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IMPROVISAÇÃO MUSICAL

AULA 3

Prof. Anderson Toni


CONVERSA INICIAL
IMPROVISAÇÃO E APRENDIZAGEM MUSICAL: ASPECTOS PSICOLÓGICOS,
SOCIAIS E
EDUCACIONAIS
Caro(a)
estudante, seja bem-vindo(a) a nossa aula! Hoje nossas discussões sobre a
improvisação musical aplicada ao contexto da educação musical apresentam
ampliações de
olhares interdisciplinares. Nesta aula, vamos focar em outros
aspectos para fundamentar nossas
práticas pedagógico-musicais sobre a
improvisação musical. A fundamentação de nossa prática é
de grande importância
quando pensamos em como justificar as atividades que propomos em sala
de aula,
seja em ambientes escolares, seja em ambientes não escolares. Os temas
estudados até
este momento nos auxiliam a estabelecer diálogos com a literatura
e com a nossa atuação
profissional, o que, por sua vez, permite que tracemos
novos rumos, que ampliam e aprofundam
nossa visão sobre a educação e a
improvisação musical.
Apresentaremos,
então, discussões sobre improvisação e aprendizagem musical com base em
aspectos psicológicos, sociais e educacionais nas práticas pedagógico-musicais.
Nesse sentido, a
presente aula apresenta os seguintes temas de estudo:
aspectos sociais e psicológicos da aprendizagem musical;
o pensamento lógico e intuitivo na improvisação musical;
as práticas musicais formais e informais;
a aprendizagem musical na infância: música, jogo e
desenvolvimento;
a dimensão social da aprendizagem musical de adolescentes e
jovens.
Além disso, há uma seção de
proposição prática e uma seção de finalização que apresenta a
retomada dos
principais tópicos estudados nesta aula.

TEMA 1 – ASPECTOS SOCIAIS E PSICOLÓGICOS DA APRENDIZAGEM


MUSICAL
A
aprendizagem musical pode tomar diferentes formas em amplos contextos de ensino
e
aprendizagem, sendo eles mais ou menos sistematizados. Nesse sentido, o
processo de
aprendizagem está associado ao desenvolvimento das pessoas, que
deve considerar aspectos
físicos, psicológicos, emocionais, sociais e outros
elementos. Na aprendizagem musical não é
diferente, o que demanda uma atenção
do professor de música na observação e reflexão dos
processos de ensino e
aprendizagem. Nosso foco, neste primeiro tema, é a aprendizagem musical
por
meio da enculturação e do treino musical.
Para Green
(2001, p. 22), “o conceito de enculturação musical diz respeito à aquisição de
habilidades e conhecimentos musicais através da imersão nas práticas musicais
diárias do
contexto social ao qual o indivíduo pertence”. Trata-se das
habilidades desenvolvidas em
decorrência da imersão nos diferentes contextos
socioculturais. Quando pensamos no
desenvolvimento musical da criança, a
enculturação tem início nos primeiros estágios da infância e
exerce influência
direta na aprendizagem até o período da pré-adolescência, marcando presença
nas
diferentes etapas de nossas vidas. Sem dúvidas, estamos imersos em contextos
sociais
específicos que influenciarão nossos processos de aprendizagem musical,
por meio da
enculturação, durante toda a nossa vida.
É importante
reforçar que os meios socioculturais influenciam diretamente em nossa
aprendizagem, assim como influenciam em nossa enculturação musical como um
processo de
aprendizagem que ocorre por meio da exposição ao contexto no qual
estamos imersos (Veloso,
2020). Nesse sentido, convém destacar a importância de
um ambiente musicalmente diversificado,
que promova uma ampliação das
possibilidades práticas e auditivas das crianças (Romanelli, 2014).
Essa
ampliação de possibilidades também deve ser uma constante para os adolescentes
e outros
alunos. Além disso, a prática musical pode apresentar uma variedade de
experiências práticas,
dentre elas a improvisação musical, de maneira ampla, como
forma de exploração, manipulação,
criação, execução, entre outras, para propor
práticas improvisativas com os materiais sonoro-
musicais.

