Você está na página 1de 9

Margarida Serrão e Maria Clarice Baleeiro

APRENDENDO A
SER E A CONVIVER

FUNDAÇÃO
��, FTD ODEBRECHT
©1999 by Fundação Odebrecht
Todos os direitos reservados.
Foi feito o depósito legal.

Supervisão: Adenil Vieira, lima Oliveira e Maria José Siqueira


Colaboradores: Feizi M. Milani, Cise/e Ribeiro e Kátia Queiroz
Consultores: Ana Verônica Mautner; Antonio Carlos Comes da Costa, Cenise Monte Vicente,
Januária Cristina Alves, Marília Pastuk, Ricardo Balestreri e Viviane Castello Branco
Coordenação Editorial: Lafayette Megale
Revisão: Esmera/do Coelho, Ceuid Dib Jardim, !sabe/a Larangeira e Lucila Vrub!evicius Segóvia
Edição de arte e projeto gráfico: Carlos Augusto Asanuma
Diagramação e editoração eletrônica: Liner Bureau de Pré-Impressão
Ilustrações: Bruno Aziz
Capa: Adriana Souza Nunes
Fotos da capa: David Clatt
Fotos da contracapa: David Clatt (7), Almir Bindilatti (2) e Mi/a Petrillo (7)

Agradecimentos especiais para os educadores populares que, com suas exper,encias, reflexões e comentários, nos
ajudaram a validar este manual, permitindo-nos compreender o mundo sob outra ótica:
Associação das Comunidades Paroquiais de Mata Escura e Calabetão: Antonio Carlos S. Carpistrano, Áurea Silva da
Enr.arnação, Cristiane Medina da Silva, Ezelvira Lima Santos, Gilda Teles dos Santos, Humberto Jorge}. dos Santos, Ivone
de Jesus Paiva, }oseda!va Conceição da Silva, José/ia Bispo Duarte, Luciano dos Santos, Miriam Celeste Sanches Costa e
Vanilda Conceição Lima
Centro Educacional Santo Antonio (CESA): Rita de Cássia Assis Souza
Escola Santo Antonio das Malvinas: Miralva Lima Sá Barreto
Grupo de Educadores Comunitários do Engenho Velho de Brotas: Iara dos Santos Cóes
llê Aiyê: Alba Rosângela Dias dos Santos, Givaldo Pereira Santos, Hildelice Benta dos Santos e Maria das Graças
Correia Santos
Paróquia São Lucas Evangelista (Marechal Rondon): E/iene Santos da Silva Reis, Evanete Andrade Ramos, Maria Claudete
dos Santos e Vanda Rocha Fiúza
Serviço Social do Mosteiro de São Bento da Bahia: José Edmilson Pereira dos Anjos e Vanda de Carvalho Farias

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Serrão, Margarida
Aprendendo a ser e a conviver/ Margarida Serrão e Maria
Clarice Baleeiro ; [colaboradores Feizi M. Milani, Gisele
Ribeiro e Kátia Queiroz]. - 2. ed. - São Paulo: FTD, 1999.

Bibliografia.

1. Adolescentes - Aspectos sociais 2. Auto-estima 3.


Educação - Finalidades e objetivos 4. Educação comunitária
5. Educação popular 6. Relações interpessoais 1. Baleeiro,
Maria Clarice. li. Milani, Feizi M. Ili. Ribeiro, Gisele. IV.
Queiroz, Kátia. V. Título.

99-3764 CDD-370-115

Índices para catálogo sistemático:


1. Adolescentes : Educação para a vida : Pedagogia 370.115
2. Educação para a vida : Adolescentes : Pedagogia 370.115

FUNDAÇÃO ODEBRECHT
Av. Tancredo Neves, 450 - Ed. Suarez Trade, 33 2 andar - Caminho das Árvores
41820-020 - Salvador - Bahia - Brasil tI
Tel.: (071) 340-1556 e 340-1420 - Fax: (071) 340-1668 - E-mail: fundacao@odb.com.br
C) NC)SSC> ADC>LESCENTE

Quando olhamos pur alto as pessoas, ressaltam suas diferenças:


negros e brancos, homens e mulheres, seres agressivos e passivos,
intelectuais e emocionais, alegres e tristes, radicais e reacionários.
Mas, à medida que compreendemos os demais as diferenças desaparecem
e em seu lugar su1-ge a unicidade humana.- as mesmas necessidades,
os mesmos temores, as mesmas lutas e desejos. Todos somos um.

