Você está na página 1de 10

A CONTRARREFORMA DO ENSINO MÉDIO A PARTIR DA LEI N.

º
13.415/2017: O ATAQUE À FORMAÇÃO DO TRABALHADOR

Sandra Regina Davanço1 - UENP


Fernando Pereira Cândido2 – UEL

Eixo Temático – Educação Profissional


Modalidade: Comunicação
Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo
A história da Educação Escolar no Brasil evidencia o seu caráter de classe e um traço
distintivo, a dualidade estrutural. Assim, o artigo parte do problema: quais as consequências
da reforma do ensino médio em curso no Brasil desde o início da segunda década deste
século, para a formação dos alunos da classe trabalhadora? O método utilizado para investigar
esse processo é a análise da educação a partir da sua base ontológica, o trabalho, intentando a
totalidade histórico-social como momento fundamental. Esse estudo é necessário para criticar
os resultados concretos que as políticas públicas em geral e educacionais em específico têm
para a formação humana da classe trabalhadora. O resultado obtido indica que o Estado passa
por uma reforma importante, redirecionando os recursos públicos do atendimento social para
a recuperação do capital em crise. O projeto formativo viabilizado por meio da Lei. n.º
13415/2017 aprofunda a dualidade estrutural da educação e está sendo implementado para
responder aos interesses do grande capital nacional, associado e subordinado ao capital
internacional.

Palavras-chave: Educação Profissional; Trabalho; Classe Trabalhadora.

1
Professora da Universidade Estadual do Norte do Paraná. Membro do Projeto de Extensão Educação Física e
Marxismo: bases teórico-metodológicas. E-mail: sandradavanco_uem@hotmail.com
2
Docente do EMH/CEFE/UEL. Coordenador do Projeto de Extensão Educação Física e Marxismo: bases
teórico-metodológicas E-mail: fercandido.emh.uel@gmail.com

ISSN
Introdução

A escola pública laica, obrigatória e gratuita é resultado tanto das lutas da classe
trabalhadora, quando uma necessidade da consolidação da burguesia como classe dominante
(FOUCAMBERT, 2010; LEONEL, 1994; LAZARINI, 2015). A educação pensada pela
burguesia para a classe trabalhadora se constituiu desde o seu início, desigual, rebaixada e
invariavelmente limitada. Como mediação necessária para o preparo do trabalhador, seus
conteúdos e formas foram sendo articulados para responder às demandas das sucessivas
etapas de acumulação do capital. Rendú3, ao defender a urgência na criação da escola pública
francesa, é assertivo: “Não se trata simplesmente de decidir se as crianças deverão de acordo
com a lei, saber ler ou escrever [...] Trata-se de saber se a escola será o instrumento pelo qual
a lei moral conservará ou retomará seu império, e assegurar para ela a transmissão dos
princípios conservadores de toda a sociedade” (apud LEONEL, 1994, p. 19).
No Brasil a organização da educação pública se deu tardiamente, voltada à inserção
subordinada do país ao capitalismo internacional, nas últimas décadas do século XIX.
Somente no final da primeira metade do século XX ela começa a ser organizada efetivamente
na forma de sistema. As leis que compõe a Reforma Capanema expressam a dualidade
estrutural que caracteriza a educação pública brasileira até os dias de hoje. O Ensino
Secundário mantinha a finalidade de “formar as individualidades condutoras”, enquanto que a
ensino técnico era voltado ao atendimento das demandas do desenvolvimento econômico
brasileiro (RIBEIRO, 2010). Esse projeto de educação, que atende de formas díspares as
pessoas a partir de sua origem de classe, se mantém com a lei 5540/68 e a lei 5692/71, dos
anos de chumbo, via parceria MEC-USAID (ROMANELLI, 1983). Dado este traço
característico da Educação em nível médio, a sua dualidade, com a discriminação de classe
social; considerando o contexto de crise do capital no mundo, as lutas entre capital e trabalho,
suas consequências econômicas e para a orientação das políticas educacionais, questiona-se:
quais as consequências da reforma do ensino médio em curso no Brasil desde o início da
segunda década deste século, para a formação dos alunos da classe trabalhadora?

