normalmente empre-


gado para fornecer o cálcio ao vidro.

Figura 33: Jazida de calcário. (Mineração Jundu)


Existem algumas matérias-primas industriais que são produzidas através de pro-
cessos químicos. A mais importante, sem dúvida, é a barrilha ou carbonato de
sódio anidro, responsável por aportar o óxido de sódio ao vidro.

A barrilha empregada pelos vidreiros tem duas origens:

Barrilha trona ou natural:


É produzida a partir do mineral “trona”, constituído principalmente de carbonato
de sódio hidratado. A trona é um mineral raro presente em poucas regiões do
mundo, usualmente em lugares de clima desértico. As jazidas mais importantes
se encontram nos Estados Unidos e na Turquia.

Barrilha artificial ou Solvay:


É produzida a partir da salmoura dos oceanos através de um processo químico
denominado “Solvay”. Existe uma empresa com este nome que produz barrilha,
mas também muitas outras que o fazem empregando este processo.

A barrilha originária da trona é mais barata de se produzir, entretanto os locais


de extração são normalmente desertos longe dos centros produtivos de vidro
devendo, portanto, ser transportada por longas distâncias. A barrilha Solvay
pode ter fábricas localizadas em qualquer lugar perto da costa. Ambas atuam
no vidro de maneira indistinta e a escolha de uma ou outra se dá apenas por
razões econômicas.

32 No Brasil, não existe nenhuma produção deste material que, portanto, deve ser
todo importado. Ele também é de longe a matéria-prima mais dispendiosa, cons-
tituindo de 50 a 60% do custo da composição dos vidros sodo-cálcicos.
Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 34: Armazém carregado de barrilha recém descarregada de um navio.

Colorantes
O vidro obtido com as matérias-primas básicas é incolor. Para obter as diversas
cores possíveis de se configurar, ao vidro se adicionam alguns óxidos metálicos,
normalmente em pequeníssimas proporções, tanto que nem nos referimos a
eles em porcentagem, mas em PPM (partes por milhão). 1 PPM = 0,0001%.

Os colorantes mais usualmente empregados em vidros industriais são:

Óxido de cromo que produz o verde das garrafas de vinho


Figura 35: Garrafa de vinho colorida por óxido de cromo

Óxido de ferro que dá o verde das chapas de vidro plano. Sua cor é menos inten-
sa que a do cromo, porém retém a passagem de radiação infravermelha respon-
sável pelo aquecimento.

Figura 36: Artigos apresentando a coloração do ferro.


33
Óxido de cobalto gera um azul forte empregado em artigos domésticos, algu-
mas garrafas de vinho branco alemão e vidros planos impressos.

Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 37: Azul ao Cobalto

Óxido de cobre também confere cor azul, porém um pouco diferente da do co-
balto, com um tom mais esverdeado. Em alguns frascos de perfume se emprega
também óxido de neodímio, que também confere um tom de azul, porém é pou-
co empregado devido ao alto custo por ser componente muito raro na natureza.
A foto da Figura 38 mostra um frasco produzido com vidro colorido ao cobre e
outro ao neodímio.

Figura 38: À esquerda vidro azul ao Cobre e à direita ao Neodímio


Selênio dá uma cor rosada. O selênio é empregado em conjunto com o cobalto e
o ferro para produzir as cores cinza e bronze dos vidros planos.

Figura 39: Vidro ao Selênio

O óxido de manganês fornece uma cor “vinho” e é empregado em alguns vidros


planos impressos.

Os vidros planos “bronze” e “cinza” são obtidos com a mistura de três colorantes:
ferro, selênio e cobalto.

34

Figura 40: Exemplo de vidro plano cinza ou fumê colorido com ferro, selênio e cobalto.
Introdução ao Vidro e sua Produção

Caco
Referindo-se a matérias-primas de vidro não se pode deixar de mencionar o caco,
pois o vidro, de fato, é 100% reciclável e um quilo de caco introduzido no forno
vai gerar um quilo de vidro novo, com as mesmas características e propriedades
do vidro original com o qual se produziu o caco.

