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PROJETOS Ρ
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OR G'rN~4 1~r 4~.

iriain Dolhni
d Jose Binif~cio de Andrada e Silva
Coleςdo Retratos do Brash

1.Cartes Chilenas —TomYs Antöniο Gonzaga


org. Joaci Pereira Furtado
2. Apontamentos de Vagem — J. A. Leite Moraes
org. Antonio Candido
3. Jornal de Timmn — Joäo Francisco Lisboa
org. JosI Murilo de Carvalho
4. Memόrias da Smhrinho de Meu Tim
Projetos pam
— Joaquim Manuel de Macedo
org. Flora Siissekind
5. O Carapuceiro — Pe. Lopes Gama o Brasit
org. Evaldo Cabral de Mello
G. Glaura — Silva Alvarenga ORGANIZACA0:
org. Fύbio Lucas
7. Vossa ΙmοΙ ncia — Olavo Bilac
Miriam Dolhnikojf
org. Antonio Dimas
8. Retrato do Brasil— Paulo Prado
org. Carlos Augusto Calil
9. A Retirada da Laguna — Alfredo &Escragnolle-Taunay
org. Sergio Medeiros
10. Cmnflssδes da Bahia — Santo Ofίcio da InquisiΨo de Lisboa
org. Ronaldo Vainfas
11. AAlma Encantadora das Ruas— Joäo do Rio
org. Raill Antelo
12. Cόdigo do Bom-Tom — J. I. Roquette
org. Lilia Moritz Schwartz
13. Projetos pars 0 Brasil— Jose Bonif~cio de Andrada e Silva
org. Miriam Dolhnikoff

Conselho editorial:
Antonio Candido
Joäo Moreira Salles
Lilia Moritz Schwartz
Maria Emilia Bender
COMPANHIA DAS LETRAS
jose Bonifάcio entrou para a histόria do Brasil
como ο Patriarca da Independencia, figura-chaνe no
processo de funda~äo do novo pals. No entanto,
as diversas faces desse estadista permanecem em boa
parte desconhecidas, a nao ser por alguns poucos
pesquisadores que estudam ο perlodo. Bonifάcio nao
fοί apenas polίtico, mas tambem pensador e cientista,
tendo se empenhado em estudar economia, falosofza,
literatura e histόria, alem das pedras e minerais
que compunham ο objeto da sua especialidade,
a mineralogia. Como cientista e, mais tarde,
nos longos anos de exllio, dividiu seu tempo entre
a leitura e a escrita; deixou inύmeros textos,
muitos ainda iniditos.
Ο centro de suas preocupa~öes estava no desafio
de construir na America um pals moderno
e civilizado, ο que significava empreender reformas
de fundo, como o fim da escravidäo, a reforma
agrYria, ο acesso de todos ά educa}do etc. Em seus
escritos, ο autor analisa ο Brasil e apresenta suas
propostas, ao mesmo tempo que desfere crlticas aos
seus contemporáneos, em especial a d. Pedro I.
Os allos de suas observa}óes 'icidas vao da Igreja
Copyright © 1998 by Companhia das Letras PROJETOS PARA O B R A S I L

Copyright da odu~äο, cronologia e notas © 1998 by Miriam Doί hnikolf


Projeto grYfico:
r
Victor Burton INDICE
Capa:
Victor Burton
• sobre detaihe de "Rua Direita no Rio de Janeiro",
Ι~pis e nanquim sobre papel de Johann Moritz Rugendas
ΡreparaΨo:
Carlos Alberto Inada
Revisäο:
Clńudia Cantarin
Isabel Jorge Cury

Dados Intranadonais de Catalogaςδo πα Publicaςáo (cu)


(Cimara Brasileira do Livro, sr, Bras!!)

Silva, Josd Bonifδcio de Andrada e, 1763-1838.


Agradecimentos 11
Projeros para ο Brasil / Jod Βοηίfδύο de Andrada e Silva; organi-
ταρο Miriam DoihoikofE — Sbo Paulo : Companhia das Ixrras, 1998. Introduςáo 13
saN 85-7164-744-5 Cronologia 37
1. Brasil —Civiliτaςάo2. Brasil—Hisεrίria— ι Reinado, 1822-1831
3. Polirkos e estadisras — Bras!! — Bibliografla 4. Silva, Jod Booifdcio
de Andrada e, 1763-1838;. Dolhnikoff, Miriam a. TItulo
PROJETOS PARA O BRASIL
98-0208 cDD-981.041

indices para cardlogo sistemYtico:


1. Estadisras brasilciros : Textos : Primeiro
Reinado, 1822-1831 : Brasil : Histdria 981.041

ESCRAVIDÄO
1998
Αή1∆ΓΙkαπlsεή
g ;
ηθ• οs direitos desta ediςäo reservados ά
/ι~ •.,EDITORA SCHWARCZ LTDA. Representaιräo ά Assembleia Gera! Constituinte e Legis-
ι ~@Υ Ί t f5
\) Rúá Bandeira Paufista, 702, cj. 72
— So Paulo— sP lativa do Imperio do Brasil sobre a escravatura . . . 45
~ΘUBls εher Kultu ~ " Telefone: (011) 866-0801
Regulamento sobre a escravatura 83
Fax: (011) 866-0814
e-mail: coletras@mtecnetsp.com.br Avulsos 86
Ί N DAC E
PROJETOS PARA O B R A S I L

Apontamentos 156
ΊNDIOS
Colónia de pretos 158
Apontamentos para a civilίzaςäo dos Indios bravos do Im- Para ajuizar sobre ο estado politico da ηαςäο 161
perio do Brasil 89 Carta ao conde de Funchal 163
Civίlizaςäo dos Indios e coisas do Brasil 122 Avulsos 173
Os Indios devem gozar dos ρrivilegios da ταςα branca 126
Banir a ignorárιcia e antiga barbάrie de costumes . 128
Os Indios so preguiςosos e voluptuosos 133 BRASIL
Α major infelicidade que suportou a massa geral dos ho-
mens foi a conquista do Novo Mundo 134 Carόter gerat dos brasileiros 183
las aldeias novas, cada familia deve ter a terra precisa A povoaςΡäo do Brasil 184
para se sustentar 138
Tudo se rege por caprichos 185
Os Indios so muito imaginativos 141
Avulsos 186
Avulsos 143

POLΊTICA
REFORMAS

Sobre a fidalguia 194


Palάdio contra revoluςöes polIticas 150
Na execuςäo no Μ segredo comparάvel ά celeridade 198
Para conservar-se um Estado 151
Os bras ileiros querem ter liberdade 200
Apontamentos sobre as sesmarias do Brasil 152
Hάbitos sultänicos 204
Lembran9as avulsas 154
155 Todo governo em revoluςäo sό faz descontentes . . . . 206
Misturemos os negros com as inclias

Ϊ
P R O J E T O S PARA Ο B R A S II.
IMOICE

Α dissolu4äo da Assembleia foi mais que um crime, foi Debilidade e pobreza do reino 266
um erro palmar d 212 Avulsos
271
Ο mecanismo do interesse destrόi os sentimentos hon-
rados e sublimes 218
Ο imperador e os άulicos 220 REFLEXÓES SOBRE LITERATURA,
Notas pro domo 224 FILOSOFIA E RELIGIÄO
Lisonja continua 227
Quando ο ΟΝΟ e fraco, murmura 229 Literatura 273
Έ preciso dissimular as desordens dos partidos 230 Heresias IiterYias 273
Acanhada musa 234 Fins do escritor 282
De que serve uma Constituiςäo em papel? 235 Literatura espanhola e portuguesa 284
Erro capital 236 Avulsos 299
Perfido Pedro 240 Filosofia 305
Rapaz mal-educado 241 Forςa primordial 305
Emprestimo oneroso 243 Filosofia 306
Decreto secreto do imperador als jornalistas 245 Ο homer primitivo 307
Avulsos 248 Ο divino Platäo 310
Avulsos 312
Religiäo 318
ECONOMIA Pureza de costumes 318
Guin~ 319
Ο governo deriva da propriedade 259 Avulsos 322
PROIETOS PARA 0 BRASIL PROJETOS PARA o BRAS' I

MISCELANEA
AGRADECIMENTOS

Mulheres 325
A natureza humana 330
Portugal 337
Causas da näo-prοsperidade das ciencias naturals em
Portugal 340
Outros 341

