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OP

POLÍTICO , ,,
_?,;

NARCOTRAFICO
TERCEIRO MUNDO N'! Il3

AOS LEITORES SUMÁRIO

epois da excelente 3 CARTAS - - - - -- - - - - - - -

D acolhida que teve o


número dedicado ao
problema da droga em junho de
4 PANORAMA TRICONTINENTAL-----

84 (ver terceiro mundo n\! 67), MATÉRIA DE CAPA - - - - - - - - -


recebemos inúmeras cartas 1O Drogas: o poder paralelo
pedindo que voltássemos a tratar 18 Legalizar: prós e contras
do assunto. Sem dúvida, a droga
se tornou um dos grandes temas AMÉRICA LATINA - - -- - -----
de nosso tempo e o que se vincula 22 Chile: O complicado caminho rumo à democracia
a ela merece ser acompanhado 24 A estratégia do não
com atenção e entendido em toda 26 Guatemala: Cessar-fogo, o início do diálogo
sua complexidade. Porque é ao
mesmo tempo um problema DESARMAMENTO - - - - - - - - - -
econômico, social, ético e político, 29 Atlântico Sul: Um lago que aproxima ou um
tendo inclusive implicações oceano que separa?
militares. 32 lpra: Cientistas contra a bomba
Nesta edição, quatro anos·depois,
dedicamos novamente a capa de ÁSIA - - - - - -- -- - - - - --
nossa revista ao tema das drogas. 33 Vietnã: Ilhas Nansha em disputa
Em dois artigos de grande 34 Transasiática: A estrada inacabada
qualidade jornalística, escritos por
uma jurista e um especialista na ÁFRICA - - - - - - -- - - - - - -
matéria, mostramos como o 39 África Austral: A rota está traçada
problema da droga, e em especial 41 Angola - Brasil: Ampliam cooperação
do narcotráfico, interfere na vida 42 Angola: Um sindicalismo participativo
dos países da América Lati na. Isso
ocorre tanto naqueles que se C U L T U R A - - - - - - - -- - -- -
tornaram grandes produtores da 44 Nicarágua: Relatos de um protagonista
folha de coca pelos altos preços 45 EI Salvador: A universidade popular
que a cocaína atingiu no mercado 46 Egito: A vitrine da história
norte-americano, como nos que
são utilizados como rota da droga SUPLEMENTO BRASIL · - -- -- -- -
em direção aos centros 48 Esporte: O que fará o Brasil em Seul
consumidores dos Estados 53 Consumo: Promoções, a muleta dos comerciantes
Unidos. Nesse número 56 O preocupante quadro dos salários
acompanhamos também o debate 58 Panorama Nacional
que acontece na sociedade 60 Economia: Empresariado assume o nacionalismo
norte-americana, envolvida no 64 Cebracan, a luta pela autonomia
desafio de ver mil hões de pessoas 66 Opinião: A visão jornalística da História
submetidas a ditadura da 68 Saúde: Autismo, um mal desconhecido
dependência dos narcóticos. 72 A "via-crucis" da família
Cadernos do
INTERCÂMBIO TERCEIRO MUNDO
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rtallda<MI, aspir1çOn e lutaa doa pal1ea
emergentes, deatinedas I con1olldar uma Nove
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CARTAS

importantes. E nada disso acontece Denúncia Em Lima também


por casualtdade. I= que os Estados
Unidos começaram a ter influência Queremos agradecer penhora- Passei uns dias em Lima num
nos setores antes marginalizados da damente a divulgação da denúncia congresso e reencontrei terceiro
vida partidária, como os negros e as de ameaças de morte contra nossos mundo, revista que acompanho
comunidades de origem latino-ame- dirigentes no Maranhão, compa- desde os primeiros números, mas
ricana que desta vez têm voz. nheiros Simar e Luiz Vilanova, em que há alguns meses não via. Me
William Smith M . sua importante revista . agradou a sua diagramação, os ar-
Los Angeles, Ca. EEU U Esperamos que terceiro mun - tigos continuam in teressantes. Vejo
do continue divulgando as lutas do agora uma ênfase altamente elogiá-
Pinochet não pode movimento camponês brasileiro. vel em seções, como mulher e mino-
permanecer Isaías Vedovato rias, que antes eram menos trata-
Executiva das.
A América Latina não pode cru- Nacional/Movimento dos Espero que continuem nesse
zar os braços enquanto o povo chi- Trabalhadores Rurais caminho, sem esquecer que na
leno se organiza e luta em todos os Sem Terra América Latina temos poucas fontes
campos para pôr ftm à longa ditadu· de informação fidedignas sobre o
ra de Pinochet. Todos nós, polflicos, Parabéns resto do Terceiro Mundo. E que
dirigentes sindicais, estudantes, li· nossas realidades, complexas e
deranças femininas, terfamos que Quero parabenizar o editor pelo subdesenvolvidas, são muito mais
nos un,r para pressionar cada um excelente trabalho, que é refletido ricas que a simples amostra que nos
Dukakis: expectativa liberal
dos nossos governos, em uma am- nos exemplares de terceiro mun- brinda a vida polftica de cada um
Dukakis e o Terceiro Mundo pla campanha de opinião pública, do, que recebo mensalmente. dos nossos pafses.
para romper relações com o regime Márcio Antônio Araújo Horácio Márquez
A convenção democrata já ele- de Pinochet se o resultado do pte- Caixa Postal 032 Almeida
geu Dukakis como candidato presi- b1sc1to não for respeitado. 30.161- Belo Horizonte-MG San Pedro Sula
dencial. Para essa vitória, esse filho I= evidente que agora as condi· Honduras
de ,m,grantes gregos contou com o ç6es internas são muito diferentes Em primeiro lugar não poderia
apoio de um setor cada vez mais in- daquelas da outra consulta popular, deixar de parabenizar toda a equipe Novo formato
fluente do Partido Democrata que quando Pinochet acabou impondo a de terceiro mundo pela d celente
é liderado pelo pastor Jesse Jack- Conslttuição de 80, num plebiscito. qualidade e independência das Realmente de impacto o novo
son. Isso, aparentemente s1gntf1ca Naquela oportunidade, sua ftgura matér,as. Como estudante sei que formato do terceiro mundo. Estou
que Dukakis teri1 que escutar a ainda não havia sofrido o desgaste só com liberdade e independência também muito impressionado com a
Jackson (quem sabe não o nomea- de hoje, as forças polfl,cas estavam consegwmos aprender algo. qualtdade da edição em inglês. Fe-
rá, inclusive, para algum cargo de desorganizadas, o povo estava em Recebi a revista referente a mato licitaç6es por esse trabalho tão de-
pr,me,ro escalão, como embaixador outra etapa de sua luta. e lendo a seçao de cartas, note, que safiador.
na ONU ou melhor ainda como se- As mulheres, em especial, têm não me enviaram o n 9 108 de mar- Medea Benjamin
cretár,o de Estado?). mostrado um alto nfvel de combalt· ço. Desde já agradeço. Senior Analyst
Isso permite acalentar certa es- v1dade e organização. Elas pos- Elizabeth Pereira Food First
perança de ver o pró xmo presidente suem, inclusive, toda uma estrutura Méier- Rio de Janeiro San Francisco· EEUU
dar uma v,rada signif1caltva na polf- trabalhando em função da derrota
tica externa dos Estados Unidos de Pinochet nas urnas. Por isso A realidade
(não vamos ser pess1m1stas e pen- também nós, cada um dos demo- latino-americana
sar que vai ganhar o Bush). Nesse cratas da América Latina, temos que
caso se pode concretizar no próximo contr,bu,r e fazer respeitar a vontade Os estigmas - subdesenvolv,-
perfodo presidencial norte-amer,ca- do povo chileno. mento, reforma agrária, analfabe-
no a esperada conferência interna- Estela Galván tismo - da América Latina, não se-
cional de paz para o Oriente Médio La Paz, Bollvia rão vencidos pelos métodos tradi-
(Jackson reivindica a proclamação cionais, nem com promessas vãs,
de um estado palestino indepen- Intercâmbio de discos demoradas e não cumpridas. O
dente, que Dukakis não acetlou que analfabetismo cresce no Brasil e os
constasse na sua plataforma, talvez Por saber que terceiro mundo métodos de combate não chegam a
por uma questão tática, porque ne- ctrcula e tem grande penetração em afetá-lo substancia/mente. Continua
cessita do voto da comunidade ju· pafses da América Latina, Ásia e uma minoria dominante que faz a
daica). Com Dukakis é provável que África, quero que me ajudem a en- situação permanecer, a não ser que
Israel seja pressionado a negociar trar em contato com pessoas que a população descubra rumos e sai·
essa ou outra solução aceitável para desejem trocar discos, fitas casse- ba o que quer. Quando o homem da
os palestinos. E a Africa do Sul po- tes, livros sobre o Terceiro Mundo. zona-da-mata deixará de apanhar e
deria ser levada a cumprir o plano Eu posso enviar material espec11ico O Guia do Terceiro quando os cidadãos dos morros das
de paz que aceitou para a Africa me· do Brasil. Tenho 36 anos, sou mé- Mundo: um instrumento grandes capitais descerão pelos
ridional. (Se Bush ganhar é provável dico (casado), amo a música e sou Quero felicitá-los pela publica· seus direitos? Os filósofos e cien-
que esse plano nunca saia do assinante do terceiro mundo há ção do Guia do Terceiro Mundo, tistas polt1icos e os polfticos nacio-
papel.) mais de três anos. uma ferramenta insubstituível para nais e latino-americanos menos
Por isso o terce,ro mundo e as G ildo Andrade Simões professores, estudantes e profissio· medfocres devem rever as posições
forças nacionalistas latino-america- Rua C, n2 22 1 nais que necessitam de informação e ajudar a formular uma filosofia de
nas em particular podem acalentar Jardim Santo Antônio sobre o mundo contemporâneo. ação.
esperança. Em relação à Nicarágua Atalaia - Araca ju Rosa Marra Vieira José de Jesus Moraes Rego
poderão haver também mudanças Sergipe- Brasil Canelones- Uruguai Brasflia-DF
PANORAMA

ções ainda este ano, possi-


velmente em novembro.
Mas ele não havia decidido
se seria, mais uma vez, o
candidato exclusivo, ou se
f-\averia de permitir o livre
jogo democrático, reivindi-
cado pela oposição, em par-
ticular pela herdeira política
do presidente Ali Bhutto,
sua filha Benazir, que depois
de um longo exílio, voltara
ao Paquistão para reorgani-
zar o Partido do Povo Pa-
quistanês.
Horas depois do acidente
aéreo que vitimou Zia e os
seus acompanhantes, entre
Zia e Raphel: objetivos comuns uniam general e embaixédor eles muitos militares da
mais alta graduação, a pre-
PAQUISTÃO: para a região, conflagrada sidência foi ocupada de for-
também pela guerra do ma interina pelo sucessor
golfo. indicado na Constituição,

Um futuro incerto Nos últimos meses de vi-


da, Zia havia endurecido a
Ghulam lshaq Khan, presi-
dente do senado. Mas, não
linha do governo, dissolven- há nenhuma legalidade que
O avião em que viajava o do o parlamento, em maio, e o sustente, já que o governo
presidente do Paquistão destituindo o único primei- de Zia era fruto de uma si-
Mohamed Zia ul-Haq explo- ro-ministro civil dos onze tuação anômala, questiona-
diu no ar, possivelmente por anos em que esteve à frente da dentro e fora do país.
causa de uma sabotagem, da nação, Mohamad Khan Nas próximas semanas,
no dia 17 de agosto, matan- Junejo. deverá ficar claro se as for-
do unto com o general ou- O Paquistão, assim como ças armadas - que davam
tras 30 pessoas, entre elas o a Índia, segundo dados dos apoio ao general Zia para se
embaixador norte-america- especialistas internacionais, manter no poder - optam
no em Carachi, Arnold Ra- detém a bomba atômica. E pelo retorno à democracia
phel. O acidente não pôs fim Zia havia dado ênfase toda ou se cedem à tentação de
só à vida de Zia, mas a toda especial à questão militar apontar um herdeiro para o
uma etapa da política pa- em geral, por considerações falecido presidente.
Ghulam lshaq Khan geopolíticas, chegando a Não é só o povo paquis-
quistanesa dominada com
mão de ferro pelo general a Zia mostrar aos Estados destinar 38% do orçamento tanês que está preocupado
morto. Unidos que poderia ser um do país aos gastos de defe- com o futuro político de seu
Zia tomou o poder num aliado útil, para influir nos sa. Esse motivo, aliás, foi país. Pelo seu papel na crise
golpe de estado, em 1977, e rumos da questão afegã. Foi citado como uma das causas afegã (Zia pessoalmente as-
mandou à forca o presidente justamente por necessitar de do seu desentendimento sumiu a representação dos
deposto, Zulfikar Ali Bhutto, um gendarme, que lhe asse- com o primeiro-ministro rebeldes muçulmanos e ne-
dono de grande carisma e gurasse o monitoramento deposto, que, aparente- gociou os acordos de Gene-
força popular. Seu contro- da crise afegã e o uso da mente, desejava reorientar bra, que estão permitindo a
vertido e temido governo fronteira e do território co- os gastos do Estado para as retirada das tropas soviéti-
passou por um difícil perío- mo santuário para os rebel- esferas produtivas. cas), pelo seu poderio militar
do inicial de isolamento in- des muçulmanos afegãos, Após oito anos de lei e atômico, e pela histórica
terno e externo, até que a que Washington rapida- marcial, o país agora se de- rivalidade com a Índia, todos
crise no Afeganistão e a en- mente retomou a ajuda eco- fronta com uma realidade os vizinhos do Paquistão, e,
trada das tropas soviéticas nômica ao Paquistão. Pouco nova. Depois das eleições de naturalmente, as superpo-
nesse país, com o qual o Pa- depois, esse país se conver- 1985, nas quais fora candi- tências, estão atentos à
quistão divide uma extensa tia numa peça chave da es- dato único, Zia tinha falado evolução da sua situação
fronteira terrestre, permitiu tratégia norte-americana na realização de novas elei- interna.
PANORAMA

IRA-IRAQUE: sencadearam o conflito: a URUGUAI:


disputa territorial, particu-
larmente em torno do canal
O cessar- fogo, afinal de Shatt-EI Arab, e a natu-
reza e o comportamento i n -
Os Oito buscam
Desde o dia 20 de agosto, geral Javier Pérez de Cuél- ternacional da Revolução integração
está oficialmente em vigor o lar, os governos do Irã e do lslãmica liderada pelo aia-
cessar-fogo entre o Irã e o 1raque concordaram, no dia tolá Komeini. O Grupo dos Oito vai
Iraque, após quase nove 8 de agosto, em suspender o Houve, nesta primeira fa- realizar acordos, para ativar
anos de uma guerra, que fogo, admitir uma força in- se, concessões de ambas as projetos de integração eco-
deixa os dois palses com ternacional de supervisão da partes: o Iraque aceitou o nômica, cultural e científica,
imensos prejuízos e uma trégua, iniciar a troca de pri- cessar-fogo antes de nego- antes da segunda reunião de
perda humana calculada em sioneiros, refluir as respecti- ciações diretas, enquanto presidentes, que acontecerá
mais de um milhão de vas tropas para as fronteiras o Irã deixou em segundo no Uruguai, em outubro.
mortos. Força especial das nacionais e dar partida às plano o que fora uma exi- Especialistas do Grupo
Nações Unidas, integrada negociações de fundo sobre gência prioritária, a de que o estiveram reunidos no mês
por algumas centenas de a paz. Os combates cessa- adversário fosse declarado passado em Montevidéu e
técnicos e militares oriundos ram no dia seguinte. A culpado pela detonação do analisaram várias propostas
de diversos países, vem rea- guerra significou gastos em conflito. para aprofundar o processo
lizando a fiscalirncão doces- armamentos superiores a A paz que ora se discute de integração.
modificará as expectativas Os representantes da Ar-
pessimistas que pairaram gentina, Brasil, Colômbia,
sobre a região do golfo, Mé~ico, Peru, Uruguai e Ve-
durante a guerra, embora se nezuela (o Panamá está pro-
considere que tão cedo não visoriamente afastado das
desaparecerá a lembrança atividades do Grupo) opta-
dos agravos, de lado a lado. ram por apoiar idéias, que já
se encontram em discussão
PORTO RICO: nos diversos organismos re-
gionais, ao invés de lançar
Hussein: trégua é vitória novas iniciativas. As discus-
O direito à
Komeini: ainda desconfiado
sões, portanto, se limitam
aos projetos do Pacto Andi-
independência no, da Associação Latino-
Americana de lntegração-
O Comitê de Descoloni- Aladi e do Sistema Econô-
zação das Nações Unidas mico Latino-Americano-
aprovou, em fins de agosto, Sela.
por 9 votos a favor, 2 contra As áreas de maior inte-
e 11 abstenções, uma reso- resse são o comércio e as fa.
lução em que reafirmou o cilidades internas entre os
direito inalienável do povo países da região, a comple-
de Porto Rico à livre deter- mentação econômica e in-
minação e à independência. dustrial, os diferentes siste-
O documento também ex- mas de transporte, os meca-
pressa a esperança de que nismos cambiais, a integra-
Porto Rico possa exercer sua ção nas fronteiras, as tele-
autodeterminação, como re- comunicações e o turismo.
conhecimento de sua sobe- Os onze países assinaram
Prisioneiros: um dos primeiros passos é sua troca
rania e igualdade política. O contrato, em Montevidéu,
sar-fogo, ao longo de uma 100 bilhões de dólares, se- projeto de resolução foi pelo qual podem comerciali-
fronteira superior a 1.200 gundo cálculos que englo- apresentado por Cuba e é zar entre si produtos no va-
quilômetros de extensão. bam os dois lados. quase idêntico ao que mere- lor de até oito bilhões de
Segundo o acordo patro- Os entendimentos para a ceu aprovação no ano pas- dólares. Tal acordo vai per-
cinado pelas Nações Unidas, paz definitiva envolverão sado. Os dois votos contrá- mitir uma redução das taxas
após exaustivas negociações dois aspectos que estiveram rios à resolução foram da em até 60% nas importa-
realizadas pelo secretário na raiz das causas que de- Noruega e do Chile. ções.
PANORAMA

que as pressões e sanções res populares, os centro-es-


AMÉRICA LATINA:
dos Estados Unidos visam a querdistas da Frente Unitá
desconhecer os Tratados do ria Popular (FUP), assim
Shultz, aquém das expectativas Canal de 1977, e ao prolon-
gamento da presença militar
como com as organizações
camponesas e associações
norte-americana no Panamá de funcionários públicos,
para além do ano dois mil. que também lutam pela li-
De acordo com os tratados bertação nacional.
assinados sobre o canal pe- Os partidos da oposição
los Estados Unidos e Pana- de direita, agrupados na
má em setembro de 1977, Aliança Democrática de
essa obra volta à soberania Oposição (ADO), repudia-
panamenha em 31 de de- ram a convocaçao de elei-
zembro de 1999. ções, por estimarem que o
O PRD tem maioria no país não tem condições para
governo e pretende concre- realizar essa consulta popu-
tizar o "processo revolucio- lar, enquanto não resolver a
nário", começado em 1968 crise em que se encontra. O
pelo extinto general Omar principal partido dessa
Torrijos, fundador e ideólo- aliança, o Panamenho Au-
go desse partido social-de- têntico (PPA), do ex-presi-
mocrata. Além disso, o PRD dente Arnulfo Arias, pede
começa a debater sobre a que se recontem os votos
escolha de seus candidatos das eleições de 1984, que,
para a campanha eleitoral de segundo ele, foram frauda-
maio de 1989. das pelo oficialismo naquela
Numa viagem de quase duas semanas, o secretáno de Es- "As experiências negati- oportunidade.
tado norte-americano, George Shultz, percorreu nove países /a- vas que o partido tem tido Outros dois partidos de
tino-americanos no início de agosto, com resultados considera- com os candidatos presiden- oposição, o Democrata
dos aquém das expectativas do Departamento de Estado. Na ciais" acrescenta Duque, Cristão (PDC) e o Movi-
América Central, Shultz viu rejeitada a sua proposta de ,solar a "impostos e importados têm mento Liberal Republicano
Nicarágua e captar apoio aos contras. /\/a Bolívia, viu uma bom- causado custos políticos e Nacionalista (Molirena),
ba de pequena potência explodir em me,o a sua comitiva, sem desgaste". O presidente do junto com a empresarial
maiores estragos, e não conseguiu maiores avanços em sua PRD disse que nesse proces- cruzada civilista, demandam
pregação de militarizar o combate às plantações de coca. No so eleitoral o partido deverá o contrário, que uma junta
Equador, teve a passagem ofuscada pela presença de seis pre- fazer alianças com os seto- presidida por Delvalle subs-
sidentes latino-americanos na posse de Rodrigo Bo(Ja, que, num titua o governo atual. Essa
dos primeiros atos, reatou relações com a Nicarágua. Na foto, posição, assim como a exi-
Shultz com o presidente costa-riquenho Oscar Arias. gência de que o general Ma-
nuel Noriega, comandante
das Forças de Defesa, deixe
PANAMÁ:
o cargo e o país, é respalda-
da pelo governo dos Esta-

PRD quer eleições em 89 dos Unidos.


Sobre essa posições, o
presidente do PRD pede ao
"O povo panamenho não mentar as sanções econõmi- presidente R9nald Reagan
caiu na armadilha e soube cas que os Estados Unidos que "nos deixe tranquilos,
separar o que está em jogo: vêm fazendo ao Panamá, pois não aceitamos intro-
ou luta pata alcançar sua in- desde que o Congresso des- missão em assuntos inter-
dependência, ou se coloca tituiu o presidente Eric Del- nos de nosso país", Duque
como uma estrela a mais da valfe, em 26 de fevereiro úl- esclareceu que seu país não
bandeira norte-americana". timo. é inimigo do povo dos Esta-
Tanto o PRD, como o dos Unidos: "Nós queremos
Esta frase é do recém-eleito
presidente do Partido Re- atual governo do presidente ter relações com esse povo e
volucionário Democrático- Manuel Solís e os militares seu governo, mas num pla-
panamenhos, considc. am Torrijos: soberania no de igualdade e respeito".
PRD, Carlos Duque, ao co-
PANORAMA

VENEZUELA:

A ameaca da crise financeira


>

O futuro presidente da taxações mínimas, se com-


Venezuela, que sairá das paradas às de outros países.
eleições em dezembro, de- "Necessitamos, afirmou o
vendo tomar posse em fe- ministro da Fazenda, de
vereiro do próximo ano, en- instrumentos tributários que
frentará séria crise financei- permitam ao governo lutar
ra, que deixa o país sem re- contra a especulação imobi-
cursos para investimentos. A liária". Ele insiste na neces- PARAGUAI:
previsão é do ministro da sidade de manter o cumpri-
Fazenda, Hector Hurtado, ao mento das obrigações ex-
apresentar o orçamento. O
projeto orçamentário regis-
tra aumento de despesas e
ternas, pois considera que a
moratória apenas iria parali-
sar o fluxo de créditos que o
Comercio macabro
dos juros da dívida externa, país obtém para grandes Estes são quatro dos sete bebês brasileiros localizados pela po-
faz um cálculo otimista dos projetos de desenvolvimento. licia paraguaia em Assunção, no início de agosto. Segundo o juiz
lucros do petróleo e prevê A Venezuela tem a quarta Angel Campos, seriam vendidos a norte-americanos, ao preço
um déficit correspondente a maior dívida externa, dentre individual de 15 mil dólares, para terem órgãos retirados e ven-
2% do Produto Interno os países da América Latina. didos para transplantes. Apesar da indignada reação da embai-
Bruto-PIB. O governo social-democrata xada norte-americana, o juiz afirmou possuir informações que
Hector Hurtado pediu ur- de Jaime Lusinchi pagou, de revelaria no momento oportuno, confirmando que as crianças
gência na aprovação da re- fevereiro de 1984 até final de seriam sacrificadas para uso comercial de parte de seus cor-
forma tributária, que tem o 1987, mais de 22 bilhões de pos. (A propósito desse tema, veja t erceiro mun do edição 112,
objetivo de reforçar as fi- dólares, sem receber um só p.46: Um comércio sinistro.
nanças do Estado. Ele con- dólar de novos emprésti-
siderou que a evasão fiscal mos, salvo os créditos con- PERU:
"adquiriu caráter inusitado", tratados para projetos in-
embora a Venezuela tenha dustriais específicos.
Absolvicão de Morote
EQUADOR: causa insatisfacâo >

,\ " 1, -,o . 1 Osmíln LI 11ne a associacão com fins


Social-democracia no poder Morote, chefe militar e um
dos fundadores da organiza-
subversivos. Muitas figuras
políticas peruanas conside-
ção guerrilheira Sendero ram que Morote foi absolvi-
Luminoso, provoca insatis- do por se temerem represá-
fação com o sistema judiciá- lias. Em relação a tal avalia-
rio e policial peruano. ção, o presidente da Corte
O presidente da Corte de Justiça comentou que
Superior de Justiça de Lima, "essa versão constitui um
Carlos Giusti, disse que a critério subjetivo".
absolvição de Morote ex- Entretanto, Giusti se
pressa um vazio legal e um queixou de que a polícia não
trabalho deficiente por parte proporciona proteção aos
das investigações policiais. juízes, nem aos seus fami-
O fato de Morote ser o liares, e observou que, no
Numa das posses mais concorridas do continente, o social-de- "cabeça" do Sendero Lumi- dia anterior à absolvição do
mocrata Rodrigo Boqa assumiu a presidência do Equador, em noso na região central não líder guerrilheiro, o Seridero
11 de agosto, prometendo austeridade e trabalho. No mesmo configurou delito, porque o Luminoso matou o juiz
dia, reatou relações diplomáticas com a Nicarágua, recebendo a atual governo social-demo- Guillermo Mutíoz, em Chin-
visita, no dia seguinte, do presidente Daniel Ortega. Assistiram à crata, em uma de suas pri- cha, uma cidade na costa
posse de Borja os presidentes da Argentina, Uruguai, Colômbia, meiras disposições, aboliu a sul, a 200 quilômetros de
Venezuela, Costa Rica, Cuba e Portugal. lei que qualificava como Lima.
PANORAMA

CHIPRE: ÁFRICA DO SUL:

Governo se dispoe a negociar Recorde de execucões >


A Afnca do Sul é o pais

.
com maior número de exe·
•-e:.
cuçoes no mundo, uma cifra ; :-.
de 593 pessoas de 83 a 87, ' 1
ou seja, mais da metade dos
998 condenados à morte
neste per/odo, segundo re-
conheceu o ministro da Jus-
tiça, Kobie Coetsee. As esta-
tistrcas oficiais fornecidas
por Coetsee, face às pres-
sões de parlamentares da
oposição, registram um au- por irregularidades e mani-
mento substanCJal no nú- pulações nos processos Judi-
mero de condenados du- ciais, sobretudo contra cida-
rante o estado de emergên • dãos negros.
eia no pais, a partir de Junho O professor dos estudos
de 1986. legais da Universidade de
A revelação desta cifra Witwaterrand, John Bugard,
coincide com ampla campa- afirmou que a pena capital
nha contra a pena de morte na África do Sul constitui
na África do Sul, motivada um ato de violência estatal.

O presidente George unidade de Chipre. Também BIRMÂNIA:


Vassilíou anunciou que o deve garantir a independên-
governo de Chipre está
pronto para começar nego-
cia e a integridade territorial
do pais, de acordo com os
Revolta popular derruba governo
ciações com a parte turca, na princípios das Nações Uni-
busca da normalização da das.
vida política da ilha. "Esta- "A desmilitarização de
mos prontos para iniciar um Chipre e a retirada das tro-
diálogo substancial, sem pas estrangeiras são fatores
condições prévias. Acredi- que contribuírão ao desen-
tamos que sobre a base dos volvimento da comunidade
acordos Makarios-Denktash turco-cipriota, Juntamente
e K1prianou-Denktash po- com a comunidade greco-
demos conseguir solução cipriota", acrescentou o pre-
global para o problema ci- sidente. De acordo com ele,
priota". uma solução para o proble-
Por ocasião dos aniver- ma também vai beneficiar a
sários do golpe militar e da Turquia, que, no momento,
invasão turca de Chipre, em está se associando à Comu-
74, Vassiliou esclareceu que nidade Econômica Euro-
seu governo aceitou a ini- péia-CEE e normalizando as
ciativa sobre procedimentos, relações com o resto do
Os protestos populares na BirmAnta determinaram a renúncia do
general Sein Lwin, no dia 12 de agosto, dezessete dias após ter
apresentada pelo secretário- mundo.
geral da ONU, para a reto- "A Turquia deve enten- assumido a presidência, por decisão do congresso extraordiná-
rio do Partido do Programa para o Socialismo. Cinco dias de re-
mada do diálogo interco- der que o caminho para se
somar aos países modernos belião provocaram centenas de mortl's. A aguda crise econômi-
munitário.
e desenvolvidos passa pela ca, que fez aumentar os preços dos produtos da cesta básica
O presidente cipriota ob-
em até 400% em pouco mais de um mês, e a pouca aceitação
servou que uma eventual solução da questão ciprio-
ta", concluiu. ao nome de Sein Lwin determinaram o levantamento popular.
solução deve salvagua rda r a
PANORAMA

INDIA: PALESTINA:

A radicalização sique OLP estuda criacão de Estado >

O primeiro-ministro da do-se à denúncia anterior de


Índia, Rajiv Gandhi, e o mi- que o governo paquistanês
nistro do Interior, Buta Sin- permite aos extremistas da
gh, receberam "ameaças de seita sique utilizarem seu
morte reais", segundo con- território, para ações no es-
firmação de um represen- tado nortista do Punjab.
tante do governo ante o A imprensa indiana, por
parlamento indiano. O mi- sua vez, divulgou que o gru-
nistro dos Assuntos Inter- po extremista sique, conhe-
nos, P. Chidambaram, cido como "Comitê Pânti-
acrescentou que o Paquistão co", ajudado pelas agências
"continua envolvido em ati- de inteligência paquistane- Hussein e Arafat: uma delicada operacão estratégica
vidades terro~istas", referin- sas, elaborou um plano para
impor o terror no Punjab e
em outras partes da Índia,
antes do fim do ano.
Divisões internas do mo-
vimento sique estariam pro-
vocando maior radicalização
e pressões sobre elementos
moderados, o que já levou
ao assassinato de Sohan
Singh, sumo sacerdote do
Templo Dourado, principal
Peres e Shamir: a incógnita de um novo quadro político
santuário da seita, em Am-
ritsar, e a atentado frustrado
contra Mal Singh Ghuman, O xadrez polt1ico árabe-israelense ganhou um dado novo e
secretário do Comitê Guru- de alta significação, com a decisão do rei Hussein, da Jordânia,
duara, ambos ocorridos no de cortar todos os vfncu/os econômicos do seu reino com a
final de julho. Cisprdânia que ele administrara de 1950 a 1967. Aproximada-
O Tribunal de Justiça da mente 24 mil funcionários públicos da Cisjordânia - professores,
Índia confirmou recente- trabalhadores da área da saúde, etc. - eram pagos pela Jordã-
mente a pena de morte para ma, mesmo depois da ocupação militar do território por parte de
dois sique~. culpados pelo Israel, a partir de 1967.
assassinato da então pri- O governo de Shamir cobra altos impostos dos moradores
meira- ministra I ndira Gan- palestinos do território, devolvendo-lhes pouco ou nada em ser-
dhi, ocorrido em 1984. viços essenciais.
Em pronunciamento a 31 de julho, o rei Hussein anunciou a
mudança, assinalando que a mesma visava a facilitar o proces-
so de paz e a solução da questão palestina. A OLP estuda a
possibilidade de proclamar a formação de um governo palestino
no exflio, o que pode vir a acontecer no correr de setembro e lhe
permitiria angariar reconhecimento diplomático mais extenso que
o atual. Em Israel, a reação foi dura por parte do primeiro-minis-
tro ltzak Shamir, que prometeu continuar a usar punhos de aço
contra a rebeMo palestina, que ja dura nove meses e vitimou,
até agora, quase trezentas pessoas. Mas, em declarações no
dia 12 de agosto, o chanceler e ex-pnme,ro-ministro trabalhista
Sh,mon .Peres admitiu que algumas concessões por parte do
gov~rno de Israel são possíveis e que uma conferência multila-
teral poderá ser aceita pelo governo, com o objetivo de estabe-
Gandhi e os siques: pesada herança de radicalização lecer a paz.
MATÉRIA DE CAPA

OPODER PARALELO Manuel Gonzalo Chavez Alvarez·

egundo a Comissão

S Nacional de Informação
sobre Consumidores de
Narcóticos (The rvat1onal
Narcotics lntelligence Consumers
Commíttee-NNJCC), o mercado
norte-americano absorve
anualmente a quase totalidade de
drogas produzidas na América Latina.
Para lá se escoam 33º{, da heroína, 80%
A crescente organização dos traficantes em diversos países da América
Latina modifica as economias locais e desafia os poderes públicos
da maconha e a totalidade da cocafna
produzidas pela Bolívia, Colômbia,
A divisão internacional da produção tão os principais produtores de maco-
Jamaica, México e Peru.
de drogas segue critérios variados, que nha e heroína, devendo-se ressaltar que
O número de usuários regulares de
vão desde as cond ições climáticas e a Colõmbia ·atingiu um estágio de pro-
maconha nos Estados Unidos passa dos
geográficas, passam pela fragilidade da dutor múltiplo, pois também processa e
20 milhões de pessoas, enquanto 8 a 20
autoridade do Estado, incluem a rede de refina a pasta originada do Peru e da
milhões consomem cocaína e o número de
apoio financeiro e chegam até o desen- Bolívia, controlando, desta maneira, a
dependentes de heroína chega a 500 mil.
volvimento tecnológico e organizativo totalidade do ciclo coca-cocaína (produ-
O mercado do tráfico de drogas nos
para a produção dos narcóticos. ção do cloridrato de cocaína, a partir da
anos oitenta movimenta aproximadamente
Na Bolívia e Peru operam os grandes folha de coca). Os traficantes colombia -
100 bilhões de dólares, nos Estados
produtores de pasta de coca, que tam- nos também financiam e organizam as
Unidos, e rende aos pafses produtores da
bém a refinam. No México, Colômbia, redes de produção de drogas nos outros
América Latina mais divisas que a
Jamaica e algumas ilhas caribenhas es- países da América Latina e são os prin -
exportação de seus produtos tradicionais.