O uso do caco traz uma série de vantagens aqui divididas em três grupos:

Ecológicas ou de meio ambiente


Quando se usa caco, deixa-se de usar matérias-primas minerais novas. Por mais
cuidado que se tenha na exploração desses bens minerais, sempre há alguma
agressão ao meio ambiente e a sua redução é positiva.

O caco também exige menos energia para elaborar vidro do que as matérias-pri-
mas novas, pois ele já é vidro pronto que só necessita ser aquecido para recupe-
rar uma viscosidade que permita a sua conformação, enquanto as matérias-pri-
mas novas demandam energia para uma série de reações químicas necessárias
para transformá-las em vidro. Desta maneira quanto mais caco houver na com-
posição, menos energia será necessário empregar no forno e consequentemente
menos gases de efeito estufa serão emitidos.

Quando se recicla o caco, ele não está sendo descartado no meio ambiente e,
portanto, haverá menos agressão também nesta área.
Estratégicas
Como o vidro pode ser produzido só com caco, sempre é bom ter estocada certa
quantidade deste material na fábrica, pois em caso de algum problema como
demora na entrega de uma matéria-prima, pane no sistema de preparação da
composição, etc., enforna-se caco enquanto se busca a solução do problema
sem afetar a produção.

Econômicas
Como o caco exige menos energia para ser elaborado, podem-se produzir quan-
tidades maiores de vidro em um forno onde se emprega maior teor de caco.

Da mesma forma como se gasta menos energia na elaboração, reduz-se o custo


global de produção.

Por outro lado, a utilização do caco pode trazer alguns problemas e a maioria
deles se origina em contaminações que eventualmente estejam presentes. Im-
purezas que entram no forno de fusão junto com o caco como cerâmicas, metais,
etc., podem tanto ocasionar defeitos nos produtos como acelerar o desgaste do
forno.

Da mesma forma, a cor do caco pode ser um limitante no seu emprego, pois se
estamos produzindo vidro incolor não podemos usar nenhum caco colorido. A
recíproca não é válida: pode-se usar vidro incolor para produzir vidro colorido,
bastando acrescentar na composição as quantidades de colorantes necessárias
para colorir este vidro. 35

Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 41: estoque estratégico de caco em uma vidraria

8 - Processo Produtivo Industrial


Agora que já conhecemos o vidro e do que ele é feito vamos ver como ele é feito.

A figura 42: mostra o processo completo de produção em uma fábrica de vidro


plano float e a Figura 43 de uma fábrica de embalagens.

Figura 42: Fluxograma de uma fábrica de vidro plano


Figura 43: Fluxograma de uma fábrica de vidro embalagem.

As matérias-primas chegam à vidraria já prontas para serem utilizadas. A massa


de matérias-primas empregadas supera a massa de vidro correspondente produ-
zida, pois algumas delas perdem gases durante o processo de elaboração. Para
cada 1000 quilos de vidro produzido são necessários, aproximadamente, 1200
quilos de matérias-primas.

Devido ao grande volume de utilização, muitas vezes se privilegia transporte fer-


roviário e marítimo, porém, no Brasil 100% do transporte de matérias-primas,
com exceção das importadas até chegarem a um porto brasileiro, é feita por via
rodoviária.

8.1 - Usina de Composição


Chegando à vidraria, as matérias-primas são encaminhadas para a “usina de
composição” que tem a função de armazenar, dosar e misturar os materiais.

36 Fazer vidro é semelhante a cozinhar. A usina de composição é semelhante à parte


da cozinha onde se guardam os mantimentos e se faz sua dosagem seguindo a
receita do bolo.
Introdução ao Vidro e sua Produção

A usina de composição é constituída de silos de armazenagem, pelo menos um


para cada material, balanças dosadoras e um misturador para misturar todos os
materiais e homogeneizar a composição, semelhante a uma batedeira, que será
em seguida enfornada e fundida para se tornar vidro.

