Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Diretores
Lúcio Delfino
Fernando F. Rossi
Conselho Editorial José Miguel Garcia Medina Luciana Cristina Minaré Pereira
José Roberto dos Santos Bedaque Luciana Fragoso Maia
Alexandre Freitas Câmara José Rogerio Cruz e Tucci Luciano Lamano
Alexandre Reis Siqueira Freire Jurandir Sebastião Luciano Roberto Del Duque
Ana Paula Chiovitti Lídia Prata Ciabotti Luiz Arthur de Paiva Corrêa
Antonio Carlos Marcato Luciano Borges Camargos Luiz Gustavo de Freitas Pinto
Antonio Gidi Luiz Eduardo R. Mourão Marcus Vinícios Correa Maia
A. João D’Amico Luiz Fernando Valladão Nogueira Paulo Leonardo Vilela Cardoso
Araken de Assis Luiz Fux Richard Crisóstomo Borges Maciel
Aristoteles Atheniense Luiz Guilherme Marinoni Rodrigo Corrêa Vaz de Carvalho
Arruda Alvim Luiz Rodrigues Wambier Wanderson de Freitas Peixoto
Bruno Garcia Redondo Marcelo Abelha Rodrigues Yves Cássius Silva
Carlos Alberto Carmona Marcelo Lima Guerra
Carlos Henrique Bezerra Leite Maria Elizabeth de Castro Lopes Conselho Internacional
Cassio Scarpinella Bueno Mariângela Guerreiro Milhoranza
Chedid Georges Abdulmassih Paulo Magalhães Nasser Adolfo Alvarado Velloso (Argentina)
Claudiovir Delfino Petrônio Calmon Filho Alvaro Pérez Ragone (Chile)
Daniel Mitidiero Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias Gustavo Calvinho (Argentina)
Darci Guimarães Ribeiro Sérgio Cruz Arenhart Hugo Jaime Botto Oakley (Chile)
Dierle Nunes Sérgio Gilberto Porto Juan Montero Aroca (Espanha)
Djanira Maria Radamés de Sá Teresa Arruda Alvim Wambier Miguel Teixeira de Sousa (Portugal)
Donaldo Armelin Teori A. Zavascki Paula Costa e Silva (Portugal)
Eduardo Arruda Alvim Virginia Pardo (Espanha)
Eduardo José da Fonseca Costa Conselho de Redação
Eduardo Talamini Pareceristas ad hoc
Ernane Fidélis dos Santos André Menezes Delfino
Evaldo Marco Antônio Bruno Campos Silva André Del Negri
Fredie Didier Jr. Bruno Garcia Redondo Andrea Queiroz Fabri
Glauco Gumerato Ramos Carlos Eduardo do Nascimento Carlos Gustavo Rodrigues Del Prá
Gil Ferreira de Mesquita Eduardo Carvalho Azank Abdu Dnieper Chagas de Assis
Humberto Theodoro Júnior Frederico Paropat de Souza Marcelo Nogueira
Jefferson Carús Guedes Helmo Marques Borges Mônica Cecilio Rodrigues
J.E. Carreira Alvim Hugo Leonardo Teixeira Murillo Sapia Gutier
João Batista Lopes Jarbas de Freitas Peixoto Roberta Toledo Campos
João Delfino José Carlos de Araujo Almeida Filho Rubens Correia Junior
Jorge Henrique Mattar José Henrique Mouta Sérgio Henrique Tiveron Juliano
José Carlos Barbosa Moreira Leonardo Vitório Salge Sérgio Luiz de Almeida Ribeiro
José Maria Rosa Tesheiner Leone Trida Sene
Av. Afonso Pena, 2770 – 16º andar – Funcionários – CEP 30130-007 Belo Horizonte/MG – Brasil – Tel.: 0800 704 3737
www.editoraforum.com.br / E-mail: editoraforum@editoraforum.com.br
Editorial..............................................................................................................7
DOUTRINA
Artigos
Culpa médica e sua apuração processual – Uma análise das teorias da prova
Luciana de Paula Lima Gazzola, Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves.......................................... 89
1 Introdução................................................................................................................ 89
2 A responsabilidade civil do médico............................................................................. 91
3 Obrigações de meios e de resultados......................................................................... 93
4 A questão probatória no Direito Processual Civil.......................................................... 95
5 As teorias da prova................................................................................................... 98
5.1 A teoria estática da distribuição do ônus da prova....................................................... 98
5.2 A inversão do ônus da prova...................................................................................... 99
5.3 A teoria das cargas probatórias dinâmicas ............................................................... 101
5.4 Presunção, indícios e caracterização da culpa .......................................................... 102
5.5 O princípio res ipsa loquitur como forma de presunção de culpa................................. 103
6 As peculiaridades da prova da culpa médica e a potencial aplicação do Código de
Defesa do Consumidor............................................................................................ 104
7 A teoria da perda de uma chance e sua aplicação do Direito Médico........................... 110
8 Conclusão.............................................................................................................. 113
Referências ........................................................................................................... 116
ÍNDICE................................................................................................................................ 247
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 7-8, jan./mar. 2014 7
Os Diretores
8 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 7-8, jan./mar. 2014
Celso Barberato
Mestrando em Direitos Coletivos e Cidadania pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP).
Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Universidade de Franca (UNIFRAN).
Advogado. E-mail: <celsobarberato@hotmail.com>.
Resumo: A partir da realização de pesquisa de gabinete, com o auxílio de doutrina, legislação e jurisprudên-
cia, foi possível identificar pontos de relevância processual na área dos direitos coletivos, com destaque à
representação adequada, à pertinência temática e à coisa julgada coletiva.
Palavras-chave: Direitos coletivos. Legitimação. Coisa julgada.
Introdução
O trabalho tem origem acadêmica e consiste numa apresentação útil de ques-
tões indispensáveis ao operador do direito que pretende se enveredar no manejo do
processo coletivo.
O artigo se insere na linha de pesquisa processual das ações coletivas e traz
um conjunto de informações precisas acerca dos textos legais do ordenamento jurídico
pátrio vigente. Também exemplifica a diversidade teórica e disponibiliza julgado a
estabelecer os parâmetros.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014 11
Não se quer influenciar que certo pensamento jurídico é melhor do que outro.
Dentro do universo das ações coletivas, é preciso compreender os conceitos dos
direitos coletivos, suscitar a questão da representação adequada, esclarecer o cri-
tério da pertinência temática e expor os efeitos da coisa julgada coletiva a partir de
elementos coletados ao longo do semestre.
Se se sacasse uma fotografia da sociedade brasileira neste momento, revelar-
se-ia um conjunto hierarquizado de regras e leis escritas ou positivadas em microssis-
temas capazes de conjugar as consciências imanentista e autonomista para preservar
os direitos difusos, coletivos em sentido estrito e individuais homogêneos dos que
participaram ou não do processo. A certeza que se tem é que a necessidade por
soluções rápidas e mais baratas dos conflitos iguais gerou a ideia do resultado útil,
consagrando a universalização do acesso de todos à justiça.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 está no ápice do orde-
namento e disciplina os direitos coletivos, reservando ao Poder Judiciário o controle
de constitucionalidade. Para melhor compreensão do que se expõe, traz-se anexo acór-
dão prolatado pela Relatora Ministra Nancy Andrigh da 3ª Turma do Egrégio Superior
Tribunal de Justiça em Recurso Especial nº 1.243.386/RS (2011/0037199-1), para
exemplificar como os direitos coletivos se deram aos produtores de soja, definir a
legitimidade extraordinária e explicar a extensão da coisa julgada coletiva. Em votação
unânime, também participaram do julgamento os Ministros Massami Uyeda, Sidnei
Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva.
12 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014
Em que pese o louvor especial de cada texto legal, a Lei nº 8.078/1990 (Código
de Defesa do Consumidor – CDC) é considerada de grande relevância tanto para a
doutrina quanto para a jurisprudência e todos concordam que deve ser aplicada exten-
sivamente a todas as áreas — e não só àquelas pertinentes à figura do consumidor
—, não só por corrigir o nomen juris como também por disciplinar as espécies dos
interesses transindividuais a serem protegidos.
Consoante se infere da leitura dos três incisos do parágrafo único do artigo 81
da Lei nº 8.078/1990, as espécies são: I - direitos difusos (interesses transindivi-
duais, indivisíveis, atribuídos a indeterminados titulares ligados por circunstância de
fato); II - direitos coletivos em sentido estrito (interesses transindividuais, indivisíveis,
atribuídos a grupo, classe ou categoria de pessoas ligadas por relação jurídica); III - di-
reitos individuais homogêneos (considerados coletivos por serem de origem comum,
mas são divisíveis e as pessoas determinadas).
O jurista Barbosa Moreira pondera que os direitos metaindividuais se dividem
em apenas dois grupos: direitos metaindividuais naturalmente coletivos e os direitos
metaindividuais acidentalmente coletivos. Naqueles se encontram os direitos coleti-
vos em sentido estrito, em que os indivíduos são determinados ou determináveis por
um grupo, categoria ou classe e estão ligados por uma relação jurídica, e, de outra
banda, os direitos acidentalmente coletivos têm objeto divisível e origem comum, ou
seja, direitos individuais homogêneos.
Em referência ao acórdão do Recurso Especial nº 1.243.386/RS (2011/0037199-
1), a Ministra Nancy Andrigh se convenceu de que a ação foi ajuizada por sindicato
para a defesa dos direitos coletivos da categoria e dos individuais homogêneos de
cada pequeno produtor de soja, com pedidos de nulidade de cláusulas despropor-
cionais e de isenção do pagamento de taxas, indenizações tecnológicas e royalties
em relação às sementes de soja geneticamente modificadas para plantio, replantio,
venda, multiplicação, doação e troca do produto, por necessariamente afetar o preço
final e revestir-se de relevância social, econômica e jurídica.
A insistência da defesa em alegar falta de interesse de agir e ilegitimidade de
parte exigiu da relatora a preocupação de apontar os direitos coletivos em sentido
estrito do artigo 81, parágrafo único, II, do CDC, por entender que a sentença que
declara a nulidade de cláusulas não torna o objeto divisível, ao revés, enquadra-se
como direitos indivisíveis de um determinado grupo de produtores de soja ligados por
relação jurídica base. Ensina o doutrinador Hugo Nigro Mazzilli: “O interesse em ver
reconhecida a ilegalidade da cláusula é compartilhado pelos integrantes do grupo de
forma não quantificável e, portanto, indivisível”.1
1
MAZZILLI. A defesa dos interesses difusos em juízo: meio ambiente, consumidor, patrimônio cultural, patrimônio
público e outros interesses, p. 55.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014 13
O que se quer destacar aqui é que um mesmo fato pode causar lesões múltiplas.
Citando o mesmo acórdão, o pedido de ressarcimento dos valores pagos pelos pro-
dutores de soja funda-se em direitos individuais homogêneos e, por causa de origem
comum, são considerados coletivos. Os exemplos2 são variáveis em relações de con-
sumo, trabalhistas, comerciais, socioambientais etc. e autorizam a tutela jurisdicional
dos direitos coletivos (difusos, coletivos em sentido estrito e individuais homogêneos),
competindo ao interessado conhecer, ainda que de forma breve num primeiro momento,
como funciona o procedimento adotado no país.
Com efeito, a compreensão das espécies dos direitos coletivos é de suma
importância e o venerando acórdão concluiu, no momento, que os excessos por con-
trole de mercado e de regras de patentes ofereciam riscos desproporcionais a grupo
determinável de produtores de soja, e se reveste de relevância social-econômica a
ensejar a tutela jurisdicional dos direitos nesta condição.
2
NERY JR. O processo civil no Código de Defesa do Consumidor. Revista de Processo.
3
Precedente apresentado: Processual Civil. Administrativo. Ação Civil Pública. Legitimatio ad Causam do
Sindicato. Pertinência Temática. Ausência de Intimação do Ministério Público Federal nas Instâncias Ordinárias.
Prejuízo Demonstrado. Nulidade Inexistente. Princípio da Instrumentabilidade das Formas. 1. Os sindicatos
possuem legitimidade ativa para demandar em juízo a tutela de direitos subjetivos individuais dos integran-
tes da categoria, desde que se versem direitos individuais homogêneos e mantenham relação com os fins
institucionais do sindicato demandante, atuando como substituto processual (Adequacy Representation). 2. A
pertinência temática é imprescindível para configurar a legitimatio ad causam do sindicato, consoante cediço
na jurisprudência do E. S.T.F. na ADI nº 3.472/DF, Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, DJ de 29.11.2002 e
do STJ: REsp nº 782.961/RJ, desta relatoria, DJ de 23.11.2006, REsp nº 487.202/RJ, Relator Ministro Teori
Zavascki, DJ 24.05.2004 (AgRg no REsp nº 901.936/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ, 16 mar. 2009).
4
CAPPELLETI, Mauro. Tutela dos interesses difusos. Revista da Ajuris, Porto Alegre, n. 33, p. 169-182, mar. 1985.
5
ALVIM. Notas atuais sobre a figura da substituição processual. Revista de Processo.
14 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014
do direito pleiteado. A previsão legal está nos artigos 5º da LACP, 82 do CDC, e, aos
sindicatos, em especial, 5º, LXX, “b”, e 8º, III, da CRFB/1988.
A defesa dos interesses individuais homogêneos é complexa, segundo Barbosa
Moreira.6 A maior dificuldade para a legitimação extraordinária fica por conta da ade-
quada representação e, sem querer atropelar a ordem do texto, a extensão dos efei-
tos da coisa julgada aos indivíduos do grupo.
Em voto, definindo a controvérsia em reexame, a Ministra esclareceu que a
pertinência temática é critério que deve ser analisado conforme fins institucionais dos
que integram o polo ativo da relação processual e pontificou que os sindicatos dos
produtores rurais, com natureza jurídica de associações civis,7 por causa de interesse
de agir dos sojicultores, têm legitimidade para a tutela jurisdicional dos direitos cole-
tivos e individuais homogêneos dos associados.
Pacífico na doutrina que a regra da legitimação ordinária é inadequada para
a solução dos conflitos individuais da atualidade de uma sociedade considerada
de massas, globalizada. A tutela jurisdicional dos direitos coletivos surge, então,
como uma solução racional, pois evita a proliferação de ações individuais por todo
o território nacional e, com isso, além de reduzir os gastos com a estruturação e o
aparelhamento dos órgãos jurisdicionais, diminui a possibilidade de decisões con-
traditórias sobre mesma matéria e, ainda, como forma de aprimoramento do Estado
Democrático de Direito e do exercício de direitos fundamentais, garante o acesso de
todos interessados à apreciação do Poder Judiciário.
A legitimidade é conferida às pessoas para atuarem de forma adequada em
processos coletivos para a defesa dos direitos dos interessados. Exige-se, contudo,
o cumprimento dos requisitos objetivos da data de constituição — relativizada no
caso dos interesses individuais homogêneos — e da finalidade dos direitos pleitea
dos a evidenciar relação e competência. No Recurso Especial nº 1.243.386/RS
(2011/0037199-1), restou claro que a exigência de pertinência temática para que se
admita a legitimidade de sindicatos na propositura de ações coletivas é mitigada pela
CRFB/1988, pois não guarda vínculo com os fins da entidade, exigindo-se, apenas,
que o direito esteja compreendido nas atividades exercidas pelos associados, mas
não se exigindo que o direito seja peculiar, próprio, da classe. Com precedente.
Muito embora o modelo brasileiro das ações coletivas tenha se inspirado no
modelo das class action, não se adotou por aqui a adequada representação nem a
notificação obrigatória.
Os que defendem a desnecessidade são aqueles que invocam a impossibili-
dade de irradiação dos efeitos da coisa julgada em caso de improcedência da ação
6
MOREIRA. Ações coletivas na Constituição Federal de 1988. Revista de Processo.
7
REsp nº 549.794/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ, 05 nov. 2007.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014 15
coletiva, ou seja, o processo coletivo não pode prejudicar o direito subjetivo individual
de ação. Em adaptação ao direito positivado ou escrito, diferente do consuetudinário,
a lei fixou regra geral de entes legitimados para a defesa do direito coletivo, condicio-
nando elementos objetivos de constituição e finalidade.
A legitimação decorre da lei, não autorizando o juiz apreciar a representação
adequada em cada caso concreto, tal como acontece no modelo da class action. De
todo modo, salvo algumas poucas regras de limitação ao direito de ajuizar ações cole-
tivas, como é o caso, por exemplo, do impedimento de se discutir matéria tributária
em ação civil pública (art. 1º, parágrafo único da LACP), compete à Justiça exercer
controle judicial,8 quando, por exemplo, exige do Ministério Público demonstração
de relevância social como pressuposto de admissibilidade das ações coletivas que
discutam direitos individuais homogêneos.
Assim, a pertinência temática é critério para a legitimidade, mas não se con-
funde com a adequada representação dos Estados Unidos. O legislador não tem
condições de esgotar as hipóteses do caso concreto, daí a existência de brechas à
inadequada representação dos interessados, o que significa ofensa direta aos prin-
cípios do devido processo legal e do acesso à justiça Os que defendem a adequada
representação não se prendem àquela legitimação concedida por lei, o que realmente
interessa é verificar se os interesses estão bem representados. Mas no Brasil não
existe a prerrogativa desse tipo de avaliação nas ações coletivas. Aliás, nas palavras
de Antonio Gidi: “o representante inadequado, portanto, é um não representante”.9
8
GRINOVER; WATANABE; MULLENIX. Os processos coletivos nos países de civil law e common law: uma análise
de direito comparado, p. 37.
9
GIDI. A representação adequada nas ações coletivas brasileiras: uma proposta. Revista de Processo, p. 70.
10
GIDI. Las acciones colectivas y la tutela de los derechos difusos, colectivos e individuales em Brasil.
16 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014
11
DINAMARCO. A reforma do código de processo civil, p. 28.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014 17
Houve uma nítida preocupação dos sindicatos dos produtores rurais em sustentar
que os direitos coletivos em sentido estrito ali se revestiam de natureza nitidamente
coletiva, na medida em que os sojicultores de todo o território nacional, e não apenas
da circunscrição do órgão julgador, estavam vinculados às obrigações desproporcionais
a ensejar riscos à economia, colacionando julgados de autoria da relatora para demons-
trar a existência de precedentes,12 embora, algum tempo depois, a divergência tenha
gerado alteração do resultado mais uma vez.13
Ainda no corpo do acórdão é possível identificar outros julgados sobre a mesma
matéria.14 Tudo é muito recente e aberto a surpresa política. Mas a Ministra não titu-
beia em reabrir os debates acerca da matéria, reafirmando a irrelevância do artigo 16
da LACP, para limitar a eficácia da sentença, dada a independência de seus efeitos
em relação à coisa julgada. Ao estabelecer que a sentença “fará coisa julgada nos
limites territoriais do órgão prolator”, a referida norma acabou por regular apenas e
tão somente o fenômeno da coisa julgada, que, segundo conclui a relatora em voto,
é absolutamente distinto da eficácia da sentença.
12
Consta no julgado: Processo civil e direito do consumidor. Ação civil pública. Correção monetária dos expurgos
inflacionários nas cadernetas de poupança. Ação proposta por entidade com abrangência nacional, discutindo
direitos individuais homogêneos. Eficácia da sentença. Ausência de limitação. Distinção entre os conceitos de
eficácia da sentença e de coisa julgada. Recurso especial provido.
- A Lei da Ação Civil Pública, originariamente, foi criada para regular a defesa em juízo de direitos difusos e co
letivos. A figura dos direitos individuais homogêneos surgiu a partir do Código de Defesa do Consumidor, como
uma terceira categoria equiparada aos primeiros, porém ontologicamente diversa.
- A distinção, defendida inicialmente por Liebman, entre os conceitos de eficácia e de autoridade da sentença,
torna inócua a limitação territorial dos efeitos da coisa julgada estabelecida pelo art. 16 da LACP. A coisa
julgada é meramente a imutabilidade dos efeitos da sentença. Mesmo limitada aquela, os efeitos da sentença
produzem-se erga omnes, para além dos limites da competência territorial do órgão julgador.
- O procedimento regulado pela Ação Civil Pública pode ser utilizado para a defesa dos direitos do consumidor
em juízo, porém somente no que não contrariar as regras do CDC, que contem, em seu art. 103, uma disciplina
exaustiva para regular a produção de efeitos pela sentença que decide uma relação de consumo. Assim, não
é possível a aplicação do art. 16 da LACP para essas hipóteses. Recurso especial conhecido e provido (REsp
nº 411.529/SP, STJ, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrigh, DJ, 05 ago. 2008).
13
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EFICÁCIA. LIMITES. JURISDIÇÃO DO ÓRGÃO PROLATOR.
1. Consoante entendimento consignado nesta Corte, a sentença proferida em ação civil pública fará coisa
julgada erga omnes nos limites da competência do órgão prolator da decisão, nos termos do art. 16 da Lei
nº 7.347/85, alterado pela Lei nº 9.494/97. Precedentes. 2. Embargos de divergência acolhidos (Embargos
de Divergência em REsp nº 411.529/SP, STJ, 3ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ, 24 mar. 2010).
14
DIREITO PROCESSUAL. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (ART. 543-C, CPC). DIREITOS META
INDIVIDUAIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APADECO X BANESTADO. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. ALCANCE SUBJETIVO
DA SENTENÇA COLETIVA. LIMITAÇÃO AOS ASSOCIADOS. INVIABILIDADE. OFENSA À COISA JULGADA. MULTA
PREVISTA NO ART. 475-J, CPC. NÃO INCIDÊNCIA. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: 1.1. A sentença gené
rica proferida na ação civil coletiva ajuizada pela Apadeco, que condenou o Banestado ao pagamento dos
chamados expurgos inflacionários sobre cadernetas de poupança, dispôs que seus efeitos alcançariam todos
os poupadores da instituição financeira do Estado do Paraná. Por isso descabe a alteração do seu alcance
em sede de liquidação/execução individual, sob pena de vulneração da coisa julgada. Assim, não se aplica ao
caso a limitação contida no art. 2º-A, caput, da Lei nº 9.494/97. 1.2. A sentença genérica prolatada no âmbito
da ação civil coletiva, por si, não confere ao vencido o atributo de devedor de “quantia certa ou já fixada em
liquidação” (art. 475-J do CPC), porquanto, “em caso de procedência do pedido, a condenação será genérica”,
apenas “fixando a responsabilidade do réu pelos danos causados” (art. 95 do CDC). A condenação, pois, não
se reveste de liquidez necessária ao cumprimento espontâneo do comando sentencial, não sendo aplicável
a reprimenda prevista no art. 475-J do CPC. 2. Recurso especial parcialmente provido. Recurso Especial em
Controvérsia Repetitiva nº 1.247.150/PR (Corte Especial, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJ, 12 dez. 2011).
18 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014
É preciso uma pausa para esclarecer as três correntes que tentam conceituar a
coisa julgada. A primeira corrente, de origem alemã, defendida por Pontes de Miranda,
Ovídio Baptista, Celso Neves etc., diz que a coisa julgada é o efeito do elemento
declaratório da sentença que a torna indiscutível e imutável. A segunda corrente,
defendida por Liebman,15 tecnicamente adotada pelo CPC e seguida pela doutrina
majoritária, diz que a coisa julgada não seria um efeito da sentença, mas qualidade a
tornar indiscutíveis e imutáveis os efeitos da sentença. E, por fim, a terceira corrente,
representada por José Carlos Barbosa Moreira e Fredie Didier, diz que a coisa julgada
é uma qualidade do conteúdo da sentença e não dos seus efeitos.
A Ministra Relatora Nancy Andrigh se filia à 2ª corrente. Orienta que a inde-
pendência entre eficácia da sentença e eficácia da coisa julgada foi a adotada pelo
sistema processual brasileiro. Reportando-se à Liebman, defende que a eficácia da
sentença justifica os efeitos modificativos do mundo jurídico por causa desse ato
judicial, ao passo que eficácia da coisa julgada seria a imutabilidade conferida a tais
efeitos em razão do trânsito em julgado da decisão.
Ao interpretar o artigo 16 da LACP, “a sentença civil fará coisa julgada ‘erga
omnes’, nos limites da competência territorial do órgão prolator”, a relatora enten-
de que o legislador pretendeu estender os efeitos do êxito da sentença a todo o
território nacional e que a coisa julgada coletiva não poderá ser questionada em
nenhuma demanda futura dentro da base. Entende que os efeitos da sentença —
tanto principais (elemento declaratório característico de toda decisão judicial) quanto
secundários (constituição de título executivo nas ações condenatórias) — devem ser
estendidos a todos terceiros que se enquadrem no contexto.
Também não é lícito ignorar que a Ministra dedicou preciosas linhas para guer-
rear as disposições do art. 2º-A da Lei nº 9.494/1997.16 Detona que referida norma
de substituição processual se aplica à tutela jurisdicional dos interesses individuais
homogêneos, e que não se confunde com a ação de natureza coletiva, proposta por
entidade associativa, cuja relevância é nacional. A ação foi proposta por sindicatos dos
15
Ensina o professor italiano: “I - A declaração oriunda da sentença, assim como seus outros efeitos possíveis,
pode conceber-se e produzir-se independentemente da coisa julgada; na aptidão da sentença em produzir
os seus efeitos e na efetiva produção deles (quaisquer que sejam, segundo o seu conteúdo) consiste a sua
eficácia, e esta se acha subordinada à validade da sentença, isto é, à sua conformidade com a lei.
II - A eficácia da sentença, nos limites de seu objeto, não sofre nenhuma limitação subjetiva; vale em face de
todos.
III - A autoridade da coisa julgada não é efeito ulterior e diverso da sentença, mas uma qualidade dos seus
efeitos e a todos os seus efeitos referente, isto é, precisamente a sua imutabilidade. Ela está limitada subje-
tivamente só às partes do processo”.
(LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e Autoridade da Sentença e outros escritos sobre a coisa julgada. 3. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 1984. p. 170).
16
Dispõe o texto legal: “Art. 2º-A A sentença civil prolatada em ação de caráter coletivo proposta por entidade
associativa, na defesa dos interesses e direitos dos seus associados, abrangerá apenas os substituídos que
tenham, na data da propositura da ação, domicílio no âmbito da competência territorial do órgão prolator”.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014 19
produtores rurais, contudo, afinal, não defende direitos trabalhistas de seus associados,
mas os interesses de todos (ou de cada um dos) sojicultores do país que se valham de
sementes transgênicas, independentemente da condição de associado, posição tam-
bém adotada em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.17
Ainda pondera que a eficácia das decisões coletivas deve ser ampla. Não concebe
a ideia de tutela jurídica que isente apenas alguns produtores de soja do pagamento
de royalties, sob pena de provocar um desequilíbrio substancial entre os iguais no
mercado de soja do país. Com base em razões de forte relevância, o recurso especial
dos sindicatos dos produtores rurais foi conhecido e, afinal, provido, para estender
os efeitos da sentença a todo território nacional, e não apenas às circunscrições da
base territorial do órgão judicial prolator da decisão.
De todo modo, a única questão pacífica sobre a coisa julgada nas ações coleti-
vas é que ela torna indiscutível e imutável as decisões judiciais, consolidando a ideia
de pacificação social.
Da conclusão
A tutela jurisdicional dos direitos coletivos é a consagração do acesso à justiça.
Nasce por necessidade de economia processual e por clamar a sociedade o cumpri
mento das prestações materiais, tais como saúde, educação, desenvolvimento,
comunicação, meio ambiente, patrimônio comum etc., previstas na Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988.
Ao comentar os aspectos do caso concreto, através do venerando acórdão proferido
pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial nº 1.243.386/RS,
pôde-se apresentar que existem diversas circunstâncias fáticas e múltiplas relações jurí-
dicas revestidas de relevância social por envolver exatamente direitos difusos, coletivos
em sentido estrito e individuais homogêneos, no caso, especialmente as duas últimas
espécies.
No campo prático, todos os sojicultores que se sentirem prejudicados e que
não ajuizaram ação individual, do jeito que está, podem aguardar o desfecho da ação
coletiva proposta pelos sindicatos dos produtores rurais e, se se mantiver o resul-
tado, aproveitar o resultado útil (in utilibus). Também podem ajuizar ação individual e
requerer a suspensão do feito para continuar a se beneficiarem do resultado útil da
coletiva. E podem ainda prosseguir com a ação individual, cônscios, porém, de que
não poderão invocar os resultados da ação coletiva.
Note-se que as discussões teóricas acerca da classificação dos direitos coleti-
vos (difusos, coletivos em sentido estrito e individuais homogêneos), da eleição dos
17
São precedentes: AgRg no RE nº 555.720 (Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJE, 21 nov. 2008) e o AgRg
no RE nº 217.566 (Rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, DJE, 03 mar. 2011).
20 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014
Abstract: From conducting research office with the help of doctrine, legislation and case law, it was
possible to identify procedural points of relevance in the area of collective rights, in particular adequate
representation, thematic pertinence and res judicata collective.
