Você está na página 1de 27

1

Universidade do Estado da Bahia

Andreia Carvalho
Gabriel Lopes
Ícaro Leal
Mateus de Deus
Ranier Azevedo
Rodrigo Gomes
Ycaro Santana

O jornal na sala de aula


Contribuições dos periódicos para o conhecimento histórico escolar

Salvador
2019
2

O jornal na sala de aula


Contribuições dos periódicos para o conhecimento histórico escolar

Trabalho apresentado a
Universidade do Estado da
Bahia (Uneb), como requisito
parcial da disciplina Pesquisa
em História III, oitavo semestre
do curso de Licenciatura em
História

Prof. Dr. Robério Souza

Salvador
3

2019
SUMÁRIO

Introdução...................................................................................................................4

1 - Isso mesmo que se quer dizer?...........................................................................9

2- “La mode” nos jornais da Soteropólis afrancesada.........................................14

3 - O Diário da Bahia e seu posicionamento no pós-Revolução de 1930...........18


4 -...........................................................
5 - .........................................................
6 - ............................................................
7 - ..................................................................
Considerações Finais......................................................................15

Referências
Bibliográficas.......................................................................................17
Edições dos Jornais.........................................................................................17
Edições de Revistas
Documentos Pesquisados...............................................................................18
4

O jornal na sala de aula


Contribuições dos periódicos para o conhecimento histórico escolar

Introdução

Tendo como base as publicações jornalísticas impressas de determinado


momento, é possível compreender a dinâmica adotada pelos periódicos no período
em questão. A partir das perspectivas de abordagens de um assunto específico é
possível entender como funcionavam os grupos editoriais. Assim realizamos um
movimento de dupla relevância, ao passo que a análise dos impressos permite
traçar um panorama cultural e social do que era publicado e, também, problematizar
os fatos que repercutiram, que ganharam notoriedade entre os observadores das
ruas – como reconhecemos aqui os jornalistas.

O trato com os periódicos permite o acesso a registros que identificam


representações acerca de como os indivíduos compreendem o momento em que
vivem, esse suporte nos permite aumentar a proximidade com o dia a dia dos
sujeitos. Coadunamos da ideia defendida por Ana Maria de Almeida Camargo, de
que o real consiste também na imagem que se faz dele. De modo que

Para estabelecer a verdade histórica, cada periódico oferece o que


registra: elementos fragmentários, divorciados, necessariamente
simplificados, poucas vezes de todo objetivos, de uma realidade
sempre complexa...o jornal, principalmente quando formativo, é um
tipo de documento que dá aos historiadores a medida mais
aproximada da consciência que os homens têm de sua época e de
seus problemas (CAMARGO, 1971, p.225).

Portanto, a busca de uma verdade absoluta não é o que deve conduzir o


trabalho do historiador, mesmo porque o jornal é um documento que deve ser
utilizado com bastante cuidado, já que os perigos do seu uso estão principalmente
nas questões ligadas aos meios que possibilitaram sua produção. Há que se
entender as lutas de representações que estão entranhadas, ainda que
subliminarmente, na construção dos discursos. O choque entre as possibilidades de
5

representações são sempre iminentes. Esses espaços de luta de representação são


postulados por Chartier, que os define como sendo onde ocorre

[...]a construção das identidades sociais como resultando sempre de


uma relação de força entre as representações impostas pelos que
detêm o poder de classificar e de nomear e a definição, de aceitação
ou de resistência, que cada comunidade produz de si mesma
(CHARTIER, 1991, p.183).

É importante considerar também que a assimilação por parte dos leitores


acontece de maneira particularizada, assim, independente das tentativas de
condução para determinado entendimento geral do exposto, há também uma
adequação das matérias ao que esperavam os expectadores dos periódicos, porque
nisso está também uma questão de sobrevivência financeira do órgão de imprensa.
Por isso é indispensável ao profissional da história que deseje estudar a imprensa,
fazê-lo sem deixar de observar o contexto em que estão inseridos os órgãos
publicadores no quadro geral dos acontecimentos. Por essa razão, ao ler os
periódicos é preciso

[...] que se desconfie das fontes, das intenções de quem a produziu,


somente entendidas com o olhar crítico e a correta contextualização
do documento que se tem em mãos...é fundamental, ao se trabalhar
com qualquer fonte, discutir os critérios possivelmente adotados por
quem a produziu, de modo a melhor decifrar a informação que ela
nos fornece (BACELLAR, 2008, p.64).

No trabalho peculiar que desenvolve o historiador ao pesquisar a imprensa,


nota-se que algumas imprecisões podem sim demonstrar a representação de
interesses de quem realizou as publicações. Da mesma maneira é fundamental
atentar para a possibilidade de “significar erro de redação, erro de cálculo, pura
distração de quem escrevia” (BACELLAR, 2008, p.64). Por isso o foco na notícia, e
no que possivelmente ela quer refletir, deve ser guiado por um faro investigativo
apurado. Entendo que o noticiário pode sofrer distorções pela intimidade dos sujeitos
em relação aos acontecimentos, bem como pelo comprometimento de cada
indivíduo com o que vai ser exposto. É tarefa primaz não negligenciar que “a
6

realidade inclui o que se pensa sobre ela” (CAMARGO, 1971, p.225). Assimilado isto
torna-se imperioso adotar procedimentos básicos e indispensáveis para o trato com
os periódicos, percebendo que

Se admitimos que a problemática não se reduz à busca da


veracidade das informações, pode-se ir mais longe; o jornal é um
documento a ser usado com o máximo cuidado; os perigos de
distorção (comuns, aliás, a todos os textos – onde geralmente se
encontra aquilo que procuramos) são bem mais
frequentes...corremos o grande risco de ir buscar num periódico
precisamente aquilo que queremos confirmar, o que em geral
acontece quando desvinculamos uma palavra, uma linha ou um texto
inteiro de uma realidade maior (CAMARGO, 1971, p.226).