10 - terceiro mundo
Da produção da
folha da coca
ao refinamento
e consumo: um
processo complexo
que gera enormes

- .. fortunas para
os traficantes
de droga

cipais distribuidores para os Estados Latina com os Estados Unidos, com ex- especializa r-se na exploração e poste-
Unidos. A Colômbia tornou-se a porta pressivas implicações de ordem estraté- rior exportação de produtos primários.
de entrada ao mercado norte-america- gica e de segurança nacional e coletiva.
no. Po r isso, tratar o problema como sim- 1ndústria sem chaminé
As Bahamas, com suas 700 ilhas, e ples questão policial é uma simplifica-
algumas outras regiões do Caribe são ção grosseira que desconhece sua com- O Peru, Bolívia e Colômbia, em bora
um estratégico centro de apoio para a plexa realidade. O narcotráfico, na sua tenham desenvolvido setores industriais
entrada de entorpecentes no mercado ve rdadeira dimensão, é um problema em pequena escala, continuam países
norte-americano, dadas _as condições econômico, social e político, de signi fi - especializados na produção de mi nérios
geográficas, que proporcionam exce- cação transnacional, q ue desequilibra o (Peru e Bolívia) e café (Colômbia). Seus
lente infra-estrutura ao tráfico. Estado e a sociedade latino-americanos. sistemas produtivos ainda gi ram em
Neste final de século, o narcotráfico A divisão internacional do trabalho torno do ciclo de algum produto p rimá-
t ransformou-se num dos eixos mais atribuiu às economias latino-america- rio, no qual o país possui van tagens
importantes nas relações da América nas, desde o século passado, a tarefa de comparativas.

1988- Nº 113 tercei ro mundo - 11


MATÉRIA DE CAPA OROC \S

O caso boliviano é um exemplo: sua americana, a qual, de maneira subterrâ- pulações locais, em termos relativos. Os
história econômica está associada aos nea, se incorporou ao padrão de repro- produtores de folhas de coca, assim
ciclos de diferentes matérias-primas dução do capital. como a mão-de-obra empregada na
minerais. Com a chegada dos coloniza- Sem dúvida, para tanto atuaram fa- produção da pasta, melhoraram de nível
dores espanhóis, iniciou-se o ciclo da tores de ordem estrutural e conjuntural. de renda, em comparação com os
prata, tornando lendária a cidade de A produção de drogas surgiu com plantadores de produtos tradicionais. A
Potosí, onde se situava a mais impor- maior intensidade em Estados de es- produção agrícola destas regiões con-
tante mina de prata do continente, no trutura pouco consolidada, que têm por centra-se cada vez mais no cultivo de
período. Já no início do século XX, co- isso, presença débil na economia e na folhas de coca e maconha, e observa-se
meça o ciclo do estanho - com ele sur- sociedade. certa tendência à substituição dos culti-
gem os poderosos "barões do estanho" Foi uma indústria estimulada pelo vos tradicionais.
Patino, Hochschild e Aramayo, os quais vertiginoso crescimento do mercado Milhares de famílias camponesas
foram expropriados pela revolução po- externo, especialmente depois da participam do cultivo de folhas de coca.
pular de 1952, realiza& sob o comando guerra do Vietnã, que proporcionou tu- Na Bolívia, estima-se que 300 mil pes-
soas estão envolvidas no circuito da
produção e tráfico, entre produtores da
folha, uma variedade de intermediários
financeiros e comerc1a1s, qu1m1cos,
guarda-costas, pilotos e a própria mão-
de-obra ou pé-de-obra, pois muitos fa-
zem a tarefa de pisar as folhas, na fase
da mistura com os produtos químicos,
como acetona e querosene.
Os recursos gerados pela produção
de cocaína afetam significativamente a
demanda agregada nacional, especial-
me8te quando o sistema produtivo tra-
dicional está em recessão, como no caso
da Bolívia. A indústria de cocaína, em-
bora concentre a riqueza, propicia uma
rede informal, paralela e clandestina de
Na Colômbia, um dos componentes da violência é a guerra entre os narcotraficantes distribuição de renda, o que provoca
mudanças no perfil do consumidor e
do Movimento Nacionalista Revolucio- cros fantásticos, pelo seu alto conteúdo afeta, direta e indiretamente, o cresci-
nário-MNR, passando o controle da ex- de valor agregado. As altas taxas de mento do consumo de bens e serviços,
tração do estanho para as mãos do Es- retorno provocaram sua rápida expan- em especial de bens supérfluos.
tado. são em menos de dez anos, coincidindo
No final da década de 70, o ciclo do com a etapa em que o sistema produti- Economia invisível
estanho praticamente se esgotara, como vo tradicional começava a entrar em cri-
consequência da catastrófica situação se profunda. Calcula-se que a produção e o tráfi-
dos preços das matérias-primas e como co, nas diferentes etapas, injetam na
resultado de sua substituição, como in- Ilhas de prosperidade economia boliviana aproximadamente
sumo, por materiais sintéticos. 600 milhões de dólares por ano. A pro-
Apesar de diferenças importantes, a A produção de drogas modificou dução de drogas na América Latina está
evolução das economias dos países lati- substancialmente as economias bolivia- intimamente associada à economia in-
no-americanos produtores de drogas, na, peruana e colombiana (particular- formal, esse conjunto de atividades le-
na sua tendência mais global, se asse- mente o norte da costa colombiana; a gais e ilegais que não se registram nas
melharam à situação boliviana. área de Tingo María, na Amazônia pe- contas nacionais e que, por isso, esca -
Podemos dizer que a decadência dos ruana; as regiões de Santa Ana de Ya- pam às disposições emanadas da auto-
ciclos anteriores de produção de pro- cuma e Chapare, na Bolívia, e Culiacán, ridade econômica. A violenta crise eco-
dutos primários provocou, nos últimos no México). com reflexos sobre a eco- nômica dos anos 80 levou as estruturas
20 anos, sua substituição pela produção nomia regional. formais a não responder às exigências
de cocaína e maconha, dando origem a O narcotráfico converteu estas re- da população, motivando desta forma a
novo ciclo, desta vez associado às dro- giões em enclaves de prosperidade eco- economia informal: nasceu assim o em-
gas. A afirmação pode parecer forte, nômica, porque, embora tenha concen- prego informal, o comércio especulati-
mas serve para ressaltar a importância trado a renda nas mãos de alguns pou- vo, a poupança e o financiamento in-
desta nova indústria na economia latino- cos, melhorou o nível de vida das po- formal, o contrabando, a evasão fiscal, a

12 - terceiro mundo
MATERIA DE CAPA

especulação com o associado basicamente à produção de Da mesma forma, os "coca-dólares"


dólar e, fundamen- cocaína entre 1981-1985, registrou cres- têm forte influência no sistema finan-
talmente, o narco- cimento fantástico (veia quadro), alcan- ceiro da Colômbia. Durante o governo
tráfico, que, ao çando aumento de 493% para o período do presidente Belisario Bethancour
mesmo tempo, faz 1980-85, sendo que a taxa anual média (1982-1986), impuseram-se restrições à
parte da economia de crescimento foi da ordem de 34,5%. conversão de dólares ilegais em pesos.
informal e a esti- A prosperidade da produção de cocaína Este fato foi um dos responsáveis pela
mula. tem os mesmos resultados na Colômbia queda das reservas internacionais do
O caso boliviano mostra com clareza e no Peru, pelo que não é surpresa que país em 77%, baixando de 4,5 bilhões de
esta situação, se tomarmos como as rendas da droga tenham superado, dólares, em 1981, para apenas 1 bilhão,
exemplo a produção da cocaína, um dos no período, as divisas conseguidas pela em janeiro de 1985.
pilares da economia informal. Para a Colômbia com as exportações de café, A economia agrícola também se vê
produção de um quilo de cocaína, preci- de que o país é um dos maiores produ- afetada pela produção da cocaína. O
sa-se de 300 a 350 quilos de folhas de tores mundiais. cultivo da folha é uma lavoura muito
coca, e, para se chegar ao produto final, A produção da pasta de coca rende à rentável e de difícil substituição, já que
passa-se por três estágios: sulfato, óxi- Bolívia, sob o aspecto de entrada de ca- oferece uma série de vantagens técnicas
do e finalmente cloridrato ele cocaína pital, urna quantia variável entre 2,0 bi- e econômicas. Em primeiro lugar, é um
propriamente dito. lhões e 3,2 bilhões de dólares por ano. cultivo que mantém sua produtividade
A economia boliviana entre 1981 e A 1mportãnc1a da produção e tráfico por mais de 30 anos e fornece entre 3 e
1985 teve um desempenho desastroso; de drogas fica menos ambígua, quando 4 colheitas por ano (mais que o arroz, a
o PIB formal registrou urna queda no observamos o seu peso e grau de in- banana e os cítricos). Em segundo lu-
quinquênio indicado da ordem de fluência no sistema monetário e finan- gar, é um cultivo que necessita de mão-
19,2%, o PIB per cápita caiu em 29,4%, o ceiro dos países latino-americanos pro- de-obra intensiva, ocupando milhares
setor externo da economia sofreu dese- dutores. Na Bolívia, 80% da oferta de de camponeses. Em terceiro lugar, não
qu1llbnos fortes, uma vez que a maioria divisas no mercado paralelo do dólar requer nenhum tipo de máquina ou fer-
dos produtos minerais que a Bolivia ex- provêm do tráfico de cocaína e de ativi- tilizante químico importado. Além disso,
porta teve seus preços significativa- dades associadas a ele, o que propicia as técnicas de cultivo e colheita são am-
mente rebaixados. Um exemplo lapidar aos traficantes alto controle deste mer- plamente difundidas e estão fortemente
foi o caso do estanho. cado. Uma contração dos "coca-dóla- enraizadas na cultura indígena. Por
No período analisado, desencadeou- res" no mercado paralelo provoca o último, é produto de alta rentabthdade e
se a pior crise econômica da história aumento do preço da divisa, de que re- fácil transporte, além de ter um merca-
moderna boliviana. Se a progressiva sulta, por sua vez, o desabastecimento do seguro e em expansão.
paralisação das at1v1dades produtivas de produtos importados (insumos e Estas razões fazem com que as re-
não teve efeitos mais devastadores, o bens manufaturados e duráveis) e au- giões aptas às plar,tações do arbusto de
motivo foi, em grande parte, pelo sur- menta o nlvel de preços internos, dado coca se tornem monoprodutoras, dese-
gimento da economia informal, em es- que todo o sistema de preços boliviano quilibrando assim a oferta de alimentos.
pecial a produção de cocaína. está indexado informalmente ao preço Desde o cultivo da matéria-prima bási-
O produto interno bruto subterrbneo, do dólar. ca, passando pela distribuição e comer-
cialização de insumos químicos, como
querosene e acetona, até a própria pro-
dução da pasta, a indústria da cocaína
mina todo o sistema econômico.

Territórios livres

O narcotráfico cria uma rede de su-


bornos e corrupção que atravessa todo
o Estado, particularmente os setores
encarregados de seu controle e repres-
são. Tal situação proporciona aos trafi-
cantes muita influência política e um efi-
ciente esquema de informação.
Os barões das drogas formam uma
nova burguesia ileg11ima, que consegue
até fragmentar geograficamente os paí-
ses produtores, constituindo enclaves
Laboratórios rudimentares, mas eficientes, produzem toneladas da droga no meio da selva políticos e militares, e, em alguns casos,

1988- Nº 113 terceiro mundo - 13


MATERIA DE CAPA DROGAS

na para Peru, Bolívia, Colômbia e o Mé- girar em torno da destruição das planta-
xico. As preocupações de Washington ções de coca e da preparação de forças
com o crescente aumento da produção repressivas locais (força policial anti-
de cocaina remontam a meados da dé- drogas, autodenominada "Leopardos").
cada de 70, mas é só a partir de 1980 Entretanto, a implementação desta es-
que o governo norte-americano passa a tratégia de combate ao narcotráfico se
adotar uma posição explícita e de en- via dificultada pelo distanciamento nas
volvimento direto no combate às dro- relações dos Estados Unidos com a Bo-
gas. lívia, nos primeiros meses do governo
Em julho de 1980, o general Luiz democrático.
Garcia Meza e o coronel Arce Gómez - O governo Siles Zuazo, apoiado por
ambos acusados pela DEA-American uma coalizão de centro-esquerda, havia
Drug Enforcement Administration de optado, nas suas relações externas, por
estarem umbilicalmente comprometi- um neutralismo independente, próximo
dos com o tráfico de·cocaina - tomam o de uma posição terceiro-mundista, que
poder na Bolívia através de um violento buscava manter equidistância frente às
golpe de estado. Diante da situação, o duas superpotências. Por outro lado, a
governo norte-americano suspendeu nível interno, tratava de fazer frente à
Prisões nem sempre afetam as quadrilhas toda a ajuda militar e civil à Bohv1a e re- grave crise económico-social, fugindo
tirou o embaixador em La Paz. As rela- do receituário do FMI. Esta opção de
estabelecendo territónos livres. Desta ções entre ambos os países só voltaram autonomia relativa, tanto na política
mane ra, os Estados boliviano e colom- à normalidade com o retorno da institu- externa como na interna, e a presença
biano são questionados em sua própria cionalidade democrática, em 1982, de ministros comunistas no gabinete
essência: a territorialidade. quando assumiu o poder Hernán Siles eram vistas com desconfiança e apreen-
A divisão político-administrativa Zuazo. Pouco depois, os Estados Uni- são no Departamento de Estado norte-
criada pela nação é substituída por zo- dos nomearam, como seu embaixador americano.
em La Paz, o diplomata Edwin Corr, que No entanto, o governo Reagan se en-
nas produtoras de drogas, divididas de
acordo com os interesses da máfia e já havia colaborado na política norte- contrava frente a um dilema: ou apoiava
americana de combate às drogas no econômica e diplomaticamente o com-
onde as leis, a autoridade e até mesmo
a moeda nacional não têm validade. O Peru. Sua missão central era acabar bate ao comércio de cocaína, reconhe-
com a produção e o tráfico de cocaína. cendo e legitimando assim a posição
Estado, além de perder o controle sobre
A administração Reagan entendia "independente" da política externa do
a economia, vê questionadas a sua he-
q e a uta contra o narcotráfico deveria governo de centro-esquerda de Siles,
gemonia, a legitimidade e a autoridade.
Os barões da cocaína intervêm na
política dos países produtores, indepen-·
dentemente do sistema de governo, e
tanto podem financiar campanhas elei-
torais de governadores, senadores e
deputados, como maquinar golpes de
Na rota da droga
estado, cujos tristes exemplos são ainda
recentes, como na Bolívia e Colômbia. A apreensão de 590 quilos de sendo, antes de mais nada, um país
Desta forma, a indústria da cocaína deu D cocaína pura, descobertos em de trânsito para os entorpecentes.
Como o problema é relativamente
origem a empresários-delinquentes, dois caminhões estacionados no
narcopolíticos, narcoguerrilheiros e au- centro de Buenos Aires, em meados novo, a polícia ainda estã se organi-
toridades militares corruptas, que con- de julho, levou a polícia argentina a zando para enfrentá-lo. Para isso
vivem com a fome e a probreza de seus acreditar que desarticulou uma cone- conta com ajuda externa. Neste ano,
povos. xão da droga. Foi o maior carrega- já recebeu dos Estados Unidos cerca
mento já descoberto na Argentina de 250 mil dólares para a compra de
Um eixo nas relações com os EUA e resultou de uma longa investiga- veículos e equipamentos, inclusive
ção. O país registra um índice de to- um computador, que se destinará
A problemática do narcotráfico tor- xicomanias ainda baixo, mas cres- a formar um banco de dados especí- li

nou-se um dos eixos contemporâneos cente, e transformou-se numa rota fico sobre o narcotráfico. Outros 360
mais importantes das relações entre a alternativa importante para os nar- milhões de dólares serão dados pelos li

América Latina e os Estados Unidos. cotraficantes. A pequena dimensão Estados Unidos para que a Argentina
Para a administração Reagan, o com- do mercado interno leva a polícia ·a reforce o patrulhamento na fronteira
bate ao narcotráfico converteu-se num acreditar que a Argentina continua com a Bolívia.
dos temas chaves de sua política exter-

14 - terceiro mundo
MATÉRIA DE CAPA

ou retardava o
combate ao tráfico
rfe drogas, expon-
do-se internam ente
Destruir as
a pressões desgas-
tarloras por parte
rla sociedade norte-
americana em geral e, em pa rt icu lar, do
plantações
Partido Democrata. O camin ho encon- O governo da Bolívia anunciou a
trado pelos Estados U nidos foi o de D destin-eção de 150 milhões de
pressionar o governo Siles Zuazo, mas dólares para financiar a erradicação
sem fornecer ajuda econômica substan- de plantações de coca. O dinheiro
cial. provém de fontes nacionais e inter-
Com efeito, em agosto de 1983 a nacionais e será utilizado em diver-
administração Reagan desti nou a quan- sos projetos de reconversão agrícola Campos de coca surgem em plena selva
tia de 2,5 mil hões de dólares, para os e desenvolvimento rural, em zonas
primeiros 18 meses do programa anti- que progressivamente erradicarem O presidente da Comissão de Luta
drogas, o equivalente a 1% da a1uda mi- plantações de coca. O anúncio do contra o Narcotráfico, da câmara de
litar concedida a EI Salvador e uma plano foi feito pelo Ministro de As- deputados da Bolívia, Guido Cama -
quantia ridícula, se comparada com os suntos Agrários, Guillermo Justinia- cho, afirmou que se definirá como
recu rsos mobi lizados pelos traficantes. no, em julho. zona legal de plantação de coca -
Em agosto de 1984, atendendo a no- A eliminação dos cultivos se pro- com um máximo de 12 mil hectares-
vas pressões norte-americanas, o go- cessará a um ritmo de cinco mil a ª zona semitropical de los Yungas
verno boliviano ocupou militarmente o oito mil hectares por ano. Lavouras de La Paz. A reg ião do Chapare de
Chapare tropical, no Departamento de de outros produtos agrícolas ocupa- Cochabamba será uma área de tran-
Cochabamba, conhecida zona de produ- rão as áreas livres, seguindo o Plano sição, para substituir a coca com a
ção de cocaína. A operação visava a de- Integral de Desenvolvimento Alter- aplicação do plano Pidas e receberá
sativar várias destilarias da droga e nativo e Substituição-Pidas. grande parte dos recursos interna-
prender os principais narcotraficantes Os projetos contarão com recur- cionais. Nos demais sete departa-
locais. Foi um fracasso, uma vez que sos provenientes das Nações Unidas, mentos do país, os cultivas serão de-
encontrou as fábricas abandonadas e através do Fundo para a Fiscalização clarados ilegais e destruídos no prazo
não prendeu nenhum traficante impor- do Abuso da Droga-Unfdac, além da de um ano, pela força. Os plantado-
tante. Comunidade Econômica Européia, res disporão de um período inicial de
Agência para o Desenvolvimento In- trégua, para que destruam volunta-
Visão equivocada ternacional, dos Estados Unidos- riamente a lavoura, entrem em acor-
Usawd, e dos governos da Grã- Bre- do com o governo e recebam uma
O erro básico de percepção da políti- tanha, Holanda e Finlândia. Os pro- indenização.
ca externa de Washington é o de isolar a jetos podem ser executados, pois Como experiência-piloto, 26 co-
problemática do tráfico de cocaína de contam com o respaldo da lei apro - munidades camponesas da região de
seu contexto econômico e social. vada, em julho, pelo parlamento, es- Coroico, a 110 quilómetros de La
Da mesma maneira que, na América tipulando a redução da semeadura Paz, firmaram convênios, com base
Central, as lutas de libertação naciona l de coca no país. A lei reduz de 60 mil no projeto Agroyungas, e abriram
são vistas pelos Estados Unidos sob a a 12 mil hectares as plantações le- mão de ampliar suas plantações, em
ótica do confronto com a União Soviéti- gais. troca da substituição das já existentes
ca, sem enfocar suas causas estrut urais A Central Operária Boliviana- por lavouras de café e cítricos, pe-
internas, o caso do narcotráfico é perce- COB, que representa 80 mil campo- cuária, produção de mel e piscicul-
bido apenas como uma questao policial: neses, anunciou que apóia a lei, mas tura.
daí a ênfase dada ao combate da oferta advertiu que nela há aspectos que O projeto conta com 22 milhões
fina l do produto, via repressão. farão subsistir tensões entre os pro- de dólares das Nações Unidas. Cam-
No dia 6 de agosto de 1985, realizou- dutores rurais da folha. Os sindica - poneses de Minachi já produzem mel
se a primeira mudança de governo da listas querem que se garanta inte- e cera, depois de seguirem um curso
era democrática. O velho líder do Mo- gralmente a substituição da econo- sobre criação de abelhas e de rece-
vime nto Nacionalista Revolucioná ri o- mia da coca, que representa cerca de berem todos os implementos neces-
MNR, Victor Paz Estenssoro, assum iu o 200 milhões de dólares anuais e be- sários, através de um sistema de cré-
poder e montou o seu esquema de go- neficia a 500 mil pessoas, que sobre- dito especial, que permite o paga-
verno sobre dois eixos. na área política, vivem dessa "economia informal". mento em produtos.
a necessidade de uma aliança, o "Pacto

1988- Nº 113
terceiro mundo - 15
MATÉRIA DE CAPA DRO(; \.\

pela Democracia", com a direitista Ação bilização da taxa de câmbio (que possi- norte-americanos, em sua primeira
Democrática Nacionalista-ADN, do ex- bilitou a reversão das expectativas infla- missão "policial". O ohJetivo explicita-
ditador general Hugo Banzer cionárias dos agentes econômicos), o do: combater o narcotráfico. Segundo a
(1971-1978); na área econômica, sus- incremento das reservas em dólares e a Casa Branca, o envio de tropas foi soli-
tenta-se numa política econômica de repatriação de capitais de origem duvi- citado pelo presidente boliviano Victor
corte neoliberal, que congelou salários, dosa, que tmham sido remetidos para o Paz Estenssoro, para que colaborassem
liberou todos os preços, abriu a econo- exterior. com as forças policiais locais na luta
mia, retirou subsídios e descentralizou e Inaugurou-se, neste conte to, nova contra o narcotrM1co.
paralisou empresas estatais. Uma pollt1- fase nas relações boliviano-estaduni- O conceito de "segurança nacional"
ca econômica calcada no receituário do denses, marcada pelo sinal do entendi- foi utilizado, mais uma vez, para 1ustif1-
FMI, que conseguiu frear a hiperinfla- mento. car a operação na Bolívia, num sentido
ção, embora a um custo social elevado. mais amplo do que quando surgiu, ao
Paz Estenssoro soube lidar de form~ Segurança: conceito flex1vel final da li Guerra Mundial, quando foi
nteligente com o narcotráfico, uma vez definido como uma estratégia para en-
que o incorporou sut1lmente ao pro- Dentro da cruzada contra o narcotrá- frentar o comunismo ,ntemac,onal.
grama de estabilização econômica, atra- fico reahzada pela administração Rea- O envio de tropas norte-amencanas,
vés da assimilação dos "coca-dólares" gan, a intervenção militar limitada na no entanto, tem objetivos políticos
ao s stema financeiro e econômico. Para Bolívia, em 1ulho de 1986, constitui o maiores, pouco relacionados com a se-
gurança nacional boliviana. A nlvel in-
terno, o governo Reagan visava a neu-
tralizar pressões dos democratas, num
no de eleições legislativas. A nível ex-
terno, tratava-se de submeter a um
teste a reação da opinião pública inter-
nacional, em especial dos povos e go-
vernos latino-americanos, quanto à pre-
sença de tropas norte-americanas no
continente.
Dentro da lógica da segurança nacio-
nal que orienta os norte-amencanos,
o traficante e o guerrilheiro de esquerda
podem ser considerados "equivalen-
tes": ambos. nas palavras de uma fonte
Honduras Coronel Leonidas A rias e Juan R anón Matta vinculados ao Cartel de Medellln oficial dos EUA, "desestabilizam nossos
aliados democráticos", sendo que os
tanto, decretou a livre conversão dos ponto mais ousado, ao lado dos acordos traficantes o fazem "através da corrup-
dólares em pesos bolivianos e a taxa de estabelecidos com o México para refor- ção das instituições polít1co-1urídicas".
câmbio foi deixada às leis da oferta e da çar os controles nas fronteiras de ambos Esse obJetivo comum é o que justifica as
procura, com monitoramento à distân- países e da a1uda militar e econômica ao reiteradas acusações de Washington -
cia por parte do Banco Central da Bolí- Peru. nunca comprovadas - de que existem
via. Por outro lado, declarou-se anistia Em abril de 1986, 250 soldados do vínculos entre os narcotraficantes e al-
tnbutária, mediante o pagamento de exército norte-americano participaram guns grupos guerrilheiros que atuam na
um "imposto especial de regularização de exercícios militares com as forças América Latina. De tais acusações, o
fiscal", pelo qual, uma vez feito o pa- armadas bolivianas, em uma operação único dado comprovável é que os ba-
gamento de valores equivalentes a 3% chamada "Força Unida", sob comando rões do narcotráfico enfeitam sua ativi-
do patrimônio das pessoas naturais e do coronel B. Utter e respondendo à dade com uma pretensa ideologia na-
1uríd1cas, consideravam-se regulariza- condução e planejamento do comando cionalista e antiimperialista. Segundo tal
dos todos os débitos com a receita fe- sul dos EUA, chefiado pelo general postura, o copioso tráfico para os Esta-
deral, a qual não poderia, posterior- John Galvin, o mesmo que supervisio- dos Unidos se justificaria, pois "os nar-
mente, fiscalizar ou exigir o pagamento nou os exercícios entre militares argen- cóticos representam, no continente, tal
de impostos dos exercícios fiscais pas- tinos e norte-americanos, conhecidos como o petróleo para os países árabes,
sados. como "Mesa de Areia", e foi responsá- uma arma de libertação da América La-
A primeira medida facilitou a recicla- vel pelas manobras hondurenho-norte- tina e de destruição interna dos Estados
gem e incorporação dos "coca-dólares" americanas na fronteira com a Nicará- Unidos."
ao sistema financeiro, e a segunda gua e pelo abastecimento aos "contras". A militari1ação da repressão ao nar-
ocultou a origem das fortunas ilegais. O Em julho de 1986, pela segunda vez, cotráfico, no entanto, foi um ataque
resultado destas medidas foram a esta- desembarcam na Bolívia 170 soldados apenas parcial ao seu poderio interna-
MATÉRIA OE CAPA DROGAS

cio nal e os resulta- cano é imediatista, dá ênfase excessiva do interior da Colômbia, assassinado
dos foram de curta ao lado da oferta do produto e não leva pelos traficantes.
duração. Após em consideração as implicações sociais A internac,onalização das responsabili-
quatro meses em e econômicas que adquiriu o narcotráfi- dades visa a formar uma frente de ação,
território boliviano, co. Baseia-se no preparo das forças re- inspirada em princípios das Nações
as tropas norte- pressivas, no desenvolvimento de her- Unidas, para a solução dos problemas
americanas desati- bicidas para o extermínio das planta- sociais e humanos que se escondem no
laboratórios, localizaram 24 ções de coca e maconha, e no apoio da tráfico de drogas. O governo boliviano
pontos de embarque, sobrevoaram ou DEA. Uma resposta a este erro de per- entende que a questão envolve países
patrulharam 256 locais suspeitos e fez o cepção foi dada pelo ex-presidente boli- produtores e consumidores, pois "não é
preço da tonelada de folha de coca des- viano Walter Guevara Arce, segundo o razoável atribuir a principal responsabi-
pencar para 10 dólares, dada a pouca qual "enquanto houver em qualquer lidade da luta contra esta atividade aos
demanda pela matéria-prima. Tais re- parte do mundo - de preferência nos países produtores, quando se sabe que
sultados são questionáveis, uma vez Estados Unidos - alguém disposto a a produção está em função da demanda
que todos os laboratórios "desativados" pagar por cocaína, sempre haverá al- das nações consumidoras".
se encontravam já praticamente aban- guém, em alguma parte do mundo (de A cooperação econômica encerra a
donados antes de chegarem as tropas preferência na Bolívia), disposto a pro- estratégia boliviana, para que o com-
boliviano- norte-americanas. duzi-la e comercializá-la". bate ao narcotráfico se realize dentro de
um projeto global de desenvolvimento
Precedente perigoso Campanha internacional econômico do país produtor. Neste
sentido, em outubro de 1986, uma co-
As várias operações mencionadas Em face dos magros resultados da missão boliviano-norte-americana ela-
pela embaixada não resultaram em pri- militarização da luta contra as drogas, o borou um "plano trienal" contra o co-
são de qualquer narcotraficante impor- governo conservador de Paz Estenssoro mércio ilegal de cocaína, com as se-
tante. Um fato revelador da pouca eficá- optou por um caminho de combate ao guintes fases: a) fortalecimento e mora-
cia da militarização da repressão contra narcotráfico, através de ativa campanha lização da polícia boliviana; bl subst1tu1-
o narcotráfico foi o assassinato de uma internacional e de uma visão mais glo- ção e redução dos cultives; c) implanta-
missão científica, encabeçada pelo bo- bal da problemática. Três idéias-força - ção de um plano integral de desenvol-
tânico Noel K. Mercado, na Serra de luta continental, responsabilidade inter- vimento econômico.
Huanchaca, perto do local onde se en- nacional, cooperação econômica Deste plano trienal, os dois últimos
contrava a maior fábrica de cocaína da transparecem na ação do ministério de pontos são os mais difíceis de imple-
região. A DEA e os comandos militares Relações Exteriores boliviano. mentação.
tinham conhecimento da presença dos A contínentalização da luta já inclui um Na Bolívia, existem entre 60 e 70 mil
cientistas na área, segundo denúncia da convênio entre os países do Pacto An- famílias de camponeses, que com o pla-
Comissão Parlamentar encarregada da dino, para pôr em prática uma estraté- no substituiriam seus cultives de folha
investigação do caso. Tanto a DEA, gia comum para o combate ao tráfico de de coca por plantações de batata, cacau,
quanto os chefes militares norte-ameri- entorpecentes. O convênio tem o nome café e frutas. O plano trienal indenizaria
canos ocultaram informações a orga- de Rodrigo Lara Bonilla, o ex-ministro os produtores com 2 mil dólares por
nismos bolivianos e foram incapazes de
desativar o referido laboratório.
A facilidade da produção da pasta de
cocaína, a alta disponibilidade dos re-
cursos financeiros dos narcotraficantes
e as características da zona amazônica
possibilitaram o reinício da produção
semanas após a saída das tropas norte-
americanas.
Se foram poucos os resultados, em
termos de diminuição da produção de
drogas, a presença militar norte-ameri-
cana criou um precedente perigoso nas
relaçoes dos Estados Unidos com a
América Latina, inaugurando uma nova
dimensão de pollt1ca externa, em que
Washington passa a assumir o papel de
policia internacional.
O programa antidrogas norte-ameri-

1988 - N\! 113


MATÉRIA DE CAPA DROC \S

hectare. Entretanto, para o sindicato de


camponeses, tal quantia é insuficiente.
No momento, existem dois planos-
piloto: no vale do rio Huallaga, no Peru,
Legalizar:
,
e na região do Chapose, na Bolívia.
A mbas as experiências sofrem forte re-
sistência dos produtores camponeses.
No que se refere ao fortalecimento
pros e contras
econômico da Bolívia, a situação é de A sociedade norte-americana discute a legalização das drogas e se
igual forma precária, uma vez que os propõe a reprimir os traficantes com as forças annadas
empréstimos e investimentos privados
estão escassos, devido à crise da dívida
externa e à situação de incerteza da
economia internacional. As agências Rosa dei Olmo·
governamentais e internacionais do
primeiro mundo têm prometido apoio
mbora o presidente norte-ame-

E
econômico, especialmente as dos Esta-
dos Unidos; entretanto, sua concretiza- ricano Ronald Reagan tenha
ção tropeça na visão imediatista e elei- qualificado a "guerra contra as
toreira da administração Reagan. drogas" realizada em sua gestão como
"uma história não contada de um êxito
Primeiro avanço dos norte-americanos", o tema das
drogas é a prime·ra preocupação dos
"A conferência internacional das Na- eleitores dos Estados Unidos, neste ano
ções Unidas sobre o uso indevido e o em que se escolherá o novo presidente.
tráfico ·lícito de drogas", realizada em O tema é o eixo central da campanha
Viena, Áustria, em julho de 1987, traçou presidencial de ambos partidos e ocupa
uma ação coletiva contra as drogas. lugar de destaque nos discursos de Mi-
O plano foi qualificado como amplo e chael Dukakis, George Bush e, logica-
multid"sciplinar e visa a atacar o narco- mente, no do próprio Reagan.
tráfico nas suas múltiplas modalidades e O congresso norte-americano, de-
etapas: redução da oferta e da deman- sesperado na busca de solução para o
da, maior controle do tráfico, reabilita- problema, aprovou, por 83 votos contra
ção dos viciados, controle dos insumos 6, lei que dispõe a participação das for-
quím·cos utilizados para produzir dro- ças armadas na repressão e controle do
D roga: tema eleitoral nos Estados U nidos
gas, destruição de organizações de trafi- contrabando de drogas para os Estados
cantes e - objetivo mais importante - a Unidos. O senador pelo estado de Nova
substituição racional do cultivo de coca. Iorque Alfonso D' Amato e o presidente opositores da legalização do consu-
Reagan solicitaram a pena de morte mo de drogas. A discussão ocupa amplo
Para a Bolívia, por exemplo, a Grã-
Bretanha deu uma contribuição de 3,5 para os homicidas envolvidos com dro- espaço nos mais importantes meios de
gas. O delegado de alfândega Wiliam comunicação da sociedade norte-ameri-
milhões de dólares, e mais uma vez os
von Raab propôs, por seu lado, novas cana, os quais ressaltam a inutilidade e
EUA prometeram 75 milhões de dóla-
medjdas para colocar a nação em pé- o fracasso da "gJerra" de Reagan con-
res.
Um plano desta natureza, junto a de-guerra, implementando sua contro- tra as _drogas, demasiadamente inclina-
vertida política denominada "tolerância da a recorrer a métodos repressivos,
uma decidida ajuda econômica e forte
zero", que abrange desde a realização especialmente contra o Terceiro Mundo.
apoio político dos países produtores,
de manobras militares até a disputa A atual política de repressão ao narco-
intermediários e consumidores, parece
econômica, inundando o mercado com tráfico deixou de lado outros métodos
ser o caminho para a solução da pro-
"pseudo-drogas", que teriam por obje- mais efetivos, como a redução da de-
blemática do tráfico de drogas. Mas,
tivo desestabilizar os preços de venda manda dentro do território dos Estados
como esta solução torna-se viável ape-
dos tóxicos. Unidos, através da educação e do tra-
nas a longo prazo, as nossas análises
tamento voluntário do drogado.
das relações da América Latina com os
Estados Unidos e Europa deverão levar Guerra perdida É clara a necessidade de se fazer algo
- "qualquer coisa que seja efetiva", co-
em consideração esta "fase oculta". •
Enquanto isso, pela primeira vez em mo dizem alguns preocupados obser-
dez anos, abriu-se nos Estados Unidos vadores - contra as drogas e sua res-
* Pesquisador boliviano sobre o tema das drogas, reside
pectiva criminalidade, a qual se tornou
atualmente no Brasil e integra o corpo docente da Univer- um debate entre os partidários e os
sidade Federal do Rio de Janeiro.