A educação pública no contexto da reestruturação produtiva


A partir de 1980, com as lutas contra a Ditadura Militar, pelas eleições diretas e a
mobilização da sociedade brasileira em prol de um projeto democrático de nação, se
configurou um movimento coletivo voltado a construir um projeto educacional pautado na
3
Rendú – inspetor geral do ensino na França, cargo equivalente ao ministro da educação.
perspectiva do desenvolvimento omnilateral, visando um sistema de ensino que integrasse
ciência, cultura, humanismo, tecnologia e trabalho (FRIGOTTO, 2002). A burguesia se
confrontou com um projeto de educação que partia das demandas da classe trabalhadora, a
proposta pautada na concepção de escola politécnica, procurava enfrentar a dualidade
estrutural por meio de uma formação que, vinculada ao trabalho, privilegia o desenvolvimento
humano em suas múltiplas potencialidades. No Ensino Médio essa formação igual a todos
compreenderia um tripé básico: o ensino intelectual, o desenvolvimento físico e o aprendizado
profissional politécnico.
Em 1988 tem início a tramitação do Projeto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional. Aos poucos foi se perdendo o projeto de formação defendido pelos educadores,
permitindo certa dualidade entre formação geral e formação profissional, ainda conseguiu
manter o eixo da educação escolar na educação politécnica (SAVIANI, 2003). No entanto, a
lei aprovada, LDBEN 9394/96, afirmou a educação voltada aos estreitos horizontes do modo
capitalista de produção. A desconstrução da proposta original da LDB refletiu as complexas
transformações que o capitalismo sofreu no final do século XX e início do século XXI.
Marcadas pela crise do Wefare State e reestruturação produtiva, a reconfiguração do modo de
produção capitalista e sua recuperação das taxas de lucro trazem a níveis mais elevados a
contradição capital trabalho (MACIEL; NETTO, 2004). A crise dos anos de 1970
desencadeou um amplo e totalizante processo de restruturação dos processos de trabalho e de
todo o ordenamento do complexo jurídico-politico e social nas décadas de seguintes. O
Consenso de Washington inclui ao menos 10 tipo de reformas 4, que tem sido levadas a cabo
no mundo todo, e com mais intensidade na América Latina, submetendo à demandas sociais
ao julgo do capital.
Constata-se o capital com o fortalecimento e uma aparente autonomia da esfera
financeira. O aumento das receitas dos Estados para o pagamento das altas taxas de juros das
dívidas públicas5 se constitui um dos principais veículos de transferências de recursos
públicos para a iniciativa privada. Para tal, os organismos internacionais prescreveram
amargos remédios na forma de reformas que buscam flexibilizar leis trabalhistas e instituir