Saiba mais
Morato e
Gonçalves (2014) enfatizam a relevância da observação educacional para a
formação de professores de música. Nesse sentido, a observação pode ser um
forte aliado do
professor de música em formação ou já atuante. Procure observar
diferentes contextos em que
ocorram processos de ensino e aprendizagem musical.
Busque notar aspectos que indiquem
uma enculturação musical das crianças ou seu
treino deliberado para a realização de uma
atividade musical. É possível também
perceber confluências entre os dois processos: a
enculturação e o treino. Um
olhar cuidadoso e reflexivo pode nos apontar para práticas de
improvisação,
como elas acontecem, em qual contexto, se há processos de ensino e
aprendizagem, entre outros elementos que possam nos auxiliar a pensar nossa
prática
pedagógico-musical.

Diferentemente da enculturação, o treino


compreende iniciativas de aprendizagem voluntárias,
autoconscientes,
intencionalmente direcionadas ao alcance de metas e orientadas por um
educador
ou por algum modelo social com proficiência nas habilidades musicais que se
pretende
desenvolver (considerando espaços com processos educativos mais
formalmente sistematizados e
também os contextos não formais ou informais de
aprendizagem, tais como igrejas e demais
espaços religiosos, as interações e
compartilhamentos entre os pares e/ou as interações em
plataformas virtuais).
O treino
musical não se opõe à enculturação, apesar de se estruturar como uma
aprendizagem
mais sistematizada, que costuma tomar mais espaço no final da
infância e início da adolescência
por meio de esforços mais conscientes, com
uma intencionalidade de desenvolvimento de
habilidades musicais. Nesse sentido,
o treino musical está relacionado com uma iniciativa que
movimenta, por
exemplo, elementos cognitivos, motivacionais e o alcance de metas no
desenvolvimento de uma habilidade musical como a improvisação em determinado
instrumento ou
prática musical. A enculturação e o treino musical precisam ser
considerados como processos
complementares na aprendizagem musical das pessoas.

TEMA 2 – O PENSAMENTO LÓGICO E INTUITIVO NA IMPROVISAÇÃO


MUSICAL
Novamente,
convém destacar que estamos discutindo a improvisação na educação musical de
maneira ampla. A improvisação musical é um tema de estudo que provoca muitas
discussões no
campo da performance musical. Apesar de considerarmos essa
possibilidade de múltiplas
discussões, os processos de musicalização são nosso
principal foco. Musicalização é um conceito
defendido por Tiago Madalozzo
(2019, p. 25) como o “[...] processo em que, com a sensibilização
sonora, a
criança passa a atribuir sentido aos conceitos musicais, a partir de uma série
de práticas
ativas em que se envolve de maneira significativa”. Apesar de essa
ser uma visão do autor voltada
para a musicalização infantil, ela pode ser
ampliada para todas as pessoas em diferentes idades,
em seu processo de
musicalização ao longo da vida.
Consideramos
a importância da improvisação na educação musical como espaço de
aprendizagem,
exploração do mundo sonoro e desenvolvimento de práticas de criação, execução e
escuta musical. Nesse sentido, discussões sobre a articulação de conhecimentos
lógicos e
intuitivos como processos cognitivo-psicológicos podem ser
interessantes para refletirmos sobre a
improvisação musical.
Para César
Albino (2009), a improvisação não é um aspecto iminentemente e exclusivamente
intuitivo, uma vez que a formação do músico movimenta diferentes informações
que constroem
essa prática de improvisação musical. David Elliott e Marissa
Silverman (2015) afirmam que a
improvisação musical ocorre segundo uma prática
musical específica que movimenta
conhecimentos a respeito de qual escala está
sendo utilizada, de qual a forma estilística de compor
e executar a
improvisação, do repertório de escuta musical do improvisador que constrói sua
prática com base em suas experiências, entre outros elementos. Já o
conhecimento intuitivo é
entendido como uma forma de conhecimento não verbal
que envolve “[...] um forte senso sentido
de que uma linha de ação é melhor que
outra, ou não tão certa, e assim por diante” (Elliott;
Silverman, 2015, p.
223). Assim, o conhecimento intuitivo é uma das habilidades desenvolvidas
pelos
músicos que improvisam, mas há outros conhecimentos e processos reflexivos
sobre a
prática musical que precisam ser considerados.