Key words: Direct. Collective legitimization. Res judicata.
Referências
ABDO, Helena Najjar. Art. 20. In: Susana Henriques da Costa (Coord.). Comentários à Lei de Ação
Civil Pública e Lei de Ação Popular. São Paulo: Quartier Latin, 2006.
ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito processual coletivo brasileiro: um novo ramo do direito pro-
cessual. São Paulo: Saraiva, 2003.
ALVIM, Arruda. Notas atuais sobre a figura da substituição processual. Revista de Processo, São
Paulo, v. 27, n. 106, p. 18-27, abr./jun. 2002.
ALVIM, José Manoel Arruda. Código de Defesa do Consumidor Comentado. 2. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1995.
ALVIM, José Manoel Arruda. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1975.
ALVIM, Thereza. O direito processual de estar em juízo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996.
AMARAL, Guilherme Rizzo; MACHADO, Fábio Cardoso (Org.). Polêmicas sobre a ação: a tutela jurisdi-
cional na perspectiva das relações entre o direito e processo. Porto Alegre: Livr. do Advogado, 2006.
BATALHA, Wilson de Souza Campos. Direito processual das coletividades e dos grupos. 2. ed. São
Paulo: LTr, 1992.
BATISTA, Roberto Carlos. Coisa julgada nas Ações Civis Públicas: direitos humanos e garantismo.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
BUENO, Cassio Scarpinella. Partes e terceiros no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003.
CAPPELLETTI, Mauro. Acceso a la justicia: programa de acción reformadora y nuevo método de
pensamiento. Traducción Silva Virgínia Leo Vidaña. Boletin Mexicano de Derecho Comparado, Instituto
de Investigaciones Jurídicas, Universidad Nacional Autónoma de México, Nueva Seria, año XVI, n. 48,
1983.
CARNEIRO, Athos Gusmão. Intervenção de terceiros. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014 21
DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso de direito processual civil: processo coletivo. 4. ed.
Salvador: JusPodivm, 2009. v. 4.
DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil. 3. ed. São Paulo: Malheiros,
1996.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Intervenção de terceiros. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
GAJARDONI, Fernando da Fonseca; GOMES JUNIOR, Luiz Manoel. O terceiro no processo civil brasileiro
e assuntos correlatos. In: DIDIER JR., Fredie et al. (Coord.). Estudos em homenagem ao Professor Athos
Gusmão Carneiro: ações coletivas e intervenção de terceiros. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
GERAIGE NETO, Zaiden. O princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2003.
GIDI, Antonio. A representação adequada nas ações coletivas brasileiras: uma proposta. Revista de
Processo, São Paulo, n. 108, p. 61-70, out./dez. 2002.
GIDI, Antonio. Las acciones colectivas y la tutela de los derechos difusos, colectivos e individuales
em Brasil. Traducción Lucio Cabrera Acevedo. Universidad Nacional Autónoma de México, 2004.
GRINOVER, Ada Pellegrini et al. (Coord.). Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos
autores do anteprojeto. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.
GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo; MULLENIX, Linda. Os processos coletivos nos países
de civil law e common law: uma análise de direito comparado. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011.
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação Civil Pública. 12. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Uma análise comparativa entre os objetos e as legitimações das
ações vocacionadas a tutela dos interesses metaindividuais, mandado de segurança coletivo, Ação Civil
Pública, ações do Código de Defesa do Consumidor e ação popular. Justitia, v. 54, n. 160, p. 181-203,
out./dez. 1992.
MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo: meio ambiente, consumidor, patrimô-
nio cultural, patrimônio público e outros interesses. 21. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2000.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Ações coletivas na Constituição Federal de 1988. Revista de Processo,
São Paulo, v. 16, n. 61, p. 187-200, jan./mar. 1991.
NERY JR., Nelson. O processo civil no Código de Defesa do Consumidor. Revista de Processo, São
Paulo, v. 16, n. 61, p. 24-35, jan./mar. 1991.
SPADONI, Joaquim Felipe. Assistência coletiva simples: a intervenção dos substituídos nas ações
coletivas para defesa de direitos individuais homogêneos. In: DIDIER JR., Fredie; WAMBIER, Teresa
Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais sobre os terceiros no processo civil (e assuntos
afins). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
VENTURI, Elton. Sobre a intervenção individual nas ações coletivas. In: DIDIER JR., Fredie; WAMBIER,
Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais sobre os terceiros no processo civil (e
assuntos afins). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
WATANABE, Kazuo et al. Código de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto.
8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.
WATANABE, Kazuo. Relação entre demanda coletiva e demandas individuais. Revista de Processo,
São Paulo, v. 31, n. 139, p. 28-35, set. 2006.
22 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014
ZANETI JR., Hermes; GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direitos difusos e coletivos. Salvador: JusPodivm,
2010. (Coleção Leis Especiais para Concursos, v. 28).
ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo: tutela dos direitos coletivos e tutela coletiva dos direitos.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
BARBERATO, Celso; GUEDES, Márcio Bulgarelli; GERAIGE NETO, Zaiden.A coisa julgada
na ação coletiva dos sojicultores: comentário sobre o REsp nº 1.243.386/RS. Revista
Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23,
jan./mar. 2014.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 11-23, jan./mar. 2014 23
Resumo: O presente artigo analisa a opção do NCPC de troca da audiência preliminar pela audiência de
conciliação, suas vantagens, desvantagens e consequências.
Palavras-chave: Projeto do NCPC. Troca. Audiência preliminar. Audiência de conciliação. Consequências.
Sumário: 1 Introdução – 2 Audiência preliminar no atual CPC – 3 Troca da audiência preliminar pela audiência
de conciliação no NCPC – 4 Conclusão – Referências
1 Introdução
Analisando a Exposição de Motivos do Projeto do Novo Código de Processo Civil
brasileiro, que chamaremos a partir de agora de NCPC, constatamos a pretensão do
legislador de criar uma nova audiência de conciliação, anterior à apresentação de
defesa pelo réu. Nesse sentido:
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014 25
Como não poderia deixar de ser, e em óbvia sintonia com a Exposição de Moti
vos, dispõe o Projeto, nos dispositivos que transcrevo:
1. Na redação original do Projeto de Lei do Senado nº 166, de 2010:
Capítulo VI
Da Audiência de Conciliação
Art. 333. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não
for o caso de rejeição liminar da demanda, o juiz designará audiência de
conciliação com antecedência mínima de quinze dias.
§1º O juiz determinará a forma de atuação do mediador ou do conciliador,
onde houver, observando o que dispõe a lei de organização judiciária.
§2º As pautas de audiências de conciliação serão organizadas separa-
damente das de instrução e julgamento e com prioridade em relação a
estas.
§3º A intimação do autor para a audiência será feita na pessoa de seu
advogado.
§4º A eventual ausência do advogado não impede a realização da con-
ciliação.
§5º O não comparecimento injustificado do réu é considerado ato atenta-
tório à dignidade da justiça, passível de sanção processual.
§6º Obtida a transação, será reduzida a termo e homologada por sen-
tença.
§7º O juiz dispensará a audiência de conciliação quando as partes mani-
festarem expressamente sua disposição contrária ou quando, por outros
motivos, constatar que a conciliação é inviável.
26 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014
Capítulo V
Da Audiência de Conciliação
Art. 323. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for
o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de
conciliação com antecedência mínima de trinta dias.
§1º O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na
audiência de conciliação, observando o previsto nos artigos 144 e 145,
bem como as disposições da lei de organização judiciária.
§2º Poderá haver mais de uma sessão destinada à mediação e à conci-
liação, não excedentes a sessenta dias da primeira, desde que necessá-
rias à composição das partes.
§3º As pautas de audiências de conciliação, que respeitarão o intervalo
mínimo de vinte minutos entre um e outro ato, serão organizadas sepa-
radamente das de instrução e julgamento e com prioridade em relação
a estas.
§4º A intimação do autor para a audiência será feita na pessoa de seu
advogado.
§5º A audiência não será realizada se uma das partes manifestar, com
dez dias de antecedência, desinteresse na composição amigável. A parte
contrária será imediatamente intimada do cancelamento do ato.
§6º O não comparecimento injustificado do autor ou do réu é considerado
ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de
até dois por cento do valor da causa ou da vantagem econômica objetivada,
revertida em favor da União ou do Estado.
§7º As partes deverão se fazer acompanhar de seus advogados ou defen-
sores públicos.
§8º A parte poderá fazer-se representar por preposto, devidamente cre-
denciado, com poderes para transigir.
§9º Obtida a transação, será reduzida a termo e homologada por sen-
tença.
Seção III
Do saneamento do processo
Art. 331. Se não ocorrer qualquer das hipóteses previstas nas seções
precedentes, e versar a causa sobre direitos que admitam transação, o juiz
designará audiência preliminar, a realizar-se no prazo de 30 (trinta) dias,
para a qual serão as partes intimadas a comparecer, podendo fazer-se
representar por procurador ou preposto, com poderes para transigir. [...]
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014 27
§2º Se, por qualquer motivo, não for obtida a conciliação, o juiz fixará
os pontos controvertidos, decidirá as questões processuais pendentes
e determinará as provas a serem produzidas, designando audiência de
instrução e julgamento, se necessário.
§3º Se o direito em litígio não admitir transação, ou se as circunstân-
cias da causa evidenciarem ser improvável sua obtenção, o juiz poderá,
desde logo, sanear o processo e ordenar a produção da prova, nos
termos do §2º.
Seção III
Do saneamento do processo
Art. 354. Não ocorrendo nenhuma das hipóteses das seções deste Capí
tulo, o juiz, declarando saneado o processo, delimitará os pontos con-
trovertidos sobre os quais deverá incidir a prova, especificará os meios
admitidos de sua produção e, se necessário, designará audiência de
instrução e julgamento.
Seção III
Do saneamento do processo
Art. 342. Não ocorrendo qualquer das hipóteses deste Capítulo, o juiz, em
saneamento, decidirá as questões processuais pendentes e delimitará
os pontos controvertidos sobre os quais incidirá a prova, especificando os
meios admitidos de sua produção e, se necessário, designará audiência
de instrução e julgamento.
Parágrafo único. As pautas deverão ser preparadas com intervalo mínimo
de quarenta e cinco minutos entre uma e outra audiência de instrução e
julgamento.
28 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014
Constate-se que o Código Modelo vem produzindo efeitos favoráveis nos proje-
tos de reformas que em nossa área ibero-americana tendem a modificar os antigos
procedimentos e aparece refletido, em muitas de suas soluções, em vários novos
ordenamentos jurídicos positivos.
O Código General del Proceso de 1988 do Uruguai, vigente a partir de 20.11.89,
segue também o lineamento do Código Modelo em matéria de faculdades probatórias
do juiz civil, mas vai mais além, em especial quando regula a matéria dos processos
1
DINAMARCO. A reforma do Código de Processo Civil, p. 117.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014 29
sociais. Dito Código regula todos os processos não penais (nem aduaneiros), pelo
qual foram derrogadas expressamente todas as leis processuais, inclusive o Código
de Procedimiento Civil de 1877. No que diz respeito à audiência preliminar, o tribunal
tentará conciliar as partes, sanear o processo, fixar o objeto da prova, em colabora-
ção das partes, com o qual deverá rechaçar as provas desnecessárias e inconducen-
tes, deixando as impertinentes para sentença. Se não houver conciliação total, ao
menos se chega a um acordo sobre certos fatos que fazem desnecessárias provas
solicitadas nos escritos introdutórios.2
Enfocados conjuntamente, os princípios da cooperação, oralidade-imediação,
com expressão escrita no processo e livre convicção do juiz orientam essa audiência.
E com esse contato entre os atores processuais, poderá o juiz observar não só o que
alegam as partes, mas também como o fazem. É a grande vantagem da oralidade.
2
VESCOVI. Los poderes probatorios del juez civil en los nuevos sistemas procesales. In: DENTI. Studi in onore
di Vittorio Denti, p. 557-558.
3
VAZ. Direito Processual Civil: do antigo ao novo Código, p. 157.
4
CHIOVENDA. Instituciones de derecho procesal civil, v. III, p. 165.
30 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014
pelas partes, se o juiz tiver de apreciar exceções dilatórias que as partes não hajam
suscitado e discutido nos articulados ou tencionar conhecer, no todo ou em parte,
do mérito da causa no despacho saneador (art. 508º-A, nº 1, al. b); c) discussão
das posições das partes, com vista à delimitação do litígio e suprimento das insufi-
ciências ou imprecisões na exposição da matéria de fato que ainda subsistam ou se
tornem patentes na sequência do debate (art. 508º-A, nº 1, al. c); d) proferimento do
despacho saneador (art. 508º-A nº 1, al. d); e) finalmente, se a ação tiver sido contes-
tada, seleção, após debate, da matéria de fato relevante para a apreciação da causa
e decisão sobre as reclamações deduzidas pelas partes contra ela (art. 508º-A, nº 1,
al. e). Em síntese, persegue múltiplas funções: de conciliação das partes (art. 508º-A,
nº 1, al. a), de audição prévia das partes (art. 508º-A, nº 1, al. b), de saneamento do
processo (art. 508º-A, nº 1, al. d), de concretização do objeto do litígio (art. 508º-A,
nº 1, al. c) e de seleção da matéria de fato (art. 508º-A, nº 1, al. e).5
A audiência preliminar propicia um contato decisivo entre as partes e o juízo,
para que seja expurgado o processo de tudo quanto não interessa, tornando-se mais
clara a matéria discutida. Consiste, assim, no ápice da aplicação do princípio da coo
peração intersubjetiva.
Quanto a sua finalidade essencial, reside em eliminar da lide, concentradamente
— em oposição ao sistema tradicional difuso, em cuja atividade se dispersa — em
uma etapa inicial, todos os obstáculos que impeçam, suspendam ou interrompam o
debate sobre a fundamentação do que se pretende. Esta genuína função de “purgar”
precocemente o processo, livrando-o dos impedimentos processuais, para propiciar a
rápida e ordenada passagem para etapa do exame do mérito, constitui uma finalidade
patente suscetível de ser alcançada por diversos caminhos. Precisamente a dificul-
dade aflora na sua articulação prática, pela persecução do imprescindível equilíbrio
e dosimetria entre o conteúdo da atividade que tem lugar na audiência preliminar
5
Mas não são as únicas funções. Poderão ainda ser preenchidas nesta audiência preliminar algumas funções
complementares, tais como: a) suprimento de insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de fato,
que se tornam manifestas na sequência do debate; b) indicação dos meios de prova e decisão sobre a res-
pectiva admissibilidade e preparação; c) nela deve ser designada a data para a realização da audiência final;
d) nela deverá ser requerida a gravação da audiência final; e) asseguramento do direito do contraditório,
quando a parte não pôde responder às exceções deduzidas pela parte contrária no último articulado admi-
tido, concedendo-se direito de resposta; f) dedução de articulado superveniente, nos termos do art. 506/3a;
g) colheita de depoimento de parte (art. 556/3); h) e obtenção de acordo das partes quanto à remessa do
processo para o tribunal competente, verificando-se uma incompetência absoluta do tribunal (art. 105/2).
Geraldes inclui ainda a apresentação de requerimento para intervenção do tribunal coletivo nos casos em que
tal intervenção não seja obrigatória. A audiência preliminar apresenta efeitos preclusivos quanto à prática de
determinados atos, tais como a apresentação de reclamação quanto à seleção da matéria de fato, indicação
dos meios de prova, apresentação do requerimento para a gravação da audiência ou para a intervenção do
coletivo, nos casos em que este não deva, em princípio, intervir no julgamento. É que a concentração de atos
prevista na lei visou, sem dúvida alguma, acelerar a marcha processual, objetivo que sairia gorado se, a partir
de interpretações diversas, se abrisse mão de tal princípio e se concluísse pela transposição, para fora da
audiência preliminar, de determinados atos que naquela se inserem e que justificaram a criação de tal “pólo
aglutinador de todas as medidas organizativas do processo”, como se refere no Preâmbulo do Dec.-Lei nº 329-A/95,
de 12 de dezembro (GERALDES. Temas da reforma do Processo Civil).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014 31
versus a necessidade de não criar um desmedido instrumento que, por fim, bloqueie
e dificulte um mais rápido alcance da etapa decisória. Este é o árduo desafio que
deve afrontar o legislador.6
Não podemos deixar de dizer que o Código de Processo Civil brasileiro seguiu
tal orientação, ao dispor:
Seção III
Do saneamento do processo
Art. 331. Se não ocorrer qualquer das hipóteses previstas nas seções
precedentes, e versar a causa sobre direitos que admitam transação, o juiz
designará audiência preliminar, a realizar-se no prazo de 30 (trinta) dias,
para a qual serão as partes intimadas a comparecer, podendo fazer-se
representar por procurador ou preposto, com poderes para transigir.
§1º Obtida a conciliação, será reduzida a termo e homologada por sen-
tença.
§2º Se, por qualquer motivo, não for obtida a conciliação, o juiz fixará
os pontos controvertidos, decidirá as questões processuais pendentes
e determinará as provas a serem produzidas, designando audiência de
instrução e julgamento, se necessário.
§3º Se o direito em litígio não admitir transação, ou se as circunstâncias
da causa evidenciarem ser improvável sua obtenção, o juiz poderá, desde
logo, sanear o processo e ordenar a produção da prova, nos termos do §2º.
6
BERIZONCE. L’udienza preliminare nel Codice Processuale Civile modello per l’Ibero-America. In: DENTI. Studi in
onore di Vittorio Denti, v. II, p. 31.
32 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014
7
MOREIRA. O processo civil brasileiro e o procedimento por audiências. In: MOREIRA. Temas de Direito Proces-
sual: sexta série, p. 105.
8
GUEDES. O princípio da oralidade.
9
GALINDO. Avanços e retrocessos na disciplina das audiências no projeto do NCPC. In: ADONIAS; DIDIER JR.
(Org.). O projeto do novo Código de Processo Civil, p. 88.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014 33
34 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014
A análise de tal pesquisa deixa claro que o sistema implantado nos Juizados
Especiais Cíveis, de realização de uma audiência no início do processo com exclusiva
finalidade conciliatória, tem apresentado resultados questionáveis, pela baixa quan-
tidade de acordos obtidos.
Nossa experiência prática demonstra ainda que vários advogados questionam
sua utilidade prática, especialmente quando se encontram no polo passivo pessoas
jurídicas, demandados habituais que muitas vezes tem a clara orientação para que
seus advogados não firmem acordos. Criticam também a falta de preparo dos conci-
liadores para a missão e o atraso que a realização de duas audiências pode causar
ao julgamento da causa, fato que tem feito com que alguns Juizados em alguns
Estados realizem as duas audiências sucessivamente no mesmo dia.
Constatamos ser duvidosa a opção do NCPC de troca da atual audiência prelimi-
nar pela audiência de conciliação. Vimos que o NCPC prevê que a audiência não será
realizada se uma das partes manifestar, com dez dias de antecedência, desinteresse
na composição amigável, devendo a parte contrária ser imediatamente intimada do
cancelamento do ato. Mesmo neste caso, terá havido retardamento para o ofereci-
mento da resposta do réu. E em momento posterior, numa fase mais adiantada do
processo, as partes perderão a excelente oportunidade de, por meio de seus advoga-
dos, interferirem de forma direta na formação do convencimento do juiz a respeito da
fixação dos pontos controvertidos e do deferimento das provas a serem produzidas
na audiência de instrução e julgamento.
Mais sensata teria sido a aprovação do Projeto de Lei do Senado de nº 135/2004,
de autoria do Senador Pedro Simon, que permitia ao juiz dispensar a produção de
provas requeridas e não ratificadas na audiência preliminar pela parte cujo advogado
injustificadamente deixou de comparecer ao ato, proposta que restou rejeitada quando
da aprovação do substitutivo do Senador Valter Pereira.11
Dessa maneira a Comissão do NCPC, ao invés de prestigiar a audiência preli-
minar, que enfatiza a cooperação intersubjetiva no processo, princípio retor do NCPC,
cria uma audiência de conciliação, de resultado duvidoso, que retira das partes a
possibilidade de terem uma participação mais ativa no processo.
E não se diga que a audiência preliminar não serve ao processo civil brasileiro.
Trata-se de um instituto extremamente avançado e que, muitas vezes, vem sendo
subutilizado por alguns juízes que comparecem à referida audiência sem conhecerem
10
PALETTA. Audiência de conciliação nos juizados especiais cíveis cariocas: obstáculo ou solução?.
11
GALINDO. Avanços e retrocessos na disciplina das audiências no projeto do NCPC. In: ADONIAS; DIDIER JR.
(Org.). O projeto do novo Código de Processo Civil, p. 96.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014 35
4 Conclusão
O NCPC, seguindo caminho contrário ao Código Tipo para a América Latina, eli-
minou a audiência preliminar, indo de encontro à cooperação intersubjetiva, princípio
que rege o novel projeto de diploma legislativo. Criou em seu lugar uma audiência de
conciliação, de resultado duvidoso, que retira das partes a possibilidade de terem
uma participação mais ativa no processo, influenciando diretamente na decisão do
juiz no que diz respeito à fixação dos pontos controvertidos e deferimento das provas
a serem produzidas em audiência, transformando o que era diálogo em monólogo.
Conciliation Conference Versus Pre-Trial Conference – The Option by the First and the Consequences by
Elimination of the Second at the Project of New Brazilian Civil Procedure Code (NCPC)
Abstract: This article analyzes the NCPC exchange option of preliminary hearing by conciliation hearing, its
benefits, losses and consequences.
Key words: NCPC Project. Exchange. Pre-trial conference. Conciliation conference. Consequences.
Referências
BERIZONCE, Roberto O. L’udienza preliminare nel Codice Processuale Civile modello per l’Ibero-America.
In: DENTI, Vittorio. Studi in onore di Vittorio Denti. Padova: Cedam, 1994. v. II.
BRUNO, Susana. Conciliação: prática interdisciplinar e ferramentas para a satisfação do jurisdicionado.
Belo Horizonte: Fórum, 2012.
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituciones de derecho procesal civil. Tradução de E. Gomes Orbaneja.
Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1940. v. III.
DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo:
Malheiros, 1996.
12
BRUNO. Conciliação: prática interdisciplinar e ferramentas para a satisfação do jurisdicionado.
36 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 25-37, jan./mar. 2014 37
Resumo: A ratio decidendi dos precedentes judiciais. O presente trabalho tem como foco descrever a
importância da ratio decidendi para uma adequada operacionalização da técnica de vinculação dos pre
cedentes, que vem sendo introduzida no direito processual brasileiro diante de uma aproximação, cada
vez maior, entre os sistemas jurídicos do common law e civil law. A pesquisa feita demonstra que, para se
identificar a ratio decidendi de um precedente, há a necessidade de se adentrar ao caso concreto levado a
julgamento, e que esta exigência afasta da condição de precedentes certos institutos, tais como a súmula
vinculante e as orientações jurisprudenciais, por vezes assim considerados pela doutrina pátria.
Palavras-chave: Ratio decidendi. Stare decisis. Precedentes vinculantes. Common law.
Sumário: 1 Introdução – 2 Evolução da teoria dos precedentes no sistema do common law – 3 Noções
sobre a regra do stare decisis – 4 A ratio decidendi – 5 Precedentes no Brasil – 6 Conclusão – Referências
1 Introdução
O tema versado no presente trabalho mostra-se interessante vez que tangencia
espaço relegado a um segundo plano nos países que, como o Brasil, tradicionalmente
adotaram o sistema do civil law.
É inquestionável que no sistema processual pátrio cada vez mais são inseridas
técnicas originárias do common law, sendo a dos precedentes judiciais, também
conhecida como stare decisis, a mais importante.
Com essa convergência que hoje se verifica entre os sistemas common law e
civil law, tornou-se imprescindível o estudo da técnica de utilização dos precedentes
no Brasil.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 39
1
Jurisprudência vinculante no direito norte-americano e no direito brasileiro. Revista de Processo, p. 101.
2
Antes deste período a Inglaterra vivenciava o esfacelamento do ordenamento jurídico, fruto do pluralismo nor-
mativo advindo do sistema feudal em que em cada área havia a prevalência dos ditames de um barão.
3
Mediante esse sistema, também conhecido como Juízo de Deus, as pessoas, sob o argumento de intervenção
divina, tinham que operar milagres para provar sua inocência.
40 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
4
Esse sistema tem como principal característica a simplicidade procedimental em que era feita uma súplica
ao rei, representado por seu chanceler; atendia, sobretudo, as demandas relativas a direito de propriedade,
contratos e também lides envolvendo garantias.
5
Os poderes do juiz no common law. Revista de Processo, p. 195.
6
Segundo o mesmo autor, os mais antigos Year-Books foram feitos por compiladores anônimos entre os reina-
dos de Eduardo I e Henrique VIII; o precedente primeiramente tinha natureza persuasiva (persuasive precedent)
de modo que o juiz podia pô-lo de lado se encontrasse razões convincentes para tanto, tendo tão somente no
século XVII se tornado obrigatório ou vinculativo (binding precedent) (O direito processual brasileiro e o efeito
vinculante das decisões dos Tribunais Superiores. Revista de Processo, p. 64).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 41
7
Cotrim arrola os principais pontos da Constituição Francesa: “Sociedade – igualdade jurídica entre todos
os indivíduos. Extinguiam-se os privilégios hereditários da nobreza e do clero. Abolia-se totalmente a tor-
tura. Mantinha-se, contudo, a escravidão nas colônias francesas (COTRIM. História global: Brasil e geral,
p. 260-261).
Economia – completa liberdade de produção e de comércio. Garantia-se a não interferência do Estado na vida
econômica. Proibiam-se as greves dos trabalhadores.
Religião – garantia-se a liberdade de crença religiosa. Instituía-se a separação do Estado e da Igreja. Tornava-
se obrigatória a nacionalização dos bens do clero.
Política – os poderes do Estado foram divididos em: Legislativo, Executivo e Judiciário. Assegurava-se a repre
sentatividade popular por meio de eleições para a escolha dos parlamentos. Dividiam-se os cidadãos em
ativos (que tinham um limite mínimo de renda para votar) e passivos (que eram pobres e ficavam fora do
processo eleitoral).”
8
A jurisprudência como fonte do direito: a experiência anglo-americana. Revista de Direito Constitucional e Inter
nacional, p. 284.
42 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
9
Leciona Nogueira: “Assim, os Estados Unidos tinham, ao contrário da Inglaterra, uma Constituição escrita
(necessária para unir as treze colônias), um sistema de separação dos poderes — checks and balances — ins-
pirado nas lições de Montesquieu (evitava a concentração de poderes), representatividade popular (impedia a
taxação sem representação), um sistema federativo (cada Estado conservava uma parcela da autonomia), um
Presidente com mandato temporário (renovação de poder) e um Poder Judiciário com possibilidade de controlar
a constitucionalidade das leis (não adotam os EUA o princípio inglês da soberania parlamentar)” (Stare decisis
et non quieta movere: a vinculação aos precedentes no direito comparado e brasileiro, p. 143).
10
O direito processual brasileiro e o efeito vinculante das decisões dos Tribunais Superiores. Revista de Pro
cesso, p. 62.
11
A expressão stare decisis (em latim: stare decisis et non quieta movere), significa algo como: “mantenha-se
a decisão e não altera o que está quieto” (NOGUEIRA. Gustavo Santana. Jurisprudência vinculante no direito
norte-americano e no direito brasileiro. Revista de Processo, p. 101).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 43
decisão. É por razões históricas que o sistema do common law se caracteriza pela
eleição do precedente como fonte primária, sendo a força vinculativa das decisões o
centro de formação do Direito.
Na Inglaterra, até meados do século XIX não havia propriamente uma regra
jurídica que obrigasse a vinculação ao precedente. Existia apenas uma tradição de
seguir as decisões da mesma Corte ou de Cortes hierarquicamente superiores. Foi
em um precedente judicial datado de 1861 que a Câmara dos Lordes arraigou-se do
poder de manter imutáveis suas próprias decisões.
Após a 2ª Guerra Mundial, estabeleceu-se na Inglaterra um debate sobre a
conveniência de manter a regra do stare decisis com toda a sua rigidez e em todas
as Cortes e instâncias. Em 1966, a Câmara dos Lordes anunciou em um documento
chamado Practice Statement que poderia superar os seus próprios precedentes, sub-
jacente a uma técnica apropriada, que se verá mais adiante.
No common law a atuação do juiz se limita a decisões anteriormente proferidas.
Só que não é toda e qualquer decisão que se consubstanciará em precedente. Cada
ordenamento jurídico delineia certos requisitos para tal configuração, mas em todos há
um ponto em comum: a semelhança entre a matéria já julgada e aquela que ainda será.
Tradicionalmente nos Estados Unidos e na Inglaterra a técnica dos precedentes,
bem como as nuanças e princípios extraídos dos casos com força vinculante, são
estudados aprofundadamente nas faculdades, sendo imprescindível este conheci-
mento para a prática da advocacia e atuação judicial.
