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na elucidação de casos
Perícias Forenses
Instituto de Pós-Graduação - IPOG
Rio de janeiro, RJ, 16 de agosto de 2021
Resumo
O presente artigo tem como objetivo geral identificar informações a respeito das
tipologias envolvendo múltiplos homicídios utilizando conhecimento consolidado a
respeito do comportamento de Serial killers, Mass murder e Spree killers. A partir do
objetivo foi levantou-se o seguinte questionamento: Seria possível identificar que tipo
de ameaça a investigação está enfrentando através da análise de aspectos
comportamentais que o criminoso estampa na cena do crime? Trata-se de uma
revisão bibliográfica de caráter exploratório com abordagem qualitativa utilizando
artigos científicos e livros que são referência em classificação de crimes,
perfilhamento criminal e psicologia investigativa. Os resultados indicam que com
base no comportamento apresentado em relação à cena do crime e a vítima é
possível encontrar informações a respeito do seu modo de atuação na forma de
cometer o crime, descobrir possíveis patologias mentais e/ou déficits cognitivos,
grau de periculosidade do indivíduo e possibilidade de ocorrência de novos crimes.
Tendo assim, através de um método de classificação é possível utilizar um banco de
dados e aplicar técnicas data minig para retirar informações úteis que possam ajudar
a elucidar casos.
1. Introdução
Crimes que envolvem múltiplos homicídios a muito tempo encontram-se na
grande mídia e possuem um espaço reservado no coração do público. Filmes como
“O Silêncio dos inocentes”, “Os Sete Pecados Capitais”, “Jogos Mortais” e outros,
chamam atenção não só pelo carisma de seus atores como também pelas ações de
seus personagens como Hannibal Lecter, Jonh Doe e Jigsaw.
O planejamento e seu aparente domínio da trama e dos outros personagens,
faz com que estes personagens possuam certo charme e assim recebam o holofote
da admiração das pessoas e da mídia. Só que precisamos entender que quando os
crimes saem das telas e atingem as ruas, nossa vizinhança, o que era visto como o
ponto alto do enredo se torna algo assustador, e ao mesmo tempo em que a
cobertura dos jornalistas transforma o evento em algo misterioso. Ainda sim uma
coisa não muda, tanto na tela quanto fora dela, que é o fator “marcante”. Múltiplos
homicídios podem gerar marcas profundas em uma em uma rua, uma cidade, em
um país ou até mesmo no mundo.
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atuando e esta falta de tato com o tema pode gerar consequências severas para a
vida das vítimas. A escritora também declara que quanto mais rápido a identificação
de criminosos com este tipo de comportamento, mais rápido é possível acionar uma
equipe multidisciplinar composta por psicólogos forenses, profilers e médicos-
legistas para traçar um perfil.
Segundo Leite e Bezerra (2019:7) “É perceptível a falta de matérias no
acervo brasileiro e os que estão à disposição são caros e muitos se encontram
disponíveis em publicações internacionais. Portanto, é possível ver os
problemas e obstáculos da pesquisa científica para os que não possuem uma
segunda língua.”
Este tipo de ação pode não somente reduzir o número de suspeitos, mas
também estabelecer estratégias eficientes para investigação, auxiliar na busca de
provas, na construção do método de interrogatório e para entender a motivação do
crime. Neste sentido, o apoio que a polícia deveria receber para investigar estes
tipos de crimes deveria ser obrigatório.
Esta falta de integração de esforços talvez possa ser observada através de
dados estatísticos a respeito de serial killers pelo mundo. Até o ano de 2010 a
população dos Estados Unidos da América era de trezentos e oito milhões e
setecentos mil habitantes e até esta mesma data possuíam cerca de três mil e
noventa e dois serial killers identificados.
Traçando um parâmetro com dados brasileiros, segundo IBGE, em 2010
tínhamos cento e noventa milhões setecentos e cinquenta e cinco mil e setecentos e
noventa e nove habitantes e devido a falta de dados foi possível apenas encontrar o
número de trinta e um casos de crimes em série.
