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AULA 2
Saiba mais
As emoções costumam ser um dos principais relatos
das pessoas sobre como se
relacionam com a música. No entanto, a pesquisadora
e educadora musical Susan Hallam
(2010) indica que poucos estudos sobre
emoção foram realizados na área da educação
musical. Nesse sentido, a autora
aponta a necessidade de pensar as emoções em processos
de escuta, fazer
musical ativo (cantando, tocando ou realizando outras atividades de execução
musical) e criação musical. Convidamos você a pensar sobre as emoções nos
processos
educativo-musicais. Aproximando-se de nosso tema de estudo, de que
forma você acredita
que a improvisação musical pode movimentar emoções
diversas com o material musical, com
as relações entre os estudantes e com a
exploração sonoro-musical em sala de aula? Busque
pensar em suas práticas
musicais e educativas. Essas observações podem ser produtivas para
pensarmos
nossa prática pedagógico-musical.
Segundo
Guilherme Romanelli (2014), as pesquisas sobre a musicalidade das crianças têm
demonstrado que este aspecto é mais elaborado do que costumamos perceber. Neste
sentido, as
pesquisas indicam que as crianças “se relacionam com seu entorno
por meio da música, mesmo
antes de desenvolverem a linguagem verbal”
(Romanelli, 2014, p. 62). Na realidade, a pesquisadora
e educadora musical Beatriz
Ilari (2009, p. 44) enfatiza que as crianças são grandes músicos
desde cedo e
desenvolvem-se musicalmente à medida que crescem, uma vez que “não apenas
ouvem
bem, mas se movimentam, dançam, cantam, criam, improvisam, imitam, representam,
tocam”. Desta forma, ao considerarmos o desenvolvimento musical das crianças, é
necessário um
olhar acolhedor das multiplicidades de práticas e significações
que os pequenos trazem junto de si.
Também é necessário considerar a
possibilidade de um fazer e de um escutar musical para todos,
incluindo a
exploração sonoro-musical por meio de criações, improvisações, adaptações e
trabalhos diversos com materiais musical e suas práticas.
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O pedagogo musical Jos Wuytack propõe alguns passos
para a aprendizagem musical
que podem ser interessantes para pensar em aulas
de musicalização com as crianças.
Seguindo a descrição de Boal Palheiros e
Bourscheidt (2012), nós temos a seguinte sequência
sugerida:
1) O professor canta a
canção como um todo para as crianças compreenderem a
ideia geral e começarem
a imitar.
2) O professor canta os
motivos melódicos com vocábulos diferentes (pá, dum etc.)
e
utiliza gestuais para que as crianças imitem.
3) As crianças aprendem
o texto por meio de uma execução em diferentes alturas e
por meio de
diferentes formas de se expressar musicalmente (por exemplo, utilizando
staccatos,
expressões faciais etc.).
4) Todos cantam a
canção completa (com melodia e letra) e adicionam possíveis
movimentos
corporais para serem executados com a canção.
Boal Palheiros e Bourscheidt (2012) afirmam que Jos
Wuytack propõe improvisações por
meio das variações e criações melódicas e
rítmicas com a voz e instrumentos musicais,
possibilidades de criações de
bases melódicas e rítmicas, e improvisações de
movimentações/percussões
corporais, explorações textuais e jogos de pergunta e resposta
musical.
Após
o canto espontâneo, as crianças começam a desenvolver habilidades para a
execução de
canções, forma de organização musical que inclui elementos musicais
e textuais/poesia de maneira
simultânea. Veloso (2020) realiza uma revisão que
indica o desenvolvimento da execução das
canções principalmente por meio do
domínio de elementos textuais, rítmicos e de contorno
melódico. Além disso, é
importante considerar a presença das canções no universo musical infantil
em
diferentes ambientes: o canto com os pais, as canções na escola, as
brincadeiras e os jogos
com os amigos, as canções das mídias, entre outros
possíveis espaços e contextos É importante
considerar que a execução de canções
não é só imitação, o cantar que as crianças desenvolvem
também envolve criação
de possibilidades melódicas, harmônicas e rítmicas com base nas
referências que
elas escutam cotidianamente em suas vidas. Por isso, deve-se reforçar o papel
do
professor e propor uma ampliação do universo sonoro-musical das crianças em
suas atividades
pedagógico-musicais (Romanelli, 2014).
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Atividade prática: busque explorar com os alunos
reflexões sobre os sons em suas vidas
em diferentes contextos: em casa, na
escola, na igreja ou em outro espaço religioso etc.
Pergunte a eles sobre os
sons nesses espaços selecionados coletivamente durante a reflexão:
Ttata-se
de sons que eles escolhem escutar? Eles produzem sons nesses ambientes? Eles
gostam de escutar todos os sons? Com base nestas reflexões, podem-se
estabelecer
paralelos sobre as improvisações musicais. Os sons em nosso
ambiente constituem uma
“sinfonia” que nem sempre escolhemos, e o acaso
sonoro é uma constante em nossas vidas.