Interessante ressaltar que a autoridade dos precedentes só foi possível a partir
da criação dos Reports: espécie de catálogo das decisões judiciais. Antes disso,
diante da impossibilidade das decisões chegarem ao conhecimento dos magistrados
não se podia falar em respeito aos precedentes.12
Os precedentes consistem em julgados que servirão de referência a futuras
decisões judiciais.
Sobre o conceito de precedente elevando-se a importante característica de ser-
viência paradigmática a composição de futuras decisões, destacam-se as palavras
de Marinoni:13
“Seria possível pensar que toda decisão judicial é um precedente. Contudo,
ambos não confundem, só havendo sentido falar de precedente quando se tem uma
decisão dotada de determinadas características, basicamente a potencialidade de
se firmar como paradigma para a orientação dos jurisdicionados e dos magistrados.”
Cabe dizer que os precedentes podem ser classificados em vinculantes ou
persuasivos.
12
NOGUEIRA. Stare decisis et non quieta movere: a vinculação aos precedentes no direito comparado e brasileiro,
p. 113. Atualmente, os precedentes são registrados em livros denominados de Years Book.
13
Precedentes obrigatórios, p. 215.
44 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
14
CARPENA. Os poderes do juiz no common law. Revista de Processo, p. 195.
15
CARPENA. Os poderes do juiz no common law. Revista de Processo, p. 195.
16
Mattei (1988, p. 3 apud CAPERNA. Os poderes do juiz no common law. Revista de Processo, p. 195) elenca
quatro requisitos para que haja um precedente vinculante: a) identidade de fato; b) que já tenha sido adotado
em Corte da mesma jurisdição; c) não tenha sido modificado ou revisto; d) mesma matéria jurídica.
17
Escrevendo sobre o tema, Lima (2012) registrou que: “O precedente só terá força vinculante se houver
identidade com base nos fatos ou nas questões de direito suscitadas (binding ou leading precedents), caso
contrário servirá apenas de elemento persuasivo (persuasive precedents).”
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 45
Por ora, importa enfatizar que do precedente não se emana uma regra abstrata:
este será sempre dotado de concretude por estar ligado a um caso específico levado
a julgamento. Em face da importância do caso concreto, é mister, na técnica de ope-
ração de um precedente, percorrer os fatos e os pontos discutidos em juízo, o que
não é tarefa simples.
Assim, vislumbrados os requisitos que elevam ao precedente a força vinculante,
partirá o magistrado para sua aplicação.
Deve-se ter em mente que o precedente será o ponto de partida da aplicação do
direito ao caso concreto, ficando a critério do julgador, elevado a certo subjetivismo,
decidir de que forma ele será enquadrado a questão a ser julgada.
O jurista Re (1990 apud Caperna18) com clareza aponta este sentido:
“É preciso compreender que o caso decidido, isto é, o precedente, é quase
universalmente tratado como apenas um ponto de partida. Diz-se que o caso decidido
estabelece um princípio, e ele é na verdade um principium, um começo, na verdadeira
acepção etimológica da palavra. Um princípio é uma suposição que não põe obstáculo
a maiores indagações. Como ponto de partida, o juiz, no sistema do common law,
afirma a pertinência de um princípio extraído do precedente considerado pertinente.
Ele, depois, trata de aplicá-la moldando e adaptando aquele princípio de forma a
alcançar a realidade da decisão ao caso concreto que tem diante de si. O processo
de aplicação, quer resulte numa expansão ou numa restrição do princípio, é mais do
que apenas um verniz; representa a contribuição do juiz para o desenvolvimento e
evolução do direito.”
Importante observar que foi baseado na cultura em que se sustenta o respeito
aos costumes e ao tradicionalismo, e, num prisma jurídico, a busca pela igualdade e a
segurança jurídica, que os países do common law adotaram o precedente como norte.
Não há razão maior para a adoção da regra do stare decisis pelos países do common
law que a necessidade de oferecer mesma resposta judicial a iguais situações.
Assinala Porto:19
“a) Na mesma jurisdição, o direito deve dar a mesma resposta para as mesmas
questões legais. Para desenvolver o direito uniformemente e através do sistema judicial,
as Cortes devem respeitar as resoluções hierarquicamente superiores. Trata-se, pois, do
prestígio ao valor ‘segurança jurídica’; b) Em segundo lugar, justiça imparcial e previsível
significa que casos semelhantes serão decididos da mesma forma, independentemente
das partes envolvidas, numa homenagem ao princípio da isonomia; c) Em terceiro lugar,
se na prática fosse de outra forma, isto é, não fossem as decisões judiciais previsíveis, o
planejamento nas demandas iniciais seria de difícil concepção; d) Em quarto lugar, stare
18
CARPENA. Os poderes do juiz no common law. Revista de Processo, p. 195.
19
PORTO. Civil Law e Common Law: precedente vinculante: estudo em homenagem ao Professor Egas Dirceu
Moniz de Aragão.
46 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
20
O direito processual brasileiro e o efeito vinculante das decisões dos Tribunais Superiores. Revista de Pro
cesso, p. 64.
21
MORIN, 2004.
22
HARDT; NEGRI. Multidão: guerra e democracia na era do Império.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 47
aspectos relevantes. A vantagem é que muitas vezes estes aspectos relevantes são
vistos pelo magistrado e não pelo legislador.
Sobre a complexidade das relações e a importância da aplicação dos prece-
dentes na sociedade atual para a efetivação da justiça, mostram-se importantes as
palavras de Taruffo:23
“Os precedentes poderiam operar como as estruturas dissipadoras das quais se
fala nas teorias da complexidade, ou seja, como momentos de formação de áreas de
ordem dentro da desordem do fluir do caos da jurisprudência. Eles, de fato, poderiam
constituir importantes fatores de racionalização, de uniformidade, pois, flexível, de
previsibilidade e de igualdade de tratamento na incontrolável quantidade e variedade
de casos que são decididos pelas cortes. Para que isso aconteça, todavia, é necessá-
rio que eles não sejam, na vez deles, um elemento de desordem e de variação causal
legada à especificidade dos casos singulares concretos: é necessário, portanto, que
se tratem de precedentes em sentido próprio e, por isso, que eles apresentem os
caracteres distintivos de ‘raridade’, autoridade e universalidade em função dos quais
eles possam emergir do caos indistinto da praxe judiciária.”
Por outro lado, a complexidade advinda das relações humanas traz a certeza
de que jamais, um caso, um problema, um conflito entre pessoas será o mesmo
que outro. Cada caso traz nuanças próprias não repetíveis. Diante disso, no campo
dos precedentes, não será todo o teor de uma decisão antes tomada que servirá de
parâmetro vinculativo a futura decisão de caso semelhante. Vai importar, e muito, a
identificação do centro irradiador da norma concreta utilizada num julgamento.
Dessa argumentação, sobressai conclusão importantíssima, dentro da opera-
cionalização da regra do stare decisis: não é todo o conteúdo do julgado que tem
força vinculativa. Somente parte da decisão terá esta força. Esta parte é denominada
de ratio decidendi. O reconhecimento e identificação da ratio decidendi é a principal
tarefa para a adequada aplicação da técnica dos precedentes.
Diante disso, passa-se ao estudo da ratio decidendi.
23
Precedente e jurisprudência. Revista de Processo, p. 139.
24
Goron (A jurisprudência como fonte do direito: a experiência anglo-americana. Revista de Direito Constitucional
e Internacional, p. 284) afirma que: “Característica da ratio decidendi como regra de direito da common law
48 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
é sua natureza necessariamente mais concreta do que a regra do Direito romano-germânico. Aos olhos da
common law as regras abstratas do Direito continental não se parecem com verdadeiras regras jurídicas, mas
com exortações morais à consciência do julgador. Na ótica de um jurista inglês ou mesmo norte-americano, as
regras jurídicas típicas do Direito Continental, significativamente mais abertas à discricionariedade do julgador,
deixam muito espaço à arbitrariedade e ameaçam perigosamente a sua segurança jurídica.”
25
A jurisprudência como fonte do direito: a experiência anglo-americana. Revista de Direito Constitucional e Inter
nacional, p. 284.
26
A jurisprudência como fonte do direito: a experiência anglo-americana. Revista de Direito Constitucional e Inter
nacional, p. 284.
27
Precedente judicial como fonte do direito, p. 175.
28
A vigência aplicativa dos regimes jurisprudenciais e a regra da coisa julgada. Revista de Processo, p. 160.
29
Precedente judicial como fonte do direito, p. 177.
30
Julgar nos Estados Unidos e na França: cultura jurídica francesa e common law e uma perspectiva comparada,
p. 34.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 49
31
CROSS; HARRIS, 2004 apud NOGUEIRA. Stare decisis et non quieta movere: a vinculação aos precedentes no
direito comparado e brasileiro, p. 168.
32
Stare decisis et non quieta movere: a vinculação aos precedentes no direito comparado e brasileiro, p. 168.
33
Teoria dos capítulos de sentença, à luz das técnicas de jurisdição constitucional. Revista de Processo, p. 43.
50 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
Nesse aspecto, afirmam Souza34 e Anjos35 que as diversas teorias criadas pela
doutrina a fim de certificar um método preciso de identificação da ratio decidendi são
conflitantes entre si, e nenhuma delas por si só é capaz de precisar absolutamente
o instituto da ratio decidendi.36
34
Do precedente judicial à súmula vinculante, p. 125.
35
“Deve-se salientar que não há método único de determinar a regra relativamente à qual um dado precedente
dotado de autoridade funcional como autoridade; segundo, não há uma formulação unicamente correta de
qualquer regra que deva ser extraída dos casos” (A vigência aplicativa dos regimes jurisprudenciais e a regra
da coisa julgada. Revista de Processo, p. 160).
36
Curiosamente, como preleciona Crownie, Bradney e Burton (2007, p. 95) apud Nogueira (Stare decisis et non
quieta movere: a vinculação aos precedentes no direito comparado e brasileiro, p. 169): “A proliferação de
explicações conflitantes é, por si só, uma estranha característica da tradicional história do raciocínio jurídico
inglês. Se precedente tem a ver com busca por certeza e consistência, e se o uso das rationes é o caminho
para o qual o sistema de precedentes fornece o real rigor da vinculação, através da comparação, parece pro-
blemático que nem os acadêmicos e nem os juízes consigam fornecer uma explicação clara sobre como as
rationes devem ser encontradas”.
37
Do precedente judicial à súmula vinculante, p. 134.
38
Do precedente judicial à súmula vinculante, p. 126, 127.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 51
39
Crítica à aplicação de precedentes no direito brasileiro, p. 69.
40
Return to stare decisis. 14 American Bar Association Journal – ABAJ, p. 71-77.
41
Apud SOUZA. Do precedente judicial à súmula vinculante, p. 129.
42
Do precedente judicial à súmula vinculante, p. 130.
52 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
43
Do precedente judicial à súmula vinculante, p. 133.
44
Precedentes obrigatórios, p. 281.
45
Crítica à aplicação de precedentes no direito brasileiro, p. 70-71.
46
“(O texto) somente estará completo quando o sentido que ele expressa é produzido pelo intérprete, como nova
forma de expressão. Assim, o sentido expressado pelo texto já é algo novo, diferente do texto. É a norma. A
interpretação do Direito faz conexão entre o aspecto geral do texto e a sua aplicação particular: ou seja, opera
sua inserção no mundo da vida. As normas resultam sempre da interpretação. E a ordem jurídica, em seu
valor histórico concreto, é um conjunto de interpretações, ou seja, um conjunto de normas. O conjunto das
disposições (textos, enunciados) é uma ordem jurídica apenas potencialmente, é um conjunto de possibilidades,
um conjunto de normas potenciais. O significado (ou seja, a norma) é o resultado da tarefa interpretativa”
(STRECK, 2006 apud RAMIRES. Crítica à aplicação de precedentes no direito brasileiro).
47
Ou seja: texto da decisão que decidiu um precedente (RAMIRES. Crítica à aplicação de precedentes no direito
brasileiro, p. 71).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 53
imprescindível que antes tome conhecimento dos fatos do caso presente e do caso
que deu origem ao julgado pretérito, e só após compará-los e distingui-los poderá
aplicar a regra.”
E, deste modo, cabe aqui seguir com a seguinte indagação. Através de qual
meio poder-se-á verificar a identidade entre os fatos, premissa principal para a apli-
cação de um precedente?
Em resposta, deve ser colocado primeiramente que esta identidade não pode e
nem deve ser absoluta, senão estar-se-ia julgando o mesmo caso duas vezes, o que
encontraria óbice através do instituto da coisa julgada. Segundo, caberá ao operador
a tarefa de encontrar elementos que ensejam a colocação dos fatos sob a égide de
uma mesma categoria.
Este é o entendimento de Souza,48 embasado na teoria de Llewllyn (1930) segundo
o qual:
“Na verdade, há que atribuir um nível correto ou apropriado de generalidade ao
fato constante do precedente. Ele há de ser considerado, baseado em critérios de genera-
lidade apropriados, como representativo de uma categoria abstrata de fatos. Ao fato
é atribuída significância não por si só, mas como membro de uma categoria. [...]
O critério para o correto grau de extensão dado à generalização — é importante
que se repita — deve ter por parâmetro e limite a constatação de não haver razão jurí-
dica que leve a distinção entre o fato concreto do precedente e fato concreto do caso
em julgamento, pertencendo ambos, na situação dada, à mesma categoria de fatos.”
Nesta fase, portanto, caberá ao jurista o aguçamento da sua sensibilidade e
reflexão, a fim de verificar quais elementos de cada fato saltam como pontos funda-
dores da decisão, e a possibilidade de serem enquadrados numa mesma categoria,
sobre a qual deverá recair as mesmas normas, sendo, destarte, passíveis de uma
mesma resposta jurídica.
Vale apontar que Dworkin (1991) citado por Ramires49 criou a expressão “força
gravitacional” (gravitational force) para descrever a extensão da influência de um pre-
cedente. Sublinha Ramires que a “tarefa que se põe à frente dos intérpretes, então,
é a de verificar em cada caso presente a sua adequabilidade a uma decisão pretérita,
e a sua inserção no ‘campo gravitacional’ de um precedente”.
Este enquadramento dos fatos numa mesma categoria (verificação da extensão
do campo gravitacional), na lição de Ramires,50 deve ser primado pelo princípio de
justiça e não por argumento político. E faz interessante distinção entre princípio de jus
tiça e argumento político, afirmando que neste há possibilidade de tratamento não
isonômico, dada a discricionariedade. Ao passo que o princípio de justiça, que baliza
48
Do precedente judicial à súmula vinculante, p. 136.
49
Crítica à aplicação de precedentes no direito brasileiro, p. 74.
50
Crítica à aplicação de precedentes no direito brasileiro, p. 74-76.
54 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
51
“Assim, a força do precedente deriva do princípio de justiça de tratar casos semelhantes de maneira seme
lhante (‘the fairness of treating like cases alike’), preocupação que não há no campo da política. Se a
Administração Pública pretender estimular o crescimento econômico investido em construção de estradas, os
construtores de casas não poderão invocar um direito de receberem os mesmos subsídios, porque a decisão
é baseada em argumentos de política. Porém, o mesmo Estado que condena um fabricante de automóveis
a indenizar uma cliente que sofreu lesões em razão de um defeito no carro deve, ao menos, dizer por que
razão deixa de condenar um empreiteiro que provocou dano econômico através do trabalho defeituoso de seus
empregados” (RAMIRES. Crítica à aplicação de precedentes no direito brasileiro, p. 75).
52
GORON. A jurisprudência como fonte do direito: a experiência anglo-americana. Revista de Direito Constitucional
e Internacional, p. 284.
53
Goron diz que: “O juiz inglês tem grande dificuldade em negar a autoridade de um precedente com força
vinculante. Em muitos casos quando a solução contida no precedente lhe parece injusta ou inadequada, o
juiz da common law prefere se utilizar da técnica conhecida como distinção, às vezes sob o preço de criar
delimitações bastante artificiais. Esse método — a distinguishing — apresenta a vantagem essencial de não
demonstrar incompatibilidade técnica com a regra do stare decisis, ainda que, muitas vezes, como visto, seja
tênue a linha que separa a distinção da superação pura e simples do precedente.
Embora a doutrina do precedente nunca tenha tido nos Estados Unidos o mesmo prestígio de que desfruta na
Inglaterra (em parte isso decorre do excessivo número de juízes e jurisdição existentes nos Estados Unidos, di-
ficultando uma melhor sistematização dos precedentes, em confronto com a estrutura relativamente simples do
Judiciário inglês), a regra stare decisis ainda é largamente aceita pela comunidade jurídica e amplamente praticada
pelo Judiciário norte-americano. Assim, não surpreende que a superação dos precedentes, ou overruling, embora
acessível às Cortes dos Estados Unidos, permaneça a ser pouco praticada naquele país” (A jurisprudência
como fonte do direito: a experiência anglo-americana. Revista de Direito Constitucional e Internacional, p. 284).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 55
4.3.1 Distinguishing
O distinguishing é o meio mais comum de se afastar um precedente. Para a sua
utilização será necessário adentrar na ratio decidendi do precedente e vislumbrar que
os fatos fundamentais do primeiro julgamento não coincidem com os fatos fundamen-
tais daquele que será julgado. E assim, por não fazerem parte da mesma categoria,
não se torna obrigatória a mesma resposta judicial.
Nogueira54 leciona que o distinguishing “permite a desvinculação de um caso
concreto de um precedente aparentemente aplicável a ele”.
Na teoria do stare decisis é a técnica do distinguishing que faz o papel de apon-
tar as diferenças entre o caso em julgamento e aquele já julgado. Através dela são
analisadas as similitudes e diferenças entre os fatos do precedente e do caso que
está em julgamento.
No distinguishing o julgador faz a distinção de dois casos aparentemente seme
lhantes, constatando que a substância dos fatos são fundamentalmente distintas
— não se coadunando a ratio decidendi de um com a do outro.55
4.3.2 Overrulling
O overrulling é o fenômeno de superação de um precedente. Através deste fenô-
meno o precedente deixa de ser vinculante. Cabe destacar que esta superação, não
significa que ele perderá a sua força persuasiva, podendo ser utilizado como dictum.56
Não se deve, todavia, perder de vista que a força dos precedentes serve exa-
tamente para manter a previsibilidade e a segurança jurídica, motes indispensáveis
para a paz social. Desse modo, é excepcional a superação de um precedente; para
que ocorra deverá haver uma exaustiva motivação.
“Na concepção de um investigador do civil law, pode-se dizer que os precedentes
do common law atuam como normas reguladoras das condutas sociais, e a negação
54
Jurisprudência vinculante no direito norte-americano e no direito brasileiro. Revista de Processo, p. 161.
55
Mcleod (1996) citado por Souza fornece exemplo apropriado de distinguishing. “Em Brigdes v. Hawkesworth
(1985) LJ 21 QB 75, a um consumidor foi reconhecido o Direito de guardar o dinheiro que ele encontrou no
chão de uma loja. Diferentemente, em South Staffordshire Company v. Sharwood (1896) 2 QB 44, a uma
pessoa que encontrou dois anéis de outro na lama do fundo de um reservatório de água não foi reconhecido
o direito de retê-los, porque o lugar em que os achou não estava aberto ao público” (SOUZA. Do precedente
judicial à súmula vinculante, p. 143).
56
As suas ideias poderão ser analisadas de forma complementar para a elaboração de um novo precedente.
56 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
57
CARPENA. Os poderes do juiz no common law. Revista de Processo, p. 195.
58
Os poderes do juiz no common law. Revista de Processo, p. 195.
59
“De outro lado, os regimes jurisprudenciais existem na prática do direito, constituindo a legítima hermenêutica
do tribunal sobre o texto legal, da qual o destinatário da norma deve agir conforme o entendimento exposto (a
ratio decidendi também se dirige ao cidadão geral).
Porém, a instituição de um regime jurisprudencial é dotada de vigência aplicativa, a qual regula, até o tempo
em que for revisitada, o espectro da vida, o qual não pode ser desconstituído por decisão posterior. Nisso está
o fundamento de que a mudança de orientação jurisprudencial quanto ao regime a ser imposto aos destinatá-
rios apenas tem efeito ex nunc.
A coisa julgada, assim, não pode ser alterada ou desconstituída em razão de mudança do regime jurispruden-
cial, mesmo no ínterim do prazo da ação rescisória. Corrobora isso a Súmula 342 do STF, em que a tomada
de posição do magistrado frente a um dissídio jurisprudencial é protegida (vigência aplicativa, pois). O caso,
porém, comporta uma exceção.
Vez que a regra da coisa julgada se refere à segurança (decisão de mérito), ao Estado de Direito (competência)
e a proteção da legítima expectativa (confiança), a decisão que permanecer intocada pelo prazo de dois anos
é a mais legítima, dotada de vigência aplicativa não mais questionável” (ANJOS. A vigência aplicativa dos regi-
mes jurisprudenciais e a regra da coisa julgada. Revista de Processo, p. 160).
60
Verdade e método: traços, fundamentais de uma hermenêutica filosófica, p. 578.
61
A vigência aplicativa dos regimes jurisprudenciais e a regra da coisa julgada. Revista de Processo, p. 160.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 57
Acrescenta ainda que a igualdade não é violada, pois “é um mito a identidade entre
causas”. Prescreve o nominado jurista que: “não se fere a igualdade quando o juiz
retira um caso do espectro da jurisprudência dominante (hipótese normativa dela),
por possuir uma nota diversa do tipo”. E arremata dizendo ainda que “o princípio da
igualdade não pode ser óbice para a possibilidade de nova interpretação dos tribu-
nais, sendo hermeneuticamente possível que se dê tratamento diverso conforme a
tradição e os fatos em causa sejam diversos”.
A lógica é que a imposição de uma prática imutável da teoria do stare decisis
poderia criar situações de injustiça e também impedir a natural evolução do direito.
Exatamente com base neste raciocínio, o mais tradicional país aplicador do
stare decisis se rendeu a possibilidade de superação de precedente, como a promul-
gação do Practice Statement, em 1966.
Sobre este importante marco histórico, destaca-se o trecho abaixo:
“Na Inglaterra, em 1966, foi editado o Practice Statemente, que concedeu auto
rização para a House of Lords (Cada dos Lordes, a Suprema Corte inglesa) de não
aplicar o próprio precedente. O texto do Practice Statemente ressalta que ele não
prejudica a utilização dos precedentes, mas reconhece que ‘a adesão muito rígida
ao precedente pode conduzir à injustiça em um caso particular e também restringir a
evolução da lei’”.62
Nos Estados Unidos também há aplicação do overruling. Ensina Nogueira63 que
na Suprema Corte deste país a não adesão a um precedente ocorre quando “se trata
de interpretação de texto constitucional, que aliás é conhecido pela impressionante
concisão, o que dá uma maior margem de liberdade na sua interpretação, face a
existência de diversos conceitos jurídicos indeterminados”.
No prisma das Constituições escritas, que ao lado dos Estados Unidos se posi-
ciona o Brasil, com uma carta magna mais absolutamente detalhada que aquela, há
evidente espaço para mudança interpretativa ou mutação constitucional.
O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Eros Grau (2003), citado por
Nogueira,64 aponta brilhantemente que:
“A Constituição é a ordem jurídica fundamental de uma sociedade em um deter-
minado momento histórico e, como ela é um dinamismo, é contemporânea à realidade.
Quem escreveu o texto da Constituição não é o mesmo que o interpreta/aplica, que
o concretiza. Por isso podemos dizer que em verdade não existe a Constituição do
Brasil de 1988. Pois o que realmente hoje existe, aqui e agora, é a Constituição do Brasil,
tal como hoje, aqui e agora, está sendo interpretada/aplicada.”
Forçoso concluir que overruling está inteiramente atrelado a uma mudança de
prisma pelo qual o homem enxerga os fatos — em busca de um valor maior: a justiça.
62
NOGUEIRA. Jurisprudência vinculante no direito norte-americano e no direito brasileiro. Revista de Processo, p. 161.
63
Jurisprudência vinculante no direito norte-americano e no direito brasileiro. Revista de Processo, p. 101.
64
Jurisprudência vinculante no direito norte-americano e no direito brasileiro. Revista de Processo, p. 101.
58 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
Quando um tribunal superior conclui que certo precedente, embora antes vinculante,
não pode mais ser utilizado, exsurge a possibilidade, através do overruling, de os
juízes deixarem de aplicar o precedente, agora ultrapassado, e criarem um novo.
5 Precedentes no Brasil
5.1 Considerações iniciais
Existem apontadas pela doutrina duas famílias de direito no mundo ocidental: a
do common law e a do civil law. Só que estas famílias estão cada vez mais próximas,
verificando-se cada vez mais uma intromissão de uma em outra. Não é totalmente
ousado dizer que um dia não muito distante serão uma só.
“A aproximação das duas famílias é fato concreto hoje. A Inglaterra, por exem-
plo, famosa pelo direito não escrito, tem um Código de Processo Civil (LGL 1973/5)
desde 2000, e o Brasil também está sentindo os efeitos dessa aproximação, princi-
palmente através da importação de institutos jurídicos norte-americanos. Afirma José
Carlos Barbosa Moreira que ‘é quase impensável que algum país, voluntariamente
ou não, permaneça alheio à imponente presença econômica, política, e cultural dos
Estados Unidos, seja qual for o juízo de valor que cada um de nós venha a formular
ao propósito”.65
Historicamente ainda existem pontos de distinção entre elas que devem ser
realçados a fim de lograr êxito em alcançar uma perspectiva técnica importante
na aplicação dos precedentes, sobretudo na família do civil law, da escola romana
germânica.
“Mostra-se absolutamente claro que, sob a ótica de divisão de sistemas jurídi-
cos mundiais, tem-se verificado uma separação realizada pela doutrina e pela acade-
mia, entre aquele de origem romano-germânica, que se denomina, em língua inglesa,
civil law, e outro, de origem anglo-saxã, chamado common law.
De fato, há uma tranquila convergência científica no sentido de se definirem
esses dois sistemas principais do mundo, contrapondo-os com base na forma como
elegem suas fontes primárias.
Em geral e em análise apertada, tem-se compreendido o civil law como um siste-
ma jurídico que tem por fonte primária, ostentando posição de relevância como fonte
de solução de conflitos sociais, a lei, vale dizer, a norma jurídica escrita, positivada;
já por common law tem-se entendido o sistema cujo elemento norteador, a base da
estrutura jurídica, são os casos julgados, isto é, as decisões proferidas, cujas solu-
ções empregadas se apresentam vinculantes, ou seja, têm de ser obrigatoriamente
observadas em julgamentos posteriores. [...]
65
Jurisprudência vinculante no direito norte-americano e no direito brasileiro. Revista de Processo, p. 101.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 59
66
CARPENA. Os poderes do juiz no common law. Revista de Processo, p. 195.
67
NOBRE JÚNIOR. O direito processual brasileiro e o efeito vinculante das decisões dos Tribunais Superiores.
Revista de Processo, p. 64.
60 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
68
Nobre Júnior, sobre os assentos em Portugal, esclarece: “Consoante Antonio Menezes Cordeiro, os assentos,
a bem da verdade, consistiam em proposições gerais e abstratas, cuja natureza era representativa de verda-
deiras normas jurídicas em sentido material, tanto que foram suscetíveis, durante a sua existência, encerrada
com o Dec.-Lei nº 329-A, de 12.12.1995, de revogação por leis posteriores e de declaração de inconstitucio-
nalidade mediante deliberação do Tribunal Constitucional” (O direito processual brasileiro e o efeito vinculante
das decisões dos Tribunais Superiores. Revista de Processo, p. 64).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 61
69
Acórdão nº 12.501, Rel. Min. Sepúlveda Pertence.
70
O procedimento é simples. Verificada, a instâncias do relator ou de alguma das partes interessadas, divergên-
cia de decisões tomadas por órgãos fracionários de uma mesma Corte, os autos serão remetidos ao Plenário,
ao qual caberá emitir a exegese a ser observada. Sendo o julgamento tomado pelo voto da maioria absoluta
dos membros da corte, passará a constituir objeto de súmula, criando precedente para que seja uniformizada
a jurisprudência de determinado tribunal (NOBRE JÚNIOR. O direito processual brasileiro e o efeito vinculante
das decisões dos Tribunais Superiores. Revista de Processo, p. 64).
71
Cláusulas gerais processuais. Revista de Processo, p. 69.
62 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
72
“Recentemente, relevantes modificações foram introduzidas no ordenamento jurídico brasileiro, com destaque
todo especial para as modificações ocorridas em torno do Código de Processo Civil (LGL 1973/5). Grande
parte destas alterações deu-se após a edição da EC nº 45, de 08.12.2004, que ficou conhecida como Reforma
do Poder Judiciário. Dentre suas inovações podemos destacar a súmula vinculante, prevista no art. 103-A da
CF/1988 (LGL 1988/3), regulamentada pela Lei nº 11.417/2006.