Joyce em Finnegan 1s Wake

A o tentarmos traçar um perfil do adolescente das comunidades


populares em que trahalhamos, fizemos a nós mesmos a pergunta: Quem
é este adolescente? Quais as suas características? É este adolescente dife-
rente dos demais?
Fomos, então, nos apercebendo das semelhanças entre todos aque­
les que se encontram nesse período de transformações e emoções inten­
sas a que denominamos ADOLESCÊNCIA. Para todos eles, adolescentes,
esta é uma passagem caracterizada por uma crise de identidade na qual Crise =
se debatem entre questionamentos relativos ao seu corpo, aos valores
existentes. às escolhas que devem fazer, ao que exigimos deles, ao seu
transformaçâo

lugar na sociedade.
O adolescente se afasta da identidade infantil e vai construindo pou-
co a pouco uma nova definição de si mesmo. É um período de reorgani­
zação pessoal e social que se inicia, na maioria das vezes, com contesta­
O adolescente

ções, rebeldias rupturas, inquietações, podendo passar por transgressões,


desmganiza-se para

para desembocar numa reflexão sobre os valores que o cercam, sobre o


reorga II i:::a r-se

mundo e seus fatos e sobre o seu próprio existir nesse mundo.


Trata-se, na verdade, da passagem do mundo infantil para o mun­
do adulto. O amor, a amizade, o trabalho, a escola, a família e o projeto
de vida constituem-se em grandes questões cujo ponto central é a identi­
dade: Quem sou eu? Como sou eu? Qual o meu valor? Quem me valoriza?
O que quero? O que quero ser?
Neste quadro comum, fomos observando particularidades nos ado­
lescentes das comunidades populares com as quais trabalhamos que os
As diferenças entre

distinguiram enquanto grupo. Essas particularidades se referem mais a


os adolescentes

diferentes formas de ver o mundo, de reagir e de expressar sentimentos


proz•êm do
contexto social

O NOSSO ADOLESCENTE
15
do que a uma essência ou natureza pe soai diversa em relação aos ado­
lescentes de outra classe social.
Esse ··modo particular"' de estar no mundo relaciona-se ao contexto
social em que estão inseridos. �esse contexto, a escola e a família muitas
vezes não têm conseguido responder aos seus reais anseios e necessida­
des. A dificuldade de alcançar escolaridade e formação profissional satis­
fatórias leva muitas vezes o jovem elo meio popular a ingressar prematu­
ramente no mundo do trabalho, sem o preparo e o acompanhamento
adequados.
As observações que se seguem não se apresentaram necessaria­
mente nos três grupos que se1Yiram de base para a elaboração deste
manual. Listamos aquelas que consideramos importantes para a reflexão
cios educadores que atuam com populações semelhantes.
Estas obser vações foram feitas de forma assistemática durante o tra­
balho com os grupos de referência, não seguindo nenhum critério ele
ordenação. Elas não devem ser tomadas como definitivas e invariáveis.
• Auto-estima fragilizada. A maioria dos adolescentes observados nos
grupos de referência espantava-se ao receber elogios ou qualquer pala­
=vra de reconhecimento dirigida à sua pessoa, demonstrando uma auto­
estima enfraquecida. O conceito de auto-estima diz respeito ao valor
O fortalecimento que o sujeito atribui a si mesmo. Percebemos que o fortalecimento
da auto-estima dâ dessa auto-estima passava por um reposicionamento na família, na
suporte para comunidade, na escola e na sociedade e acontecia pelo vínculo estabe­
o crescimento
pessoal e social lecido com o educador e o grupo e como resultado do trabalho reali­
zado. Recolocar-se nesses ambientes modificava o olhar sobre si próprio
e possibilita,·a readquirir a dignidade que ficou perdida no processo
histórico.
• Auto-imagem contaminada por preconceitos. Preconceitos relati­
vos a classe social. etnia, nível cultural. profissão e local ele moradia
constituíam referenciais de identidade social. Ser negro, ser pobre ou ser
da periferia parecia ,·incular-se a obstáculos •'intransponíveis" e deter­
minantes de uma condição ela qual não podiam escapar. Muitos ado­
lescentes percebiam o fato de ser negro e/ou ser pobre como um ele­
mento de des,·alorização dentro da sociedade. Observamos que esse
adolescente, quando em ambientes estranhos, freqüentemente omitia
ou mentia sobre a ua origem. Este dado tanto pode indicar que sua
auto-imagem estava comprometida, quanto revelar um manejo eficaz
para lidar com o preconceitos ociais.
• Medo de expressar-se. A dificuldade de se expor, presente em alguns
jo\·ens, relaciona\·a- e com o medo do ridículo e da exclusão. A des­
confiança dentro do grupo era muito intensa. Como a sociedade, ele

