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IMPROVISAÇÃO MUSICAL

AULA 5

Prof. Anderson Toni


CONVERSA INICIAL
AS PEDAGOGIAS MUSICAIS ATIVAS: CONTRIBUIÇÕES ÀS PRÁTICAS DE
IMPROVISAÇÃO NO
ENSINO DE MÚSICA
Caro(a)
estudante, seja bem-vindo(a) a nossa aula! Hoje o estudo da improvisação e de suas
interfaces com a educação musical nos conduz a uma revisão das pedagogias em
educação
musical. Nossas discussões apresentam alguns olhares sobre
possibilidades para se pensar a
improvisação musical com base em perspectivas de
educação musical. Nesse sentido, é
importante considerar nosso desenvolvimento no
que diz respeito a uma visão crítica de modelos,
pedagogias e propostas, sempre
tendo em mente as contingências socioculturais e contextuais de
cada
perspectiva. Outro ponto de relevante importância é a necessidade de
integrarmos a teoria e
a prática a nossos estudos como músicos e professores de
música, o que também se aplica à
fundamentação de nossas práticas
pedagógico-musicais.
Para esta
aula, é necessário termos em mente o fazer musical ativo, principalmente quando
discutirmos a improvisação musical e suas possibilidades no ensino e
aprendizagem de música.
Nesse sentido, a presente aula apresenta os seguintes
temas de estudo:
os paradigmas tradicionais do ensino de música;
as pedagogias ativas e os novos paradigmas em educação
musical;
a educação musical no século XX: a primeira geração de
metodologias ativas;
a educação musical no século XX: a segunda geração e as
metodologias (cri)ativas;
a improvisação musical e as propostas integradoras no ensino
de música: as proposições de
Keith Swanwick.
Além disso,
há uma seção de proposição prática e uma seção de finalização que apresenta a
retomada dos principais tópicos estudados nesta aula.

TEMA 1 – OS PARADIGMAS TRADICIONAIS DO ENSINO DE MÚSICA


Iniciamos
nossa aula considerando a necessidade de um olhar crítico sobre os modelos de
ensino e aprendizagem na educação geral e na educação musical. Quando
reforçamos esse olhar,
estamos situando a necessidade de pensarmos nos
contextos e visões de mundo implicados em
determinadas propostas. Tal postura
nos possibilita analisar como a criação, o fazer e a escuta
musicais são
entendidos em cada proposta, em especial como é feita a integração desses
elementos em nossos estudos sobre a improvisação musical.
Ao lançar um
olhar histórico para o ensino de música, Marisa Fonterrada (2008, p. 81) afirma
que, entre os séculos XVIII e XIX, mudanças no ensino de música ocorreram, com
“[...] o
surgimento das primeiras escolas particulares de caráter
profissionalizante”. Algumas dessas
escolas ficaram conhecidas pelo nome de conservatórios
ou academias de música, como é o caso
do Conservatório de Paris (fundado
em 1794) e de The Royal Academy of Music (fundada em
1822). Esse modelo também
chegou ao Brasil, com a fundação do Conservatório Brasileiro de
Música (1845),
no Rio de Janeiro, e do Conservatório Dramático e Musical (1906), em São Paulo.
Esses espaços de ensino e aprendizagem de música primavam pela “[...] formação
do
instrumentista virtuose e corroboravam a tendência ao individualismo, ainda
hoje presente na
formação de grande parte dos músicos” (Fonterrada, 2008, p.
81). Em relação a esse tema e ao
que será chamado de habitus conservatorial
no ensino de música praticado nos conservatórios,
Pereira (2014) destaca pontos
que indicam que o formato de instituição conservatorial ainda
persiste no Brasil,
na figura do professor como exemplo máximo e detentor de todo o
conhecimento,
por meio de um ensino tutorial, da existência de programas fixos e progressivos
de
estudos, com um aluno sem possibilidades de escolhas, a música de concerto
ocidental como
sendo o conhecimento oficial, entre outros aspectos.