Além da súmula vinculante, hoje a doutrina processual vem se debruçando sobre os chamados precedentes
judiciais e a sua atual importância para o aperfeiçoamento do sistema processual, principalmente em razão de
suas finalidades: segurança jurídica e previsibilidade. Tanto é que o Projeto do Novo Código de Processo Civil
(LGL 1973/5) (PLC nº 8.046/2010), em diversos dispositivos, demonstra sua preocupação com os preceden-
tes judiciais, principalmente dos Tribunais Superiores.
Assim, o objetivo do presente estudo é tratar tanto da súmula vinculante como do precedente judicial, apon-
tando suas características e suas diferenças, já que comumente encontramos afirmações de que a súmula
vinculante é produto da common law, ou seja, resultado da influência dos precedentes, o que, conforme ire-
mos apontar, não é verdadeiro” (CARREIRA. Algumas questões a respeito da súmula vinculante e precedentes
judicial. Revista de Processo, p. 213).
73
Vinculante versus precedentes: notas para evitar alguns enganos. Revista de Processo, p. 289.
74
Algumas questões a respeito da súmula vinculante e precedentes judicial. Revista de Processo, p. 213.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 63
Streck75 diz que um precedente não cabe num enunciado. E critica a forma com
que foi introduzida a súmula vinculante no Brasil, dizendo que esta técnica vinculativa
através das referidas súmulas não se equipara à dos precedentes. Diz Streck76 que
existe uma diferença entre o “que é precedente no common law e o que pensa que
é um precedente no direito brasileiro. Nos Estados Unidos, precedente tem ‘nome
e sobrenome’; aqui, uma súmula (para falar apenas em um ‘tipo’ de ‘precedente’)
possui apenas um número”. Diz ainda que o precedente lá serve para resolver casos
passados: aqui, tem a pretensão de abarcar todos os casos futuros — “aliás, uma
súmula é feita exatamente para esse fim”.
A argumentação de Streck parte do princípio que a aplicação da súmula mantém
a operacionalização do direito sob uma ultrapassada ótica dedutiva, que busca o
encaixe da situação fática, via subsunção, numa plataforma pré-estabelecida, o que,
via de regra, sacrifica o caso concreto, pois serão confinadas a um espaço de sentido
previamente delimitado pelo enunciado genérico das súmulas.
Reflete Streck:77
“Esclarecendo melhor esse ponto: venho insistindo há muito tempo que texto e
norma não são colados, nem cindidos. A questão de direito, que surge do julgamento
anterior (ou da cadeia de julgamentos), será sempre uma questão de fato e vice-
versa. Por isso — e nisso reside o equívoco de setores da doutrina — é impossível
transformar uma súmula em um ‘texto universalizante’. Insisto: isso seria voltar à
filosofia clássica-essencialista. É preciso entender que a ‘aplicação’ de uma súmula
não pode ser feita a partir de um procedimento dedutivo. Que as súmulas são textos,
não há dúvida. Só que ‘esse texto’ não é uma proposição assertórica. Portanto, não
pode ser aplicada de forma irrestrita e por mera subsunção ou por dedução. No para-
digma filosófico em que nos encontramos, é equivocado falar ainda em subsunção,
indução ou dedução. [...]
Insisto: o precedente não cabe na sumula. Como resolveríamos o caso de apli-
cação de uma súmula que estabelecesse, hipoteticamente, a exemplo de um julgado
recente do TRF 4ª Reg. (Processo 2003.72.05.000103-2), que ‘o colarinho faz parte
do conteúdo do chope’? Qual é o tamanho do colarinho? Quantos centímetros de es-
puma são possíveis? E mesmo que se fizesse um adendo à (essa hipotética) súmula,
especificando que o colarinho somente poderá ser de um centímetro (ou dois...),
ainda assim teríamos problemas com o tamanho e a largura do copo... E quanto
tempo o chope deverá ficar em repouso? De que modo a dogmática jurídica resolveria
tais impasses interpretativos? Mas, haveria impasses? Quais? Afinal, enunciados
75
Súmulas vinculantes em Terrae Brasilis: necessitamos de uma “Teoria para elaboração de precedentes”?.
Revista Brasileira de Ciências Criminais, p. 284.
76
No prefácio da obra de Maurício Ramires, Crítica à aplicação de precedentes no direito brasileiro.
77
Súmulas vinculantes em Terrae Brasilis: necessitamos de uma “Teoria para elaboração de precedentes”?.
Revista Brasileira de Ciências Criminais, p. 284.
64 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
como ‘o colarinho faz parte do chope’ ou, a contrario sensu, ‘o chope sem colarinho
não é chope’, não são claros, precisos? Não é isso que a doutrina — que acredita
em isomorfia entre texto e realidade — deseja para o direito? Não querem clareza e
precisão?
Ora, aqui voltamos, inexoravelmente, à questão fulcral: o ‘precedente’ não cabe
no enunciado! As palavras de uma proposição jurídica (ou qualquer outra) não são
claras e nem obscuras, precisas ou ambíguas, etc. Dito de outro modo — e levando
em conta as ‘especificidades’ da hipotética súmula acerca do colarinho do chope
— somente a construção de significados (atribuição de sentidos) a esses signifi-
cantes é que permitirá que se evite abusos por parte dos comerciantes vendedores
de chope. Não haverá (assim como não há) um significado de colarinho em si. Não
há qualquer relação ontológica (no sentido clássico) entre a quantidade permitida
de espuma e a essência da coisa designada. No enunciado ‘o colarinho faz parte do
chope’, não estão contidas as essências de todos os chopes com colarinho do mundo
(sic). Hermeneuticamente, a integridade e a coerência do direito exigirão ao que as
decisões acerca da matéria contenham uma espécie de ‘sentido comum’ (tradição
autêntica no sentido gadameriano da palavra) acerca do significado do ‘colarinho’,
independentemente do tamanho do copo e do tempo de repouso do copo. Na ver-
dade, para que uma súmula possa ser editada, haverá uma sucessão de casos, que,
reconstruídos, darão azo a uma ‘coagulação de sentido’ (é isso que é uma súmula
vinculante, em síntese)”.
Já foi visto aqui que para a utilização da técnica dos precedentes, e que este
possa exercer a sua força vinculativa, mister se faz identificar a ratio decidendi do
julgado. Numa súmula vinculante, que possui um nível de abstração bem maior que
uma decisão judicial, sem se remeter a um caso concreto,78 pode-se dizer que locali-
zar a ratio decidendi seria uma missão quase impossível (para não dizer impossível).
Por tal razão, perfilha-se aqui que as súmulas vinculantes não podem ser equiparadas
a um precedente.
Da mesma forma que as súmulas vinculantes, a jurisprudência também não é
tecnicamente um precedente. Esta constatação se evidencia, ainda, da força interativa
entre o precedente e o caso concreto a ele correlativo.
Aponta Taruffo79 existirem diversas diferenças entre os citados institutos. Destaca
o grande processualista que quando se fala em jurisprudência se faz normalmente
78
Há mais um aspecto, talvez menos evidente, mas não menos relevante, sobre o qual a referência ao precedente
influi na estrutura da argumentação jurídica. Ele relaciona-se à circunstância de que, como o precedente é
sempre uma decisão relativa a um caso particular, é necessário que o significado da regra jurídica, usada como
critério de decisão, venha “concretizada” para relacioná-lo à solução do caso particular: não se compreende o
precedente se a interpretação da norma que nele foi aplicada não vem conexa diretamente como a fattispecie
concreta que foi decidida (Precedente e jurisprudência. Revista de Processo, p. 139).
79
Precedente e jurisprudência. Revista de Processo, p. 139.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 65
80
Análise da Aplicação do art. 285-A, do Código de Processo Civil. Revista de Processo, p. 341.
66 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
“O regramento instituído pelo art. 285-A do CPC (LGL 1973/5) está em consonân-
cia como outros dispositivos reformadores que, da mesma forma, pretendem atribuir
uma maior celeridade e efetividade aos feitos, instituindo procedimentos para decisões
uniformes a processos repetitivos. São exemplos desta tendência os arts. 475, §3º,
518, §1º, 515, §3º, 543-A, 557, §1º-A, entre outros. [...]
A esse respeito, ressalte-se que, ao tomar conhecimento de precedentes con-
sonantes de Juízos de determinada Comarca, e vislumbrando a possibilidade de sen-
tenciamento liminar de sua demanda, pode o autor, já na petição inicial, demonstrar
as dessemelhanças entre seu caso e tais precedentes. Caso não o faça, terá oportu-
nidade para tecer tais argumentos em sede de recurso de apelação. [...]
A expressão ‘casos idênticos’, s.m.j, deve ser entendida como coincidência de
teses jurídicas (questões de direito) e circunstâncias fáticas entre a nova demanda
ora sub judice e as demandas julgadas anteriormente no Juízo e que receberam sen-
tença de improcedência. A prevalência da coincidência deve se dar, cem por cento,
em relação às questões predominantemente de direito de uma e outra causa.”
Wambier, Alvim e Medina81 (2006) deixam claro que para a aplicação da norma
do art. 285-A do CPC (LGL 1973/5) em compasso à aplicação do mecanismo do stare
decisis com o fito de conceder força vinculante ao precedente (com ênfase na neces-
sidade de o julgado se coadunar com o entendimento de tribunal superior), caberá ao
julgador o mister de identificar no julgado a sua ratio decidendi. Afirmam:
“De fato, a correta exegese do art. 285-A deve levar em conta a orientação da
jurisprudência dos Tribunais Superiores (STF e STJ), no sentido de que não deverá ser
utilizado o art. 285-A se o entendimento do magistrado colidir com o entendimento
desses Tribunais. Em realidade, se a hipótese de que já há decisões no juízo não
colidir com o entendimento de Tribunal Superior, em tal situação configura-se o qua-
dro para o juiz aplicar a norma. Se se configurar esse quadro, a aplicação revelar-se-á
funcional; do contrário, a aplicação, ao invés de facilitar, complicará o processo, e o
objetivo da norma é facilitar as hipóteses que se coloquem ao juízo como pacíficas,
mas sem colisão com jurisprudência existente. A identificação de que ‘casos idênti-
cos’ poderão servir-se, senão deverão servir-se, das noções de ratio decidendi e obter
dicta. Ratio decidendi diz respeito à essência de um litígio, que, no caso, será igual
ao outro. E, obter dicta é o que possa constar de uma decisão, mas que não se terá
colocado como necessário para decidi-la. Essas duas noções podem ser úteis porque,
certamente — conquanto se reputem casos idênticos — não haverá uma essência
dessa argumentação que se projetará nas decisões (ratio decidendi), e haverá parte
dessa argumentação que se evidenciará como desnecessária. Curialmente, não se
trata de hipótese de causas idênticas (inaplicável o art. 301, §2º), mas de causas em
81
Apud SILVA. Análise da aplicação do art. 285-A, do Código de Processo Civil. Revista de Processo, p. 341.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 67
82
Recursos especiais repetitivos: recursos fundados em idêntica questão de direito no âmbito do Superior
Tribunal de Justiça. Revista de Processo, p. 164.
83
Apud RAMIRES. Crítica à aplicação de precedentes no direito brasileiro, p. 71.
68 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
84
Recursos repetitivos: realização integral da finalidade do novo sistema impõe mais do que a paralisação dos
recursos especiais que estão no 2º grau. Revista de Processo, p. 188.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 69
85
Disponível em: <http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf>. Acesso em: 13 fev. 2012.
86
Disponível em: <http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf>. Acesso em: 10 dez. 2012.
87
Adiante consta na Exposição de Motivos que: “Proporcionar legislativamente melhores condições para ope-
racionalizar formas de uniformização do entendimento dos Tribunais brasileiros acerca de teses jurídicas é
concretizar, na vida da sociedade brasileira, o princípio constitucional da isonomia.
Criaram-se figuras, no novo CPC, para evitar a dispersão.
Dentre esses instrumentos, está a complementação e o reforço da eficiência do regime de julgamento de re-
cursos repetitivos, que agora abrange a possibilidade de suspensão do procedimento das demais ações, tanto
70 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
6 Conclusão
Através deste trabalho pretendeu-se buscar a conformação da teoria dos prece-
dentes, partindo de um enfoque nas suas origens na Inglaterra, até como hoje é tratada
pelo direito brasileiro. Através das pesquisas, foi compreendido ser imprescindível
o domínio do conceito do que seja a ratio decidendi, pois um dos requisitos para a
vinculação de um precedente a outro caso, é que encontre o operador do direito em
ambos a mesma razão de decidir.
Viu-se que, no Brasil, há certa confusão e incerteza sobre a utilização dos pre-
cedentes, diante da implantação das súmulas vinculantes, bem como da força das
orientações jurisprudenciais, uma vez que o método e a técnica de operacionalização
destes institutos não envolvem um aprofundamento nas nuanças do caso concreto,
em que muitas vezes está situada a ratio decidendi.
No entanto, percebeu-se que existe no ordenamento processual figuras típicas
que permitem a utilização da regra do stare decisis (vinculação dos precedentes), tais
como as do artigo 285-A e 543-C do Código de Processo Civil.
no juízo de primeiro grau, quanto dos demais recursos extraordinários ou especiais, que estejam tramitando
nos tribunais superiores, aguardando julgamento, desatreladamente dos afetados.
Com os mesmos objetivos, criou-se, com inspiração no direito alemão, o já referido incidente de Resolução
de Demandas Repetitivas, que consiste na identificação de processos que contenham a mesma questão de
direito, que estejam ainda no primeiro grau de jurisdição, para decisão conjunta.
O incidente de resolução de demandas repetitivas é admissível quando identificada, em primeiro grau, con-
trovérsia com potencial de gerar multiplicação expressiva de demandas e o correlato risco da coexistência de
decisões conflitantes.
É instaurado perante o Tribunal local, por iniciativa do juiz, do MP, das partes, da Defensoria Pública ou pelo
próprio Relator. O juízo de admissibilidade e de mérito caberá ao tribunal pleno ou ao órgão especial, onde
houver, e a extensão da eficácia da decisão acerca da tese jurídica limita-se à área de competência territorial
do tribunal, salvo decisão em contrário do STF ou dos Tribunais superiores, pleiteada pelas partes, interessa-
dos, MP ou Defensoria Pública. Há a possibilidade de intervenção de amicus curiae.
O incidente deve ser julgado no prazo de seis meses, tendo preferência sobre os demais feitos, salvo os que
envolvam réu preso ou pedido de habeas corpus.
O recurso especial e o recurso extraordinário, eventualmente interpostos da decisão do incidente, têm efeito
suspensivo e se considera presumida a repercussão geral, de questão constitucional eventualmente discutida.
Enfim, não observada a tese firmada, caberá reclamação ao tribunal competente.”
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 71
Abstract: The ratio decidendi of judicial precedents. This work focuses on primary purpose to describe
the importance of the ratio decidendi for proper operation of the technique of binding precedent, which
has been introduced in the Brazilian procedural law in face of an ever greater between the legal system of
common law and civil law. The survey shows that in order to identify the ratio decidendi of a precedent for
the need to enter the case on trial, and that this requirement away from the condition precedent certain
institutions, such as bindind docket and jurisprudential guideless, so considered by doctrine homeland.
Key works: Ratio decidendi. Stare decisis. Binding precedent. Common law.
Referências
ABBOUD, Georges. Súmula vinculante versus precedentes: notas para evitar alguns enganos. Revista
de Processo, São Paulo, v. 33, n. 165, p. 218-230, nov. 2008.
ANJOS, Pedro Germano dos. A vigência aplicativa dos regimes jurisprudenciais e a regra da coisa
julgada. Revista de Processo, São Paulo, v. 35, n. 187, p. 160-180, set. 2010.
CARPENA, Márcio Louzada. Os poderes do juiz no common law. Revista de Processo, São Paulo, v. 35,
n. 180, p. 195-220, fev. 2010.
CARREIRA, Guilherme Sarri. Algumas questões a respeito da súmula vinculante e precedentes judicial.
Revista de Processo, São Paulo, v. 36, n. 199, p. 213-245, set. 2011.
CERVO, Amado Luiz. Metodologia científica: para uso dos estudantes universitários. 3. ed. São Paulo:
McGraw-Hill, 1983.
CORTÊS, Osmar Mendes. Súmula vinculante e segurança jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2008.
COTRIM, Gilberto. História global: Brasil e geral. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1998.
DIDIER JÚNIOR, Fredie. Cláusulas gerais processuais. Revista de Processo, São Paulo, v. 35, n. 187,
p. 69-83, set. 2010.
GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método: traços, fundamentais de uma hermenêutica filosófica.
Tradução de Flávio Paulo Meurer. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1999. v. 1.
GARAPON, Antoine; PAPAPOULOS, Ioaniss. Julgar nos Estados Unidos e na França: cultura jurídica
francesa e common law e uma perspectiva comparada. Tradução de Regina Vasconcelos. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2008.
GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1999.
GORON, Lívio Goellner. A jurisprudência como fonte do direito: a experiência anglo-americana. Revista
de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo, v. 12, n. 47, p. 284-295, abr./jun. 2004.
72 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014
HARDT, Michael; NEGRI, Antonio. Multidão: guerra e democracia na era do Império. Tradução de Clóvis
Marques. Rio de Janeiro: Record, 2005.
LIMA, Leonardo D. Moreira. Stare decisis e súmula vinculante: um estudo comparado. Disponível em:
<http://shere.rdc.puc-rio.br>. Acesso em: 12 jan. 2012.
MARINONI, Luiz Guilherme Marinoni. Precedentes obrigatórios. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
MORIN, Edgar. O método. Tradução de Juremir Machado da Silva. Porto Alegre: Sulina, 2005. v. 6 - Ética.
NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. O direito processual brasileiro e o efeito vinculante das decisões
dos Tribunais Superiores. Revista de Processo, São Paulo, v. 27, n. 105, p. 64-95, jan./mar. 2002.
NOGUEIRA, Gustavo Santana. Jurisprudência vinculante no direito norte-americano e no direito brasileiro.
Revista de Processo, São Paulo, v. 33, n. 161, p. 101-114, jul. 2008.
NOGUEIRA, Gustavo Santana. Stare decisis et non quieta movere: a vinculação aos precedentes no
direito comparado e brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
OLIPHANT, Herman. Return to stare decisis. 14 American Bar Association Journal – ABAJ, p. 71-77,
1928.
PORTO, Sérgio Gilberto. Civil Law e Common Law: precedente vinculante: estudo em homenagem ao
Professor Egas Dirceu Moniz de Aragão. Disponível em: <www.abdcp.org.br>. Acesso em: 15 jan. 2012.
RAMIRES, Mauricio. Crítica à aplicação de precedentes no direito brasileiro. Porto Alegre: Livr. do
Advogado, 2010.
SANTOS, Ramom Ouais. Teoria dos capítulos de sentença, à luz das técnicas de jurisdição constitu-
cional. Revista de Processo, São Paulo, v. 35, n. 184, p. 42-66, jun. 2010.
SILVA, Eider Avelino. Análise da aplicação do art. 285-A, do Código de Processo Civil. Revista de
Processo, São Paulo, v. 36, n. 195, p. 341, maio 2011.
SOUZA, Marcelo Alves Dias de. Do precedente judicial à súmula vinculante. Curitiba: Juruá, 2011.
STRECK, Lenio Luiz. Súmulas vinculantes em Terrae Brasilis: necessitamos de uma “Teoria para
elaboração de precedentes”?. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 78, 2009.
TARUFFO, Michele. Precedente e jurisprudência. Revista de Processo, São Paulo, v. 36, n. 199,
p. 139-155, set. 2011.
TEIXEIRA, Rodrigo Valente Giublin. Recursos especiais repetitivos: recursos fundados em idêntica
questão de direito no âmbito do Superior Tribunal de Justiça. Revista de Processo, São Paulo, v. 36,
n. 191, p. 161-186, jan. 2011.
TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do direito. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2004.
WAMBIER, Teresa Arruda; MEDEIROS, Maria Lúcia Lins Conceição de. Recursos repetitivos: realização
integral da finalidade do novo sistema impõe mais do que a paralisação dos recursos especiais que
estão no 2º grau. Revista de Processo, São Paulo, v. 36, n. 191, p. 187-197, jan. 2011.
SOARES, Marcos José Porto. A ratio decidendi dos precedentes judiciais. Revista
Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73,
jan./mar. 2014.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 39-73, jan./mar. 2014 73
Resumo: Trata da cooperação no processo civil, abordada em inúmeros dispositivos do projeto do novo
Código de Processo Civil. Estabelece a influência do formalismo-valorativo — nova fase metodológica do
processo civil — na lapidação da colaboração. Busca fundamentos para a implementação do processo civil
cooperativo, notadamente no tocante ao reforço das posições jurídicas das partes e à paridade do juiz na
condução do processo. Reflete sobre a importância de uma nova roupagem ao princípio do contraditório e
ao da democracia, com vistas a realizar de forma plena a colaboração. Averigua um modelo de contraditório
como direito de influência e de democracia deliberativa aplicada ao processo civil, com vistas a possibilitar
uma maior participação das partes no deslinde processual e na formação da decisão judicial. Analisa o
impacto da cooperação no projeto do novo Código de Processo Civil e reflete sobre os desafios dessa nova
empreitada na seara processual.
Palavras-chave: Colaboração no processo civil. Democracia deliberativa. Contraditório.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014 75
Tanto las reglas como los principios son normas porque ambos dicen lo
que debe ser. Ambos pueden ser formulados con la ayuda de las expre
siones deónticas básicas del mandato, la permisión y la prohibición. Los
principios, al igual que las reglas, son razones para juicios concretos de
deber ser, aun cuando sean razones de un tipo muy diferente. La dis
tinción entre reglas y principios es pues una distinción entre dos tipos de
normas. (ALEXY, 1997, p. 83)
76 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014 77
78 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014 79
80 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014
prejuízos, eis que este direito passa a ser exercido no afã de buscar integrar a parte
em um procedimento que assegure efetiva participação.
O sentido da palavra influência nesse novo matiz conceitual do contraditório é
bem definido por Cabral (op. cit., p. 114):
O juiz adota uma postura que se coaduna com o modelo cooperativo de orga-
nização social e com a lógica argumentativa de resolução de conflitos, pois não é
apenas a sua conduta que sempre determinará o comportamento dos demais sujei-
tos, estando também aberto aos atos estimulantes das partes. Portanto, as partes
passam a exercer atos de poder e influência dentro do processo.
Além do mais, até mesmo no momento da decisão o magistrado é diretamente
influenciado pelo que foi dito, produzido, argumentado e praticado pelas partes, fru-
tos do diálogo judicial em contraditório como direito de influência.
Importante ressaltar que estes atos estimulantes dotados de poder e influên-
cia devem ser praticados também pelo juiz na condução do processo, ou seja, os
atos praticados pelo juiz também devem influenciar diretamente a postura das partes
posteriormente, pois todos os sujeitos do processo passam a ser condicionados
pelos atos dos demais, indistintamente. É uma via de mão dupla, onde impera a
cooperação.
Salienta-se que o contraditório como direito de influência deve ser acompa-
nhado de inúmeros deveres de natureza ética, pois a influência não pode caminhar
desenfreada. “Preza-se, ao contrário, a solidariedade, sem que a vitória tenha que
prevalecer a qualquer preço” (CABRAL, op. cit., p. 211).
Habermas ensina com maestria que o procedimento democrático não pode ali-
mentar atitudes violentas. Em outras palavras, para o melhor andamento do processo
em colaboração, não basta que sejam assegurados e observados meios e instrumen-
tos de influenciar a decisão judicial, sendo imperioso que ao lado do procedimento
caminhem deveres de lealdade, transparência e retidão:
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014 81
82 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014 83
Percebe-se então que a democracia representativa não foi e não está sendo
suficiente para manter o cidadão efetivamente partícipe na sociedade, haja vista
que os indivíduos permaneceram súditos, “antes subordinados ao príncipe, depois
à assembleia, mas de toda sorte distantes do efetivo processo de produção das
normas jurídicas” (CABRAL, op. cit., p. 107).
Destarte, só é possível a inserção da parte na decisão judicial, se o Estado-juiz
não simplesmente escancarar a decisão aos cidadãos, porque detém algum poder
para isso, mas, ao contrário, deve promover a participação dos sujeitos processuais
no procedimento que antecede a formação da decisão. Para tanto, a democracia deve
ser encarada com uma nova roupagem, qual seja a de uma democracia deliberativa,
viabilizado por meio do contraditório como direito de influência, que “permite a inte-
ração constante e recíproca entre os sujeitos participantes, franqueando a garantia
cidadã de participar da decisão estatal” (CABRAL, op. cit., p. 111).
1
Artigo 266º
Princípio da cooperação
1 - Na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias
partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio.
84 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014
2 - O juiz pode, em qualquer altura do processo, ouvir as partes, seus representantes ou mandatários judiciais,
convidando-os a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurem pertinen-
tes e dando-se conhecimento à outra parte dos resultados da diligência.
3 - As pessoas referidas no número anterior são obrigadas a comparecer sempre que para isso forem notifica-
das e a prestar os esclarecimentos que lhes forem pedidos, sem prejuízo do disposto no nº 3 do artigo 519º
4 - Sempre que alguma das partes alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informa-
ção que condicione o eficaz exercício de faculdade ou o cumprimento de ónus ou dever processuais, deve o
juiz, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo.
Artigo 266º-A
Dever de boa fé processual
As partes devem agir de boa fé e observar os deveres de cooperação resultantes do preceituado no artigo anterior.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014 85
Conclusão
Por processo cooperativo, deve-se ter a ideia de uma organização social baseada
na democracia, solidariedade e contraditório, sendo este o meio pelo qual se realiza a
cooperação e o diálogo no processo, o que implica deveres de conduta para as partes
e para o juiz. Nesse sentido, o juiz assume posição paritária na condução do processo
e assimétrico na decisão, além do que a verdade deve ser alcançada mediante tarefa
do juiz e das partes.
A democracia deliberativa proposta por Habermas, aplicada ao processo, con-
cretiza em grau elevado o princípio da democracia e do contraditório, levando-se em
conta as possibilidades jurídicas e fáticas, pois, por meio do contraditório como di-
reito de influência, as partes participam de forma mais ativa no deslinde do feito,
colaborando com o magistrado na condução do processo e no conteúdo da sentença.
O contraditório como direito de influência é instrumento de concretização da
democracia deliberativa no processo civil, dando ensejo à efetiva colaboração, uma
vez que permite a produção de atos estimulantes pelas partes e pelo juiz, atos estes
que influenciem reciprocamente as atitudes dos sujeitos processuais.
Por tudo o que foi exposto, com a nova fase metodológica do processo civil (for-
malismo-valorativo ou neoprocessualismo) e a cooperação no processo civil, calcada
na democracia deliberativa e no contraditório como direito de influência, percebe-se
uma aproximação substancial do juiz em relação às partes. Em contrapartida, é patente
o incremento da posição jurídica das partes no deslinde do feito.
O projeto do novo Código de Processo Civil caminhou bem ao prever inúmeros
dispositivos na linha da colaboração, contudo, a efetividade do processo civil coope-
rativo perpassa muito mais por uma mudança cultural do que propriamente pela codi-
ficação de deveres, direitos e poderes direcionados nesse sentido, motivo pelo qual
a implementação desse modelo não será feita de forma automática, com importação
de diplomas processuais de outros países.2
2
Teresa Arruda Alvim Wambier, no XXII encontro nacional do CONPEDI, ao responder uma pergunta minha sobre a
possibilidade de implantação da mediação feita na Inglaterra no Brasil, disse: “para importar as civil procedure
rules é necessário importar os ingleses também”.
86 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014
Cooperation in Civil Procedure – Equality Judge and the Parties Power within a New Conception of
Democracy and Contradictory
Abstract: This cooperation in civil proceedings, addressed numerous devices in the design of the new
Code of Civil Procedure. Establishes the influence of formalism-evaluative — new phase of civil procedure
methodological — the stoning of collaboration. Search foundations for the implementation of civil
cooperation, especially in playing the strengthening of the legal positions of the parties and the parity of
the judge in conducting the process. Reflects on the importance of a new look to the adversarial principle
and democracy, in order to perform in a full collaboration. Figuring out a model of how contradictory right
to influence and deliberative democracy applied to civil proceedings in order to enable greater participation
of the parties in disentangling procedural and training of the judicial decision. Analyzes the impact of
cooperation on the design of the new Civil Procedure Code and reflects on the challenges of this new
venture in the field of procedural law.
Referências
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales,
1997.
ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo. Tradução de Roberto Raposo. São Paulo: Companhia das
Letras, 2007.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 1º out. 2012.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014 87
BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Código de Processo Civil. Disponível em: <http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869compilada.htm>. Acesso em: 07 ago. 2013.
BRASIL. Projeto de Lei nº 8.046/2010. Novo Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.
camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=11D251880CEA6627F1BE9BE1CB
53B0E8.node1?codteor=831805&filename=PL+8046/2010>. Acesso em: 07 ago. 2013.