Um esquema de usina de composição é apresentado na Figura 44. Por intermé-


dio de elevadores de canecas e esteiras as matérias primas são conduzidas aos
seus respectivos silos. Sob cada silo existe uma balança responsável por dosar
cada material. Todos os materiais já pesados são conduzidos a um misturador
que em poucos minutos gera uma mistura homogênea de todos eles.

O caco não entra no misturador, mas é igualmente dosado e acrescido à mistu-


ra na saída do misturador. A composição assim pronta é conduzida ao forno de
fusão.

Figura 44: Esquema de uma usina de composição.


A receita que estabelece a quantidade necessária de cada material para produ-
zir o vidro que precisamos é chamada de “cálculo de composição” e com essas
informações se regulam as balanças que vão preparar a mistura para garantir a
obtenção de um vidro com a composição química adequada.

8.2 - Forno de Fusão


Depois de pronta, a composição é levada ao forno, onde é fundida e transfor-
mada em vidro. Da mesma forma que a massa do bolo se transforma em bolo
dentro do forno.

O forno é constituído de uma grande piscina sempre cheia de vidro fundido. De


uma extremidade dessa “piscina” vai se tirando o vidro para produzir os artigos,
enquanto que da outra se repõe a mesma quantidade de composição. O controle
da quantidade enfornada se dá por um sistema que mede o nível do banho com
grande precisão. Quando a extração está muito alta, o nível tende a baixar e o
medidor informa para a enfornadeira trabalhar mais rápido. Se o nível está alto, o
mesmo informa para a enfornadeira reduzir seu ritmo.

Sobre a piscina existe um espaço onde se faz a combustão do combustível que


pode ser óleo, mas preferencialmente se usa gás. A chama desta combustão
mantém a piscina aquecida e líquida e fornece energia para fundir a composição
que está entrando e que fica boiando sobre o banho até vir a fazer parte dele.

A figura 45 mostra o corte longitudinal de um forno de fusão.


37

Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 45: esquema de corte longitudinal de um forno de fusão

Os fornos de fusão empregados em vidro são regenerativos, isto é, aproveitam o


calor da fumaça antes de descartá-la para aquecer o ar que, em conjunto com o
gás, fará a combustão.

A Figura 46 revela corte transversal do forno mostrando as câmaras de regenera-


ção e o sistema de funcionamento.

Existe um ventilador que capta o ar do ambiente e o injeta no forno; antes, po-


rém, passando por uma câmara de regeneração de calor. Na entrada do forno é
misturado com o combustível e gera a chama. No primeiro esquema da Figura
46 mostra-se o ar entrando pelo lado esquerdo do forno e a fumaça saindo pelo
direito. A fumaça quente passa pelo regenerador do lado direito e o aquece (ao
mesmo tempo em que ela se esfria) indo em seguida para o filtro e a chaminé.

Depois de 20 minutos nesta situação, corta-se o combustível e se apaga a cha-


ma. A válvula de inversão muda de posição e o ar captado pelo ventilador passa a
entrar pelo lado direito. A câmara de regeneração do lado direito está bem aque-
cida, pois recebeu fumaça quente por vinte minutos, e então o ar se aquece antes
de entrar no forno recuperando parte da energia que seria perdida pela fumaça.

Em seguida, abre-se o combustível do lado direito, a combustão reinicia e a fu-


maça quente passa a aquecer a câmara esquerda, que agora está fria, pois rece-
beu ar da atmosfera pelos últimos vinte minutos.

A cada vinte minutos, este processo se repete.

38
Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 46: Sistema de regeneração dos fornos de fusão

A foto da figura 47 mostra o interior do forno de fusão. No momento está quei-


mando do lado esquerdo e a fumaça saindo pelo lado oposto. A superfície do
banho é espelhada e podemos notar as imagens refletidas na mesma.
Figura 47: Vista do interior de um forno de fusão.

8.2.1 - Refratários
Todo o interior do forno é revestido de material refratário, feito especialmente
para fornos de vidro devendo resistir ao calor e não contaminar o banho. Os for-
nos trabalham ininterruptamente por diversos anos e os refratários devem per-
manecer íntegros durante todo esse período. Depois de determinado período de
funcionamento, que pode ser até superior a 15 anos, o forno é apagado para ser
reformado, procedendo-se à troca dos refratários.