Saiba mais
Convidamos
você a pensar sobre seus contextos como aluno. Você já realizou aulas de
instrumento? Se sim, como eram organizados os exercícios, as práticas e a
execução musical?
Você tinha espaços para improvisar musicalmente? Era
incentivado a realizar essas práticas?
Pensando em tudo que vimos até agora,
reflita sobre como você acredita que a improvisação
musical pode ser importante
em aulas de instrumento musical.
Visões do
ensino de música como as dos conservatórios de música apontam para uma
educação
musical que busca se conservar em paradigmas tradicionais (Veloso, 2020). Ao se
tecer
críticas ao modelo conservatorial de ensino, é importante se ter em mente
que muitas de suas
contribuições auxiliaram no desenvolvimento de propostas de
educação musical. Trata-se aqui de
entender suas contribuições, mas superar suas
limitações, como as destacadas nas pesquisas de
Pereira (2014) e Veloso (2020).
Esse modelo de ensino será profundamente discutido ao longo da
história da
educação musical no século XX e XXI, uma vez que as tendências subsequentes
apontarão para a sua superação como um modelo demasiadamente tecnicista.
Flávio Veloso
(2020) aponta três críticas ao modelo tradicional de ensino de música comum
em
conservatórios, com possíveis condições de superação de suas premissas. A
primeira delas diz
respeito a uma ênfase quase que exclusiva no domínio
técnico-instrumental, o que poderia ser
superado com um olhar para o aluno como
um ser que também pode ser reflexivo, atuante e
criativo. A segunda está
relacionada com um ensino tutorial, que apresenta uma unidirecionalidade
do
professor para o aluno, por meio da transmissão de ideias, o que poderia ser
superado mediante
interações e construções conjuntas do professor com o aluno,
sobre a prática musical. Por fim, o
terceiro aspecto está relacionado com
visões de ensino fragmentadas e com destaque para um
único repertório, o que
aponta para possibilidades de expandir os olhares sobre educação musical
para
diferentes possibilidades sonoro-musicais. Dessa forma, os professores precisam
pensar
sobre suas condutas e ações – as pedagogias e as reflexões sobre o
ensino de música no século
XX levam-nos a agirem de modo que possam promover a
autonomia dos alunos e incentivar
práticas musicais que vão além de uma
interpretação tecnicista/mecanicista. Nesse cenário, a
improvisação musical
aparece como uma oportunidade para se pensar em ampliações dos
processos de
ensino e aprendizagem de música em diferentes contextos e faixas etárias.

TEMA 2 – AS PEDAGOGIAS ATIVAS E OS NOVOS PARADIGMAS EM


EDUCAÇÃO MUSICAL
A virada do
século XIX para o século XX apresentou diferentes tendências intelectuais,
sociais
e artísticas que impactaram a educação geral e as propostas de ensino e
aprendizagem de música.
Violeta de Gainza (2004, 2011) reforça que o início do
século XX apresentou novidades no
pensamento educacional, com novas tendências
como as propostas pelo filósofo John Dewey e o
movimento chamado escola nova,
que tinha como base uma educação ativa centrada na
experiência e nos processos
do aluno.
Nesse cenário
de mudança de paradigmas, alguns educadores musicais começam a propor
pedagogias ativas para o ensino de música. Essas pedagogias ativas em educação
musical são
entendidas como novas formas de se pensar o ensino e aprendizagem
de música de maneira a
superar os padrões tradicionais até então em vigência.
Teca de Alencar Brito (2003) apresenta
alguns comparativos nos quais ela afirma
que, no modelo tradicionalista, há, por exemplo, a
atenção exacerbada
apenas para a performance, a predominância do tecnicismo e do ensino
teórico e
de repertórios alheios à vivência dos alunos. Por outro lado, as pedagogias
ativas
privilegiam uma formação musical mais ligada à experimentação, ao fazer
musical ativo, ao aluno
no centro do processo, à atenção aos movimentos e ao
fazer musical ativo. Nesse sentido, a
improvisação está presente nas propostas de
uma educação musical ativa quando se pensa na
expansão de repertórios para
possibilidades de práticas improvisativas e criação, invenção e
exploração
sonoro-musical pelos alunos (Brito, 2003; Veloso, 2020).
Sobre o uso
do termo pedagogias, em educação musical, Teresa Mateiro e Beatriz Ilari
(2012)
afirmam que esse parece ser o mais apropriado para as ideias dos
educadores musicais do século
XX, uma vez que alguns deixaram métodos ou
sequências mais estruturadas, enquanto que
outros propõem ideias
e reflexões mais abertas para que outros educadores possam delas se
apropriar
em seu cotidiano e em seu contexto educacional. Nesse sentido, Maura Penna
(2012)
destaca a necessidade de o professor de música analisar o contexto e os
fundamentos de cada
proposta, compreendendo os contextos nos quais elas foram
desenvolvidas e suas específicas
visões de mundo.
Ao pensar a
superação de modelos tradicionalistas, as pedagogias em educação musical no
século XX expõem uma necessidade de proposição de um fazer musical ativo em
diferentes idades
e por todas as pessoas. Para isso, o fazer musical deve vir
antes da teoria, entendendo-se ambos
não como processos opostos, mas
complementares. Convém relembrar a ideia de musicalização
de um modo amplo, pelo
qual o ensino de música é algo mais do que apenas lecionar como tocar
um
instrumento, sendo a musicalização um “[...] processo em que, com a
sensibilização sonora, a
criança passa a atribuir sentido aos conceitos
musicais, a partir de uma série de práticas ativas em
que se envolve de maneira
significativa” (Madalozzo, 2019, p. 25). Quanto à improvisação nas
pedagogias
ativas em educação musical, ela tem “[...] um lugar de destaque no ensino e
aprendizagem de música, [em se] concebendo-a como uma rica (e imprescindível)
ferramenta
pedagógica e uma via de expressão da arte musical” (Veloso, 2020, p.
245).