α organizaςäo deste volume contei corn a inestimά-


PESSOAL N vel colaboraς äo de Luis Dolhnikoff. Corn seu pro-
(undo conhecirncnto da lingua portuguesa foi ο responsY-
DiYrio de observaςóes, e notas sobre as minhas leituras, 1cl pela revisäo ortogrάfica. Fez tarnbem a pesquisa e redaςäo
conversaξöes, e passeios 347 de parte das notas. Graas ά sua generosidade, pude contar
Notas sobre ο meu carάter 355 corn um precioso conselheiro que interferiu corn valiosas
Reflexóes sobre ο meu carter 358 sugestóes em todas as etapas do trabalho.
Temperamento fervido 360 Agradeςo tambem a Ricardo Jensen de Oliveira pelas
Leve ο diabo aos que tern os joelhos dobradίςos, e a bo- traduςóes do latim, frances e italiano. Alem do trabalho de
ca risonha 363 traduςäo, Ricardo tambem realizou a pesquisa para identi-
Avulsos 367 ficar a origern das citaςóes latinas e francesas.
Agradeςo ainda aos companheiros do Cebrap, em espe-
cial a Luiz Felipe de Alencastro, John Monteiro, Angela
Alonso, Pedro Puntoni e Alvaro Commn pelas valiosas su-

v 11
PROJETOS PARA O BRASIL

:..:................
• ESCRAVIDAO •

χEpRESENTA ςLJOAASSEΜBLΈIA GERAL CONS TI-


TUINTE Ε LEGISLATIVA DO ΙΜΡΈRIΟ DO BRASIL
SOBREA ESCRAVATURA*

Chegada a epoca feliz da regeneraςäo poll tica da ηαςäο


brasileira, e devendo todo cidadäo honrado e instruldo con-
correr para täo grande obra, tambem eu me lisonjeio que
poderei levar ante a Assembleia Geral Constituinte e Legis-
lativa algumas ideias, que ο estudo e a experiencia tem em
mim excitado e desenvolvido.
Como cidadäo livre e deputado da ηαςäο dois objetos
me parecem set, fora a Constituiςäo, de major interesse para

*~ *Tftulo do autor.

Ας
PROJETOS PARA O B R A S I L ESCRAVIDAO

a prosperidade futura deste imperiο. Ο primeiro έ um flOh mancipa$o progressiva dos escravos, agitam-se
a favor da e
regulamento para promover a civiliz;ςäο geral dos Indios ίmigos da humanidade como outrora; mas
utra vez os in
di Brasil, que faräi corn ο andar do tempo inύteis os escra- justiςa e generisidade do polo ingles, que se con-
espero da
vos; cujo esboςo j comuniquei a esta Assembleia. Segun- mancίpaςäo, como jά se conseguiu a aboliςäo de
segυirά a e
jfamc trάfico. Ε por que os brasileiros somente εοη-
do, uma nova lei sobre ο comercio da escravatura, e trata-
täο
mento dos mίserάνeis cativos. Este assunto faz ο objeto da a ser surdos aos gritos da razäo, e da religiäo cristä,
tίηυaräο
atual representaςäo. Nela me proponho mostrar a necessi- ύnica
c iirei mais, da honra e brio nacional? Pois somos a
dade de abolir ο trάfico da escravatura, de melhorar a sorte de sangue europeu que ainda comercia clara e publi-
ηαςäο
dos atuais cativos, e de promover a sua progressiva emanci- nente em escravos africanos.
caι
ραςäο.
Eu tambem sou cristäo e filantropo; e Deus me anima
Quando verdadeiros cristäοs e filantropos levantaram a para ousar levantar a minha fraca viz no meio desta augus-
voz pela primeira vez em Inglaterra contra ο trάfico de es- tapssembleia a favor da causa da justiςa, e ainda da sä politi-
crabs africanos, houve muita gente interesseira ου preo- ςóes
ca, causa a mais nobre e santa, que pode animar cora
cupada, que gritou ser impossivel ου impoiltica semelhan- generosos e humanos. Legisladores, no temais is urros do
te aboliξäo, porque as colónias británicas no podiam escusar na carreira
sόrdido interesse: cumpre progredir sem pavor
um tal comercio sem uma total destruiςäo: todavia passou
da justiςa e da regeneraςäi politica; mas todavia cumpre
o Bill,' e no se arruinaram as cοlónias. Hoje em dia que
que sejamos precavidos e prudentes. Se ο aritigo despotismo
Wilberforces e Buxtonsz trovejam de novo no Parlamento
foi insensivel a tudo, assim lhe convinha ser por utilidade
prόpria: queria que fóssemis um povo mesclado e hetero-
J Bill: referencia ao An de 2 de marςο de 1807, aprovado pelo Parla-
geneo, sem nacionalidade, e sem irmandade, para melhor
mento británico, que aboliu o trάfico negreiro realizado pot sY'ditos ingleses. ~
1► ~ ~ William Wilberforce (1759-1833) e Sir Thomas Fowell Buxton (1786- nos escravizar. Graςas aos ceus, e ά nossa posiςäo geogrάfi-
1845): membros do Parlamento ingles, que tiveram importante papel na εα, jY somos um ρονο lίvre e independente. las como ρο-
αρrοναςάο de leis antiescravistas. derά haver uma Constituiςäo liberal e duradoura em um
PROJETOS PARA O BRASIL Esc R A V I D A O

pals continuamente habitado pot uma multidäo imensa de fisica e civil; cuidemos pois desde j em combinar sabia-
escravos brutais e inimigos? Comecemps pus desde jά esta ente tantos elementos discordes e contdrios, e em amal-
φ
grande obra pela expiaςäo de nossos crimes e pecados ve- tantos metals diversos, para que saia um todo homoge-
gamar
Ihos. Sim, ηäο se trata somente de sermos justos, devemos
n eo e compacto, que se no esfarele ao pequeno toque de
tambEm ser penitentes; devemos mostrar ά face de Deus e
qualquer nova convulsäo polltica. las que ciencia qulmi-
dos outros homens que nos arrependemos de tudo ο que ca, e que desteridade ηäο säo precisas aos operadores de täo
nesta parte temos obrado h seculos contra a justiςa e con- grande e dificil manjpulaςäo? Sejamos pois sYbios e pru-
tra a religiäo, que nos bradam acordes que ηάσ fafamos aos
dentes, porem constantes sempre.
outros o que queremos que ndo nos fa~am a nόs. Έ preciso pus
Corn efeito, Senhores, ηαςäο nenhuma talvez pecou
que cessem de uma vez os roubos, inceηdios, e guerras que
mais contra a humanidade do que a portuguesa, de que fa-
fomentamos entre os selvagens da Africa. Έ preciso que no
zίamos outrora parte. Andou sempre devastando ηäο sό as
venham mais a nossos portos milhares e milhares de negros,
terras da Africa e da Asia, como disse Camöes, mas igual-
que morriam abafados no poräo dos nossos navios, mais
mente as do nosso pals.* Foram os portugueses os primeiros
apinhados que fardos de fazenda: e preciso que cessem de
que, desde ο tempo do infante d. Henrique, fizeram um
uma vez todas essas mortes e martirios sem conta, corn que
ramo de com€rcio legal de prear homens lίvres, e vende-los
flagelάvamos e flagelamos ainda esses desgraςados em nosso
como escravos nos mercados europeus e americanos. Ainda
prόprio territόrio. Έ tempo pus, e mais que tempo, que
hoje perto de quarenta mil criaturas humanas so anual-
acabemos corn um trYflco täo bάrbaro e carniceiro; e tempo
tambem que vamos acabando gradualmente at os ύltimos
corn atenςáo o eloquentfssimo e veemente sermäo do padre
vestlgios da escravidäo entre nόs, para que venhamos a for-
Vieira da Μ Dominga da Quaresma que foi ο primeiro pregado em Säo
mar em poucas geraςóes uma ηαςäο homogenea, sem ο que
Luis do Maranháo em 1653, t. 12, Ρ. 316 e seguintes. Leiam-se tambem
nunca seremos verdadeiramente lίvres, resρeitάveis e felizes.
ουτεas obras do mesmo autor sobre esta matEria, e aplique-se αο cativeiro
Έ da major necessidade jr acabando tanta heterogeneidade dos negros. (Iota de Jose BonifYcio.)
PROJETOS PARA O B R A S I L EScRAVIDAO

