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Trabalho Final
Este trabalho versa sobre os efeitos sociais e educacionais possíveis nas quais a
reforma do ensino médio pode desdobrar. Partindo de uma perspectiva crítica,
reproduzindo e refletindo sobre os argumentos contidos nos trabalhos de Tamberlini
(2017) e KOEPSEL, E; GARCIA; S; CZERNIK (2020), demonstrando como a reforma
está inserida em um contexto social e econômico mais amplo, respondendo a interesses
de grupos e classes sociais dominantes, subvertendo a lógica cidadã e democrática da
educação consagrada na Constituição de 19881 em nome da formação de sujeitos sociais
adequados às novas (velhas) modalidades de relação laboral do capitalismo flexível,
priorizando competências em detrimento de conhecimentos. Todavia, o objetivo aqui é
ampliar essa crítica, demonstrando que a reforma não só reforça desigualdades sociais
no âmbito da educação, mas também aprofunda o caráter dependente e subalterno da
posição do Brasil no capitalismo globalizado, atrelando-se a um modelo de
desenvolvimento pautado ainda na exportação de commodities e importação de
produtos de maior valor agregado, em um contexto em que a educação é um ativo
essencial nas perspectivas de desenvolvimento econômico e social.
O trabalho é estruturado em três partes: primeiro, é apresentada a evolução da
organização educacional brasileira, iniciando pelas disputas entre renovadores e
católicos no período de Nacional-Desenvolvimentismo (1930-1945) (Andreotti, 2006);
passando pela expansão educacional combinada com a entrada de agentes privados na
educação durante a Ditadura Militar (1964-1985) (Saviani, 2008); e chegando às
influencias de organismos internacionais na elaboração de leis e reformas educacionais
nos governos pró-reformas de mercado da década de 1990 (Gomide, 2013). Na segunda
parte, são colocados em perspectiva crítica os aspectos que guiam e traduzem
socialmente os efeitos da reforma, sendo focalizados três aspectos principais: a
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Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com
a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 1988).
formação dos itinerários formativos, o ensino técnico dissociado e a contratação de
professores por notório saber. Por fim, uma conclusão com uma reflexão mais aberta e
indicativa de quais perguntas podem guiar futuras pesquisas relacionadas ao tema,
vinculando educação e economia política.
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§ 7º Os currículos do ensino médio deverão considerar a formação integral do aluno, de maneira a adotar
um trabalho voltado para a construção de seu projeto de vida e para sua formação nos aspectos físicos,
cognitivos e socioemocionais (BRASIL, 2016 ).
A proposta de ensino técnico contida na reforma avança em uma perspectiva que
reduz o tempo de sala de aula dos estudantes, apesar da divulgação de fortalecimento do
ensino integral. A possibilidade de se encurtar o ensino técnico, mediante um certificado
de semi-conclusão, porém atestando habilidades adquiridas, esvazia a importância da
formação técnica.3 Tamberlini (2017) aponta que esse movimento reforça a dissociação
do ensino propedêutico do profissionalizante, alienando o jovem estudante da
compreensão totalizante dos aspectos produtivos, esvaziando a proposta da politecnia e
formando um profissional que compreende a prática de uma técnica, porém sem inseri-
la em um todo, respondendo apenas a uma demanda de mercado de uma mão de obra
mais simples de ser formada e mais barata. Essa proposta de ensino técnico atende
necessidades daqueles setores de menor intensidade tecnológica, reforçando o caráter
subalterno da economia brasileira em termos da qualificação profissional.
Por fim, a proposta de contratação de professores por notório saber 4 torna
desimportante a prática pedagógica, permitindo que a difusão de habilidades e práticas
se se sobreponha sobre os conhecimentos adquiridos durante a trajetória formativa do
profissional da educação. Tal como Tamberlini (2017) coloca, essa possibilidade torna
ainda mais fragmentado e mais segmentado a proposta pedagógica de construção do
ensino médio, pois flexibiliza o conceito de qualidade, pensando a qualidade como
expressão de uma formação pouca aprofundada e calcada na prática e não no
conhecimento.
Conclusão
A partir das discussões aqui apresentadas chega-se a conclusão de que a reforma
do ensino médio é a expressão de uma correlação de forças desfavorável para as classes
populares e forças democráticas nesse momento. Pensando em uma relação capital x
trabalho, a educação tem pendido para o lado da valorização de mercado,
transformando-se em um importante ativo da financeirização da economia. As críticas
apresentadas demonstram essa situação, onde a formação de sujeitos sociais se resumem
a formação de sujeitos para o mercado, sem direitos e ausente de uma consciência
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§ 6º A critério dos sistemas de ensino, a oferta de formação com ênfase técnica e profissional
considerará: II - a possibilidade de concessão de certificados intermediários de qualificação para o
trabalho, quando a formação for estruturada e organizada em etapas com terminalidade (BRASIL, 2016).
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§ 3º O processo seletivo referido no inciso II considerará as competências e as habilidades definidas na
Base Nacional Comum Curricular.” (NR)
IV - profissionais com notório saber reconhecido pelos respectivos sistemas de ensino, para ministrar
conteúdos de áreas afins à sua formação ou experiência profissional, atestados por titulação específica ou
prática de ensino em unidades educacionais da rede pública ou privada ou das corporações privadas em
que tenham atuado, exclusivamente para atender ao inciso V do caput do art. 36 (BRASIL, 2016).
crítica que lhes serão tomadas no ensino médio. Para além dessa questão, é importante
salientar que a reforma do ensino médio está inserida no circuito global de acumulação
capitalista também na sua dimensão de reprodutora da posição subordinada do Brasil
enquanto participante de etapas de criação de mercadorias de menor valor agregado e
tecnologicamente defasadas. Pensar criticamente a reforma também impõe uma revisão
e uma necessária vinculação de uma proposta educacional que se insira em um projeto
de desenvolvimento econômico e social mais amplo.
Referências Bibliográficas
ANDREOTTI, A. A ADMINISTRAÇÃO ESCOLAR NA ERA VARGAS E NO
NACIONAL-DESENVOLVIMENTISMO (1930 - 1964). Revista HISTEDBR On-line,
Campinas, n. especial, p.102–123, ago. 2006.
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Brasília:
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n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional, e a Lei n. 11.494 de 20 de junho 2007, que regulamenta o Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais
da Educação, e dá outras providências. Brasília: Câmara dos Deputados, 2016.
GOMIDE, A. ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: UM DEBATE
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KOEPSEL, E; GARCIA; S; CZERNIK; E. A TRÍADE DA REFORMA DO ENSINO
MÉDIO BRASILEIRO: LEI No 13.415/2017, BNCC E DCNEM. Educação em Revista
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SAVIANI, D. O LEGADO EDUCACIONAL DO REGIME MILITAR. Cad. Cedes,
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TAMBERLINI, A. A reformulação do ensino médio; pontuando conceitos, desvelando
sentidos, pensando caminhos. VI CONEDU. 2017.