4
1) disciplina fiscal; 2) redefinição das prioridades do gasto público; 3) reforma tributária; 4) liberalização do
setor financeiro; 5) manutenção de taxas de câmbio competitivas; 6) liberalização comercial; 7) atração das
aplicações de capital estrangeiro; 8) privatização das empresas estatais; 9) desregulação da economia; 10)
proteção dos direitos autorais (PORTELLA FILHO, 1994, apud GENTILI, 1998, p.14).
5
No caso do Brasil em 2015 43,42% do PIB foi para o pagamento de juros da dívida pública, in:
http://www.auditoriacidada.org.br/blog/2013/08/30/numeros-da-divida/ E em 2016 a dívida pública brutra
chegou 70,5% do In: PIB. https://nacoesunidas.org/divida-publica-bruta-do-brasil-chega-a-705-do-pib-maior-
indice-da-america-latina/
diversas formas de privatização dos fundos públicos, transferidos para a iniciativa privada, via
organizações denominadas “sociais”, como estratégia para convencer a população que o
capital tem plenas condições de operar direitos sociais coletivos, públicos e universais. A
proposta primeira, de reforma da previdência, prescrita já em 1994 e reforçada em 2005 pelo
Banco Mundial, segundo Granemann (2007), é o modelo de contrarreforma para as demais
políticas sociais, e todas elas se encontram em processo de implantação no Brasil.
Gentili (1998) demonstra a homogeneidade das reformas educacionais em curso na
América Latina através da similaridade das propostas e dos argumentos oficiais a respeito da
crise educacional. A incapacidade do Estado em administrar as políticas sociais é o ponto
central, para demonizar o centralismo e a burocracia do Estado interventor, que se fundamenta
em algumas premissas tais quais: os governos são incapazes de assegurar quantidade e
qualidade e/ou, a expansão dos serviços educacionais já foi alcançada; a exclusão e a
marginalidade são expressão da ineficiência dos sistemas. Diante deste quadro não são
necessários mais recursos, mas direcionar corretamente os existentes. A estratégia é buscar a
superação da crise no mercado, afastando o Estado e os sindicatos das decisões sobre as
escolas (GENTILI, 1998). A defesa do Estado Mínimo “trata de uma argumentação teórica
que restaura o mercado como instância mediadora societal elementar e insuperável e uma
proposição política que repõe o Estado mínimo como única alternativa e forma para a
democracia” (NETTO, 1985, pp.70-77). Assim, todas as esferas sociais devem organizar-se
sob a lógica mercantil, repassando à sociedade funções que historicamente são do Estado.
O neoliberalismo ofereceu o argumento perfeito para a entrada do empresariado na
disputa pelos fins e modelos não só da educação pública, mas do gerenciamento de todo os
direitos sociais que podem ser convertidos, eles mesmos ou a prestação de serviços
relacionados, à voracidade sedenta do capital em busca de novos nichos e produtos onde
possa dar continuidade a sua acumulação ampliada. Foi nesse contexto que a LDB aprovada,
Lei 9394/96, não representou uma política global, pelo contrário, as forças conservadoras e
econômicas se ocuparam mais em esvaziar o projeto anterior, resultando em um texto “inócuo
e genérico”. No entanto, Saviani alerta que isso não significa que “o ministério não tenha
uma política global para a área da educação. Certamente ele a tem. Entretanto,
estrategicamente parece ter optado por não enunciá-la, procurando implementá-la através de
reformas pontuais acreditando, talvez, que dessa forma seria mais fácil viabilizá-la
politicamente, safando-se das pressões e quebrando as eventuais resistências” (SAVIANI,
2003, p. 200).
E o projeto inacabado na LDB de 1996 demandou ao longo dos anos, uma sucessão de
propostas que compõem um conjunto de leis e projetos e programas (decreto 2208/97, decreto
5154/04, PLANFOR, PROEP, PROEM, DCNEM, PL 6840/13 e MP 746/16), na tentativa e
resolver os problemas da educação, em especial os problemas do Ensino Médio. Kuenzer
(2002) ressalta que a etapa da educação apresentada, também é desdobramento do que se deu
no próprio transcurso da sua constituição histórica, que é sua indefinição quanto aos seus
objetivos fins, uma vez que compete à mesma etapa da educação preparar para o Ensino
Superior e preparar para o mercado de trabalho, aglutinando questões pedagógicas e políticas
resultantes do tensionamento da relação entre o trabalho e a educação. Segundo a autora,
como esse tensionamento não pode ser resolvido sem que seja superada a sociedade de
classes, a categoria dualidade é a categoria explicativa por excelência do ensino médio,
legitimando a dualidade de classes desta sociedade. Krawzyk (2014), na mesma direção,
mostra que a dualidade estrutural é a categoria explicativa do Ensino Médio brasileiro pela
ausência de uma finalidade específica.
O decreto 2208/97 foi o principal instrumento jurídico da reforma anterior, pois ele
vem justamente tornar as intenções já subliminarmente contidas na Lei nº. 9394/96. Pois, à
medida que os redatores desta lei não estabeleceram a cargo de quem ficaria a educação
profissional, eles deixaram aberta a possibilidade de uma legislação pontual que dispusesse
desta modalidade de ensino da forma como a burguesia, em tempos de reestruturação
produtiva, demandasse. Ao retirar a Educação Técnica Profissional da rede regular de ensino
atendeu aos interesses do empresariado da educação que passou a ofertá-la na rede privada de
ensino, colocando-a no balcão de negócios do capital. O Decreto nº. 2.208/97 ao absorver
parte da Lei nº. 9394/96 e ignorar o Art. 36 6 restringiu a articulação entre a educação geral e a
educação profissional às modalidades concomitante ou a subsequente, de modo que a antiga
dualidade histórica do nível médio “passa a ser uma orientação legal e uma prescrição oficial”
(CÊA, 2006 p. 3). A educação profissional desintegrada da educação geral em nível médio
possibilita um grande avanço do capital, pois transfere à iniciativa privada, empresas de
educação, e individual, cada trabalhador da responsabilidade pela qualificação profissional. A
necessidade de racionalizar o uso dos recursos públicos reflete o processo de redistribuição
das verbas que serão investidas para sanar as bancarrotas das empresas falidas (MÉSZÁROS,