mente arrancadas da Africa, privadas de seus lares, de seus que tido cristo deve promover, e espalhar: diz que
pais, filhos e irmäοs, transpirtadas άs }ιossas regióes, sem a 1h ο
esses infelizes mudam de um clima e pals ardente e horn-
menor esperanςa de respirarem outra vez os pUtrios ares, e fertil e amen; diz pot fir que, deven-
ara o utro, dice,
destinadas a trabalhar toda vida debaixo do αςοί te cruel de criminosos e prisioneiris de guerra mortos jmediata-
do οs
seus senhores, elas, seus filhos, e os filhos de seus filhos para rente pelos seus b-rbaros costumes, e um favor, que se Ihes
todo o sempre! -los, para lhes conservar a vida, ainda que seja
far, comprά
Se is negros säi homens como nόs, e ηäο formam uma
em catίveiro.
especie de brutos animais; se sentem e pensam como nόs, }-Iomens perversos e insensatos! Todas essas razóes apon-
que quadro de dir e de miseria ni apresentam eles ά imagi- alerjam alguma coisa, se vόs fósseis.buscar negros ά
tadas v
ηαςäο de qualquer homer sensuici e cristäo? Sc os gemi- liberdade no Brasil, e estabelece-los
pfrί ca para Ihes dar
dos de um bruto nis cindoem, e impissfvel que deixemis corn0 colons; mas perpetuar a escravidäo, fazer esses des-
de sentir tambem certa dir sirpάtica com as dcsgraas e ados mais infelizes do que seriam, se alguns fossem mir-
graς
miserias dos escravis; mas tal e ο efeito do cistume, e a viz tos pela espada da iηjustiςa, e at dar
azis certos para que
da εοδίςα, que veem homens correr !Ygrimas de outros se perpetuem tais horrores, e decerto um atentado mani-
homens, ser que estas Ihes espremam dos olhos uma sό go- festo contra as leis eternas da justi9a e da religiäo. Ε por que
ta de compaixäo e de ternura. las a cibiςa ni sente nem continuaram e continuam a ser escravos is filhos desses afri-
discorre como a razäo e a human jdadc. Para lavar-se pus canis? Cimeteram eles crimes? Foram apanhados em guer-
das acusaςóes que mcrecia, Ιanςiu sempre mäo, e ainda ago- ra? Mudaram de clima mau para outri melhor? Sairam das
ra lαηςα de mil motivis capciosos, corn que pretende fazer trevas di paganismo para a luz do evangelho? Νο por certo,
a sua apologia: diz que έ um ato de caridade trazer escravos e todavia seus filhos, e filhos desses filhos, devem, segundo
da Africa, porque assim escapam esses desgraςadοs de serem vόs, set desgraςadοs para todo ο sempre. Fala pus contra
vitimas de despόticos regulos: diz igualmente que, se ηäο vόs a justiςa e a religiäo, e SU los podeis escort no bάrbaro
viessem esses escravos, frcariam privados da luz do evange- direito piiblico das aritigas naςóes, e principahnente na far-
PROJETOS PARA O B R A S I L ESCRAVIDAO

ragem das chamadas leis romanas: corn efeito os apologis- adpeGem, e se inutilizam, e demais pouco trabalham. Que
tas da escravidäo escudam-se corn ο gregos, e romanos, ju'O rut de escravatura tambem no apresentam nossas
sem advertirem que entre os gregos e romanos no estavarn jlas e cidades, que serf ele poderiam limitar-se a poucos e
v
ainda bem desenvolvidos e demonstrados os princ1pios eter- nccc5505 criados? Que cducao podem ter as familias,
nos do direito natural, e os divinos preceitos da religiäo; e erver destes entes infelizes, serf honra, fern religiäo?
que Sc s
todavia como os escravos de entäo eram da mesma cor e De escravas, que se prostituem ao primeiro que as procura?
origem dos senhores, e igualmente tinham a mesma, ου 'TudO porem se compensa nesta vida; nόs tiranizaros os
quase igual, civilizaςäo que a de seus amos, sua indilstria, escravos, e os reduzimos a brutos anirnais, e eles nos ino-
born comportamento, e talentos os hab ilitavam facilmente culam toda a sua imoralidade, e todos os seus vicios.
α merecer ο amor de seus senhores, e a considera4äo de ου-
Ε na verdade, senhores, se a moralidade e a justi4a social
tros homens; ο que de nenhum modo pode acontecer em
de qualquer povo se fundam, parte nas suas instituiςóes reli-
regra aos selvagens africanos. giosas e politicas, e parte na frlosofra, para dizer assim, do-
Se ao menos os senhores de negros no Brasil tratassem mestica de cada farni'lia, que quadro pode apresentar ο Brasil,
esses miserάveis corn mais liumanidade, eu certamente no quando ο considerarnos debaixo destes dois pontos de vista?
escusaria, mas ao menos me condoeria da sua cegueira e Qual e a religiäo que temos, apesar da beleza e santidade
injusti4a; porem ο habitante ljvre do Brasil, e mormente ο do evangelho, que dizemos seguir? Α nossa religiäo e pela
europeu, e no sό, pela major parte, surdo ás vozes da justi4a, major parte um sistema de superstiςóes e de abusos anti-
e aos sentimentόs do evangelho, mas an e cego aos seus sociais; ο nosso clero, em muita parte ignorante e corrorn-
prόprios interesses pecuniYrios, e ά felicidade domestica da pido, e ο prirneiro que se serve de escravos, e os acumula
farnilia. para enriquecer pelo cornercio, e pela agricultura, e para
Corn efeito, imensos cabedais saem anualmente deste formar, rnuitas vezes, das desgra4adas escravas um harem
imperio para Africa; e imensos cabedais se amortizam den- turco. As famflias no tern educaςäo, fern a podem ter corn
tro deste vasto pals, pela compra de escravos, que morrem, ο trάfrco .de escravos, nada as pode habituar a conhecer e

52 53
PROIETOS PARA O BRASIL ESCRAVIDEO

mente em ρονοα4
amar a virtude, e a religiäo. Riquezas e mais riquezas gri- äο e agricultura, e sustentava de milho, fei-
tam os nossos pseudo-estadistas, os ιiόssos compradores e farinha, arroz, toucinhos, carnes de porco etc. a muitas
jάο
vendedores de carne humana; os nossos sabujos eclesiάstί_ tra5 provincias maritimas e interiores. las conceda-se
cos; os nossos magistrados, se e que se pode dar um täο hon- iegado) que corn efeito a gente lίvre do Brasil ηäο pode
(asl r
roso titulo a almas, pela major parte, venais, que sό empu_ corn taantos trabalhos aturados da lavoura, como na Europa,
nham a vara da justiςa para oprimir desgra4ados, que n ο milho, por exemplo em Portu-
pergυnto, se produzindo
podem satisfazer ά sua cobi4a, ου melhorar a sua sorte. ξ gal rias melhores terras quarenta por um, e no Brasil acima
entäo, senhores, como pode grelar a justi4a e a virtude, e de duzentos, e as mais sementeiras ά proρor~äo; e estando
florescerem os bons costumes entre nόs? Senhores, quando as horas do trabalho nccessjo da lavoura na razäo inversa
me emprego nestas tristes considera4fles, quase que perco
do produto da mesma; para que se precisa de major robustez
de todo as esperan4as de ver ο nosso Brasil um dia regene- e trabalhos mais aturados? Os lavradores da Ίndia säo por-
rado e feliz, pus que se me antolha que a ordem das vicis- ventura mais robustos do que um branco, um mulato, um
situdes humanas estά de todo invertida no Brasil. Ο luxo e cabra do Brasil? Νο por certo, e todavia ηäο morre aquele
a corrupςäo nasceram entre ηόs antes da civilizaΨο e da ρ010 de fore. Ε porque eles ηäο tem escravos africanos, dei-
indiistria; e qual scr a causa principal de um fenόmeηο t5o xar as suas terras de ser agriculturadas, e ο seu pals um dos
espantoso? Α escrauidäo, senhores, a escraυidäo, porque ο mais ricos do globo, apesar de sua pessima religiäo e giver-
homer, que conta com is jornais de seus escravos, vile na ο, e da impolitica infernal da divisäo em castas?
indolencia, e a indοlencia traz todos is vicios apos si. Hoje em dia a cultura dos canaviais e ο fabrico do α4ύ-
Diz porem a cobi4a cega que os escravos säo precisos no car tem crescido prodigiosamente, cujo produto jI. rivaliza
Brasil, porque a gente dele έ frouxa e pregui4osa. lentem nos mercados pύblicos da Europa corn ο do Brasil e ilhas
por certo. Α proifncia de S. Paulo, antes da cria4äo dos enge- do golfo do Mexico.
nhos de αςύcar, tinha poucos escravos, e todavia crescia anual- Na Cochinchina ηäο hά escravos, e todavia a produ4äo
PROJETOS PARA O B R A S I L Ε Sc RAIlS Al