CABRAL, Antônio do Passo. Nulidades no processo moderno. São Paulo: Forense, 2009.
CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo: direitos fundamentais, políticas públicas
e protagonismo judiciário. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
GÓES, Gisele Santos Fernandes. Processo civil cooperativo. Revista da Escola Superior da Magistratura
do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, v. 5, n. 9, p. 111-116, nov. 2012. Disponível em: <http://
www.tjpa.jus.br/esm/rev_v5_n9.html>. Acesso em: 04 ago. 2013.
HABERMAS, Jüergen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1997. v. 1.
MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2009. (Coleção Temas Atuais de direito Processual Civil).
OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. Do formalismo no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2010.
PORTUGAL. Consolidação do Código de Processo Civil português. Disponível em: <http://www.dgpj.
mj.pt/sections/leis-da-justica/livro-iii-leis-civis-e/consolidacao-processo/codigo-de-processo-civil/>.
Acesso em: 07 ago. 2013.
ZANETI JUNIOR, Hermes. Processo constitucional: o modelo constitucional do processo civil brasileiro.
São Paulo: Lumem Juris, 1997.
88 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 75-88, jan./mar. 2014
Resumo: A responsabilidade civil do médico é tema relevante na sociedade moderna, tendo-se notado con-
siderável incremento nas demandas judiciais que versam sobre a questão. Com a crescente complexidade
nas relações de saúde, a prova da culpa médica em demandas judiciais é tarefa de fundamental impor-
tância, porém sempre difícil. Nesse ínterim, de interesse acadêmico é a análise das teorias que regem
a produção processual da prova da culpa médica, como os modos de distribuição do ônus da prova, sua
inversão e a teoria das cargas probatórias dinâmicas. Entre as formas jurídicas de abrandamento dos pres-
supostos da responsabilidade civil, enquadra-se, ainda, a teoria da perda de uma chance. Procurar-se-á
demonstrar que a teoria dinâmica amolda-se às tendências do processo atual, no intuito de se compartilhar
o encargo probatório entre os litigantes, a fim de que se adote uma postura ativa e participante na colheita
de provas, de forma bilateral e consentânea com os ditames da justiça material.
Palavras-chave: Responsabilidade civil. Culpa médica. Teorias da prova. Ônus da prova.
1 Introdução
Numerosas são as razões que motivaram a intensificação do interesse pelo estudo
da responsabilidade civil do médico. O desenvolvimento tecnológico, a publicidade e
a divulgação de resultados (especialmente na medicina estética) e a sociedade de
consumo são alguns dos fatores que contribuíram para o progressivo distanciamento
do médico de seu paciente; pode-se dizer, sem exagero, que até mesmo a denomina-
ção dos sujeitos da relação não é mais a mesma, tendo passado para prestador de
serviços e usuário, numa nítida tendência à transformação consumerista da outrora
personalíssima relação entre médico e paciente.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 89
90 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 91
92 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
de responsabilidade civil por erro médico é questão que, por suas peculiaridades
no caso concreto, merece detalhado debate. Porém, antes disso, importam breves
distinções entre as obrigações de meios e de resultados, cuja caracterização pode
influenciar a prova da culpa.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 93
1
“CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. [...] CIRURGIA PLÁSTICA ESTÉ
TICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. DANO COMPROVADO. PRESUNÇÃO DE CULPA DO MÉDICO NÃO AFASTADA.
PRECEDENTES. [...] 2. A obrigação assumida pelo médico, normalmente, é obrigação de meios, posto que
objeto do contrato estabelecido com o paciente não é a cura assegurada, mas sim o compromisso do profis-
sional no sentido de um prestação de cuidados precisos e em consonância com a ciência médica na busca
pela cura. 3. Apesar de abalizada doutrina em sentido contrário, este Superior Tribunal de Justiça tem enten-
dido que a situação é distinta, todavia, quando o médico se compromete com o paciente a alcançar um deter-
minado resultado, o que ocorre no caso da cirurgia plástica meramente estética. Nesta hipótese, segundo o
entendimento nesta Corte Superior, o que se tem é uma obrigação de resultados e não de meios. 4. No caso
das obrigações de meio, à vítima incumbe, mais do que demonstrar o dano, provar que este decorreu de culpa
por parte do médico. Já nas obrigações de resultado, como a que serviu de origem à controvérsia, basta que
a vítima demonstre, como fez, o dano (que o médico não alcançou o resultado prometido e contratado) para
que a culpa se presuma, havendo, destarte, a inversão do ônus da prova. 5. Não se priva, assim, o médico
da possibilidade de demonstrar, pelos meios de prova admissíveis, que o evento danoso tenha decorrido, por
exemplo, de motivo de força maior, caso fortuito ou mesmo de culpa exclusiva da ‘vítima’ (paciente)” (STJ.
REsp nº 236.708/MG. 4ª Turma. Rel. Carlos Fernando Mathias. Publ. 18.05.2009).
94 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
2
CIRURGIA ESTÉTICA. INDENIZAÇÃO. QUELOIDES. Trata-se, na origem, de ação de indenização por danos morais
e estéticos, ajuizada pela ora recorrente contra o recorrido, na qual alega que foi submetida a uma cirurgia
estética (mamoplastia de aumento e lipoaspiração), que resultou em grandes lesões proliferativas — formadas
por tecidos de cicatrização — nos locais em que ocorreram os cortes da operação. Ora, o fato de a obrigação
ser de resultado, como o caso de cirurgia plástica de cunho exclusivamente embelezador, não torna objetiva a
responsabilidade do médico, ao contrário do que alega a recorrente. Permanece subjetiva a responsabilidade
do profissional de Medicina, mas se transfere para o médico o ônus de demonstrar que os eventos danosos
decorreram de fatores alheios à sua atuação durante a cirurgia. Assim, conforme o acórdão recorrido, o laudo
pericial é suficientemente seguro para afirmar a ausência de qualquer negligência do cirurgião. Ele não poderia
prever ou evitar as intercorrências registradas no processo de cicatrização da recorrente. Assim, não é possível
pretender imputar ao recorrido a responsabilidade pelo surgimento de um evento absolutamente casual, para o
qual não contribuiu. A formação do chamado queloide decorreu de característica pessoal da recorrente, e não
da má atuação do recorrido (STJ. REsp 1.180.815/MG. Rel. Min. Nancy Andrighi. Julg. 19.08.2010).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 95
96 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
3
“[...] Não se desconhece que as normas relativas ao ônus da prova constituem, também, regra de julga-
mento para se evitar o non liquet do Direito Romano, pois as consequências da não-comprovação de fato
ou circunstância relevante para o julgamento da causa devem, quando da decisão, ser atribuídas à parte a
quem incumbia o ônus da sua prova. É este um dos aspectos relevantes da distribuição do ônus da prova.
Trata-se do aspecto objetivo, dirigido ao juiz. [...]” (STJ. REsp nº 802.832/MG. Voto do Ministro Paulo de Tarso
Sanseverino. Julg. 09.02.2011).
“O juiz somente utilizará as normas de distribuição do ônus da prova quando o produto da atividade de instru-
ção se revela insuficiente para formar no espírito do julgador uma convicção razoavelmente sólida a respeito
dos fatos” (TJRS, 13ª CC., Ap. Civ. nº 70003044039, Rel. Des. Sérgio Luiz Grassi Beck, ac. 20.12.2005, DJ,
04 jan. 2006).
4
A expressão latina non liquet é uma abreviatura da frase iuravi mihi non liquere, atque ita iudicatu illo solutus
sum, cujo significado é: jurei que o caso não estava claro o suficiente e, em consequência, fiquei livre daquele
julgamento. Ao declarar o non liquet, o juiz romano se eximia da obrigação de julgar os casos nos quais a
resposta jurídica não era tão nítida. Na atual fase de evolução do direito, vigora a regra da proibição do non
liquet, ou seja, os juízes devem julgar todos os conflitos que lhes são submetidos.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 97
fatos, sendo a cooperação das partes dispensável, sequer havendo como sancioná-las
pela omissão de provar.
Embora nosso sistema processual seja predominantemente influenciado pelo
princípio dispositivo, há momentos processuais “pincelados” pelo domínio do prin-
cípio inquisitivo, como é o caso da chamada regra do diálogo, inerente à garantia
constitucional do contraditório em sua feição moderna; tal regra integra o modelo
cooperativo de processo e preconiza que o juiz deve esclarecer as partes sobre os
rumos da instrução probatória, conclamando-as a complementar ou a produzir provas.
5 As teorias da prova
5.1 A teoria estática da distribuição do ônus da prova
O precitado artigo 333 do Código de Processo Civil trata da distribuição do ônus
da prova e traz ao texto legal a teoria estática: o sistema de partilha desse ônus
no âmbito do Código é, predominantemente, rígido, estático. É o sistema do direito
positivo, a chamada divisão do ônus estático da prova.
Cada parte tem o ônus de provar os pressupostos fáticos do direito que pretende
seja aplicado em seu favor: ao ônus de afirmar fatos, segue-se o de comprová-los.
Quando, na contestação, o réu nega o fato no qual se baseia a pretensão do autor,
todo o ônus da prova recai sobre este. E se o autor não produzir prova, o réu ganhará
a causa, mesmo sem também a ter produzido. Assim eram os adágios romanos:
actore non probante, reus absolvir 5 e allegatio et non probatio, quasi non allegatio.6
Mas se o réu utiliza defesa indireta, invocando outro fato capaz de modificar, extinguir
ou impedir o direito do autor, a regra se inverte: implicitamente o réu admitiu como
verídico o fato básico da petição inicial, que se torna incontroverso e não precisa mais
ser provado. A controvérsia desloca-se para o novo fato alegado, que deverá então
ser provado pelo réu.
A teoria estática não é suficiente para orientar o juiz na busca da certeza pos-
sível. A vida é muito mais rica que a imaginação do legislador e, por isso, não se
submete sempre às suas pretensões normativas. É possível, desde já, perceber que
a multiplicidade de experiências da vida cotidiana torna, em grande número de ca-
sos, impraticável a rígida separação de fatos constitutivos e extintivos de direito em
compartimentos estanques. O acesso à verdade real pode ser sacrificado por um
rigorismo formal e, em algumas situações concretas, a teoria estática será capaz
de propiciar julgamentos injustos, por estar albergada em critérios imutáveis e infle-
xíveis. Daí ter-se, modernamente, formado um entendimento segundo o qual, nas
5
Se o autor não prova o que alega, é o réu absolvido.
6
Quem alega e não prova, é tido como não tendo alegado.
98 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 99
Já a segunda teoria assenta que o juiz inverte o onus probandi para julgar e
fundamentar a decisão: somente após a instrução do feito, no momento da valoração
das provas, estará o juiz apto a afirmar se existe ou não situação de inversão do
ônus da prova. Havendo deficiência de provas, as regras sobre o ônus da prova serão
utilizadas para decidir a causa. Os adeptos dessa teoria preconizam que promover
a inversão em momento anterior seria o mesmo que proceder ao prejulgamento da
causa, o que é também inadmissível.
Há ainda autores que sugeriram uma terceira regra, de que a inversão se desse
ainda no despacho da petição inicial, quando requerida pelo consumidor. A doutrina
majoritária entende que, no despacho inicial, não há elementos suficientes para a
verificação dos requisitos da inversão, rejeitando tal teoria, pois ela traz uma precipi-
tação desnecessária e que poderia prejudicar o andamento ordenado do processo e
a efetivação de justiça.
Em recente julgado, emblemático no que tange à matéria ora em análise, deci
diu o STJ ser vedada ao juiz a inversão do ônus da prova na sentença, devendo a dina-
mização ser seguida de oportunidade para que a parte onerada possa se desincumbir
adequadamente de seu encargo.7
7
“INVERSÃO. ÔNUS. PROVA. CDC. Trata-se de REsp em que a controvérsia consiste em definir qual o momento
processual adequado para que o juiz, na responsabilidade por vício do produto (art. 18 do CDC), determine a
100 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do mesmo codex. No julgamento do especial, entre outras
considerações, observou o Min. Relator que a distribuição do ônus da prova apresenta extrema relevância de
ordem prática, norteando, como uma bússola, o comportamento processual das partes. Naturalmente, parti-
cipará da instrução probatória com maior vigor, intensidade e interesse a parte sobre a qual recai o encargo
probatório de determinado fato controvertido no processo. Dessarte, consignou que, influindo a distribuição
do encargo probatório decisivamente na conduta processual das partes, devem elas possuir a exata ciência
do ônus atribuído a cada uma delas para que possam produzir oportunamente as provas que entenderem
necessárias. Ao contrário, permitida a distribuição ou a inversão do ônus probatório na sentença e inexistindo,
com isso, a necessária certeza processual, haverá o risco de o julgamento ser proferido sob uma deficiente e
desinteressada instrução probatória, na qual ambas as partes tenham atuado com base na confiança de que
sobre elas não recairia o encargo da prova de determinado fato. Assim, entendeu que a inversão ope judicis
do ônus da prova deve ocorrer preferencialmente no despacho saneador, ocasião em que o juiz decidirá as
questões processuais pendentes e determinará as provas a serem produzidas, designando audiência de ins-
trução e julgamento (art. 331, §§2º e 3º, do CPC). Desse modo, confere-se maior certeza às partes referente
aos seus encargos processuais, evitando a insegurança. Com esse entendimento, a Seção, ao prosseguir o
julgamento, por maioria, negou provimento ao recurso, mantendo o acórdão que desconstituiu a sentença,
a qual determinara, nela própria, a inversão do ônus da prova. Precedentes citados: REsp 720.930/RS, DJe
09.11.2009, e REsp 881.651/BA, DJ 21.05.2007” (STJ, REsp nº 802.832/MG, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino. Julg. 13.04.2011. Informativo, n. 0469, 11-15 abr. 2011).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 101
102 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
processo como meio de prova indireta, deverão ser tidas como juris tantum, relativas,
prevalecendo até que se demonstre o contrário. A chamada “presunção de culpa” alia-se
frequentemente à verossimilhança dos fatos alegados e hipossuficiência probatória tão
comum do autor/paciente e, assim, está ligada à inversão do ônus da prova; tem sido,
contudo, bastante combatida pelos juristas brasileiros no que tange à questão da neces-
sária prova da culpa médica.
Em países que admitem amplamente o sistema de presunção de culpa, como a
Espanha e Alemanha, nota-se a tendência no sentido de se mitigar o rigor do princípio
de que a vítima/paciente deve provar a culpa do médico.
Nesses países, adota-se ainda a chamada prova prima facie, teoria desen-
volvida na Alemanha sob o nome de Anscheinbeweis: o convencimento do juiz é
formado a partir das máximas da experiência, o que comumente ocorre (KFOURI
NETO, 2002, p. 131). Trata-se de uma prova de presunções: a prova prima facie se
materializa quando se expõe o fato do qual normalmente advém uma consequência
certa e determinada. Afasta-se tal prova desde que se aleguem fatos que demons-
trem a probabilidade contrária. Revela-se como uma questão de avaliação judicial
da prova.
A interpretação mais consentânea com os rumos do direito médico brasileiro
atual é a de que a prova da culpa médica deve ser certa, devendo-se observar extrema
prudência na avaliação de indícios e presunções que podem, até mesmo, atuar em
favor do médico.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 103
ter sido causado diretamente pelo médico ou por alguém sob seu comando; deverá
ter ocorrido em circunstâncias que indiquem que o paciente não o produziu voluntaria-
mente ou por negligência sua. A culpa exsurge da própria realidade dos fatos.8
8
Ilustrativo de um caso de aplicação da teoria no direito pátrio é o acórdão do TJRS, que, por sua peculiaridade,
merece ser transcrito: “APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE MÉDICA. OFTALMOLOGISTA. CIRURGIA ELETIVA
DE CORREÇÃO DE MIOPIA. SUBSEQUENTE PERDA DA VISÃO. APLICAÇÃO DA DOUTRINA DA CULPA IN RE IPSA.
DANOS MATERIAIS E MORAIS. Merece ser acolhida pretensão de indenização (por gastos médicos e de terapia
psicológica) e de reparação (por dano moral) de quem, submetendo-se a cirurgia de eleição para correção de
deficiência em um dos olhos, vem a obter, como resultado, a perda de visão. Ainda que se não flagre aí uma
obrigação de resultado, inegavelmente dessa se aproxima a denominada cirurgia funcional, merecendo ser
responsabilizado o médico que, por razões insuficientemente comprovadas, não só não logra êxito — que não
lhe era exigido — mas termina por deixar o paciente em situação extremamente pior do que se encontrava
antecedentemente, pois sem visão justamente no olho operado. Merece prestígio, em casos tais, a doutrina
da culpa in re ipsa, na medida em que o sistema de responsabilidade civil do médico é o da responsabilidade
subjetiva” (TJRS. Processo nº 598068245. 6ª Câmara Cível. Rel. Antônio Jandyr Dall’Agnol Júnior. 11.11.98).
104 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
9
“RECURSO ESPECIAL. ERRO MÉDICO. CIRURGIÃO PLÁSTICO. PROFISSIONAL LIBERAL. APLICAÇÃO DO CDC.
PRESCRIÇÃO CONSUMERISTA. I - Conforme precedentes firmados pelas turmas que compõem a Segunda
Sessão, é de se aplicar o Código de Defesa do Consumidor aos serviços médicos prestados pelos profissio-
nais liberais, com as ressalvas do §4º do artigo 14. II - O fato de se exigir comprovação da culpa para poder
responsabilizar o profissional liberal médico pelos serviços prestados de forma inadequada não é motivo sufi-
ciente para afastar a regra de prescrição estabelecida no artigo 27 da legislação consumerista, que é especial
em relação às normas contidas no Código Civil. Recurso especial não conhecido” (STJ. REsp nº 731078/SP.
3ª Turma. Rel. Min. Castro Filho. DJ, 13 fev. 2006).
10
O Código de Ética Médica (Resolução nº 1.931 de 17.09.2009 do Conselho Federal de Medicina) traz a se-
guinte afirmativa no seu Capítulo I que trata dos Princípios Fundamentais: XX - a natureza personalíssima da
atuação profissional do médico não caracteriza relação de consumo.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 105
juízo. Nem todo consumidor será hipossuficiente no sentido processual (embora seja
necessariamente vulnerável, pois este é um conceito do âmbito do direito material).
A hipossuficiência refere-se a questões probatórias e haverá casos concretos em
que o consumidor possuirá os meios necessários para promover a prova do fato
constitutivo do seu direito. Logo, se na observância do caso concreto não ocorrer a
dificuldade de se produzir a prova, não poderá o juiz inverter o ônus apenas diante da
vulnerabilidade genérica reconhecida a todos os consumidores.11
A responsabilidade civil médica, no ordenamento brasileiro, é indubitavelmente
e em regra subjetiva, o que pode também ser inferido a partir da leitura do próprio
CDC, em seu artigo 14, §4º — a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais
será apurada mediante verificação da culpa. Nos dizeres do Desembargador Miguel
Kfouri Neto,12
11
Ilustrativa é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça nesse sentido: “Mesmo quando caracterizada a
relação de consumo, continuam os ônus da prova submetidos, em regra, ao art. 333 do CPC. A inversão só
pode ocorrer, durante a marcha do processo, quando o juiz verificar a dificuldade em que se encontra o consu-
midor para provar o fato constitutivo de seu direito. Esse fato, todavia, tem de revestir-se de verossimilhança
diante dos elementos disponíveis no processo e ao consumidor deve faltar condições técnicas para prová-lo
adequadamente. Se o juiz não se basear na verossimilhança nem na hipossuficiência para fundamentar o de-
certo de inversão, esta não subsistirá, e o que haverá de prevalecer será a regra geral do art. 333 do Código
de Processo Civil” (STJ. REsp nº 437.425/RS. 4ª Turma. Rel. Min. Barros Monteiro. Ac. 15.08.2002, DJU,
p. 232, 24 mar. 2003).
12
Em palestra proferida no I Congresso de Direito Civil, realizado em 07.10.2009, em Belo Horizonte.
13
“INDENIZAÇÃO – Responsabilidade civil – Hospital – Ajuizamento com base no Código de Defesa do Consumidor
– Responsabilidade objetiva – Inadmissibilidade – Hipótese de exercício de profissão liberal, na medida em que
o que se põe em exame é o próprio trabalho do médico – Necessidade de prova de que o réu agiu com culpa ou
dolo – Art. 14, §4º, do referido Código – Recurso não provido. Em ação de indenização contra hospital, ajuizada
com base no Código de Defesa do Consumidor, embora se trate de pessoa jurídica, a ela não se aplica a
responsabilidade objetiva na medida em que o que se põe aqui em exame é o próprio trabalho do médico, que
responde se provada a culpa” (TJSP. Rel. Des. Marco Cesar. RJTJSP-Lex 141/248).
106 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
14
O entendimento do STJ é no mesmo sentido: “RESPONSABILIDADE. HOSPITAL. MÉDICO. DIAGNÓSTICO. A Turma
negou provimento ao recurso, reiterando o entendimento de que se aplica o CDC no que se refere à responsabili-
dade médica e hospitalar, cabendo ao hospital, por vício do serviço, a responsabilidade objetiva (art. 14 daquele
código), no caso de dano material e moral causado a paciente que escolhe o hospital (emergência) e é atendido
por profissional médico integrante, a qualquer título, de seu corpo clínico, prestando atendimento inadequado,
causador de morte (erro de diagnóstico). Outrossim, responde por culpa subjetiva o médico, aplicando-se, porém,
a inversão do ônus da prova (art. 5º, VII, do mencionado código)” (REsp nº 696.284/RJ. Rel. Min. Sidnei Beneti.
Julg. 03.12.2009).
15
“Os médicos, cirurgiões, farmacêuticos, parteiras e dentistas são obrigados a satisfazer o dano, sempre
que da imprudência, negligência, ou imperícia, em atos profissionais, resultar morte, inabilitação de servir,
ou ferimento”.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 107
“[...] na sociedade complexa atual, com a descodificação, a tópica e a microrecodificação (como a do CDC),
16
trazendo uma forte pluralidade de leis ou fontes, a doutrina atualizada está à procura de uma harmonia ou
coordenação entre estas diversas normas do ordenamento jurídico (concebido como sistema).
Erik Jayme alerta-nos que, nos atuais tempos pós-modernos, a pluralidade, a complexidade, a distinção impo-
sitiva dos direitos humanos e do ‘droit à la differènce’ (direito a ser diferente e ser tratado diferentemente, sem
necessidade mais de ser ‘igual’ aos outros) não mais permitem este tipo de clareza ou de ‘mono-solução’. A
solução atual ou pós-moderna é sistemática e tópica ao mesmo tempo, pois deve ser mais fluida, mais flexí-
vel, a permitir maior mobilidade e fineza de distinções. Hoje, a superação de paradigmas foi substituída pela
convivência ou coexistência dos paradigmas. [...]
Seguirei aqui novamente a teoria de Erik Jayme, que propõe, em resumo, no lugar do conflito de leis, a visua-
lização da possibilidade de coordenação sistemática destas fontes: o diálogo das fontes. Uma coordenação
flexível e útil (‘effet utile’) das normas em conflito no sistema a fim de restabelecer a sua coerência. Muda-se
assim o paradigma: da retirada simples (revogação) de uma das normas em conflito do sistema jurídico ou do
‘monólogo’ de uma só norma (a ‘comunicar’ a solução justa), à convivência destas normas, ao ‘diálogo’ das
normas para alcançar a sua ‘ratio’, a finalidade visada ou ‘narrada’ em ambas. Este atual e necessário ‘diálo-
go das fontes’ permite e leva à aplicação simultânea, coerente e coordenada das plúrimas fontes legislativas
convergentes com finalidade de proteção efetiva.”
108 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
Não é justo que o ônus da prova recaia sempre sobre o autor, pois isso pode
equivaler-se a negar-lhe a tutela jurídica. As tendências atuais procuram se afastar de
critérios rígidos e arbitrários, tornando-se importante situar o caso concreto em pri-
meiro plano. Ciente das dificuldades na produção de prova — traço característico em
demandas dessa natureza —, o julgador deverá concitar ambos, médico e paciente,
a adotar postura ativa e participante na colheita de provas. O ônus da prova deverá
ser bilateral.
Se é por meio da prova que o juiz conhecerá da verdade, modelará a realidade
e formará seu convencimento de modo a proferir uma decisão justa, nada como se
utilizar de meios que facilitem sua obtenção. A distribuição dinâmica do ônus da pro-
va é um desses meios e aumenta substancialmente a possibilidade de que a prova
necessária à solução da lide venha aos autos e se mostre ao julgador.
A carga dinâmica tem, pois, o condão de auxiliar no encontro da verdade real,
para que o magistrado possa proferir uma solução justa. Em demandas tão pecu-
liares como as que versam sobre o direito médico, isso é fundamental para que a
jurisdição desempenhe a mais importante função para a qual ela foi criada, a de
pacificação social.
17
STJ. REsp nº 69.309/SC. 4ª Turma. Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar. Julg. 18.06.1996. DJU, 26 ago. 1996.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 109
110 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
18
“Há forte corrente doutrinária que coloca a perda da chance como um terceiro gênero de indenização, ao lado dos
lucros cessantes e dos danos emergentes, pois o fenômeno não se amolda nem a um nem a outro segmento.
[...] Também, como anota a doutrina com insistência, o dano deve ser real, atual e certo. Não se indeniza, como
regra, por dano potencial ou incerto. A afirmação deve ser vista hoje com ‘granum salis’, pois, ao se deferir uma
indenização por perda de chance, o que se analisa, basicamente, é a potencialidade de uma perda [...]” (STJ.
REsp nº 788459/BA. Voto do Ministro Fernando Gonçalves. DJ, 13 mar. 2006).
19
“RESPONSABILIDADE CIVIL. ADVOGADO. PERDA DE UMA CHANCE. Age com negligência o mandatário que
sabe do extravio dos autos do processo judicial e não comunica o fato à sua cliente nem trata de restaurá-los,
devendo indenizar à mandante pela perda da chance” (TJRS, Apelação Cível nº 591064837. 5ª Câmara Cível.
Rel. Des. Ruy Rosado de Aguiar. Julg. 29.08.1991).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 111
A supracitada teoria foi transposta para o Direito Médico sob a rubrica de perda
da chance de cura ou sobrevivência (tradução da expressão francesa “perte d’une
chance de survie ou guérison”). Trata-se, com isso, de um agravamento da responsa-
bilidade civil do médico, um alargamento do nexo de causalidade, pois se condena o
médico mesmo quando o nexo causal é incerto, dando especial ênfase ao resultado
lesivo. Pela teoria, ao médico é imposta uma “obrigação parcial de indenizar” se, por
culpa sua, faz perder ao doente uma chance palpável de cura ou sobrevivência.
O médico não tem a obrigação de curar; se ele cuidou bem do doente, se domi-
nou as chances de cura ou sobrevivência, não pode ser censurado. De outra forma,
se o cuidado que ele dispensou ao doente foi deficiente, tendo isso acarretado a dimi-
nuição ou a supressão da chance de cura, como negar a avaliação do dano advindo
das chances perdidas pela vítima?
Vale exemplificar: um médico comete um erro culposo e sobrevém a morte ao
doente. Todavia, não é certo que ele teria sobrevivido, não obstante o erro do médico.
Pode-se considerar o profissional como responsável, senão da morte, ao menos da
perda da chance de sobrevivência da vítima? A jurisprudência francesa é bem sedi-
mentada no sentido que sim.
Ao tratar sobre o assunto no direito comparado, Juan Espinoza traz exemplo
de caso acontecido na Espanha (ESPINOZA apud CARLUCCI, 2007, p. 425): trata-se de
paciente que, em duas internações hospitalares, não teve realizado o diagnóstico de
seu câncer de pulmão, pelo fato de que os sintomas que apresentava eram comuns
a outras enfermidades. O Tribunal Superior de Justiça do País Basco condenou o ser-
viço de saúde a pagar uma indenização aos familiares da vítima, pela não realização
de exames complementares que poderiam ter evidenciado o diagnóstico e não pela
morte do doente.20
A jurisprudência pátria traz caso semelhante: o médico que não realiza certos
exames, que podia e devia realizar para a correta elaboração do diagnóstico, priva
o paciente da possibilidade de vir a seguir um tratamento adequado e conseguir a
cura;21 esse fato é susceptível de dar lugar a um pedido de indenização procedente,
à luz dos princípios da responsabilidade civil (CARVALHO, 2009, p. 158).
De acordo com essa teoria, a culpa do médico decorre, precisamente, de não
terem sido dadas todas as oportunidades ao doente.22 Trata-se, dessarte, de uma
20
Ilustrativo é o trecho do acórdão: “No se indemniza por la muerte del enfermo, debido a que, aunque se
hubiese detectado el cáncer, la actuación sanitaria nada podría hacer para su curación. No obstante ello,
se responsabiliza a la Administración porque de haberse diagnosticado el cáncer se habría podido instaurar el
tratamiento tendente a alargar su vida”.