O período de funcionamento entre duas reformas ou entre a construção e a pri- 39


meira reforma é denominado de “campanha”.

Introdução ao Vidro e sua Produção


Os refratários são feitos sob medida, e as fotos da figura 48 mostram a pré-mon-
tagem de partes do forno, feita ainda no fabricante, para se certificar de que na
montagem vão se encaixar perfeitamente.

Figura 48: Pré-montagem de peças refratárias de um forno. Fonte: SEFPRO

A figura 49 mostra esquema dos refratários de um forno de vidro plano. No mes-


mo se observam os regeneradores dispostos de ambos os lados. As diferentes
cores representam diferentes qualidades de refratários que se empregam.

Um forno desses comporta em torno de 20 000 toneladas de refratários a um


custo da ordem de sessenta milhões de euros, podendo trabalhar 18 anos até ser
necessária sua parada para reparação.
Figura 49: Desenho representando um forno de fusão de vidro plano. Fonte: SEFPRO

A figura 50 mostra esquema dos refratários de um forno de vidro embalagem. No


mesmo se observam os regeneradores, sempre em número de dois, dispostos na
parte anterior do forno.

Figura 50: Desenho representando um forno de fusão de vidro embalagem. Fonte: SEFPRO

40
8.3 - Processo de Conformação
Após o vidro ter sido elaborado no forno de fusão, ele será conformado nos di-
versos produtos.
Introdução ao Vidro e sua Produção

A conformação inicia quando o vidro ainda está viscoso e pode fluir. Ao mesmo
tempo em que ele vai sendo conformado, ele se esfria e a viscosidade vai aumen-
tando. O processo de conformação deve terminar no exato momento em que o
vidro fica rígido para manter então a forma do produto final.

Caso a conformação seja muito lenta e não termine antes do enrijecimento, não
se chega ao produto desejado. Da mesma forma se ele for muito rápido e termi-
nar com o vidro ainda fluido, pelo próprio peso, ele vai escoar e perder a forma
necessária.

Existem vários processos de conformação empregados de acordo com o produto


almejado. O vidro plano, no passado, era estirado; e agora é flotado, conforme fi-
gura 14. Os produtos de cozinha normalmente são prensados em um molde que
confere a forma final ao mesmo tempo em que resfria o vidro. A figura 51 mostra
o esquema da prensagem de uma gota de vidro a fim de produzir uma saladeira:

Figura 51: Prensagem de uma saladeira


Fibras de vidro empregadas no reforço de plásticos são estiradas, ou seja, são
esticadas até chegarem à espessura necessária, que é de alguns milésimos de
milímetro. A figura 52 mostra a estiragem de fibras de reforço, alguns produtos e
algumas aplicações.

Figura 52: Processo de estiragem de fibras de reforço, alguns produtos


e um exemplo de aplicação de fibra de vidro reforçando plástico.

A figura 53 mostra o processo de fibragem da lã de vidro e um exemplo de apli-


cação deste material, excelente isolante termo-acústico. É o mesmo princípio da
produção do algodão doce.

41

Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 53: processo de fibragem de lã de vidro e um exemplo de aplicação


como isolante termo-acústico na construção civil.

As garrafas são sopradas dentro de um molde. No processo, primeiramente se


faz uma pré-garrafa e, num segundo sopro, conclui-se a forma final. O processo
é feito em duas fases, pois na primeira deve-se formar a boca, e no segundo, o
corpo da embalagem. A figura 54 a seguir representa as etapas da conformação
de uma embalagem:
Figura 54: Processo de conformação de embalagem

8.4 - Recozimento
Durante a conformação, como consequência do fato de que a massa de vidro
não se esfria por igual, são geradas muitas tensões. Devido a isso, o vidro deve
ser recozido, ou seja, levado até a temperatura de recozimento para alívio de
tensões e, em seguida, esfriado lentamente, todo por igual. Isto é feito no forno
de recozimento que aproveita a própria energia térmica que os produtos trazem
do forno.