Considerando que, tanto o Brasil quanto os Estados Unidos da América, são
países populosos e levando em conta estudos de Adrian Raine (2015), no livro “A
Anatomia da Violência” que apontam as raízes da violência, era de se esperar um
número ao menos proporcional de eventos envolvendo crimes e criminosos em
série. Somados a isto ainda temos números de homicídios que crescem desde o
momento da sua medição. E ainda, segundo o IPEA (2017) o Brasil registrava
11.217 homicídios e no ano de 2017 registrava 65.502.
Este índice de elucidação baixo se torna ainda mais assustador se pegarmos uma
citação de um agente de Alagoas divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança
(2010:33)“ Até 48 horas é fundamental. 70% dos homicídios se resolvem em 48
horas. Se não fez em 48 horas, pode esquecer...”.
3. Múltiplos homicídios
A algum tempo atrás, antes da classificação de múltiplos homicídios que
temos hoje, estes crimes eram apenas classificados como mass killing, que em
tradução livre seria matança em massa. Por volta de 1980 o FBI(Federal Bureau of
Investigation) teve a iniciativa na sua academia de Quantico, em Virginia, de realizar
estudos, de documentar e investigar “repeat killers” que seriam homicidas que
tendem a repetir os seus crimes. Foi estabelecido a uma divisão em três partes do
que seria múltiplos homicídios em massa , spree e serial (BROOKMAN, MANGUIRE
e MANGUIRE, 2017:250).
podem ser um cinema, um teatro, escola, igreja, local de trabalho, igreja, dentro de
lugares ou ao lado de fora onde corram grande circulação de pessoas.
O mesmo utilizar armas, fogo, explosivos e dificilmente irá se envolver em
crime envolvendo parafilias ou atos sexuais e suas vítimas podem envolver
membros da família com mais frequência do que casos de serial killer (DOUGLAS,
et. al., 2013:472).
Com bastante frequência encontramos definições de serial killer como sendo
um tipo de predador e no caso do mass murder seria como uma “bomba-relógio
humana”. Embora existam casos de mass murder perpetrados por mulheres, a sua
grande maioria são homens. De uma forma bem generalista poderíamos definir o
“mass murder” com uma pessoa o qual a vida saiu dos eixos de forma negativo no
aspecto conjugal, profissional ou passou por alguma situação que o trouxe bastante
humilhação (SCHECHTER, 2003:19).
Existem dois tipos de mass murder, o clássico e o família. O clássico envolve
apenas um homicida, atuando em um local e em um período de tempo que pode
compreender minutos, horas e pode durar até dias. O clássico também possui algum
tipo de distúrbio mental que quando ele atinge certo grau de agravamento ele
comete os homicídios contra grupos que não possuem relação direta com o seu
problema (DOUGLAS, et. al, 1986:6).
No segundo tipo de homicida em massa, o homicida de membro da família,
ocorre quando mais de três membros da família são mortos por ele e o mesmo
acaba tirando a sua própria vida recebendo a classificação de homicida em
massa/suicida. Pode suceder também casos onde não ocorre o suicídio e este é
chamado de “Family killing”, que em tradução livre seria homicida de família
(DOUGLAS, et. al, 1986:6).
Contudo existem alguns problemas relacionados ao conceito de mass murder.
O primeiro problema é que o termo “mass” que traduzindo seria “massa” faz relação
a quantidade de pessoas que foram mortas. Quando utilizamos a palavra “massa”
sobre outras óticas como “mass media”(Que traduzindo seria “comunicação em
massa”), estamos tratando de milhões de pessoas que recebem algum tipo de
informação, como em um sistema de TV.
Quando estamos tratando de classificação de crime podemos definir um mass
murder apenas com quatro homicídios. O segundo problema é que não existe um
consenso entre os pesquisadores sobre o número de vítimas necessário para a
classificação como mass murder e a estipulação de um número de vítimas faz
parecer uma decisão arbitrária. O terceiro problema é um mito que existe sobre que
este tipo de criminoso é acometido de algum tipo de doença mental onde o mesmo
atira em pessoas a sua volta de maneira aleatória.