Muitas vezes, assistimos a uma cena
visual e podemos antecipar/imaginar um som que ainda
não chegou até nossos
ouvidos (como quando vemos a claridade de um trovão e seu som
chega somente
depois de alguns segundos em nossa percepção sonora). Outras vezes, não
esperamos que um som “apareça”, o que pode nos assustar em razão da aparição
inesperada.
Para pensar o acaso sonoro que permite paralelos com a
improvisação musical, utilize a
música 4’33 de John Cage, que
apresenta a ideia de o músico ficar em silêncio por mais de
quatro minutos e
os sons do ambiente constituírem a música. Outros paralelos são possíveis
ao
pensar no acaso sonoro-musical em nossas vidas.
Elliott
e Silverman (2015) afirmam a necessidade de os educadores musicais conceberem a
escuta como atividade ativa, e não passiva. Os autores consideram que a escuta
está infusa em
todas as nossas atividades de fazer musical (improvisação,
composição, performance etc.) e deve
ser compreendida por meio de práticas
ativas, de discussões e reflexões constantes, e de
possibilidades de ampliação
do repertório musical dos alunos. Aqui, podemos indicar como a
escuta está
relacionada com a improvisação musical: ela compõe parte da improvisação
musical e
funciona como referência auditiva para a prática em questão, seja a
prática de um músico
improvisando em um show ou um grupo de alunos se
escutando durante um exercício de
improvisação.
Por fim, vamos considerar brevemente a escuta musical
ativa proposta pelo educador musical
Jos Wuytack. Ela está relacionada a uma
escuta engajada corporalmente e cognitivamente por
meio da percepção sonora dos
materiais musicais em atividades práticas (Boal Palheiros;
Bourscheidt, 2012).
Assim, a apreciação musical nessa perspectiva não é passiva, mas ativamente
percebida e construída pelos ouvintes de maneira corporal e cognitiva. Nessa
forma de escutar,
possibilidades de improvisação com gestos, movimentos e
pensamentos são possíveis nas
atividades educativo-musicais. Cabe, então, ao
professor, pensar na preparação e no planejamento
das atividades, na escolha de
diferentes repertórios possíveis, no estabelecimento de relações
entre os
materiais musicais escutados, na elaboração de práticas de escuta ativa e na
busca de
materiais auditivos com boa qualidade sonora.
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Atividade prática: você recorda o assunto das improvisações
musicais estruturada e livre
estudado anteriormente? Com base no que
discutimos sobre a utilização do corpo na criação,
execução e escuta musical,
vamos propor uma atividade baseada em Veloso (2020) de uma
improvisação
corporal com caráter mais livre. Em duplas, os alunos podem ser orientados a
improvisarem com o corpo, com percussões corporais ou com a utilização de
outras fontes
sonoras por meio de um jogo de pergunta e resposta livre. Os
alunos devem ser orientados a
explorar a espacialidade do lugar, criar
motivos sonoro-musicais livres e responderem aos
materiais sonoro-musicais de
seus colegas. Uma variação desse exercício pode acontecer por
meio de uma
orientação do professor para a exploração da espacialidade do ambiente
utilizando gestos corporais. Assim, o professor ou um aluno pode realizar
sons que serão
interpretados por meio de uma improvisação corporal-gestual
livre. Também é possível escutar
um exemplo musical que possibilite a
realização desta atividade.
Quando
articulamos as questões do corpo com a improvisação, fica evidente a
necessidade do
corpo na execução musical, como nos processos de movimentação
para a criação de um gesto
que resulta no fazer sonoro. Na escuta musical não é
diferente, costumamos situar a escuta
musical em nosso discurso por meio de
indicações de direção (alto, baixo, comprido etc.). Além
disso, as crianças
frequentemente buscam expressar corporalmente sons fracos, longos ou
estridentes de diferentes formas corporais. Nesse sentido, na criação, na execução
e na escuta, o
corpo está sempre presente e precisa ser levado em consideração nas
práticas musicais.
De maneira prática, na vivência educativo-musical, um
exemplo frequente do uso do corpo na
prática musical e em suas possibilidades
de improvisação está no ensino da rítmica. Crianças e
adultos frequentemente
conseguem executar exercícios rítmicos por meio do reconhecimento do
próprio
corpo, seja na marcação dos passos, na visualização/conscientização das
durações com
base em elementos visuais, como o espaço entre duas palmas ou
entre um passo e outro. No
momento de criar ou improvisar, o corpo toma um
espaço central: fornece uma base para a
construção de uma ideia rítmica,
melódica ou harmônica e pode sugerir intencionalidades que
implicam na
expressividade musical e na própria execução técnica que venha a ser
necessária.
NA PRÁTICA
Para esta aula, vamos propor uma prática que permita a
improvisação musical por meio de: (1)
possibilidades de exploração e execução
vocal; e (2) ampliação de possibilidades de improvisação
na escuta e outras
práticas musicais.
Em um primeiro momento, podemos pedir que as crianças,
os adolescentes ou até mesmo os
adultos busquem descobrir sons “diferentes” ou
“inusitados” com a voz. Com base nesta
exploração inicial, os alunos podem ser
divididos em pequenos grupos para criarem uma
composição musical naquele
momento por meio dos sons escolhidos. Uma variação dessa primeira
atividade
poderia ser uma exploração sonora e improvisação na leitura de um pequeno
fragmento
de um texto, poema ou frase.