TEMA 3 – A EDUCAÇÃO MUSICAL NO SÉCULO XX: A PRIMEIRA


GERAÇÃO DE
METODOLOGIAS ATIVAS
Ao revisar as
pedagogias em educação musical no século XX, Gainza (2004) propõe seis
momentos
distintos que agrupamos em uma primeira e em uma segunda geração. Com base na
organização e categorização da autora, podemos pensar a primeira geração em
três períodos
compreendidos entre o início do século XX e a década de 1960,
conforme a Figura 1.
Figura 1 – Primeira geração das pedagogias ativas em educação
musical

Fonte: Elaborado com base em Gainza, 2004.


Com base na
divisão apresentada na Figura 1, a primeira geração de pedagogias em educação
musical no século XX distingue-se em três momentos apontados por Gainza (2004):
métodos
precursores, métodos ativos e métodos instrumentais. Os métodos
precursores são
caracterizados como aqueles que serviram de base pedagógica
para tendências futuras. Dentre as
propostas está o modelo intitulado tônica
Sol-Fá, uma proposta para facilitar a leitura musical e que
foi muito
aplicada no canto coral e nos estudos de solfejo. Trata-se de um modelo que
utiliza um
sistema de recordação para cada nota, na forma de símbolos (números,
letras, sílabas). Os
métodos ativos são entendidos como
pedagogias musicais estruturadas que exploram novas
possibilidades no ensino de
música, destacando-se três de seus propagadores, segundo Gainza
(2004):
1. Émile Jaques-Dalcroze, que propõe atividades musicais que
buscam explorar os
movimentos corporais com a música e uma proposta para o
ensino da rítmica;
2. Edgar Willems, que buscou compreender a inteligência
auditiva, as questões afetivas e
a busca de bases científicas para o ensino da
música;
3. Maurice Martenot, que apresentou uma atenção ao
desenvolvimento pessoal de cada
aluno e ao elemento rítmico da música.
Por fim, os métodos
instrumentais são discutidos por Gainza (2004) com menção a três
nomes:
1. Carl Orff, que buscou explorar práticas instrumentais e
vocais em suas propostas;
2. Zoltán Kodály, que propôs um trabalho com a voz e o canto
coral;
3. Shinichi Suzuki, que trabalhou com o ensino de instrumentos,
inicialmente o violino e
posteriormente outros instrumentos.

Saiba mais
Nas propostas de Orff, a improvisação possui espaço
determinante em improvisações
melódicas, rítmicas, textuais e corporais (Bona,
2012). Seguindo a divulgação do método de
Orff, o educador musical Jos Wuytack
(citado por Palheiros; Bourscheidt, 2012) também
destaca a importância da improvisação
musical em suas práticas. Com base nessas ideias de
improvisação na educação
musical, podemos pensar em propostas de atividades que
envolvam:
a. jogo de eco, com imitações e variações;
b. jogo de perguntas e respostas rítmicas, melódicas ou
corporais;
c. explorações melódicas e harmônicas livres ou com base em
notas determinadas
em instrumentos de altura definida.