e exportaςäo do αςύιαr j montava em 1750, segundo nos sar de.entrarem no Brasil, como j disse, perto de quarenta
diz ο sάbio Ρoivre,3 a quarenta mil pi~ιas de duas mil libras mi1 escravos anualmente, ο aumento desta classe e ου nub,
cada uma, e ο seu preςo era baratissimo no mercado: Ira, de mui pouca monta: quase tudo morre ου de miseria,
ου
advirta-se que todo este a4ύcar vinha de um pequeno pals
ου
de desesperaςäo, e todavia custaram imensos cabedais,
sem haver necessidade de estragar matas e esterilizar ter- que se perderam para sempre, e que nem sequer pagaram ο
renos, como desgraadamente entre nόs est sucedendo. juro do dinliciro empregado.
Demais, uma vez que acabe ο pessimo metodo da 1α- Pata provar a segunda tese, que a escravatura deve obstar
voura de destruir matas e esterilizar terrenos em rάρida pro- a nossa indύstria, basta lembrar que is senhores que pos-
gressäo, e se forem introduzindo os melhoramentos da cul- suem escravos vivem, em grandissima parte, na inercia, pois
tura europeia, decerto corn poucos braςos, a favor dos arados näο se veem precisados pela fore ου pobreza a aperfeiςoar
e outros instrumentos rύsticos, a agricultura ganhar pes sua indύstria, ου melhorar sua lavoura. Demais, continuan-
diariamente, as fazendas seräo cstYveis, e ο terreno, quanto do a escravatuta a set empregada exclusivamente na agricul-
mais trabalhado, mais fertil ficarά. Α natureza ρrόvida, e tura, e nas artes, ainda quando is estrangeiros pobres ve-
sάbia em toda e qualquer parte do globo, d os meios pre- nham estabelecer-se no pals, em pouco tempo, como rostra
cisos aos fms da sociedade civil, e nenhum pals necessita de a experiencia, deixam de trabalhar na terra com seus prό-
braςos estranhos e forςados para ser rico e cultivado. prios braςos e, logo que podem ter dois ου tres escravos,
Alem disto, a introduςäo de novos africanos no Brasil entregam-se ά vadiaςäo e desleixo, pelos caprichos de um
no aumenta a nossa ρορulαςäο, e sό serve de obstar a nossa falso pundonor. As artes no se melhoram; as mάgυίnas,
indiistria. Para provar a primeira tese bastarά ver corn atenςäo que poupam braςos, pela abundáncia extrema de escravos
ο censo de cinco ου seis anos passados, e ver-se-ά que ape- nas povoaςóes grandes, so desprezadas. Causa raiva, ου ri-
so, ver vinte escravos ocupados em transportar vinte sacos
Pierre Poivre (1719-86): viajante e naturalista frances, autor das Υία- de αςύεar, que podiam conduzir uma ου duas carretas bem
gens de um fdόsofo (1778). construldas corn dois bois ου duas bestas muares.
P R O J E 7 O 5 PARA O B R A S I L ESCRAVIDAO

Α lavoura do Brasil, feita por escravos bo4ais e ρregu e seräo por interesse seu mais bem tratados; os
i ~ais valor,
ςosos, ηäο dά os lucros, corn que hoinens ignorantes noveräo entäo os casarentos, e estes a ρορυ-
e fan- ςeπ
bores proι
dsticos se iludem. Se calcularmos ο custo atual da aquisi o Os forros aumentados, para ganharem avida, aforaräo
1α4αο•
do terreno, os capitals empregados nos escravos que ο deve r4óes de terras descobertas ου taperas, que hoje
ιη pequenas po
cultivar, ο valor dos instrumentos rurais corn que deve tra_ nada valem. Qs bens rurais seräo estάveis, e a renda da terra
balhar cada um destes escravos,* sustento e vestuYrio, moles_ onf ridirY corn a do trabalho e indiistria individual.
ο se c
tias reais e afetadas, e seu curativo, as mortes numerosas, Νο sό estes males particulares que traz consigo a grande
filhas do mau tratamento e da desesperaςäo, as repetidas fugi- escravatura no Brasil, ο Estado e ainda mais prejudicado.
das aos maus, quilombos, claro fica que ο lucro da lavoura ηäο tivessem uma multidäo demasia-
Sc os senhores de terras
deve ser mui pequeno no Brasil, ainda apesar da prodigiosa de escravos, eles mesmos aproveitariam terras j. abertas
da
fertilidade de suas terras, como rostra a experiencia. vres de matos, que hoje jazem abandonadas como ma-
e lί
τu4äo
No Brasil a renda dos predios rύsticos no depende da ❑inhas. Nossas matas preciosas em madeiras de const
extensäο e valor do terreno, nem dos bra~os que ο culti- civil e nάutica no seriam destruidas pelo machado assassi-
vam, ras sir da mera indiistria e inteligencia do lavrador. ηο do negro, e pelas chamas devastadoras da ignoráncia.
Os cures de nossas serras, fonte perene de umidade e fer-
Um senhor de terras e de fato pobrissimo, se pela sua igno-
ráncia ου desmazelo no sabe tirar proveito da fertilidade t ilidade para as terras baixas, e de circula4äo eletrica, no
de sua terra, e dos bra4os que fda emprega. Ευ desejara, estariam escalvados e tostados pelos ardentes estios do nosso

para bem seu, que os possuidores de grande escravatura ci- clima. $ pois evidente que, se a agricultura se fizer corn os
nhecessem que a proibi4äo do trάfico de came humana os bra4os livres dos pequenos propriettrios, ου por jornaleiros,
por necessidade e interesse seräo aproveitadas essas terras,
fart mais ricos; porque seus escravos atuais viräo a ter entäo
mormente nas vizinhan4as das grandes povoa4óes, onde se
acha sempre um mercado certo, pronto e proveitoso, e deste
Ι * Por exemplo, vinte escravos de crabalho necessitam de vinte enxa-
das, que todas se poupariam corn um sό arado. (Iota de Jose Binifkio.) modo se conservaräo, como heran4a sagrada para nossa pos-
PROJETOS PARA O B R A 5 1 L ESCRAVIDAO

teridade, as antigas matas virgens, que pela sua vastidäo e des> que e a execu4äo estrita de todos os deveres prescritos
da
frondosidade caracterizam ο nosso beld pals. pela natureza, pela religiäo, e pela sä polltica: Ira, a exe-
Έ de espantar pus que um trάfico täo contrάrio ás leis de todas estas obriga4öes e ο que constitui a virtude;
ευ4äο
da moral humana, e ás santas mximas do evangelho, e ate
e toda legislaς
äo, e todo governo (qualquer que seja a sua
contra as leis de uma sä politica, dure h tantos seculos entre forma) que a no tiver por base, e como a estάtua de Να6υ-
homens que se dizem civilizados e cristäos! Mentem, nunca codonosor, que uma pedra desprendida da montanha a der-
o foram.
ribou pelos pes; e um ediflcio fundado em areia solta, que
Α sociedade civil tern por base primeira a j υsti4a, e por pequena borrasca abate e desmorona.
a mais
fir principal a felicidade dos homens; mas que justί4a tern Gritam os traficantes de carne humana contra os piratas
urn homer para roubar ά liberdade de outro homer, e ο barbarescos, que cativam por ano mil, ου dois mil brancos,
que e pίor, dos filhos deste homer, e dos filhos destes filhos? quando muito; e no gritam contra dezenas de milhares de
las diräo talvez que se favorecerdes a liberdade dos escravos homens desgra4ados, que arrancamos de seus lares, eterni-
ser atacar a propriedade. Νο los iludais, senhores, a pro- zando er dura escravidäo toda a sua geraΨo. Νο basta
priedade foi sancionada para hem de todos, e qual e ο bem responder que os compramos corn ο nosso dinheiro; como
que tira ο escravo de perder todos os seus direitos naturais, se ο dinheiro pudesse comprar homens! — coro se a es-
cravidäo perpetua no fosse um crime contra ο direito natu-
e se tornar de pessoa a coisa, na frase dos jurisconsultos? Νο
ral, e contra as leis do evangelho, como disse. As leis civis,
e pus ο direito de propriedade, que querem defender, ί ο
que consentem estes crimes, so no sό culpadas de todas
direito da for4a, pois que ο homer, no podendo ser coisa,
as miserias, que sofre esta por4äo da nossa especie, e de todas
ηäο pode ser objeto de propriedade. Se a lei deve defender as mortes e delitos que cometem os escravos, mas igual-
a propriedade, muito mais deve defender a liberdade pes- mente ο säo de todos os horrores, que em poucos anos devem
soal dos homens, que no pode ser propriedade de ninguem, produzir uma multidäο imensa de homens desesperados,
sem atacar os direitos da provide"ncia, que fez os homens que j νο sentindo ο peso insuportάvel da injusti4a, que
livres, e no escravos; sem atacar a ordern moral das socie- os condena a uma vileza e miseria sem fir.