6
O artigo 36 da LDBEN 9394/96 garante que a articulação da Educação Profissional e Educação Geral possa
também na forma integrada, ou seja, Educação Profissional em Nível Médio, cursado no ensino regular,
garantindo o acesso ao ensino regular aos que fazem curso técnico.
2002; HARVEY, 2011), submetendo interesses sociais, como a educação e a saúde, aos
interesses econômicos do grande capital.
O decreto 5.154/04, ao revogar o 2208/97, em um contexto razoavelmente menos
ofensivo à classe trabalhadora, possibilita a reintegração da formação profissional à formação
geral - único avanço desse decreto -, limitado do ponto de vista da luta histórica da classe
trabalhadora, porém um obstáculo às necessidades do capital, pois não retirou da pauta a luta
por uma educação que tem como base a articulação entre ciência, tecnologia e cultura, e
oportunizou a criação de propostas nos estados da federação, como foi o caso da reforma
empreendida no Paraná7 onde, ao menos formalmente houve a intenção de romper com o
modelo de ensino de caráter dual.

A contrarreforma do Ensino Médio


Com o avanço das políticas de caráter neoliberal, a educação na perspectiva
economicista passa a ser defendida como meio de tornar o país mais competitivo,
demandando para isso novas mudanças adequando-a aos ditames da acumulação flexível.
Krawzyk, (2017), identifica que no âmbito educacional, mais especificamente no Ensino
Médio, os empresários passam a compor um grupo privilegiado, dando as cartas e
direcionando as políticas para uma nova racionalidade pedagógica e organizacional destinadas
às escolas públicas. Exemplo disso é o PL 6840/138, que propõe o aprofundamento do modelo
que forma para o trabalho ou para a universidade, ao privilegiar percursos formativos que
abandonam por completo a ideia de uma educação básica comum a todos. O PL 6840/13 foi
construído em diálogo com o empresariado, como evidencia Silva (2016), a contestação e as
críticas a ele, por parte dos educadores organizados no Movimento em Defesa do Ensino
Médio9 deu origem a um substitutivo, que embora não significasse nenhum avanço em
direção a uma proposta que realmente atendesse à classe trabalhadora, tentou eliminar os