A imprensa possui como uma de suas características a produção rotineira e


diária de fragmentos de histórias. Os jornalistas, havidos por desvendar e
descortinar casos inéditos, se lançam às ruas para farejar tudo o que possa ser
transformado em notícia. Esse movimento peculiar a este ofício rende a esses
profissionais a possibilidade de contar algo original e que ainda não foi
compartilhado por um de seus pares. Isso revela não apenas o interesse na
multiplicação de exemplares vendidos, o que não deixa de ser algo imprescindível
para essas empresas, mas também no destaque dentre os demais que realizam a
mesma função.

Os conglomerados de notícia lançam mão de inúmeras estratégias para


alcançar tais objetivos. E é o jornalista quem está na ponta dessa equipe; farejar,
investigar e apurar são apenas algumas das atribuições desse especialista que, ao
desenvolver tão peculiares habilidades, revelam ao grande público o inédito, o
polêmico e o inesperado. Está nisto o caráter personalíssimo deste perito na arte de
transmitir; refinando o ocorrido, destaca-se em relação aos que compartilham da
mesma atividade. Refinar, realçar e acentuar são apenas algumas das ferramentas
que este trabalhador dos acontecimentos dispõe no seu labor diário. De modo que,
entabular a notícia de determinada forma, ou de outra, pode acentuar ou invisibilizar
uma informação.
7

Tais questões são importantes porque corroboram em nossas consultas a


esses documentos do passado. É imperioso entender o texto no contexto de sua
época, apurando os significados de cada expressão utilizada. Desconfiar é o
princípio básico deste ofício, é a ferramenta que se apresenta para orientar uma
leitura dirigida a uma análise atenta e investigativa.

Ao realizar uma pesquisa histórica cujas fontes são os jornais, o farejador de


notícias precisa ter em mente que este documento abarca uma amplitude de
questões. Inúmeros são os estímulos que conduzem as escolhas do que vai ou não
ser publicado, do que vai ou não virar manchete naquele dia. O profissional que
adota como ofício esse tipo de investigação, necessariamente deve atentar-se para
as motivações que direcionaram os produtores de informes a dar proeminência,
realçar determinado acontecimento. Historicizar é, portanto, considerar também a
escolhas e as exclusões, o que foi exposto e o que foi silenciado; sem esquecer de
levar em conta o que se dispunha naquele momento, é claro.

Entendendo isto, é possível propor o uso dessas fontes históricas como


alternativa para a produção de conhecimento histórico no âmbito do ensino da
história escolar. O que permite uma interação dinâmica entre o que é produzido no
ambiente acadêmico e compartilhado na formação básica dos estudantes, já que
insere alunos e professores em um debate historiográfico com dimensões muito
mais alargadas. A construção do conhecimento através de um processo de
ensino/aprendizagem que priorize a reflexão histórica não implica necessariamente
na formação de novos profissionais no ofício de historiador, mas promove uma
relação de intimidade mais profunda com os temas econômicos, políticos, sociais e
culturais que permeiam o espaço de interação entre os indivíduos. Flavia Eloisa
Caimi trata com propriedade deste tema ao afirmar que

Mais do que objetos ilustrativos, as fontes são trabalhadas no


sentido de desenvolver habilidades de observação, problematização,
análise, comparação, formulação de hipóteses, crítica, produção de
sínteses, reconhecimento de diferenças e semelhanças, enfim,
capacidades que favorecem a construção do conhecimento histórico
numa perspectiva autônoma (CAIMI, 2008, p.141).
8

Afinados com as propostas debatidas pela renovação historiográfica e da


pesquisa histórica e utilizando o arcabouço alcançado no trato direto com periódicos
para a produção dos trabalhos para conclusão de curso (monografia) no curso de
Licenciatura em História nesta universidade é que seguiremos a partir daqui. Nosso
objetivo é realizar a transposição didática do material produzido, afim de
compartilhar das experiências com outros profissionais de educação.

Estudantes que somos, e com o frescor que ainda possuímos, acreditamos


poder contribuir um pouco para esse debate que é tão importante para o avanço nas
estratégias que possibilitem uma maior interação entre educadores e educandos no
ambiente de sala de aula. E, também, compartilhar das descobertas que realizamos
no trato direto com esta fonte que é tão rica para o ofício do historiador. Convidamos
você leitor para seguir conosco nessa empreitada. Os condutores dessa jornada
através dos jornais são jovens estudantes que, atentos a necessidade de novas
dinâmicas, que otimizem o processo de ensino/aprendizagem, encontraram na
análise da imagem e do discurso, trato com a fonte e transposição didática do
conteúdo trabalhado a oportunidade de imergir neste tema tão importante para a
educação do nosso país. Sigamos pois!
9

1- Isso mesmo que se quer dizer?

Não é possível compreender com maior clareza as publicações que


abordaram o confronto que resultou na morte de Lampião em Angico sem que se
busque investigar o cenário político naquele período. Em julho de 1938, quando os
jornais anunciavam o perecimento do “governador do Sertão” 1, o Brasil já
contabilizava aproximadamente nove meses sob o regime instalado por Getúlio
Vargas, o Estado Novo. Instaurada em 10 de novembro de 1937, a nova
Constituição do país era caracterizada, principalmente, pela centralização do poder.
Com pronunciamento em rede nacional de rádio lançou o manifesto “À Nação”
(PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA), pelo qual afirmou ser possível “restaurar a
autoridade nacional” diante do que julgou serem “ameaças caudilhescas e o perigo
das formações partidárias sistematicamente agressivas”. Era a consolidação
getulista no poder.