60 61
PROJETOS PARA O B R A 5 1 L Ε S C RAVIDAO

Este comercio de carne humana e pus um cancro quc γe


pente a escravidäo; tal acontecimento traria consigo
rόi as entranhas do Brasil, comercio, porem, que hoje em grandes males. Para emancipar escravos sem prejuizo da
dia j. ηäο e preciso para aumento da sua agricultura c sociedade, cumpre faze-los primeiramente dignos da libcr-
ρονοαςäο, uma vez que, por sάbios regulamentos, nio se dade: cumpre que sejamos forςados pela razäo e pela lei a
consinta a vadiaςäo dos brancos, e outros cidadäos mescla- converte-los gradualmente de us escravos em homens lίvres
dos, e a dos forros; uma vez que is muitos escravos, que j. e ativos. Entäo os moradores deste Imperio, de crueis que
memos, possam, ás abas de um governo justo, propagar lίvre säo em grande parte feste ponto, se tοrnaräo cristäos e jus-
e naturalmente corn as outras classes, uma vez que possam tos, e garιharäo muito pelo andar do tempo, pondo em lίvre
bem criar e sustentar seus filhos, tratando-se esta desgraςa- cί rculaςäo cabedais mortos, que absorve ο uso da escravatu-
da raςa africana corn major cristandade, ate por interesse ra: livrando as suas famflias de exemplos domesticos de cor-
prόprio; uma vez que se cuide enfim na emancipaςäo gra- rυρςäο e tirania; de inimigos seus e do Estado; que hoje nuo
dual da escravatura, e se convertam br.utos imorais em cida- tem pάtria, e que podem vim a ser nossos irmäos, e nossos
däos tίteis, ativos e morigerados. compatriotas.

Acabe-se pois de uma vez ο infame trYfico da escravatu- Ο mal est feito, senhores, mas ηäο ο aumentemos cada
ma africana; mas corn isto nuo estά tudo feito; e tambem pre- vez mais; ainda e tempo de emendar a mäο. Acabado ο

ciso cuidar seriamente em melhorar a sorte dos escravos jfame comercio de escravatura, j que somos forςados pela
existentes, e tajs cuidados so jY um passo dado para a sua razäo politica a tolerar a existencia dos atuais escravos,
futura emancipaςäo. cumpre em primeiro lugar favorecer a sua gradual emanci-
As leis devem prescrever estes meios, se e que elas reco- ραςäο, e antes que consigamos ver ο nosso pafs lίvre de todo
nhecem que os escravos so homens feitos ά imagem de deste cancro, ο que lciarY tempo, desde jY abrandemos ο
Deus. Ε se as leis os consideram como objetos de legislaςäo sofrimento dos escravos, favoreςamos, e aumentemos, todos
penal, por que ο nuo seräo tambem da proteςäo civil? os seus gozos domesticos e civis; instruamo-los no fundo
Torno a dizer porem que eu nuo desejo ver abolida de da verdadeira religiäo de Jesus Cristo, e no em momices e
PROIETOS PARA Ο BRAsIL
ESCRAVIDAO

superstiςöes: por todos estes meios ηόs lhes daremos toda a jntere5se senäo, mais cedo do que pensam, seräo unidos
cίvilizaςáo de que säo capazes no seu ςdesgraςado estado,
das suas injustiςas, e da sua incorrigivel barbaridade.
despojando-os ο menos que pudermos da dignidade de ho-
Eu νου, fjnalmentc, senhores, apresentar-vos os artigos,
meηs e cidadäos. Este e ηäο sό ο nosso clever mas ο nosso
que podem ser objeto da nova lei que requeiro: discuti-os,
major interesse, porque sό entäo conservando eles a espe-
emendai-os, amPlίai-os segundo a vossa sabedoria e justiςa.
ran4a de virem a ser um dia nossos iguais em direitos, e
Para eles me aproveitei da legίslaςäo dos dinamarqueses e
comeςando a gozar desde j da liberdade e nobreza de alma,
espanhόis, e mui principalmente da legislaςäo de Moises,
que sό ο vfcjo e capaz de roubar-nos, eles nos serviräο corn
que foi ο ilnico, entre is antigos, que se condoeu da sorte
fidelidade e amor; de inimigos se tornaräo nossos amigos e
nιiserάvel dos escravos, ηäο sό por humanidade, que tanto
clientes. Sejamos pois justos e beneficos, senhores, e sen-
reluz nas suas instituiςóes, mas tambem pela sάbia politica
tίremos dentro da alma que ηäο h situaςáo mais deliciosa
de ηäο ter mimigos caseiros, mas antes amigos, que pudessem
que a de um senhor carinhoso e humano, que vive sem me- defender o nob Estado dos hebreus, tomando as armas,
do e contente no meio de seus escravos, como no meio da quando preciso fosse, a favor de seus senhores, como jά ti-
sua prόpria familia, que admira e goza do fervor corn que
nham feito os servos do patriarca Abraäo antes dele.
estes desgraςados adivinham seus desejos, e obedecem a seus
mandos, observa corn jιίbilo celestial ο como maridos e mu-
lheres, filhos e netos, säos e robustos, satisfeitos e risonhos, ARTIGO Ι
ηäο sό cultivam suas terras para enriquece-1ο, mas vem νο-
luntariamente oferecer-Ihe at as premissas dos frutos de Dentro de quatro ου cinco anos ccssar inteiramente ο
suas terrinhas, de sua caa e pesca, como a um Deus tute- comercio da escravatura africana; e durante este prazo, de
lar. Έ tempo pus que esses senhores bάrbaros, que por des- todo escravo varäo, que for importado, se pagarU ο dobro
graςa nossa ainda pululam no Brasil, ουςαm os brados da dos direitis existentes; das escravas porem sό metade, para
consciencia e da humanidade, ου pelo menos ο seu prόprio se favorecer os casamentos.
PROJETOS PARA O BRASJL Ε Sc R All DA Ι

ART Π por ex., as crja5 at um ano sό pagaräo 1/12 do valor do


ί to: as de um at cinco sό ο sexto, as de cinco atY
hοmem-fe
qυί nze, dois terς
Todo escravo, que for vendido depois da publicaςäo desta os: as de quinze at vinte, tres quartos: de

1jte ate quarenta ο preςo


lei, quer seja undo da Africa, quer dos j existentes no Brasil total; e dαί para cima irY dimi-
ser registrado em um livro pύblico de notas, no qual se
ηυίηdο ο valor ά proporςäo.
declararά ο preςo por que foi vendido. Para que este artigo
se execute ά risca Pica autorizado qualquer cidadäo a acusar
a sua infraςäo, e, provado ο fato, receberά metade do valor ART. V
do escravo dos contratantes que ο sobnegaram ao registro.
Todo escravo, ου alguem por ele, que oferecer ao senhor
o valor por que foi vendido, ου por que for avaliado, serY
ART. III imediat3entc forro.