16 APRE\DE\DO A SER E A CONVIVER


modo geral, não lhes oferecia oportunidades, desenvolviam defesas
que foram sendo quebradas à medida que estabeleciam vínculos de
_
confiança com o educador e com o gru po .
• ?�c�ru:1de �m re�onhecer e m s i atitudes de racismo. Para reagir
a d1sc �m1 � açao sofnd a , muitos tomavam atitudes que vinham reforçar
� _
seu p i opno preconceito. Por exemplo: colocando-se como vítimas do
branco ou assumindo comportamentos racistas em relação ao mesmo .
Este tipo de atitude também aparecia dirigido a si próprio e semelhan­
tes . Eles não se davam conta de que perpetuavam esse preconceito
quando repetiam entre si brincadeiras e palavras preconceituosas e
pejorati\·a em relação ao negro.
• Presença da sensualidade. A relação com o próprio corpo era , em
geral, colorida por u ma sensualidade natural , evidenciada na movi­
mentação. no gesto, no andar, no modo de vesti r, nas cores escolhidas.
Esta sensualidade natural não era sinônimo apenas de sexualidade ,
referia-se mais a u ma facilidade de expressar-se com o próprio corpo e
a um jeito sedutor de ser.

• Música e dança como forma de expressão. Havia u ma musicalidade


permeando olhar, voz e corpo, que estava presente em todas as mani­
festaçõe dos gru pos . As músicas, geralmente , tinham letras cheias de
significado, cantando o corpo, a negritude , os protestos, a l iberdade . O
ritmo era primitivo, repetindo as batidas do coração e trazendo de volta
as raízes africanas .
• Ataque como forma de defesa. Todos utilizam defesas psicológicas
para proteger-se de fru trações e sofrimentos presentes e passados . No
caso dos grupos em questão, chamou-nos a atenção o modo como essas Aproximar a
defesas se processavam. O outro constituía ameaça constante . A des­ prática ao
confiança era anterior ao grupo. Era trazida para este e se manifestava discurso é um
nas atitudes, nas falas, nos gestos e nos componamentos, como uma desafio

reedição da história de cada um, ou seja, como uma forma dramática de


contar sua biografia .
• Falta de perspectiva. Embora almejassem alcançar e obter as mesmas
coisas que o adolescente de outras classes sociais - casa própria, famí­
lia, carro, profissão reconhecida , boa situação financeira -, tinham cons­
ciência das barreiras sociais impostas a quem não chega à universidade,
é pobre , é negro, sem qualificação específica para o trabalho, não man­
tendo ilusões acerca da condição desigual de oportunidades que lhes
era oferecida . A percepção das desigualdades e da posição desfavorá­
vel en1 que se encontravam gerava em muitos jovens uma atitude de
resignação e desesperança , por não acreditarem que sua ação fosse
capaz de interferir no curso dos acontecimentos .

O NOSSO A DO L E SC E TE 17
• ntradi ões frente à realidade. Parecia existir u ma contradição
e e o dé cur o e a ação no que diz re peito à transformação da reali­
dade . Quando solicitado a falar obre a mesma , expressavam-s e como
agentes de ação : é possível mudar, transform ar, criar, resolver. Quando
solicitados a agir, encaraYam a realidade como imut:"ivel : é assim, tem
ido a im, erá a im. Ficavam, portanto, imobiliza dos diante dos fatos.
Isso foi muito ob ervado princip alment e nos momen tos iniciais cio gru­
po . À medida que foram le,·ado a refletir sobre suas possibi lidades de
ação e alternat i,·a , muito pa aram a acredita r em si próprio s , a enten­
der mudan ça como proce o e não apenas como resultad o e a confiar
em ua capacid ade de tran formar ua própria vida e a da coletivid ade .
Este cre cin1ento e deu a partir do resgate da auto-estima , que é funda­
mental para o joYem er dono do eu desejo e acreditar no seu poder
de transformaçã o.