Estudos apontam que 40% dos casos de mass murder ocorrem em âmbito
familiar, outros 40% ocorrem em locais de trabalho e apenas 20% ocorrem se
encaixam na descrição da mídia ocorrendo em lugares como escolas, shoppings e
campus universitários. Existem até mesmo casos onde o mass murder não atacou
ou nem ao menos machucou alguma vítima em potencial pelo fato de que aquela
pessoa “não tenha magoado os seus sentimentos”(Edelstein, 2014:124).
Muitos estudos encontrados na literatura apontam que o mass murder sabe o
que difere o certo do errado e planejam seu ataque em locais públicos com muito
cuidado. Outro mito diz que pode enganar é que o mass murder é um homicida de
ocasião sendo que seu alvo são pessoas estranhas. Na verdade funciona de forma
oposta onde dados apontam algum tipo de laço com suas vítimas (membros da
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Crime Violentos. Esta unidade conta com expertise onde analisam cenas de crime e
geram perfis criminais desde de 1970 (DOUGLAS e BURGESS, 1998:12).
ele aborda as vítimas por oportunidade justamente ter uma inaptidão para criar e
seguir planos. As próprias ações do criminoso na cena do crime em relação a uma
tentativa de mudar a cena do crime para tentar direcionar a investigação pode até
direcionar o investigador para elucidar a motivação (FBI, 1998:21).
Motivação (Motivation)
A motivação é o aspecto mais difícil de se determinar em um crime, pois ele
diz respeito a fatores profundos da mente do criminoso, neste caso quanto mais
desorganizado forem seus pensamentos e/ou caso possua alguma desordem mental
mais difícil de identificar a motivação. (FBI, 1998:20)
Esse fator pode ser ainda mais agravado se for incluído variáveis como
emocionais como pânico e estresse, assim como também pode ocorrer consumo de
drogas lícitas ou ilícitas. No caso de criminosos organizados isso pode ser um pouco
mais fácil pois existe uma "lógica" que pode ser acompanhada através da habilidade
de planejar e seguir o planejamento deste tipo de criminoso. Esta organização pode
acabar criando uma sequência lógica que auxilia o investigador. (FBI, 1998:20)
A motivação é algo tão conectado ao criminoso que para uma pessoa sem
conhecimento em perfil criminal a vítima pode ter sido escolhida ao acaso quando na
verdade, na maioria dos casos, a vítima tem alguma simbologia em relação a
ele.Entender os quatro tipos de serial killer também ajuda a conhecer a motivação
dos crimes em série. Os quatro tipos são visionário, missionário, emotivo e sádico.
(CASOY, 2017:23)
No caso do visionário temos a caracterização dele como um psicótico onde
devido a distúrbios mentais é acometido de alucinações audiovisuais que o
impulsionam ao crime. Já o missionário não demonstra grandes sinais de distúrbio
mental, porém tem a necessidade de cumprir uma missão de ajudar o mundo a se
livrar de determinado grupo que ele julga indigno ou representa algum tipo de
imoralidade. (CASOY, 2017:23)
O emotivo realiza os homicídios por pura diversão e ele obtém prazer desde o
planejamento até a execução do crime. O sádico mata por desejo sexual onde atos
como torturar, mutilar e matar lhe traz prazer sexual e canibais e necrófilos estão
inseridos nesta categoria (CASOY, 2017:23)
Dinâmica da cena do crime (Crime Scene Dynamics)
Os investigadores fazem a interpretação da cena do crime através de
elementos que são comuns em todas as cenas de crime. Estes elementos são o
local da cena do crime, causa da morte, método utilizado para matar, posição do
corpo, traumas excessivos e localização dos ferimentos. Através destes elementos
citados anteriormente, com base em sua experiência em casos similares é realizado
o investigador compreender a dinâmica dos eventos (FBI, 1998:20)
No caso dos agentes do FBI, esta experiência possui um potencializador que
é uma enorme base de dados de entrevistas com criminosos que estão na Unidade
de Ciências Comportamentais. Neste material possui uma enorme quantidade de
informações sobre personalidade criminosa e seus padrões (FBI, 1998:20)
4 - Estágio de perfilamento Criminal (Criminal Profile Stage)
Nesta fase busca-se o tipo de pessoa que cometeria o crime e a sua
organização comportamental individual(Personalidade) em relação com a cena do
crime. Com as informações é possível agora formular a estratégia de investigação
com relação a como o indivíduo irá responder em relação aos esforços empregados.