Saiba mais
Você já improvisou musicalmente? Se sim,
como você organizou suas ideias musicais
durante sua criação, execução e escuta
simultâneas? Caso ainda não tenha experimentado
improvisar em seu instrumento
musical, voz ou outras fontes sonoro-musicais, busque realizar
esse exercício
com entusiasmo e de maneira exploratória. Se pretendemos articular práticas
pedagógico-musicais com nossos alunos, é importante que nós professores de
música
também tenhamos alguma experiência prática em tal atividade. Isso não
significa que seremos
grandes improvisadores em nossas práticas musicais, mas
significa que já passamos pelo
processo de criação, execução e escuta musical
simultâneas que proporemos para nossos
alunos, em sala de aula.

Ao pensar a
articulação entre os conhecimentos intuitivos e lógicos, Keith Swanwick (1994,
citado por Fonterrada, 2008, p. 112-113) afirma que sua “[...] posição é que o
crescimento do
conhecimento, em qualquer nível, emerge intuitivamente e é
nutrido e direcionado pela análise”, ou
seja, pelos processos lógicos. Nesse
sentido, a interação contínua entre os processos educativos e
reflexivos
mediados pela aprendizagem musical e empreendimentos musicais que emergem do
conhecimento intuitivo é uma constante na improvisação musical. O que aponta
caminhos a
respeito da importância da articulação de explorações
sonoro-musicais e reflexões recorrentes nas
práticas pedagógico-musicais, em
sala de aula, sobre os processos de criação, execução e escuta
musical.

TEMA 3 – AS PRÁTICAS MUSICAIS FORMAIS E INFORMAIS


As práticas
musicais formais e informais são o tema de nossa próxima discussão, com base em
uma articulação com a improvisação na educação musical. José Carlos Libâneo
(2010) destaca as
concepções comuns dos ambientes educacionais:
a. formais (educação institucionalizada geralmente em ambiente
escolar/universitário);
b. não formais (atividades educacionais com certo grau de
sistematização que costumam
ocorrer fora do ambiente escolar);
c. informais (relacionados a influências educacionais exercidas sobre
o indivíduo de
maneira não sistematizada).
No entanto, o
próprio autor reconhece que, no domínio da educação de uma maneira geral, as
fronteiras nem sempre são tão definidas, uma vez que diferentes níveis de
sistematização dos
processos de ensino e aprendizagem podem ocorrer no ambiente
escolar e no ambiente não
escolar (Libâneo, 2010). No domínio musical não é
diferente: apesar de muitas vezes pensarmos o
ensino formal como aquele que é
sistematizado somente na escola, sua presença também está em
instituições fora
do ambiente escolar, caracterizando maiores ou menores sistematizações dos
processos de ensino, maiores ou menores espaços para processos de treinamento
e/ou
enculturação musical (Green, 2001; Wille, 2005).
A
pesquisadora e educadora musical Lucy Green (2001) propõe, em suas pesquisas,
uma
distinção entre aprendizagem musical informal e formal. Green (2001, 2012)
destaca que uma das
principais características atribuídas aos músicos populares
é a aprendizagem informal, mesmo que
cada vez mais músicos populares estejam
estudando de maneira formal. De acordo com a autora, a
aprendizagem informal na
música popular costuma envolver a interação com os pares, familiares e
outras
pessoas que atuam como modelos musicais, e a aprendizagem autodidata é comum,
calcada
no desenvolvimento de técnicas independentes de aprendizagem, com o músico
adquirindo
habilidades e conhecimentos em interações com outras pessoas ou em grupos. Por
fim,
destaca-se nesse modelo uma interação constante entre a escuta e o fazer
musical ativo, o que
inclui a composição/improvisação.

Saiba mais
Lucy Green (2012) propõe que aspectos da aprendizagem
informal de músicos populares
sejam levados a ambientes formais como o da
aprendizagem musical escolar. Para isso, a
autora propõe os seguintes passos
estudados em sua pesquisa, nos quais os estudantes:
a. selecionam as músicas que eles querem tocar, juntam-se em
grupos e direcionam a
aprendizagem aos seus interesses (nisso, a improvisação
também tem seu espaço);
b. recebem materiais musicais escolhidos pelo professor, que
pede para que eles os
escutem e toquem as músicas propostas em seus grupos,
como no estágio anterior;
c. repetem o primeiro estágio com um cuidado maior na escolha
das músicas;
d. envolvem-se em atividades de composição musical, o que
movimenta elementos da
improvisação musical;
e. recebem modelos para escreverem músicas ou canções e são
apresentados a músicos
convidados ou estudantes em estágios mais avançados;
f. são apresentados a músicas de concerto mais conhecidas (como
músicas presentes em
comerciais de TV), para serem trabalhadas, como no
primeiro estágio;
g. são apresentados a músicas de concerto menos familiares e a outros
repertórios.