21
“Responsabilidade civil. Erro médico. Perda de uma chance. Culpa do médico ao escolher terapêutica contrária
ao consenso da comunidade científica. Dever de dispensar ao paciente a melhor técnica e tratamento
possível. Chances objetivas e sérias perdidas. Erro também no acompanhamento pós-operatório. Dano moral.
Indenização. Valor da indenização adequado. Apelação não provida” (TJPR. AC nº 0415873-4. 10ª C.Cível. Rel.
Juiz Subst. 2º G. Albino Jacomel Guerios. Unânime. Julg. 04.06.2009).
22
“AÇÃO ORDINÁRIA – DANOS MORAIS E MATERIAIS – DIAGNÓSTICO TARDIO – MORTE DE PACIENTE – CABIMENTO.
I - Genitores que pretendem ser ressarcidos por danos morais e materiais decorrentes de falha estatal no
112 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
mitigação do ônus do autor (paciente) de provar a culpa pela perda da chance, que
será, de certa forma, presumida. Mas deve-se levar em conta o grau da álea e, quanto
à prova, o caráter atual ou iminente da chance que o paciente alega ter sido privado.
Há várias críticas no que tange à aplicação indiscriminada da perda de uma
chance no direito médico. Nesta teoria, não resta evidente um nexo causal entre a
ação culposa do médico e o dano sofrido pelo doente. Obriga-se, assim, a se penetrar
na seara das possibilidades, a se fazer avaliações subjetivas, sendo necessário até
mesmo o exercício mental de se reproduzir condições passadas de tempo e lugar
para que se avalie a decisão tomada pelo médico, o que é, no mínimo, perigoso.
Dessa forma, embora o debate surgido por meio da aplicação da teoria da perda
de uma chance no direito médico seja um progresso inegável no ramo da responsa-
bilidade civil profissional, seu campo de aplicação deve ser restrito aos casos em
que ela é realmente apropriada, pois, em última análise, quase todas as decisões
médicas importam o descarte de várias outras possibilidades, o que não quer dizer
que teriam sido efetivas chances de cura.
Sua aplicação irrestrita seria o mesmo que engendrar responsabilidade sem
culpa, mitigando-se demasiadamente a atividade probatória, dispensando o paciente
de provar o nexo causal entre a culpa e o dano e transformando as atividades médi
cas em obrigações de resultado, o que não pode ser aceito na busca da justiça
processual em demandas médicas.
8 Conclusão
A louvável preocupação em não causar danos ao paciente durante a realização
de cuidados à saúde remete à Antiguidade, quando Hipócrates declarava “primum
non noscere”. Contudo, é inegável que a falibilidade é uma característica intrínseca
e imutável do processo de cognição dos seres humanos; com base nessa premissa,
é de se aceitar que erros inevitavelmente acontecerão durante a prestação de assis-
tência à saúde.
Ademais, apesar da enorme evolução da responsabilidade civil e da medicina,
dois fatos permanecem substancialmente inalterados: o de que a vida humana não é
eterna e o de que é o médico quem se aproxima do paciente para tentar reverter seu
diagnóstico de enfermidade gravíssima, que acabou acarretando a morte da paciente. II - Não é possível
afirmar com absoluto juízo de certeza que o breve atendimento seria capaz de impedir o avanço da doença. A
demora no atendimento, contudo, ensejou a impossibilidade da intervenção, subtraindo, ilicitamente, a chance
de obtenção de uma vantagem ou minoração do prejuízo. Caracterização da ‘perte d’une chance’, verificada
nos casos em que o ato ilícito tira da vítima a oportunidade de obter uma situação futura melhor, ou de, pelo
menos verificar situação menos gravosa. III - Verba indenizatória que deve ser mantida (150 salários mínimos)
já que não se refere à indenização pelo evento morte, sendo devida em razão da demora no correto trata-
mento. Recurso dos autores parcialmente provido” (TJSP. Ap c. rev. 7144985000. 7ª Câm. de Dir. Público.
Rel. Nogueira Diefenthaler. Julg. 09.02.2009).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 113
114 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 115
Medical Malpractice and its Processual Determination – An Analysis of the Theories of Proof
Abstract: A doctor’s civil liability is a relevant topic in modern society, since one can notice a considerable
increase in the number of judicial claims on this issue. With the growing complexity of health relations,
finding proof of medical liability in lawsuits is a task of fundamental importance; however it is always
arduous. Meanwhile, the analysis of the theories that regulate the processual production of proof of medical
malpractice is academically interesting, and so are the modalities of distribution of the burden of proof, its
inversion, and the so-called “dynamic theory of the burden of proof”. Among the judicial forms of lessening
of civil liability requirements, one can list the theory of a missed opportunity. We will try to demonstrate that
the “dynamic theory” is better suited to the current trends of processes, with the intention of sharing the
burden of proof among the litigious parts, so that a more active and participative posture is adopted while
gathering proof, in a bilateral manner that is consistent with the mandates of material justice.
Key words: Civil liability. Medical malpractice. Theories of proof. Burden of proof.
Referências
AGUIAR JR, Ruy Rosado de. Responsabilidade civil do médico. Revista dos Tribunais, São Paulo,
ano 84, n. 718, p. 33-53, ago. 1995.
BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1998. v. 1.
CARLUCCI, Aída Kemelmajer de. Responsabilidad civil. Buenos Aires: Rubinzal-Culzoni Editores, 2007.
CARVALHO, José Carlos Maldonado. Iatrogenia e erro médico sob o enfoque da responsabilidade civil.
3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
CINTRA, Antonio C. A.; GRINOVER, Ada P.; DINAMARCO, Cândido R. Teoria geral do processo. 25. ed.
São Paulo: Malheiros, 2009.
CREMASCO, Suzana Santi. A distribuição dinâmica do ônus da prova. Rio de Janeiro: GZ, 2009.
DANTAS, Eduardo. Direito médico. Rio de Janeiro: GZ, 2009.
DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
GÓMEZ, J. Miguel Lobato. A aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao contrato de serviços
médicos e à responsabilidade civil dele decorrente. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 387, 29 jul. 2004.
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5507>. Acesso em: 07 jan. 2011.
KFOURI NETO, Miguel. Culpa médica e ônus da prova. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
MARQUES, Cláudia Lima. Superação das antinomias pelo diálogo das fontes: o modelo brasileiro de
coexistência entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002. Revista da Escola
Superior da Magistratura de Sergipe, n. 7, 2004.
MORAES, Irany Novah. Erro médico e a lei. 4. ed. São Paulo: Lejus, 1998.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
v. 13 - Contratos.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
v. 2 - Teoria geral das obrigações.
116 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014
SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. São Paulo: Atlas, 2006.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 50. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2009. v. 1.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 89-117, jan./mar. 2014 117
Paula Paz
Advogada. Graduada em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí. Advogada Associada do
Escritório Menezes Niebuhr Advogados Associados. E-mail: <paula@mnadvocacia.com.br>.
1 Introdução
A crescente constitucionalização do processo civil se percebe na preocupação
do legislador em criar mecanismos que valorizem a ordem constitucional no processo,
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014 119
120 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014
confere uma posição ainda mais privilegiada na ordem jurídica pátria e, inclusive,
permite ser identificado como um dos elementos constitutivos do princípio do Estado
Democrático de Direito.1
Desta feita, o instituto da coisa julgada destina-se à proteção da estabilidade
das relações jurídicas e sociais, erigido à condição de valor constitucional. A esta-
bilidade reclamada pela coisa julgada deriva do encerramento da disputa realizada
através de pronúncia judicial definitiva. Definitiva posto que imodificável em relação
às partes. A par da consagração do dever de cognição exauriente (como instrumento
apto a potencializar a adequada prestação jurisdicional), a coisa julgada confere às
sentenças a estabilidade imprescindível à segurança jurídica e à preservação das
expectativas legítimas de realização do direito.
Portanto, ao instituto da coisa julgada se atribui a especial função de conferir
estabilidade à tutela jurisdicional, garantindo que a decisão que pôs termo a deter-
minada controvérsia não será rescindida, conferindo status de certeza ao provimento
jurisdicional, tanto à parte vencedora quanto à vencida.2
No entanto, a proteção outorgada à coisa julgada não é absoluta, como não
é absoluto nenhum dos bens constitucionalmente protegidos.3 Em oposição ao ins-
tituto da coisa julgada, tradicionalmente, se reconheceu a possibilidade de que os
julgados fossem rescindidos ante a demonstração de que houve algum vício ao longo
da prestação jurisdicional. Na legislação brasileira, a previsão de uma ação autônoma
de natureza desconstitutiva excepcional, a ação rescisória, é expressamente discipli-
nada pelo artigo 485 do Código de Processo Civil.
Não há que se falar em antinomia entre a ordem jurídica infraconstitucional
(quando prevê a ação rescisória) e a garantia insculpida no inciso XXXVI do artigo 5º
da Constituição Federal. Trata-se, a evidência, de mera antinomia aparente, já que a
redação do texto constitucional permite inferir que o legislador protege a coisa julgada
em face do legislador, já que impede que a edição de nova lei seja capaz de descons-
tituir os efeitos já alcançados pela coisa julgada.4
De certo, o princípio constitucional se limita a estabelecer que a lei nova não
pode desfazer a decisão acobertada pela coisa julgada, porém, não impede que a
legislação preordene regras para sua rescisão mediante atividade jurisdicional, como
é o caso da ação rescisória.5 Não é à toa que a ação rescisória exige uma estrita
análise de admissibilidade e se revela como instituto de aplicabilidade excepcional
e residual.
1
NERY JUNIOR. Princípios do processo civil na Constituição Federal, p. 49.
2
ZAVASCKI. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional, p. 123-124.
3
AGACCI; RODRIGUES. Sobre a relativização da coisa julgada, seus limites e suas possibilidades. Revista de
Processo, p. 25.
4
ASSIS. Manual da execução, p. 1110.
5
SILVA. Curso de direito constitucional positivo, p. 436-437.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014 121
6
NERY JUNIOR. Princípios do processo civil na Constituição Federal, p. 59.
7
SILVA JUNIOR. Novas linhas da coisa julgada civil, p. 58.
8
SILVA JUNIOR. Novas linhas da coisa julgada civil, p. 58.
122 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014
9
THEODORO JUNIOR; FARIA. Reflexões sobre o princípio da intangibilidade da coisa julgada e sua relativização.
In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitucional, p. 190-193.
10
THEODORO JUNIOR; FARIA. Reflexões sobre o princípio da intangibilidade da coisa julgada e sua relativização.
In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitucional, p. 171.
11
CARVALHO. Ação rescisória como meio de controle de decisão fundada em lei declarada inconstitucional pelo
STF. Revista de Processo, p. 20.
12
MARINONI. Coisa julgada inconstitucional, p. 93-94.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014 123
não pode ser interpretada de forma extensiva. Afinal de contas, esta situação poderia
eternizar no tempo, para além do limite dos dois anos, o caráter controvertido da
decisão judicial já proferida.
É justamente a partir desta perspectiva que são dirigidas muitas das críticas
endereçadas ao novel instituto que será analisado neste artigo. No entanto, situar ou
reduzir o debate a estes termos revela-se contraproducente. Primeiro, porque o argu-
mento de inconstitucionalidade é construído a partir de um falso silogismo (a cons-
tituição proíbe que lei restrinja a coisa julgada, a lei previu mecanismo que restringe
a coisa julgada, a lei é inconstitucional), até mesmo porque esta inovação legislativa
vem ao encontro de outro bem de índole igualmente constitucional: a efetividade da
jurisdição. Segundo, porque se constrói a partir de imprecisões teóricas quanto à
natureza deste novo mecanismo de defesa e sobre a natureza das decisões proferi-
das pelo Supremo Tribunal Federal, o que acaba por causar ainda mais imprecisão e
incerteza ao debate.
124 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014
13
ASSIS. Eficácia da coisa julgada inconstitucional. In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitu-
cional, p. 371-372.
14
Tribunal Constitucional da Alemanha.
15
ASSIS. Manual da execução, p. 1108-1109.
16
ASSIS. Eficácia da coisa julgada inconstitucional. In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitu-
cional, p. 369.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014 125
com abalizada doutrina, a inexigibilidade não seria o melhor indicador dos efeitos
retirados do título com a declaração de inconstitucionalidade da norma que o funda-
mentou, visto que seu significado como requisito do título executivo é outro. Porém,
os outros requisitos necessários à execução do título judicial, certeza e liquidez, tam-
bém não se encaixam nesta situação, ocasionando dúvidas e contradições àqueles
que pretendem utilizar o mecanismo em casos concretos.17
Paralelamente a esta discussão, exsurge ainda outra sorte de questionamento,
que coloca em xeque a própria inclusão deste mecanismo de impugnação de decisão.
Afinal de contas, por que criar novo mecanismo de impugnação à coisa julgada frente
ao dever constitucional de preservação da segurança nas relações jurídicas? Por que
não continuar restrito às hipóteses previstas no art. 485 do CPC, notadamente frente
à interpretação consolidada atribuída ao inciso V que permite a rescisão de julgados
nestas situações?
O enfrentamento a estas questões depende de que seja explicitada a natureza
jurídica deste instituto para que se possa, então, conferir-lhes os contornos jurídicos.
17
Sobre a tema ver discussão apresentada em: LIMA. “Relativização” da coisa julgada e embargos à execução
fundados na inconstitucionalidade do título executivo: art. 741, parágrafo único, do Código de Processo Civil.
Revista do CEJ – Centro de Estudos Judiciários, p. 72, 73.
126 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014
Nas palavras de Zavascki, a função rescisória dos embargos fica clara, ao afirmar
que o referido preceito normativo “[...] veio apenas agregar ao sistema um mecanismo
processual com eficácia rescisória de certas sentenças inconstitucionais”,19 neste
sentido, o mesmo jurista atribui ao instrumento o nome de “embargos rescisórios”.20
No mesmo sentido pronunciou-se Eduardo Talamini, para quem a utilização desta
nomenclatura, foi “[...] uma tentativa (inútil e atécnica) do ‘legislador’ de enquadrar
a nova hipótese de embargos em alguma das categorias já existentes, para assim,
diminuir as censuras e resistência a inovação”.21
Para postular a defesa deste propalado efeito rescisório, argui-se que a execu-
ção (ou cumprimento de sentença) é o momento em que o credor requer o cumpri-
mento da tutela satisfativa em decorrência de um direito reconhecido. Desta feita,
quando se confere ao devedor a possibilidade de inadimplir a obrigação oriunda do
titulo judicial, acaba por tornar ineficaz o próprio provimento jurisdicional da ação
cognitiva anterior.
Em contrapartida, aqueles que defendem revestir-se o mecanismo de natureza
de causa de inexigibilidade do título judicial defendem seu ponto de vista a partir da
conjugação da literalidade do dispositivo legal e de sua origem próxima (exemplo do
direito português e alemão). Esta corrente é capitaneada por Araken de Assis, para
quem a ideia substancial do disposto nos artigos 475-L, §1º, e 741, parágrafo único,
do CPC, foi extraída de norma alemã, sendo que lá, o juízo de inconstitucionalidade
da norma, na qual se fundou o pronunciamento a ser executado, atua na esfera da
eficácia normativa. Deste modo, primeiro se desfaz a eficácia da coisa julgada retroa
tivamente, e após, apaga-se o efeito executivo da condenação, o que, em outras
palavras, importa em reconhecer a inadmissibilidade da execução.22
Em nosso ordenamento, apesar de não ter havido expressa reprodução do texto
alemão no tocante ao efeito desconstitutivo da decisão de pronúncia de inconstitucio-
nalidade proferida pela Corte Suprema, manteve-se o tratamento usualmente atribuído
18
LUCON. Coisa julgada, conteúdo e efeitos da sentença, sentença inconstitucional e embargos à execução
contra a Fazenda Pública (ex vi art. 741, parágrafo único, do CPC). Revista de Processo, p. 32.
19
ZAVASCKI. Embargos à execução com eficácia rescisória: sentido e alcance do art. 741, parágrafo único do CPC.
In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitucional, p. 340.
20
ZAVASCKI. Embargos à execução com eficácia rescisória: sentido e alcance do art. 741, parágrafo único do CPC.
In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitucional, p. 339.
21
LIMA. “Relativização” da coisa julgada e embargos à execução fundados na inconstitucionalidade do título exe-
cutivo: art. 741, parágrafo único, do Código de Processo Civil. Revista do CEJ – Centro de Estudos Judiciários,
p. 72-73.
22
ASSIS. Eficácia da coisa julgada inconstitucional. In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitu-
cional, p. 369.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014 127
23
ASSIS. Eficácia da coisa julgada inconstitucional. In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitu-
cional, p. 369.
24
ARMELIN. Flexibilização da coisa julgada. In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitucional, p. 210.
25
ANTUNES; BELLINETTI. Impugnação ao cumprimento de sentença por inconstitucionalidade. Scientia Iuris, p. 70.
26
ANTUNES; BELLINETTI. Impugnação ao cumprimento de sentença por inconstitucionalidade. Scientia Iuris, p. 70.
128 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014
título judicial impugnado contraria decisão vinculante proferida pelo Supremo Tribunal
Federal, razão porque não está apto a produzir efeitos.
27
ZAVASCKI. Embargos à execução com eficácia rescisória: sentido e alcance do art. 741, parágrafo único do CPC.
In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitucional, p. 340.
28
ZAVASCKI. Embargos à execução com eficácia rescisória: sentido e alcance do art. 741, parágrafo único do CPC.
In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitucional, p. 341.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014 129
29
MENDES. Coisa julgada inconstitucional: consideração sobre a declaração de nulidade da lei e as mudanças
introduzidas pela Lei nº 11.232/2005. In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitucional,
p. 102-103.
30
ASSIS. Manual da execução, p. 1112.
31
ZAVASCKI. Embargos à execução com eficácia rescisória: sentido e alcance do art. 741, parágrafo único do CPC.
In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitucional, p. 346.
130 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014
32
ANTUNES; BELLINETTI. Impugnação ao cumprimento de sentença por inconstitucionalidade. Scientia Iuris, p. 75.
33
ANTUNES; BELLINETTI. Impugnação ao cumprimento de sentença por inconstitucionalidade. Scientia Iuris, p. 74.
34
ANTUNES; BELLINETTI. Impugnação ao cumprimento de sentença por inconstitucionalidade. Scientia Iuris, p. 74.
35
SILVA JUNIOR. Novas linhas da coisa julgada civil, p. 132-133.
36
NERY JUNIOR. Princípios do processo civil na Constituição Federal, p. 43.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014 131
jurídico instrumento processual com eficácia de mitigar a coisa julgada, visto que até
o seu advento, o meio adequado para isso era a ação rescisória.37
Como visto, este mecanismo exsurge como mecanismo que confere densidade
à celeridade e à efetividade do processo igualmente concebidos como direitos fun-
damentais àquele cidadão. Trata-se de uma forma de conferir força aos provimen-
tos oriundos de decisões do Supremo Tribunal Federal. Junte-se a este mecanismo
diversos outros imbuídos deste mesmo propósito, a exemplo da repercussão
geral (art. 543-B, do CPC), a súmula vinculante (art. 103-A, da CFRB), do julgamento
imediato do pedido na apreciação da petição inicial (art. 285-A), da possibilidade de o
relator negar seguimento a recurso em confronto com a jurisprudência do STF, ou do
próprio Tribunal, de maneira monocrática (art. 557, do CPC).38
Neste contexto, podemos verificar que os instrumentos trabalhados até o
momento não pretendem ampliar ilimitadamente as hipóteses de flexibilização da
coisa julgada, não está se negando sua garantia como direito fundamental, apenas
demonstra que a sociedade anseia por observância de outros princípios igualmente
fundamentais. Por óbvio, não é apenas a coisa julgada que propicia aos cidadãos a
confiança no Estado para tutelar seus conflitos, é preciso que o ordenamento jurídico
crie instrumentos, como vem fazendo, que garantam a efetividade do provimento
jurisdicional.
Visto que o ordenamento jurídico já reconhece a possibilidade de manusear
ação rescisória, no prazo decadencial de dois anos, para as mesmas hipóteses abar-
cadas pelos artigos em questão, porque não evitar o procedimento custoso de uma
nova ação, com todas as propriedades e requisitos de uma ação rescisória, quando
se pode atacar a consequência proveniente de título judicial fundando em norma
inconstitucional através de procedimento mais simples? Suscitar a inexigibilidade
do título é mais célere, eficiente e menos custoso, tanto para a parte, quanto para o
Poder Judiciário.
Sendo assim, a manifestação de que a aplicação do mecanismo se limita ao
prazo estabelecido para ação rescisória não deve prosperar, pois como já visto, a
natureza jurídica deste instrumento não tem caráter de rescindibilidade, mas sim de
inexigibilidade do título judicial em apreço. Sabe-se que a fiscalização da inconstitu-
cionalidade da norma é matéria de ordem pública quando são tratadas nos processos
de conhecimento, mas neste caso não se pretende rever a coisa julgada já formada
no processo de execução, e sim declarar de inexigibilidade do título judicial, de modo
que a interpretação dos dispositivos deve ser restrita ao texto.
37
ZAVASCKI. Embargos à execução com eficácia rescisória: sentido e alcance do art. 741, parágrafo único do CPC.
In: NASCIMENTO; DELGADO (Org.). Coisa julgada inconstitucional, p. 339-340.
38
LIMA. “Relativização” da coisa julgada e embargos à execução fundados na inconstitucionalidade do título exe-
cutivo: art. 741, parágrafo único, do Código de Processo Civil. Revista do CEJ – Centro de Estudos Judiciários,
p. 75.
132 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014
4 Considerações finais
O presente estudo pretendeu analisar a previsão de impugnação ao cumpri-
mento de sentença e embargos à execução opostos contra sentença transitada em
julgado, proferida com base em aplicação de norma declarada inconstitucional pelo
Supremo Tribunal Federal, nos termos dos artigos 475-L, §1º, e 741, parágrafo único,
do CPC.
Este trabalho pretendeu avaliar a introdução destes mecanismos de flexibiliza-
ção da coisa julgada sob a perspectiva de sua compatibilidade com a ordem consti-
tucional, visto que sua aplicação no caso concreto envolve o conflito entre princípios
constitucionais de igual hierarquia. A introdução de mecanismos como este em nosso
ordenamento jurídico evidencia um processo necessário de mudança dos procedi-
mentos utilizados para tutelar as relações sociais e jurídicas entre os indivíduos,
na busca pela garantia da efetividade de seus direitos fundamentais. Com estes
instrumentos, o legislador optou por assegurar estes direitos através da observância
da isonomia na aplicação das decisões proferidas pelo STF.
39
ANTUNES; BELLINETTI. Impugnação ao cumprimento de sentença por inconstitucionalidade. Scientia Iuris,
p. 70-71.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014 133
134 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014
The Unenforceability of the Judicial Decree Founded in Provision Ruled Unconstitutional by Brazilian
Supreme Court (Articles 475-L, §1º, and 741, Sole Paragraph, of the Civil Procedure Code)
Abstract: This article aims to analyze legal provisions in Civil Procedure Code by which is possible to object
the enforcement of a judicial decree founded in provision ruled unconstitutional by Brazilian Supreme Court:
the “impugnação ao cumprimento de sentença” (art. 475-L, §1º), and the “embargos à execução”(art.
741, sole paragraph). The focus of this study is to delimitate some parameters to apply this mechanism,
by adopting a constitutional perspective that balance the res judicata and the judicial effectiveness duty.
In order to set the starting points of this study, initially, the article focuses on clarify the link between the
res judicata and the protection of the juridical relations security, and also on discuss about the revocability
of the unconstitutional judgments. Then, the article defends that this new mechanism of debtor defense
consists of a new issue of unenforceability of judicial decree (in opposition of whom that defends the
revocability nature of this institute); that it requires an adequate comprehension of the effects of the
pronunciation of unconstitutionality by Supreme Court (necessity to the distinguish between the decisions
endowed with binding effect and those that have only inter parts effect); and, finally, that this mechanism
consists in a response of the State to guarantee its citizens’ fundamental rights by introducing mechanisms
that provide a higher level of effectiveness to the decisions of the Supreme Court.
Key words: Res judicata unconstitutional. Unenforceability of judicial decree. Defense debtor mechanism.
Supremo Tribunal Federal. Binding effect.
Referências
AGACCI, Francielli Stadtlober Borges; RODRIGUES, Horácio Wanderlei. Sobre a relativização da coisa
julgada, seus limites e suas possibilidades. Revista de Processo, São Paulo, ano 37, n. 203, p. 15-38,
jan. 2012.
ANTUNES, Thiago Caversan; BELLINETTI, Luiz Fernando. Impugnação ao cumprimento de sentença
por inconstitucionalidade. Scientia Iuris, v. 14, p. 63-78, nov. 2010.
ARMELIN, Donaldo. Flexibilização da coisa julgada. In: NASCIMENTO, Carlos Valder do; DELGADO,
José Augusto (Org.). Coisa julgada inconstitucional. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2008.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014 135
ASSIS, Araken de. Eficácia da coisa julgada inconstitucional. In: NASCIMENTO, Carlos Valder do;
DELGADO, José Augusto (Org.). Coisa julgada inconstitucional. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2008.
ASSIS, Araken de. Manual da execução. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
CARVALHO, Fabiano. Ação rescisória como meio de controle de decisão fundada em lei declarada
inconstitucional pelo STF. Revista de Processo, São Paulo, ano 34, n. 170, p. 9-26, abr. 2009.
GERAIGE NETO, Zaiden. Ação rescisória: o lento caminhar do direito escrito, comparado com às
rápidas transformações da sociedades contemporâneas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
LIMA, Catarina Vila-Nova Alves de. “Relativização” da coisa julgada e embargos à execução fundados
na inconstitucionalidade do título executivo: art. 741, parágrafo único, do Código de Processo
Civil. Revista do CEJ – Centro de Estudos Judiciários, ano 1, n. 2, p. 65-94, dez. 2008. Disponível
em: <http://www.tjpe.jus.br/documents/33154/34980/Catarina+Vila-Nova+Alves+de+Lima.pdf/
f38482e5-ead2-41f9-8ee4-788a442202a8>. Acesso em: 20 mar. 2012.
LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Coisa julgada, conteúdo e efeitos da sentença, sentença
inconstitucional e embargos à execução contra a Fazenda Pública (ex vi art. 741, parágrafo único, do
CPC). Revista de Processo, São Paulo, ano 31, n. 141, p. 20-52, nov. 2006.
MARINONI, Luiz Guilherme. Coisa julgada inconstitucional. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2010.
MENDES, Gilmar Ferreira. Coisa julgada inconstitucional: consideração sobre a declaração de nulidade
da lei e as mudanças introduzidas pela Lei nº 11.232/2005. In: NASCIMENTO, Carlos Valder do;
DELGADO, José Augusto (Org.). Coisa julgada inconstitucional. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2008.
NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 8. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2004.
SILVA JUNIOR, Aldo Ferreira da. Novas linhas da coisa julgada civil. Campo Grande: Futura, 2009.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
THEODORO JUNIOR, Humberto; FARIA, Juliana Cordeiro. Reflexões sobre o princípio da intangibilidade
da coisa julgada e sua relativização. In: NASCIMENTO, Carlos Valder do; DELGADO, José Augusto
(Org.). Coisa julgada inconstitucional. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2008.
ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2001.
ZAVASCKI, Teori Albino. Embargos à execução com eficácia rescisória: sentido e alcance do art. 741,
parágrafo único do CPC. In: NASCIMENTO, Carlos Valder do; DELGADO, José Augusto (Org.). Coisa
julgada inconstitucional. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2008.
BASTOS JUNIOR, Luiz Magno Pinto; PAZ, Paula. Da inexigibilidade do título judicial
fundamentado em norma declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal
(arts. 475-L, §1º, e 741, parágrafo único, do CPC). Revista Brasileira de Direito
Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014.
136 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 119-136, jan./mar. 2014
Resumen: Al concentrar la atención sobre cuestiones técnicas puntuales del proceso muchas veces se
olvida que el fundamento de todo sistema jurídico es la ley, contemplada tanto en su carácter individual y
específico como en la totalidad del cuerpo normativo del cual es parte orgánica. Ya en los escritos de Platón
se plantean las múltiples facetas que atraviesan el legislar como una tensión dinámica constante entre la
comunidad y sus propios códigos escritos. Más allá del monismo de Kelsen, Miguel Reale recupera en su
concepción del Derecho la multiplicidad fenoménica del hecho jurídico, y la visión garantista de Alvarado
Velloso complementa esta inquietud en el reclamo al magistrado y los actores de un ineludible compromiso
que les asegure a las personas un adecuado acceso a la justicia y un debido proceso en todas sus etapas.