• Percepção das limitações da escola. Apesar ele constata rem que a


escola a que tinham ace o não oferecia meios para melhora r suas
condições de Yida . consideraram -na como a forma que encontravan1
para obter conhecimento s, e tabelecer relações e criar vínculos. A maioria
concordava que em a e cola enfrentaria dificuldades ainda maiores .
A má qualidade do ensino era interpretada como mais uma evidência
da desqualificação ocial a que e sentiam submetidos . Tal desqualificação
A escola precisa tornava-se uma espécie de atributo pessoal . Freqüentemente verbalizavam
assumir seu papel que as escolas dirigidas aos jovens de classe social mais favorecida
transfonnador
eram boas, mesmo se tratando de escolas públicas. A escola parecia
reforçar a desesperança , ao deixar de exercer o seu papel transforma­
dor, não oferecendo espaço e condições para ações bem-sucedidas
(como passar de ano, realizar pequenos projetos etc . ) , não instru­
mentalizando o jovem com u ma boa educação básica , não desenvol­
vendo seu potencial intelectual e suas habilidades de leitura , escrita
e interpretação de urn mundo que , dessa forma , permanecia distante e
ameaçador.
• Preocupaç ão com a inserção no mercado de trabalho. De modo
gera l . deseja am trabalha r para ajudar a família e atender às necessid a­
?�s . p � ssoais , embora nem empre a esse desejo corresp ondess em
m 1c1at1v as prátic as direc ionad a s à s ua viabi lizaçã o. É impo
rtante frisar
que algum as famíl ia exerc iam pre · ·ão, direta ou indire
ta , em relaçã o
ao t raba lho. u itos adol esce nte eram ame
açad os de ser expu lsos de
c � s a se não con tribu ísse m nas de pesa s .
Algu ns cheg avam inclu ­
sive , a aban don ar a esco la para se lanç
ar no mer cado de tr�b alho
eng ros and o s filei ra da eco nom ia info
� rma l . A esco la , por outr�
lad o, era negl igen te em relaç ão às ques tões do
- traba lho e da onen · t a-
cao pro f1· 10nal

.

18
APRE DE\DO A SER E A CONVIVER
• Papéis de gênero masculino e feminino com limites mais rígi­
dos. Os adolescentes obser vados pareciam reproduzir os modelos
familiares que reforçam a separação entre o permitido ao homem e
o permitido à mulher. os relatos masculinos, era expresso que aos
homens permitia-se ter árias mulheres, esquivar-se das funções do­
mésticas, usufruir de maior liberdade, ter direito ao lazer, abandonar
a responsabilidades familiares de sustento, de presença e de afeto.
Em contrapartida , lhes era cobrado que reprimissem sua sensibili­
dade, que não demonstrassem suas emoções, que tivessem atitudes
características de " macho", a saber: atividade heterossexual constante
e iniciada o mais cedo pos ível, iniciativa perante a mulher, impossibi­
lidade de recusar qualquer oferecimento/insinuação/convite femini­
A s desigualdades

no. estrutura machista , embora questionada no discurso das adoles­


entre os gêneros

centes , se encontrava presente em suas atitudes. A mulher era mais


estão prese11tes em
todas as camadas

respeitada pela comunidade se estivesse vinculada a um homem. Embora


sociais

não concordando com isso, reconheciam que o meio impunha-lhes


e sa condição - a de adquirir um valor maior q uando respaldadas
por uma figura masculina . Todos consideravam obrigações femininas
cuidar das tarefas domésticas, assumir os filhos e sua educação, ser
re pon á,_·el por evitar a gravidez, estar sempre disponível às solicita­
çõe do eu parceiro . Aliás, essas questões não aparecem apenas nas
percepçõe do adolescentes de comunidades populare s, mas estão
presentes na nossa cultura .
• Falta de privacidade na vida pessoal . Observa mos que nos locais de
onde provêm nossos adolescentes, a intimidade da família era compar­
tilhada com a comunid ade . Os vizinhos acompanhavam a maioria dos
acontecimento familiares . A falta de privacidade era considerada natu­
ral. Quem qu· e e manter sua intimidade geralmente era apontado como
estranho ou como alguém que pretendia ser diferente dos dema is.
• Condições de olidariedade. Dada a situação limite em que viviam, o
comportamento olidário era freqüente. Aprendia-se a ser solidário como
forma de sobre,·i,·ência : o que se fazia pelo outro e para o outro garan­
tia a ajuda para si próprio em situações futuras. Existia, assim, uma
vivência de repartir o pouco que e tinha, estar junto, ser presença . A
cooperação era u m instrumento de preser vação do grupo. Através dela
podiam fazer frente às dificuldades do cotidiano.
• O papel da religião. A necessidade de afiliação e a compreensão do
sentido da vida e da morte são necessidades básicas do ser humano. As
instituições religiosas suprem essas necessidades de proteção, pe1tinência
e identidade. Para a maioria dos jovens observados, a religião ocupava
o espaço da lei, da ordem, da proteção, possibilitava o estabelecimento
de laços sociais e concretizava o sentimento de pertencer.