Flávio Veloso (2020) afirma que as


práticas ditas formais muitas vezes estão relacionadas com
a música de
concerto, apesar de isso não ser uma exclusividade. No entanto, o autor reforça
a
necessidade de se integrar processos formais e informais de ensino e
aprendizagem musical.
Nesse sentido, há momentos em que há práticas mais
sistematizadas e momentos de práticas
menos sistematizadas que favoreçam uma
troca entre professor e aluno, bem como entre os pares.
A prática informal
proposta por Green (2001) movimenta interesses dos alunos e aponta para a
necessidade de se considerar habilidades musicais como a improvisação e a
prática musical
colaborativa em grupo. Por fim, Veloso (2020) indica quatro
ideias para integrar as práticas
musicais informais em contextos de ensino e
aprendizagem de música:
1. considerar o desenvolvimento da habilidade de escuta musical;
2. considerar o desenvolvimento da habilidade de improvisação
musical;
3. dar suporte para as possibilidades de arranjo musical;
4. valorizar as práticas coletivas.

TEMA 4 – A APRENDIZAGEM MUSICAL NA INFÂNCIA: MÚSICA,


JOGO E DESENVOLVIMENTO
As
brincadeiras na infância possibilitam espaços de exploração e improvisação
musical. Nesse
sentido, Teca de Alencar Brito (2003, p. 153) afirma que: “A
improvisação musical das crianças é
seu modo de brincar e comunicar-se
musicalmente, traduzindo em sons seus gestos, sentidos,
sensações e
pensamentos, simbolizando e sonorizando, explorando e experimentando, fazendo
música, história, faz de conta, jogo [...]”.
Com base no
exposto por Brito (2003), podemos compreender a música como parte
integrante do
brincar na infância, um brincar permeado pelas possibilidades de exploração
sonoro-
musical que permite a improvisação musical desde o início nas
experiências de criar, fazer e
escutar música.
A exploração
e a manipulação sonoro-musical que a improvisação permite têm uma relação
direta com criar, fazer e escutar música de maneira ativa. Teresa Mateiro e
Beatriz Ilari (2012)
afirmam que diferentes educadores passaram a compreender
os processos educativos em sua
maneira ativa no início do século XX, o que
também ocorreu com as propostas de pedagogias
musicais ativas. O fazer musical
ativo movimentado na improvisação musical aponta para
considerações sobre a
autonomia da criança (Madalozzo, 2019). Autonomia essa que pode ser o
ponto de
partida do professor de música para pensar atividades que propiciem o fazer
musical
ativo em um espaço no qual a criança age e interage com o mundo
sonoro-musical e compreende
aspectos de um fazer musical lúdico e
significativo. A brincadeira, o jogo e a ludicidade são vistos,
então, como
aspectos importantes nesse processo, pois o brincar de maneira lúdica, num
ensino e
aprendizagem pensado com propósitos e finalidades pedagógicas, pode
auxiliar na construção de
um ambiente musical e afetivamente positivo.
A brincadeira
e o jogo nos processos de ensino e aprendizagem de música com as crianças
apontam para implicações educacionais, psicológicas e afetivas que podem vir a
tornar a prática
musical significativa para as crianças e professores. Aspectos
emocionais da exploração e
descoberta no jogo e na improvisação musical são,
então, movimentados em uma aprendizagem
lúdica. Esses aspectos motivacionais e
lúdicos da brincadeira/jogo que podem ser articulados na
improvisação musical
parecem indicar uma relação entre música, motivação, emoção e ludicidade
(Veloso, 2020). Por fim, é importante destacar a relevância do incentivo à
curiosidade sonoro-
musical da criança, pois a curiosidade permeia as
descobertas de possibilidades na improvisação
musical.