las alforrias dos escravos, cujo preςo de venda no cons-


tar do registro, se procederά a uma avaliaςäo legal por jura- ART VI
dos, um dos quais serά nomeado pelo senhor, e outro pela
autoridade ρύblίεα a quer competir. las se ο escravo, ου alguem por ele, no puder pagar
todo preςo por inteiro, logo que apresentar a sexta parte
dele, ser ο senhor obrigado a recebe-la, e lhe darY um dia
ART N lίvre na semana, e assim ά proporςäo mais dias, quando for
recebendo as outras sextas partes atY ο valor total.
Nestas avaliaςóes se atenderά aos anos de cativeiro e
serviςo do escravo, ao estado de saύde, e ά idade do mesmo:
Ε Sc RAIl DA Ι
P R O 1 E T O S PARA O B R A S I L

ART ΙΙΙ escrava sem vender ao mesmo tempo, e ai mesmo com-


~ filhos menores de doze anos. Α mesma
prador> a mulher e os
Ο senhor, que forrar escravos gratuitamente, em premί tem lugar a respeito da escrava ηäο casada e seus
o dίsροsί4äο
da sua beneficencia poderά reter ο forro em seu servi4o por filhos dessa idade.
cinco anos, serf 'he pagar jornal, mas sό o sustento, curati-
νο, e vestuάrio: mas se um estranho ο forrar na forma dos
artigos v e νι poderά contratar com ο forro ο modo da sua
ART. X
indeniza4äo em certos dias de trabalho, cujo contrato ser
revisto e aprovado pelo juiz policial curador dos escravos. Todos os homens de cor forros, que ηäο tiverem oflcio,
modo certo de vida, receberäo do Estado uma pequena
ου
sesmaria de terra para cultivarem, e receberäο outrossim

ART. ΙΠ dele os socorros necessios para se estabelecerem, cujo valor


iro pagando corn ο andar do tempo.

Todo senhor, que forrar escravo velho, ου diente in-


curάvel, ser obrigado a sustentά-1ο, vesti-lo, e tratY-lo du-
rante sua vida, se ο forro ni tiver outro modo de existen- ART. XΙ
cia; e no caso de ο ηäο fazer, ser ο forro recolhidi ao hospital,
ου casa de trabalho ά custa do senhor. Todo senhor que andar amigado corn escrava, ου tiver
tido dela um ου mais filhos, serf for4ado pela lei a dar liber-
dade ά me e aos filhos, e a cuidar na educa4äo destes at a
ART ΙX idade de quinze anos.

Nenhum senhor poderό vender escravo casado corn

69
PROJETOS PARA O BRASIL EScRAVIDAO

ART. XΙΙ ART XIV


k

juiz policial, ου
Ο escravo e senhor legal do seu pecύlίo, e poderά ρ Todo escravo, que mostrar perante ο
heranςa ου dοαςäο deixά-Ιο a quer quiser, no caso de n 0 o Provincial Conservador, que tern sido cruelmente
ςonsellι
ter herdeiros forςados: e se morrer ab intestato, e sem her seu senhor, tern direito de buscar novo
nιaltratado por
deiros, herdar a Caixa de Piedade.4 senhori mas se for estropiado, ου mutilado barbaramente,
ime'hiatamente forro pela lei.
serά

ART XΙΙΙ
ART XV
Ο senhor ηäο poderά castigar ο escravo corn surras, ου
castigos crueis, seno no pelourinho pύblico da cidade, lila, Os escravos podem testemunhar em juizo, no contra
ου arraial, obtida a licen9a do juiz policial, que determj- os prόprios senhores, mas contra os alheios.
narά ο castigo ά vista do delito: e qualquer que for contra
esta determinaςäo serά punido corn pena pecuniάria arbi-
trada a bem da Caixa de Piedade, dado porem recurso ao ART XVI
Conselho Conservador da provincia.
Antes da idade de doze anos no deveräo os escravos ser
empregados em trabalhos insalubres e demasiados; e o Con-
selho vigiarY sobre a execuςäo deste artigo para hem do Esta-
do e dos mesmos senhores.

λR I` Bοnifάcio propbe aqui a criaςäo de um fundo piiblico para financiar


a libertaςáo de escravos.

7'.' 71
ESCRAVIDAO
PROIETOS PARA Ο BRASIL

Γ ver cinco filhos, porem sujeita α obedecer e morar


ART. XVII que tί
~ marido, se for
casada.
corn ο
Igualmente os Conselhos Conservadores determί naräo
em cada provincia, segundo a natureza dos trabalhos, as ho-
ART. XX
ras de trabalho, e ο sustento e vestuάrio dos escravos.

ρ senhor no poderά impedir ο casamento de seus es-


cravos corn mulheres lures, ου corn escravas suas, uma vez
ART. XVΙΙΙ
que aquelas se obriguem a morar corn seus maridos, ου estas
queiram casar corn lίvre vontade.
Α escrava durante a prenhez, e passado ο terceiro ms,
ηäο ser obrigada a servίςos violentos e aturados; no oitavo
ms ώ serά ocupada em casa; depois do parto ter um ms ART. XYJ
de convalescen4a; e passado este, durante um ano ηäο tra-
balharά longe da cria. Ο governo fica autorizado a tomar as medidas ηeces-
sYrias para que os senhores de engenho e grandes planta4óes
de cultura tenham pelo menos dois ter4os de seus escravos
ART XIX casados.

Tendo a escrava ο primeiro filho vingado, se pejar de


novo, ter, alem do que acima fca determinado, uma hora
de descanso mais fora das horas estabelecidas; e assim ά pro-
ροrςäο dos filhos vingados que for tendo: ficad. forra logo
F R O 1 E T O 5 PARA O B R A S I L ESCRAVIDAO

ART. XXII ART XXV


~
DarY igualmente todas as provide"ncias para que os
es_ ~ las manumissóes, que Sc fizerem pela Caixa de Piedade,
cravos sejam instruidos na religiäo e moral, no que ga nha preferidos os mulatos aos outros escravos, e os criou-
berάο
muito, alem da felicidade eterna, a subordinaςäo e fι los aos da Costa.
delί_
dade devida dos escravos.

ART XXVI

ART. XXΙΙΙ
dia de festa solene
Ο dia destas manumίssóes scrY um
asSjstncia das autoridades civis e eclesiάsticas.
Ο governo procurarά convencer os pYrocos, e outros corn

eclesiYsticos, que tiverem meios de subsistencia, que a relj


giäo os obriga a dar liberdade a seus escravos, e a ηäο fazer ART. XXVΙΙ
novos infelizes.
Para recompensar a beneficencia e sentimentos de relί-
giäo e justiςa, todo senhor, que der alforria a mais de oito
ART XXIV familias de escravos, e lhes distribuir terras e utensi'lios ne-
cessάrios, serά contemplado pelo governo como benemeri-
Para que no faltem os braςos necessYrios ά agricultura to da pάtria, e ter direito a requerer merces e condecoraςóes
e indύstria, porY ο governo em execuςäo ativa as leis poli- pύblicas.
ciais contra os vadios e mendigos, mormente sendo estes
homens de cot.
PROJETOS PARA O BRASJL
E S c R A V I D A O

ART. XΧVΙΙΙ 2
lheS tomar contas; 5 ) um pot cento da renda de todas as
α
propriedades rύsticas e urbanas dos conventos e mosteiros;
Para excitar ο amor do trabalho entre os escravos, e a
serY arrecadado e fiscalizado religiosamente pelos bis-
ο qua!
sua major felicidade domestica, estabelecerά ο governo em
autoridades superiores das provfncias; 6°) uma jόia,
pos, ου
todas as provincias caixas de economia, como as de Frania
determί nada pelo regimento geral, que se deverά fazer, a
e Inglaterra, onde os escravos possam pór a render os pro-
qua! deveräo dar todos os que obtiverem merces de hάbitos
dutos pecuniYrios dos seus trabalhos e indilstria.
de Cristo, ου
de honras e foros passados pela mordomia-
2
ιnor do Imperio; 7 ) enfim mais um meio por cento, que
deveräo pagar os que arrematarem contratos e rendas nacio-
ART. XKIX
nais.