O forno de recozimento é um túnel cuja entrada fica logo na saída da conforma-


ção do produto e tem um perfil de temperatura adequado para o tratamento
térmico. O vidro é conduzido dentro dele por um conjunto de rolos, no caso do
vidro plano, ou por uma esteira metálica nos demais.
42
Após o forno de recozimento, o vidro tem a sua qualidade verificada e é cortado
e empilhado para ser expedido, no caso de vidro plano, ou embalado em palets,
no caso de vidros de embalagem.
Introdução ao Vidro e sua Produção

A figura 55 mostra um forno de recozimento de uma linha de produção de vidro


plano:

Figura 55: Forno de recozimento.

9 - Transformação do Vidro
O vidro plano, diferentemente da maioria dos produtos de vidro, depois de pron-
to pode ser utilizado diretamente ou sofrer diversas transformações que lhe
agregam valor ou mesmo o transformam em um novo produto.

Um exemplo típico são os espelhos. Na verdade o que reflete a imagem não é o


vidro, mas uma fina camada de prata que é aplicada em sua superfície. O vidro
só tem a função de suportar a prata e, por ser uma superfície perfeitamente lisa,
não distorce as imagens. A prata também se oxida em contato com o ar e como
o vidro é totalmente impermeável, a protege. Para se fazer um espelho, do lado
oposto ao vidro, várias camadas são adicionadas após a aplicação da prata, tanto
para protegê-la como para impedir que alguma luz atravesse o vidro e atrapalhe
a observação da imagem refletida.

A têmpera aplicada ao vidro é uma forma de aumentar de 3 a 5 vezes a sua re-


sistência mecânica. O principio da têmpera se baseia no fato de que, quando o
vidro esfria mais rapidamente (mais desordenado), tende a ocupar maior espaço
do que vidro esfriado lentamente (mais ordenado).

Para se temperar uma chapa de vidro ela é aquecida até que quase comece a es-
coar. Em seguida se esfria com jatos de ar direcionados por toda a sua superfície.
Desta forma o vidro que está na camada externa, como se fosse a sua pele, esfria
rapidamente com o jato de ar. Porém o vidro do centro, que está protegido pela
pele, se esfria lentamente (o vidro é um mau condutor de calor).

No final do processo, o vidro da pele ocupa um volume maior, como se ele qui-
sesse crescer, mas fica impedido pelo núcleo que ocupa um volume menor e
quer se encolher. Isso tudo gera uma tensão de compressão na superfície que
impede, ou ao menos dificulta, qualquer defeito superficial de se tornar uma trin-
ca que quebraria o vidro.

Entretanto se por alguma razão alguma trinca penetrar no vidro e atingir a zona
em tração no núcleo, o vidro se quebra em muitos pedaços. Esta é uma vanta- 43
gem do vidro temperado, chamado muitas vezes de “vidro de segurança”, pois
por não se quebrar em pedaços grandes tem menos chances de ferir pessoas e

Introdução ao Vidro e sua Produção


normalmente os ferimentos são menos importantes.

O esquema da Figura 56 mostra a quebra em três tipos de vidro: o primeiro é um


recozido, que é o vidro como sai do processo float; o segundo é um vidro lamina-
do constituído por duas lâminas de vidro recozido com uma camada interna de
um plástico especial, chamado de polivinilbutiral ou PVB, que adere ao vidro, não
interferindo em sua transparência, e segurando firmemente os cacos, em caso de
quebra evitando-se assim riscos de cortes nas pessoas que estiverem próximas; e
o terceiro é um vidro temperado que se quebra (com mais dificuldade) em mui-
tos pedaços pequenos e com os bordos arredondados.

Figura 56: Quebra de vidro recozido; laminado e temperado.