TEMA 5 – A DIMENSÃO SOCIAL DA APRENDIZAGEM MUSICAL DE


ADOLESCENTES E JOVENS
A relação dos
adolescentes com a música costuma ser retratada em nossas observações e
nas
pesquisas em educação musical com base em uma ligação muito forte entre o
indivíduo, as
suas preferências musicais e as suas relações com os pares. Com
um olhar cuidadoso, podemos
observar uma sala de aula no ensino médio e
perceber como os alunos costumam se aproximar por
afinidades musicais em comum.
Na prática docente, verificamos que os relacionamentos dos
jovens em suas
“tribos” indicam um compartilhamento da música que eles ouvem. Os
pesquisadores
Emery Schubert e Gary McPherson (2016) afirmam que, desde a infância, as
crianças escutam músicas semelhantes ou iguais às músicas escutadas pelas
pessoas com que
elas convivem em seus diferentes ambientes, o que se relaciona
com a enculturação já discutida.
No entanto, esses autores sugerem que, na
adolescência, parece haver dois caminhos para a
experiência com a música:
1. o do senso de pertencimento e de formação de uma identidade em
grupo;
2. o de uma independência e emancipação da experiência musical,
principalmente
quando pensamos a possibilidade da escuta musical individual,
com uso de fones de ouvido.
Wayne Bowman
(2009) indica que a prática musical pode apresentar uma identificação e
conexão
com os outros e um senso de pertencimento, entre seus praticantes, em uma
comunidade
que é construída pelas negociações e interações entre as pessoas, de
maneira contínua. Esse
senso de pertencimento está presente em diferentes
atividades musicais, como participar de
shows, tocar com os amigos,
sentir-se parte de uma comunidade musical, emocionar-se com a
música e seu
contexto etc. (Elliott; Silverman, 2015). A tecnologia auxiliou no
estabelecimento uma
maior relação das pessoas com a música por meio de
diferentes plataformas em que podemos ver,
ouvir, compartilhar e praticar
música com as pessoas (Veloso, 2020). Diferentes pesquisas têm
apontado a
necessidade de se considerar as culturas juvenis como espaços em que os jovens
atuam de maneira autônoma sobre suas escolhas e têm voz para propor, refletir e
discutir
ativamente sobre seu contexto.

Saiba mais
A
improvisação musical com atividades que componham momentos das aulas de música
pode ser articulada mediante o uso de tecnologias. O professor de música pode
sugerir
atividades de improvisação musical que utilizem celulares, tablets e/ou
computadores com o
uso de aplicativos musicais. Por exemplo, há aplicativos de
piano, bateria, sons sintetizados,
notação musical, entre outros. Uma outra
possibilidade é a criação de projetos que articulem
diferentes formas de
improvisação musical: com instrumentos, aplicativos, gravação de sons
do
ambiente etc. Há a possibilidade ainda de se realizar gravações para
compartilhar com a
turma, grupos de discussão sobre as práticas musicais dos
grupos e ainda de se propor um
espaço de performance musical que envolva a
improvisação musical no próprio ambiente de
ensino-aprendizagem.
As práticas musicais dos jovens não se
limitam aos espaços escolares e à casa; muitos jovens
buscam, deliberadamente,
uma aprendizagem musical por meio do desenvolvimento de suas
habilidades. Nesse
sentido, diferentes espaços oferecem oportunidades para que o jovem busque
um
treinamento musical, como projetos sociais, escolas de música e demais
ambientes com maior
ou menor sistematização dos processos de ensino e
aprendizagem de música. No cenário
nacional, instituições diversas mantêm
projetos que buscam desenvolver práticas musicais
voltadas à comunidade. Muitos
municípios brasileiros possuem casas de cultura ou escolas
especializadas de
música, públicas e privadas, que desenvolvem práticas musicais individuais e
coletivas, como aulas de instrumento, aulas de musicalização infantil, projetos
de orquestras,
bandas, corais etc. Organizações
sociais como o Instituto Baccarelli e o Olodum também
promovem ações musicais
em comunidades que apresentam vulnerabilidades sociais por meio de
aulas de
musicalização, coral, formação de grupos musicais como orquestras, grupos de
percussão e outras frentes de atuação musical, artística e social. Trabalhos
colaborativos nas
esferas pública e privada, em diferentes frentes e
localidades (Projeto Guri, Grupo Cultural
AfroReggae, para citar outros
exemplos), têm demonstrado a importância desses espaços para
todos os
envolvidos: alunos, professores e comunidade.