A prática da improvisação musical compõe também


as propostas de Dalcroze e está presente
nas improvisações vocais,
instrumentais e corporais como um momento em que o aluno pode se
expressar
criativamente e interagir social e musicalmente de maneira individual e
coletiva (Mariani,
2012). Em Kodály (citado por Silva, 2012) também é possível
verificar propostas que trabalham
com improvisações rítmicas e melódicas por
meio da expressão musical do aluno.
TEMA 4 – A EDUCAÇÃO MUSICAL NO SÉCULO XX: A SEGUNDA
GERAÇÃO E AS
METODOLOGIAS (CRI)ATIVAS
A segunda
geração das pedagogias em educação musical abarca as propostas que surgem a
partir da década de 1970. Muitos dos educadores musicais da segunda geração de
pedagogias em
educação musical estão alinhados às tendências composicionais e
de vanguarda do século XX, à
chamada música nova ou música
contemporânea. Com base na classificação de Gainza (2004), a
segunda
geração das pedagogias em educação musical pode ser dividida em outros três
períodos,
conforme a Figura 2.
Figura 2 – Segunda geração das pedagogias ativas em educação
musical

Fonte: Elaborado com base em Gainza, 2004.


A Figura 2
apresenta a divisão proposta por Gainza (2004) para as tendências em educação
musical a partir da década de 1970. Sobre as abordagens criativas,
destaca-se o
compartilhamento do interesse criativo do professor com os alunos,
principalmente se
consideramos que os educadores musicais são também
compositores, como são os casos de
George Self, John Paynter, Boris Porena e
Murray Schafer. Essas abordagens são consideradas
criativas por
centrarem em um deslocamento do ensino da música para o enfoque na criação
musical, ao invés de uma atenção apenas para os elementos de escuta e
interpretação musical.
Nas tendências de transição é apresentado um
momento em que há uma diversidade de
questionamentos e propostas para a
educação musical: emprego da tecnologia digital na
educação, de maneira geral,
e nas aulas de música; ecologia sonora, com base na reflexão sobre
os espaços
sonoros que nos cercam, entre outros movimentos. Por fim, nos novos
paradigmas
considera-se um despertar de ideias sobre como pensar o ensino
superior em música, assim como
Gainza (2004) destaca práticas orientadas para os
novos paradigmas em vigência, como a
valorização de culturas populares e a
atenção com a ludicidade.
Saiba mais
Murray Schafer propôs uma série de ideias para se pensar as
possibilidades sonoro-
musicais. Já revisamos anteriormente, em nossas aulas,
algumas ideias desse compositor, que
também se dedicou a pensar em propostas
que pudessem ser desenvolvidas em sala de aula.
Schafer (1991) incentiva a
experimentação sonora e musical por meio da improvisação
constante com os sons
disponíveis em nosso entorno. O professor poderá pensar em ideias de
exploração
sonoro-musical por meio de projetos que:
a. estimulem a busca de sons inusitados e/ou convencionais;
b. trabalhem o som e o silêncio;
c. desenvolvam improvisações vocais, rítmicas, sonoras e
corporais.
Utilize a
internet para buscar informações sobre aquele educador musical, suas
composições e suas propostas pedagógico-musicais.

Para pensar
um pouco mais sobre a improvisação musical, destaca-se a importância desse
elemento para os educadores Gertrud Meyer-Denkmann e John Paynter (citados por
Souza, 2012;
Mateiro, 2012), em suas propostas, que incentivavam experimentações
sonoro-musicais e o
exercício da improvisação, o que estava condicionado a um
olhar para as pessoas como agentes
sonoro-musicais em ações experimentais
com os sons.