Este movimento inicial abre margem para um
desdobramento que pode ser interessante e vir a
movimentar interesses entre os
alunos. Para isso, pode-se selecionar uma partitura de um
compositor do século
XX que apresente uma notação gráfica (por exemplo, John Cage ou Murray
Schafer). Um fragmento de uma partitura selecionada para esta atividade poderia
ser o
apresentado na Figura 1.
Figura 1 – Recorte de
um trecho da peça Aria de John Cage
Fonte:
John Cage, 1958.
A obra Aria de John Cage foi composta em 1958 e
apresenta uma partitura gráfica com
elementos coloridos e dispostos
espacialmente para sua execução vocal. Esta partitura apresenta
pequenos textos
que podem ser desconsiderados no início e adicionados conforme o nível de
complexidade que se busca explorar na realização da atividade no contexto em
que a prática
musical se realiza. Individualmente ou em grupo, os alunos são convidados
a executar a partitura
apresentada. As práticas musicais com base na partitura
gráfica abrem margem para uma ampla
improvisação melódica, rítmica,
trimbrística e expressiva na criação e execução musical. Podem ser
sugeridos
elementos para guiar a improvisação por cores, traços ou disposições espaciais.
Perceba que a exploração vocal inicial pode conduzir a uma liberdade sonora
para a realização
dessa atividade de desdobramento.
É importante notar que, até aqui, existe uma série de
possibilidades de aproximações com
outros conteúdos. O professor pode refletir
com os alunos sobre cada uma das improvisações
executadas por eles e pensar no
estabelecimento de critérios avaliativos conjuntos sobre cada uma
das
improvisações. Além disso, o tema abre espaço para discussão sobre como podemos
usar a
voz de maneira musical, sobre as crenças de que uma partitura “só pode
ser escrita de um jeito” e
sobre o que é música. Conteúdos formais sobre
propriedades do som (altura, timbre, intensidade e
duração), história da música
e outros conteúdos podem ser articulados. Lembramos novamente a
necessidade de
uma reflexão contínua do professor de música sobre as atividades, sobre seus
alunos e seus contextos de atuação.
Partindo para a ampliação de possibilidades de
improvisação na escuta e outras práticas
musicais, sugerimos que o professor
pense em articular a escuta musical por meio de exemplos
vocais que deem margem
à improvisação. A própria peça utilizada no exemplo anterior pode ser
interessante
(Aria – John Cage), pensando em Pierrot Lunaire A rnold
Schoenberg e outras peças
de compositores do século XX, ou ainda práticas
improvisativas-vocais da música popular (por
exemplo, improvisações vocais do
cantor e compositor Ed Motta e práticas vocais que utilizam o
yodellin).
Uma ampliação destas atividades de improvisação para
espaços virtuais pode ser pensada
pela utilização da aplicação Kandinsky do Chrome
Music Lab (disponível em:
<https://musiclab.chro
meexperiments.com/Kandinsky/>):
Figura 2 – Exploração
visual-sonora na aplicação Kandinsky do Chrome Music Lab
Fonte:
Elaborado por Toni, 2020, com Chrome Music Lab.
Nesta aplicação do Chrome Music Lab, é possível
desenhar algumas imagens que são
reproduzidas por diferentes timbres de
instrumentos. O nome da aplicação e o estilo de desenho
fazem referência ao
pintor Wassily Kandinsky, que também ficou conhecido por tentar reproduzir
em
suas pinturas elementos musicais, como os elementos das composições de Arnold
Schoenberg. Esta aplicação possibilita improvisações por meio de uma plataforma
digital
interessante de trabalhar com os alunos. Lembre-se de que outros
aplicativos, sites e recursos
tecnológicos e virtuais podem ser utilizados nas
aulas de música. Inclusive, uma ampliação dessa
proposta de atividade pode ser
pensada com base em improvisações vocais e instrumentais
baseadas em diferentes
pinturas. Para isso, pense em escolhas apropriadas ao conteúdo
trabalhado pelo
professor de música. Possíveis exemplos de pinturas para explorar em
improvisações vocais-instrumentais em contextos individuais e coletivos são: Composição
VII e
Composição VIII de Kandinsky; New Harmony de Paul Klee;
O Mamoeiro de Tarsila do Amaral;
Nenúfares de Claude Monet; entre
outras que podem ser exploradas com um olhar interdisciplinar.
FINALIZANDO
Recapitulando, nesta aula estudamos a respeito da
natureza musical das crianças em seu
desenvolvimento musical, o que permitiu
algumas discussões a respeito da improvisação no
balbucio dos recém-nascidos,
no canto espontâneo das crianças e nas explorações sonoro-
musicais das crianças
ao aprenderem canções. O tema da improvisação na educação musical
conduziu
nossas discussões para a exploração do mundo sonoro, a apreciação/escuta
musical e a
utilização do corpo. Por fim, a proposição prática ao final de nossa
aula nos permitiu estabelecer
paralelos com os assuntos estudados.
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