NA PRÁTICA
Nesta aula,
vamos focar em duas práticas que movimentam os assuntos estudados. Em um
primeiro momento, práticas musicais com a flauta doce, que desenvolvem a
improvisação em
processos de ensino e aprendizagem de música, são apresentados.
Em um segundo momento,
possibilidades de práticas de improvisação musical com
instrumentos de cordas serão
apresentadas, com um foco em instrumentos como
violão, guitarra e baixo elétrico.
Aspectos
educacionais, sociais e psicológicos podem ser constantemente relacionados com
o
tema estudado nesta aula. Destaca-se o interesse na reflexão do professor de
música sobre
elementos das práticas musicais que os alunos podem apresentar em
suas improvisações e
estudos musicais, com base na enculturação, em seus
contextos musicais (aspectos rítmicos
aprendidos em seus contextos, melodias,
letras de canções etc.). O treino musical também será
constantemente
relacionado nas propostas que apresentamos aqui, o que permite pensar a
movimentação de conhecimentos intuitivos e analíticos/lógicos no
desenvolvimento musical dos
estudantes. Finalmente, as práticas apresentadas
podem ser pensadas para diferentes contextos
de ensino e aprendizagem de
música, bem como para diferentes públicos (crianças, adolescentes
e adultos), desde
que com adequação das práticas ao nível de habilidade de cada grupo ou aluno.

FLAUTA DOCE
A flauta doce
é um instrumento de sopro que costuma ser utilizado como instrumento
musicalizador de crianças, adolescentes e adultos. É comum encontrar diferentes
projetos
educativos que se utilizam desse instrumento. Para além de suas
possibilidades de musicalização,
a flauta doce é um instrumento que apresenta
grande potencial musical e muitos músicos se
aperfeiçoam em sua prática.
Normalmente, a flauta doce mais utilizada nos processos de ensino e
aprendizagem de música é a soprano, a mesma que estamos tomando de base
para a realização
das atividades desta seção. Além da flauta doce soprano, há
uma família de flautas doces das mais
graves até as mais agudas (baixo, tenor,
contralto, soprano e sopranino) construídas de diferentes
materiais.
A primeira
possibilidade de prática de improvisação musical que podemos pensar é a
exploração sonoro-musical do instrumento. Trata-se de um momento importante
para que as
crianças, adolescentes e adultos compreendam as possibilidades de
emissão de som e como o
instrumento funciona. O professor pode orientar essa
etapa por meio de perguntas e
direcionamentos.
Com notas predefinidas,
a flauta doce pode ser utilizada em uma improvisação mais
estruturada. Pode-se
iniciar com as notas Si e Sol em um jogo de pergunta e resposta entre os
alunos. Para professores de música que nunca tocaram a flauta doce soprano,
recomenda-se que
estudem com antecedência como funciona o instrumento, quais
são as posições das notas e como
se produz som nesse instrumento. Essas notas
iniciais para a prática musical podem ser ampliadas
em um trecho melódico que
funcione de base para a improvisação, como no exemplo da Figura 1.
Figura 1 – Base melódica para improvisação na flauta-doce
soprano

Crédito: Anderson Toni.


No trecho da
Figura 1, temos as notas Sol, Lá e Si, que são tocadas por todos ao mesmo
tempo. Essa melodia funciona como base. Após a sua execução, um aluno pode
improvisar
utilizando as mesmas notas (Sol, Lá e Si). Assim que o aluno
finalizar o seu improviso, retoma-se a
melodia-base novamente e a improvisação
segue para o próximo aluno. Essa improvisação
estruturada auxilia na
memorização das notas e de suas posições no instrumento, além de permitir
a
movimentação de interesses por parte dos alunos com base na
criação/improvisação musical.
As
possibilidades de improvisação podem se tornar cada vez mais complexas conforme
o
grupo ou o aluno. Pode-se aumentar o número de notas envolvidas, assim como
pode-se pensar
na improvisação com uso de escalas maiores e menores. O
professor pode pensar em espaços de
debates sobre a improvisação de cada aluno,
pode realizar feedbacks sobre como realizar frases
melódicas de determinadas
formas e sobre a execução da improvisação musical e pode pedir para
que diferentes
expressões possam ser adicionadas (staccattos, legatos etc.). A
improvisação com
uma escala pentatônica também pode ser interessante. A escala
pentatônica é uma escala que
apresenta cinco notas e se caracteriza por uma
circularidade na execução musical que permite
sobreposições sonoras a serem
exploradas em nossa prática de improvisação musical. Vejamos o
exemplo da
Figura 2.
Figura 2 – Escala pentatônica e proposta de improvisação
musical com sobreposição de vozes