Sumario: 1 Platón y el papel fundamental de la ley – 2 La norma jurídica en la teoría tridimensional del
derecho de Miguel Reale – 3 El garantismo según Alvarado Velloso y el papel de la ley – 4 Conclusiones
– Referencias
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 137-147, jan./mar. 2014 137
al Derecho,1 las Leyes son los diálogos en los que este problema busca su solución.
Allí se destaca que dos son los conflictos iniciales que debe tener en cuenta quien
legisle: tener presente qué es lo que alimenta la necesidad de la norma, y cómo este
interés genera un roce ineludible entre las esferas de lo público y lo privado: “Los
hombres deben promulgarse leyes y vivir de acuerdo con ellas o no se diferenciarán en
nada de las fieras más salvajes. La causa de ello es que no nace ninguna naturaleza
humana capaz de conocer lo conveniente para los hombres en lo que atañe al orden
político y, conociéndolo, no sólo poder sino también querer hacer lo óptimo. En primer
lugar, es difícil reconocer que el verdadero arte político se ocupa necesariamente no
de lo particular sino de lo común —pues lo común une, mientras que lo particular
desmembra las ciudades— y que conviene tanto a lo público como a lo privado, a
ambos, si se coloca eventualmente a lo público por encima de lo privado”2 (Platón,
Leyes IX, p. 237). Ambos ámbitos se entrelazan obligadamente, y esta relación de
ningún modo puede ser ignorada al legislar.
Otro punto destacado es el rasgo de cierta provisionalidad perfectible que Platón
parece ver en la norma: “Si alguna vez un hombre engendrado con esa capacidad
natural por un destino divino pudiera asumir el poder, no necesitaría en absoluto de
leyes que lo gobernaran. En efecto, ni la ley ni ningún orden es mejor que la ciencia,
ni es justo que la inteligencia obedezca a nada que ni sea esclava de nada, sino que
debe gobernar todas las cosas, si realmente es verdaderamente libre por naturaleza.
Pero ahora no existe en absoluto en ningún lado, sino en pequeña medida. Por eso,
sin duda, hay que elegir lo segundo, orden y ley, que miran y observan por un lado a
lo general pero son impotentes en el caso particular” (Platón, Leyes IX, pp. 237-238).
Este origen en la emergencia es lo que se debe subrayar. La ley surge como paliativo
frente a la imposibilidad radical de que exista un perfecto juez que resuelva, sobre
la base de un criterio ecuánime e infalible, cada caso peculiar que se le presente.
Arriesgando aún más nuestra interpretación, quizás se pueda afirmar que ya desde
este momento se considera a la norma como producto de la idiosincrasia de una
comunidad específica en un período determinado de su historia. Es fácil entender,
1
“— Examina también esto y dame tu opinión: ¿no les encomendarás a los gobernantes la conducción de los
procesos judiciales del estado?
— Sí, claro.
— Y cuando juzguen, ¿tendrán en vista otra cosa antes que ésta, a saber, que cada uno no se apodere de lo
ajeno ni sea privado de lo propio?
— Ninguna otra cosa.
— Porque eso es lo justo.
— Sí.
— Y en ese sentido habría que convenir que la justicia consiste tanto en tener cada uno lo propio como en
hacer lo suyo.
— Así es”
(Platón, República IV, p. 226).
2
Cf. Aristóteles, Política III, 1279a, pp. 28-31.
138 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 137-147, jan./mar. 2014
3
“Ateniense: Que todas estas cosas que ahora exponíamos son lo que la mayoría de la gente denomina usos
no escritos. También se las llaman leyes paternas, no son sino eso. Además, es correcto lo que acabamos
de decir, que ni hay que llamarlas leyes ni debemos dejar de mencionarlas. En efecto, son vínculos que unen
todo el orden político, situados en el medio de todas las leyes que se dieron, se dan y se darán por escrito,
realmente como usos ancestrales y muy arcaicos, que, si están bien establecidos como costumbres, protegen
y conservan plenamente las leyes que se han promulgado por escrito hasta ese momento, pero en caso de
que con desorden se aparten de lo bello, como los apeos en los edificios que levantan los constructores,
se derrumban desde el centro y hacen que todo se precipite hacia el mismo punto, unas sobre otras, ellas
mismas y, tras caerse las antiguas, las que después se construyeron correctamente encima. Con eso en
mente, Clinias, debemos atar por todos lados tu ciudad nueva, tratando de no dejar en lo posible nada de lado
ni grande ni pequeño de cuanto se denomina leyes, costumbres o hábitos. En efecto, la ciudad se mantiene
unida gracias a todas estas normas, y ni las leyes escritas ni las costumbres son estables si una de ellas no
lo es, de modo que no hay que admirarse si, confluyendo, muchas costumbres y hábitos que aparentemente
son de poca importancia hacen que aumente el tamaño de nuestro código” (Platón, Leyes VII, pp. 83-84).
4
Lo que sería la base de nuestros actuales Códigos Civiles.
5
La inspiración de los Códigos Penales contemporáneos.
6
“El hecho de ser una nación que habla la misma lengua y tiene el mismo nombre produce una cierta amistad,
puesto que tienen en común los ritos y todo ese tipo de cosas, mas no soportan fácilmente leyes diversas y
otros sistemas políticos diferentes de los que traen de casa, sino que, a veces, al tender a la disensión civil
por la maldad de sus leyes y al intentar seguir usando, por hábito, las mismas costumbres por las que se
habían destruido antes, se hacen difíciles de manejar y convencer para el que funda la ciudad y le da leyes. Por
su parte, un pueblo de variado origen que confluye en un lugar quizá estaría más dispuesto a obedecer unas
leyes nuevas, pero el respirar al unísono y el unirse y, como la yunta de caballos, como se dice, tirar juntos en
el mismo sentido, necesita mucho tiempo y es difícil” (Platón, Leyes III, p. 359).
7
Resulta extraño quizás para quien tiene una imagen superficial del pensamiento platónico —imagen identificada
someramente con la inmutabilidad de lo Ideal y la imposibilidad de alcanzarlo— descubrir esta dinámica
condicionada por un tiempo y un espacio, pero lo cierto es que en toda su obra se percibe —hasta diríamos
con claridad— esta característica.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 137-147, jan./mar. 2014 139
fueran los más obedientes en lo que a la virtud atañe, y es evidente que en toda
la legislación el legislador intentará llevar a cabo eso” (Platón Leyes III, p. 375). La
ley es propiedad de la comunidad, no de los jueces ni de los legisladores, y nunca
ha de limitarse, para no modificar su esencia concertada y plural, a ser un dogma
unívoco y unidireccional. La misma polisemia de la palabra ‘ley’ en griego refleja
las implicaciones señaladas: “El término nómos, que en su forma plural da el título
al tratado, tiene en griego un campo semántico que supera en mucho a nuestra
palabra ‘ley’. Originariamente significa ‘división’, ‘distribución’, y su uso se encuentra
atestiguado a partir de Hesíodo (Los trabajos y los días, v. 276). Abarca significados
tan diversos como ‘hábito’, ‘costumbre’, ‘ley’ y ‘aire musical’, ‘norma de conducta’,
‘regla para la acción’, etc. Todas estas significaciones están presentes en el uso de
esta palabra en la obra de Platón y todas están entrelazadas entre sí para formar un
conjunto coherente que estructura la obra de un extremo al otro. La noción de nómos
adquiere una dimensión trascendente, religiosa, que hay que tener en cuenta en el
momento de analizar su proyecto político” (Francisco Lisi, en la Introducción a las
Leyes, Platón, p. 69).
En síntesis, este carácter que Platón atribuye a la norma —de múltiples facetas,
perfectible, y de producto de tensiones dinámicas que permanentemente entran en
juego y modifican la realidad con la que el legislador debe enfrentarse— es el que que
pretendemos destacar, para señalar, a continuación, las relaciones que creemos tiene
con concepciones contemporáneas como las de Reale y Alvarado Velloso, preocupadas
también en que no se le cercene al Derecho su condición compleja y fascinante para
transformarlo en un catálogo de arbitrariedades incapaz de comprender y dar solución
las necesidades reales de la gente. “Toda ciudad en la que los juzgados no estuvieran
instituidos correctamente se destruiría como tal” (Platón, Leyes VI, p. 37).
140 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 137-147, jan./mar. 2014
8
“En la escala de valores, hay que reconocer, sostiene, valores subordinantes (fundantes) y valores subordinados
(secundarios); los primeros se presentan como un fin, mientras que los otros son medios. De esta manera,
Reale sitúa en el primer lugar el valor de lo verdadero, que tiene una doble dimensión. La lógica y la ontológica.
El segundo valor es el de lo bello, que funda la estética. En tercer lugar, se halla el valor de lo útil, que se
realiza particularmente en el ámbito de la economía política. El peligro con este valor es cuando se convierte
en el valor dominante sin referencia a otros como el ético o el religioso, reduciendo la realización humana a la
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 137-147, jan./mar. 2014 141
producción y consumo de bienes. En cuarto lugar se halla el valor de lo santo o religioso, que es el fundamento
de las religiones y de la relación que en ellas se expresa con el sentido trascendente de la existencia humana.
En quinto lugar está el valor de la vida, entendido éste como la realización existencial de la vida humana, que
comprende la concreción de los demás valores. Finalmente, se halla el valor del bien, al cual se refieren la
filosofía del derecho y la ética” (Ramos, La filosofía de Miguel Reale, p. 107).
9
Y supera, creemos, a las concepciones materialistas de la sociología en las fechas en que Reale daba a la luz
sus teorías: “La idea de sociedad, lejos de constituir un valor originario y supremo, se halla condicionada por
la sociabilidad del hombre, esto es, por algo que es inherente a todo ser humano y que es la ‘condición de
posibilidad’ de la vida de relación. El hecho de que el hombre sólo adquiera conciencia de su personalidad en
un momento determinado de la vida social no elude la verdad de que ‘lo social’ ya estaba originariamente en el
ser mismo del hombre, en el carácter bilateral de toda actividad espiritual: la toma de conciencia del valor de la
personalidad es una expresión histórica de la actualización del ser del hombre como ser social, una proyección
temporal, en suma, de algo que no se había convertido en experiencia social si no fuese intrínseco al hombre,
a la condición trascendental de ser persona’” (Reale, Introducción a la filosofía, p. 181).
142 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 137-147, jan./mar. 2014
10
“Esta teoría es el resultado de su insatisfacción con la teoría de Kelsen por ser insuficiente, en su opinión,
la explicación del derecho por la sola referencia a la norma. De las limitaciones del normativismo jurídico
surgen sus investigaciones en el culturalismo, la fenomenología, la teoría de los valores, las explicaciones
hermenéuticas, el existencialismo, etc. En 1953 publica Filosofia do Direito, obra en la cual analiza el
fenómeno jurídico compuesto de estos tres elementos que él considera ya indiscutibles. Allí sostiene que
estos elementos no sólo se correlacionan, sino que se dialectalizan, porque hay entre ellos un dinamismo
integrante y convergente, de manera tal que se puede analizar el derecho en tres órdenes diferentes. Así, si
la perspectiva de análisis es el Derecho Positivo de la Jurisprudencia, la norma resulta de la tensión dialéctica
entre hechos y valores. Si el enfoque se realiza, en cambio, desde la Sociología Jurídica, el Derecho aparece
como el hecho entendido como la norma valorada. Y si se analiza lo mismo pero desde la perspectiva de
la Filosofía Jurídica, lo que se busca es el valor que explica el hecho que ha sido regulado por una norma”
(Ramos, La filosofía de Miguel Reale, p. 124).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 137-147, jan./mar. 2014 143
la convivencia. De allí que también la ley requiera de una fuerza que haga posible
la instauración de este orden social: la función coactiva del poder. El Derecho, por
último, no puede no tener una relación directa con la persona, puesto que lo que
busca con el orden social es el bien de las personas, y más aún, los valores que las
personas descubren como verdaderos bienes, y la persona misma como fuente de los
valores. Esto nos permite llegar a la conclusión de que su pensamiento filosófico ha
inspirado una visión realista del Derecho, entendiendo este realismo como búsqueda
de fundamento en el hombre y en su contexto histórico y cultural” (Ramos, La filosofía
de Miguel Reale, pp. 126-127).
Estos párrafos de Ramos son elocuentes respecto de la similitud entre lo
propuesto por Platón sobre la ley, en el nacimiento mismo de la filosofía occidental,
y las teorías de Reale, hijas de un esfuerzo por integrar elementos conceptuales
aparentemente dispersos y acotados por sus respectivos campos y objetos de
estudio. De allí que nos interese señalar las relaciones entre estas dos visiones
tan separadas en el tiempo, pero tan unidas en su manera de intentar responder
globalmente a la complejidad que enfrentan.
En este punto podemos entender el papel que en la concepción de Reale tiene
la ley para el Derecho: “Las normas jurídicas, en efecto, son una formulación racional
de una preferencia, esto es, de un valor por el cual el hombre actúa. La norma
traduce, en cierta forma, ese valor. Por eso, no se puede considerar a la ley como
una mera proposición lógica sin referencia alguna a estos valores, al hombre y a la
cultura en la cual vive. La norma es el producto final de la tensión dialéctica entre
hechos y valores, aunque no todas las relaciones de tensión entre hechos y valores se
conviertan en una norma jurídica, sino sólo aquellas que se consideran socialmente
fundamentales. En síntesis, en la conformación de la norma jurídica intervienen tres
elementos: 1- un conjunto de valores y fines que se trata de preservar y establecer
como guías de la conducta en la construcción de una sociedad en paz; 2- un conjunto
de hechos vinculados entre sí que influyen en la acción de cada individuo; 3- un
cuerpo de normas establecidas por el legislador para regir una sociedad determinada”
(Ramos, La filosofía de Miguel Reale, p. 128). La norma como mediadora dinámica.
Bosquejaremos en el apartado siguiente algunas hipótesis sobre cuál puede ser su
incidencia basal sobre las condiciones que garanticen un justo proceso.
11
<http://cporesolucionesjudiciales.blogspot.com.ar/2012/08/el-garantismo-procesal-alvarado-velloso.html>.
Publicado en la ley, 15.12.2010 1.
144 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 137-147, jan./mar. 2014
“[...] como movimiento filosófico que en definitiva es, lo que el garantismo pretende
es el irrestricto respeto de la Constitución y de los Pactos internacionales que se
encuentran en su mismo rango jurídico. Los autores así enrolados no buscan a un juez
comprometido con persona o cosa distinta de la Constitución, sino a un juez que se
empeñe en respetar y hacer respetar a todo trance las garantías constitucionales [...]
Y es que el proceso judicial es la gran y máxima garantía que otorga la Constitución
para la defensa de los derechos individuales desconocidos por cualquiera persona
—comenzando por el de libertad— y, muy particularmente, por la propia autoridad,
con la cual el individuo puede igualarse jurídicamente sólo en el proceso, ya que
allí hay un tercero que le otorga un trato absolutamente igualitario desde su pro
pia imparcialidad. De ahí el nombre de garantista o libertaria (por oposición a la
anta gónica, claramente totalitaria) [...] Reitero: el garantismo procesal no tolera
alzamiento alguno contra la norma fundamental [...]; por lo contrario, se contenta
modestamente con que los jueces —insisto que comprometidos sólo con la ley—
declaren la certeza de las relaciones jurídicas conflictivas otorgando un adecuado
derecho de defensa a todos los interesados y resguardando la igualdad procesal con
una clara imparcialidad funcional para, así, hacer plenamente efectiva la tutela legal
de todos los derechos”.12 Estos párrafos del doctor Adolfo Alvarado Velloso definen
magistralmente lo que es el llamado garantismo procesal. Dos ejes sobresalen con
claridad: el absoluto e inclaudicable respeto por las garantías constitucionales como
base de cualquier sistema judicial y la preocupación permanente por asegurar un
justo juicio a todas las personas.
¿Cuál es la relación entre esta visión del proceso y la ley? Cuando el estudioso
argentino cuestiona reiteradamente en sus obras vicios de arrastre —herederos del
sistema inquisitivo de juzgamiento, de concepciones solo enfocadas a cumplir la letra
fría de la normativa, etcétera— y otros propios de nuestra época —la mediatización
de las causas y la tentación de dar respuestas exprés propias del activismo judicial—
pone el dedo en la llaga sobre cuestiones de vital importancia. Ciertos comporta-
mientos se naturalizan y bastardean instituciones fundamentales de la república y
de la vida democrática. El proceso ve diluir su entidad original para convertirse o en
un mero formalismo burocrático con soluciones prefabricadas por la comodidad y la
desidia de sus actores, o en un show que los medios ofrecen al ritmo alocado que el
hambre de novedades de los mass media demande. Ante esta situación, urge zanjar
la brecha que existe entre los poderes Legislativo y Judicial, a fin de que trabajen con
visiones de largo plazo que tengan como horizonte definitivo la estabilidad republica-
na. El Legislativo no debe embarcarse en la sanción de leyes efectistas pergeñadas
12
Ídem supra.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 137-147, jan./mar. 2014 145
con el único y mezquino objeto de para buscar un nimio y circunstancial rédito político
entre la ciudadanía, y que luego no se pueden aplicar, ya sea por su evidente incons-
titucionalidad o por su total desconocimiento de la realidad de la Justicia. Legislar es
atenerse a los dictados de la Constitución. Jamás debe encararse esta actividad, al
igual que el proceso, obviándola o yendo en su contra. Por eso la norma sigue siendo
la piedra fundamental del sistema jurídico de un país y no puede ser producto de un
capricho o el resultado de una flagrante violación a contramano de la carta magna de
una nación.
4 Conclusiones
La norma es el punto de encuentro entre el legislar y el juzgar. Es la materiali-
zación consistente de los grandes lineamientos que traza la Constitución que se ha
dado un país. Desde Platón se le reconoce la variedad de aspectos que abarca, su
carácter perfectible y dinámico en función de las evoluciones de la comunidad que la
ha engendrado y aceptado. El monismo de Kelsen, imperante desde fines del siglo
XIX y que no ha perdido su importante influjo hasta la actualidad, implica el riesgo de
convertirse en un mero resorte taxonómico que sólo tipifica una acción y le impone el
castigo correspondiente que manda la letra fría del código. La teoría tridimensional
del Derecho de Miguel Reale es un aporte valioso a fin de recuperar la perspectiva
multifacética de la ley, de considerar al hecho jurídico como un fenómeno en su
apasionante individualidad. Las concepciones del llamado garantismo, en la visión de
Alvarado Velloso, buscan que no se pierda el rumbo respecto de la naturaleza y los
alcances del debido proceso, esto es, la plena vigencia de las garantías constitucio-
nales. Con estas grandes líneas como marco, se entiende que la norma jurídica ha de
ser la mediadora dinámica entre los poderes Legislativo y Judicial, entre el dar leyes
y el debido proceso, entre la comunidad y sus mandatarios. Debe tener siempre una
clara identidad con el ordenamiento jurídico y el sistema procesal de los cuales es
parte, a fin de no bastardear la esencia íntima del sistema republicano de gobierno.
Referencias
Alvarado Velloso, A. (1982) El juez, sus deberes y facultades. Buenos Aires, Depalma.
(1997) Introducción al estudio del Derecho Procesal. Primera parte. Santa Fe, Rubinzal-Culzoni.
(1998) Introducción al estudio del Derecho Procesal. Segunda parte. Santa Fe, Rubinzal-Culzoni.
(2003) El debido proceso de la garantía constitucional. Rosario, Zeus,
(2004) Debido proceso versus pruebas de oficio. Bogotá, Temis.
(2005) Garantismo procesal contra actuación judicial de oficio. Valencia, Tirant lo Blanch.
Platón (2007a) Leyes (Libros I-V). Barcelona, Gredos.
146 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 137-147, jan./mar. 2014
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 137-147, jan./mar. 2014 147
Francieli Pisetta
Professora na Fundação Universidade do Contestado (FUnC). Especialista em Direito Civil pela
Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB) e Centro Universitário de Jaraguá do
Sul (UNERJ), atual Centro Universitário – Católica de Santa Catarina. Especialista em Direito
Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL) em parceria com a
Rede de Ensino LFG. Especialista em Direito Público pela Fundação Universidade Regional de
Blumenau (FURB) em parceria com a Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC), Escola
Superior da Magistratura do Estado de Santa Catarina (ESMESC) e Fundação Fritz Müller.
Resumo: Este trabalho apresenta um estudo sobre o amicus curiae (do latim, “amigo da corte”), cujo
objetivo geral é analisar o tratamento legal que lhe é dado no Brasil a fim de constatar as hipóteses
possíveis de sua participação, além de verificar a sua natureza jurídica e a abordagem dada pela doutrina
pátria a respeito. Assim, este estudo aponta conceitos do “amigo da corte” formulados por diversos
expoentes, além de traçar paralelos com outras figuras processuais (partes, juiz, auxiliares da justiça,
perito, intérprete, testemunhas, custos legis e curador especial) para diferenciação. Quanto à natureza
jurídica da figura, a doutrina revela três correntes principais: terceiro interventor, assistente qualificado e
auxiliar do juízo. São questionados aspectos como legitimidade, conveniência, quantidade de colaboradores,
momento da intervenção, prazo e modo de manifestação, extensão dos poderes e limitações. O trabalho
também elenca os dispositivos legais do ordenamento jurídico brasileiro que indicam hipóteses de
participação do “amigo da corte”, porém com outra terminologia ou, ainda, apenas caracterizando-o no
sentido de permitir a participação no feito. Acentua a insuficiência da disciplina legal do amicus curiae e
a necessidade de uma sistematização específica, entendendo-se que tal medida pode resolver eventuais
problemas e permitir a ampla participação da figura em procedimentos diversos. Outrossim, durante o
trabalho, infere-se a importância prática e a repercussão social e jurídica da ampla intervenção do “amigo
da corte”, observando-se os aspectos favoráveis e desfavoráveis dessa forma de colaboração.
Palavras-chave: Amicus curiae. Natureza jurídica. Hipóteses de participação. Insuficiência legal.
Introdução
O amicus curiae no direito processual civil brasileiro é, pois, o tema desta pes-
quisa científica.
Existem causas cujo desfecho interessa, quando não a um grupo determinado,
a toda uma sociedade, eis que acabam por atingi-la diretamente e/ou gerar reflexos
em determinados setores que, por sua vez, refletem em outros, e assim sucessiva-
mente. Infere-se, pois, a importância do julgamento destas causas, que deve ser mais
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 149
firme, seguro e completo quanto possível for. Para tanto, imprescindível esquadrinhar
exaustivamente e esmiuçar ao máximo o objeto da causa, o que pode ser alcançado
com a ampliação e a viabilização da pluralização do debate. Neste ponto, entra em
cena o amicus curiae, pessoa física ou jurídica, que contribui para a melhor resolução
do conflito, emprestando seus conhecimentos técnicos sobre o tema vergastado.
Mas quais as hipóteses de participação do amicus curiae no direito brasileiro?
Exatamente neste ponto reside a problemática central deste trabalho.
A discussão concernente ao amicus curiae é de eminente relevância ao saber
jurídico, eis que importa a todo aplicador do Direito, confundindo-se com a importân-
cia social, pois também interessa à sociedade como um todo e ao Estado que deve
zelar por sua harmonia na busca do bem comum.
Como objetivo geral desta pesquisa, tem-se a análise do tratamento legal dado
pelo ordenamento jurídico brasileiro à figura do amicus curiae a fim de constatar as
hipóteses possíveis de sua participação, além da verificação da sua natureza jurídica
e da abordagem dada pela doutrina pátria a respeito.
Outrossim, de maneira específica, convém ressaltar que o presente trabalho
pretende esclarecer o que vem a ser amicus curiae, traçar paralelos com outras figuras
processuais (partes, juiz, auxiliares da justiça, perito/intérprete, testemunhas, custos
legis e curador especial) e identificar a divergência concernente à sua natureza jurí-
dica. Tenciona também averiguar a disciplina legal existente no Brasil e, caso insu-
ficiente ou deficitária, observar a possibilidade de intervenção do amicus curiae nas
hipóteses não expressas na lei, bem como analisar se o ordenamento jurídico pátrio
possui outros dispositivos legais ou princípios que poderiam ser aplicados ou se
é imprescindível a criação de uma lei especial para tratar da questão. Além disso,
almeja enumerar as hipóteses de participação do amicus curiae nos procedimentos,
expressar a importância prática e a repercussão social e jurídica da ampla interven-
ção e observar os aspectos favoráveis e desfavoráveis desta forma de colaboração.
O vertente estudo encontra-se dividido em três partes que acompanham, dentro
do possível, os aspectos mais marcantes referentes ao tema proposto.
Constatar-se-á que a primeira parte é destinada a considerações basilares do
amicus curiae. Assim, em um primeiro momento, ter-se-á a sua conceituação e, em
um segundo momento, o estabelecimento de um paralelo com outras figuras proces-
suais (partes, juiz, auxiliares da justiça, perito, intérprete, testemunhas, custos legis
e curador especial) para diferenciação e consolidação de sua definição.
A segunda parte é dedicada a um aprofundamento da figura em estudo, na qual se
enfoca a natureza jurídica e reflexões contextuais. Destarte, notar-se-á, primeiramente,
as discussões doutrinárias concernentes à natureza jurídica. Em seguida, apresentar-se-á
a origem do instituto e a primeira aparição no direito pátrio, bem como se questionarão
aspectos de legitimidade, conveniência, quantidade de colaboradores, momento da inter-
venção, prazo e modo de manifestação, extensão dos poderes e limitações.
150 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
1
PASOLD. Prática da pesquisa jurídica: idéias e fundamentos úteis para o pesquisador do direito, p. 83.
2
PASOLD. Prática da pesquisa jurídica: idéias e fundamentos úteis para o pesquisador do direito, p. 84.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 151
1.1 Conceituação
Amicus curiae é uma expressão de origem latina que significa “amigo da corte”.3
Evidente, entretanto, que a tradução literal do termo não encerra em si a definição
do instituto em apreço. Tal tarefa é incumbência da doutrina, uma vez que não o fez
a legislação pátria.
Paulo Ronai classifica o amicus curiae como uma espécie de perito, ao exprimir
o seguinte significado: “amigo da cúria, isto é, da justiça. Diz-se de perito designado
por um juiz para aconselhá-lo”.4 Para Cassio Scarpinella Bueno, essa primeira aproxi-
mação do significado esclarece a função processual da figura e é bastante rente às
funções desempenhadas pelos seus ancestrais no direito medieval inglês.5
Ultrapassando a conceituação etimológica, Rodrigo Murad do Prado amplia a
definição, explicitando tratar-se de um instituto democrático, já que permite que ter-
ceiros integrem a demanda para discutir teses jurídicas que vão afetar toda a socie-
dade, nos limites subjetivos da coisa julgada.6
Maria Chaves de Mello, por sua vez, define a figura como um “terceiro que,
com o consentimento por escrito das partes, ou autorização do juiz, pode, em uma
questão que afeta o interesse público, juntar o seu parecer aos autos do processo,
declarando como ele acha que deve ser decidida a matéria”.7
De Plácido e Silva também trata o amicus curiae como um terceiro, porém, que
não dá sua opinião sobre como o feito deve ser decidido, mas sim que presta infor-
mações ou esclarecimentos que interessem à causa:
3
SANTOS. Amicus curiae: um instrumento de aperfeiçoamento nos processos de controle de constitucionalidade.
Jus Navigandi.
4
RONAI. Não perca o seu latim, p. 25.
5
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 6.
6
PRADO. O amicus curiae no direito processual brasileiro. Jus Navigandi.
7
MELLO. Dicionário jurídico português-inglês, inglês-português = Law Dictionary Portuguese-English, english-
portuguese, p. 245-246.
8
SILVA. Vocabulário jurídico, p. 104.
152 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
9
SANTOS. Amicus curiae: um instrumento de aperfeiçoamento nos processos de controle de constitucionalidade.
Jus Navigandi.
10
SILVA. Anotações sobre o “amicus curiae” e a democratização da jurisdição constitucional. Jus Navigandi.
11
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 30.
12
PEREIRA. ‘Amicus curiae’: intervenção de terceiros. Revista de Informação Legislativa.
13
AGUIAR. Amicus curiae, p. 3.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 153
Observa-se que algumas linhas coincidem, o que permite formular, com base
no que foi discorrido, o seguinte conceito de amicus curiae: trata-se de um terceiro,
pessoa física ou jurídica, que intervém no processo para prestar informações e/ou
esclarecimentos sobre matéria determinada que seja objeto de discussão no feito,
cuja relevância ultrapassa o interesse das partes litigantes, ampliando o debate e a
análise da questão e, assim, contribuindo para que a decisão do(s) julgador(es) seja
mais fundamentada, firme e segura.
Outrossim, pela própria conceituação, deflui-se a relevância jurídica e, por con-
seguinte, social, do amicus curiae.
14
CHIOVENDA apud CARNEIRO. Intervenção de terceiros, p. 4.
15
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 359.