Ato contínuo o Congresso Nacional foi fechado, significando controle amplo e


irrestrito do poder executivo e consequente nomeação de interventores estaduais.
Um novo Poder Legislativo, algo previsto na carta outorgada, não foi instituído, até
porque eleições em tempo algum foram realizadas durante o regime. O Judiciário
teve sua autonomia preservada, entretanto sempre em estado de vigilância. Os
partidos políticos foram extintos em 2 de dezembro de 1937 pelo Decreto-Lei
número 37, que considerava a multiplicidade partidária razão da “atmosfera de
excitação e desassossego permanentes, nocivos à tranquilidade pública e sem
correspondência nos reais sentimentos do povo brasileiro” (BRASIL).

O governo implementava, também, a censura à imprensa e a propaganda.


Isso ficou ainda mais evidente com a publicação do Decreto-Lei n 1.949 de 30 de
dezembro de 1939, cabendo “aos jornais...contribuir...para a obra de esclarecimento
da opinião popular em torno dos planos de reconstrução material e de reerguimento
nacional" (BRASIL). A deliberação nada mais foi do que a formalização do que já
estava sendo praticado, regulação das atividades jornalísticas e propagandística em
todo o território nacional.

1
Referência feita pelo Jornal Estado da Bahia na edição de num. 474, ano VI, em 1º de agosto de 1938
10

Entendendo que também é função da imprensa registrar embates entre os


grupos que disputam o poder, para alcançarmos os objetivos propostos nessa
análise é imprescindível desconfiar de posicionamentos ambíguos. Como se dá o
relacionamento com os mais poderosos, a força dos interesses publicitários e
omissões deliberadas podem ser alguns indícios que contribuem para alcançarmos
o que se desejava realmente dizer. Quem escreve para o jornal testemunha os
acontecimentos, e os traduz por um prisma personalíssimo, que, inevitavelmente,
contagia as palavras com suas impressões. A ferramenta historiográfica de análise
do discurso é que vai possibilitar, mais ou menos, identificar as verossimilhanças
entre o ocorrido e o arrolado. Isso, registre-se, está longe de ser uma exclusividade
deste tipo de documento. Quanto a isso Tânia Regina de Luca afirma que,

[...]jornais e revistas não são, no mais das vezes, obras solitárias,


mas empreendimentos que reúnem um conjunto de indivíduos...daí a
importância de...atentar para a escolha do título e para os textos
programáticos, que dão conta de intenções e expectativas, além de
fornecer pistas a respeito da leitura de passado e de futuro
compartilhada por seus propugnadores. Igualmente importante é
inquirir sobre suas ligações cotidianas com diferentes poderes e
interesses financeiros, aí incluídos os de caráter publicitário. Ou seja,
à análise da materialidade e do conteúdo é preciso acrescentar
aspectos nem sempre imediatos e necessariamente patentes nas
páginas desses impressos (LUCA, 2008, p.140).

Manifestações que convergem, ou não, com os interesses da máquina


administrativa são, para o historiador, indícios que descortinam o alinhamento ou
declividade das mais diversas organizações sociais com a estrutura institucional do
Estado. Com o Estado Novo isso não foi diferente, sendo possível localizar inúmeras
oportunidades em que isso ocorreu nos periódicos aqui analisados.

O jornal Estado da Bahia publicou em sua primeira edição do dia 30 de julho


de 1938 a seguinte manchete: “O Presidente Getúlio Vargas congratula-se com a
victoria da força estadual sobre Lampeão”2. O Diário de Notícias, por sua vez,
manifestou-se: “Façamos votos porque, para sempre, como para o estabelecimento
2
Jornal Estado da Bahia 1ª Edição, ano VI, num. 473, em 30 de julho de 1938
11

da tranquilidade e da confiança, na nossa vida sertaneja!” 3. Contextualizar o exposto,


em um movimento que considera a impossibilidade da neutralidade do documento, é
fundamental para a coleta de dados. Cabe ao profissional da História realizar esse
feito, ao compreender que as fontes estão impregnadas das opiniões de quem as
fomentou. E também que há fatores que mudam o curso da escrita, a depender das
relações estabelecidas com as forças de poder.

Essa duas reportagens indicam o momento de amplo controle exercido sobre


a imprensa no país. Considerando as assertivas de Santos e Santos (2007, p.p. 9,
10 e 13), quando afirmam que “Chateubriand apoiava o Estado novo”, a ponto de,
por serem tão favoráveis os seus artigos “chegaram a ser repassados pela Agência
Nacional para os demais veículos”. Que os editoriais Diário da Bahia “também eram
fortes elementos da campanha getulista, mesmo antes de ser decretada a censura à
imprensa”; e ainda o Diário de Notícias que “publicava os telegramas de apoio ao
governo getulista”, podemos então ter uma ideia aproximada do contexto em que
eram produzidas essas matérias. Realizar essa apuração não seria possível sem
considerar a deliberação da Comissão Executora do Estado de Guerra no dia 06 de
novembro de 1937. Leiamos:

Communicado à Imprensa
Realizado a Segunda Sessão Ordinária da Comissão
Dentre outros assumptos que não podem ser tornados públicos, foi
resolvido que seria nomeada uma comissão para controlar a censura
prévia de toda a Imprensa, inclusive Revistas, Jornaes, Semanarios,
Mensários e toda espécie de expressão gráfica do pensamento e
estações de Rádios.
Attendendo ao apelo dos Diretores da Associação Bahiana de
Imprensa para não ter censores junto às redações, a Comissão vai
experimentar a censura feita pelos Directores de Redações, os quais
ficam pessoalmente responsáveis por quaisquer transgressões.
A Comissão de Censura terá também a seu cargo a orientação da
campanha anti-comunista na Imprensa e no Rádio (SANTOS;
SANTOS, 2007, p.p. 10 e 11).