Na Caixa de Piedade acima mencionada, alem das penas


pecuniYrias j estabelecidas, entraräo: 1°) a metade mais das
ART. ΧXX
quantias que custarem as dispensas eclesiάsticas de missa
em casa, batizar e casar fora da matriz etc.; 2°) as duas ter4as
Fica outrossim autorizada esta Caixa a receber e admi-
partes dos legados pios, que pelo alvarά de 5 de setembro
nistrar todos os legados e doa4óes que lhe hajam de fazer,
de 1786 foram aplicados para ο Hospital Real, e casa de
como e de esperar, todas as almas pias e generosas.
expostos de Lisboa; 32) os bens vacantes sem herdeiros e
senhores certos, que de tempo imemorial foram doados als
cativos, e tudo ο mais que lhes e aplicado na lei de 4 de
ART Χ3αϊ
dezembro de 1775; 42) ο dizirno do rendimento das irman-
dades e confrarias; ο qual serf cuidadosamente arrecadado
Pam vigiar na estrita execur~äo da lei, e para Sc promover
e entregue pelos magistrados, que estäo encarregados de
por todos os modos possiveis ο born tratamento, ringe-
P R O J E T O 5 P A R R 0 B R A S I L ESCRAVIDAO

ra4äo, e emancipa4äo sucessiva dos escravos, haverά na capi_ aqui tendes, senhores, ο que me sugerira por ora ο
Eis
tal de cada proviricia um Conselho Superior Conservador άtria, e ο zelo da justiςa e da piedade cristä. Α vόs
dos escravos, que serά composto do presidente da ρrονί η- amοr da p
com pete corrigir, aumentar, e aperfei9oar ο meu magro e
cia, do bispo, ου em falta deste, da major autoridade ecle-
desalinhado trabalho; e a rim me bastard a consolaξäo de
siάstί ca, do magistrado civil da major graduar~äo, e de dois
haver excitado mais esta vez a vossa aten4äo sobre um assun-
membros mais, escolhidos pelo governo dentre os conse-
lheiros provinciais. presidiräo pot turno e mensalmente ο to täo ponderoso quanto necessdrio. Ο vastissimo Brasil,
presidente e ο bispo. situado no clima ο mais amerio e temperado do Universo,
dotado da major fertilidade natural, rico de numerosas ρτο-
du4öes, prόprias suas, e capaz de mil outras que facilmente
ART. XXXII Se podem nele climatizar, sem os gelos da Europa, e sem os
ardores da Africa e da Tndia, pode e deve ser civilizado e
Al~m deste conselho, haverά nas vilas e arraiais uma me- cultivado sem as fadigas demasiadas de uma vida inquieta
sa composta do pYroco, capitäo-mor, e juiz de vara branca
e trabalhada, e sem os esfor9os alambicados das artes e co-
ου ordinάτio, ου em sua falta de um homer born e dos mais
mYrciis exclusivos da velha Europa. Dai-lhe que goze da
honrados e virtuosos do polo, escolhido pelo conselho. Esta
liberdade civil, que j tern adquirido; dai-lhe major instruςäo
mesa decidirY sumariamente dos negόcios e causas que lhe
pertencerem, e darά αρelαςäο e agravo para ο conselho, que e moralidade, desvelai-vos em aperfeiςoar a sua agricultura,
tambem decidir afinal sumariamente. em desempe4ar e fomentar a sua indύstria artistica, erri
So procuradores e fiscais natos is juizes e andadores aumentar e melhorar suas estradas e a navega4äo de seus
das irmandades e confrarias dos homens de cor, que existi- rios; empenhai-vos em acrescentar a sua ρονοαΨο ljvre,
rem na capital, ου nas vilas e arraiais das provincias. destruindo de um golpe ο pe4onhento cancro que ο rόi, e
que enfraquece a sua forςa militar, forςa to necessdria nas
atuais circυnstáncias, que ηäο pode tirar de um milhäo de

7R 74
EscRAVIDA ο
P R o J E T o s PARA O B R A S I L

escravos, e mais, que desgraςadamente fazem hoje em dia e%periencia e a razäo que a riqueza sό reina onde impera a
cativeiro e a εοτ-
um terςo pelo menos da sua mesclada ορυlαςäο:
entáo ele iberdaik e a justiςa, e no onde mora ο
ser feliz e poderoso. Α natureza fez tudo a nosso favor, nόs ο mal est feito, ηάο ο aumentemos, senhores,
rup4äO Se
pordm pouco ου nada temos feito a favor da natureza. N0s- multiplicando cada vez mais ο mίmero de nossos iriimigos
cos, desses vis escravos, que nada tem que perder,
sas terras estäo ermas, e as poucas, que temos roteado, sá0 dοmdstί
tes tudo que esperar de alguma revoiuςäo como a de Säo
mal cultivadas, porque ο säo por braςos indolentes e forςa_ an
5 Ouvi pus, torno a dizer, os gemidos da cara
dos; nossas numerosas minas, por falta de trabalhadores I7oming°S
tria, que implora socorro e patrocinio: pelejemos deno-
ativos e instruidos, estäo desconhecjdas, ου mal aproveita- pά
dadamente a favor da razäo e humanidade, e a favor de nos-
das; nossas preciosas matas νο desaparecendo, vitimas do
όs uive e ronque ο
sos prόprios interesses. Embora contra n
fogo e do machado destruidor da ignoráncia e do egoismo;
egofsmo e a vii cobiς a; sua perversa indigriao, e seus desen-
nossos montes e encostas νäο se escalvando diariamente, e
toados gritos sei am para nόs novos estimulos de triunfo,
corn ο andar do tempo faltaräo as chuvas fecundantes, que
seguindo a estrada limpa da verdadeira poiftica, que Ρ filha
favoreςam a vegetaςäo, e alimentem nossas fontes e rios, sem
da razäo e da moral.
o que ο nosso belo Brasil em menos de dois sdculos ficar
ά Ε vόs, traficantes de carne humana, vόs, senhores injus-
reduzido aos pάramos e desertos άridos da Lfbia. Virά entäo -
tos e crudis, ouvi corn rubor e arrependimento, se no ten
esse dia (dia terrivel e fatal), em que a ultrajada natureza se
ache vingada de tantos erros e crimes cometidos. ς, Silo Domingos: referencia ά revolta escrava ocorrida na ilha Hispanio-
1791 os
Eia pois, legisladores do vasto Impdrio do Brasil, basta 1α, hoje Haiti, cuja parte leite chamava-se Sáo Domingos. Em
escravos negros de Sáo Domingos, que formavam ο grosso da sua ρορυ-
de dormir: d tempo de acordar do sono amortecido, em que
lαςäο, promoveram uma revolta de grandes proporςόes, cujas sucessivas
h sdculos jazemos. Vόs sabeis, senhores, que ηäο pode haver
vitόrias levaram ao fir da escravidSo, em 1794, e depois ά independen-
indύstria segura e verdadeira, nem agricultura florescente e
cia, em 1804, quando um dos seus lideres, Dessalines, proclamou-se giver-
grande corn braςos de escravos viciosos e boςais. Mostra a nadir vitalfcio para, meses depois, coroar-se imperador.

80 81
PROJETOS PARA O BRASIL E S C R A V I D A O

des pUtria, a viz imperiosa da consciencia, e os altos brad ,GULAIVIΣNTO SOBREA ESCRAUATURA'
05
da impaciente humanidade; aliUs, mai~s cedo talvez do que
pensais, tereis que softer terrivelmente da vossa νοlυtι tά
rίa : [...]
cegueira e ambiςäo; pus ο castigo da divindade, se e tardj
o 6Q) SerY conveniente que em cada rοςα ου fazenda se
ás vezes, decerto nunca falta. Ε qual de vόs quererY set täi fa4a uma caixa pia para a qual concorreräo corn uma peque-
obstinado e ignorante, que ηäο sinta que ο cativeiro perpe-
na contrί buiςäo
os pais de familia escravos, e entraτäο as
bes dos pequenos crimes e desmazelos, e final-
tuo e no somente contdiio ά religiäo e ά sä poll tica, mas condenaς
tambem contrάrio als vossos futuros interesses, e ά
vossa renne as heranςas dos escravos ab intestato ου sem herdeiro.
seguranςa e trangiiilidade pessoal? Estas caixas seräo administradas pelos senhores e pelos
Generosos cidadäοs do Brasil, que amais a vossa pUtria, rios do tribunal mencionado. Destas caixas sairäo
comissά
sabei que sem a ab οli4äo total do infame trfico da escra- negras e mulatas que casarem, e para sustento
os dotes das 5
vatura africana, e sem a emancipaςäo sucessiva dos atuais e curativo dos velhos e impossibilitados de trabalhar. 7 ) Α
cativos, nunca ο Brasil firmarά a sua independencia nacional, escolha e quantidade dos alimentos deve ser regulada. Ο
e segurarά e defender a sua liberal Constituiςäo; nunca melhor alimento que se Ihes pode dar so as bananas em
aperfeiςoarά as raςas existentes, e nunca formad, como primeiro Iugar, depois os cars e batatas, ο milho, tanto 0
fυbά, como a canjica, a farinha de ρäο, os
feijbes e favas, as
imperiosamente ο deve, um exlrcito brioso, e uma marί-
nha florescente. Sem liberdade individual no pode haver frutas bem sazonadas, e nas festas e domingos uma ροrςäο

civilizaςäo fern sόlida riqueza; ηäο pode haver moralidade, de peixe salgado ου carne-seca do sertäo. Uma penca de

e justiςa; e sem estas filhas do ceu, ηäο h nem pode haver bananas e alguns car.s cozidos ου assados bastam muitas

brio, forςa, e poder entre as naςöes. vezes para sustentar ο escravo. Uma terra de bananeiras pro-