7
Para conhecer o projeto do governo paranaense e o processo e implantação do Ensino Médio Integrado:
DAVANÇO, S. R. “A implantação do Ensino Médio Integrado no Estado do Paraná: a difícil superação da
cultura da dualidade”. Disponível em: http://www.ppge.ufpr.br/teses/M08_davan%C3%A7o.pdf
8
O PL 6840/13 propõe, sob a justificativa de adequar o ensino às necessidades dos alunos, a retomada da
formação por áreas da antiga lei 5692/71 e no terceiro ano teriam que escolher uma ênfase: Linguagem,
matemática, ciências da natureza, ciências humanas; torna sua carga horária integral, 7 horas diárias; o ensino
noturno continuará a existir, mas será permitido somente a maiores de 18 anos, com mesma carga horária do
integral, podendo 1000 horas ser integralizada a critério do sistema de ensino; obrigatoriedade dos temas
transversais, que entre outros tem empreendedorismo, noções sobre Constituição Federal e, no ultimo ano,
escolha da carreira; estabelece também que a formação de professores seja feita por áreas do conhecimento.
9
O Movimento em Defesa do Ensino Médio foi resultado do descontentamento dos educadores com o conteúdo
pragmático e economicista do PL 6840/13 para articular as lutas em prol de uma educação básica comum a todos
que estava sendo negada no PL.
aspectos mais danosos à formação da classe trabalhadora, como a obrigatoriedade da
formação em tempo integral aos menores de 18 anos, a não obrigatoriedade das opções
formativas somente para os que fizerem a jornada ampliada, garantido a continuidade da
oferta de uma educação básica Silva (2016).
Com o processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT) o PL não tramitou, até que
no final do primeiro semestre, o presidente interino Michel Temer, via Medida Provisória
746/16, retoma uma espécie de escopo piorado do projeto original e o apresenta para votação
na Câmara e no Senado. Alvo de grande resistência popular, pois somada s ela há o anúncio
de reformas e ajustes10 deletérios, especialmente para os mais pobres, a MP 746 encontrou
resistência principalmente dos alunos do Ensino Médio, que promoveram ocupações de
escolas no país todo, chegando a mais de 1000 escolas ocupadas. A repressão foi brutal, os
que reivindicam a garantia constitucional de direitos humanos e sociais passam a enfrentar um
vertiginoso crescimento da criminalização dos movimentos sociais na luta por direitos:
moradia, transporte, trabalho e previdência. Desencadeando um ciclo violento de ataques
brutais às condições de trabalho e vida do trabalhador, acompanhadas de uma intensificação
da violência policial no campo e na cidade. Na esfera educacional, a criminalização vem na
forma da tentativa do controle da liberdade de ensino, liderado pelo Movimento Escola sem
Partido, que acusa professores de fazerem doutrinação nas salas de aula, sob a alegação da
“audiência cativa” defendida por Miguel Nagib no PL 867/2015.
A MP 746/16, agora lei 13415/2017, sem dúvida alguma é um esforço do setor
produtivo para garantir, também no âmbito da reprodução da força de trabalho, nos processos
educativos especificamente pedagógicos desenvolvidos pelas escolas (KUENZER 2002), a
manutenção de seus privilégios econômico-sociais. Uma questão crucial no capitalismo é
assegurar que cada indivíduo adote como suas as metas de reprodução objetivamente
possíveis do sistema na mediação do desenvolvimento de um conteúdo técnico-ideológico,
10
PEC 55 – teto de gastos públicos por 20 anos, nenhum outro país fez um ajuste tão rígido e tão longo.PL 257 –
renegociação das dívidas dos Estados, que impõe uma pesada agenda que vai da adoção do teto de gastos, ao
ataque à carreira e a condição de trabalho dos servidores públicos e, principalmente, o comprometimento dos
serviços prestados à população. Reforma Trabalhista – flexibilizando de forma absoluta a CLT, com ataques a
todas as formas de proteção que o trabalhador historicamente foi conquistando. Essa reforma também cria
dificuldades de acesso a justiça do trabalho, permitindo a continuidade e a intensificação de relações de trabalho
análogas à escravidão sob o amparo da lei. PEC da terceirização - permitindo a terceirização da atividade fim,
restringida pela Constituição Federal de 1988, desloca a condição de trabalho no Brasil à condição anterior à
própria consolidação das leis trabalhistas, impedindo o trabalhador de se manter por mais tempo empregado,
repercutindo no seu tempo de contribuição e acesso à aposentadoria. Reforma da Previdência – ampliando o
tempo de contribuição mínima de 15 para 25 anos e 49 anos para o acesso à aposentadoria integral, no limite do
teto do INSS e idade mínima de 65 anos. O direito a pensões por morte também são completamente atacadas,
restringindo o acesso à fração do salário do cônjuge, a depender do número de filhos, além de criar as pensões
temporárias, para cônjuges mais novos, considerando a pensão não como direito, mas como ajuda/assistência.
cabendo à escola a “internalização pelos indivíduos [...] da legitimidade da posição que lhe foi
atribuída na hierarquia social, juntamente com suas expectativas ‘adequadas’ e as formas de
condutas certas” (MÉSZÁROS, 2008, p. 44). Determinar fins e modelos da educação escolar
ofertada à classe trabalhadora é não só a precarização e o barateamento da mercadoria que
mais interessa ao capitalista, a força de trabalho mas, também, a tentativa de produzir um
consenso por meio da formação da juventude, na perspectiva do desenvolvimento de um
pensamento sob a lógica empresarial expressa na meritocracia e no empreendedorismo.