(FBI, 1998:20)
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6. Conclusão
Crimes causam sérios danos, tanto para pessoas quanto para a coletividade
como o seu todo. Estes danos são ainda maiores quando se trata de crimes
continuados ou em série contra o bem mais precioso que é a vida. Estes crimes
geram uma grande quantidade de vítimas e podem formar feridas sociais que
deixam severas cicatrizes. Como exemplo podemos citar o atentado ao World Trade
Center onde terroristas colidiram dois aviões contra edifícios conhecidos como
Torres Gêmeas, sendo assim este ato classificado como um evento de mass
murder.
A melhor maneira de entender um crime é buscar classificá-lo através de suas
características. Estas características além de ajudar a compreender a periculosidade
do criminoso e a possibilidade de repetição do delito, pode também proporcionar a
descrição necessária que possibilita a individualização do crime para cadastro,
análise e pesquisa em um sistema de banco de dados.
Com as informações devidamente cadastradas é possível usar técnicas de
data mining para poder tirar informações úteis para a elucidação dos crimes. Estas
informações não necessariamente trarão a autoria dos crimes, mas podem dizer
bastante sobre o criminoso, sua personalidade e comportamento. Através de
informações de perfilamento criminal é possível ao menos ajudar nas investigações
para reduzir a quantidade de suspeitos. Caso as pesquisas continuem avançando no
sentido do estudo do crime em relação ao comportamento humano, será possível
prever o comportamento futuro do criminoso através da análise dos crimes
anteriores.
Um banco de dados atuando em conjunto com data mining é uma ferramenta
de análise de dados e para isso precisa ser alimentado com informações
quantitativas e qualitativas para que possam ser extraídos resultados precisos. Estas
informações podem ser objetivas e subjetivas a respeito de determinada cena de
crime e seus vestígios. Para isso é necessário padronização do método de
investigação para que os esforços de todos os envolvidos sejam direcionados a
elucidação do caso e para a entrada de dados confiáveis no sistema.
Para que este sistema possa dar certo e ajudar a elucidar crimes é necessário
mais do que uma padronização, é necessário um esforço nacional principalmente
para superar barreiras relacionadas a jurisdição.
Quanto mais colaboração para criar um banco de dados criminal, maior será a
efetividade da análise realizada por ele. Desta forma uma dos problemas que hoje
atrapalha a elucidação de crimes em série, que é a possibilidade do criminoso
praticar o ato delituoso em múltiplas jurisdições, possa ter uma maior chance de ser
sanado.
Infelizmente, no Brasil, contamos com uma taxa de elucidação de crimes
baixíssima. Ainda mais se compararmos com outros países. Esta taxa não é devido
a baixa qualidade dos nossos agentes, mas sim da falta de estrutura e apoio que é
dada a eles durante as investigações.
A criação de um sistema nacional não somente irá facilitar as investigações,
pois irá servir como um banco de dados forenses, como também irá proporcionar
likar múltiplos crimes de maneira mais eficiente, melhorar a comunicação entre
instituições e jurisdições para juntos aumentar a taxa de elucidação de crimes e
assim salvar mais vidas, servir e proteger os cidadãos do nosso país.
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Referências
BROOKMAN, F.; Manguire, E.R.; Maguire, M.The handbook of homicide.Arizona:
Wiley, 2017.
CASOY, Ilana. Serial Killers: Made In Brazil. Rio de janeiro: DarkSide Books, 2017.
https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=3025
3>. Acesso em: 13 de julho de 2021.