3
Diário de Notícias, ano LXIII, num. 10337, em 29 de julho de 1938
12

O documento que foi assinado pelo secretário da comissão deixa claro o


posicionamento do Estado em relação as publicações que seriam feitas a partir de
então. O capitão Carlos Albuquerque não apenas direciona as escolhas dos
periódicos, como também estabelece previamente as punições dos que ousassem
transgredir as novas determinações. Em relação a esse cenário, Peixoto Júnior
(2003, p.34) faz bem ao afirmar que “a finalidade totalitária que permeava o caldo
político – literário – intelectual do Brasil neste período sustentava-se, basicamente,
em quatro palavras chaves: anticomunismo, trabalho, pátria e moral”, demonstrando
a firmeza com a qual exercia-se o controle sobre os órgãos de notícias.

Pensemos então no quanto era desconfortável para um governo totalitário


como aquele a existência de um “Rei do Cangaço” 4, que com seus asseclas
desafiavam as forças policiais e políticas no interior do país. Para um governo que
se sustentava pela força e centralização aqueles atos eram, no mínimo, aviltantes.
Atentar para as contradições nos discursos é o objetivo deste tópico. Ao avaliar se o
que está exposto era o que realmente se queria dizer, é o meio mais apropriado no
meu entender para avançarmos nessa empreitada.

Doravante há de se entender que não é tão fácil controlar esse tipo de


noticiário, mesmo porque poucas eram as agências que forneciam as informações
para todos os jornais. De modo que, os Directores de Redações que fossem muito
criteriosos poderiam não ter o que publicar. A impossível neutralidade se impõe, e o
que acontece acaba sendo publicado. Isso provoca, não poucas vezes, um revés no
conteúdo comercializado. E, ainda que não agrade a máquina administrativa, a
notícia eivada de uma pseudoneutralidade precisa ser mercantilizada, até mesmo
por uma questão de retroalimentação dos grupos que a produzem. No bojo desse
fenômeno estão questões que subvertem a lógica do sistema, e propiciam escapes
providenciais para se desfazerem as amarras dos detentores do poder. Quanto a
isso Chartier afirma que

Todo o dispositivo que visa criar controle e condicionamento segrega


sempre táticas que o domesticam ou o subvertem; contrariamente,
não há produção cultural que não empregue materiais impostos pela

4
Referência feita pelo Jornal Estado da Bahia na edição de num. 480, ano VI, em 08 de agosto de 1938
13

tradição, pela autoridade, ou pelo mercado e que não esteja


submetida às vigilâncias e às censuras de quem tem poder sobre as
palavras ou os gestos. A oposição é demasiado simples entre
espontaneidade {{popular}} e coerções das instituições ou dos
dominantes: o que é preciso reconhecer é o modo como se articulam
as liberdades condicionadas e as disciplinas derrubadas
(CHARTIER, 2002, p.137).

Dito isto, vejamos o que publicou o jornal comandado por Assis Chateubriand
em 1º de agosto de 1938.

Jornal Estado da Bahia, edição de num. 474, ano VI, em 1º de agosto de 1938

Isso mesmo. O periódico comandando por um dos mais ativos defensores do


governo getulista publicou parte dos folhetos populares produzidos pelo
pernambucano João Martins de Athayde. Não sendo essa a única oportunidade em
que foi possível constatar essa clara “transgressão” aos limites impostos pela
censura à época. Esse fragmento, no entanto, é ainda mais significativo já que
ultrapassa a linha imaginária que se estabelece por decretos que blindam o poder
político dominante. Romper esse espaço limítrofe nos provoca reflexões em torno de
um questionamento que é primaz nesse subcapítulo: de tudo que era escrito, o que
realmente se queria falar?
14

2- “La mode” nos jornais da Soteropólis afrancesada

Ao longo do curso, observamos a importância da utilização de documentos


históricos para enriquecer as aulas de história, visto que a utilização de fontes
possibilita o contato mais concreto com um passado que, por muitas vezes, nos
parece abstrato.

A imprensa possibilita, ao historiador, compreender muito sobre as pegadas


realizadas pelos atores sociais podendo ser concebida como um espaço em que
representa uma passagem vivenciada. Ela se constitui como resultado das práticas
de homens e mulheres do passado. Visto isso, percebemos que a imprensa assume
lugar de destaque como fonte para o ensino de história, pois ela fornece a
compreensão dos acontecimentos e fatos de maneira interpretativa, provocando
comparações, contextualizações e relações do período histórico que está sendo
estudado.

O final do século XIX é denominado de Belle Époque5, período em que as


sociedades europeias viviam em uma época de patriotismo, de esplendor e de luxo,
onde a França foi referência de civilidade mundial. No Brasil, as tendências, os
costumes e as ideais europeias foram imitados pelos representantes das elites,
ávidos por novidades. Consideramos um período de grande importância e de
acontecimentos relevantes na história do Brasil, a exemplo da abolição da
escravatura, a Proclamação da República e os processos de remodelamento das
capitais. Destacamos que esses fatores influenciaram na ordenação das condutas
sociais, tanto das classes das elites quanto das mais humildes, visto que os novos
ares da modernidade, para os republicanos, eram sinônimos de progresso. Essas
modificações reformularam a vida das mulheres e consequentemente no modo de
vestir-se.

No século XIX, a imprensa tornou-se um importante veículo na divulgação dos


novos padrões moldados aos modelos europeus. Ressaltamos o papel determinante
dos periódicos nacionais e estrangeiros que abordavam a moda e comportamento
5
Período em que as sociedades europeias viviam em uma época de lealdade a pátria, ao luxo e na
religiosidade e nas verdades da ciência. Na América houve um processo de imitação das pessoas,
nos costumes e nas ideias que atravessaram o atlântico e aportaram nas cidades brasileiras.
15

onde se tornaram acessíveis às famílias letradas da cidade. Contudo, temos que


lembrar que na capital da República, Rio de Janeiro, as ideias de civilidade já
estavam difundidas e eram noticiadas pelos jornais da capital baiana.