Os para-brisas de todos os veículos são fabricados em vidro laminado por ques-


tões de segurança. Em caso de quebra, o vão não fica vazado e se pode prosse-
guir a viagem, além de gerar menos riscos ao condutor e passageiros. O vidro
temperado, quando se quebra, produz muitos fragmentos e pode atingir o rosto
dos ocupantes do veículo. Se por outro lado ele quebrar e ficar no local, a visibi-
lidade do motorista será prejudicada e, em casos assim, por instinto, é comum
brecar violentamente o carro e sofrer colisão traseira.

Os demais vidros dos veículos são temperados.

O carro da foto da Figura 57 está apoiado sobre um vidro temperado e a cabine


telefônica da foto da Figura 58, vandalizada, também tinha vidro temperado, e
a da Figura 59 vidro laminado. O plástico garante o fechamento e a segurança
tanto do imóvel como de pessoas que estivessem por perto e poderiam se ma-
chucar se fosse vidro recozido ou mesmo temperado.

O plástico intercalar pode ser de diversas cores com aplicações muito interessan-
tes em arquitetura. Um exemplo é o edifício da foto da Figura 60.

Figura 57: Carro sobre vidro temperado

44
Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 58: Aspecto da quebra de vidro temperado.

Figura 59: Aspecto da quebra de vidro laminado.


Figura 60: Exemplo de aplicação de vidro laminado colorido na arquitetura.

Revestimentos superficiais
Vários tipos de revestimentos superficiais podem ser adicionados ao vidro me-
lhorando algumas de suas características e agregando outras novas. A seguir são
apresentados três exemplos:

A Figura 61 mostra a foto de um vidro auto-limpante que possui um revestimen-


to superficial que, com a ação da luz, reage com partículas de sujeira depositadas
na superfície eliminando-as e, assim, reduzindo a necessidade de limpeza. Eles 45
são ótimos em aplicações onde o difícil acesso torna complicada a limpeza.

Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 61: Vidro normal X auto-limpante

A Figura 62 mostra a foto de um vidro antirreflexo muito empregado em vitrines


de lojas de rua. Durante o dia o lado externo da loja é muito mais claro que o seu
interior. Quando se olha para a vitrine, parte desta claridade é refletida pelo vidro
o que impede ou pelo menos atrapalha a observação do interior da loja. Nos
vidros antirreflexo a claridade é muito menos refletida e fica mais fácil observar
o interior da loja. E este é justamente o objetivo do lojista, exibir seus produtos.
Nesta foto, para efeito de comparação um vidro antirreflexo está instalado ao
lado de um vidro normal.
Esta aplicação também é muito utilizada em lentes oftálmicas.

Figura 62: Vitrine montada com uma chapa de vidro normal (à esquerda)
onde o reflexo do exterior dificulta a visualização do interior e uma chapa de vidro antirreflexo (à direita).

Vidros semi-refletivos refletem parte da luz solar incidindo sobre eles reduzindo
o aquecimento interno dos edifícios. A foto da Figura 63 mostra algumas aplica-
ções deste tipo de vidro na arquitetura.

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Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 63: Exemplos de aplicações de vidros semi-reflexivos.

Os vidros de baixa emissividade também conhecidos com Low E (sua designação


em inglês) são uma evolução a partir dos semi-refletivos. Eles deixam passar toda
a luz visível e, portanto não dão aquele aspecto de espelho dos anteriores, mas
impedem a passagem da radiação infravermelha responsável pelo aquecimento.

Eles são aplicados em refrigeradores comerciais de bares e supermercados que


precisam exibir os produtos e não deixam o calor entrar nos mesmos evitando
assim necessidade de maior consumo de energia na refrigeração.

O mesmo acontece em residências. Em clima frio não deixa o calor do aqueci-


mento interno se evadir pela janela e em clima quente não deixa o calor do ex-
terior penetrar no imóvel. Isso gera conforto térmico e economia de energia e
indiretamente redução de emissões de gases produtores de efeito estufa.

A figura 64 mostra alguns exemplos de aplicações de vidros de baixa emissivi-


dade.
Figura 64: Aplicações típicas de vidro de baixa emissividade.