ά.~ ~ 6 O teor deste texto, em especial a referencia άs pοssessδ es afrkanas,


permite supor que foi escrito antes da Indepetιd"eιιcia brasileira. Α primeira
parte ηäο foi encontrada.
PROJETOS PARA O B R A S I L
BSCRAVIDAO

duz mais que uma terra de mandioca, e muito mais ainda


que estiverem na enfermaria. 13°) Quando se come-
que uma igual terra de canavial. 8°) Deae-se cuidar m υί το temP0
ςas ου fazendas, se os pretos ηäο decla-
e muito na educaςäo religiosa dos escravos, para os quais se ter um crime nas ro
malfeitor, seräo multados em certa corιdenaςäo que
deve fazer um pequeno catecismo, em que se lhes inculque rarem ο
se ratea por todos. 14°) Poderäo criar is pretos um porco
corn toda a clareza e eficάcia ο amor do trabalho e a obe-
por famjhia, fιcando porem sujeitos aos danos que fizerem
diencia aos senhores. 99) Para a prosperidade do reino de
porcos> Porem galinhas, patos etc. as que quiserem. 15°)
0S
Angola, e outras possessöes da Africa, imitar ο governo
senhor nunca castigarY corn aςoite preto algum sem ser
portugues os ingleses de Serra Leoa corn iguais regulamen- ρ
julgado primeiramente pelo feitor e dois pretos velhos e
tos e vistas pOliticas. 10") As horas de trabalho principiaräo
mais respeitados. 16°) As negras e negros ηäο poderäo vir ά
a toque de sino ao nascer do so!, άs oito horas descansaräο
ρονοαςäο sem virem vestidos ao menos corn camisas, saia
e almοςaräo, ás onze da manhä nos paises quentes cessarU
o trabalho at ου tanga, que lhes νά pelo menos ate meia perna. 17") Para
duas, e nos mais abrigados ás onze e meia;
pór em execuςäo devida este regulamento [ilegivel] ο tri-
das duas at ο pór-do-sol continuaräo ο trabalho. As mulhe-
bunal j mencionado corn os seus comiss.rios, a quer recor-
res pejadas at ο sexto res e as que criarem aos peitos is
reräo os negros para que se tome conhecimento dos seus
f lhos teräo as mesmas horas de trabalho conforme ο esta-
requerimentos debaixo do mais restrito segredo de justiςa.
do de vigor e saύde de cada uma; do sexto res para diante
18°) Todo senhor que for injusto e cruel para corn seus
sό faräo trabalhos leves as prenhas, e no nono res ηäο tra-
escravos scrY punido pelo dito tribunal corn multa pecu-
balharäo senäo em casa a tecer e Eiar. Depois do parto teräo
niάria ου castigo corporal, ου corn prisäo segundo a atroci-
quando muito um mes de convalescenςa. 11 °) Cada pai de
dade do caso, e serf entäo obrigado a vender ο escravo a
familia ter. ο seu rancho ά parte e um quintal pelo menos
melhor senhor. 19°) Todo escravo que tiver trabalhado
de cinqüenta pes er quadro para sua horta e pomar. 12")
depois de homem-feito vinte anos a um ου mais senhores
Na repartiςäo do tempo que pertence a cada preto e preta
ser forro corn sua mulher se tiler quinze anos de serviςo;
de trabalho se descontarά a metade do seu quinhäo pelo
e ο Estado lhe dar terras para cultivar. 20°) Toda escrava
PROJETOS PARA O BRASIL E S C R A V I D A O

que tiver dois filhos vivos, logo que lhe ηasςα um terceiro,
sua εοηd'ιςäο:
estes entes aviltados e fracos afogam aos meus
terY ο quinhäo que pertence a um escrava de trabalho.
patrίcios os sentimentos de virtude, e liberdade civil no seu
que a natureza inspira: cerceam-nos desde a infáncia.
6erςο,

AVULSOS
Todo filho de mulato corn branco deve ser reputado
Para acrescentar ά minha memόria sobre a escravatura branco e gozar de todos os privilegios de homens brancos,
devo lembrar que seria muito ύtil ao governo do Brasil que
e indioS.
em cada uma de suas provfncias se desse anualmente liber-
dade a quatro ου cinco escravos, que se distinguissem em
atividade, e bom comportamento. Os infelizes negros, diz Benjamin Constant, arrebata-
dos άs suas familias, amontoados em edificios infectos, expi-
ταηdο de misUria na viagem, ου perecendo no trabalho, e
Sό ο Brasil ά quer pode realizar os desejos cosmopoli- nas dores debaixo do aqoitc de seus verdugos, cuja escra-
tas, que procuram civilizar a Africa; sό ele pode formar um vidäo, desde as seduςóes e violencias corn que so apanha-
grande Estado conquistador nos reinos de Angola e [ilegi- dos at os suplicios espantosos que se empregam para conte-
veil, pus bάrbaros sό pela forςa, e sabedoria podem sair do
los, e um crime que interesse algum pode justifιcar, nem
estado miserYvcl em que se acham. nenhum sofisma absolver.

Os brasileiros adquirem um gosto para a escravidäo Uma das causas, que concorre a perpetuar e piorar a
politica e uma baixeza de sentimentos de seu viver com os escravidäo dos negros, e a cor: um escravo romano, apenas
escravos, cujo coraςäo e cspfriti sempre cheiram ά vileza da lίvre, podia confundir ο seu sangue corn seus primeiros
PROJETOS PARA O BRASIL
PROJE7OS PARA 0 BRASIL

amos; mas ο negro conserva indelevelmente um sinal de se-


para4äo e de desprezo. Νο sό ο escravo άqui € inferior αο
amo, mas ο negro ο e tambem ao branco.

Quäo pouco a escravidäo concorre para a cultura e


povoarräo de um pals se rostra nos Estados Unidos da Ame-
rica, onde os estados em que ha escravos, como as Caroli-
nas, Virginia, Geόrgia, at mesmo Kentucky e Tennessee,
estäo muito atrasados.
ΛPONTAΜBNTOS PARA A CIVILIZAςΑO
DOS ÍNDIOS BRAVOS DO IMMRIO DO BRASIL'

Os jesultas davam um socorro em dinheiro e uma ροrξäο


Vou tratar do modo de catequizar, e aldear os Indios
de terreno a cada negro seu escravo que se casava.
bravos do Brasil: materia esta de suma importáncia; mas ao
mesmo tempo de grandes dificuldades na sua execuςäo.
Os homens escravos, que na menor desgra4a veer a Nascem estas 1 °) da natureza, e estado em que se acham
morte certa e nada pior, naturalmente procuram perturbar estes Indios; 2°) do modo corn que sucessivamente por-
o Estado, e conspirar contra ο soberano, ύnico remedio que tugueses e brasileiros os temos tratado, e continuamos a tra-
lhes resta. tar, ainda quando desejamos domesticύ-los e faze-los felizes.
As primeiras provem: 1 °) de serem os Indios povos vagabun-

Tema o Brasil que se former novos Palmares de negros! ~ ~ ' Projeto apresentado na Assembleia Constitωnte, em 1823. (Tkulo
do autor.)

RR

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