É correto afirmar que a moda, desde o início do século XVIII até os dias
atuais, circula nos meios de comunicação. O vestuário é visto como um produto que
precisa conquistar o mercado para ganhar o consumidor final. Ela precisa estar em
destaque para seduzir o público e é nesse pensamento que gradativamente vão
aparecendo os anúncios com a finalidade de chamar a atenção.

A imprensa de moda circulou e se desenvolveu para atender aos anseios dos


mais ricos. A partir das pesquisas dos periódicos das revistas de moda e de
comportamento do século XIX do Rio de Janeiro e de Salvador constatamos que os
anúncios e desenhos eram plágios das revistas francesas. Outro fato era o número
significativo de publicações estrangeiras na cidade. Destacamos uma ilustração do
período de 1890 da revista francesa L´Ilustrationn.

Vestidos

Fonte: Revista L’Ilustration 01/02/1890


16

O modo de trajar ampliou a visibilidade da mulher. A exposição do corpo


através de decotes e acessórios, associados com as novidades da moda expostas,
através de anúncios publicitários, são elementos que ampliaram a desenvoltura e o
movimento dos espaços urbanos. Observamos que mulher, através da moda,
ganhou status de consumidora.

É interessante observar que no momento em que a mulher realizou compras,


com o desígnio de agradar visualmente aos outros e a si mesma, a figura feminina
ganha relevância nos espaços públicos e nos periódicos.

A moda é uma instituição que se enquadra na dimensão comunicativa do


mundo. “Ela tem por função de recriar distância, excluir a minoria, incapaz de
assimilá-las imediatamente e distinguir ao contrário, por tempo, as classes
privilegiadas que podem, estas sim, apropriar-se delas” (LIPOVETSY, p. 147).

A mídia impressa é um elemento poderoso para expor os produtos. Ela tem a


finalidade de ativar o desejo do consumo, seja por anúncios ou imagens. A
comunicação criativa valoriza e poetiza os produtos procurando o efeito chique. A
partir do exposto observamos que os periódicos foi um canal de expressão, de
difusão e de legitimidade da moda.

A moda anunciada nos periódicos é uma grande aliada do capitalismo e


sustentáculo da sociedade consumista. Pode-se afirmar que a moda é um motor da
economia urbana e instrumento transformador das relações sociais. A autora Rosa
Maria Barbosa de Araújo expõe, em seus estudos, que as preocupações com a
moda ocuparam grande espaço na vida da mulher, consumindo tempo e dinheiro.
Nisso, entendemos que a imprensa colocou esse sistema em representação, pois
ela acaba promovendo a necessidade de consumo como uma categoria de
existência.

Certificamos que, na grande maioria dos periódicos em circulação na cidade,


no período entre 1890 a 1900, reservaram um amplo espaço para os anunciantes.
São anúncios de venda de cosméticos, de serviços de costura e alfaiataria e, na sua
grande maioria, anúncios das lojas de modas.
17

Sobre o papel da imprensa veiculando anúncios, Daniel Roche descreve:

“O triunfo da economia indumentária refletiu-se nessa nova


imprensa, assim como os novos cosméticos e a moda perfumista,
luveiros, joalheiros e artistas de todo tipo. A imprensa tornou-se o
palco para os embates da concorrência e para a exibição de todas as
lucubrações sonhadas pelos negociantes de moda.” (ROCHE, 2007,
p. 49)

Fonte: Diário de notícias 04/04/1893 Fonte: Correio de Noticias 14/03/1899

A intenção de utilizar os impressos de moda feminina, em sala de aula, é de


inserir as mulheres nas transformações que ocorriam na cidade, visto que a
historiografia positivista, do final do século XIX, silenciou as pegadas do “bello sexo”,
todavia estas se fazem presente em todo o contexto histórico. Assim, reitero que as
mulheres foram esquecidas, porém nunca ausentes.
18

3 - O Diário da Bahia e seu posicionamento no pós-Revolução de 1930

A Revolução de 1930 nos leva a perceber o movimento que pôs fim a


República Velha e estabeleceu uma nova configuração Republicana no Brasil,
derrubando o então Presidente Washington Luís, impedindo que a chapa vencedora
das eleições nacionais (Júlio Prestes – Vital Soares) do referido ano tomasse posse
e levando ao poder federal o gaúcho Getúlio Vargas, da Aliança Liberal, que
ocuparia o cargo até 1945. Porém, antes do estabelecimento do movimento
revolucionário, existiram outros meandros defendendo a legalidade, sobretudo aqui
na Bahia, Estado que, na sua grande maioria, se opôs à Revolução e defendeu os
políticos que se sagraram vencedores no pleito federal.

Com relação a Vital Soares, é importante compreender que o mesmo, baiano


de nascimento, era o governador do Estado, sendo que vagou o cargo com o intuito
de disputar o pleito federal concorrendo ao cargo de vice-presidente, compondo a
chapa governista indicada pelo Presidente Washington Luís. Logo, o presidente do
Senado, Coronel Frederico Costa, assume provisoriamente, em fevereiro, o Governo
da Bahia, até que houvesse novas eleições para que se decidisse os rumos do
Estado. De acordo com o jornal Era Nova, comentando sobre a posse do
governador provisório, “o acto realizou-se hontem, às treze horas no Palácio Rio
Branco, sem solenidade”6. O sufrágio que marcou a vitória da composição governista
ocorreu em 1º de março de 1930, que recebeu aproximadamente, em resultados
oficiais, 1.091.709 votos, em âmbito nacional.