18 - terceiro mundo
MATÉRIA DE CAPA

insuportável. Há dez re, Kurt Schmoke, na conferência nacio- demasiado tarde". Uma das saídas po-
anos, quando a úni- nal de prefeitos, em abril. Lá, surpreen-
deria ser, evidentemente, a legalização,
ca preocupação era dentemente, Schmoke pediu a abertura
ainda que Keating não o manifeste.
com a maconha, o de um debate nacional sobre a legaliza- É curioso que o mesmo argumento
problema das dro- ção das drogas, e repetiu a proposta
tenha sido colocado na primeira página
gas era encarado ante o congresso sobre a legalização editorial da revísta britânica "The Eco-
como apenas preo- das drogas, ocorrido na mesma época,
nomist", de 2 de abril, em relação à
cupante. O curioso do atual debate, en- quando recebeu o apoio de vários de- mudança da tática oficial quanto às dro-
tretanto, é a heterogeneidade dos parti- putados.
gas, considerando prioritária a inci-
dários da descriminalização do consu- O prefeito salientou a necessidade de dência dos narcodólares na estrutura fi.
mo: desiludidos ex-partidários da políti- se levar em conta os ensinamentos dei- nanceira global dos Estados Unidos.
ca de intolerância absoluta; economis- xados pela Lei Seca dentro da sociedade
tas, como o Prêmio Nobel Milton norte-americana, e convocou à "luta Ignorância co lossal
Friedman ou Peter Reuter, da Rand contra o império subterrâneo da droga,
Corporation; a instituição Diálogo lnte- através dos únicos meios que eles res- Sob uma perspectiva também eco-
ramericano, dirigida por Sol Linowitz e peitam· os do dinheiro". Schmoke frisou
nômica, mas com enfoque acadêmico e
Galo Plaza, ambos ex-funcionários da
O.E.A.: decanos de universidades, como
Lester Thurow, do Massachussets lns-
titute of Technology-MIT; acadêmicos
de reconhecida competência nas pes-
quisas sobre drogas, como Arnold Tre-
bach, diretor do Instituto sobre Drogas,
Criminalidade e Justiça, da Universida-
de Americana, ou Lester Grinspoon, de
Harvard, além de alguns partidários de
ideologias libertárias e esquerdistas.
Vê-se que o debate não tem envolvi-
do apenas integrantes das organizações
de consumidores de drogas, partidários
de sua legalização, mas também uma
série de representantes de todo o es-
pectro político norte-americano, que
está criando uma corrente de opinião
favorável à legalização, com diferentes
matizes e motivações. O denominador
comum, entretanto, é a constatação do
saldo deixado pela atual política de in-
tolerância: uma "guerra perdida", que Dukakis e Bush têm fei to reiteradas condenações ao tráfico de entorpecentes
serviu para aumentar os imensos lucros
dos traficantes, entupir as prisões com a necessidade de recuperar os lucros do consciente das consequências que a po-
consumidores dependentes do tóxico, tráfico de drogas, através da legalização. lítica de "guerra contra as drogas" teve
deixar áreas urbanas inteiras aterroriza- Existe, na proposta do prefeito de na política externa norte-americana,
das pelas quadrilhas, levar à violação Baltimore, o interesse de proteger a Lester C. Thurow, professor da Escola
dos direitos humanos na prática da re- economia norte-americana. Neste sen- de Administração do Massachussets
pressão e produzir uma política exterior tido, coincide, desde outra perspectiva, lnstitute of Technology-MIT, publicou
desvirtuada. com as declarações de Francis Keating, um violento artigo no "New York Ti-
secretário-assistente do Tesouro, publi- mes", em 8 de maio último, sob o título
Uma questão de finanças cadas no "Globe and Mail", de Toronto, de "A política de drogas dos Estados
em fins de abril. Sem ser partidário da Unidos: uma ignorância colossal".
Embora, no mundo acadêmico nor- legalização, Keating sustenta a necessi- Nele ponta que "aqueles que dirigem
te-americano Já venha de algum tempo dade de enfocar o tema das drogas sob nossa guerra contra as drogas não en-
a discussão sobre a legalização, e, ainda o ângulo das finanças: "É tal a quanti- tendem nada de economia, de história
antes e com mais intensidade, na Euro- dade de dinheiro que está desestabili- nem de culturas estrangeiras... Se a
pa e Canadá, o detonador da atual ce- zando a integridade das instituições fi. nossa meta é privar os criminosos dos
leuma nos Estados Unidos parece ter nanceiras dos Estados Unidos, que o grandes lucros que obtêm com o pro-
sido o discurso do prefeito de Baltimo- governo precisa atuar, antes que seja duto da venda de drogas, a teoria eco-

1988 - N'? 113 terceiro mundo - 19


MATÉRIA DE TAPA ORO(; , ,·

nôm1ca e a história ensinam que a única nalidade, que rodeia as drogas, produz mesmo tempo, os direitos constitucio-
resposta é a sua legalização". E acres- mais danos à sociedade do que o con- nais. São conscientes de que não exis-
centa: "As políticas antidrogas dos Es- sumo das mesmas. Os viciados caem na tem, na atuahdode, trabalhos acadêmi-
tados Unidos têm sido simplesmente criminalidade para financiar seus hábi- cos que sirvam como indicadores do
arrogantes. Em muitos lugares do tos e, dessa forma, se expandem a que aconteceria, caso o consumo de
mundo, os camponeses vêm cultivando prostituição, os assaltos e os roubos". drogos fosse legalizado, porque 1á se
maconha, ópio ou coca há séculos e, de Os que adotaram posições teóricas passaram dez anos de silêncio sobre o
repente, ordenamos que não plantem libertárias, como o psiquiatra Thomas assunto, sem financiamentos para a
aquilo que sempre cultivaram. Nós nun- Szasz, defendem, pelo seu lado, a lega- pesquisa. nem investimentos neste tipo
ca acataríamos uma exigência dessa lização, porque consideram que "o di- de política.
natureza para nossos produtores rurais. reito à liberdade das idéias tem como
Somos incapazes de persuadir a nossos correlatos os d1re1tos md1v1dua1s, na li- Os que se opõem
concidadãos para que deixem o consu- berdade para se fazer uso do corpo na
mo de drogas e, no entanto, nos consi- forma em que cada um considere mais Os opositores, como o administrador
deramos capazes de ordenar aos gover- conveniente, e não como determina o da OEA, John Lawn, definem que "as
nos estrangeiros que impeçam seus governo". drogas não são prejud1c1ais porque se-
camponeses de cultivá-las. As indústrias iam ilegais, mas são ilegais porque são
só desaparecem quando seus produtos A educacão dos consumidores pre1udiciais. Os que falam em legaliza-
nao têm demanda: assim, a única solu- ção defendem uma posição racista, pois
ção para o problema das drogas é não Um outro grupo, presidido por Ar- estão dispostos a condenar à morte as
consumi-las. As proibições ao cultivo nold S. Trebach. é formado por acadê- classes pobres". A produção legal e sua
que venhamos a impor no exterior micos e economistas que organizaram a venda, de acordo com eles, seria uma
constituirão uma simples Husáo". Drug Policy Foundat,on, em 1987, para ameaça à sociedade. Outros, como o
A critica ao sistema penal é outro ar- trabalhar na busca de políticas efetivas senador Alfonso D'Amato, afirmam que
gumento dos que defendem a legaliza- no tratamento do tema da droga, consi- "a legalização do consumo de drogas é
ção do consumo de drogas. Para eles, derando-se as liberdades constitucio- uma política imoral e perigosa, que au-
as leis que reprimem o tráfico e o con- nais. Os cientistas pensam que a aplica- mentaria o número de drogados e con-
sumo de entorpecentes criminalizaram ção da chamada política de "guerra verteria a sociedade norte-americana
uma área que é própria da saúde públi- contra as drogas" foi um desastre mun- em uma sociedade de zumbis".
ca. "Ao converter a droga em assunto dial, e querem desenvolver a investiga- Michel Rosenthal, presidente da
criminal, pioramos o problema", sus- ção, a educação e a informação pública, Phoenix House, um programa nacional
tenta a criminóloga de Nova Iorque. para demonstrar que os métodos pacífi- de reabilitação de viciados, diz que se
Georgette Bennett. E o economista cos são a única esperança para controlar aumentaria o consumo, com todas as
Milton Friedman observa que "a crimi- o abuso dos tóxicos, preservando-se, ao suas sequelas, criando "um exército de

O'' novo sabor'' da Coca


Por decênios a Coca-Cola ocul- processa a coca que se usa na bebi- mou.
O tou, sob sete chaves, o segredo da. Cientistas e funcionários do go- A Coca-Cola era fabricada no ini-
de sua fórmula, desconhecida até verno norte-americano, que estão cio com cocaína e foi considerada por
mesmo pela maioria dos alt.:>s exe- investigando a composição do pro- John Smith Pemberton - o farma-
cutivos da própria transnacional. duto, obtiveram do laboratório a cêutico que fez a mistura, em 1886 -
Poucas semanas atrás, porém, con- confirmação de que a folha de coca como "uma bebida que tonifica o •
firmou-se oficialmente uma versão era lá processada para produzir Co- cérebro e o intelecto". No começo do
que corria há muito tempo. Segundo ca-Cola. A partir dai. a própria fábri- século, o componente narcótico foi
informou o "The New YorK Times", ca de Atlanta acabou por admitir o retirado da fó!mula. A empresa de
um dos ingredientes do famoso re- uso da coca em sua "água negra". Atlanta negou-se a comentar se as
frigerante é cocaína ou um produto Randy Donaldson, porta-voz da em- pressões de Reagan, para acabar
não-narcótico extraído da folha da presa, reconheceu que ingredientes com as plantações de coca, podem
coca. extraídos da folha da coca são utili- afetar a produção da bebida. A Ste-
A informação vazou através da zados no refresco, "mas tudo é su- pan Co. é o único laboratório autori-
Stepan Co., com sede em Illinois e pervisionado pelo gov~no e não zado a importar folha de coca para os
que é o laboratório que importa e existe cocai na no produto", afir- Estados Unidos.
Tres toneladas de maconha foram cremadas na Tailândia em abril, num duro golpe contra o tráfico oriental, que é forte também em hero/na

pessoas fora de controle. Os que não Enquanto isso, como destaca a re- eventualmente alcança 75%, faixa que
consomem se beneficiariam, porque vista "Time", os partidários da legaliza- poderia tornar-se viciada em definitivo,
diminuiria o índice de criminalidade, ção oferecem quatro razões fundamen- se o consumo se tornasse legal; 2) a le-
enquanto que os viciados ficariam con- tais: 1) os 8 bilhões de dólares, que se galização poderia facilitar a venda de
denados a uma brutal luta solitária con- gastam anualmente em programas de drogas sintéticas ou derivadas, como
tra a dependência, o que é algo imoral e controle e repressão dentro dos Estados o crack, que gera dependência irreversí-
racista". O dr. Edward Senay, da Uni- Unidos, poderiam ser utilizados em vel, sem que existisse uma compreen-
versidade de Chicago, considera que se educação e atendimento médico, item são geral de seus efeitos perniciosos; 3)
trata de "uma experiência social muito que recebe menos de 500 milhões de os gastos em saúde causados pelo abu-
perigosa, que poderia ter consequências dólares por ano; 2) as vendas de cocaína so de drogas - estimados em 60 bilhões
desastrosas". e maconha representam uma renda de de dólares anuais - aumentariam; 4)
mais de 20 bilhões de dólares anuais remover as restrições legais poderia
20 bilhões de dólares para os chefões das drogas, que iriam à converter o consumo de drogas em um
falência com a legalização; 3) os consl,- hábito socialmente aceitável.
Charles Rangel, presidente da Co- midores norte-americanos geram lucros Nenhum dos lados, no entanto, está
missão Especial sobre o Abuso e Con- de 2 bilhões de dólares para os trafi- em condições, no presente momento,
trole de Drogas-SCNAC, do congresso cantes latino-americanos, cuja perse- de responder se a legalização reduziria a
norte-americano, opõe-se à legalização, guição afeta nossas relações com os criminalidade ou aumentaria a depen-
formulando uma série de perguntas: - países da região; 4) os programas de dência. Ao mesmo tempo, faz-se tam-
Oue drogas se permitiriam? Como se tratamento poderiam ser financiados bém necessário responder a uma per-
venderiam? Com receita médica nos com impostos sobre os entorpecentes, gunta crucial: o que acontece na socie-
hospitais e clínicas, ou em farmácias e semelhantes aos que existem sobre o dade norte-americana, para que tantos
supermercados? Haveria limites de ida- álcool e o fumo. cidadãos tenham que recorrer às drogas
de? Venda ilimitada ao consumidor ou Por sua vez, os opositores oferecem para existir? •
quantidades controladas? Como execu- também razões contra a legalização: 1)
tar um sistema desses?". As respostas drogas baratas e abundantes aumenta- * Rosa dei Olmo é uma destacada personahda<le den•·o
variam, de acordo com os vários parti- riam o vicio, pois, enquanto somente da criminologia latmo-americana, Prolossora da Universi-
dade de Caracas, frequentemente ensina em tnslllulOS e
dários da legali1ação, mas o debate mal 10% dos que bebem ficam dependentes, universidades eslrangeira s Atualmente nos Estados um.
dos, laz um sem,nãrio na Universidade George Washing-
está começando. a percentagem dos que usam drogas ton.
AMÉRICA LATINA ( Ili//

s vésperas de t entar prolongar a ditadura, o regime militar chileno enfrenta o repúdio popular à violencia governamental

Ocomplicado caminho
rumo à democracia
A organização do plebiscito para definir o futuro presidente gera participação e expectativa que podem selar
o destino da ditadura

dente e parlamento. avizinham constituirão, sem dúvida, um


Esteban Tomic' Fora do Chile, são poucos os que dos mais estranhos períodos de toda a
crêem que este plebiscito possa pôr fim história do Chile".
aos 15 anos de poder pessoal do gene-
esafiando a lógica com que os ral Augusto Pinochet. "As ditaduras não Pinochet: conhecimento do poder

D governantes autoritários costu-


mam se mover, os militares chi-
lenos preparam-se para consultar os ci-
organizam eleições para perdê-las" - é
o argumento lembrado por políticos
europeus a líderes da oposição chilena
O exame de alguns dos elementos
que constituem o quadro político do
Chile de hoje nos dá algumas indicações
dadãos, sobre quem deve deter o poder que por lá estiveram recentemente.
no Chile, a partir de 1989. Segundo a Talvez os políticos europeus tenham importantes para a análise da situação.
Constituição ditada em 1980, os coman- razão, mas o certo é que no Chile são Em primeiro lugar, está a longa tra-
dantes das três forças armadas e da po- cada vez mais numerosos os que vêem dição democrática de seu povo (150
lícia devem submeter ao veredito po- no plebiscito uma possibilidade real de anos), o que forçou o governo militar a
pular um nome para presidente. Se este afastar Pinochet do poder e de enviar os oferecer - além de "lei e ordem" - tam-
for aprovado, governa por oito anos. militares de volta aos quartéis. Por isso, bém o retorno a formas democráticas
Caso contrário, passado um ano, serão um cotado jornalista chileno escreveu
* Esteban Tomíc é advogado democrata-cristão e ex·
convocadas eleições livres para presi- em sua coluna semanal: "Os dias que se diplomata

22 - terceiro mundo
AM ÉRICA LATINA

Período raro

O jogo dinâmico de todos esses fa-


tores, unidos ao papel da Igre1a - que
tem grande ascendência sobre o povo,
com a defesa clara e decidida dos direi-
tos humanos assumida durante a dita-
dura - delineia um panorama pouco
cla ro , do qual se podem esperar dife-
rentes desenlaces. Por isso mesmo,
1988 é, no Chile, um "período raro",
CUJO decurso é necessário se analisar dia
a d ia.
M as, se tirarmos os olhos dos acon-
tecimentos imediatos e observarmos a

Os protestos contra o regime tornaram-se


freqúentes como a passeata (abaixo)
de condenação às torturas policiais

de governo, incompa t íveis com o


que foi a sua atuação nos últimos 15
anos.
Por outro lado, existe a person alida-
de de Pinochet, homem de raciocíni o
simples, astu to e co m g rande co nheci-
mento do poder, o que garante que vo-
luntariamente não fará nada q ue venha
a significar a diminuição da autoridade
que detém.
Um terceiro aspecto de importância
está na união da oposição em to rn o do
não em 2 de fevereiro últi mo. termina-
ram 15 anos de lutas e q uerelas in ternas
na oposição e formou-se um g rande
bloco político pelo não, ao qual se so-
mou ultimamente o Partido Comunista,
ainda que à margem da estru tura for -
mal do movimento
Em qua rto lugar, deve-se levar em
conta que um significativo número de
empresas sobreviveu ao liberalism o
econômico exacerbado aplicado pelo
Pinochet: plebiscito em outubro
governo e pôde competir com êxito no
mercado internacional , com uma varie- O Ofirmou
próprio geni>ral Pinochet con-
a realização do plebiscito
para derrotar a campanha pelo não.
A imprensa oficial difundiu, em
dade apreciável de produtos. O Chile no próximo mês de outubro, adver- forma destacada, a sondagem da fi -
não é mais um país mono-exportador. tindo seus partidários a "não terem lial chilena da transnacional Gallup,
Nenhum futuro governo poderá pres- mentalidade triunfalista" e a se em- segundo a qual o "sim" ganha do
cindir deste setor, se quiser levar penharem na obtenção da vitória na "não" por 42,1 % contra 33,4%. A
a contento qualquer política econô- consulta popular. mesma pesquisa assinala que ainda
mica. O general - que já completou 72 existem 24,5% de indecisos. Todas as
Em quinto lugar, é p reciso atentar anos e se projeta como o candidato enquetes realizadas por essa trans-
para as forças armadas, bem equi padas. único ao referendo- falando para uma nacional vêm dando vantagem ao
educadas na tradição prussiana e o rgu - centena de jovens, na cidade de Con- governo, em contraste com estudos
lhosas de jamais terem perdido uma cepción, afirmou que é preciso "tra- de outras entidades de sondagem de
guerra (o Chile en fren tou duas guerras, balhar como se estivéssemos aflitos, opinião, que atribuem a vitória aos
além da campa nha chama da " de pacifi - como se estivéssemos empatados", partidários do "não".
cação" cont ra os índios mapuchesl.

terceiro mundo - 23
AMÉRICA LATINA Cll!l.f:'

evolução que sofreu o regime militar até


hoje poderemos afirmar. sem medo de
errar, seja qual for o resultado do ple-
biscito, que o poder militar sobre a so-
A estratégia do não
ciedade chilena, e por consequência o O objetivo comum de derrotar a ditadura leva
de Pinochet. se encontra em fase decli- numerosos partidos e personalidades chilenas a trabalhar
nante. em conjunto para ganhar o plebiscito
Há um ano os
partidos políticos tória do não no plebiscito, em suas di -
não tinham existên- mensoes políticas e econômicas. Sa-
cia legal: bastou lienta que a frente. formada para a rejei
que o regime ditas- çào tio candidato do regime militar, tem
se uma lei, que como objetivo uma solução racional,
permitia sua forma- "que faça possível uma transição rápida,
cão, para se reor- pacífica e em ordem. rumo à democra-
ganizarem quatro cia".
partidos de oposi- Os 16 partidos expressaram que "o
ção que estão ativos regime <ie Pinochet é extremista' e tem
em todo o país e atuado permanentemente "com a lógica
conseguiram inclu- da guerra. rlividindo o povo chileno en-
sive, acesso à tele- tre amigos e inimigos". Ao mesmo
visão. mero que o tempo. reafirmam seu compromisso
regime havia con- com o acordo econômico e social, assi-
trolado totalmente nado em 10 de maio passado. e enfati-
até agora. zam a decisão de fazer respeitar o voto
A brecha que as- A luta congrega todas as correntes políticas secreto.
s·m se abriu no
ambiente cultural e político do país é s forças políticas que decidiram O não na Constituição de 1980
ostensiva. Do pessimismo existencial e a trabalhar em conjunto pela rejei-
consequente desmobilização que reina- ção do candidato único do regi- O plebiscito é um instrumento de
va no ano de 1987, passou-se a um es- me militar, no próximo plebiscito, de- consulta popular previsto na Constitui-
tado de febril organização em todos os ram novo passo em seu processo unitá- ção de 1980 - promulgada pelo atual
planos. mas especialmente no da pre- rio de coordenação, ao constituírem um governo e rejeitada pela oposição. Mas.
paração dos operadores que terão como conselho de pres dentes e um comitê o tempo e as circunstâncias foram le-
missão fiscalizar, por conta da oposição, executivo para a condução da campa- vando as forças democráticas a aceitá-
que no dia do plebiscito não se cometa nha. Em ato realizado em 16 de junho, la. "A Constituição contempla para esse
fraude na sede do Comando pelo Não, o con- referendo duas alternativas: sim e não.
As pesquisas de opinião demons- selho se apresentou, e assumiu a condi- Em nenhum de seus artigos qualifica o
tram, igualmente, mudança muito im- ção de porta-voz o presidente da De- não como o caos, a paralisia de toda a
portante em relação ao ano passado. mocracia Cristã, Patrício Aylwin. atividade produtiva, financeira e comercial
Faz 12 meses, Pinochet era considerado O comitê executivo está integrado do país, que é a forma como o define o
imbatível pela grande maioria dos pes- por Andrés Zaldivar (DC), Enrique Silva general Augusto Pinochet", observam
quisados. Hoje, em contrapartida, a Cimma (Partido Radical). Ricardo Lagos os defensores da recusa à proposta
proporção de não seria o dobro dos (Partido pela Democracia, PPD). José continuísta do regime. Para eles, se os
votos im nas grandes cidades do país. Tomás Sáenz (Partido Humanista). Luís que redigiram a atual Constituição pen-
Mesmo a nível nacional, compreenden- Maira (Esquerda Cristã) e representan- sassem que o triunfo do não era preju-
do os setores rurais, o não manteria tes do Comando Socialista pelo Não. O dicial para o Chile. não o teriam coloca-
uma vantagem de três a quatro pontos. secretário-executivo da entidade é o do como alternativa. Uma consulta de
Nada pode garantir que o caminho cientista político Genaro Arriagada. tanta transcendência pressupõe justo e
definitivo até à democracia ocorrerá Ao se constituir. o conselho divulgou equilibrado respeito pelas respostas.
sem traumas, mas o que se sabe é que um documento. em que frisa que já se "A oposição terminou aceitando as
esse caminho já começou no cotidiano inscreveram 6 milhões de cidadãos, nos regras do jogo impostas pelo regime.
dos chilenos, antes ainda do plebiscito, registros eleitorais, e se formaram Co- Só reclama transparência e limpeza".
independentemente de Pinochet. a sua mandos pelo Não em mais de 200 co- afirmam os porta-vozes da Comissão
revelia, ultrapassando-o. munas. pelo Não. Mas, parece que esses são
Isto é estranho, difícil de se entender. O conselho criticou as interpretações justamente os ingredientes que se tor-
mas está acontecendo. dadas pelo governo a uma eventual vi- nam inaceitáveis para o governo e de-

24 - terceiro mundo
AMÉRICA LATINA

mais pa rtidá ri os do sim, que, em todas ao exteri o r os objetivos da ca mpanha e


as declaraçoes, impug nam o nao. as co ndições, nas q uais a m esma se de-
Primeiro, alega ram que o não levari a se nvo lve. Ao mesmo tem po, propõe-se
ao caos. Depois, af irmaram que consti - a dar respostas às perguntas que ve- ~rocesso
tuiria o retrocesso do Chile ou a reedi -
ção da Unidade Popular. Po r isso, co -
n ham a surgir a nível internacio nal. Ela
serve, em cont rapa rtida, a iniciativas
contra
menta-se em Santiago q ue quem redi-
giu a Constitu ição, ou os que a apoia-
externas de so lidariedade com o povo
chileno.
a imprensa
ram depois, talvez pressupusesse que o Seus membr os estimam que é de D O juiz chileno Jorge Varela pro-
não jamais poderia ganhar. Mas, at ua l- vital i mpo rtância a visita de líderes polí- cessou os diretores de um jornal
mente o plebisci to é um fato político da ticos e sociais ao país, pa ra se infor ma- e de duas revistas de oposição, por
maior importância no Chile: o governo e rem sobre as formas pelas q uais o ple- haverem publicado um manifesto do
seus pa rtidários estão sendo levados, biscito est á sendo or ganizado. Para t al ilegal Partido Comunista, que fez um
pela força da mobilização popular, a o bjetivo se di recionam os esforços da chamamento ao não, no próximo
sentir a obrigação de serem conse- A painde, que visam a garantir a presen- plebiscito presidencial.
quentes com o que criaram, respeita ndo ça de observadores parlamentares. O juiz, ex-diretor dos serviços de
a campanha do não. impostos internos do atual regime,
Observadores acolheu requerimento do ministério
O processó de unidade do Interior e abriu processo contra o
Duzentos e dezessete senadores e diretor do jornal "Fortín Mapocho",
A constituição do Consel ho de Presi- deputa dos, pertence ntes a 45 parla- Alberto Gamboa. Foram também in-
dentes foi um novo passo no crescen te mentos do mu ndo, já confirma ram pre- cluídos os diretores das revistas" Ap-
processo de unidade da oposição, gera- sença no Chile, para atuarem como o b- si", Marcelo Contreras, e "Cauce",
do a partir da declaração de 2 de feve- servadores no plebiscit o. Este número Francisco Herreros, enquanto ficou
reiro, quando se constitu iu o Com ando será aumentado até ultrapassa r talvez pendente o processo contra a revista
pelo Não. Os 13 assinantes de então os trezentos parlamentares, segundo "Análisis", já que faltou identificar
(hoje 16) ressaltaram, nessa declaração, cálculos da direção da Apainde. quem era o diretor da mesma, à épo-
que, cumpridos os objetivos da compo - O governo chileno critico u aberta- ca da publicação.
sição e aprovada a proposta do não, mente a presença de observadores polí- Em seu manifesto, o PC chileno,
"corresponderá aos partidos políticos ticos estrangeiros. Recentemente, o há dois anos declarado inconstitucio-
democráticos negociar com as forças próprio Pinochet qua)ificou as persona- nal, repudia o candidato único, de-
armadas os termos de uma transição lidades convidadas de "marionetes", fendendo o não no plebiscito e ar-
rápida e organizada para a democracia, advertindo que seu governo "não per- gumentando que "o referendo é uma
tendo como marco esta proposta." mitirá observado res estrangeiros no conjuntura favorável à causa demo-
O Comando Nacional pelo Não or- plebiscito, porque a lei eleitoral chilena crática, para com ele impor uma
ganizou uma comissão internacional, assim o estabelece". E, usando uma lin- derrota a Pinochet e gerar uma situa-
integrada por represent antes dos parti- guagem vi rulenta, expressou que "eu ção que faça possível pôr um fim à
dos políticos assinantes do acordo e não aceito que venham me olhar. Ai nda ditadura" .
pela Apainde, a Assembléia Parlamen- m ais que a lei proíbe que entrem nos Os três diretores processados
tar Internacional pela Democracia. A recintos. Mas (os opositores) estão desfrutam de liberdade, já que não
comissão é presidida por Juan Somavía chamando para que venham ver a frau- tiveram penas de cárcere, mas de
e a integram Roberto Cifuentes (DC), de, porque, em primeiro lugar, é uma m ultas em dinheiro, que poderão
Carlos Dupre (Apainde), Mariano Fer- forma de conseguir dinheiro. Eu creio chegar até o equi valente a 15 mil
nández (DC), Francisco Granella (PH), que o melhor negócio que fizeram foi dól ares.
Eduardo Jara Letelier (PS-Almeyda), este: tanto para ti, tanto para mim. E
Nora Maluenda (PRSD), Luís Risopatrón depois dizem que existe fraude". Em
(Comando pelo Não), Ricardo Serrano seguida, Pinochet advertiu: "Se eles (os de se manter sereno como correspon -
(Secretariado), Sérgio Trucco (PN), opositores) ganham, não existe fraude. deria a sua envergadura".
Juan Gabriel Valdés (PPD), Raimundo Aí fica bem claro. Mas, se perdem, a Reafirmou também que os observa-
Valenzuela (IC), Eugenio Ve lasco Lete- fraude existe. É uma maneira de enga- dores internacionais convidados " virão
lier (PSD) e Guillermo Zavala (PS- nar o m undo. São traidores, são vende- e ingressarão nos recintos de votação,
Almeyda) . pátrias!" tal como a lei perm ite. O povo chile no
O objetivo é abordar os assuntos Após saber das declarações de Pino- avaliará nosso convite, e as ameaças de
substanciais e operativos de ca ráter in- chet, a Apai nde as ref utou, assinalando Pinochet não terão efeito real". •
ternacional, vincu lados ao desenvolvi - que Pinochet insultou a oposição da
mento da campanha pelo não. forma mais grosseira e desqualificada, * lnlormações extraídas de "Chile, Democracia Urgente",
boletim quinzenal, editado pela Comissão Internacional
A comissão tem a ta refa de info rmar "porque está perdendo, e isso o i mpede pelo Não.
C UA Fl:"'1,\/.A
AMÉRICA LATINA

Cessar- fogo,
o início do diálogo
A decisão da guerrilha de colocar em prática uma trégua
pode facilitar o reinício do dialogo com o governo, com a mediação
da Comissão Nacional de Reconciliação

Diá logo N acional

Representantes
da URNG e do go-
verno de Vinício
Cerezo reuniram-se
em outubro do ano
passado em Madri,
nas primeiras nego-
ciações diretas en-
tre o Estado e a
guerrilha, depois de
27 anos de enfren-
tamentos. O movi-
mento insurgente
chegava à mesa de
negociações relati-
vamente fortalecido
no campo mili tar,
Grupos de defesa dos d ireit os humanos saem às ruas e reclamam justica ao govern o de Vin icio Cerezo (fot o menorl
enquanto o gover-
no o fazia empurra-
o processo de pacificação", afirmaram do pela pressão internacional.
A/do Gamboa porta-vozes da comissão, advertindo, Não houve acordo concreto, mas, a
entretanto, que o caminho a percorrer é partir de uma proposta da URNG, dis-
difícil e complexo. cutiu-se a necessidade de estabelecer
esde 1'! de julho vigora o cessar- Os comandantes da URNG propõem enlaces rápidos e secretos, como um

D fogo de 90 dias, proposto unila-


teralmente pela Unidade Revo-
lucionária Nacional Guatemalteca (UR-
uma
opinião
pelos
supervisão
deles,
governos
do

da
cessar-fogo
poderia ser levada
Espanha,
que,
a
na
cabo
Alemanha
Federal, Canadá e Brasil. Em relação ao
meio de comunicação entre ambos os
lados. O representante do governo, Ro -
berto Valle, sublinhou a necessidade de
acabar com a guerra, enquanto o co-
NG), mas que foi considerado uma me-
dida "oportuna" pelo governo de Viní- diálogo, o movimento armado estima mandante Rodrigo Asturias, chefe da
cio Cerezo. A secretaria de relações pú- que toda negociação deve partir da delegação guerrilheira, assinalou a ur-
blicas da presidência disse que "vê com premissa de que as causas históricas do gência de terminar com as causas que
bons olhos" a proposta da URNG "para conflito persistem e necessitam ser ana- lhe dão origem.
lisadas, para pôr fim ao derramamento As conversações de Madri se origi-
um diálogo através da Comissão Nacio-
de sangue. A URNG reivindica, assim naram do processo de negociação que
nal de Reconciliação-CNR", a qual tor-
se desenvolveu em toda a Amé rica
nou pública a decisão do comando da mesmo, seu reconhecimento como in-
terlocutor representativo e válido e a Central, impulsionado pelos acordos de
ag ru pação guerrilheira, que se dispôs a
continuidade das conversacões de ou- Esquipulas e, de certo modo, estavam
cessar as operações militares.
"Trata-se de um passo para se iniciar tubro de 1987 em Madri, Espanha. implícitas no compromisso assumido

26 - terceiro mundo
AMÉRICA LATINA

pelo presidente Cerezo, durante sua


campanha eleitoral, de fazer um gover-
no democratizante. Para iniciar a cons-
truçílo ciíl democracia na Guatemala, era
necessário abordar dois temas: o diálo-
go entre o governo e a URNG, como
primeiro passo, e um amplo Diálogo
N acional, com todas as forças políticas e
sociais.
Partiu da URNG a iniciativa da con-
vocação para um amplo diálogo com
todas as forças do país. A princípio, foi
muito bem recebida a nível potítico, mas
não contou com a simpatia do governo,
nem dos militares. "Certos setores pen-
sam que Já é hora de nos sentarmos, de
maneira civilizada, para discutir a solu-
ção política do conflito guatemalteco",
assinala Miguel Angel Sandoval, mem-
bro da comissão político-diplomática da
Unidade Revolucionária Nacional Gua-
temalteca, que participou das negocia-
ções de Madri.
"Mas, outros sequer digeriram as
primeiras conversas. Por isso, somos
cautelosos", acrescenta. "Não se trata
de buscar uma solução à guerrilha; tra-
ta-se de dar resposta às causas que lhe
"'"------
Greves prolongadas atestam a crise econômica
deram origem". Para o dirigente, ainda
que o governo insista em que a URNG URNG considera que o governo deve Episcopal, os partidos políticos e até o
deponha as armas - "coisa que pode- garantir tratamento justo aos prisio- presidente Oscar Arias, da Costa Rica,
ríamos fazer amanhã" - não é essa a neiros de guerra e comprometer-se a também se ofereceram como interme-
solução. Enquanto sigam intactas as não bombardear a sociedade civil. As- diários.
causas de base que levaram a adotares- sim, ficaria mais perto a solução do "Falta somente a vontade política do
se caminho, outros pegariam as armas, conflito. "Lamentavelmente, o governo governo de aceitar as negociações",
e continuariam a luta, se a URNG a não quer assumir este compromisso, afirma o dirigente da UNRG.
abandonasse. porque bombardear a sociedade civil é
uma arma de terror", diz o líder guerri- O problema da terra
Quatro princípios lheiro.
Diálogo - criar condições para um A origem da aguda crise social e po-
A proposta da URNG ao governo diálogo nacional, com todas as forças lítico-institucional guatemalteca é a ex-
contempla quatro pontos: sociais e políticas. cessiva concentração da terra em pou -
Democratização - medidas para a Gradualismo - debater sobre que ba- cas mãos, enquanto a maioria da popu-
democratização, em particular a disso- ses construir a democracia na Guate- lação está constituída por trabalhadores
lução çlas patrulhas civis. "Não é aceitá- mala. A URNG propõe cria r zonas des- sem terras. A esse problema se soma a
vel que 10% da população sejam recru- militarizadas, com o propósito de ir ge- crítica situação das vinte etnias existen-
tados para formar patrulhas de repres- rando condições para passar, em etapas tes no país.
são, nem que milhares de guatemalte- posteriores, à eliminação do conflito. O problema é similar em toda a
cos sejam obrigados a viver nas aldeias Por ocasião das conversações de América Central, mas, na opinião da cú-
estratégicas, ou que dezenas de milita - Madri, a proposta, em seu conjunto, não pula da URNG, na Guatemala este qua-
res implicados na repressão continuem foi aceita pelo governo. Mas, a Comis- dro tem um agravante: já houve uma
a exercer cargos no governo. É neces- são de Reconciliação Nacional - instru- experiência de reforma agrária, na épo-
sário desmilitarizar a estrutura repressi- mento criado pelos tratados de Esqui- ca de Jacobo Arbenz (1953-54). Mas,
va montada nos últimos anos", observa pulas li - propôs-se como intermediária todas as conquistas foram eliminadas
Sandoval. entre o governo e a URNG, para garan- pelo golpe de estado de 1954. Desde
Humanização - humanizar a guerra, tir a continuidade das conversas. O ar- então, tanto o exército, quanto a oligar-
com base nos acordos de Genebra. A cebispo da Guatemala, a Conferência quia endureceram suas posições, tor-