TEMA 5 – A IMPROVISAÇÃO MUSICAL E AS PROPOSTAS


INTEGRADORAS NO ENSINO DE
MÚSICA: AS PROPOSIÇÕES DE
KEITH SWANWICK
Keith
Swanwick é professor emérito do Instituto de Educação da Universidade de
Londres e é
considerado em professor e pesquisador de destaque nos estudos
sobre a educação musical.
Vamos focar em uma proposta sua, com outro
pesquisador: o modelo intitulado C(L)A(S)P (França;
Swanwick, 2002), do
inglês: composition (composição), literature studies (literatura
acadêmica/teórica em música), appreciation (apreciação), skills (habilidades
técnicas) e
performance (execução/interpretação musical). O modelo
C(L)A(S)P não é um produto ou molde
fechado, mas uma possibilidade de
olhar para a educação musical. As letras C, A e P são
consideradas os pilares do modelo e sustentam a ideia da composição/criação, da
apreciação/escuta e da performance/fazer musical (França; Swanwick,
2002). Buscamos relembrar,
ao longo de nossas aulas, a importância desses três
aspectos no ensino e aprendizagem de
música, o que, por sua vez, também está
relacionado com a fundamentação de nossa ideia sobre a
improvisação musical.
Certamente, França e Swanwick (2002) não são os únicos a defenderem a
inter-relação entre a criação, a escuta e o fazer musicais; outras propostas e
educadores musicais
também sustentam o mesmo discurso (por exemplo, Elliott;
Silverman, 2015; e as propostas de
pedagogias ativas em educação musical de
Mateiro; Ilari, 2012). As letras L e S são secundárias na
sigla
(estão entre parênteses) e referem-se à literatura e às habilidades técnicas,
as quais são
pensadas como subsidiárias dos três componentes principais
(França; Swanwick, 2002). Dessa
forma, é possível obter uma organização dos
componentes da forma exibida na Figura 3.
Figura 3 – Modelo C(L)A(S)P e seus componentes

Fonte: Elaborado com base em França;


Swanwick, 2002.
A composição
é pensada aqui de maneira ampla, envolvendo a criação, a exploração
sonoro-
musical e a improvisação musical. Na apreciação temos os processos de
escuta musical e na
performance há a manipulação do material sonoro mediante execuções
em diferentes níveis de
interpretação. A literatura sobre a área musical pode
fornecer subsídios históricos e teóricos para
se compor o conjunto de
conhecimentos musicais, enquanto a técnica pode auxiliar, por exemplo,
no
desenvolvimento da execução técnico-instrumental e na leitura e escrita
musical. Nosso foco
está na improvisação musical, a qual é contemplada por um
olhar para a criação musical. Nesse
sentido, Veloso (2020) destaca que, por essa
visão de educação musical, a criação movimenta o
aluno em direção à manipulação
dos elementos estruturantes da música, auxilia na estruturação do
pensamento,
que facilita a compreensão e o desenvolvimento musical do aluno em sua
manipulação sonora, e demanda uma postura ativa e autônoma do aluno, o que incita
seu
engajamento na atividade musical.

NA PRÁTICA
Nesta aula,
nossa atividade prática estará relacionada com uma prática musical ativa
pensada
para a musicalização infantil, mas que também pode ser estendida, com
um aumento gradual de
complexidade, a outras faixas etárias. Em nossas experiências
em aulas de musicalização infantil, já
aplicamos a atividade aqui descrita a
crianças de 2 a 5 anos. Cada turma reage de uma maneira
diferente às propostas
e cada professor tem liberdade para adaptar as atividades à necessidade de
seus
alunos.
Para essa
atividade, vamos utilizar instrumentos de percussão sem altura definida. Os
instrumentos de percussão de altura não definida são aqueles que não apresentam
alturas/notas
claramente definidas, como  maracas, reco-reco, ganzá, guizos,
triângulo, pandeiro, clavas, caxixi,
entre outros instrumentos. Para a nossa
atividade, também é possível explorar possibilidades com
a percussão corporal e
outros materiais sonoro-musicais (Figura 4).
Figura 4 – Instrumentos de percussão com altura não definida