O desfecho eleitoral foi veementemente recusado pela Aliança Liberal,


oposicionistas cuja chapa era liderada por Getúlio Vargas, fazendo sérias acusações
de fraude no resultado oficial. A partir desse momento, começam as articulações
para a tomada do poder, que se intensificam com o assassinato de João Pessoa, ex-
candidato à vice-presidência junto a Vargas, em 26 de julho. De acordo com
Skidmore, “esse momento tenso da vida nacional teve um efeito traumático, porque
Washington Luís havia apoiado o grupo ao qual estava ligado o assassino”
(SKIDMORE, 1982, p. 23).

6
Jornal Era Nova. 25 de fevereiro de 1930. Número 487. Salvador/BA. Pág.1
19

Apesar das turbulências que foram enfrentadas ao longo do processo, o


cenário da Revolução de 1930 começou a ser montado. Getúlio Vargas e a Aliança
Liberal contaram com o apoio de militares dissidentes, o que contribuiu de forma
significativa para a vitória revolucionária. Enquanto no Norte, sobretudo na Bahia, as
tropas legalistas haviam sido derrotadas, no Rio de Janeiro, o então Presidente da
República, Washington Luís, havia sido deposto, abrindo caminho para o triunfo de
Getúlio Vargas. É necessário ressaltar que antes deste assumir a presidência do
Brasil, fato que ocorreu em 3 de novembro, uma junta militar, que contava com os
nomes de Mena Barreto e Tasso Fragoso, governou o Brasil durante dez dias, com
o intuito de estabilizar a situação. Diante disso, conclui-se que “em 1930, os
comandantes do Exército e da Marinha encontravam-se colocados numa posição
que se tornou cada vez mais familiar na subsequente história do Brasil: o papel de
árbitros finais da política interna” (SKIDMORE, 1982, p. 25).

A vitória da Revolução, em 1930, trouxe um contexto peculiar para o Estado


da Bahia. Isso porque, as terras baianas foram palco de sucessivas trocas entre os
Interventores federais, sempre contando com a mediação do delegado do Norte,
Juarez Távora. Pensando no recorte deste texto, não nos aprofundaremos nas
questões políticas envolvendo cada Interventor, mas sim, iremos analisar o contexto
de sucessão envolvendo a saída de Arthur Neiva, o terceiro administrador que a
Bahia teve em menos de um ano.

No referido período, que compreende o mês de agosto de 1931, o Diário da


Bahia, periódico “dirigido por Moniz Sodré, político ligado a J.J Seabra”
(CARVALHO, 2005, p. 38) aproveitou-se do declínio considerável frente aos baianos
do Governo de Neiva para lançar críticas ao então Interventor. Quanto à reforma
administrativa de reorganização municipal, calcanhar de Aquiles deste Governo, o
jornal comentou:

A reorganização municipal redundou num fracasso que foi maior do que


esperávamos. Talvez os espíritos mais pessimistas no assumpto, integrados
naquella maneira de vêr as cousas referentes ao caso, com a mais absoluta
antipathia, não avaliassem as proporções da desastrosa reforma municipal. 7

7
Diário da Bahia. 31 de julho de 1931. Número 175. Salvador/BA. Pág. 1
20

Ainda sobre o projeto de Neiva, pontua-se que, além de tudo, a reforma, que
se mostrava tão inovadora, não suprimiu um ponto crucial: a velha politicagem. Esta
que era marcada, principalmente, por políticos que tinham ideais anacrônicos,
buscando, em primeiro lugar, a satisfação dos seus interesses pessoais. No tocante
a isso, o periódico ressaltou que “innúmeros municípios continuam dirigidos por
elementos contaminados pela politicagem antiga dos chefes eleitoraes” 8.

Diante do clima caótico em que mergulhou o seu Governo, sendo


praticamente impossível a sua sustentação, Arthur Neiva, em 15 de agosto de 1931,
pediu demissão do cargo de Interventor Federal da Bahia. No dia seguinte, em tom
de comemoração pela saída de Neiva, o referido jornal publicou na página principal
a seguinte manchete: “Fim de um Governo Déspota – Coagido pela opinião pública
da Bahia o Sr. Arthur Neiva pediu demissão do cargo” 9.
Figura 1 – Diário da Bahia. 22 de agosto de 1931. Número 195. Pág.1

Com a vacância do cargo após a saída de Arthur Neiva, o editorial acreditava


que sua referência política na Bahia, o conhecido político J.J Seabra, viesse a
assumir o posto de comando mais importante do Estado. Como veremos a seguir,
referências a Seabra foram publicadas, a partir de então, cotidianamente nas
páginas principais do jornal.

8
Diário da Bahia. Ibidem. Pág. 1
9
Diário da Bahia. 16 de agosto de 1931. Número 189. Salvador/BA. Pág. 1
21

A campanha de promoção do “eminente estadista bahiano” 10 foi bastante


contumaz no interregno que iria decidir o novo Interventor da Bahia. Tudo o que foi
possível fazer para a promoção do nome do referido político foi feito pelos jornalistas
dirigidos por Moniz Sodré. Faltava apenas o mais complicado: a anuência de Getúlio
Vargas e de Juarez Távora, o famoso delegado do Norte.

Diante da demora na solução do caso baiano e com a crescente possibilidade


de Juracy Magalhães assumir o Governo baiano com a articulação de Juarez
Távora, o Diário da Bahia tratou de publicar, sucessivamente, diversos artigos
contrários a tal probabilidade. Em um desses escritos, levando em consideração que
Juracy era cearense, o periódico destacou que aquele que viesse para o Governo
deveria ser “portador de credenciaes que recommendem o seu nome e que esteja
identificado com o nosso povo”11. Ainda assim, em face disso, escreveu que a Bahia
“não pode, não deve e não quer se ultrajada em seus brios” 12.

O imbróglio político baiano começa a ser solucionado quando o Tenente


Juracy Magalhães, nome tão pleiteado para assumir o comando do Estado desde a
vitória da Revolução de 30, é escolhido para ser Interventor da Bahia. Mais uma vez
se constata o papel decisivo de Távora na escolha do novo líder do Governo.