1988-Nº 113 t erceiro mundo - 27


AMÉRICA LATINA

nando-se muito mais conservadores,


para evitar uma nova experiência de
reformas populares.
A terra se converteu em problema
Mar tão agudo, que foi discutido pela con
MÉXICO do
ferência episcopal em carta pastoral
Cariba
chamada O clamor pela terra. A rea-
ção não se fez esperar: a direita acu-
sou a todos os bispos da Guatemala
de comunistas e instrumentos da
URNG".
GUATEMALA
·o tema da terra é central e, en-
quanto não se resolva, haverã violên-
KONOURAS cia", adverte Sandoval. Para o dirigente,
a injusta estrutura econômica estã sus-
Oceano
F' cffico tentada no aparato militar e paramilitar
que domina o conjunto da sociedade
guatemalteca. Paradoxalmente, ao ser a
causa principal do conflito, é, também, a
base para sua solução. o

Desmascarar a contra- insurgência


O comandante Rolando em nosso país, na estratégia temalteco, depois de tantos ção dos problemas mais
D Morán - de 56 anos, 26 do governo da Democracia anos no poder, tem sua pró-
pria visão do Estado e do
graves e urgentes."
Os sinais do novo mo-
deles na luta guerrilheira Cristã, não seria capaz de
- integra o comando-geral modificar a realidade de papel que os militares de- mento que vivem as forças
da Unidade Revolucionária nosso país. Portanto, não vem desempenhar nele. Em revolucionárias guatemalte-
Nacional Guatemalteca poderia retirar as bases so- sua concepção, os civis cas, assegura o comandante,
(URNG}. Ele analisou, em ciais que integram e apóiam agora devem atuar só como são muitos. Cita em especial
entrevista concedida a nosso nosso movimento", afirma administradores, deixando o reconhecimento da URNG
colaborador Rubén Aguilar Morán. "Desde o começo, para eles o governo real". por parte de governos, co-
Valenzuela, os efeitos que a demos ao presidente Cerezo A Democracia Cristã e o mo o da Espanha e Costa
situação internacional da a oportunidade de tornar próprio presidente Cerezo se Rica; o repúdio, em assem-
atual década teve na luta re- realidade suas palavras de enganaram, pensa Morán, bléias internacionais, aos
volucionária centro-ameri- devolver a democracia real a ao considerar que haviam ataques diplomáticos do go-
cana, e, em particular, na nosso país, o que necessa- chegado por sua conta ao verno Vinfcio Cerezo, que
que se desenvolve no inte- riamente exige estabelécer a poder, e não como uma tenta apresentar a guerrilha
rior da Guatemala. justiça social. Mas, estáva- concessão do exército, o como ilegítima e condená-
Segundo Rolando Morán, mos conscientes das dificul- qual nunca perdeu, na nego- la; e o crescimento do apoio
no começo, a nova conjun- dades que isto implicava, ciação com os norte-ameri- à URNG, como interlocutor
tura mundial - de grande porque na Guatemala é o canos, o controle da situa- válido e indispensável no
impulso à distensão, para exé~cito, e não o executivo, • ção. diálogo nacional.
afastar a -possibilidade de quem detém o poder". "A igreja, por exemplo,
uma conflagração interna- Na opinião do coman- 1nterlocutor indispensável uma das mais importantes
cional - afetou as relações dante da URNG, a Democra- forças sociais do país, deu
internacionais do movi- cia Cristã pecou por inge- "Nosso objetivo - afirma início, na figura do arcebispo
mento revolucionário gua- nuidade, "ao considerar que o comandante - não é der- da Guatemala, monsenhor
temalteco. teria possibilidades reais de rubar a Democracia Cristã. Próspero Penados, ao diálo-
governar, e que poderia dei- Queremos desmascarar o go com as organizaçoes re-
Justiça social xar de lado, nas decisões projeto contra-insurgente, volucionárias", observa
fundamentais, os que man- demonstrar que não é alter- Morán.
"Sabíamos que a nova daram no país nos últimos nativa, porque em nosso
trinta anos. O exército gua- país ele não conduz à solu- Rubén Aguilar Valenzue!a
situação, que se expressava,
DESARMAMENTO I ATLÂNTICO SUL

Um lago que aproxima


ou um oceano que separa?
Países dos dois lados do
Atlântico Sul reúnem - se ÁFRICA
pela primeira vez, para
estudar meios de integração
e de preservação da
paz na região

Procópio Mineiro

epresentantes de 22 nações sul-

R americanas e africanas reuni-


ram-se no final de Julho, no Rio
de Janeiro, para o primeiro encontro
dos países da Zona de Paz e Coopera-
ção do Atlântico Sul, quando debateram
um temário de grande importância para
a região, envolvendo assuntos políticos,
econômicos e sociais, inclusive o s1gn1fi-
cat1vo aspecto do meio ambiente.
O encontro internacional teve a co-
ordenação do Brasil, através do ltama-
rati, e refletiu as preocupações desta
parte do mundo banhada pelo oceano
Atlântico, onde vivem mais de 300 mi-
lhões de pessoas, um cenário em que,
ao longo dos últimos séculos, desenvol-
veu-se intensa interpenetração de po-
vos, através da forçada migração negra, TÁRTIDA
resultando, hoje, em grupos humanos
O Atlântico Sul pode tornar-se o lago afro-amer icano desenvolvi mentist a e desnuclear izado,
identificados, em grande parte, pelas se forem aproveitados, com v istas ao futuro, os laços que surgiram no passado
mesmas origens étnicas.
Ao abrir os trabalhos, o chanceler que continua oprimindo a maior parte com os países desenvolvidos do norte,
brasileiro Abreu Sodré destacou, que da população da África do Sul; en- antigos colonizadores ou novos centros
"as afinidades históricas, os laços de quanto países de nossa região sofrerem econômicos mundiais. O papel de pro-
amizade e de solidariedade e os ele- agressões e tiverem violada sua integri- dutores de matérias-primas e a indus-
mentos comuns de nossa inserção no dade territorial; ou enquanto persistir o trialização recente são cumpridos, da
cenário internacional fundamentam a colonialismo em suas formas anacrô- mesma forma, com baixo índice de in-
disposição de construir um novo tipo de nicas". tegração regional: o mar - que agora se
relação, em benefício de todos". pretende fazer um lago que aproxima -
Abreu Sodré acentuou ainda que "os Criando laços é ainda, por enquanto, um oceano que
objetivos de paz e cooperação no Atlân- separa.
tico Sul não poderão ser plenamente al- Este conjunto de países distingue-se, A declaração final do encontro con-
cançados, enquanto não se lograr a in- ao longo de suas histórias nacionais, templou os assuntos mais imediatos
dependência da Namíbia; enquanto não por uma baixa integração regional, vi- para os países da região. Com destaque
se desarticular o sistema do apartheid, vendo em função de relações paralelas foi lembrada a questão angolana, fa-
AT/.,\NT/CO SUi
DESARMAMENTO

zendo os 22 países uma condenação


formal da agressão sul-africana ao ter-
ritório de Angola e enfatizando o apoio
aos esforços para a independência da
Namíbia. Igualmente destacou-se a ne-
cessidade de solução pacífica para a
questão das Ilhas Malvinas, ocupadas
por uma potência extra-regional, a Grã-
Bretanha. No aspecto econômico, fri-
sou-se a conveniência de que se inten-
s"fiquem os intercâmbios entre os paí-
ses do Atlântico Sul, estabelecendo-se
novas rotas marítimas e aperfeiçoando-
se os sistemas de comunicação.

D esnuclearização

Outro aspecto significativo da decla-


ração -final do encontro envolveu a rea-
firmação dos propósitos de se manter o
Atlântico Sul como uma área livre de
armas atômicas. A preocupação antinu-
clear foi, inclusive, uma das motivações
que estimularam, anos atrás, os países
da região a criar a zona de paz e coo-
peração. vencionais, pronunciando-se os inte-
Os propósitos antinucleares esten- Sodré: paz, comunicação, intercâmbio grantes da Zona de Paz e Cooperação
dem-se também aos armamentos con- por sua redução e controle, evitando-se
a introdução daquelas de grande poder

Ll•xei•ra dOS r•IC OS


de destruição.
doAtlânticoSul. Preocupação paralela a esta refere-se
o caso mais recente prende-se ª ao meio ambiente, um assunto que
168 barris de lixo tóxico produzido na ocupou grande parte das discussões,
Itália e depositado por um navio no em função do papel de lixeiras de restos
porto de Koko, em Bendel, Nigéria, tóxicos em que alguns países do grupo
para posterior internamento em ter- estão ameaçados de se transformar.
ritório nigeriano. O caso chegou ao Episódios recentes de lançamento, por
conhecimento da opinião pública em parte dos países industrializados, de
junho, através de denúncia do diário despejos perniciosos na região mere-
"The Guardian", de Lagos. A mobili- ceram veemente condenação, uma vez
zação imediata do governo nigeriano que, além dos desconhecidos dos go-
levou ao recolhimento do perigoso vernos, são numerosos os casos em
depósito. No dia 17 de agosto, os úl- que, mesmo autorizados, tais depósitos
timos barris foram embarcados de de alta toxicidade não receberam a ade-
Lixo nuclear: rumo ao Terceiro Mundo volta à ltãlia, no navio Deep Sea Car- quada proteção, constituindo-se em
rier. perigo direto para as populações vizi-
O Aparecem, com frequência cada Já em maio, a questão dos rejei-
vez maior, as denúncias de que tos tóxicos lançados pelas transna-
nhas e para as condições ambientais.
A este respeito, o secretário geral do
países do Terceiro Mundo, especial- cionais ou governos dos países ricos ltamarati, Paulo de Tarso Flecha de Li-
mente africanos, estão sendo utiliza- merecera indignada condenação, em ma, acentuou, no encerramento do en-
dos por nações industrializadas e resolução do Conselho de Ministros contro, que se torna "fundamental o
suas companhias transnacionais co- da Organização de Unidade Africa- estabelecimento de um sistema de troca
mo áreas para depósito do lixo peri- na-OUA, que se reunia em Adis de informações entre os diversos países,
goso, de origem industrial ou nu- Abeba, Etiópia: "O depósito de lixo para que se possa acompanhar com efi-
clear. Alguns incidentes já ocorre- nuclear ou industrial no continente é ciência e evitar o lançamento de despe-
ram, inclusive com relação ao lança- um crime contra a África e contra o jos em terra ou nas águas do Atlântico
mento de rejeites tóxicos nas águas povo africano". Sul". •
DESARMAMENTO

Anseios da comunidade especialmente para o processamento


de nossas matérias-primas, que es-
tão sendo vendidas a preço vil num
mercado internacional, cujo controle
está fora de nossas mãos. Assim,
uma comercialização adequada de
. nossos próprios produtos acabados e
semi-acabados forneceria, de forma
vantajosa, os recursos para o finan-
'ciamento de nossas políticas de de-
senvolvimento."
(Pronunciamento do Embaixador Koffi
Adjoyi, da República do Togo)

ARGENTINA

"Na região do Atlântico Sul, ape-


Cooperação sul-atlântica: o desafio de aproximar, partilhar e conviver com dignidade sar dos esforços da comunidade in-
ternacional em estabelecer uma zona

D Representantes dos diversos


países-membros fizeram pro-
Porque acreditamos nesta possi-
bilidade, estamos hoje aqui, nesta
de paz, esta ainda não se faz ver no
conjunto. O apartheid continua, ainda
nunciamentos no correr dos traba- terra brasileira que é, em tão grande não conhecemos a data final para
lhos, enfocando aspectos do temário medida, parte de nossa história." a independência da Namíbia e per-
geral mais identificados com os in- (Pronunciamento do Embaixador Rafael siste a situação colonial das ilhas
teresses de seus países. Abaixo, tre- Branco, da República Democrática de Malvinas; Geórgia e Sandwich do Sul.
chos de alguns desses pronuncia- S. Tomé e Prfncipe)
mentos. Nosso oceano é objeto de uma
TOGO injustificada militarização por parte
S. TOMÉ E PRÍNCIPE dos Estados possuidores de armas
"Esta situação (a disputa entre as atômicas, o que afeta a segurança de
"Ao chamarmos a atenção para as poténcias) expõe, inevitável e objeti- toda a região e se caracteriza pela
situações conflituais existentes, não vamente, o problema da capacidade existência de bases, a realização de
queremos de maneira alguma su- dos países em desenvolvimento em manobras e pelo deslocamento ir-
bordinar ou relegar para segundo assumir inteiramente a soberania so- restrito de unidades navais dotadas
plano os desafios que se nos apre- bre seus espaços nacionais, sejam dessas armas nucleares.
sentam no çfomínio da cooperação. marítimos, terrestres ou aéreos.
Os caminhos conducentes à paz são A importância estratégica do Torna-se, pois, necessário haver
diversos e muitas vezes ambíguos. A Atlântico Sul é clara, se levarmos em uma resposta firme e enérgica desta
cooperação entre países é certa- conta o grande número de países da reunião, porque é difícil pensar em
mente um desses caminhos e dos região, a regularidade e a diversidade cooperação integral, abrangente e
mais seguros. do tráfego comercial marítimo e, permanente, a que todos aspiramos,
O Atlântico Sul tem sido, até o portanto, os interesses econômicos, se ainda persistirem sinais sérios de
pre!sente, testemunho das maiores financeiros e de segurança subja- confrontação. Estamos convencidos
calamidades e afrontas de que a Áfri- centes à utilização desta zona. de que o melhor caminho para tornar
ca tem sido vítima durante os últimos A desigualdade do sistema eco- efetiva a cooperação é garantir a paz
séculos. O grande desafio é trans- nômico internacional e seu cortejo de e a segurança em nossa região. A
formá-lo numa via, num meio que efeitos perniciosos sobre as econo- Argentina considera que a coopera-
traga a prosperidade e o bem-estar e mias dos países pobres tornam ur- ção bilateral econômica, social e téc-
a dignidade para os países que dele gente o crescimento da cooperação nica, assim como a multilateral, entre
se servem para comunicar, para fazer econômica e social Sul-Sul. Sob este os países da região, é o meio mais
o comércio de idéias e produtos, para ângulo, nossos países deveriam adequado, realista e efetivo de pro-
aproximar culturas, para partilhar re- promover infra-estruturas econômi- mover a cooperação nos setores pre-
cursos, para comungar aspirações e cas dinâmicas e mutuamente vanta- vistos na declaração."
para desfrutar com dignidade os josas, com a criação de indústrias (Pronunciamento do Embaixador J.C.
avanços da civilização humana. complementares e não-concorrentes, Beltramino, da República Argentina)

1988 - Nº 11 3
DESARMAMENTO ll'R \

Cientistas contra a bomba


Depois de terem contribuído para o desenvolvimento da tecnologia que permitiu a fabricação das armas
nucleares, esses homens da ciência perceberam os perigos e se tornaram militantes da causa da paz

aquilo que se eliminou não foi uma me- a fazer lobby pelo interesse público e
Nereida Daudt sa, um3 cadeira ou um telefone?", tem, como nenhuma outra entidade, a
questiona Sto-.e. qualificacão de dar uma perspectiva
científica ao Congresso norte-americano.
o participar da XII Conferêncin Em 1969, a FAS teve um papel muito

A da lpra, lnternational Peace Re-


search Assoc·ation. no Rio de
Janeiro, em agosto último, o cientista
significativo na discussão para persuadir
a opinião pública de que um acordo
com os soviéticos em relação aos Mís-
norte-americano, Jeremy Stone, diretor seis antibalísticos - Ant1-Ball1stic Missi-
da, Federacão Americana de Cientistas- le-ABM - seria preferível a ter que
FAS, uma espécie de consciência critica construir um sistema antimísseis. De-
da sociedade norte-amencana, disse pois em 1972, a FAS formulou a idéia de
que a corrida armamentista já teve seu que nenhuma pessoa, mesmo o presi-
ápice. Ela já tem 42 anos, é o mais lon- dente, deveria ter a autoridade indivi-
go processo de armamento dos dois úl- dual suficiente para utilizar armas nu-
timos séculos, o povo está exausto", cleares numa guerra convencional. Na
sublinhou. ocasião, se propôs que uma comissão
Stone, que esteve em duas oportuni- no Congresso tivesse o poder de veto
dades reunido com Gorbachev consi- sobre a decisão de serem os primeiros a
dera que tanto o líder soviético como o apertar o botão da bomba atômica e,
novo presidente norte-americano - es- mais recentemente, em 1984, o diretor
pecialmente se for Dukakis e até mesmo Jeremy J. Stone .. O povo está exausto" Jeremy Stone recomeçou uma campa-
Bush - irão dar cada vez mais ma or nha nesse sentido.
importância aos acordos. "Os soviéticos Hans Bethe, George Kistiakowsky, Pela primeira vez na história, em
são pobres. pouca gente sabe disso, a Philip Morrison e Victor Weisskopf aju- maio de 76, uma proposta da adminis-
corrida é muito cara, até os norte-ame- daram a construir a primeira bomba tracão Ford de construir um novo bom-
ricanos que são ricos têm problemas fi- atômica participando do "Manhattan bardeiro, o B-1, foi recusada pelo Sena-
nanceiros com relação a ela". Além dis- project". Mas assim que previram as do norte-americano graças a pressões
so. o cientista norte-americano enfati- implicações e perigos da era nuclear se desses cientistas. Dando continuidade
zou a d·minuição de armamentos como uniram em 1945, para fundar a Federa- ao seu trabalho, eles propuseram em
característica do atual período, "esse cão dos Cientistas Americanos-FAS, dezembro de 1978, um método de redu-
processo está no ponto certo para ter- uma organizacâo dedicada ao controle ção paulatina das armas nucleares cha-
minar, está maduro". Por tudo isso, o das armas e ao uso apropriado da ciência. mado Percentage Annual Reduction-
representante da sociedade científica Embora o controle de armas ainda PAR. Seis meses mais tarde, como re-
norte-americana acredita que dentro de seja seu principal objetivo, a FAS tam- sultado do trabalho de conscientização
dez anos vamos estar bem melhores do bém se interessa em questões como o do FAS, esse mecanismo foi secreta-
que agora. desenvolvimento do Terceiro Mundo, mente proposto pelo presidente Jimmy
No entanto, ainda há desafios a ven- os direitos humanos dos cientistas e a Carter a Leonid Brejnev, em Viena. Hoje
cer. Segundo ele, o acordo de INF (ln- política energética. é esse o método de redução preferido
termediate Nuclear Forces) proposto Essa que nasceu como a federacão nos debates sobre o congelamento da
pelos Estados Unidos e rapidamente dos cientistas nucleares e que é a mais corrida armamentista.
aceito pela União Soviética, destruiu o antiga organização dedicada a evitar a Mas também se deve a ela grande
míssel mas não a bomba que se coloca utilização de armas atômicas tem o or- parte do mérito na reaproximação dos
no topo do míssel. E é exatamente essa gulho de possuir entre seus cinco mil Estados Unidos à União Soviética.
uma das principais questões em estudo associados 47 laureados com o prêmio Por mais de uma década a FAS fez
no momento: como destruir as bombas Nobel da Ciência. campanha para que os parlamentares
atómicas sem revelar seus segredos. São inúmeras as realizações da Fe- norte-americanos visitassem a União
"Se os norte-americanos eliminarem deração nos ultimos 50 anos em relação Soviética e os líderes soviéticos fossem
suas bombas, os soviéticos vão querer ao controle de armamentos. Pelo fato aos Estados Unidos. Nesse intercâmbio,
ver, porque senão, quem garante que de não visar lucros, ela está credenciada a federação foi sempre intermediária. •

32 - terceiro mundo
Ilhas Nanshã em disputa .
A tensão aumenta ao sul do mar da China em torno de um arquipélago potencialmente rico em petróleo

Philip Smucker o()


(
..... __... ...'
<,,>
s faixas e bandeiras desfraldadas LAO S ,,..-

A na cidade de Ho Chi Minh (ex-


Sa1gon) evidenciam o crescente
sentimento antichinês dos vietnamitas, r,._
\,
'' \
',
em consequência da disputa pelas ilhas
'V' '
', 1
1
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Nansha e Spratley, localizadas 600km ao
...,...- - - - - - - - - - - - --~
~
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leste da costa do Vietnã.
A tensão se agravou no início deste TAILÂNDIA ',
\
'
f
~-----------
$-----------1
ano, quando a artilharia chinesa alvejou ,' ?
i •VIETNÃ ~
uma embarcação vietnamita que se
./'
- - - - ,l
- -..!
,~v~
\
--------1 ---~---------;
aproximava de uma das ilhas. Setenta e
quatro marinheiros morreram no ata- t-------- t;;i'r-- -- - - - - - - - - - - - - - 1
que e as autoridades denunciaram a \ ~MPUC:~~i
"intimidação chinesa", que impediu o ,. .J
trabalho de resgate. 1
_..,...,
Funcionários chineses salientaram, J .., - ~ - - -- -- - - ILHA THITU-- - - - - - - , , H
por seu lado, que o incidente teve início J F:::;.___ _ _ _ _ __ _ _ __ _ \ _ _ NANSHÃ _ _ 'y-0
depois da chegada de uma equipe de .;.. ~
pesquisadores de seu país às ilhas, para ~
realizar estudos patrocinados pelas Na- r - - - - - -- - - -- - - - - -- --,-- -- «,~
ções Unidas. Ambos os países recla-
mam a soberania sobre o arquipélago
de Nanshã, com mais de 100 ilhas, nu-
a
ma área total de 160 mil quilômetros
quadrados. As ilhas Nanshã, a 600 quilômetros da costa vietnamita, ocupam posição estratégica no Mar da Chma
Um comunicado de imprensa do Mendional e têm riqueza mineral em fosfatos e talvez petróleo. China, Fi//pmas, Malásia e Tailândia
reivindicam o arquipélago
Vietnã, defendendo suas posições, es-
clareceu que as ilhas possuem "grandes interessada nas ilhas, porque decidiu norte-americano Larry Pressler, ao re-
depósitos de guano - rico em fosfato - e converter a ilha de Hainã numa área es- gressar de sua recente viagem a Ho Chi
importantes produtos marinhos, além pecial de desenvolvimento econômico. Minh.
de, possivelmente, possuir jazidas de Além disso, as disputas, que se geraram Na região, teme-se que a disputa
petróleo". Beijing reivindicou a sobera- pelo direito de projetar a extração de pelas ilhas intensifique o conflito na
nia sobre as ilhas Nanshã em várias petróleo no Mar da China Meridional, fronteira sino-vietnamita, onde ocorrem
oportunidades, assim como as Filipinas, poderiam impedir os planos de atrair periódicas trocas de tiros. Os países vi -
a Malásia e a Tailândia. No entanto, a investidores estrangeiros para Hainã, zinhos do Vietnã estão igualmen te
maioria dos observadores considera caso a soberania das ilhas permaneça preocupados pela possibilidade de eclo-
que o Vietnã é o país que tem o direito sem definição. são de um conflito naquela área do Mar
legítimo sobre o arquipélago, já que a Os analistas concordam em que a da China, de grande importância eco-
distância entre as ilhas e a costa vietna- China provocou o último incidente, en- nômica e estratégica.
mita é apenas metade da que as separa viando navios de guerra ao arquipélago As ilhas Nanshã estão no meio de
de Hainã, a província chinesa mais pró- e ordenando o desembarque de tropas importantes rotas marítimas: a ruptura
xima. em duas ilhotas. O Vietnã não respon- da paz nessa região poderia afetar se-
deu militarmente, limitando-se a fazer riamente o intercâmbio comercial
Briga pelo petróleo enérgicos protestos. "Os vietnamitas da maioria dos seis membros da Asso-
estão se unindo por esta causa, pois se ciação de Nações do Sudeste
Suspeita- se que a China está agora sentem ameaçados", disse o senador (Asean).
ÁSIA l'R \ \'S \ SI \I ICA

A estrada inacabada
pais até Teknaf, na fronteira com a Bir-
mânia A maior parte do caminho é es-
treita e tem cinco travessias com barca-
ças, pois o delta do Ganges-Brahmapu-
Guerras e conflitos regionais somam -se à falta cfe algumas pontes para tra está constituído por braços excessi-
impedir a utilização dos 10 mil quilõmetros cfa Rocfovia Transasiatica vamente largos. para que se possa atra-
vessá-los com pontes convencionais
Nos anos 70, o segmento ocidental
Tabibul lslam cfa estrada transasiát1ca teve um movi-
mentado período, durante o qual intré-
picfos turistas europeus em busca de
m dos projetos socio-econõmi- aventuras viaiavam à lnd111 em seus Ji-

U cos mais importantes do conti-


nente asiático, a estrada que une
a Turquia à Indonésia, através de dez
pes Mas a revolução iraniana, a guerra
entre o Irã e o Iraque e o conflito afegão
acabaram paralisando o trânsito
mil quilômetros. está quase terminada,
mas ainda levará tempo até que algum Pot encial turíst ico
veiculo possa percorrê-la.
Duas décadas depois do traçado dos Não são só esses os conflitos que
primeiros planos. as pontes e as vias de ameaçam a inauguração da estrada
acesso. que ainda faltam construir, e os transas1át1ca. Em Bangladesh, por
escombros das guerras ao longo de seu exemplo, a rodovia passa pela zona
percurso mantêm a rodovia intransitá- montanhosa de Ch1ttagong, onde os re-
vel A idéia de abrir a estrada foi incen- beldes chakmas se encontram em esta-
tivada pela Comissão Econômica e So- do de insurreição contra o governo
cial para a As1a e o Pacífico (Escap). um central de Dacca Na Birmânia, o pro-
departamento da ONU com sede em blema não se limita à falta de pontes: a
Bangcoc, Ta1lând1a. maior parte da fronteira oriental com a
Cada um dos Estados cortados pela Tailândia está sob controle de vários
rodovia ficou com o compromisso de grupos rebeldes. em armas contra o re-
realizar o trecho correspondente ao seu gime de Rangun (Ver t erceiro mun-
território com recursos próprios. 'a do, n 107: "A guerra e o ópio").
realidade, trata-se de duas rodovias: Problemas: grandes rios e falta de pontes A rodovia A- 1 passa também pela
a A-1 começa em Bazar-Gan. na fron- belicosa fronteira da Tailândia com o
te ra turco-iraniana, e passa pelo Irã, através da selva, numa cadeia de mon- Campuchea e atravessa este último pais,
Afeganistão, Paquistão. Índia. Bangla- tanhas perpendicular ao Himalaia, "A onde diversas forças rebeldes se en-
desh, Birmânia, Tailândia e Campuchea. estrada está ali. mas ainda vai passar al- frentam com as tropas vietnamitas.
terminando na cidade de Ho Chi Minh gum tempo antes que possamos tran · aliadas ao governo de Phnom Penh, No
ex-Sa1gon). no Vietnã; a A-2 começa sitar por ela com carros e caminhões". entanto, um funcionário do departa-
em Ghasr-1-Xirin, na fronteira iraníano- afirmou um especialista em transportes mento de estradas cie Banglaciesh ob-
raquIana. atravessando o Irã, Paquis- de Bangladesh. A qualidade da rodovia servou que cada um cios paises atraves-
tão. lndia. Nepal. novamente a Índia. difere de país para país e às vezes de sados pela rodovia vai aumentar seus
Bangladesh. Birmânia, Tailândia. Malá- trecho em trecho. Existem desde em- laços com as naçoes vizinhas por onde
sia e Singapura, e se estendendo pelo poeiradas etapas no deserto central do antes·não havia caminhos. expandindo-
ntenor da Indonésia, via estreito de Irã até despenhadeiros do Caminho de se o tráfego comercial e o intercâmbio
Málaca, onde a travessia dos carros se Ouiber, na fronteira afegão-paquistane - turístico. "Nós poderíamos ahrir nossas
fará por barcaças. sa (hoje um lugar famoso. em conse- portas a Birmânia. Isto uniria os dois
quência da crise afegã, por fazer parte países e poderia contrihuir para conso-
"equenos segmentos da rota de abastecimento dos rebeldes lidar a rodovia A-1 " , afirmou.
muçulmanos que combatem o governo Os especialistas reconhecem que a
De acordo com a Escap, 98% da ro- de Cabul). No Nepal. existe uma série estrada transasiát1ca tem enorme po-
dovia estão prontos. mas faltam trechos de estradas de mão única. enquanto. na tencial turístico, como ficou evidenciado
por construir na Birmânia e Nepal, além Indonésia. estão as "superestradas" que na década de setenta, com o intenso
de um pequeno segmento na Índia . cortam as matas tropicais. trânsito entre a Europa e a Índia. "A-
Na Birmânia, falta construir seis im- Um trecho de 1000km da A-1, por gora , tudo o que necessitamos é pa1. O
portantes pontes, enquanto o Nepal terá exemplo, come9a em Bangladesh, na resto, a estrada o fará por s1 só", disse o
que fazer um trecho de 100 quilômetros fronteira com a lndia. e atravessa todo o alto funcion~no. •

34 - terceiro mundo
Sem dúvida,
com toda seguranca.
Conta Azul Remunerada. para_sac.ar ou depositar. parecida com as oucras que estão
Agora, ao intés do seu dinheiro Equanda você resoltier. no men:ado.
fie.ar parado, perdendo minuto No e.aso de retiradas, é so avisar Mas só ela tem uma coisa que CAIXA ECONÔMICA
a minuto, ele vai render.
Dianamente.
Eja a parur do dia da
24 horas antes. Ea m011imentaçao
pode ser feita pessoalmente ou até
por telefone, se preferir.
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a nossa Pátria Grande que há
de ser; e sobretudo de Bolívar-
homem, armado da mais alta VENDAVAL DA
alegria de viver e do mais ca- LIBERDADE
pitoso gozo de amar. Tudo A Luta do Povo pela
isto que faz de Bol!var a figura Abolição
mais pujante, mais romântica De: Edmar Morei
e mais bela de nosso mundo,
aqui está, explêndido. Agarre Neste seu livro, Edmar
este livro com as duas mãos Morei reconstitui o papel de-
e leia, como eu li emociona- sempenhado pelo jangadeiro
do.(DARCY RIBEIRO) Francisco José do Nascimento, NÓS, AS
cognominado o DRAGÃO MULTINACIONAIS E
224pág.
DO MAR, no contexto da luta OS ESTADOS UNIDOS
E-169 Cz$ 3.100,00 De: Samuel de Paula
pela abolição da escravatura
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Com o início do cessar- fogo no sul do território angolano, passou da mesa de negociações para o terreno militar
o plano de paz aprovado nas reuniões quadripartites. Mas, ainda há ceticismo na região

daram em recomendar ao Conselho de O custo estimado da operação da


Micaela Ramada Segurança das Nações Unidas o dia 1'2 ONU é de um bilhão de dólares, num
de novembro como a data para o início momento em que a organização mun-
da implementação da resolução 435 da dial passa por sua pior crise f inanceira,
independência da Namíbia - o

A
ONU, referente à independência da devido aos atrasos nos pagamentos de
~ó górdio das negociações entre Namíbia. alguns dos países-membros. Estados
Africa do Sul, Estados Unidos, Unidos, que sozinho é responsável por
Angola e Cuba, que começaram em Um bilhão de dólares um quarto do orçamento, está devendo
maio deste ano, em Londres - já é qua- às Nações Unidas mais de 400 milhões
se certa. O quase fica por conta das dú- Apesar de estar somente a uma se- de dólares. O secretário-geral Javier
vidas que podem merecer as autorida- mana das eleições norte-americanas, os Pérez de Cuellar - que por sua interven-
des de Pretór,ia em sua anunciada dis- meios diplomáticos estão certos de que ção mediadora no conflito da África
posição de se retirarem do território o calendário prosseguirá normalmente, Austral, na guerra entre Irã e o Iraque e
namibiano, finalmente, após 73 anos de independente do resultado das mesmas. no caso do Saara (ver t erceiro mun-
ocupação Rlilitar ilegal. Mas, o com- A resolução 435 prevê a realização de do n'l 112, "Sahara: A hora da negocia-
promisso está formalmente assumido: o eleições para a escolha de uma Assem- ção") está sendo visto como um forte
acordo de paz foi acertado em Genebra bléia Constituinte na Namíbia, sete me- candidato ao Prêmio Nobel da Paz -
no início de agosto, após várias discus- ses após a início da sua implementação, confia em que o papel decisivo da orga-
sões azedas da comitiva angolana com a sob a supervisão de 7.500 membros das nização mundial na conquista da paz,
delegação sul-africana, que insistia em Nações Unidas. Essa força também de- em tres regiões-chaves do Terceiro
apelar para manobras de última hora, verá supervisionar a retirada gradual Mundo, poderá ajudar a criar uma cons-
que por pouco não levam por água das tropas sul-africanas, infiltradas, se- ciência nos países que estão em atraso
abaixo os avanços, pacientemente cos- gundo informações militares, num raio com suas contribuições, para que atuali-
turados nas sucessivas rodadas de ne- de 300 quilômetros de território ango- zem os seus pagamentos.
gociação mediadas pela ONU. lano. O analista militar Helmut Romer
O cessar-fogo no Heitman, corres -
sul de Angola en- pondente da revista
trou em vigor a 8 de especializada Janés
agosto, após o Defense Weekly,
acordo a que se afama que 1.500
chegou em Gene- 1 soldados sul-africa-
bra. Sob os termos nos ainda estão ba-
dessa trégua, a seados perto de
África do Sul com- Cuito Cuanavale.
prometeu-se a re- Segundo ele, o
tirar todas as suas problema que ainda
tropas estacionadas resta resolver é a
em Angola, a partir retirada da artilha-
de 1'2 de setembro, ria sul-africana do
enquanto os gover - território angolano,
nos de Luanda e composta pelos ca-
Havana elaboram nhões G-5. Durante
um calendário oito meses, Cuito
aceitável para todas Cuanavale foi alvo
as partes - para a de bombardeios
retirada das forças por esses canhões
cubanas do territó- de longo alcance.
rio angolano. As Pelo acordo assina-
delegações concor - O chanceler Van Dunem (sem óculos) falou por Angola nas diversas negociações do, a saída militar

1988-N!l 113 terceiro mundo - 39


ÁFRICA 1\1-'R!C,\ HSrR \ l

sul-africana deverá ser completada até


setembro.
As cinco principais forcas que se en-
NAMÍBIA
frentam há 13 anos no sul de Angola (a
Unita e a África do Sul, Angola e Cuba,
e a Swapo, que combate pela indepen-
dêncõa da Namíbia, tendo iniciado em •
Windhoek
1966 operações guerrilheiras no territó-
rio ocupado ilegalmente por Pretória)
possuem na região mais de 100 mil ho-
mems em armas, segundo fontes oci-
dentais.