Considerações Finais
Tonet (2016) explica que os métodos científicos têm sempre uma construção que
reflete o local e o momento de determinada sociedade, o conhecimento científico de forma
mais ou menos direta vai influenciar a reprodução de dada sociedade e a proposição de
diferentes projetos históricos. Como isto se aplica à contrarreforma da Lei 13415/2017? A
separação do percurso formativo dos estudantes nas Escolas públicas do país não é uma
formulação político-educacional abstrata, não tem o mesmo peso e efeito na periferia ou no
centro do capital, no Brasil, no Canadá ou na Inglaterra uma política assim definida terá
consequências distintas. Distinguir a formação para o trabalho em diferentes setores da
economia na sociedade cujo centro da produção são as mercadorias, por serem veículo de
criação e expansão do valor, afeta as possibilidades de desenvolvimento integral dos
indivíduos. Em outra sociedade, com outra lógica social orientando a produção, essa divisão
poderia ter efeitos diversos, não nocivos e não impeditivos da formação humana, o que
claramente não se aplica ao capitalismo periférico brasileiro.
Essa reforma afirma um projeto de desenvolvimento econômico subordinado, de
caráter exportador primário, dependente tecnológica e cientificamente. Portanto, aos
educadores que conhecem o processo de constituição histórica do Ensino Médio no Brasil, no
contexto da Escola Moderna disciplinadora, higienizadora e moralizadora do cidadão atual,
cabe lutar contra essa Lei, envidando os esforços para que seja revogada, bem como, o
conjunto de reformas implementadas pelo governo golpista e ilegítimo - que em conluio com
bandidos protegidos pela estrutura estatal, destrói um sem número de direitos e garantias da
classe trabalhadora em função do socorro do grande capital nacional no seu processo de
recuperação e expansão de lucros – de forma a garantir que a formação acadêmica escolar, ao
menos legalmente continue igual para todos.
Referências

BRASIL, Decreto nº. 2208, Brasília, 1997. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d2208.htm Acessado em 15/05/2017.

BRASIL, Decreto nº. 5154 de 23 de julho de 2004, Brasília, 2004. Disponível em:
http://www.etsus.ms.gov.br/wp-content/uploads/sites/64/2015/04/DECRETO_5154.pdf

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil-1988. 2 ed. Rio de Janeiro:


Expressão e Cultura, 2002.

BRASIL. Lei de diretrizes e bases da educação nacional: (Lei 9.394/96). Apresentação


Carlos Roberto Jamil Cury. 4 ed. Rio de Janeiro: DP & A, 2001.

BRASIL/CNE/CEB. Resolução CEB nº.03, de 26/08/1998. Disponível em:


http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/res0398.pdf Acessado em: 21/04/2010.

FOUCAMBERT, J. A escola de Jules Ferry: um mito que perdura (Tradução de Lúcia


Cheren e Nathalie Dessarte). Curitiba: UFPR, 2010.