Quanto a Juracy, é importante colocar que o mesmo não possuía experiência


política anterior. Sobre isso, o autor Aruã Silva de Lima afirmou que “a campanha
rápida que envolveu o processo revolucionário de 1930 é o início de sua vida
pública”. Por outro lado, o mesmo autor registra que o regionalismo baiano foi, de
alguma forma, importante no início da carreira política do futuro Interventor da Bahia.
(LIMA, 2009, p. 22).

Evidentemente, tanto Seabra quanto o Diário da Bahia, discordaram


frontalmente da nomeação do Tenente Juracy Magalhães, que era cearense, para o
alto cargo do executivo baiano. Como será observado na imagem a seguir, o próprio

10
Diário da Bahia. 22 de agosto de 1931. Número 195. Pág. 1
11
Diário da Bahia. 23 de agosto de 1931. Número 196. Salvador/BA. Pág. 2
12
Diário da Bahia. Ibidem.
22

jornal fez questão de destacar isso nas suas publicações. Sendo assim, com o
momento inicial do novo governo já contava explicitamente com dois opositores.

Figura 2 – Diário da Bahia. 1º de setembro de 1931. Número 203. Pág. 1

Desse modo, ao se analisar o papel do Diário da Bahia no momento posterior


à Revolução, pretende-se levar para a sala de aula a importância de se
compreender o papel da imprensa diante de momentos políticos importantes,
percebendo, portanto, o quanto ela pode ser influenciadora na formação da opinião
dos seus leitores. Nesse sentido, se trabalhará com os estudantes os processos de
interpretação crítica de um discurso veiculado em meios de comunicação, levando
em consideração que nada é colocado naturalmente ou de maneira ingênua. Logo,
corroborando com Tânia Regina de Luca, “é importante estar alerta para os
aspectos que envolvem a materialidade dos impressos e seus suportes, que nada
têm de natural” (LUCA, 2008, p. 132). É de fundamental importância analisar a
composição do jornal, verificando como as mais diversas notícias estão sendo
colocadas.
23

Considerações Finais

O jornal como objeto da pesquisa histórica nos permite entender o


imbricamento cada vez mais incentivado entre História e Literatura, já que suscita
reflexões quanto a produção e consumo dos periódicos. Para tanto devemos nessa
busca considerar aspectos que são esclarecedores, como a apresentação das
notícias e a organização do conteúdo que não se limitam ao anúncio completamente
despretensioso. Antes apontam para uma amplitude de significados muito maior,
adotados pelos impressos no momento que alcançam o grande público. Questionar-
se sempre sobre as escolhas feitas, diante do que estava disponível naquele
momento, é, talvez, a melhor estratégia para lidar com esse tipo de fonte.

Os jornais são fontes riquíssimas para as pesquisas históricas, e ainda que


alguns elementos ao primeiro olhar possam parecer insignificantes, se analisados
com profundidade podem render excelentes narrativas. Esse suporte parece superar
as rápidas e ininterruptas mudanças que as sociedades experimentam ao longo do
tempo. Conseguiu se reinventar diante das transformações com as quais se deparou
no século XX, ao se adaptar as novas demandas que aquele período exigiu.
Outrossim, não se exauriu diante das revoluções tecnológicas que todos os dias
alteram as formas de comunicação deste século. Põe-se sempre na vanguarda
quando se trata da investigação do espírito das sociedades, como a brasileira por
exemplo.

Tais páginas são um prato cheio para o profissional da História analisar a


realidade a partir das representações que os indivíduos, influenciados por suas
concepções pessoais e pelos limites que lhes são impostos, constroem dela.
Apreende assim uma realidade com múltiplos sentidos, que podem ser analisados
se considerarmos os aspectos políticos, socioeconômicos e culturais nos quais as
sociedades se estruturam. Por essa razão aparenta ser fonte inesgotável para a
realização de pesquisas cujo intento seja compreender as ideias e os sentimentos, e
de como isso se exterioriza as partir das histórias fragmentadas que são forjadas
diariamente pelos jornalistas.
24

Do mesmo modo os periódicos se apresentam como fontes históricas que


possibilitam a produção do conhecimento histórico na educação básica em nosso
país. São riquíssimos os debates que os jornais podem suscitar, já que lidam
diretamente com o cotidiano dos indivíduos e conflitos que envolvem o espaço de
convivência destes. A observação social que realiza o profissional da imprensa pode
conduzir estudantes e professores à tempos longínquos, desde que sejam
analisadas as possíveis condições nas quais as publicações foram produzidas.
Esquecer-se disto é fatal para a real condição que envolve o exposto nos jornais.

Exercitar esse campo investigativo em sala de aula pode permear o saber


escolar seja no ensino da disciplina histórica, como nas demais que compõem a
estrutura curricular das instituições de ensino básico. Isso representa uma ruptura
com as concepções que durante muitas décadas foram vigentes em nosso país.
Significa romper uma perspectiva de memorização por uma postura de reflexão
social do espeço de convívio entre os indivíduos ao longo do tempo, e, da mesma
forma, das relações de poder que envolve esses encontros.

Com iniciativas que visem ultrapassar os muros da escola, leia-se trato da


fonte histórica, visitas a arquivos e museus e compreensão básica da história oral
local, pode-se favorecer a aprendizagem pela descoberta. Sabemos que isso
somente é possível em condições normais de temperatura e pressão. Não
desconhecemos o real diante do ideal pretendido. Estamos cientes das dificuldades
da educação na realidade do nosso país, e do mesmo modo que, via de regra, o
professor que isoladamente será responsável por esta intervenção. Não queremos
assim pôr mais um peso sobre este profissional que já padece pelas condições que
lhe são impostas. Nosso chamado é para que você, caro leitor, sonhe conosco. Que
mesmo diante da dura realidade do Brasil, não deixemos de vislumbrar uma nação
que priorize a construção do conhecimento e não, tão somente, a memorização de
datas que muitas vezes não correspondem aos eventos ocorridos e que não
parecem, muitas das vezes, fazer muito sentido. Talvez nunca chegaremos lá! Mas,
não custa nada sonhar.
25

Referências Bibliográficas

ARAÚJO, Rosa Maria Barbosa de. A Vocação do Prazer, a cidade e a família no


Rio de Janeiro Republicano. Rio de Janeiro: Rocco, 1993.