País desértico e rico Sam Nuioma. a luta da Swapo


será a de organizar um novo
país, integrando as massas
A Namíbia, que recebeu este nome a negras
partir de 1968 antes era chamada de
África do Sudoeste), tem dois milhões que não é necessária muita coisa, para da correlação de forças no terreno levou
de habitantes, entre eles cem mil bran- que os acordos não se cumpram e tudo a África do Sul a ter que negociar. Por
cos de or"gem alemã, e é um país em se transforme numa grande frustração". isso, aceitou o encontro de Londres e,
grande parte desértico, com excepcio- Em 1985, a África do Sul impôs na mais tarde, o encontro quadripartite do
1aIs riquezas minerais, como diaman- Namíbia o atua governo interino, que Cairo."
tes, cobre e chumbo, além de metais teme eleições lh,res, que poderiam levar O chefe de Estado angolano reiterou
estretégicos para a indústria bérca e a Swapo ao governo do território. Du- que a paz no sudoeste da África só será
eletrônica: urânio, germânio selênio. rante a realizacão das conversações de possível com a efetiva implementação
Com a maior mina de urânio do mundo, Genebra, quatro dos ministros do go- da resolução 435 da ONU, sobre a inde-
a de Rossinq, a Namíbia é o (luarto pro- verno interino da Namíbia viajaram a pendência da Namíbia; a cessação de
Pretória e se entre- todo o tipo de ajuda à Unita e dos atos
vistaram com o de agressão da África do Sul contra An-
presidente P.W. gola. E reafirmou que "Angola e Cuba
Botha, o qual lhes só aceitarão um calendário para a saída
assegurou que a das tropas cubanas, quando forem re-
África do Sul 'não movidas as causas que motivaram a sua
venderá seus inte- presença em Angola, ou seja as siste-
resses nas atuais máticas agressões sul-africanas e a utili-
negociações". To- zação do território ilegalmente ocupado
dos eles expressa- da Namíbia, como base das agressões
W indhoek, Namíbia: a fila de ônibus só para negros ram a sua oposição contra Angola".
à resolução 435 da Os próximos dias serão determinan-
dutor mundial do metal. ONU, com a qual a delegação sul-afri- tes do futuro da África Austral. Se em
Foram justamente tais riquezas, so- cana acabou concordando dias depois, setembro, efetivamente, a retirada das
madas ao alto valor estratégico do seu apesar das promessas de Botha aos tropas sul-africanas das províncias me-
porto de águas profundas de Walvis Bay seus aliados namibianos. ridionais de Angola se tiver concretiza-
- o mais importante de todo o Atlântico do, o cronograma previsto na resolução
Sul africano - que atraiu a cobiça de A desvantagem de Pretória 435/78 da ONU poderá ser cumprido,
Pretória. Por isso, alguns dirigentes da implementando-se os passos prévios
Organização do Povo do Sudoeste Afri- O presidente de Angola, José Eduar- à independência da Namíbia, o que po-
cano-Swapo, o movimento de liberta- do dos Santos, afirmou em entrevista a derá vir a se concretizar ano que vem. E,
cão da Namíbia, ainda estão céticos, uma publicação portuguesa, no dia se- seguramente, os governos de Cuba e
quanto às verdadeiras intenções de guinte ao anúncio dos acordos obtidos Angola apresentarão, para dar continui-
Pretória. "Se a África do Sul está sendo em Genebra, que "foram as derrotas dade aos acordos, um calendário esti-
sincera, então podemos alimentar as sul-africanas em Cuito Cuanavale e o pulando a saída das tropas cubanas do
maiores esperanças dos últimos dez reforço das tropas cubanas que estive- território angolano. Caso contrário, tudo
anos de que a independência do nosso ram na base da mudança radica-!, verifi- pode voltar à estaca zero. Mais uma vez,
país está próxima", assinalou um dos cada na correlação de forças a favor da a responsabilidade do avanço ou frus-
dirigentes da organização. "Mas, sabe- República Popular de Angola". E agre- tração no rumo da paz depende de
mos por experiência - acrescentou - gou: "Pensamos que essa modificação Pretória. •

40 - terceiro mundo
ÁFRICA ANGOl,A - BRASIi.

Ampliam coo per ação considerado pelos dois países como


inesgotável, principalmente em setores
como a agricultura, indústria alimentar,
construção civil, educacão e outros. An-
Trocas de produtos, créditos e oportunidades de investimentos são as gola está particularmente interessada
bases de maior aproximação comercial entre os dois países em absorver tecnologias brasileiras
adaptadas às condicões tropicais.
O previsível desenvolvimento das
João Melo
relações de cooperacão entre os dois
países assenta em profundas afinidades
culturais, herdadas do passado, e na
ngola e Brasil vão estudar um

A
cordialidade das relacões políticas pre-
proieto de cooperacão a médio e sentes. Países situados praticamente em
longo prazos, com o objetivo de frente um ao outro, de cada lado do
se incrementar a participacélo brasileira Atlântico Sul, Angola e Brasil tem inte-
nos programas de desenvolvimento da resse comum em criar na região
economiél angolana. O anúncio dessa clima de paz e desenvolvimento.
decisão foi feito em Brasília pelo minis-
tro angolélno Pedro de Castro Vari-Du- Pedro Van-D unem cooperacao avancacla Coincidência de interesses
nem, que esteve no Brasil por dois dias,
no início de Julho. Ambos os governos, embora com
Van-Dunem, ministro para o setor regimes políticos diferentes, são unâni-
produtivo, assistiu à assinatura do acor- mes em considerar o sistema do "a-
do de fornecimento de petróleo (20 mil partheid" da África do Sul como uma
barris/ dia) de Angola ao Brasil. Na das fontes de tensão. O Brasil tem clara·
mesma ocasião, foi assinado convênio posição de repúdio ao regime de_segre-
sobre a rolagem da parte principal da gação racial sul-africano, assim como
dívida angolana (63,5 milhões de dóla- aos constantes ataques de Pretória
res) e outros sobre a concessão de no- contra os Estados vizinhos, em especial
vos créditos brasileiros, no total de 235 Angola.
milhões de dólares (75 milhões, de curto Flecha de lima. potencial inesgotável Além das motivações históricas e po-
prazo, para bens de consumo, 60 mi- líticas, há razões econômicas na base do
lhões, de médio prazo, para máquinas e do Brasil de desempenhar um papel incremento das relações angolano-bra-
equipamentos, e 100 milhões a longo mais ativo, ainda que indireto, nas con- sileiras. Angola, cujos filhos, trazidos
prazo, para a barragem de Capanda, versações de paz do sudoeste africano, como escravos, contribuíram para o de-
que está sendo feita pela construtora bem como a vontade política do gover- senvolvimento do Brasil, quer agora
Norberto Odebrecht). Angola pagou ao no e dos empresários brasileiros de beneficiar-se desse desenvolvimento,
Brasil, referentes a estes acordos, 53,7 contribuírem para o desenvolvimento objetivando tornar-se um país à altura
milhões de dólares de juros e dos em- econômico do país impressionaram o da vastidão de seus recursos naturais.
préstimos a curto prazo, que venciam ministro angolano. De seu lado, o Brasil sabe da importân-
este ano. cia de Angola na África Austral, a região
Na capital brasileira, o ministrCJ an- Aprofundando a parceria mais rica do continente.
golano foi recebido pelo presidente da Mesmo sob um ponto de vista ime-
República interino, Ulysses Guimarães, "Criamos as condições para entrar diatista, o Brasil tem bons motivos para
que transmitiu a disposição do Brasil de em nova fase, mais avançada, da nossa apostar no relacionamento com Angola.
servir de local para as conversações so- cooperação", declarou Van-Dunem. Como assinalou o comunicado conjunto
bre a paz no sudoeste africano. O pro- Chamado pelo ministro brasileiro das divulgado depois do encontro entre Pe-
grama angolano-brasileiro de coopera- Relações Exteriores em exercício, Flecha dro Van-Dunem e Flecha de Lima, An-
ção de médio e longo prazos, disse Pe- de Lima, de "arquiteto das relações en- gola tem saldado os seus compromissos
dro Van-Dunem, deverá ficar pronto tre Brasil e Angola", o ministro angola- pontualmente.
antes da visita do presidente José Sar- no acha que os brasileiros têm tudo Produzindo 450 mil barris de petró-
ney a Angola, talvez em outubro. Em para serem os principais parceiros de leo e consumindo apenas 150 mil, o
setembro, terá lugar em Luanda um seu país. país, embora enfrente as agressões sul-
seminário com empresários brasileiros, Atualmente, o Brasil é o terceiro par- africanas, "é um risco aceitável", nas
para analisar as perspectivas de inves- ceiro comercial de Angola, depois dos palavras de Júlio Oshiro, gerente de fi-
timentos em Angola. Estados Unidos e de Portugal. Mas, o nanciamento da Cacex, citado pela im-
Os acertos financeiros, a disposição potencial de cooperação existente é prensa econômica. o

1988 - N'.? 113 terceiro mundo - 41


ÁFRICA \ \(,OI.A

Pinho esclarece que "em cada empresa

Um sindicalismo do pais existe um Conselho de Direção.


Esse conselho apóia-se em assembléias
de produção, para traçar os programas

participativo a nlvel de base". Quer dizer: o movi-


mento sindical participa, desde a base
até os órgãos superiores, da elaboração
dos planos do governo. "Isto contribui,
Dirigentes da Unta traçam um panorama do movimento sindical angolano, também, para o sucesso dos planos e
enfatizando que no seu pars os trabalhadores estão no governo para o alto grau de enga1amento que
mostram os trabalhadores".
Um representante da comissão sindi-
cal, ou um trabalhador indicado por
seus companheiros, port1cipa do con-
selho de direção da empresa. Ele tem,
entre outras prerrogativas, a do d scut1r
o plano do prodt1ção, em termos coleti-
vos, com todos os trabalhadores. "A-
gora mesmo, com a implantação do
nosso programa de Saneamento Eco-
nõm1co-Finapceiro-SEF (ver terceiro
mundo nº 108, entrevista de Roberto de
Almeida) algumas medidas de caráter
organizativo estão sendo tomadas e
Agostinho Pinho: governo do trabalhador Castelo Branco: debate das pol!tic s
nelas colaboram os trabalhadores.
balhadores Angolanos e o Movimento Acatamos o programa e trabalhamos
Lenin Novaes de libertação de Angola/Partido do para sua execução. E ainda existe a par-
Trabalho são bastante estreitas, embora ticipação dos trabalhadores na elabora-
a Unta, enquanto organização de mas- ção dos planos de cada empresa. Na
rês diretores da União Nacional sas, não se1a urna peça do Partido". O própria reformulação das leis da nova

T dos Trabalhadores Angolanos-


Unta participaram em São Paulo
do encontro com lideranças da Central
número de integrantes da Unta no Par-
tido é ainda reduzido: somos 600 mil
trabalhadores e só uma minoria é mili-
etapa econômica, levou-se em conta o
ponto de vista sindical".

Umca dos Trabalhadores-CUT. Depois, tante do Partido. "Mas, trabalhamos em Cada setor, uma voz
AgoSlmho de Almeida Pinho, membro con1unto", assinala Pinho. E cita um
do secretariado-geral do Conselho exemplo: quando não há célula do Par- Em Angola, a organização da central
Central da União e secretário para Ad- tido no local de trabalho - hoJe em dia sindical é um pouco diferente da do
ministração e Finanças: N'zinga May são poucas as empresas que apresen- Brasil. A organização da Unta está ba-
Ekodi, diretor do Departamento Nacio- tam esse quadro -. a própria comissão seada nas representações trabalhistas
nal de Organização Sindical, e Camilo sindical explica aos trabalhadores o de cada área de produção. O movi-
Castelo Branco, chefe da Seção das programa do Partido e as metas que ele mento sindical (portanto a Unta), tem
Américas e Canadá, no Departamento pretende atingir. dez sindicatos que correspondem a dez
de Relações Internacionais da central "Em Angola, torna-se absurdo foca- ramos de atividades, explica Agostinho
smd cal, seguiram para o Uruguai. lizar a atividade sindical como instru- Pinho. Cada um tem representante no
Na redação de terceiro mundo, os mento reivindicativo, de pressão sobre órgão máximo do movimento sindical,
três dirigentes da Unta falaram sobre a o governo. O trabalhador não vai plei- no intervalo entre dois congressos dos
participação dos trabalhadores angola- tear para si próprio. Nossa ação sindical trabalhadores.
nos no programa de desenvolvimento é, pelo contrário, participativa. Os tra- A Constituição garante aos trabalha-
do país e sobre as relações do movi- balhadores engajam-se no programa do dores o direito de organização e de gre-
mento sindical com o Movimento Po- governo para ajudar a sua realização. Se ve que está regulamentado pela Lei
pular de libertação de Angola- as metas forem atingidas, o benefício é Sindical. Essa lei está sendo revisada,
MPLA/Partido do Trabalho. para toda a sociedade angolana". pois data do tempo do governo de tran-
"Quem está no poder em Angola são sição, anterior à independência. "De
os trabalhadores. Nosso governo é dos Debatendo a economia fato - assinala Pinho - o direito de gre-
trabalhadores", define Ago·stmho Pinho. ve existe, mas em Angola é muito difícil
Segundo o dirigente sindical, "as rela- Quanto à participação do operariado que uma greve venha a acontecer. Co-
ções entre a União Nacional dos Tra- na orientação da economia, Agostinho mo nós, trabalhadores, estamos de fato

42 - terceiro mundo
ÁFRICA

no poder, a possibilidade de greve po-


derá surgir, mas, nesse caso, significaria
a retirada do voto de confiança no go-
verno. No entanto - acrescenta o diri-
gente sindical - por não existirem con-
tradições antagônicas entre os trabalha-
dores e o governo, como no Brasil, pro-
vavelmente nunca a greve será utilizada
como forma de pressão".
Agostinho Pinho lembra que o tra-
balhador de Angola participa de todos
os níveis da política do país, tendo re- Angola depende da paz para dinamizar seu desenvolvi menta econômico e soei ai
presentação garantida tanto na direção
das empresas, quanto nas assembléias ou não do Partido, participa do movi- governo racista da África do Sul, o lazer
populares provinciais e na Assembléia mento sindical. Quando existem pontos não está nos planos prioritários do go-
do Povo, o parlamento. de vista divergentes, o problema é sem- verno. De rest o, os traba lhadores têm
"Tudo é discutido com a nossa parti- pre discutido e a decisão majoritária é todos os direitos sociais garantidos:
cipação. Na Assembléia do Povo, a Unta acatada". existem bons centros m édicos dentro
participa com 15 representantes, num das empresas, com medicina g ratuita,
total de 120 membros", assinala. "Mas, Garantia de emprego aliás, como o é para toda a população
além desses 15 que estão lá enquanto angolana, e a educação também é gra-
membros da direçâo da Unta, há no A demissão de um trabalhador em tuita em todos os níveis, em todo o
nosso Legislativo muitos outros repre- Angola "é uma coisa complicada", nas país".
sentantes dos trabalhadores, escolhidos palavras de Agostinho Pinho, pois a Lei
através de outros meios". do Trabalho estabelece uma série pro- Comunicação
gressiva de sanções a possíveis atos de
Objetivos infração e só em casos de faltas muito "A Voz dos Trabalhadores" é o ór-
graves se prevê a destit uição do cargo. gão oficial da Unta, no qual se refl etem
Os dirigentes explicam que a ~eta "A demissão nunca chega a ser con- todas as questões políticas, sociais e re-
prioritária da Unta nesse momento é sumada, em virtude da graduação de creativas dos filiados. Por outro lado, os
contribuir para o sucesso do plano de sanções. As infrações graves têm seu trabalhadores têm duas horas na pro-
Saneamento Econômico-Financeiro. encaminhamento judicial e, a partir daí, gramação matinal da Rádio Nacional de
' "Esse plano tem como objetivo último o o trabalhador, punido ou não pela just i- Angola. Nesse programa, t ransmitido
trabalhador", disse. "Nós estamos por ça, passa por um processo de reeduca- para todo o país e elaborado pela Unta,
todas as formas, apoiando a sua execu- ção, no final do qual retorna ao seu em- os trabalhadores são informados do de-
ção. Estamos na fase de esclarecimento prego. Nunca, em função de qualquer senvolvimento da atividade sindical,
e mobilização de apoio ao plano". infração, o trabalhador é demitido", ex- através de entrevistas nos locais de t ra -
Agostinho Pinho relata que o proces- plica Agostinho Pinho. balho, o que lhes permite o conheci-
so de discussão do SEF inclui uma reu- Em Angola, o governo sempre se mento do panorama do estado funcio-
nião mensal da Unta, para balanço das preocupou em não estabelecer grandes nal de cada uma das empresas.
atividades desenvolvidas. Nessas as- desníveis salariais. Por isso, o salário Os efeitos da guerra sobre a vida do
sembléias, surgem críticas, que são máximo não ultrapassa sete vezes o mí- trabalhador angolano são intensos, se -
aproveitadas para correção dos erros no nimo. O salário-mínimo, segundo re- gundo Agostinho Pinho, principalmente
encaminhamento do plano e educação vela, é de cinco mil kwanzas (cerca de nas áreas onde ocorrem combates. Em
daqueles que possam não se ter dedica- 150 dólares), enquanto o maior salário função dessa situação, foram criados
do o suficiente em prol do objetivo co- do país é de 35 mil kwanzas. A política batalhões de autodefesa em cada em -
letivo. Em termos formação política e salarial é centralizada, com uma escala presa, para garantir a segurança das ati-
ideológica dos trabalhadores, a Unta de remuneração única no país, fixando- vidades, segundo esclarece o sindica -
realiza cursos e seminários na Escola de se os diversos níveis salariais por cate- lista.
Formação Sindical, por onde passa a goria ocupacional. "Nós aguardamos que haja a possi-
maioria dos quadros dirigentes, quer da Outro fator importante, o lazer do bilidade, nas próximas negociações en-
base, quer da direção da Unta. Pinho trabalhador, ainda não está estruturado tre Angola e Cuba, por um lado, e África
destaca, ainda, que a participação do na medida desejável. "Carecemos - do Sul e Estados Unidos, pelo outro, de
trabalhador no movimento sindical se aponta o sindicalista - de infra-estrutura se alcançar o desfecho da guerra. Os
faz em função da sua condição de assa- adequada e, pela situação da nossa eco- trabalhadores angolanos aguar dam
lariado e não envolve S.LÍas posições nomia, que atravessa um momento difí- melhores dias", conclui Agqstinho Pi -
ideológicas. Todo trabalhador, membro cil em consequência da guerra com o nho. •

t erceiro mundo - 43
CULTURA 1

Relatos de um protagonista
chamam os cnchomnhos ', d11 C, be1as
Incentivado pela enorme repercussão do primeiro livro. o dirigente 'Não tem nome Tenho vários proIetos
sandinista Omar Cabezas conclui sua segunda obra mas nao me dec1cf1 Porque tem que re-
fletir o que aconteceu .. E às vezes me
soam tão mnl os t1tulos. que não en
Serg,o Ferran contro qual escolher No entanto, ao fi-
nal o tltulo terá ll ver com Cts coisas"
O hvro foi feito comhinnnrfo as gra-
Ivro testemunhal "A montanha vações - como no pnme1ro, com partes

O é mais que uma imensa estepC'


ve•cfe", escrito "no gravador'
o comandante guerrilheiro Cmar
escritas cm um computador "A monta-
nha " foi gravado em cerca de 18 horas
rfe trabalho Este saiu em 20 cf,as
bC'1as. ao rememorar algumas de Tinhn 35 laudas escritas Em seis
su s mais impactantes e penenc,as no anos hav,a elaborado só isso - relembra
mb te antI-somozIsta até 1975 cau Om r Cahezas Por falta de cf1sc1pt1na -
ou sensaçao no inicio desta década O porque não sou escritor - pelo trabalho
remio Casa das Améncas-1982 o lan a guerra, a d sphscênc1a Até que um
, como um sucesso. pois foi ed tado dia, com tanta pressao rias pessoas so-
bre o livro, aproveIteI umas férias e me
convenci de que nao porf a voltar sem o
livro terminado Me fechei numa casa
Capa da edicão brasileira do livro de Omar em X1loa - recanto turistIco a uns 15km
Cabezas, publicada pelos Cadernos o mais de Manágua - sem telefone, e voltei de
dramático da primeira fase da luta
lá com 415 laudas de espaço um Nesses
s1ve me fazerem sugestoes • 20 dias, fiz uma espécie rfe fábrica, bus-
O ·velho · guernlhe,ro, apesar de quei um computador, e como nao o sei
seus escassos 38 anos - dos quais vinte usar, me auxiliou uma companheira,
viveu cm funçao da m1htânc1a sand1n1sta que é muito eficiente Combinei três
- ocupou, desde a vitória até a atuahda- métodos um. o gravador (quer dizer,
de, um sem número de responsab1hda- gravando e passando para o computa-
des no Estado, no partido e agora tra- dor), o outro, ditando para a compa-
balha como coordenador nacional dos nheira e ela batendo a mâquina o ter-
Comitês de Defesa Sandinista (CDS) ceiro, escrevenc1o Uma irmã, que tam
Este novo pegue (trabalho, na gma bém estava de fénas ali - estuc1a fora do
nicaraguensel à frente dos CDS - que país - e que tem a virtude de entender
são as organizações de vizinhança no minha letra, ditava, para que a compa-
país e. portanto. as estruturas populares nheira passasse ao computador O
Cal>ezas o escritor que nasceu da reflexao
pollt ica nos intervalos das batalhas mais amplas e d1fund1das na Nicarágua computador me facilitou a correçao e as
pós-Somo1a - está mudando seu ritmo cópias"
desde então, 60 vezes em 25 países e 13 de vida "Não tenho noite nem fim cfe
d1omas diferentes semana lrvre, e estou pensando como A revolucao e os partidos
"O que fiz foi unir várias gravacões e fazer, para não fundir em seis meses",
mandá-las ao concurso Ganhei o prê- diz ele, em sua linguagem direta Nesse segundo livro, Cahe1as aborcfa
mio Casa das Américas e me f11 escritor O primeiro lrvro foi concluícfo em o tema cfa relação cfa Frente Sanóinista
sem saber", confessa Omar Cabezas. 1975. O que está sendo lançado é uma com os partidos políticos.
continuacão. Narra nele o triunfo cfa re- "Buscamos os part,cfos politicos cfes·
M em órias revolucionárias volução sandínista e, no último pará- cfe 1969, com o objetivo cfe derrotar ll
grafo, salta cfe 20 cfe Julho de 1979, a óitarfura somozista. De maneira efetiva
"Se tudo correr bem e não houver entrada na Praca da Revoluçao. até porém, somente os encontramos .. trés
mais cortes de eletricidade - d11. ironi - 1984 É a contI:1uaçao cfo primeiro, mas meses antes do fim na ditarfura Du-
zando a real dade atual de seu país - está feito de forma tal, que o leitor pode rante 17 anos, a Frente Sandinista de
espero que o segundo livro saia no se - compreendê - lo sem ter lido o anterior Libertação Nnc1onal - FSLN esteve sõ,
gundo semestre deste ano. Alguns ami- "Até agora o livro se intitula "Psch- sofrendo as mortes. as prisões. Os mi-
gos estão fazendo a revisão, para inclu - chch ..." , que é a forma com que se litantes elos partidos tracf1c1ona1s, en-

44 - terceiro mundo
CULTURA 1 1 \ \/ \ \/)(1/:

A universidade popular
Em meio à guerra civil que lhe encolhe o orçamento, a principal
casa ~e estudos superiores salvadorenha implanta uma reforma

A/do Gamboa

universidade estatal salvadore-

A nha, que completa 148 anos - foi


criada em 1841 - possui oito fa-
culdades, onde se cursam 65 disciplinas.
Na vigilância, o empenho da mundança apresentadas por 1.500 docentes.
Atualmente, depois das intervenções
tretanto, estavam fazendo negócios, que sofreu em anos anteriores. está re-
mantinham seus filhos no estrangeiro. cuperando o número de estudantes: em
Enquanto nós passávamos fome, eles Junho, recebeu 10 mil novos alunos e
estavam de férias em Miami. É uma com isso alcança um corpo discente de Argueta: decisiva acão da universidade
falta de ética política, depois de supli- 40 mil jovens. Deve-se assinalar que frentando uma das piores crises. Toda a
carmos todos esses anos que nos unís- 78% desse total vêm de origem popular, edocação recebe aproximadamente 14%
semos contra a ditadura, enquanto nos de famílias operárias e camponesas. do orçamento estatal, do qual 1,6% é
davam as costas, virem agora reclamar Essa composição determinou, histo- para a UES. As autoridades universitá-
uma quota do poder que não têm. As ricamente, na opinião do reitor Luis Ar- rias reivindicam 5%, o mesmo percen -
quotas do poder são produtos de pro- gueta Ant1llón, que a universidade opte tua! que estão recebendo outras univer-
cessos reais e obJetivos", assinala o co- pelos interesses das grandes maiorias, sidades centro-americanas. Antes da
mandante sandinista. "sem descuidar, entretanto, dos interes- guerra, a educação recebia 30% do or-
"Bendigo a hora - continua - em que ses da minoria". Foi essa característica o _,çamento.
Carlos Fonseca e os demais compa- motivo da confrontação entre universi-
nheiros fundaram a FSLN. Se não hou- dade e governo. "Quando teve início o Mudança curricu lar
vesse a Frente Sandinista, mas apenas conflito armado, em 1980 - relembra
aqueles partidos, tanto da direita como Argueta - as universidades enfrentaram Apesar do momento não ser o mais
da esquerda, carentes de imaginação, uma repressão cada vez maior, não so- propício, a Universidade de EI Salvador
Somoza teria mais quatro gerações no mente através de restrições orçamentá- está empenhada numa radical mudança
poder. Não tinham imaginação. Eram rias, mas com uma intervenção militar curricular. "A universidade estagnou em
1
partidos fossilizados, de panelinhas. E em 1980, que se prolongou até 1984". função das intervenções", explica o rei-
seguem igualzinho: não têm dialética os Hoje, quatro anos depois, o estran- tor. Constatou-se que os currículos ti-
partidos daqui. Não evoluíram. Estacio- gulamento financeiro persiste e obriga a nham pouca relação com a realidade. O
naram várias décadas atrás", define Ca- universidade a desempenhar exclusi- perfil dos profissionais não correspon-
bezas. vamente as funções que lhe assegurem dia às necessidades do país. A partir da
O guerrilheiro-escritor sabe porque a sobrevivência. "A repressão contra as implantação do novo sistema, os estu-
fala assim. Três irmãos e seu pai foram universidades também continua", com- dantes passarão um período em aulas,
mortos pela guarda da ditadura somo- plementa o reitor. Nesse sentido, assi- para em seguida irem para a comunida-
zista. "A guarda acabou com a metade nala, houve rumores em maio de que se de, a servir de acordo com o nível alcan-
da minha família. Se a revolução de- interviria novamente na universidade. çado nas classes. Assim, poderão co-
mora um pouco mais, acabaria toda a Segundo ele, o governo estava preocu- nhecer a realidade e trazer informação
família, incluindo-me a mim. O coman- pado com a crise política e pretendia às aulas e laboratórios. Essa informa-
dante Humberto Ortega descreveu essa criar uma cortina de fumaçà. "A opção ção, processada, voltará aos alunos,
situação com uma frase exata: "É como que escolheu foi a intervenção na uni- tanto na docência, como em contato
engolir sapos. Mas, se tivermos de en- versidade, devido a seu papel de cons- com a sociedade.
goli-los pela libertação deste país e para ciência crítica no contexto da realidade Durante sua recente viagem à Améri-
que a paz venha e se acabe o martírio salvadorenha". ca do Sul, o reitor Argueta firmou con-
do nosso povo, eu estaria disposto a fa- Em EI Salvador, a guerra consome vênios com as universidades do Uru-
zê-lo quantas vezes forem necessárias", 60% do orçamento e, por isso, o ensino guai, Campinas e São Paulo. •
afirma o comandante. • e outros serviços públicos estão en- Foto 4: Valter Santos

1988 - Nº 113 terceiro mundo - 45


CULTURA l:(,/1 o

A vitrine da história
O governo egípcio usa alta tecnologia para
Oriente Méd o, ao encontro das c1v1llza-
çocs eg1pcIa e helênira. ao nascimento
do cnstmnismo, ti influônc1n do lslfi, etc
Um setor especial estnrá destinado
reconstruir a biblioteca de Alexandria ao papel das c1ônc1ns na ant1gu1r1ade
Essa base de dados será nberta aos
s recursos tecnológicos mais pesquisadores do mundo inteiro, graças

O modernos de documentação, de
banco de dados e da informação
rao utilizados na reconstruçao da
mera biblioteca universal de Alexan-
a uma rede regional de serviços Ao
mesmo tempo, a biblioteca estará co-
nectadn aos centros e banros de dados
de todo o mundo cuias fontes de in-
r a por decisão do governo do Egito formaç o perm1trrão enriquecer seus
O novo centro documental, de 42 m 1 arquivos de computação. diariamente
met ros quadrados, será uma v1trine da No in cio do século XXI. o volume
tór e da cultura das c1v1llza oes fu hter rio deverá alcançar os oito milhões
t ras a imagem de sua congenere de de exemplares A maioria deles serll
o s rT' 1anos atrás tratada e armazenada cm sIstemns m
A biblioteca da antiguidade - a pri- formât1cos. como. por exemplo, os dis-
e ra biblioteca universal da história cos óucos numéricos (DON), capazes de
- fo construida no nic10 do século IV conter o equivalente a uma enciclopédia
ntes de Cristo, para "conservar os es- de vinte e cinco volumes A b blloteca
tas de todas as nações , e ao mesmo Alexandria riqueza cultural milenar con1ugarâ o papel a informática e o m1-
tempo para acolher os cientistas, flló- crof1lme. ainda que a busca das obras e
ofos e artistas do mundo mediterrâ- ram a pnmeIra pedra do futuro monu- os dados, assim como a escritura, se
neo Em pouco tempo, conseguiu obter mento arquitetônico em fins de 1unho. realizará quase exclusivamente por
pelo menos uma cópia de todas as O prédio vai estar concluído em 1995 raios laser Um pesqu1sacior ou um lei-
obras escritas em grego e traduções dos e poderá abrigar cerca de duas mil e tor poderá obter rapidamente o que
mais importantes manuscritos em ou- quinhentas pessoas publico, pesquisa- buscam. consultando as fichas digitadas
tras hnguas dores e c1entrstas de todo o mundo. em através de um terminal, e reproduzir em
Os barcos que transitavam pelo ótimas cond1çoes. Ao mesmo tempo, discos a obra selecionada. Poderá tam-
ort.o de Alexandria estavam obrigados permitirá a restauração e consulta de bém v1suahzar o documento de referên-
emprestar seus rolos de papiro ma- manuscritos originais medievais. amea- cia, em tela de alta qualidade, e repro-
nuscrito, para que os conservadores da çados de destruição duzi-lo em papel com impressor ele-
b blloteca pudessem copiá-los. Assim. Com a finalidade de elaborar desde trofotográfico. O custo total do amh1c10-
no ano 50 a C., contavam-se cerca de Já um fundo editorial, as autoridades so proJeto é de 170 milhões de dólares,
532.800 manuscritos, class1f1cados e egípcias fizeram um chamamento, no financiados pelo Programa das Naçoes
conservados segundo métodos muito começo deste ano, a todos os editores Unidas para o Desenvolvimento (Pnud)
avançados para a época Entre eles se do mundo. para que enviem ao Conse- A Unesco lançou um apelo interna-
ncontrava o "Pinakes de Callamachus", lho Nacional Superior da Biblioteca de cional em 22 de outubro de 1987, com o
um catálogo que apresentava títulos dos Alexandria dois exemplares de cada obJetivo de a1udar as autonciades egíp-
livros, com seus respectivos autores e uma de suas obras artísticas e científi- cias a obterem os fundos necessários,
incluía a análise de cada texto. Este pro- cas. ao mesmo tempo que empreendeu um
cedimento deu origem às fichas exis- estudo de viabilidade. Um concurso tn·
tentes ho1e em dia nas bibliotecas de Modernos sistemas de teletransmissão ternacional de arquitetura, por um
todo o mundo. Dois graves incêndios. montante de 500 mil dólares, será lan-
nos séculos Ili e IV d.C., destruíram essa No futuro, os editores poderão en- çado pela agência, Junto com a União
importante obra helênica. Salvaram-se viar os originais diretamente por tele- Internacional de Arquitetos. e financia-
apenas alguns expoentes. graças a tra- transmissão e de um computador a ou- do pelo Programa das Naçoes Unidas
duções feitas por poliglotas árabes tro, graças aos modernos sistemas de para o Desenvolvimento (Pnud).
telecomunicações previstos no pro1eto. O renascimento da ancestral bibliote-
A nova bibliot eca O complexo documental terá gestão ca perm1t1rá ao mundo clássico e con-
completamente informatr1ada e seus temporâneo deixarem seus rastros na
O presidente da República Árabe do catálogos serão progressivamente aces- "memória viva dos computadores", ao
Egito, Hosni Mubarak, e o diretor geral síveis, através de sistemas multidirecio- mesmo nível que a Livraria do Museu
da Organização das Naçoes Unidas para nais de telecomunicação. Um banco de Britânico, a Biblioteca Nacional France-
a Educação, a Ciência e a Cultura (Unes - dados armazenará e tratará as informa- sa ou a Livraria do Congresso America-
co), Federico Mayor Zaragoza, coloca - ções relativas à Grécia antiga e ao no, dos Estados Unidos. •

46 - terceiro mundo
O que fará o Brasil em S eul
São 167 atletas brasileiros e poucas chan-
ces de medalhas
O PODER p.48

POLÍTICO Promoções, a muleta dos comerciantes


O reajuste frequen te de preços afugenta o
DO NARCOTRÁFICO consumidor
o.53
esde que os fenícios aprenderam - não se sabe com quem - a