CÊA, G. S. S. A reforma da educação profissional e o ensino médio integrado: tendências e


riscos. Anais da 29ª Reunião Anual da ANPED, 2006. Disponível em:
http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/gt09-2565--int.pdf Acessado em
09 de março de 2008.

FERRETI, C. J. Mudanças em sistemas estaduais de ensino em face das reformas no Ensino


Médio e no Ensino Técnico. Educação e Sociedade, ano XXI, n. 70, abril/2007)

FRIGOTTO, G.; CIAVATTA, M.; RAMOS, M. (Org.). Ensino médio integrado:


concepções e contradições. São Paulo: Cortez, 2005.

GENTILI, Pablo. A falsificação do consenso: simulacro e imposição na reforma educacional


do neoliberalismo. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1998.

GRANEMANN, S. Políticas sociais e financeirização do trabalho. Em Pauta. Revista da


Faculdade de Serviço Social da Universidade do Rio de Janeiro, n. 20, 2007. P. 57-68.
Disponível em: http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaempauta/article/viewFile/
159/184 Acessado em 28/04/2017.

GUIMARÃES, E. R. Políticas para o ensino médio e educação profissional. In: Reunião


anual da associação nacional de pesquisa e pós-graduação. Disponível em:
http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/GT05-2132--Int.pdf Acessado em
09/03/2008.

KRAWCZKY, N. Ensino Médio: empresários dão as cartas na escola pública. Revista Educ.
Soc: Campinas, v. 35, n.16, p. 21-41, jan-mar, 2014. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-
73302014000100002&script=sci_abstract&tlng=pt Acessado em: 07/05/2017.
KRAWCZYK, N. O Ensino Médio flexibilizado: Uma reforma entre a fantasia da propaganda
e o pesadelo da realidade. Revista APASE, Ano XVI, nº 18, ISSN 1806-9843. Disponível em:
https://drive.google.com/file/d/0B3rY31x0kgNILU5HQXFtemdSUHc/view Acessado em
06/05/2017.

KUENZER, A. Z. Ensino Médio: Construindo uma proposta para os que vivem do trabalho.
3 ed. São Paulo: Cortez, 2002.

LEONEL, Z. Contribuições à história da escola pública: elementos para uma crítica da


teoria liberal da educação. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Educação da
Unicamp, Campinas, 1994.

MACIEL, L. S. B.; NETO, A. S. Formação de professores – passado, presente e futuro. São


Paulo: Cortez, 2004.

MARX, Karl. O Capital. L.1, v.1, Tradução: Regis Barbosa e Flávio R. Kothe. São Paulo:
Nova Cultural, 1985.

MÉSZÁROS. I. Educação para além do capital. (Tradução Isa Tavares). 2 ed. São Paulo:
Boitempo, 2008.

RIBEIRO, Maria Luiza Santos. História da Educação Brasileira: A organização Escolar.


21ª Ed. Campinas: Autores Associados, 2010.

NETTO, J.P. e BRAZ, M. Economia política: uma introdução crítica. 4 ed. São Paulo:
Cortez, 2008.

RODRIGUES, J. O pensamento pedagógico industrial. Disponível em:


http://www.ppgte.cefetpr.br/gtteanped/trabalhos/rodrigues.pdf#search=%22politecnica
%20saviani%22 Acessdo em: em 02/10/2006.

ROMANELLI, O. A História da Educação no Brasil (1930/1973). 4 ed. Petrópolis, RJ:


Vozes, 1983.

SAVIANI, D. A nova lei da educação nacional: trajetórias e perspectivas. 8 ed. Campinas,


SP: Autores Associados, 2003.

SILVA, M. R. O Ensino Médio como um campo de disputas: interfaces entre políticas


educacionais e movimentos sociais. Reunião Científica Regional da ANPED. Educação,
Movimentos Sociais e Políticas Governamentais. UFPR: Curitiba, 2016. Disponível em:
http://www.anpedsul2016.ufpr.br/wp-content/uploads/2015/11/Eixo-2-Ensino-M
%C3%A9dio.pdf Acessado em: 01/05/2017.

Você também pode gostar