BACELLAR, Carlos A. P. Uso e mau uso dos arquivos. Fontes Históricas / Carla
Bassanezi Pinsky, (organizadora) – 2.ed., 1ª reimpressão – São Paulo: Contexto,
2008.

CAIMI, Flávia Eloisa. Fontes históricas na sala de aula: uma possibilidade de


produção de conhecimento histórico escolar? Anos 90. Porto Alegre. V. 15, n.
28, 2008, p.129-150.

CAMARGO, Ana Maria de Almeida. “A imprensa periódica como fonte para a


História do Brasil”, em Eurípedes Simões de Paula (org.), Anais do V Simpósio
nacional dos professores Universitários de História, São Paulo, Seção Gráfica da
FFLCH/USP, 1971, v. II, p.225-239.

CARVALHO, Patrícia Carneiro Santos Moreira de. Juracy Magalhães e a


construção do Juracisismo: um perfil da política baiana. Dissertação de
Mestrado apresentada na Universidade Federal da Bahia no ano de 2005.

CHARTIER, Roger. O mundo como representação. In: Revista Estudos


Avançados. São Paulo, Instituto de Estudos Avançados da USP, v. 5, n. 11, 1991, p.
173-191.

CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa:


Difel, 2002.

PEIXOTO JÚNIOR, José Carlos. O caso Diário de Notícias da Bahia: a quinta


coluna baiana 1935-1941. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade
Federal da Bahia, Programa de Pós-Graduação em História, Salvador, 2003.

PINHEIRO, Eloísa Petti. Europa, França e Bahia: difusão e adaptação de


modelos urbanos. Salvador: EDUFBA, 2011.

LIMA, Aruã Silva de. Uma democracia contra o povo: Juraci Magalhães, Otávio
Mangabeira e a UDN na Bahia (1927 – 1946). Dissertação de Mestrado
apresentada na Universidade Estadual de Feira de Santana no ano de 2009.
LIPOVETSY, Gilles. Império do Efêmero: a moda e seus destinos nas sociedades
modernas. Trad. Maria Lúcia Machado. 2ª. Ed. São Paulo: Companhia das Letras.

LUCA, Tania Regina de. História dos, nos e por meio dos periódicos. Fontes
Históricas / Carla Bassanezi Pinsky, (organizadora) – 2.ed., 1ª reimpressão – São
Paulo: Contexto, 2008.
26

ROCHE, Daniel. A Cultura das Aparências: uma história da Indumentária (séculos


XVII-XVIII) Trad. Assef Kfouri. São Paulo: Editora Senac, 2007.

SANTOS, Ciranda Campos Santana dos; SANTOS, Laís de Souza dos. A Nova
Imprensa: como os veículos baianos de informação realizaram a cobertura do
Estado Novo. Artigo desenvolvido no curso de Comunicação Social com habilitação
em Jornalismo, da Faculdade Social da Bahia, na disciplina de História do
Jornalismo. 2007.

SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Getúlio a Castelo. 7ª edição. Rio de Janeiro: Paz


e Terra, 1982.

Edições dos Jornais


Diário de Notícias, ano LXIII, num. 10337, em 29 de julho de 1938
Estado da Bahia 1ª Edição, ano VI, num. 473, em 30 de julho de 1938
Estado da Bahia 1ª Edição, ano VI, num. 474, em 1º de agosto de 1938
Estado da Bahia 2ª Edição, ano VI, num. 480, em 08 de agosto de 1938
Jornal Era Nova. 25 de fevereiro de 1930. Número 487. Salvador/BA. Pág.1
Diário da Bahia. 31 de julho de 1931. Número 175. Salvador/BA. Pág.1
Diário da Bahia. 16 de agosto de 1931. Número 189. Salvador/BA. Pág. 1
Diário da Bahia. 22 de agosto de 1931. Número 195. Salvador/BA. Pág. 1
Diário da Bahia. 23 de agosto de 1931. Número 196. Salvador/BA. Pág. 2
Diário de notícias 04 de abril de 1893
Correio de Noticias 14 de março de 1899

Revistas
L’Ilustration 01 de fevereiro de 1890

Documentos Pesquisados

BRASIL. Decreto lei n. 37, de 02 de dezembro de 1937. Dispõe sobre partidos


políticos. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, p. 23961, 04 de dezembro, Seção
1. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1930-1939/decreto-lei-
37-2-dezembro-1937-354175-publicacaooriginal-1-pe.html Acesso em: 03 jan. 2018.
27

BRASIL. Decreto lei n. 1949, de 30 de dezembro de 1939. Dispõe sobre o exercício


da atividade de imprensa e propaganda no território nacional e dá outras
providências. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, p.39, 30 de dezembro, seção
1. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1930-1939/decreto-lei-
1949-30-dezembro-1939-412059-publicacaooriginal-1-pe.html Acesso em: 03 jan.
2018.

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, Biblioteca da. Proclamação ao Povo Brasileiro –


Discurso de Posse Getúlio Vargas. Rio de Janeiro, 10 de novembro de 1937.
Disponível em: http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/presidencia/ex-presidentes/
getulio-vargas/discursos/discursos-de-posse/discurso-de-posse-1937/view Acessado
em: 28 jan. 2018.

Você também pode gostar