D penetrar os portos de todo o mundo conhecido, vendendo e


comprando (até tomando, se o caso se complicasse) para vender
adiante, fazendo inesquecível essa lição comercial, passou a ser mal vist o
Julho
Panorama do mês
p.58
todo aquele que pusesse na água sua barcaça e tentasse, da mesma fo rma,
tornar-se uma força econômica. Muita guerra houve, muita guerra há. Empresariado assume o nacionalismo
Hoje, chamam de retaliação. São doutrinas complicadas, que se dE:finem A Cámara das Empresas Brasileiras de
como do livre comércio, na vinda, mas que, na volta, at endem pelo nome Capital Nacional (Cebracan) ·surge como
de patentes, direitos de primogenitura de invenção, imposição da lei do resposta ao monopólio que as corpora-
"cheguei antes", que prevê, em seu artigo primeiro, o uso de todo tipo de ções transnacionais têm nas entidades
pressões contra os que tentarem levantar a cabeça. empresariais existentes
Mas, não fosse assim, que insossa seria a vida isenta de desafios ... p.60
Pois o desafio da empresa nacional é a novidade que brota do
empurra -empurra entre a Constituinte e as transnacionais: a novidade Opinião: A visão jornalística da História
atende pelo nome de Cebracan , que quer dizer Câmara das Empresas Neiva Moreira informa sobre produção lite-
B~asileiras de Capital Nacional, e se dispõe a adotar o nacionalismo rária atual de jornalistas
empresarial que fez g·randes as nações dotadas de engenho e p.66
determinação.
A nova associação empresarial é o tema central deste Suplemento Autismo, mal desconhecido
Brasil e a reportagem expôe os argumentos de seus inspiradores, Crianças doentes marginalizadas pela so-
dispostos a lutar para assegurar à criação e ao empreendimento brasileiros ciedade e pelo Estado
os espaços econômicos que lhes cabem ocupar. p.68
()/ /\ll'Í\I> \'
1 ESPORTE 1

O que fará o Brasil em


Seul l1ciades de meda-
lhas apenas no fu-
tebol, jució, vela,
atletismo, basquete
e vôlei.
O vólei (masculi-
A estrutura esportiva brasileira
no e feminino) terá
continua a dever grandes
três chefes de equi-
atletas ao país: nossa
pe. Este esporte
participação em Seul será em
também estará pri-
busca de poucas medalhas
vilegiado de um
médico, profissional
importante em
competições, mas
que só foi lembrado
Walmyr Peixoto
para, além do vôlei,
acompanhar tam-
bém as delegações
gora em setembro, mais de uma

A
de atletismo, bas-
centena de brasileiros e brasi-
quete e futebol.
leiras estarão na corrida do ouro Que não haja ne-
em Seul. Enquanto isso, aqui mesmo no cessidade de aten-
Brasil, milhões acompanharão os pas-
dimento médico
sos, os saltos, cestas, chutes e as corta-
para ninguém do
das, talvez impelidos pelo que será des-
boxe, ciclismo, es-
pejado em suas casas, graças ao pool grima, hipismo, ju-
das grandes redes de televisão que dô, levantamento
prometem, minuto a minuto, mostrar de peso, luta olím-
tudo o que está acontecendo nos XXIV pica, natação, remo
Jogos Olímpicos. ou vela: para acudi-
São 167 atletas brasileiros, dos quais
los só terão mesmo
33 mulheres, que, mesmo sabendo das os chefes de equi-
próprias limitações físicas e técnicas, pes, que são, na
tentarão galgar o tão sonhado pódio. verdade, presiden-
Eles sabem que os principais adversá- São raras medalhas, como as de Ricardo e Ronaldo Carvalho
tes de confedera-
rios são a falta de infra-estrutura espor-
Brasileiro (COB). presidido há mais de ções.
tiva no país e a vaidade de dirigentes
20 anos pelo major Sylvio de Magalhães Ao contrário do que prenuncia o pre-
que, por não terem autocrítica, se eter-
Padilha, poderiam seguir o exemplo da sidente do COB, outros esportes pode-
nizam no poder, perpetuando vícios e
China: o país asiático, com mais de um rão dar mais alguns pontos às tristes
erros antigos. estatísticas do Brasil na história das
Para a maioria dos 167 atletas, Seul bilhão de pessoas, levará uma delega-
ção de 460 atletas. E mais: o secretário- olimpíadas.
significa turismo. Nem o tão propalado
geral do Comitê Olímpico Chinês afirma
intercâmbio, utilizado como desculpa
que seu país quer ficar com a quinta Os medalháveis
para derrotas, pode ser invocado, já que
será difícil o confronto com os grandes colocação em número de medalhas.
Mais coerência do que a famosa sa- O país já participou de 14 olimpíadas,
astros, pois muitos dos nossos ficarão desde 1920, em Antuérpia, quando le-
no meio do caminho, perdidos nas fases piência. A China sabe onde deve dispu-
tar, o que pode ganhar e quantos atletas vou 32 pessoas. Sua menor delegação
classificatórias. Na verdade, O Brasil foi em Paris, nos Jogos de 1924: 13
exagera no preciosismo de levar tanta precisa levar para atingir o objetivo. Já
o Brasil, com verba da Loteria Esporti- atletas. Mesmo assim, o aproveitamen to
gente, sabendo que suas chances de pode ser considerado insuficiente para
va, transportará 2l esportes. E o próprio
medalhas são tão poucas. uma nação de dimensões continentais.
Os dirigentes do Comitê Olímpico major Padilha confessa que vê possibi-
ESPORTE OLPv!PÍADAS

De 1920 para cá, conseguimos apenas cordistas mundiais, européias e ameri- especialidade.
30 medalhas, sendo seis de ouro, sete canas, como Evelyn Ashford, Valerie Robson Caetano está em .plena for-
de prata e 17 de bronze. E, para Hooks, Marita Koch, keike Dreschler, ma. Este carioca de 23 anos ganhou os
obtêlas, o Brasil utilizou 1.568 atle- Tatiana Kazankhina, Ginka Zagorcheva, 100 e 200 metros rasos no meeting de
tas. Stefa Kostandinova, Maricica Puica e São Paulo, batendo três norte-america-
Talvez por isso o povo não demons- muitas outras. Soraya Telles, Angélica nos. Em Seul, ele vai medir forças com
tre tanto interesse. É claro que os índi- de Almeida e Claudiléia Santos devem os recordistas Carl Lewis (EUA), Ben
ces de audiência vão ao pico, pois uma ganhar experiência para outras compe- Johnson (Canadá), James Hines (EUA)
olimpíada é o clímax do que de melhor tições. .e Pietro Menea (Itália). Isso, porém, não
existe no mundo em cada esporte. Mas, Mas, o lado masculino pode faturar assusta Robson, que revela: "Sou hoje o
que ninguém espere ver o cidadão sen- alguma coisa. E as chances recaem na- melhor atleta do Brasil. Já passei dessa
tado na cadeira, copo de cerveja na mão queles que moram nos Estados Unidos, fase de ficar estudando atletas estran-
direita, bandeirinha na mão esquerda, graças a bolsas-de-estudo, e estão geiros. Por isso, se a medalha não bater
torcendo e gritando. Isso não aconteceu sempre disputando meetmgs com os no meu peito em Seul, não ficarei en-
antes e não seria agora que o cidadão melhores atletas do mundo. Isso dá vergonhado. Treino, luto e não vem um
dirigente para me dizer: cachorro, va-
leu'" E Robson conclui que Carl Lewis
só ganhou quatro medalhas, em Los
Angeles, porque os países socialistas
não foram aos jogos. "Sempre aparece
um cara novo para ganhar dos mais fa-
mosos. Desta vez, esse cara novo sou
eu", decreta.
Agberto Guimarães e Zequinha Bar-
bosa estarão na mesma prova de Joa-
quim Cruz. É até possível dar um trio
brasileiro no pódio, já que os dois vêm
obtendo excelentes resultados na Euro-
pa. Em Viarregio, Zequinha foi o pri-
meiro nos 800 metros, seguido de Ag-
berto. Eles chegaram à frente do sene-
galês Oupmane Diarra. Zequinha ainda
ficou com a medalha de prata no mee-
ting de São Paulo, perdendo para Mousa
Fal, do Senegal, e chegando na frente
do norte-americano Ocky Clark. Não
podemos descartar alguns atletas que
podem surpreender, como Adauto Do-
A musa Hortência não vai a Seul, mas o cestinha Oscar pode brilhar de novo mingues (5,000 metros) e Ivo Rodrigues,
que foi medalha de ouro na maratona
teria tais rompantes ufanistas. know-how, pois o intercâmbio e o co- de lndianápolis.
Mas, nem tudo está perdido. Pelo nhecimento da tática do adversário são
menos no terreno da hipótese. Temos as principais armas para se chegar à Basquetf
alguma chance nas seguintes modalida- medalha.
des: atletismo, basquete, boxe, futebol, Nesses casos estão Joaquim Cruz O Brasil de Oscar estréia nos Jogos
judô, luta olímpica, remo, natação, tênis (medalha de ouro nos 800 metros, nos Olímpicos de Seul contra o Canadá, dia
de mesa, vela e, com muito boa vonta- Jogos Olímpicos de Los Angeles), Ag- 17. Depois, pega a China (20). EUA (21).
de, o vôlei masculino e feminino. Fora berto Guimarães, Zequinha Barbosa e Egito (23) e Espanha (24). Desde os Jo-
desses esportes, se algum brasileiro ga- Robson Caetano. Cruz parece que vai gos Pan-Americanos de lndianápolis, o
nhar alguma coisa, vai ser fruto de seu partir para o bi olímpico. Em maio, ele basquete só tem dado alegrias ao bra-
próprio esforço ou sorte. Principal- derrotou o mitológico inglês Steve sileiro. Derrotou os Estados Unidos em
mente desta. Ovett, nos 1.500 metros. Depois, trei- casa e ficou com o ouro. No Pré-Olím-
nando nos Estados Unidos, teve pro- pico de maio, assombrou o Ginásio EI
Atletismo blemas alérgicos e foi obrigado a parar. Cilindro, em Motevidéu, conquistando o
No início de agosto, de volta às pistas, primeiro lugar ao derrotar, na final,
Ao que parece as mulheres não terão arrasou em Viarregio, Itália, ganhando Porto Rico por 101 a 92.
vez, porque se defrontarão com as re- nos 1.000 metros, prova que não é a sua Isto graças ao talento de Oscar, cha-

1988- Nº 113 terceiro mundo - 49


Ol /\//>/ \[). \ S
ESPORTE

mado na Itália, onde


Joga profissionalmen-
te, de ' Mão Santa".
Oscar transmite garra,
\J bração e técnica e,
não satisfeito, resolve
tudo a seu modo,
saindo sempre como
cestinha das competi- V ôle i, futebol e atletismo são dos poucos
ções. Mas, se Oscar, esportes com chances em Seul. (Acima,
como Marcel, Israel, as moças do vôlei e o maratonista Ivo
Rodrigues; ao lado, o futebol de Valdo)
Rolando e Gérson,
uma prova de fogo. E o resultado, se
está no apogeu da
não foi expressivo, pelo menos mostrou
forma técnica, muito
se deve ao fato de ter alguns aspectos positivos.
se tornado profissional
É fato que os empresários andaram
rondando os hotéis e atacando os joga -
(ganha cerca de 120
dores, com total concordância dos diri-
mil dólares anuais) e
gentes da Confederação Brasileira de
jogar pela equipe ita-
Futebol. E isso, segundo o técnico Car-
liana do Caserta. Este
los Alberto Silva, tirou a concentração
ala de 29 anos, 2,04m,
dos atletas em campo. Na excursão, o
não esconde que qual-
Brasil teve dois empates (1 a 1 com a
quer um pode levar a
Norúega, e 1 a 1 com a Suécia) e uma
medalha, à exceção
vitória (2 a O na Áustria).
das seleções africanas:
O resultado da desorganização é que
"Hoje não existe mais
a seleção só voltou com um terço de sua
surpresa no basquete.
delegação. Muitos jogadores ficaram na
Depois que ganhamos
Europa, comprados ou com promessas
o Pan-Americano nos
de venda. E todo trabalho de Carlos Al-
Estados Unidos, acre-
chamou Renato e Muller que, por terem berto Silva pode ter sido em vão, já que
dito em qualquer coisa. Passou na nos-
participado de torneios da Fita, não po- ele pensa até em reformular a seleçã o
sa frente, a gente pega", ironiza.
dem disputar Olimpíadas - a seleção que disputará os Jogos de Seul. Devido
começou seus trabalhos para Seul. a isso, a medalha de ouro, um títu lo
Futebol
Foi a Austrália e lá, depois de passar inédito para o futebol tricampeão do
por Argentina (O a O), Arábia Saudita (4 mundo, parece que continua difícil.
Dirigentes desonestos e incompe-
tentes, jogadores enfeitiçados pelos a 1) e Austrália (na final 2 a O), conquis-
dólares que vêm de todas as partes da tou o Torneio Bicentenário daquele Natação
Europa e um técnico cheio de boa in- país. Mais ta rde, mantendo basicamente
o mesmo grupo - Muller foi cortado - e Sem dúvida a natação brasileira é o
tenção, apenas. Este é o retrato da cha-
alterando o time em algumas posições, esporte-surpresa. Quando menos a
mada seleção olímpica de futebol. De-
a seleção foi para a Europa passar por gente espera, aparece no pódio um
pois de uma convocação equivocada -

50 - terceiro mundo
ESPORTE OLH1PÍADAS

atleta a que ninguém dava a mínima com 4m05s45); e 800 metros livres - ele e os campeoníssimos dinamarque-
chance. Dos 16 nadadores que estarão 8m57s38 (o mundial é de Janete Evans, ses, suecos, norte-americanos, alemães
em Seul, pela lógica podemos apontar dos EUA, com 8m17s12). e soviéticos era a qualidade dos barcos.
como medalháveis Patrícia Amorim Depois de ganhar o sul-americano e o
(200/400/800 livres e revezamento), Cí- V ela pré-olímpico, Lars e Clínio partiram
cero T ortelli ( 100 metros peito/200 me- para a Europa com o barco novo. Com
tros peito), Cristiano Michelena (100, De 1980 para cá, já virou tradição o um patrocinador forte, que bancou 20
200 e 400 metros livre/1.500 reveza- Brasil conquistar medalhas na vela. Nas mil dólares para a construção de um
mento), e Jorge Fernandes (50 e 100 olimpíadas de Moscou, Marco Soares e barco competitivo, os dois foram para o
metros livres). Eduardo Penido ganharam o ouro na confronto.
Ricardo Prado já é ídolo nacional e classe 470. Alexander Welter e Lars O novo barco de Lars e Clínio, fabri-
todos o tratam por Pradinho. Ele com- Bjorskstrom, na classe totornado, tam- cado na Inglaterra, todo em fibra de vi-
pletou 23 anos no dia três de janeiro e bém levaram o ouro em 80. Torben dro, chama-se H202, que é, simples-
tem uma excelente bagagem interna- G rael, Daniel Adler e Ronaldo Senft pe- mente, a fórmula da água oxigenada.
cional, pois além de olimpíadas e pan- garam a prata na classe soling em 1984 Na recente excursão à Europa obtive-
americanos, já participou de campeo- e Rinald Conrad e Ficker, na classe ram dois segundos lugares: na Semana
natos mundiais e outras competições flying-dutchman obtiveram a medalha de Kiel (Alemanha) e num Torneio na
internacionais. No entanto, Ricardo de bronze em 1976. Suécia. O importante, nos dois casos, é
Prado não estará presente naquela que Em Seul, as grandes possibilidades qué chegaram na frente do campeão
seria sua terceira olimpíada. O nadador recaem para Torben Grael e Nélson Fal- mundial da modalidade.
brasileiro, especialista nos 200 metros cão, classe star; Lars Grael e Clínio de Torben Grael, 28 anos, conquistou o

Pradinho e Patrícia sobressaem como exceções e dependem da própria dedicação para superar a falta de infra-estrutura

costas e 200 metros quatro estilos, de- Freitas, classe tornado; Daniel Adler, pré-olímpico de vela classe star, com
sistiu de competir pois não teve tempo José Paulo Barcellos e José Augusto seu companheiro Nelson Falcão, e con-
suficiente para treinar, devido a uma Barcellos, na classe soling, e George firmou sua participação nas Olimpíadas
hepatite contraída há três meses. Mulim Rebello, o "Meu Garoto", na de Seul. Mas o campeão não se acomo-
Já a musa da natação brasileira, Pa- prancha à vela. dou e foi para a Europa disputar todos
trícia Amorim, acredita que Seul será A família Grael ficou famosa com a os torneios da classe. É verdade que ele
apenas uma etapa a mais na sua car- conquista de Torben em Los Angeles e ficou em quarto lugar em Kiel, Suécia e
reira. Realista, ela afirma que pretende com seu pai, o coronel Dickson Grael, Holanda, mas este estudante de admi-
ficar entre as 16 primeiras. Depois das que, irritado com o rumo do inquérito nistração de empresas da U FF sabe que
Olimpíadas de Montreal, em 1976, esta do caso "Riocentro", preferiu sair, fi- o importante nestes torneios é corrigir
será a primeira vez que o Brasil vai levar cando marginalizado nos meios milita- erros, pois o acerto final deve ser dedi-
uma nadadora. De lá para cá a natação res na época da ditadura. Depois surgiu cado às Olimpíadas.
evoluiu muito e a própria Patrícia ad- Lars, irmão de Torben que, com seu Da poluição da Baía de Guanabara,
mite que "ficamos marcando passo". companheiro, o dentista Clínio de Frei- no Rio de Janeiro, para o mundo. As-
Patrícia Amorim tem os seguintes re- tas, poderá ganhar mais uma medalha sim, pode ser sintetizada a carreira de
cordes sul-americanos: 200 metros li - para a família. George Mulim Rebello, o "Meu Garo-
vres - 2m05s70 (o mundial é de Heike Lars G rael percebeu que o impor- to", que vai representar 10 Brasil no
Sreriedrich, da Alemanha, com tante não era só competir. E viu que, campeonato de prancha à vela. Ele con-
1m57s55); 400 metros livres - 4m20s64 com sua técnica, poderia também ga- quistou o pré-olímpico em Búzios e
!o mundial é de Janete Evans, dos EUA, nhar. E percebeu que a diferença entre desde 81 veleja nesse esporte, tendo si-

1988 - Nº 113 terceiro mundo - 51


ESPORTE 01./\f/>/,\l>AS

do campeão brasileiro e 22. sul-am eri -


cano em 84; 32. brasileiro e campeão
sul-americano em 85; campeão brasi-
leiro e sul -americano em 86; campeão
brasileiro, sul-americano e 4'!, colocado
no Pan-Americano em Michigan, além
de ter representado o Brasil em vários
campeonatos europeus.

V ôlei

O Brasil estréia no vôlei masculino


em 18 de setembro, contra a Itália. De-
pois enfrenta Coréia, Bulgária, Suécia e
União Soviética. Apenas os dois pri-
m eiros colocados dessa chave se classi-
f cam para lutar por uma medalha con-
tra os out ros dois do Grupo B.
A batalha para subir ao pódio teve
n cio aqui mesmo no Brasil, com as
quedas dos técnicos José Carlos Bru-
noro e, recentemente. do coreano
Young Wan Sohn. Desentendimento
entre Jogadores, como William, Monta-
naro e Bernard também contribulram
para que aquela seleção de prata das
ohmpladas de los Angeles fosse resu- Márcia, Sandra, Vera Mossa, Aninha, em fundo, ainda não se apagou. Os dois
mida a um time caricato de voleibol. Eliani, Ana Cláudia, Simone, Ana Richa, remadores choravam de emoção ou,
O próprio técnico Bebeto de Freitas Dora e Ana Lúcia. quem sabe, desabafavam depois de
não mostra muito otimismo em suas transporem tantos obstáculos. E eles
declarações. Perguntado se o vôlei mas- Os outros estarão de novo na raia, em Seul. na
cu lino traria uma medalha, revelou: "O modalidade dois sem. Sem dúvida, é
que vier deverá ser encarado da melhor O boxe ganhou três medalhas em a única chance de medalha no remo.
m aneira possível. O problema é cabeça. lndianápolis e, devido à projeção de Nossos adversários estão muito bem
Somos amadores nesse sentido. É pre- Maguila no cenário internacional, as preparados dentro e fora da raia de
ciso que todos acabem com as brigui- academias estão produzindo bons atle- competições. Atletas, nadadores. ciclis-
nhas, pois vôlei é grupo, esporte coleti- tas, dentre eles Wanderley Oliveira. O tas e atiradores não só apuram a forma
vo. E ninguém ganha nada sozinho". Judô também tem ótimas chances (ga- como batem recordes incríveis. Eles Já
A seleção feminina, ao contrário dos nhou 12 medalhas no Pan, sendo que vão chegar em Seul, como se diz no
homens, deu um show de união, ga- cinco de ouro). Os principais destaques meio esportivo, "cheios de moral". No
nhando a vaga para Seul, derrotando são Soraia André, Aurélio Miguel, luiz torneio de têni s, por exemplo, Gisela
a ltáha na cidade de Forli. Foi mais Onmura, Ricardo Cardoso e Walter Miró vai encarar Steffi Graf, nn 1 do
garra do que técnica. Mas também foi a Carmona. mundo, Chris Evert, n '! 3; Pam Shriver,
consagração. Pena que, em Seul, as Roberto Leitão é candidato a meda- nº 4; Gabriela Sahatini, nº 5 e por aí vai.
m eninas vão pegar um grupo fortíssi- lha na luta olímpica, ele que conseguiu a Os atletas brasileiros, considerados
mo, o B, que tem China, Estados Unidos de prata em lndianápolis. O tênis de salvadores da pátria - como Oscar, Pa-
e Peru. Mas, como o pior já passou, o mesa estréia como esporte olímpico. trícia Amorim e o próprio técnico do
técnico Jorge Barros leva muita fé nas Cláudio Kano foi nono no Campeonato vôlei, Bebeto do Freitas - pedem que
m eninas. Mundial e sexto na Copa do Mundo de não se alimente muita esperança. As-
Em Forli, o Brasil venceu o Canadá Macao. Carlos Kawai também se classi- sim, só resta concluir que a maior dele·
por 3 a O, a Itália por 3 a 1 e a Nova Ze- ficou no Pré-Olímpico do México. Os gação do Brasil numa olimpíada deverá
lândia por 3 a O. A única derrota foi para dois se aperfeiçoaram no Japão, a trazer o menor número de medalhas.
a União Soviética, por 3 a 1. Fernanda maior escola de tênis de mesa do mun- Tudo isso poderia ser evitado, com uma
foi considerada a melhor jogadora do do. política esportiva e com a opção pela
torneio e Vera Mossa ganhou prêmio de A imagem dos irmãos Ronaldo e Ri- qualidade e não pela quantidade. •
melhor saque. Vão defender o Brasil as cardo Carvalho ao receberem a medalha
Foio 7 O Globo
seguintes jogadoras: KP.rly, Fernanda, em lndianápohs, com o hino nacional Foto e w I r Santos, Ilustração Amorim

52 - terceiro mundo
PRO O OES,
a muleta dos comerciantes
O comércio vive em guerra há meses, procurando atrair um consumidor cada vez mais retraído,
devido à perda do poder de compra dos salários

As facilidades, os descontos, as promo- quedas de vendas, U!11a vez que a comi-


Lenin Novaes ções, as promessas de vender pelo pre- da é o último item a ser expurgado das
ço de custo, os desafios do tipo "nossos listas mensais de compras. É que eles
preços são menores e devolvemos seu registravam, ao longo do primeiro se-
mestre, progressiva redução no movi-

L
eve 3 e pague 2. Com este apelo, dinheiro, se você achar mercadoria mais
que resumia toda a filosofia de barata", e até mesmo congelamentos mento, que acabou por atingir, de ja-
um chamado plano redutor da que duram o mês inteiro - todas as ar- neiro a junho, o índice de queda de
inflação, a rede de supermercados Car- tes de estímulo à demanda estão sendo 14,4% nas vendas, segundo os dados
refour entrou na verdadeira guerra que tentadas pelo comércio, nos últimos revelados em agosto pela Associação
se desencadeou no Rio de Janeiro e em tempos. Brasileira de Supermercados-Abras.
outros grandes centros, a partir de abril, O que mais chamou a atenção nessa Com tablóides coloridos nos jornais
pela conquista de compradores novos e caça ao consumidor foi a maciça partici- de fim de semana e anúncios até de pá-
pela manutenção das quotas mensais de pação dos supermercados, normal- gina inteira nos jornais, além de propa-
vendas, ambos em progressivo declínio. mente o mais remoto ponto a registrar ganda nas emissoras de rádio e TVs, os

1988- Nº 113 terceiro mundo - 53


CONSUMO \"( l'l R\11 RC/\llOS

exemplo, acumula rea1ustes de 358,4%,


enquan to a inflação no período não ul-
trapassou o índice de 232,10%. Os fa bri-
cantes de cigarro ainda estão a reclamar
de uma defasagem de 50% em algumas
marcas. O Hollywood, a marca mais
• consumida no pais, passou de CzS 135
para CzS 163, em meados de agosto.

Nome limpo no SPC

A queda das vendas no setor loJista


pode ser avaliada pelo volume de con-
sultas feitas ao Serviço de Pro teção ao
Crêd1to-SPC, em julho. O órgão de
controle dos sistemas de crediário faz
investigações sobre as pessoas que pro-
curam fazer compras a prazo. As con-
sultas ao SPC foram 540.454, o que re-
presentou queda de 16,75% no comér-

O alfaiate,
a nutricionista,
o comerciante
D Comer, vesti r, pagar aluguel,
a luz, a água, o condomlmo, a
escola, o transporte, as prestações -
a luta permanente pela vida está d1fl-
cil, recl amam o alfaiate de classe mé·
dia, a nutricionista, o comerciante.
O alfaiate Ewerton Gonçalves
O s preços deixam aflitas muitas donas-de-casas e não são raras as discussões Vieira passou a andar m ais, para
sondar preços e gastar um pouco
donos de supermercados lutam entre si anunciando certas vantagens, que es- menos, e se diz espantado em que
para atrair os consumidores, que estão condem determinadas desvantagens, haja tanta dificuldade para se comer
reduzindo o consumo de produtos bási- geralmente não percebidas pelos con- num pais que produz de tudo e é
cos como o arroz, a carne e as massas. sumidores, como a questão do peso dos dotado da tal extensão. "O alto custo
A promoção do Leve 3 e pague 2 teve produtos. de vida impõe uma alimentação defi-
para o Carrefour o mesmo objetivo do De 576 produtos examinados no mês ciente e isto é c~usa primária do
congelamento anterior: aumentar em de julho pelo lpem, a pedido da Secre- quadro de desnutrição e de prolifera-
10% o número de clientes. taria de Defesa do Consumidor de São ção de doenças que se verifica no
Paulo, 330 deles apresentaram irregula- pais", queixa-se a nutricionista Ma-
Radiografia da mesa ridades de até 26% no peso especificado riãngela leite Andrade, presidente
nas embalagens. Ficou comprovado do sindicato carioca da categoria,
A pesquisa divulgada pela Abras em como os consumidores são lesados na uma cidadã também às voltas com a
meados de agosto, com dados referen- compra de produtos fraudados no peso. pesquisa de preços e atenta às ofer-
tes a seis estados brasileiros, revelou A tolerância máxima permitida pela le- tas, promoções, lançamentos e des-
que a movimentação dos comerciantes gislação varia de 1% a 3%, dependendo contos.
t eve razão de ser: está-se comendo me- do tipo do produto. Desde que se entende por gente -
nos arroz (-5%), menos carne (-11%), Mas, a base do problema da fuga do o perlodo abrange 60 anos, assegura
m enos massas (-8%), que são alimentos consumidor são mesmo os reajustes ele - o presidente do Clube de Dire·
básicos. Assim, explica-se o esforço de frequentes de preços dos produtos. No tores Lojistas do Rio de Janeiro, S11·
atrair o comprador ao supermercado, oitavo aumento este ano, o cigarro, por

54 - terceiro mundo
CONSUMO SUPERMERCADOS

cio, em relação ao mesmo mês do ano


passado. No acumulado dos primeiros
sete meses deste ano, porém, e refletin-
do ainda os números menos negativos
do início do ano, no Rio de Janeiro o
total de consultas foi 4,6% superior ao
mesmo período em 1987. De janeiro a
julho de 1988, o SPC recebeu 3.279.045
consultas,contra3.138.070 no ano passado.
Na indústria de massas alimentícias,
a retração quase já toma conta do setor,
com os empresários buscando uma es-
tratégia de propaganda para tentar fe-
char o ano de 1988 com uma queda de
no máximo 20%. A maioria dos empre-
sários do ramo da indústria de alimen-
tos já diminuiu encomendas de maté-
rias-primas aos principais fornecedores,
em função da queda nas vendas, que al-
cançam níveis de redução de 28% a

propaganda dos grandes atacadistas.

-,
É uma farsa que não traz benefícios
reais para o assalariado. Os super-
mercados fazem promoções de pro-
dutos supérfluos, jamais de artigos
de primeira necessidade, como os ali
mentos básicos da população: arroz,
feijão, carne. Vou a vários supermer-
cados, comprando uma coisa em ca-
da um, mas, no final, descubro que
acaba ficando um produto pelo ou-
Ewerton Mariãngela Sflvio
tro, quanto ao gasto total".
vio Cunha, jamais viu uma situação mércio alcançaram a extraordinária A mesma opinião é compartilhada
como a que enfrenta o Brasil dos cifra de dois milhões, no correr do pela nutricionista Mariângela Leite
anos oitenta: "Estamos procurando primeiro semestre. "Com isso, des- Andrade: os anunciados congela-
forçar as vendas, atraindo de toçlo moralizou-se o instituto· do cheque", mentos de preços em supermercados
jeito o comprador, mesmo sacrifi- alarma-se. "é uma coisa falsa".
cando nossa margem de lucro", ex- O comerciante observa que as Lamenta que a necessidade impo-
plica o líder comercial. condições de vida impedem que o nha à massa dos trabalhadores o
trabalhador tenha disponibilidades corte na alimentação, com a redução
Declínio para gastos, além dos estritamente das quantidades necessárias de pro-
necessários. A situação reflete-se no dutos, como o leite e a carne. "Co-
"As vendas do comércio lojista comércio. "Mesmo entendendo o nheço pessoas que baixaram o con-
vêm apresentando Beclínio desde o quadro geral de falta de dinheiro sumo semanal de leite da família, de
ano passado. Em junho de 88 tive- corremos o risco, inventamos pro- cinco para apenas dois litros. Aca-
mos uma queda de 35%, em relação moções e sistemas de pagamento, bam cortando o que é necessário
a junho de 87. O primeiro semestre para sustentar o movimento dos ne- para o organismo humano. Esta
deste ano, em comparação com o gócios", diz Sílvio Cunha. promoção de congelamentos nos su-
primeiro semestre do ano passado, O alfaiate Ewerton Gonçalves permercados é ilusória, pois conge-
mostra queda de movimento de Vieira volta-se contra as limitações lam os preços da cerveja. Por que
30,5%", exemplifica Sílvio Cunha. Ele impostas pel9 quadro econômico e não congelam os preços do queijo,
cita um dado que considera impres- pelos expedientes utilizados pelo da carne e de outros produtos essen-
sionante e, ao mesmo tempo, uma comércio em geral, particularmente ciais?", desafia a nutricionista.
verdadeira fotografia da realidade: os os supermercados: "O congelamento
cheques sem fundo passados no co- de alguns produtos não passa de L.N.

1988 - Nº 11 3 terceiro mundo - 55


CONSUMO SUPI R\trRC \DOS

30%, em média, no primeiro semestre.


A ociosidade na indústria de alimentos
chegou a 30%. E no setor de frigorífico é
O preocupante
em torno de 70%.

Vale-refeição
quadro dos salários
O prato de comida para cerca de 2,1
milhões de trabalhadores no pais é ga-
rantido com o uso do vale-refeição, que
barateia a alimentação em até 80%.
Aproximadamente 80% dos trabalha-
dores, com renda entre um e cinco sa-
lários mínimos, são beneficiados.
O vale-refeição foi criado a partir do
Programa de Alimentação ao Trabalha-
dor l PAT), em 1976, e é uma boa ma-
neira de enfrentar a inflação, pois é cor-
rigido pela OTN e o trabalhador paga
uma pequena parcela. No entanto, ao
invês de usá-lo nas refeições nos res-
taurantes, muitos utilizam o vale-refei-
As osc1lacoes da economia refletem-se no nlvel de emprego e preocupam Amato, da F iesp
ção para complementar o pagamento
de compras nos supermercados, devido
a sua baixa renda. Máno Negreiros
Quem tem cartão de crédito procura
ganhar da inflação, fazendo o paga-
mento das compras até 40 dias depois. s números são do próprio Mi-
O cartão 1ã é utilizado em corrida de tãxi
e até para casamento, como ocorre na
Igre1a de Santo Antonio, da paróquia da
O nistério da Indústria e Comércio
de janeiro a maio deste ano,
cairam em 3% as vendas do comércio
Paz, em Fortaleza, Ceará. lá, o preço de vare1Ista. No mesmo período, a produ-
um casamento vai de cinco a 12 OTN. O ção industrial no mesmo período só
mportante do cartão de crédito é que o apresentou algum crescimento (5%) em
usuãno - aquele que tem reserva de di- março. Em janeiro, a queda na produ-
nheiro no banco - pode distanciar o pa- ção industrial foi de O, 1%, em fevereiro
gamento da data da compra. como for- foi de 1,4%, em abril 2,5% e, em maio,
ma de driblar a inflação e sentir menos 1,7%.
os aumentos de preços quase diários O presidente da Federação das In-
das mercadorias e produtos. dústrias de São Paulo, Mário Amato,
Vale tudo para enfrentar a inflação, considera que, se o quadro não se alte-
quando se vai às compras. É necessário rar, além do aperto salarial, haverá de-
fazer uma pesquisa no mercado da re- missões em massa nos próximos me-
gião, buscar sempre as melhores ofer- ses, agravando o quadro social. A taxa
tas, promoções e descontos. É preciso, de desemprego vem se mantendo, se- blefe para inibir, desde Já, posslve,s rei-
portanto, estar sempre alerta. Do con- gundo o IBGE, entre 3% e 4%, o que, se vindicações salariais em São Paulo.
trário - e nos dias de hoje é quase ine- não é motivo de orgulho, também não Nos bons tempos do Plano Cruzado,
vitável -. poderá voltar para casa sem chega a ser alarmante. Considerando-se quando algumas categorias se atreviam
um cruzado no bolso. Isto porque os a queda de vendas no comércio e a bai- a pedir melhorias salariais, o ministro
comerciantes fazem de tudo para ven- xa produção industrial, pode-se até da Fazenda da época dizia que, se per-
der: se o consumidor não abrir o olho, concluir que o nível de emprego, com- mitisse aumentos nos salários, a de-
"eles vendem até o diabo", como filo- parado à remuneração dos que estão manda explodiria e, com ela, a inflação.
sofava uma mulher, durante as compras empregados, pouco tem sido (ainda) Era preciso conter, através dos salários,
que fazia numa loJa de lustres, no bairro afetado pela crise. Só o tempo dirá até o "ímpeto consumista" dos brasileiros,
carioca de Benfica, preocupada com os que ponto o presidente da Fiesp estaria para que o fantasma da inflação não
preços, mas tentada pelos diversos tru- falando sério, ao prever demissões em voltasse a assombrar a economia do
ques de venda da casa. • massa, ou apenas recorrendo a um país.