Vidros podem ser pintados com uma tinta que adere a sua superfície permane-
cendo para sempre. Essas tintas são à base de vidros coloridos que com o aqueci-
mento se fundem e se soldam á superfície do vidro. Inúmeras aplicações podem
ser realizadas com este recurso. A Figura 65 mostra alguns exemplos de aplica-
ções destas tintas realizadas pelo processo de silk screen, o mesmo empregado
para aplicação de desenhos em tecidos.

47

Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 65: Exemplo de vidros pintados

Um ponto fraco do vidro em imóveis que é a resistência à passagem de fogo em


caso de incêndio também já foi solucionado com vidros laminados especialmen-
te projetados para esse fim.Vidros a prova de fogo apresentam o mesmo aspecto
dos utilizados cotidianamente, mas garantem a segurança de pessoas e equipa-
mentos em caso de sinistro alem de reduzir prêmios de seguro impostos pelas
seguradoras. A Figura 66 mostra um ensaio deste tipo de produto que resistiu à
intensa ação das chamas.
Figura 66: Vidros a prova de fogo

Já existe no mercado vidros que ao apertar de um botão se tornam transparentes


ou opacos dependendo da vontade do utilizador dispensando cortinas e alter-
nando privacidade e possibilidade de observação. As fotos da Figura 67 mostram
as duas situações deste produto: transparente e opaco.

48
Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 67: Vidro que se torna opaco ou transparente com o apertar de um botão.

Vidros foto crômicos permitem escolher o nível de escurecimento desejado para


o mesmo. São muito adequados para tetos de veículos. As fotos da Figura 68 são
alguns exemplos.

Figura 68: Vidros foto crômicos que permitem escolher o nível de escurecimento.
Vidros foto cromáticos podem ser considerados materiais inteligentes que cla-
reiam quando há pouca incidência de luz no ambiente e escurecem quando há
muita luz. São muito empregados em lentes oftálmicas como mostra a Figura 69.

Figura 69: Lentes foto cromáticas

Vidros muito finos e extremamente resistentes a riscos e quebras são aplicados


hoje em tablets, telefones celulares, computadores, etc..A Figura 70 mostra al-
guns desses artefatos.

49

Introdução ao Vidro e sua Produção

Figura 70: Vidros extremamente finos e resistentes aplicados em tablets, fones e televisores.

Vidros são imbatíveis nos sistemas de aproveitamento da energia solar quer seja
no aquecimento quer seja na transformação da luz em energia elétrica em dispo-
sitivos foto-voltaicos como pode ser observado nas fotos da Figura 71.
Figura 71: Aplicação de vidros em artefatos que empregam a luz solar no aquecimento e na produção de energia elétrica

Esses são apenas alguns exemplos de como este material milenar cuja compo-
sição não se alterou muito desde milênios continua atual sempre presente, evo-
luindo e participando ativamente dos desenvolvimentos tecnológicos e da vida
das pessoas.

50
Introdução ao Vidro e sua Produção
10 – Bibliografia
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14 Cable, M. , Theads of Glass, Glass Technology 29, October 1988 p. 181-187

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Introdução ao Vidro e sua Produção


Esta publicação foi impressa em papel offset 90g/m2 (miolo) e pa-
pel couché 230g/m2 (capa).

Fontes utilizadas: Colaborate título 25pt, subtítulo 14pt, Palatino


texto 10pt, Helvetica neue (quarta capa) 8pt.
MAURO AKERMAN
Engenheiro Metalurgista pela Escola Politécnica da USP.
Doutor em Engenharia Metalúrgica e Materiais pela Escola Politécnica da USP.
29 anos de experiência industrial na área de elaboração do vidro e gerenciamento
de programas de formação em tecnologia vidreira na Saint Gobain Vidros.
Atualmente consultor independente nas mesmas áreas, coordenador da Escola
do Vidro da ABCeram (Associação Brasileiras de Cerâmica) e membro do comitê
técnico da ABIVIDRO (Associação Brasileira das Indústrias Automáticas de Vidro).

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