O NOSSO ADOLESCE NTE


19
• Forte relação com a mãe. relação com a mãe a p resentava-se
mu ito forte para a maioria dos adole centes observados , por esta
ocupar o l ugar principal da famíl i a . Ie mo quando fora de casa
.-1 mãe exerce u m p o r m u i tas h o ra s , a mãe se consti t u ía no eixo e m torno do q u a l os
papel integrador
fil hos se agru pav a m . o discu rso dos adolescentes , e ra possível
reconhecer u ma espécie de c u lto à figura materna : u m amor in­
condiciona l , gratidão , dese j o de ser mot ivo de seu orgu l h o .

• Ausência d a figura paterna. a maioria d a s famílias d o s adoles­


1

centes observados , a figura do p a i encontrava-se a u s e nte . Geral­


mente , essa ausência provinha da separação do casa l , de faleci­
mento e da d i fi c u l dade e/ou impossib i l i dade de assu m i r o p a p e l e
o lugar de p a i . O s adolescentes e x p ressavam simu ltaneamente o
afa stamento em relação ao p a i e o desejo de u ma maior a p roxima­
çã o que permit isse o d i á l ogo e a i n t i m idade .

• Percepção da cidadania como conceito abstrato. A cidadania era


percebida como um conceito desvinculado da prática diária de vida . Os
O crescimento direitos eram tão desrespeitados nas pequenas coisas do cotidiano, que
pessoal e social a experiência pessoal do jovem no exercício da cidadania se encontra­
implica tornm•se
cidadâo
va comprometida . ó quando direitos e deveres passavam a ser perce­
bidos como dois lados da mesma moeda se tornava possível aos
adolescentes sair da posição passiva , para se assumirem como agentes
de mudança , concretizando, então, o conceito de cidadania: indivíduo
no gozo dos direitos e desempenho dos deveres - cidadão capaz de
comprometer-se com a realidade social e sua transformação.

• A festa do povo - tudo se comemora. Apesar de condições


adversas de vida e de sobrevi,·ência , as comemorações entre os
j ovens eram freqüentes e deixavam e me rgir a a l egria e a esponta­
neidade . Manifestações cultu rais, como a dança, a música e o teatro,
ocu pavam u m l u g a r p rivilegiado no u n iverso desses jovens . Quase
tudo se tornava mot ivo p a ra que se reunisse m , dançassem e c a n­
tassem j u ntos . Observamos que as comemorações permitiam ao
g ru po se refazer de um cotidiano sofrido e ameaçador. Além disso ,
respond i a m ao c a ráter imediatista dessas c o m u nidade s , e m que o
presente estava garantido p e l o agora e o a manhã era incerto . Este
modo de celebrar a vida a t ravessou os sécu l o s , sobreviveu ao tem­
po, às civil i zações dominantes e pe rmanece vivo hoj e , na festa do
povo , representando a música e a dança do negro e do índio -
raíze da c u ltu ra b ra s i l e i ra .

20 APRE'JDE \D0 A SER E A CO VIVER


Cada educador deve ana lisar, refletir, ampliar ou dispensar o
que expomos, acrescentando, inclusive, novas observações, a partir
de sua própria experiência nas comunidades. O importante é buscar
conhecer o grupo no tocante à sua cultura, seus valores, sua história
e referencia is, para que suas necessidades sejam compreendidas e a
comunicação se estabeleça de forma clara e objetiva . Por fa lta de
uma observação mais sistematizada, aspectos como violência, margina­
lidade e uso de drogas não apresentaram consistência suficiente para
fa2er parte deste rela to, constituindo-se, no entanto, em questões
muito importantes que devem ser consideradas. Informações relativas
às comunidades de origem, condições socioeconômicas, relações
com outros segmen tos socia is não foram contempladas por falta de
dados. É fundamental que o educador compreenda que os grupos
socia is têm características próprias, diferem entre si, mas não podem
ser valorados - não há grupos melhores ou piores. Há formas diversas
de ver o mundo e estar nele.

O NOSSO ADOLESCENTE 21

Você também pode gostar