56- terceiro mundo


CONSUMO SUPER1yJERCADOS

Estabeleceu-se, na época, o hoje um se puder imaginar. Aos que vêem no chegar aos 88% da Nova Zelândia, o
tanto esquecido gatilho salarial, que mercado externo a grande alternativa, é número de empregados ou salário de
consistia num aumento salarial de 20% preciso recordar que os Estados Unidos cada trabalhador brasileiro teria que ser,
nos salários, sempre que a inflação ul- e a Comunidade Econômica Européia-· portanto, multiplicado por mais de cinco
trapassasse esse limite. Os aumentos CEE, nossos maiores compradores, têm vezes. A diferença entre o valor final de
dos salários eram acionados pela infla- ameaçado com sobretaxas que inviabili- produção e as despesas operacionais
ção e não o contrário. Antes que o go- zariam a entrada de uma série de pro- (salários, inclusive) é, na Nova Zelândia,
verno autorizasse aumentos salariais, os dutos brasileiros. de 11 pontos. No Brasil é de 52. A gros-
preços iam por conta própria aumen- O arrocho salarial já chegou a ser so modo, pode-se constatar, a partir
tando, de tal maneira que, rapidamente, justificado com o argumento de que daí, que a margem de lucro no Brasil é
o gatilho passou a ser acionado a cada conteria supostos ímpetos consumistas, praticamente cinco vezes superior à dos
mês, até ser substituído pela URP, que mas agora o argumento é de que au- empresários neozelandeses.
vem a ser a média da inflação nos últi- mentar salários significaria demitir em Não é preciso, no entanto, ir à Nova
mos três meses. O reajuste dos salários massa. Zelândia para se descobrir a grande
continua, portanto, a ser acionado a margem de lucro dos empresários bra-
partir da inflação e não o contrário. Salário sem peso no custo sileiros, em relação aos do resto do
Tanto o gatilho, quanto a URP, pelo mundo, e o quanto é pequeno o salário
atraso com que reajustam os salários Mas, João Furtado, professor de no Brasil. Entre os países latino-ameri-
em relação à inflação, representam re- Ciência Política e Econômica da Univer- canos pesquisados por João Furtado -
dução real do poder de compra dos as-
salariados. Ainda que alguma categoria
profissional consiga, no dissídio coleti-
vo, reajustes que cubram a inflação, a
vantagem se dissipa rapidamente, na
medida em que o reajuste salarial pela
URP, defasado por natureza, não pode
cobrir por muito tempo a inflação dos
meses que se seguirão ao dissídio.

Círculo vicioso da estagnação

Fica fora de consideração, portanto,


culpar qualquer "ímpeto consumista"
pela inflação, pois a corrosão salarial
impede o aumento do poder de compra,
como o confirma a queda de 3% no ní-
vel de vendas do comércio varejista. (O
normal, num país cuja população cres-
ce, é que as vendas aumentem).
As queixas do comércio baseiam-se-
se na projeção do quadro econômico Os vasos comunicantes da economia ligam a queda do poder de compra à queda da producão
em que surge o círculo vicioso da falta
de dinamismo das atividades econômi- sidade de São Paulo, após exaustivas México, Bolívia, Uruguai, Venezuela,
cas: se o comércio não vende, as indús- pesquisas concluiu que o salário no Bra- Chile, Colômbia e Brasil - é no Brasil
trias deixam de produzir por falta de en- sil é o mais baixo do mundo. E mais: a que é menor a participação dos salários
comendas, e se as indústrias não produ- margem de lucro é uma das maiores do na composição de custos. Os 17% do
zem, deixam de dar empregos e podem mundo. Brasil são imbatíveis em qualquer con-
até ameaçar com demissôes em massa; Foram ao todo 40 países pesquisa- tinente. Já na diferença entre o valor fi-
e, se estas se consumarem, menos dos, utilizando-se dados de 1980, consi- nal de produção e as despesas opera-
gente terá como comprar. Estará com- derados válidos ainda, ante a situação cionais, a Venezuela e a Colômbia (am-
pleta assim uma volta do sinistro círculo de não recuperação do poder salarial no bos com 54 pontos) e o Chile (campeão
vicioso. país. Para se ter uma idéia, na Nova mundial nessa categoria, com 60 pon-
Se as demissões previstas pelo pre- Zelândia, país onde os salários mais pe- tos) conseguem bater os 52 pontos do
sidente da Fiesp, Mário Amato, vierem a sam na composição de custos das em- Brasil que, no entanto, ainda garante
se cumprir, os 3% referentes à queda de presas, a folha de pagamento repre- uma margem de lucro aos seus empre-
vendas de janeiro a maio podem virar senta 88% dos custos. No Brasil, os sa- sários superior à média do continente,
quatro, cinco, seis ou quantos por cento lários representam apenas 17%. Para que é de 47 pontos. •

1988- N° 113 terceiro mundo - 57


PANORAMA NACIONAL

Enchova ressurge
A partir de novembro, o quanto a extração de petró-
campo petrolífero de En- leo recomeçará em maio do
chova, na Bacia de Campos, próximo ano, ante a neces-
volta a produzir, através de sidade de se faze a remoção Ladeando o deputado Chuahy, o casal Moreno ouve saudações
um sistema provisório, pou- prévia dos escombros da
plataforma. Este sistema
co mais de seis meses após
ter sua plataforma central provisório será mantido, Cônsul ganha título
seriamente danificada por quando for reconstru do o
um incêndio. Inicialmente, sistema definitivo e será co- O casal venezuelano, que tem participado do pro-
será retomada a produção nhecido como Enchova- cônsul Regulo Moreno e a grama de educação das
Oeste, e ambos farão o tra- consulesa Judith Ferro Mo- crianças e está muito identi-
de gás, num total diário de
balho conjuntamente. • reno, foi homenageado, in- ficada com os problemas da
750 mil metros cúbicos, en-
dividualmente, com o titulo América Latina", disse a de-
de Cidadão do Estado do putada Yara Vargas.
Cidadão carioca Rio de Janeiro, em soleni-
dade realizada dia 17 de
O cônsul venezuelano
agradeceu a homenagem,
1
agosto na Assembléia Le- observando que "dizem que
g·slativa fluminense. Com o Brasil está em quinto lugar
três filhos - uma moça e entre todos os países do
dois rapazes-. Regulo e Ju- mundo pelo tamanho de
dith estão no Consulado da suas fronteiras. Porém de-
Venezuela, no Rio de Ja- veriam dizer que ocupa o
neiro, desde outubro de primeiro lugar pela qualida-
1984. O título concedido à de de sua geografia humana
consulesa que é artista e pelo clima de compreen-
plástica, foi uma iniciativa da são para a convivência civili-
deputada Yara Vargas, en- zada. Falar do Brasil é falar
Louzeiro: causas populares quanto o deputado Alberto do Rio de Janeiro, a cidade
Brizola propôs a homena- cosmopolita que personifica
gem ao cônsul Regulo. o país inteiro", definiu o
O escritor e jornalista Mortos". que deu origem ao
filme "Pixote" , "Araceli, Judith "é uma mulher homenageado.
maranhense José Louzeiro
foi homenageado com o Meu Amor", "Verão dos
Título de Cidadão Honorário Perseguidos" e roteirista de
da Cidade do Rio de Janeiro, 16 longa-metragens. Des- O susto da meningite
dia 9 de agosto, em sessão fruta atualmente do sucesso
Dezenas de casos da me- paulista, Jose Anstodemo
solene na Câmara Municipal, da novela "Olho por Olho", Pinotti, defendeu a conve-
em parceria com Geraldo ningite do tipo B assustaram
por iniciativa do vereador niência de se receber a vaci-
Carneiro, na TV Manchete. São Paulo, em julho, levan-
Antonio Pereira Filho, o
do a uma movimentação sa- na e testá-la, ressaltando
Pereirinha. José Louzeiro já Louzeiro, ao agradecer a
nitária, que implicou na doa- que as 50 mil doses serão
vive no Rio de Janeiro há 34 homenagem pelo título, re-
ção de 50 mil doses da vaci- insuficientes, pois a preven-
anos. Foi onde, segundo o cordou os atalhos que per-
na específica fabricada pelo ção de um surto na popula-
vereador Pereirinha, ele "a- correu, quando chegou do
governo de Cuba. A doação, ção infantil aconselharia a
madureceu sua consciência Maranhão com 22 anos de
entretanto, viu-se atropela- aplicação de quatro milhões
das coisas da vida, desen- idade, "ameaçado de morte
da por um grande debate de doses.
volveu suas ativídades lite- por um gangs~er maranhen-
em torno da eficácia e da O único dado tranquiliza-
rárias e artísticas e aprofun- se chamado Vitorino Freire".
conveniência de receber de do(, quanto à bizarra discus-
dou seu compromisso com Lem)::>rou as reportagens
graça o produto medicinal são que se armou em torno
as lutas do nosso povo". policiais que o levaram a co-
cubano, numa discussão em da vacina cubana, é a expe-
Ex-presidente do Sindi- nhecer cidadãos "marginali-
grande parte atribuída a in- riência, como disse Pinotti,
cato · dos Escritores do Rio zados" e os muitos amigos de que a meningite B - me-
teresses contrariados das
de Janeiro, José Louzeiro é que conquistou, principal- nos contaminante que os ti-
transnacionais dos medica-
autor de 21 livros, entre eles mente nas redações dos jor- pos A e C - nunca provocou
nais cariocas em que traba- mentos.
"Lúcio Flávio, o Passageiro uma grande epidemia. •
O secretário de saúde
da Agonia", "Infância dos lhou. •
PANORAMA NACIONAL

Universidade discute
producão científica
Uma visão crítica da uni fato de que a universidade
versidade brasileira foi o brasileira concentra-se ria
tema que envolveu profis- função de transmitir e não
sionais acadêmicos de todas na de criar conhecimento:
as áreas e estudantes, du- a falta de compromisso com
rante a 40ª reunião anual da
Sociedade Brasileira para o
a inovação e a descoberta é
a responsável por vários dos
Parceira espacial
Progresso da Ciência-SBPC, males apontados, como as Iniciados em escolas es- e fornecerá diversos dos
realizada em julho, em S. práticas centralistas e a es- paciais diferentes, Brasil e instrumentos de bordo. Terá
Paulo. pécie de preguiça mental, China formalizaram um ainda direito ao uso comer-
Insuficiência de recursos, que faz com que a qualidade acordo, que os torna par- cial das informações envia-
ausência de políticas de lon- seia preterida por uma ten- ceiros do programa já co- das pelos satélites e trans-
go prazo, práticas equivoca- dência ao nivelamento por nhecido por Satélite Sino- mitidas para três estações
das - são alguns dos muitos baixo. Brasileiro de Levantamento terrestres. Outros tipos de
pontos que atrapalham a vi- Como solução, destacou- de Recursos Naturais, o Chi- componentes feitos no Bra-
da das instituições de ensino se a necessidade de se fixa- na-Brasil Earth Resources sil já foram negociados com
superior do país, na avalia- rem políticas que visem à Satellite-CBERS. Os novos a China, que também acom-
ção geral de professores e excelência de resultados, o parceiros vão criar dois en- panha o projeto e constru -
pesquisadores. A trajetória que só se torna possível com genhos orbitais de cerca de ção de mais quatro satélites
da jovem universidade bra- a identificação entre univer- 1.800 quilos, sofisticados, brasileiros, que subirão ao
sileira, um fenómeno de sidade e a pesquisa, isto é, com estabilização nos três espaço no início da próxima
pouco mais de meio século, com a adoção de um con- eixos, câmeras óticas e var- década.
envolve permanente discus- ceito de universidade que redores térmicos, para exa- O programa CBERS, no
são sobre seus rumos e sua tenha por função privilegia- miníilr a Terra e descobrir valor de 150 milhões de dó-
eficácia, entremeada de in- da a criação de conheci- depósitos subterrâneos de lares, foi um dos acordos de
tervenções negativas, como mentos. Uma política defini- minérios e água, poluição, cooperação tecnológica as-
foi o caso das consequências da de desenvolvimento tec- fenómenos meteorológicos, sinados pelo presidente Jo-
do regime militar na vida da nológico foi reclamada, pois etc., com lançamento pre- sé Sarney com as autorida-
instituição. serviria, por exemplo, de visto para 1992. des chinesas, durante sua
Um dos pontos básicos roteiro permanente para a O Brasil arcará com um viagem àquele país, no início
das dificuldades reside no pesquisa universitária. • terço do custo do programa de julho. •

duas vigas mestras são as gipana de Turismo, com 25


Homenagem a Lampião coleções do general Teodu- peças usadas pelo canga-
reto Camargo do Nasci- ceiro e seu bando. Antes de
Os 50 anos de morte de tenceu a Maria Bonita) e mento, que chefiou a Polícia ser tornar o mais temido
Virgulino Ferreira, o canga- armas, inclusive o facão que Militar de Alagoas, e do co- cangaceiro do Brasil, Virgu-
ceiro Lampião, ocorrida no Lampião utilizou em vários ronel João Bezerra da Silva, lino foi vaqueiro e tropeiro,
dia 27 de julho de 1938, combates e que serviu para o homem que na madruga- profissões que o ajudaram a
mereceram comemoracões decapitá-lo. da do dia 27 de julho de conhecer os segredos e es-
no Recife, capital de Per- Frederico Pernambucano 1938, numa fazenda do inte- tradas do sertão nordestino.
nambuco, com uma exposi- reuniu os objetos da exposi- rior de Sergipe, atacou o Preso por causa da morte
ção sobre o "Banditismo ção em 15 anos de pesqui- acampamento do bando e de uma vaca, Virgulino foi
Rural Brasileiro", organizada sas, tempo em que preparou liquidou Lampião com um libertado por seus irmãos,
pelo pesquisador Frederico o livro. "Guerreiros dd Sol - tiro na testa. que invadiram a cadeia. N_a
Pernambucano de Melo. A o banditismo rural no Nor- Em Aracaju, capital de briga, o filho do delegado de
exposição apresenta foto- deste do Brasil", publicado Sergipe, a neta de Virgulino polícia morreu, desenca-
grafias, roupas, instrumen- em 1986 pela Fundação Ferreira, a jornalista Vera deando a luta entre as duas
tos (como binóculos e ócu- Joaquim Nabuco. Grande Lucia Ferreira Nunes, dirige famílias, que culminou na
los de alcance) utensílios parte do material lhe foi um museu inaugurado em morte do pai de Lampião e
domésticos (como uma má- confiado pelas famílias dos homenagem a Lampião, or- sua entrada para o cangaço,
quina de costura que per participantes da luta. As ganizado pela Empresa Ser em 1917. •
[ ECONOMIA 1 /, / \ \ 1 1 , 1

Empresariado assume
o nacionalismo
Mais de 20 associacões empresariais de vârios setores economicos se unem na defesa dos interesses nacionais

Athayde. a Cebracan surge para resgatar o sonho de um pro1eto brasileiro para o Brasil com panlcipaçao empresarial

seu Projeto Bra~il. leira. A Cebracan surge como resposta à


Lwz Carlos de Souza Nele trabalharão "pessoas de reno- falta de representat1v1dade das entida-
me da economia e do mero empresarial, des empresariais mais s1gnif1cat1vas,
incorruptíveis, bem como do meio cien- que redundou na necessidade de busca
tuar de uma maneira mais am- tifico e tecnológico, no sentido de nos de um caminho para levar os reclamos

A pla na defesa dos interesses na-


cionais - em vez de ser apenas
uma entidade corporativa - é finalidade
orientar sobre a verdadeira dimensão
dos fatos gerados nos bastidores do
poder. Será um pro1eto de brasileiro
de 99º/c das empresas brasileiras de ca -
pital nacional.

da recém-criada Câmara das Empresas para brasileiros, que leve adiante o• Ouestao de soberania
Bras lerras de Capital Nac1onal-Cebra- ideais de Teotónio Vilela, para resgata
an, segundo o seu presidente, empre- as quatro dívidas brasileiras: a interna, a Tais entidades, acentua, foram to-
ário Luiz Otávio Athayde. Já constituí- externa, a política e a social", define o madas por corporações transnacIonaIs,
da n1c1almente por mais de 20 associa- empresário. que aliciaram testas-de-ferro, para de-
oes empresariais de vários setores luiz Otávio Athayde diz que, a curto fender seus interesses ilegítimos· "Sua
conomicos, representando cerca de prazo, a Cebracan defenderá as con- ação se faz sentir em lobb1es fortlss1mos,
c nco mil empresas genuinamente bra- quistas da Constituinte e a nova Carta pressionando os três poderes a agir de
s1le1ras e que empregam mais de 800 como um todo, mesmo com suas con- acordo com sua conveniência, inclusive
mil trabalhadores, a Cebracan, explica tradições, se é que as tem. pois em úl- nos escalões inferiores".
Athayde, pretende estabelecer também tima análise espelha a realidade brasi- Estão aí as nefastas políticas nos

60 - terceiro mundo
ECONOMIA MIl'RhSA NACIONAi

campos mi neral, farm acêutico, i nfo r-


mfltica (com pressões sobre a reserva
de mer.:ado), energético, programa do
âlcool, estatais produ tivas, ciência e tec-
nologia, transportes, etc. Em tono o
campo, busca-se a internacionalização e
a compra de pacotes tecno lógicos, des-
locando-se do pais o centro decisório. O
arrocho salarial, encu rtando o mercado
interno, completa o quadro de coloni78-
ção do Brasil. O sistema financeiro, as
dividas interna e externa são instru-
mentos utilizados para impedir o desen-
volvimento econômico com soberania.
Surgiu assim a Cebracan, que tra-
balhará incansavelmente no sentido de
reverter estas tendências e políticas -
diz seu presidente e também vice-presi- A part1cipacao nacional reduziu -se em setores estratégicos, como o dos medicamentos
ter. Nada justifica - diz - que os ban-
queiros captem dinheiro à taxa de 20%,
por exemplo, e não o repassem a 21%
no máximo, em vez de especularem fi-
nanceiramente, minando a economia e
alimentando a inflação.

Confusa internacionalizacão

A Cebracan deseja também q ue seIa


feita urna reforma monetária, que o
atual governo "com sua ilegitimidade e
falta de prestígio", segundo Athayde,
"não pode fazer". Dentro dessa refor-
Sob fogo cerrado, a informática bras ile ira 41 um dos setores essencia is à autonomia ma, "o próprio Conselho Monetário Na-
cional-CMN teria que ser reformulado,
dente da Associação Fluminense da Pe- A seu ver, realmente deve haver crité- porque é muito mais representativo de
quena e Média Empresa-Flupeme, enti- rios para o tratamento dessa questão, interesses econômicos particulares e
dade associada à Cebracan, entre ou- mas o que estão querendo impingir à setoriais, do que nacionais e coletivos.
tras. opinião pública é a idéia de que ficariam Dos nove membros que nele rep resen-
Segundo Athayde, a nova entidade prejudicados os que pagaram suas dívi- tam a iniciativa privada, quatro são
quer representar todos os setores que das, quando, na verdade, o problema banqueiros", diz.
dependem do mercado interno para so- redundou da alta de Juros dos emprés- A luta será árdua mas venceremos,
breviver e aqueles que se interessem timos tomados na vigência do Plano assim corno Davi venceu o gigante Go-
pelo desenvolvimento econômico e so- Cruzado (veja, a propósito, terceiro lias - acrescenta Luiz Otávio Athayde,
cial do povo brasileiro. A Cebracan é mundo , edição 112, p. 50-51, a matéria numa previsão do que será, daqui para
uma associação de associações, "po- "Anistia - o desencontro da política com adiante, o trabalho da Cebracan. No to-
rém, abrimos categorias de sócios espe- a economia"). cante à elaboração do Projeto Brasil,
ciais, para podermos contar com a par- Quanto aos juros bancários, o presi- a idéia é não lidar com economistas
ticipação de entidades representativas dente da Cebracan defende seu tabela- formados no exterior, "com lavagem
da sociedade, empresas e indivíduos, mento, dentro da filosofia de que são cerebral, repetindo como papagaios as
todos que tenham espírito patriótico de uma taxa de serviços bancários que não realidades que não são nossas, às vezes
defesa de nosso pais". pode visar lucros. Se os juros da cader- sem perceberem, pois são apenas aca-
A defesa da Constituinte é tarefa neta de poupança são tabelados em dêmicos, fazendo o discurso da moder-
abraçada pela nova entidade de empre- 0,5%, por que os outros não podem nidade que só interessa aos interesses
sários nacionais, jâ que, para seu presi- ser7, pergunta. Juros, dinheiro e medi- alienígenas".
dente, existe contra-propaganda quanto camentos não deveriam ser encarados O presidente acha que alguns estão
a suas decisões, inclusive em relação à corno itens de economia de mercado, e confundindo internacionalização da
anistia às pequenas e médias empresas. contra isto a Cebracan pretende se ba - economia com a capacidade do Brasil

1988-Nº 113 terceiro m undo - 61


ECONOMIA

direitos das empresas brasileiras, estão


nos planos da Cohrocan, que pretende,
Entidades fundadoras conforme sou presidente, ser uma ban-
deira de quem acredita num Brosil sem
ABCPAI - Associação Brasilei ra de Assine - Associação Industrial de annlfabotismo, sem miséria nem doen-
Controle e Processos de Automação Duque de Caxias ça, e com melhor d1stnbu1ção de renda.
Industrial Abicomp - Associação Brasilei ra da
Abercote/ - Associação Brasileira de Indústria de Computadores e Perifé- Sangria de 15 bilhoes de dólares
Empresas Construtoras do Redes ricos (em negociação)
Telefônicas Fecotngo - Federação das Cooperati - Uma dos primeiras ati tudes de
Ab1cm - Associação Brasileira da In - vas e de Produtores de Tngo Athayde foi mandar telegrama à presi-
dústria de Componentes para Infor- Flupeme - Associação Fluminense da dência da República, con trário à permis-
mática Pequena e Média Empresa são aos laboratórios transnac1ono1s do
Abffllla - Associação Brasilei ra das t,, siste - Assooação Brasileira de tirarem patentes dos sous produtos. Tal
Indústrias de Oulmica Fina Instrumentação e Sistemas Técnico- patenteamonto impede o desenvolvi-
Ab,graf - Associação Brasileira da In- c1entlfico mento dos laboratórios nac1ona1s, por-
dústria Gráfica Sindican - Sindicato Nac,onal de Em- que estes não ter,arn acesso ao proces-
Abrabi - Associação Brasilei ra de presas de Carga so de fabricação dos produtos.
Empresas de Biotecnologia mR - Associação Nacional dos Luiz Otávio A thayde diz que o Brasil
Abra, - Associação Brasileira de In - Transportadores Revendedores Re- precisa romper sua dependência em
formática talhistas de Derivados de Petróleo refação ao capital estrangeiro, que re-
Ac.islab - Associação dos Distri bui- Assespro - Associação das Empresas dunda na sangria de riquezas nacionais,
dores Brasileiros de Produtos para Prestadoras de Serviços de Informá- desviadas para remessas de lucros e
laboratórios tica (em negooaçãol pagamentos de Juros. Essa t ransferên -
A/anac - Associação dos l aboratórios Sindicato Nacional dos Corretores de cia, acredi ta, co rresponde a cerca de
Farmacêuticos Nacionais Imóveis 40% dos lucros (ou poupança) produz,.
Apebi - Associação Paranaense das Unimed - União das Empresas Pres- dos pelos brasileiros.
Empresas de Biotecnologia tadoras de Serviços Médicos Em documento que distribui u re-
Asstbral - Associ ação das Indústrias Síndcon - Sindicato Nacional dos centemente em Brasília, fica comp rova-
Brasilei ras de Produtos para labo- Construtores de Pontes, Estradas e do que a remessa de lucros das tra nsna-
ratórios Barragens (em negociação) cionais, desde 1985, vem superando, em
valor, o montante de um bil hão rfe dó-
lares ao ano. Somado ao que se paga
enfrentar o mercado internacional. em juros e a outros déficits, o pais é for-
Quanto à ciência e tecnologia, é preciso çado a transferir ao exterior uma qua n-
dar-lhes prioridade. Esta última, por tia em torno de 15 bilhões de dólares ao
exemplo. não se transfere, mas se faz ano.
em casa, e sem ela o Brasil não será so- As transnacionais, conformo ainda o
berano, Acontece que "querem nos documento da Cebracan, mandam no
transferir pacotes tecnológicos que Brasil. Entre as 11 maiores empresas cio
atrelem nossa economia à deles", refe- setor de velcufos automotores, oito são
rindo-se às nações que assim procedem estrangeiras e retêm 97% do mercado
em relação a países do Terceiro Mundo. brasileiro; na produção do fumo, entre
ivemos que mudar para um discurso as 12 maiores, cinco estrangeiras fatu-
forte e coraioso - continua o presidente ram 91 %, e na indústria fa rmacêutica,
da Cebracan, manifestando-se cont~ário entre as 55 maiores, 23 transnacionais
à vinda de bancos estrangeiros para o ficam com 85% do valor das vendas.
Sá: setores estratég icos estão co nosco
Brasil. onde podem captar depósitos à
vista, e sugerindo uma nova regula- aspectos que considera negativos para o A guerra da química fina
mentação dos investimentos estran- Brasil, apesar de saber, de antemão, que
geiros no país. Historicamente, cita, es- encontrará forte resistência. Mas, para Outro participante do movimento, o
ses i nvestimentos nunca ultrapassaram que consiga mais espaço nos meios de diretor de Administração e Relações ln ·
7%, o que significa um percentual muito comunicação, fará campanhas, para que dustriais da Companhia Brasileira de
menor do que levam de retorno. empresas essencialmente nacionais Antibióticos (C1bran), Roberto Almeida
A Cebracan, por não estar vinculada anunciem mais nesses veículos. Sá, representante dessa empresa asso·
a nenhum órgão federal, partido político Seminários, palestras, conferências e ciada à Cebracan, diz que a luta da entl·
ou entidades estrangeiras, quer mudar até o recurso à Justiça, para lutar pelos dade é para proteger a indúst ria nacio·

62 - terceiro mundo
ECONOMIA Et!PRESA NA CIO NAL

nal, contribuir para recuperar a econo-


mia e, cm suma, reabilitar o Brasil.
Lembra Sá que a Cebracan, da qual é
um dos fundadores, nasceu de um mo-
vimento da Associação dos Laborató- O manifesto
rios Farmacêuticos Nacionais (Alanac),
que desde janeiro passado enfrentava,
num corpo a corpo, discutindo com
''A formação da Câmara das Empresas Brasilei~a~ de Capital Nacional
deve-se a uma exigência da sociedade brasileira, porque nenhuma
parlamentares da Constituinte, pontos entidade de classe está realmente apta a defender os genuínos inte-
polêmicos de interesses fundamentais resses do empresariado nacional. Paradoxalmente, as organizações empre-
para a indústria brasileira. sariais que deveriam fazê-lo estão intimamente comprometidas com o capital
A Alanac, conta, sugeriu a criação de internacional e dedicam-se ao fortalecimento do lobby das multinacionais,
uma confederação de empresas nacio- que pretende alterar o texto aprovado no primeiro turno da Constituinte.
nais, mas, como isso não foi possível, Não queremos banir as transnacionais. Pelo contrário, defendemos~ ne-
bateu-se por uma cãmara, o que, afinal, cessidade de atrair capital e tecnologia estrangeiros, mas fazemos questao de
foi concretizado como forma de escapar colocar as coisas nos seus devidos lugares.
às antigas entidades, "que dizem repre- "O /obby montado pelo capital estrangeiro está tentando provar que os
sentar empresas nacionais, mas, na ve r- constituintes brasileiros são xenófobos e retrógrados. Será que os nossos
dade, representam interesses multina- constituintes são incompetentes?
cionais". "Os defensores do capital estrangeiro usam como principal argumento a
Sá adverte que a Cebracan não tem pretensa internacionalização da economia mundial. Segu~d~ o milio_nário
ideologia ou doutrina, mas apenas o de- programa exibido em rede nacional de televisão, a Constituinte ~stana f~-
sejo de proteger a indústria genuina- chando a economia brasileira, enquanto o resto do mundo se dedica a abrir
mente brasileira. O presidente da Ce- as portas para um futuro radioso e sem barreiras industriais e comerciai~.
bracan, Luiz Otávio Athayde, foi esco- "Esse argumento é absolutamente falso e ardiloso. Não existe essa inter-
lhido, segundo Sá, porque é vice-presi- nacionalização da economia. Vejamos o exemplo do Mercado Co_mum Euro-
dente da Flupeme, entidade que não peu, que deve ser seguido pelo Brasil. Assim como eles se ~r~antzam na ~u-
tem nenhum comprometimento com ropa, precisamos nos organizar na América Latina. O obJet1vo das naço~s
transnacionais. européias não é se entregarem às transnacionais, mas defenderem a própria
economia.
Sobre a indústria farmacêutica em si,
a Cebracan, anuncia Sá, lutará por me- " Como todos sabemos, países não têm aliados, têm apenas interesses. Es-
lhores critérios para fixação dos preços sa dura realidade não se derru ba com argumentos fa!)tasiosos, espalhados
dos produtos, porque, ao seu ver, os do num tendencioso program a de televisão. Dizer que as economias da China e
Conselho lnterministerial de Preços-CIP da União Soviética est ão -se internacionalizando, enquanto o Brasil estaria
são inJustos, pois o órgão não pode prestes a expulsar o ca pital estrangeiro, como se t enta fazer crer, _é ~ma afir-
controlar e analisar as planilhas de cus- m ação irresponsável, que menospreza a inteligência do povo bras1le1ro e, so-
bretudo, a dos constitu intes.
tos de 35 mil fármacos e afins. O CIP,
diz, vem esmagando a indústria farma- " É preciso que a o pini ão pública brasileira se conscientize de que a Cons-
cêutica nacional, porque não corrige os tituinte não está inovando ao defender as empresas de capital nacional. Pelo
preços dos produtos pelos índices da contrário, trata-se de reunir no texto constituci onal as normas que existem
inflação. Enquanto isto, a indústria es- desde a década de 60. •. • .
trangeira sempre faz seu plano de cus- "O que os constituintes decidiram, demonstrando elevado espmto publico
tos prevendo importação de matéria- e patriotismo, foi dar preferência às empresas nacionais na qq_uisi~ão de bens
prima. e serviços pelo poder público. E seria de se estranhar, casq nao tIve_ssem to-
"Obviamente, que o preço da im- mado tal decisão, pois trata -se de um princípio consagrado mundialmente.
Preferência não significa exclusividade.
portação é para embutir os prejuízos
"Os constituintes concederam proteção e benefícios especiais, de caráter
que elas têm, no Brasil, com os preços
temporário, para que as empresas nacionais ~esenvolvam atividades impres-
fixados pelo CIP. Quem perde são as
cindíveis para o desenvolvimento da nação. E o mínimo que se pode esperar
indústrias nacionais, que vão sendo
que os políticos brasileiros façam por seu país. As forças armadas defende-
compradas pelas estrangeiras, que as
ram princípios nacionalistas no primeiro turno e temos certeza de que conta-
retiram do mercado, para poder im-
remos com seu apoio na fase decisiva da Constituinte.
portar matérias-primas e se tornarem
"Em nenhum pais do n:iundo, o s setores estratégicos podem ficar sob
as únicas fornecedoras", diz.
controle externo. O empresariado brasileiro está disposto a assumir suas res-
Frisa Roberto Almeida Sá que "as
ponsabilidades com a nação. Nosso objetivo é reabilitar o Brasil. Nosso pa·ti-
nacionais precisam do governo: há 20
cio é o Brasil."
anos atrás elas tinham mais de 50% do
mercado e hoje só têm 15%". o

1988- N~ 113
t erceiro mundo - 63
ECONOMIA I. \ll'Rf. S \ IJR \ S/1 /:IR\

CEBRACAN,
a luta pela
autonomia
A entidade de defesa da
empresa nacional fez sua
instalação nas dependências
do Congresso Nacional