Crédito: Studio Light and


Shade/Shutterstock.
Convém
destacar a necessidade da exploração sonoro-musical do instrumento. Muitas
vezes,
a criança e até mesmo os adolescentes e adultos estão tendo contato com
o instrumento pela
primeira vez. Nesse sentido, a improvisação musical já
começa com a exploração do material
sonoro, situação que o professor pode
incentivar em sua prática pedagógico-musical.
Os
instrumentos de percussão de altura não definida costumam ser comuns em espaços
com
aulas de musicalização infantil. Portanto, conseguimos realizar uma
aproximação da improvisação
musical com os assuntos estudados em nossa aula. Há
também possibilidades de adaptações de
instrumentos, por exemplo, cabos de
vassouras podem ser cortados e transformados em clavas.
Além disso, é possível
utilizar o corpo para a realização de percussões corporais, bem como a voz
e
outros materiais do ambiente de aula.
Com base nessas
considerações iniciais, podemos começar nossa prática. Os instrumentos
são
distribuídos aos alunos e eles são orientados a fazer música juntos, em roda.
Esse fazer
musical se constitui de uma improvisação musical coletiva que mescla
tanto a improvisação livre
quanto a improvisação mais estruturada, com a
criação de padrões musicais/rítmicos com as
informações anteriores. A ideia é
que um aluno (ou o próprio professor) comece um motivo
musical/rítmico que será
complementado por um outro aluno logo ao lado daquele, na roda. Assim,
as
ideias musicais/rítmicas são sobrepostas e os dois alunos (ou um aluno e o
professor) tocam
juntos. Na sequência, um outro aluno na roda apresenta uma nova
ideia musical/rítmica e assim por
diante, até que todos os alunos contribuam com
a dinâmica e toquem juntos.
Pelo menos em
um primeiro momento, talvez seja interessante que cada aluno foque em
apenas um
motivo musical/rítmico individual, que será repetido constantemente. A criação
musical,
nesse exercício, movimenta aspectos da improvisação em uma composição
em tempo real, ou seja,
a integração do criar/improvisar, do fazer e do escutar
permite que um produto musical não
estritamente determinado antes emerja dos
processos empreendidos individual e coletivamente.
Cada turma, cada aula e cada
distribuição de instrumentos apresentarão com isso um resultado
musical
distinto.
Continuando a
atividade, é possível realizar a mesma progressão de entradas simultâneas,
mas
agora com o silêncio. O aluno que iniciou a atividade fica em silêncio, seu
colega ao lado
também e assim por diante, de maneira progressiva. A retirada de
sons apresentará uma outra
característica musical. Esses exercícios podem ser
discutidos na sequência, com os alunos. Dessa
forma, eles são colocados no
centro da experiência musical e podem refletir ativamente sobre seu
processo de
criar, fazer e escutar musical.
Ampliando
possibilidades, o professor pode propor que um aluno se torne o regente/maestro
da turma. Essa função será constantemente trocada tendo em vista o interesse
dos alunos em
participar assumindo esse papel. O aluno regente indicará quais
alunos irão tocar, quando começar
a tocar e quando silenciar. Esse movimento
poderá apresentar camadas a mais para se pensar a
improvisação e ser um
importante momento para os alunos se engajarem em desafios adicionais.
Novamente, a improvisação musical está presente na execução de cada aluno, o
qual precisará
criar musicalmente com considerações tais como em relação aos
motivos musicais-rítmicos de um
colega que já está tocando e às possibilidades
oferecidas pelo instrumento que ele tenha em mãos.
Cada configuração
apresentará uma característica musical singular e reforça-se a necessidade de
cada aluno experimentar diferentes instrumentos e possibilidades. A figura do
regente também
pode ser encarada de maneira ampla como uma
criação/improvisação, uma vez que suas
indicações gestuais e musicais são
realizadas no momento da atividade e mediante possíveis
escolhas
sonoro-musicais apresentadas por seus colegas.
Para
finalizar, os alunos podem intercalar momentos de criação coletiva com espaços
de
improvisação individual, de modo que suas ideias musicais possam ser
expressas. Essas atividades
não estão restritas apenas às crianças. Na verdade,
é comum adolescentes e adultos se engajarem
em atividades como essa ao
explorarem as possibilidades de criar/improvisar em grupo.

FINALIZANDO
Recapitulando,
nesta aula foi possível revisar perspectivas de um ensino de música tradicional
e analisar novas perspectivas para uma educação musical ativa no século XX com
a intenção de
elucidar o aspecto da improvisação musical nas pedagogias em
educação musical. Dessa forma,
recomendamos o devido aprofundamento no assunto,
caso seja de seu interesse. Além disso,
buscamos estudar brevemente o modelo
C(L)A(S)P e as possibilidades de pensarmos a
improvisação musical e a
integração da criação, do fazer e da escuta musicais. Por fim, a
proposição
prática, ao final de nossa aula, permitiu estabelecer paralelos com os assuntos
ora
estudados.
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