No trecho da Figura 2, temos uma escala


pentatônica e uma possibilidade de prática de
improvisação musical. Pode-se
pensar em uma improvisação que seja sobreposta com a
improvisação de um colega,
de maneira sucessiva. Nessa proposta de prática de improvisação,
todos:
a. tocarão com um primeiro colega;
b. tocarão sozinhos;
c. tocarão com um segundo colega.
Trocas
musicais e sonoras podem ser incentivadas na prática musical.

INSTRUMENTOS DE CORDAS: VIOLÃO, GUITARRA E BAIXO ELÉTRICO


Em relação
aos instrumentos de cordas, nosso foco nessa atividade prática está em
instrumentos como o violão, a guitarra e o baixo elétrico. Todos os passos
citados para a execução
da flauta doce soprano podem ser aplicados também aos
instrumentos de cordas. No entanto, é
necessário ter em mente que cada instrumento
envolve técnicas diferentes. No violão, podemos
dedilhar as cordas com os
dedos, podemos utilizar palhetas para executar as notas ou podemos
executar
acordes, entre outras técnicas possíveis no instrumento. A guitarra e o baixo elétrico
também envolvem suas técnicas, que precisam ser consideradas. Perceba a
necessidade de
pensarmos em nossas práticas como professores de maneira
integral: se pretendemos utilizar ou
ensinar um determinado instrumento musical
em nossa aula de música, precisamos consultar
informações, praticar e pensar em
um desenvolvimento didático da aula.
As práticas
citadas na flauta doce podem ser aplicadas aos instrumentos de cordas:
improvisação com duas ou três notas, com uma melodia de base, com a execução de
improvisações com escalas específicas (maior, menor, pentatônica etc.). Além
disso, podemos
ampliar nossos olhares para possibilidades harmônicas. O violão,
a guitarra e o baixo elétrico
permitem a execução de acordes (sons sobrepostos
e tocados simultaneamente) que podem ser
um material musical para manipulação e
exploração na improvisação musical. Nesse sentido, o
professor ou os alunos
podem executar uma série de acordes previamente selecionados que
servirão de
base para a improvisação musical, por exemplo, as progressões:
C-F-G-C;
C-G-Am-F.
É possível
adaptá-las para outras tonalidades ou ainda utilizar outras progressões de
acordes.
Com base nos acordes selecionados, o professor direciona a
improvisação, podendo ser essa uma
improvisação musical livre ou estruturada. É
interessante sempre incentivar para que haja um
ambiente de cooperação e
discussão, como em um laboratório de criação/improvisação musical
em sala de
aula. Em improvisações mais estruturadas, o professor pode pedir para os alunos
improvisarem utilizando arpejos (tocar as notas de cada acorde de maneira
separada), com base
em um estilo musical específico e até mesmo com escalas
específicas (escala de blues, escala de
tons inteiros etc.).
Lembre-se
sempre de que as atividades práticas aqui descritas não são prescritivas, ou
seja,
não precisam ser seguidas de maneira idêntica ao que propomos. O contexto
de atuação do
professor de música indicará os melhores caminhos que podem ser
seguidos no desenvolvimento
de habilidades de improvisação musical em processos
de ensino e aprendizagem de música. As
possibilidades aqui descritas também
podem ser pensadas para outros instrumentos.

FINALIZANDO
Recapitulando,
nesta aula nós estudamos a necessidade de se considerar aspectos físicos,
psicológicos, emocionais, sociais e demais elementos na aprendizagem musical.
Nesse sentido,
discutimos sobre a enculturação e o treino musical, os
conhecimentos intuitivos e analítico-lógicos
na improvisação musical e a
aprendizagem formal e informal em diferentes contextos. O tema da
improvisação
na educação musical conduziu nossas discussões para a brincadeira e a
improvisação musical na infância, bem como para as considerações sobre a música
entre os
adolescentes e jovens. Por fim, a proposição prática, ao final de
nossa aula, permitiu estabelecer
paralelos com os assuntos ora estudados.

REFERÊNCIAS
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