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O fio condutor que faz o desenrolar da história é o triângulo amoroso entre Villela, Rita
e Camilo. Este último mantém uma amizade de longa data com Vilela, que acaba se
estendendo para a esposa de Vilela, Rita. Camilo e Rita passam a viver um caso
amoroso as escondidas.
A história se inicia com Rita indo visitar uma cartomante, querendo saber se seu amante
ainda a queria, após notar a ausência do mesmo. Camilo, afim de evitar despertar
suspeitas de seu amigo Vilela, decide parar de frequentar a casa dos dois após receber
bilhetes anônimos, onde a pessoa que escrevia afirmava saber do romance com a esposa
de seu melhor amigo. Camilo ri da decisão de sua amada, pois ele não acredita em
superstições.
Em um primeiro momento, acreditamos que Camilo era mais seguro e menos ingênuo
que Rita, mas no decorrer do conto, ao deparar-se com uma situação que lhe causa
medo e insegurança, o homem que até então nos passava uma imagem de “seguro”,
acaba por buscar amparo em algum lugar. É nesse momento que temos a segunda
aparição da personagem que dá nome ao conto.
O narrador, nos apresentou um Camilo que desdenhava da crença de Rita, mas que após
receber um bilhete de seu amigo Vilela, pedindo para que compareça urgentemente em
sua casa, o mesmo se rende ao desespero e não somente acaba por procurar ajuda nas
cartas, mas acredita plenamente na fala da cartomante, que o tranquiliza.
No entanto, ao contrário daquilo que a cartomante tinha lhe falado, ao chegar na casa de
Vilela, Camilo se depara com uma Rita “morta e ensanguentada”, e logo acaba sendo
assassinado por dois tiros de revólver disparados por seu então amigo. Após esse
episódio o conto é finalizado.
Como observamos, Camilo molda sua própria consciência e interpreta as palavras das
outras pessoas segundo seus próprios interesses, como o fato de acreditar que o bilhete
que recebeu de Vilela não constituía uma ameaça à sua vida. Essa mudança de
comportamento de Camilo ao longo da história representa a mudança de valores na
consciência diante de certos interesses. O desfecho da história pode ser interpretado
como uma crítica a necessidade desse olhar do outro para podermos construir nossa
consciência.
A primeira personagem que o autor nos apresenta é a jovem Rita, com 30 anos é
descrita pelo autor como uma dama graciosa, formosa e viva nos gestos e com olhos
cálidos. Camilo tem 26 anos de idade, trabalha como funcionário público, não possui
intuição, de começo aparenta ser alguém seguro, mas com passar vai se mostrando uma
pessoa ingênua e inexperiente. Já Villela, é o marido e um advogado, que apesar de ter
apenas 29 anos, aparenta ser mais velho que sua mulher, Rita. Temos também a
cartomante, uma mulher italiana de olhos esbugalhados e grande, magra e na faixa dos
40 anos de idade
A história é contada por um narrador onisciente, que está posicionado de forma superior
aos personagens. O narrador ocupa uma posição de mediador, ele não toma parte direta
dos eventos que acontecem, apenas relata-os. Ele detém conhecimento total do que já se
passou e transfere ao leitor informações referentes aos personagens e acontecimentos
que se envolveram. Outro traço presente, é a intrusão do narrador, como quando expõe
os sentimentos e percepções dos personagens, ou faz comentários referente a vida dos
mesmos, assim como defende a Tipologia de Friedman. (VER LÍGIA
Se o narrador já sabe o que Camilo ia fazer, mas não fez, e suas razões para não fazer,
podemos imaginar que o narrador se trata do próprio Camilo no futuro, ou que ele está
em uma posição privilegiada em relação ao personagem e aos acontecimentos . Isso fica
mais evidente nas últimas páginas do conto, no seguinte trecho:
No excerto acima, podemos perceber que o narrador não descreve as ações de Camilo,
mas sim seu raciocínio, pensamentos e sentimentos em relação a situação que o mesmo
se encontra, com suposições de ações jamais realizadas, por exemplo a ideia de levar a
arma para ir ao encontro de seu amigo
Com a invenção do discurso indireto livre por Flaubert, que “tinha preferência por
narrar como se não houvesse um narrador conduzindo as ações e as personagens”
(LÍGIA, 1985), o narrador onisciente intruso foi perdendo espaço. Machado de Assis
foi um dos únicos a continuar utilizando esse tipo em suas obras.
Perguntas como essa a história não consegue responder, então vai do imaginário de cada
leitor criar um fim ideal.
O tempo da história é cronológico, contém marcadores explícitos de temporalidade,
como vemos no fragmento: “(...) numa sexta-feira de novembro de 1989 (...)” e (...) era
perto de uma hora da tarde (...)”, além disso os acontecimentos da narrativa são
dispostos de uma forma em que o leitor é capaz de organizar cronologicamente o tempo
em que eles ocorreram.
Ao longo do texto, não nos deparamos com nenhum juízo de valor sobre as atitudes
expostas. O narrador passa para quem está lendo, o encargo de julgar o comportamento
dos personagens em questão
Assim como em outras obras, onde Machado de Assis faz críticas sociais a sociedade da
época, em A Cartomante ele aborda temas como o adultério, a traição e a sustentação de
um casamento vazio para manter as aparências. Há uma hipótese de que o conto tenha
sido inspirado em uma história de um casal denunciada nos jornais daquela época.
REFERÊNCIAS:
BRAIT, Beth. A personagem. Série Princípios. São Paulo: Editora Ática, 2002.
https://filosoficabiblioteca.files.wordpress.com/2018/12/BRAIT-Beth-A-
personagem.pdf
LEITE, Ligia Chiappini Moraes. O foco narrativo. Série Princípios São Paulo: Editora
Ática, 1985.
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4864345/mod_resource/content/0/Chiappini_O
%20Foco%20Narrativo.pdf