Clóv,s Sena

instalação da Câmara das Em-

A presas Brasileiras de Capital Na-


cional (Cebracan) foi saudada
por constituintes, corno acontecimento
da máxima 1rnportãnc1a, pois a nova
entidade se propõe a defender o empre-
sariado e a economia do Brasil, papel
que deixou de prestar a Fiesp, que pas-
sou ao controle dos empresários ligados
aos interesses do capital estrangeiro,
conforme recordou o deputado e cons-
tituinte Fernando Gasparian, do PMDB
de São Paulo, dizendo que fora bem di-
versa a finalidade com que alguns fun-
daram a poderosa entidade dos indus-
triais paulistas.
A Cebracan foi instalada no auditório
Nereu Ramos, da Câmara dos Deputa- Empresariado congrega-se pelo desenvolvimento e contra ação do capital espoliador
dos. com a adesão inicial de mais de 20
entidades, presença de urna centena de sua vez o empresário Luiz Athayde di- deixá-la aqui, para uso interno em nos-
empresários. além de constituintes, e zia: "Tecnologia é poder; tecnologia não so país".
lançou um manifesto de criação (veja se transfere. Se nós não criarmos aqui A Cebracan terá, corno urna das prin-
íntegra. adiante). no qual rebateu o mi- dentro os nossos próprios caminhos, cipais metas, a de atuação iunto aos go-
lionário programa patrocinado por assim corno fez o Japão (tanto que a vernos, para que dêem atenção aos
transnacionais e exibido em julho, em máxima dos programas japoneses é de centros de tecnologia, ao desenvolvi-
rede nacional de televisão, segundo o c;1p,tal se faz em casa, tecnologia se faz mento da ciência autônoma brasileira.
qual a constituinte estaria fechando a em casa, nós não alcançaremos nunca a
economia brasileira. condição de país autônomo. de país Disposição para lutar
"Este argumento é absolutamente próspero. Achamos fundamental que
falso e ardiloso - diz o manifesto dos este campo científico seja totalmente "Em vários campos, já demos provas
empresários - pois não existe essa in- desenvolvido no Brasil". de que somos capazes de alcançar a
ternacionalização da economia. Veja- Conforme Luiz Athayde, "falamos autonomia - diz o empresário. Áreas
mos o exemplo do Mercado Comum em importar empresas, com a ilusão de onde obtivemos sucesso foram exata·
Europeu, que deve ser seguido pelo que elas trarão tecnologia, "mas elas mente aquelas em que houve a reserva
Brasil". trazetn a tecnologia para uso próprio, de mercado, numa atuação firme do go-
Na presidência dos trabalhos, por jamais para transferir a tecnologia e verno brasileiro, corno é o caso típico da
ECONOMIA EtfPRESA BRASILEIRA

tecnologia de águas pr ofundas desen-


volvida pela Petrobrás, com pessoal
brasileiro e engenharia br asi lei ra".
A solenidade de instalação demons-
trava o clima de disposição para a lut a
pelo desenvolvimento: nas paredes, em
volta, faixas como "Empresa nacional -
desenvolvimento com soberania", ou
"Abifina pela tecnologia e produção na-
cional", ou "A empresa nacional e o
mercado: patrimônio do povo brasilei-
ro", ou ainda "desenvolvimento com
soberania".
No plenário, Justino Felício Perius,
da Fecotrigo, explicava sua participação
como decorrência do fato de que o coo-
perativismo é 100% nacional: "Quere-
mos participar, para que a empresa na-
cional possa se desenvolver com nossos
próprios recursos , e entendemos que Embraer e lnpe: o
f uturo é o d om lni o
os recursos estrangeiros são bem vin- da tecnologia
dos, desde que ajustados aos objetivos
brasileiros". O nascimento da
Edmundo Castilho, da Unimed (so- Cebracan recebeu o
ciedade do cooperativismo médico), deu incentivo de diver-
também a sua posição: "Vimos partici- sos setores e nomes
par de um movimento de defesa dos representativos da
interesses nacionais. Achamos que o luta pelo desenvol-
capital estrangeiro será bem vindo, mas vimento nacional. O
na medida em que trouxer know how, professor José
trouxer empreendimentos produtivos Walter Bautista Vi-
geradores de empregos, e tudo mais. da!, que há 30 anoc:
Agora, o capital colonialista, espoliador, se dedica ao desen-
desse a gente é adversário". volvimento da ciên-
cia e da tecnologia
Os seto res no Brasil, mostrou a
importância históri-
O vice-presidente da Cebracan, Ro- ca da instalação da
berto de Sá, destacou, durante a soleni- Câmara de Empre-
dade de instalação, a representatividade sas Brasileiras de
da nova entidade: "Os setores estratégi- Capital Nacional, enquanto o líder do ministro Paulo Lustosa, presidente do
cos estão conosco. Ou seja: toda a área PCB, Roberto Freire (PCB/PE), hipote- Cebrae.
de informática está com a gente, toda a cou solidariedade, o mesmo fazendo o
área de química fina, toda a área da in- presidente do PSDB, senador Mário Co- Direção
dústria farmacêutica, a área de robótica, vas (PSDB/SP) e o também senador Se-
a de distribuição especial, como o sindi- vero Gomes (PMDB/SP). Luiz Otavio Athayde, vice-presidente
cato dos transportadores de derivados A Frente Parlamentar Nacionalista, da Associação Fluminense da Pequena
de petróleo". co-organizadora do evento, saudou a e Média Empresa-Flupeme, foi empos-
Virgílio Perius, da Organização das nova entidade, ·através do deputado sado como presidente da Cebraca n.
Cooperativas Brasileiras, destacou, por Nelton Friederich (PSDB/SC), enquanto Foram empossados dois vices-presl-
sua vez, que as 3.500 cooperativas bra - pelo PDT se manifestaram os deputa- dentes: Roberto Oliveira de Sá, rep re-
sileiras são de capital genuinamente na- dos Luiz Salomão (PDT/RJ) e Raquel sentante da indústria nacional de anti-
cional. "Queremos nos somar a essas Cândido (PDT/RO) . Também participa- bióticos, e Álvaro Faria, do sindicato na-
forças na luta pela preservação das em- ram da solenidade o prefeito Saturnino ciona l dos transpo rtadores de combus-
presas brasileiras. Na área agrícola, o Braga (PSB/RJ), o deputado Aldo tíveis. Pedro Ynterian, da indúst ria de
cooperativismo representa 50% da pro- Arantes (PCdoB/GO), Fernando Gaspa- produtos de laboratório, é o secret ário-
dução deste país". rian (PMDB/SP), e o ex-deput ado e ex- geral. •

1988-N '2 113 tercei ro m undo - 65


OPINIÃO

Avisão jornalística da História


sobre a história secreta do Al-5, uma gan" do Jornal falado da Rádio Na-
Neiva A1orelfa sinistra ferramenta ditatorial, cuJos cional, e analisando-os de perto, é
autores ainda ai estão, sem que se natural que o testemunho dos jorna-
conheça de sua parte qualquer ini- listas ganhe a autenticidade e o rea-
.
J
ornalistas-escntores ou es- cIatIva de autocrítica. lismo que os leitores sabem apreciar•
critores-jornalistas não são A experiência de Samuel Wainer, Por outro lado, a qualidade do estilo,
raridade. O oficio de ambos é num dos momentos mais complexos acessível a todos, estimula o interes-
assemelhado, sobretudo quando o e decisivos da nossa história con- se pela leitura, mesmo quando os
enga1amento político e social os in- temporânea, resultou num best-sel- temas são mais complexos e esca-
sere no. âmbito e na dinâmica dos ler, que continua a provocar polêmi- pam à simples narrativa testemunhal.
acontecimentos. "Os Sertões" são, cas. José louze1ro e Arthur Poerner Isso não significa que não haja
essencialmente, uma obra do melhor d1v1dem o tempo entre a redação e bons livros de escritores, de leitura
JQrnahsmo, que não exclui a análise JorgeArb eh
profunda de um fenômeno como
Canudos. Os livros de Hélio Silva têm
a v1vênc1a e o estilo do Jornalismo.
Hélio Fernandes. ainda no periodo
ditatorial. reuniu em um volume -
"Recordações de um desterrado em-.::==:::::::::::=::•!1::==:!!:S;;:-
Fernando Noronha"- uma coletânea
de seus desassombrados artigos pu-
blicados no auge da repressão e que
-i::::::::::=::;:;;_:~~:::;;:;~~~--
hoJe ganham valor histórico, como
contribuição ao julgamento de uma
época ainda não devidamente analisada.
Com o fim da ditadura, tivemos li-
vros muito interessantes de Jornalis-
tas, relatando quase sempre através
de experiências próprta!., aqueles
duros anos de cerceamento das li-
berdades, repressão e exílios. A crô- os livros. fácil e agradável e rnnus livros de
nica da guerrilha urbana nos propor- No âmbito dos temas mais ligados jornalistas, pesados e enfadonhos.
cionou I vros de êxito como os do ao exercício da profissão, destaco o Falamos em tese, sem espírito de
Gabeira e do Sirk1s. Fernando Mo- excelente livro de nosso colega de confronto.
rais, com o seu lidíssimo "Olga", Brasília, Aylê Selassié Ouintão - "O Alguns livros de 1ornahstas, re-
abordou um dos episódios mais Jornalismo econômico no Brasil de- centemente aparecidos, não se limi-
dramáticos do período Vargas, na pois de 1964" -. reduzindo às suas tam à informação ou à análise de fa-
mesma linha de pesquisa e denúncia verdadeiras proporções o chamado tos que lhes foi dado cobrir ou dos
de outro livro corajoso e documenta- jornalismo econômico. quais participaram. Abordam aconte-
do como o "Ha rry Berger", de José Atuando dentro dos aconteci- cimentos que a história oficial escon-
Joff1ly. mentos, "testemunha ocular da His- de ou tergiversa, mas que foram
Zuemr Ventura está escrevendo tória", como diria aquele velho "slo- fundamentais no nosso processo de
OPINIÃO

desenvolvimento político e social. restroika de GoriJachev,


Entre esses livros incluímos "Canu- uma visão por vezes
dos: a guerra social" de Edmundo cáustica, mas fascinante,
Moniz, o "Vendaval da Liberdade", da grande aventura do
sobre a luta da Abolição no Ceará, do homem no caminho do
repórter Edmar Morei e o "Desmo- socialismo.
ronamento do Mundo Jagunço", um A maneira clara e di-
estudo sobre o Contestado, do jorna- dática como esse gran-
lista catarinense Paulo Ramos De- de mestre do jornalismo
rengosky. Na mesma linha de pes- expõe fenômenos tão
quisa, Ivan Alves Filho acaba de lan- profundos quanto con-
çar "Memorial dos Palmares", um trovertidos, ajuda a en-
documentado trabalho sobre o epi- tender o intrincado e
sódio histórico, em cujo centro se aparentemente contra-
agigantava a figura de Zumbi. ditório avanço das
Há, sobretudo entre os jovens, idéias e dos movimen-
muito interesse pelos episódios mar- tos sociais, na perene
cantes da história revolucionária da luta contra o obscuran-
nossa época, como a Grande Marcha tismo e pela justiça so-
de Mao, a vitória dos vietnamitas sob cial. Os leitores, sobre-
o comando de Giap, em Dien-Bien- tudo os jovens, terão
Phu; as gestas cubana e sandinista de_ nesse livro respostas a
Sierra Maestra e Las Segóvias, e a do muitas indagações. Co-
Che Guevara nos Andes bolivianos; a mo diria Darcy Ribeiro
batalha de Luanda, a insurreição sul- nele "a História é pas-
africana contra o apartheid e muitos sada a limpo" e a dialética, acres- tos e a narrativa fluente e amena, que
outros. É fundamental conhecer es- centamos nós, trocada em miúdo. nele é a marca de uma extraordinária
ses e outros fatos históricos, como O trabalho de Moacir Wernek de experiência profissional. Não tenho
é igualmente importante saber o que Castro é, sem dúvida, um marco na dúvidas do êxito desse livro em nos-
se passou em Canudos, como atua- nossa vida cultural e política. Desde so país, sobretudo entre os jovens,
ram os jangadeiros cearenses na muito cedo me senti atraído pelo te- preocupados com os destinos co-
Abolição e o que havia por trás da ma da unidade latino-americana e, muns desse imenso conglomerado
guerra do Contestado. Os livros cita- no seu contexto, pela vida e a gesta de povos e territórios que o Liberta-
dos e outros da mesma linha são es- de Simón Bolívar. No exílio, todo ele dor desejou ver unido.
senciais a esses conhecimentos. na América de língua espanhola, Como se vê, sem serem candida-
Mas, nesta resenha, que é mais procurei ler mais sobre esse tema. tos - pelo menos por agora - à Aca-
uma informação sobre livros de jor- Mas, já antes de sair do Brasil e, so- demia, onde já estão notáveis jorna-
nalistas do que um esboço de crítica bretudo, depois que voltei, me cha- listas como Austregésilo de Athayde
literária, totalmente fora dos meus mou a atenção que, em nosso país, e Barbosa Lima Sobrinho, nem tirar
planos, há que destacar dois exce- se conhecesse tão pouco de Bolívar e patente de escritor, nossos jornalistas
lentes trabalhos que acabo de ler que fosse tão escassa sua bibliogra- estão dando ao estudo da História,
quase sem pausa: "A Originalidade fia. uma contribuição que vai além do
das Revoluções", de Edmundo Moniz Moacir preenche esse deplorável trabalho cotidiano nas redações. Eles
e "O Libertador - A vida de Simón vazio cultural. E o faz com brilho e estimulam a ampliação da leitura e
Bolívar", de Moacir Werneck de Castro. competência, reunindo dois ele- levam ao conhecimento de fatos de
O livro de Edmundo nos dá, desde mentos de difícil coexistência entre ontem, decisivos na construção do
os clássicos Marx e Engels até a Pe- os historiadores: a fidelidade aos fa- hoje e do amanhã. o
SAÚDE \I li\\/()

Autismo:
Um mal desconhecido
Descoberto ha decadas, mas ainda pouco conhecido, o autismo pennanece um enigma para a ciencia e uma
fonte de angustia para a familia. que ve seus doentes marginalizados pela sociedade e pelo Estado

Clauda Neva

pesar de atingir segundo cálcu-

A los da Organização Mundial de


Saude (OMS). uma em cada dez
m I crianças, a Síndrorre do Autismo
a nda é uma doença pouco conhecida
Caracterizada, principalmente, pelo Iso-
amento da criança, ela permanece um
n gma para a ciência não se sabe, ao
certo. suas causas nao hã um consenso
obre qual a melhor forma de trata-
mento, e. o pior. ainda nao existem
perspectivas de cura
No Terceiro Mundo, o problema é
ma s d1f1c1I de ser enfrentado Por um
lado a carência de recursos para pes-
quisa e a desinforlT'ação generalizada
tornam os médicos dependentes do re-
sultado dos estudos realizados nos paí-
ses mais desenvolvidos A literatura so-
bre o tema, porém, é d1fíc1I de ser obtida E importante q ue as crianças autistas tcnhãm educado especializada e lazer
e chega normi=lmente com uma defasa-
gem de anos Por outro lado, o precário para caracterizar a perda de contato do seus exames neurológicos e de labora-
atendimento médico nos serviços de indivíduo cem a realidade, o que acar- tório (inclusive o eletroencefalograma)
saúde estatais deixa a família do autista retaria, em consequência. uma 1mpossI- eram normais, levou o estudioso a des-
sem ter a quem recorrer. bihdade ou grande dificuldade para se crever. de forma pioneira, a doença, que
Para eles, o drama começa no diag- comunicar com os demais. Foi: porém, ganhou seu nome: "Síndrorr,e de
nóstico. como a desinformação sobre o L. Kanner quem descreveu, em 1943, o Kanner"
autismo ainda é grande, frequente- autismo precoce, como uma doença Estudos posteriores mostraram que
mente ele é confundido com outras mental especifica, que atinge as crianças o autismo. tal como foi descrito por
doenças mentais O problema. porém, nos seus primeiros anos de vida. Kanner, era uma doença rara, mas que,
não pára aí: após o diagnéstico, em ge- Estudando pacientes infantis que em suas manifestações mais amplas, ou
ral feito tardiamente, vem a descoberta apresentavam um comportamento de seja o comportamento autista, ocorria
ée que não existem locais especializa- isolamento extremo. mas boa potencia- com relativa frequência. De acordo com
dos no tratamento do autista. O que fa- lidade intelectual, entre outras caracte- a Organização Mundial da Saúde
zer, então7 rísticas. Kanner observou que o seu (OMS), uma em cada dez mil crianças
quadro se diferenciava dos que sofriam apresentaria a síndrome. Já segundo
A ciência descobre o autismo de esquizofrenia infantil ou oligofrenia pesquisas realizadas na década de 70 na
(retardamento mentall. A constataç o Dinamarca e Inglaterra, o autismo atin·
O termo "autismo" foi usado pela de que essas crianças não apresentavam gíria cinco em cada dez mil cria nças.
p rimeira vez por E Bleuler, em 1911, nenhuma lesão orgânica no cér· bro e aparecendo com uma frequência quatro

68 - tercei ro mundo
SAÚDE AVT/S",1O

vezes maior nos meninos do que nas definitivas é ·a origem da doença. Uma
meninas. corrente de especial stas tende a consi-
derar o autismo uma doença psicogéni-
A margem do Estado ca, isto é. causada por problemas psi-
cológicos, pelos quais os pais seriam os
Nos 40 anos que nos separam da responsáveis. Moacira contesta essa te-
descrição da doença. pouco se avançou se:
no conh!!cimento e divulgação do au- "Segunde essa linha de raciocínio, a
tismo. Apesar das pesquisas realizadas. criança se isola porque não suporta os
muitos países, como o Brasil, ainda não problemas do mundo externo, como,
reconhecem o autismo corro uma para dar um exemplo, o fato dos pais
doença mental especifica A consequên- viverem uma relação conflitiva. Acho
cia disso é que milhares de crianças nao difícil sustentar essa teoria, já que e au-
têm acesso à assistência médica estatal, tismo se manifesta nos primeiros meses
o que condena a maioria a viver sem de vida. Custa acreditar que nessa etapa
nenhum tlpt> de tratamE nto especializa- a criança 'prerreditadamente' decidiu se
do. isolar do mundo .. ", afirma.
Para a psicóloga Moacira Garcia Ve- Moacira " A familia precisa de apoio" Moacira ressalta, no entanto, que "a
rãnio Silva, que dirige, Junto com a as- influência do aspecto psicológico é
sistente social Judith Pereira da Cunha, sidade de recorrer a instituições psi- muitas veles yrr agravante e, como tal,
a Cra"psi- Comunidade Recreativa e quiátricas de regime asilar". deve ser lev~do em consideração. Por
Atendimento Psicossocial - voltada para Moacira explica que o autismo é en- isso, é tão importante que o aspecto
o tratamento de crianças com dificulda- quadrado como uma psicose infantil, psicológico tenha uma interferência te-
des no processo de socialização - esse é doença mental em que a pessoa cria rapêutica, através do trabalho com a
urr dos mais graves problemas enfren- uma realidade interior mais rica do que própria criançé! e, prir.cipalmente. da
tados pela família do autista. Sem apoio a exterior. Mas enfatiza que, apesar de orientação e apoio aos pais de autistas",
dos órgãos de saúde do governo, a manter-se isolada, a criança vive. à sua assinala.
criança muitas vezes é abandonada pela mr1neira, dese1os e afetos: "O autista Ela revela que existem casos de
familia que não tem recursos: "É co- apresenta a necessidade de sentir prazer crianças que ct:egaram a se alfabetizar -
mum encontrarmc,s nos hospícios. com a vida e não só consigo mesmo. nunca através de• um método de apren-
adultos wtistas sendo tratados como Por isso, é indispensável que se pi;,opicie dizagem formal - mas c,ue, no Brasil, is-
deficientes mentais". a ele o lazer, a educação especializada e so é raro, por causa da dificuldade de
A psicóloga explica que a criança au- a inserção sócio-familiar. Associado a diagnóstico precoce e da falta de clínicas
tista alcança a vida adulta, em termos qualquer intervenção terapêutica, de- especializadas. "O diagnóstico é o ponto
cronológicos, mas o seu desenvolvi- vemos lutar também para promover a de partida para que se possa traçar um
mento ocorre com lacunas e de forma organização primária dos impulsos afe- plane de tratarl'ento adequado e, dentro
desarmônica. Sendo assim, seu desem- tivos e orgânicos, bem como as condu- c!o possível, clarificar o prognóstico. Es-
penho global mostra-se aquém de sua tas primárias de sociabilidade". sa triade - diagnóstico, tratamE nto e
idade cronológica: "Por apresentar tais A psicóloga ressalta que o trata- prcgnóstico - é importantíssima e inse-
atrasos especificos, o autista é confun- rr.ento não tem uma receita pronta: " E parável Somente quando ela existe
dido muitas vezes corr o deficiente necessária a participação de diferentes como um todo integrado, o desenvol-
mental, o que leva a uma intervenção profissionais: pediatras, ne uropsiquia- vimento da criança está amparado. Não
terapêutica e/ou pedagógica inadequa- tras, psicólogos, fonoaudiólogos. tera- podemos encobrir o fato de que o de
da". peutas ocupacionais. pedagogos, assis- senvolvimento da criança ocorre, mes-
Para os pais, a necessidade de apoio tentes sociais. Através desse trabalho mo que de forma atípica, e ele de"e ser
Por parte dos órgãos estatais não se li- conjunto, se conseguem resultados. estimulado e respeitado", conclui a psi-
mita, portanto, à fase infantil: "De fato - ri-as é bom enfatizar que o comporta- colcga.
continua - o apoio assistencial ao au- mento psicótico é marcado por avanços Por apresentar uma doença com ca-
tista e sua família é de suma irrportân- e regressões. Ou seja, um dia, por al- racterísticas muito complexas, a orien-
c1a, mas não podemos esquecer que es- gum motivo, a criança entra em crise e tação de um terapeuta aos pais é um
sa criança vai crescer e, quando adulto, volta a uma etapa que Já havia SL pera - requisito fundamental para o trata-
continuará necessitando de acorr pa- do" mento do autista. A assistente social
nhamento. Só recebendo apoio durante Judith Pereira da Cunha assinala que a
toda a vida, a família tem condições de Origem desconhecida existência de uma criança com proble-
continuar assumindo o árduo trabalho mas é um foco gerador de muita ansie-
de educar e relacionar-se com ele, di- Um dos pontos mais estudados e so- dade na família, bem como de senti-
minuindo, consequentemente, a neces - bre o qual ainda não existem conclusões mentos de revolta e impotência. "Na
SAÚDE unrno

verdade, nenhuma pessoa foi preparada tros prof1s siona1s é muito importante Temos todos que
para receber um filho com uma altera- Mas a falta de maior mformaçao so- estar abertos para aceitar o impossível
ão em seu desenvolvimento No caso bre o autismo nas universidades faz da crmnça".
do autismo, as dificuldades especificas com que poucos prof1ss1ona1s da área Ehsabeth foz questão de ressaltar
1 são mais do que conhecidas, mas ca- este1am preparados para atender crian- que o resultado a ser conquistado nao é
be a nos encontrar Junto à familia pon- ças com esse problema. Para Ehsabeth que a criança fale, mas que se comum-
tos que facilitem e propiciem um me- D'Albuquerque - fonoaudiologa que ha que "Conheço o caso de uma fcimiha,
hor relacionamento. Devemos, como dez anos trabalha com crianças autistas que considerou curada a criança por-
técnic-os, au,dliá-los a encontrar solu- -. o desconhecimento leva muitos pro- que, após um tratamento equivocado,
çoes e redinamizar esse núcleo" f1ss1ona s a re1eitarem esse tipo de pa- ela conseguia dizer várias frases Na
ciente "Muitos têm medo Não conhe- verdade, eln tinha apenas memori,ado
A barreira da linguagem cem a patolQ91a, e por isso resistem a e pressões. o que é comum entre os
cuidar dessas crianças Por outro lado, autistas Paro qualquer pergunta, a res-
Para a família. o aspecto talvez mais não conseguem encarar bem o fato de posta da cr1anca era: 'Bom cf1a-como
doloroso do autismo é a d1f1culdade de que os resultados realmente, são ml- está você-e sua familia-eu vou bem-
estabelecer uma comunicação com a mmos e lentos" obrigado ' Ela falava como se fosse um
criança, principalmente através da hn- Para que o tratamento dê resultado robô"
uagem oral Romper essa barreira é Ehsabeth considera fundamental a cola- Um dos pontos que levanta mais
um trabalho que leva anos e para o boração da familia • Como a criança polêmica na questão do autismo são os
qual é fundamental a part1c1pação passa muitas horas do dia em casa o estudos segundo os quais a doença se
um fonoaud1ologo ao l:tdo de ou traba ho con unto com os pa1c; 1rmaos wanife>sta e>m gNal, nas classes com

Encontrando 7 dessas caracterfst1cas - em idade


inadequada e de modo pers1Stente - o diagnóstico
de aut smo deve ser senamente consklerado
G1r1 ob'etos d e m1n11r1 Nlo mant•m
b1z1rr1 • peculiar contacto VIIUII

Rea,111 1 mud1nça1 Aes,ste ao Usa pessoas como Não demonstra medo


dl roun1 11prend1zado lerr1m1nt11 de per,0O1 re111

Apego nl o apropn1do
1 ObJetOS
Aes,ate ao
contacto lía,co
Aa vezes é agreulvo
e dellrut,vo
t,
Modo e comportamento
ind1lerent1 • 1rrld1O

----a,,--
---- -.- --
----
'ã l
, ~~

Age como se fosse Não se m,s1ura com Acentu1d1 A,sos e mov1mento1


surdo outras cr,anças h1perat,v1d1de llaa nêo apropriedoa

70 - t reerro mundo
SAÚDE Aunrno

Os pais se unem dro Paulo Rocha, engenheiro eletrô-


nico e professor, explica que o prin-
O A n~cessidade de_ trocar infor- ções e experiências foi fundamental cipal objetivo da Associação é inter-
maçoes e se apoiarem mutua- para entenderem o problema de seus cambiar informações, "na busca de
mente levou pais e amigos de crian- filhos: "O trabalho com as crianças soluções para os nossos problemas".
ças autistas a fundarem grupos para autistas deve partir dos pais, pois
Como a maioria dos pais, Pedro
análise e divulgação sobre a doença, somos nós a peça-chave no seu tra-
Paulo, que tem uma filha autista,
como a AMA (Associação de Amigos tamento", enfatiza.
passou por uma série de especialis-
do Autista). A primeira AMA surgiu Selma não poupa críticas à de- tas, sem que nenhum deles conse-
em São Paulo, em agosto de 1983, e sinformação da classe médica em
guisse diagnosticar a doença. Ele
hoje já existem similares em vários geral: "O pediatra deveria ser o pri-
conta que foi só através de um filme,
outros estados do país. meiro a conhecer a doença. Fui obri- que tomou conhecimento da existên-
A AMA realiza reuniões periódicas gada a fazer uma verdadeira peregri-
cia do autismo, há seis anos: "Pela
entre os associados, além de promo- nação durante anos, batendo na
primeira vez, eu via uma descrição
ver atividades específicas para as porta de diversos médicos. Cada um
dos sintomas e características que
crianças: " Fazemos passeios e pi- me dava um diagnóstico diferente, apresentava minha filha. Só aí, co-
queniques. É importante que a crian- desde surdez até problemas neuro- mecei a pesquisar o assunto".
ça também brinque. O autista, ao lógicos. Houve até um que me disse
O presidente da Aparj é enfático
contrário do que pensam muitas pes- que é ' normal' a criança não falar até ao criticar a tese de que o autismo
soas, pode nadar, andar de bicicleta, os quatro anos ..."
teria causas psicológicas: "Não acei-
etc. cõmo qualquer outra criança", Outro grupo voltado para a divul- tamos a tese· da rejeição. Segundo os
afirma a advogada Selma Andrade gação e estudo da doença é a Aparj
estudos mais recentes, o autismo te-
Brandão, presidente da AMA-NI (Associação de Pais de Autistas), que ria um conjunto de causas orgãnicas,
(Nova Iguaçu, município do Rio). reúne no Rio de Janeiro 100 pais e 50 como por exemplo, o aparecimento
A descoberta de que seu filho, profissionais envolvidos com o pro-
da rubéola e infecções viróticas na
hoje com 12 anos, era autista fez com blema. Criada em 1985, a Aparj esti- fase pré-natal, fatores hereditários,
que, pouco a pouco, Selma fosse en- mula a discussão do autismo, através deficiência do sistema imunológico
trando em contato com outros pais da realização de seminários, pales -
etc. A abordagem psicológica influi,
que passavam pelo mesmo proble tras em escolas, reuniões e troca de
mas não é a causa", afirma Pedro
ma. Para ela, a troca de informa- trabalhos. Seu atual presidente, Pe- Paulo.

maior poder aquisitivo. Vários médicos haja cura, quanto mais cedo inicie um preciso ter também uma visão social cio
contestam esse fato, assinalando que, tratamento, maiores serão as cha nces problema: " Num hospital público, pór
embora essa estatística possa ter sido de sair do isolamento em que vive. exemplo, essas questões sociais se ma-
feita de forma séria, ela não espelha a Apesar da complexidade da doença, nifestam de forma mais aguda. Para
realidade. Para Elisabeth, a dificuldade o neuropsiquiatra Aníba l Coelho do uma família pobre, tratar de um autista,
de acesso à assistência médica, sobre- Amorim ressalta que isso é possível: como de qualquer outro doente, é um
tudo nos países menos desenvolvidos, "Dentro de seus limi tes, o autista pode dilema : ou compram o remédio que o
não permite avaliar qual é a verdadeira até ser 'feliz' e 'se integrar' ao mundo, doutor mandou o u compram comida.
proporção de casos de autismo nas só que à sua maneira". O dr. Aníbal - Por isso, nem no caso do tratamento do
classes mais pobres. "O lavrador do in- que trabalha no Hospital de Neuropsi- autista se pode deixar de levar em conta
terior - afirma - Jamais saberá que o fi- quiatria Infantil Pedro li - lembra, no o contexto social".
lho é autista. Para ele, a criança é 'ruim entanto, que é muito difícil para a famí- Para ele, o primeiro passo para mu -
da cabeça' e não autista, doença sobre a lia compreender esse fato. E explica dar essa situação seria realizar um tra-
qual certamente ele nunca ouviu falar" . porquê: "Num sistema como o nosso, a balho a nível dos postos de saúde e da
sociedade cobra muito da família: a rede escolar: "Só assim, poderíamos
Pressão social criança tem que ser preparada para fu- diagnosticar precocemente se a criança
tu ramente conseguir um diploma, um tem um quadro de deficiência ment al ou
Tão importante quanto estudar as bom emprego, o carro da moda, enfim, física (como surdez) e proporcionar-lhe
causas do autismo é dar uma resposta alcança r o que se entende por 'sucesso'. um tratamento adequado. A inexistên-
agora ao problema. Enquanto a ciência A questão que se coloca, então, é se cia de um trabalho desse tipo por parte
não chega a um consenso sobre suas vamos tratar o aut ista para proporcio- dos órgãos públicos faz com que, quan-
origens e melhor terapia, é importante nar- lhe bem-estar, físico e mental, ou do o autista chegue até nós, seu quadro
abrir espaços, nos quais os autistas re- para inseri-lo num mercado de trabalho esteja tão comprometido que já é muito
cebam alguma assistência. O tempo, altamente competitivo". difícil diferenciá-lo de um deficiente
nesse caso, é fundamental . Embora não O dr. Aníbal enfatiza, portant o, que é mental;', conclui dr. Aníbal. o

1988_: Nº 113
terceiro mundo - 71
SAÚDE AUTIS\/0
<
'
çao, aliás. cro um verdadeiro rit ual

A ··via-crucis·· ela familia queria sempre a mesma comida, dis-


posta do mesmo ,eito na mesa. Custava
fazê-lo provar algo novo, como por
arilene exemplo, um chocolate. A princípio, ele

M Marques
Vieira
Santos é professora
sempre rejeitava".
Uma das maiores angústias de Ma-
nlene era descobrir se seu filho estava
de literatura. Tem com algum problema: "Como toda
dois filhos. David, criança autista, ele não falava sim. Eu ti·
de seis anos. e Alba, nha que advinhar tudo, desde um pro-
de 14 anos. Há cer- blema mais sôrio, atô uma simples dor
ca de três anos, de barriga"
Marilene. depois de Outra caracteristica do autismo apre-
percorrer inúmeros sentada por David era a 1mposs1b1hdade
consultórios médi- de adquirir sua 1dent1dade: "A principio
cos, soube que o ele não aceitava nem olhar no espelh o
seu filho era autista. Depois, olhava, mas nao se identificava
O seu depoi- com a imagem que via refletida". Con
mento Ilustra bem o sequência também desse problema era
drama vivido por o fato dele ser incapaz de utilizar o pro
muitas outras fami- r.1arilene ·o fundamental é dar multo amor li crianc:a· nome eu: "Quando começou a falar, no
lias máximo, David dizia: 'Alguém está com
"No começo, foi fome·. Ou então: 'As cnanças estão com
muito duro. O primeiro sentimento é de A primeira suspeita foi surdez, des- sede'".
revolta, pois é difícil para os pais aceitar cartada após os exames confirmarem Para Marilene. uma das piores fases
o fato. Além disso, eu não conhecia a que ouvia perfeitamente. "David apre- de David foi a época em que ele apre
doença e não tinha quem me orientasse. sentava outras características - conta sentou uma idéia fixa na imagem da
Passei. então. a procurar informações Marilene - que não eram as de uma cruz "Era uma obsessão. Com qualquer
sobre o assunto. a ler desde livros de criança surda. Ele se isolava constante- coisa, palitos de fósforos, canudinhos de
fonoaud1ologia até sobre patologia ce- mente (vivia atrás das portas e mesas), e refrigerantes. lápis, ele fa1ia a imagem
rebral. Comecei também a frequentar não permitia nenhum contato físico. Era da cruz. Quando não tinha ao alcance
reuniões de pais de crianças autistas e a impossível estabelecer qualquer tipo de nenhum obJeto, fazia a cruz com os de-
assistir palestras. Toda essa busca me comunicação com ele". dos. Essa fase passou sem que soubés
fez crescer muito". afirma Marilene. Até os 4 anos e meio, David não fala- semos a que atribuir aquela fixação".
Ela lembra que o primeiro fato que va: "Quando ele queria algo, nos usava HoJe. após anos de tratamento, David
lhe chamou a atenção no comporta- como instrumento. Por exemplo, se apresenta vários avanços· já faz diversas
mento de seu filho ocorreu ainda na fa- queria um copo de água, nos levava até coisas sozinho e, às vezes. até manifesta
se da amamentação: "Por mas fome a cozinha. Este talvez tenha sido um dos seus sentimentos. " Há alguns meses
que tivesse, era incapaz de mamar na aspectos mais difíceis de aceitar. E quando ele entrou em um momento de
presença de terceiros". muito duro para os pais que a criança crise. dizia o tempo todo: 'Estou caindo
Até os dois anos. "ele era muito não fale" estou caindo'. Para nós. é um grand
quietinho. Nem parecia que havia crian- O fato de não falar foi usado como avanço que ele chegue ao ponto de ex
ça na casa. Mas a partir daí, entrou nu- argumento pelos diretores para recusar pressar, ao seu modo, o que está sen
ma fase em que gritava muito". Já nes- David nas escolas: "Foi terrível. Eu me tindo".
sa época David apresentava também sentia ao mesmo tempo humilhada e Apesar de todo o sofrimento. Marile·
estereotipias. ou seja, a répetição, inde- impotente para mudar aquela situação. ne não desanima: "Sofri muito - afirm
finidamente. de um determinado mo- A única escola que o aceitou foi a 'es- - porque a carga em cima da mãe
vimento. "Ficava, por exemplo. se ba- cola da praça', onde ele ia brincar, enorme, mas me considero uma pesso
lançando. para frente e para trás, ou acompanhado da empregada ...", ironiza. feliz . Só o fato de David ter conseguid
mexendo com as mãos", lembra Ma ri Iene. Cerno tantas outras mães de autistas, ir sozinho ao banheiro. no final do an
A constatação de que David real- Marilene teve muita dificuldade para passado. foi um verdadeiro prêmio para
mente tinha algum problema sério sur- continuar trabalhando fora de casa: "A mim. Penso que o fundamental é da
giu quando começou a andar. "Ele era dependência de meu filho era total. Ele muito amor à criança. A familia dev
completamente ausente, não respondia não fazia nada sozinho, Era preciso ves- procurar aceitar a doença e se informa
quando o chamavam e não olhava nin- ti-lo, dar-lhe banho, levá-lo ao banhei- sobre ela. para que possa aJudar melh
guém nos olhos. à exceção de mim". ro;dar-lhe comida na boca. A alimenta- o filho" .

72 - terceiro mundo
LINHAS AÉREAS DE ANGOLA
A Serviço da Reconstrução Nacional
0 EJ,4PRESAS CONTROLADAS
e EMPRESAS COLIGADAS "'~1111
~~ Companhia
Vale do Rio Doce

MINISltRIO DAS MINAS E ENE~

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