16
CINTRA; DINAMARCO; GRINOVER. Teoria geral do processo, p. 293.
154 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
Neste entendimento, o juiz é classificado como um terceiro por não ser parte.
O amicus curiae também é um terceiro, como mencionado anteriormente, porém não
decide o litígio. A resolução do conflito cabe ao magistrado, na qualidade de repre-
sentante do Estado. O “amigo da corte”, por sua vez, colabora com o juiz na tarefa
de solucionar a questão na medida em que compartilha seus conhecimentos sobre
a matéria discutida.
Além dos sujeitos principais (partes e juiz, representando o Estado), existem os
sujeitos secundários, quais sejam, os auxiliares da justiça. Estes são
Nesta vereda, o artigo 139 do Código de Processo Civil apresenta um rol exem-
plificativo destes cooperadores.18
Em um primeiro momento, é inevitável classificar o amicus curiae como auxiliar
da justiça. No entanto, Cassio Scarpinella Bueno acentua que não se estaria distin-
guindo o “amigo da corte” como tal e também não haveria condições de diferenciá-lo
dos demais auxiliares, sendo importante confrontá-lo com outras figuras para traçar,
com a maior exatidão possível, a sua natureza jurídica.19
Dentre os auxiliares da justiça, destaca-se, a título de comparação com o amicus
curiae, o perito e o intérprete.
O perito, nas palavras de Humberto Theodoro Júnior, é um auxiliar eventual do
juízo, eis que assiste o juiz quando a prova do fato depender de conhecimento téc-
nico ou científico.20 21 E complementa o processualista que o expert “É, geralmente,
pessoa estranha aos quadros de funcionários permanentes da Justiça. Sua escolha
é feita pelo juiz para funcionar apenas num determinado processo, tendo em vista o
fato a provar e os conceitos técnicos do perito”.22
Diferencia-se do “amigo da cúria”, segundo Fredie Didier Júnior, porque: a) este
auxilia o juiz na tarefa hermenêutica enquanto o perito tem a função de servir como
17
CINTRA; DINAMARCO; GRINOVER. Teoria geral do processo, p. 201.
18
“Art. 139. São auxiliares do juízo, além de outros, cujas atribuições são determinadas pelas normas de organi-
zação judiciária, o escrivão, o oficial de justiça, o perito, o depositário, o administrador e o intérprete” (BRASIL.
Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973).
19
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 361.
20
THEODORO JÚNIOR. Curso de direito processual civil, v. 1, p. 196.
21
Neste sentido, prevê o caput do artigo 145 do Código de Processo Civil: “Quando a prova do fato depender de
conhecimento técnico ou científico, o juiz será assistido por perito, segundo o disposto no artigo 421” (BRASIL.
Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973).
22
THEODORO JÚNIOR. Curso de direito processual civil, v. 1, p. 196.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 155
Denota-se, portanto, que o amicus curiae pode guardar alguns traços de seme-
lhança com as figuras descritas, porém, com elas não se confunde diante de suas
peculiaridades.
23
DIDIER JÚNIOR. Possibilidade de sustentação oral do amicus curiae. Revista Dialética de Direito Processual –
RDDP, p. 36-37.
24
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 369.
25
THEODORO JÚNIOR. Curso de direito processual civil, v. 1, p. 434.
26
DINARMARCO. Instituições de direito processual civil, v. 2, p. 428.
27
“Art. 9º O juiz dará curador especial: I - ao incapaz, se não tiver representante legal, ou se os interesses deste
colidirem com os daquele; II - ao réu preso, bem como ao revel citado por edital ou com hora certa. Parágrafo
único. Nas comarcas onde houver representante judicial de incapazes ou ausentes, a este competirá a função
de curador especial” (BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973).
28
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 389.
156 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
29
PEREIRA. ‘Amicus curiae’: intervenção de terceiros. Revista de Informação Legislativa.
30
AGUIAR. Amicus curiae, p. 54.
31
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 424.
32
CARNEIRO. Mandado de segurança: assistência e amicus curiae. Revista Forense, p. 78.
33
PRADO. O amicus curiae no direito processual brasileiro. Jus Navigandi.
34
AGUIAR. Amicus curiae, p. 52.
35
BINENBOJM. A dimensão do amicus curiae no processo constitucional brasileiro: requisitos, poderes proces-
suais e aplicabilidade no âmbito estadual. Revista Eletrônica de Direito do Estado – REDE.
36
SILVA. Anotações sobre o “amicus curiae” e a democratização da jurisdição constitucional. Jus Navigandi.
37
MACIEL. “Amicus curiae”: um instituto democrático. Revista da Ajuris, p. 7.
38
PRADO. O amicus curiae no direito processual brasileiro. Jus Navigandi.
39
NOGUEIRA. Do amicus curiae. Revista de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, p. 20, 27.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 157
em legitimação excepcional do terceiro, que, para alguns autores, teria de ser juridi-
camente interessado, e, para outros, bastaria que possuísse interesse econômico”.40
É cediço que a assistência é uma modalidade de intervenção de terceiros.
Nessa senda, os expoentes da segunda corrente salientam que a intervenção do
amicus curiae se trata de uma forma qualificada de assistência. Isso porque se exige
do interventor “[...] outros requisitos além da comprovação de interesse jurídico”.41
Como ícone desse posicionamento doutrinário, destaca-se Edgard Silveira
Bueno Filho que assim se manifestou ao analisar a presença do “amigo da cúria” nas
ações diretas de constitucionalidade e de inconstitucionalidade:
Em prol da terceira corrente, pontua Fredie Didier Júnior que o “amigo da corte”
é um auxiliar do juízo, não sendo parte, terceiro ou custos legis, bem como não sendo
equiparada sua intervenção à intervenção de terceiro:
40
AGUIAR. Amicus curiae, p. 62.
41
AGUIAR. Amicus curiae, p. 62.
42
BUENO FILHO. Amicus curiae: a democratização do debate nos processos de controle da constitucionalidade.
43
DIDIER JÚNIOR. Possibilidade de sustentação oral do amicus curiae. Revista Dialética de Direito Processual –
RDDP, p. 34, 36-37.
44
AGUIAR. Amicus curiae, p. 59.
158 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
Carlos Gustavo Rodrigues Del Prá, por sua vez, pondera a natureza dúplice do
amicus curiae (auxiliar do juízo e terceiro interveniente), por força das hipóteses de
manifestação (manifestação por iniciativa do juiz e manifestação voluntária). Nesse
passo, explica que, em caso de manifestação por iniciativa do juiz, o “amigo da corte”
desempenharia função semelhante ao do auxiliar do juízo; no caso de intervenção
voluntária, ou seja, exercendo a faculdade de se manifestar, o “amigo da cúria” seria
o terceiro interventor.46
Por sua vez, Luciano Marinho de Barros e Souza Filho reflete que “[...] a depen-
der do limite de abrangência do instituto [...] pode-se flutuar a natureza jurídica do
amicus curiae ora para uma intervenção ou assistência padrão ou inovadora, ora mais
restritamente, para um tipo de auxiliar específico”.47
Segundo Guilherme Giacomelli Chanan, “[...] certo é que a intervenção do amicus
curiae é uma forma de intervenção de terceiro especial ou, como preferem alguns
autores, um tipo de assistência qualificada”.48 O entendimento deste doutrinador per-
mite inferir uma outra classificação da natureza jurídica dúplice do “amigo da corte”
(terceiro especial ou assistente qualificado) ou, simplesmente, uma qualificação de
uma modalidade específica de intervenção de terceiro.
Como visto, não há entendimento pacífico acerca da natureza jurídica do “amigo
da cúria”. A maioria doutrinária, entretanto, defende que o amicus curiae é um terceiro
interventor atípico. Inegável que as discussões permanecerão acirradas, mormente
enquanto não houver uma regulamentação do instituto em debate. Grifa-se, outros-
sim, que a identificação da natureza jurídica tem relevância diante dos reflexos na
limitação da atuação, poderes, deveres, dentre outros.
45
AGUIAR. Amicus curiae, p. 62.
46
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 123-128.
47
SOUZA FILHO. Amicus curiae: instituto controvertido e disseminado no ordenamento jurídico brasileiro. Justilex,
p. 37.
48
CHANAN. Amicus Curiae no direito brasileiro e a possibilidade de seu cabimento nas Cortes estaduais.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 159
Não vemos como recusar que quaisquer outras pessoas jurídicas ou físi-
cas, mesmo que não admitidas, pela lei brasileira, como legitimadas
para a propositura de ações coletivas, possam pretender desempenhar
a função de amicus curiae. Contudo, à falta de norma genérica para o
assunto [...], parece-nos que o referencial necessário é o do art. 7º, §2º,
da Lei nº 9.868/99.56 57
49
AGUIAR. Amicus curiae, p. 11.
50
SANTOS. Amicus curiae: um instrumento de aperfeiçoamento nos processos de controle de constitucionalidade.
Jus Navigandi.
51
REIS. Amicus curiae. Fórum Administrativo – FA, p. 1988.
52
SOUZA FILHO. Amicus curiae: instituto controvertido e disseminado no ordenamento jurídico brasileiro. Justilex, p. 35.
53
MARTEL; PEDROLLO. Amicus curiae: elemento de participação política nas decisões judiciais-constitucionais.
Revista da Ajuris, p. 166.
54
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 116.
55
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 172.
56
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 647.
57
“Art. 7º Não se admitirá intervenção de terceiros no processo de ação direta de inconstitucionalidade. §1º
VETADO. §2º O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá,
160 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
Neste diapasão, explica o citado doutrinador que tal dispositivo traz um “filtro”
para contrastar, ao mesmo tempo, a utilidade da manifestação do amicus curiae
(“relevância da matéria”) e a sua específica “representatividade adequada” (“repre-
sentatividade dos postulantes”).58
Edgard Silveira Bueno Filho enfatiza que, “Por relevância da matéria, o legislador
quis que o postulante demonstrasse a relação de relevância entre a matéria discutida
e a atividade perseguida pela instituição”.59 E, quanto à representatividade, aduz
o autor que entidades de notória representatividade serão facilmente admitidas ao
debate, conforme o tema discutido e sua relação com a atividade por estas desenvol-
vida, a exemplo das associações de magistrados, de advogados, de outros profissio-
nais liberais, de empresários, de defensores de direitos humanos, de consumidores,
do meio ambiente etc.60
Percebe-se que outras pessoas, inclusive físicas, poderiam intervir como amicus
além das entidades, a exemplo de expertos, pesquisadores etc., retrocitados. Trazendo-
se, pois, o caráter de representatividade para tais pessoas, sugere-se que seja con-
siderado o seu notório saber concernente à matéria discutida.
O trilhar da reflexão adentra em outra questão, qual seja a conveniência da
intervenção do “amigo da corte”. Compartilha-se do entendimento explanado para con-
siderar como adequada a participação nos casos em que a matéria é de tal relevância
que ultrapassa os interesses estritos dos litigantes, gerando reflexos em determinado
grupo ou na sociedade como um todo. Pensa-se que, nos casos em que não há essa
amplitude, a intervenção do amicus curiae corre o risco de não ser apropriada, gerando
debate desnecessário e, quiçá, tumulto processual.
Traçadas as linhas dos casos adequados para a intervenção, questiona-se
quantos colaboradores podem atuar no feito. A legislação pátria nada disciplinou a
respeito, razão pela qual se entende admissível a intervenção de mais de um “amigo
da corte”. Também se posiciona pela pluralidade de intervenções Cassio Scarpinella
Bueno.61 E em estudo dos processos de controle de constitucionalidade, Edgard
Silveira Bueno Filho apresenta lição que pode ser aplicada:
por despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros
órgãos ou entidades” (BRASIL. Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999).
58
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 647.
59
BUENO FILHO. Amicus curiae: a democratização do debate nos processos de controle da constitucionalidade.
60
BUENO FILHO. Amicus curiae: a democratização do debate nos processos de controle da constitucionalidade.
61
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 165-168.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 161
Além de não existir proibição, deve ser lembrado que a participação desse
terceiro qualificado tem por objetivo ampliar o debate do tema constitucio-
nal, democratizando-o. Só pessoas representativas são habilitadas para
participar do processo de controle, daí porque a presença de vários amici
nos parece admissível.62
62
BUENO FILHO. Amicus curiae: a democratização do debate nos processos de controle da constitucionalidade.
63
BUENO FILHO. Amicus curiae: a democratização do debate nos processos de controle da constitucionalidade.
64
CABRAL, Antônio do Passo apud BINENBOJM. A dimensão do amicus curiae no processo constitucional bra-
sileiro: requisitos, poderes processuais e aplicabilidade no âmbito estadual. Revista Eletrônica de Direito do
Estado – REDE.
65
“Art. 6º O relator pedirá informações aos órgãos ou às autoridades das quais emanou a lei ou o ato normativo
impugnado. Parágrafo único. As informações serão prestadas no prazo de trinta dias contados do recebimento
do pedido” (BRASIL. Lei nº 9.869, de 10 de novembro de 1999).
66
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 164-165.
67
BINENBOJM. A dimensão do amicus curiae no processo constitucional brasileiro: requisitos, poderes processuais
e aplicabilidade no âmbito estadual. Revista Eletrônica de Direito do Estado – REDE.
162 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
Com relação ao amicus curiae que age por requisição do relator, não
assumirá a qualidade de terceiro interveniente, mas de uma espécie de
auxiliar do juízo. Por isso, os poderes concedidos àquele que intervém
voluntariamente não podem ser estendidos a este.
De qualquer forma, e agindo com o fim de informar a corte, poderá esse
amicus curiae (i) informar matéria de fato; (ii) apresentar manifestação
sobre questão jurídica ou, ainda, (iii) juntar documentos.69
68
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 141-142.
69
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 142.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 163
70
BINENBOJM. A dimensão do amicus curiae no processo constitucional brasileiro: requisitos, poderes processuais
e aplicabilidade no âmbito estadual. Revista Eletrônica de Direito do Estado – REDE.
71
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 170.
72
NOGUEIRA. Do amicus curiae. Revista de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, p. 18.
73
DIDIER JÚNIOR. Possibilidade de sustentação oral do amicus curiae. Revista Dialética de Direito Processual –
RDDP, p. 38.
74
DIDIER JÚNIOR. Possibilidade de sustentação oral do amicus curiae. Revista Dialética de Direito Processual –
RDDP, p. 38.
75
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 162.
76
“Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não
excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu,
mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou” (BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro
de 1973).
77
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 162.
78
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 171.
79
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 172.
164 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
Não obstante, outros diplomas legais possuem comandos que podem referir-se
ao “amigo da cúria”, porém, com outra terminologia ou, ainda, caracterizando-o no
sentido de permitir a sua participação no feito. É o caso da Lei nº 9.868/1999, que
dispõe sobre o processo e o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade (ADI) e
da ação declaratória de constitucionalidade (ADC) perante o Supremo Tribunal Federal.
O §2º do artigo 7º menciona “outros órgãos ou entidades” que funcionam como “ami-
gos da corte” ao se manifestarem na ADI:
80
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 126.
81
BRASIL. Resolução nº 390, de 17 de setembro de 2004.
82
BRASIL. Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 165
83
AGUIAR. Amicus curiae, p. 29.
84
BRASIL. Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999.
85
BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
166 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
86
BRASIL. Lei nº 9.882, de 03 de dezembro de 1999.
87
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 91-92.
88
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 91.
89
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 92-94.
90
BRASIL. Lei nº 10.259, de 12 de julho de 2001.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 167
Art. 31. Nos processos judiciários que tenham por objetivo matéria incluí-
da na competência da Comissão de Valores Mobiliários, será esta sempre
intimada para, querendo, oferecer parecer ou prestar esclarecimentos, no
prazo de quinze dias a contar da intimação.
§1º A intimação far-se-á, logo após a contestação, por mandado ou por
carta com aviso de recebimento, conforme a Comissão tenha, ou não,
sede ou representação na comarca em que tenha sido proposta a ação.
§2º Se a Comissão oferecer parecer ou prestar esclarecimentos, será
intimada de todos os atos processuais subseqüentes, pelo jornal oficial
que publica expedientes forense ou por carta com aviso de recebimento,
nos termos do parágrafo anterior.
§3º A comissão é atribuída legitimidade para interpor recursos, quando
as partes não o fizeram.
§4º O prazo para os efeitos do parágrafo anterior começará a correr,
independentemente de nova intimação, no dia imediato aquele em que
findar o das partes.92
91
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 204.
92
BRASIL. Lei nº 6.385, de 07 de dezembro de 1976.
93
BRASIL. Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994.
168 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
94
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 326.
95
BRASIL. Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994.
96
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 398-399.
97
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
98
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 169
Art. 5º A União poderá intervir nas causas em que figurarem, como au-
toras ou rés, autarquias, fundações públicas, sociedades de economia
mista e empresas públicas federais.
Parágrafo único. As pessoas jurídicas de direito público poderão, nas
causas cuja decisão possa ter reflexos, ainda que indiretos, de natureza
econômica, intervir, independentemente da demonstração de interesse
jurídico, para esclarecer questões de fato e de direito, podendo juntar
documentos e memoriais reputados úteis ao exame da matéria e, se for
o caso, recorrer, hipótese em que, para fins de deslocamento de compe-
tência, serão consideradas partes.100
A grande inovação, no entanto, pode estar por vir no próximo Código de Processo
Civil, em cujo anteprojeto consta menção expressa ao amicus curiae.
O Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil apresenta o amicus curiae
em uma seção especialmente a ele destinada (“Seção I – Do amicus curiae”), por
sua vez inserida no “Capítulo IV – Da Intervenção de Terceiros”, dentro do “Título I –
Do Procedimento Comum” constante do “Livro III – Do Processo de Conhecimento”.
Todavia, a disciplina ainda é insuficiente, pois se limitou a um único dispositivo de lei:
99
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
100
BRASIL. Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997.
101
BRASIL. Senado Federal. Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil.
170 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
102
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 120-121.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 171
demandas. Seguindo este raciocínio, grifa-se que a ampliação do debate com a apre-
sentação de ideias e pensamentos proporciona a representatividade da sociedade,
contribuindo para uma ordem jurídica mais justa e democrática. O enfoque democrático,
por sua vez, também mostra a importância social do amicus curiae.
Segundo o Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil, a intervenção do amicus
curiae se dá “considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto
da demanda ou a repercussão social da lide”.103 Não há maiores especificações,
ao contrário do que se verifica na questão repercussão geral exigida nos Recursos
Extraordinários.
Mirella de Carvalho Aguiar desenvolveu um quadro sinóptico das hipóteses de
intervenção do amicus curiae — o qual também é citado por Luciano Marinho de Barros
e Souza e Filho104 — que convém ser trazido à baila, já que consolida os aspectos
vistos no item anterior deste capítulo:105
Dispositivo Comprovação
Interventor Requisitos Observações
legal de interesse
103
BRASIL. Senado Federal. Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil.
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicio-
nal, p. 120-121.
104
SOUZA FILHO. Amicus curiae: instituto controvertido e disseminado no ordenamento jurídico brasileiro. Justilex,
p. 35.
105
AGUIAR. Amicus curiae, p. 35.
172 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
Dispositivo Comprovação de
Interventor Requisitos Observações
legal interesse
Res. A resolução fala
Qualquer
nº 390/01 – Dispensada expressamente em
interessado
art. 23, §1º amicus curiae.
A doutrina de Carlos
Lei
Qualquer Gustavo Rodrigues
nº 9.882/99, – Dispensada
pessoa Del Prá defende ser
art. 6º
amicus curiae.106
Cassio Scarpinella
Lei Matéria institucional Bueno,107 além de Carlos
nº 8.906/94, OAB e/ou relativa ao seu Dispensada Gustavo Rodrigues
art. 49 múnus. Del Prá,108 sustenta ser
“amigo da corte”.
Carlos Gustavo Rodrigues
Lei Ações de nulidade de
Del Prá109 e Cassio
nº 9.279/96, patente, de registro
INPI. Dispensada Scarpinella Bueno110
arts. 57, 118 de desenho industrial e
perfilham ser caso de
e 175 de registro.
“amigo da cúria”.
106
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicio-
nal, p. 91-94.
107
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 398-399.
108
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicio-
nal, p. 108-109.
109
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicio-
nal, p. 66.
110
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 304.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 173
111
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 159.
174 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
Conclusão
Neste trabalho, verificou-se que a tradução literal do termo latino amicus curiae,
qual seja, “amigo da corte”, não o define plenamente. Assim, e não se olvidando que
o instituto ainda está em construção no direito brasileiro, foi possível conceituar o
amicus curiae como um terceiro, pessoa física ou jurídica, que intervém no processo
para prestar informações e/ou esclarecimentos sobre matéria determinada que seja
objeto de discussão no feito, cuja relevância ultrapassa o interesse das partes liti-
gantes, ampliando o debate e a análise da questão e, assim, contribuindo para que a
decisão do(s) julgador(es) seja mais fundamentada, firme e segura.
Neste passo, constatou-se que o “amigo da corte” é uma figura especial que
não se confunde com partes, juiz, auxiliares da justiça, perito, intérprete, testemu-
nhas, custos legis e curador especial. O amicus curiae pode guardar alguns traços de
semelhança — uns maiores, outros menores — com tais figuras, porém, repisa-se,
é diverso.
No tocante à natureza jurídica, a doutrina pátria é divergente. Neste diapasão,
observaram-se os seguintes posicionamentos: a) terceiro interventor (espécie de
intervenção de terceiros, anômala ou não), sendo esta a corrente majoritária que
possui como defensores Milton Luiz Pereira,112 Cassio Scarpinella Bueno,113 Athos
Gusmão Carneiro,114 Rodrigo Murad do Prado,115 Antônio do Passo Cabral,116 Gustavo
Binenbojm,117 Luiz Fernando Martins da Silva,118 Adhemar Ferreira Maciel,119 Lenio
Luís Streck120 e Gustavo Santana Nogueira;121 b) assistente qualificado (forma qua-
lificada de assistência), destacando-se Edgard Silveira Bueno Filho122 como ícone;
c) auxiliar do juízo, sendo expoentes Fredie Didier Júnior,123 Leonardo José Carneiro
da Cunha124 e Mirella de Carvalho Aguiar.125 Além disso, assinalou-se a existência de
doutrinadores que perfilham que o amicus curiae possui natureza dúplice: a) terceiro
interventor e auxiliar do juízo, apontando-se como defensor Carlos Gustavo Rodrigues
112
PEREIRA. ‘Amicus curiae’: intervenção de terceiros. Revista de Informação Legislativa.
113
BUENO. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 424.
114
CARNEIRO. Intervenção de terceiros, p. 78.
115
PRADO. O amicus curiae no direito processual brasileiro. Jus Navigandi.
116
AGUIAR. Amicus curiae, p. 52.
117
BINENBOJM. A dimensão do amicus curiae no processo constitucional brasileiro: requisitos, poderes proces-
suais e aplicabilidade no âmbito estadual. Revista Eletrônica de Direito do Estado – REDE.
118
SILVA. Anotações sobre o “amicus curiae” e a democratização da jurisdição constitucional. Jus Navigandi.
119
MACIEL. “Amicus curiae”: um instituto democrático. Revista da Ajuris, p. 7.
120
PRADO. O amicus curiae no direito processual brasileiro. Jus Navigandi.
121
NOGUEIRA. Do amicus curiae. Revista de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, p. 20, 27.
122
BUENO FILHO. Amicus curiae: a democratização do debate nos processos de controle da constitucionalidade.
123
DIDIER JÚNIOR. Possibilidade de sustentação oral do amicus curiae. Revista Dialética de Direito Processual –
RDDP, p. 34, 36-37.
124
AGUIAR. Amicus curiae, p. 59.
125
AGUIAR. Amicus curiae, p. 62.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 175
126
DEL PRÁ. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e aperfeiçoamento da prestação jurisdicional,
p. 123-128.
127
SOUZA FILHO. Amicus curiae: instituto controvertido e disseminado no ordenamento jurídico brasileiro. Justilex,
p. 37.
128
CHANAN. Amicus Curiae no direito brasileiro e a possibilidade de seu cabimento nas Cortes estaduais.
176 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 177
convenience, quantity of collaborators, moment of intervention, time and mode of manifestation, extension
of powers and limitations. The work also lists the legal dispositives of Brazilian legal system that indicates
hypothesis of participation of “friend of the court”, but, with another terminology or, further, just only
characterizing it in the direction of allowing the participation in the process. Accentuates the insufficiency
of the legal discipline of amicus curiae and the need for a specific systematization, understanding that
this measure can resolve eventual problems and allow the broad participation of the figure in various
proceedings. Also, during the work, infers the practical importance and the social and legal repercussions
of the broad intervention of “friend of the court”, observing the favorable and unfavorable aspects of this
form of collaboration.
Key words: Amicus curiae. Juridical nature. Hypothesis of participation. Lawful insufficiency.
Referências
AGUIAR, Mirella de Carvalho. Amicus curiae. Salvador: JusPodivm, 2005.
BINENBOJM, Gustavo. A dimensão do amicus curiae no processo constitucional brasileiro: requisitos,
poderes processuais e aplicabilidade no âmbito estadual. Revista Eletrônica de Direito do Estado –
REDE, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, n. 1, jan. 2004. Disponível em: <http://www.
direitodoestado.com/revista/REDE-1-JANEIRO-2005-GUSTAVO%20BINENBOJM.pdf>. Acesso em: 07
out. 2007.
BRASIL. Lei nº 10.259, de 12 de julho de 2001. Dispões sobre a instituição dos Juizados Especiais
Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
Leis/LEIS_2001/L10259.htm>. Acesso em: 07 nov. 2007.
BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5869.htm>. Acesso em: 26 set. 2007.
BRASIL. Lei nº 6.385, de 07 de dezembro de 1976. Dispõe sobre o mercado de valores mobiliários e
cria a Comissão de Valores Mobiliários. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/
L6385.htm>. Acesso em: 08 nov. 2007.
BRASIL. Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994. Transforma o Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade) em Autarquia, dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem
econômica e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/
L8884.htm>. Acesso em: 09 nov. 2007.
BRASIL. Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8906.htm>.
Acesso em: 10 nov. 2007.
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade
industrial. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9279.htm>. Acesso em: 10
nov. 2007.
BRASIL. Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997. Regulamenta o disposto no inciso VI do art. 4º da Lei
Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993; dispõe sobre a intervenção da União nas causas
em que figurarem, como autores ou réus, entes da administração indireta; regula os pagamentos
devidos pela Fazenda Pública em virtude de sentença judiciária; revoga a Lei nº 8.197, de 27 de
junho de 1991, e a Lei nº 9.081, de 19 de julho de 1995, e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9469.htm>. Acesso em: 10 nov. 2007.
BRASIL. Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999. Dispõe sobre o processo e julgamento da ação
direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo
Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9868.htm>. Acesso
em: 18 out. 2007.
178 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
BRASIL. Lei nº 9.882, de 03 de dezembro de 1999. Dispõe sobre o processo e julgamento da arguição
de descumprimento de preceito fundamental, nos termos do §1º do artigo 102 da Constituição Federal.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9882.htm>. Acesso em: 04 nov. 2007.
BRASIL. Resolução nº 390, de 17 de setembro de 2004. Dispõe sobre o Regimento Interno da Turma
Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais. Disponível em: <http://
www.cjf.gov.br/download/res390.pdf>. Acesso em: 27 out. 2007.
BRASIL. Senado Federal. Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.
senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf>. Acesso em: 28 ago. 2012.
BUENO FILHO, Edgard Silveira. Amicus curiae: a democratização do debate nos processos de controle
da constitucionalidade. Disponível em: <http://www.cjf.gov.br/revista/numero19/artigo9.pdf>. Acesso
em: 18 out. 2007.
BUENO, Cassio Scarpinella. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático. São
Paulo: Saraiva, 2006.
CARNEIRO, Athos Gusmão. Intervenção de terceiros. 11. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2000.
CARNEIRO, Athos Gusmão. Mandado de segurança: assistência e amicus curiae. Revista Forense,
Rio de Janeiro, v. 100, n. 371, p. 73-78, jan./fev. 2004.
CHANAN, Guilherme Giacomelli. Amicus Curiae no direito brasileiro e a possibilidade de seu cabimento nas
Cortes estaduais. Disponível em: <http://www.tex.pro.br/home/noticias2/97-artigos-set-2005/5302-
amicus-curiae-no-direito-brasileiro-e-a-possibilidade-de-seu-cabimento-nas-cortes-estaduais>. Acesso
em: 18 out. 2007.
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel; GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria
geral do processo. 14. ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 1998.
DEL PRÁ, Carlos Gustavo Rodrigues. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e
aperfeiçoamento da prestação jurisdicional. Curitiba: Juruá, 2007.
DIDIER JÚNIOR, Fredie. Possibilidade de sustentação oral do amicus curiae. Revista Dialética de
Direito Processual – RDDP, São Paulo, n. 8, p. 33-38, nov. 2003.
DINARMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 4. ed. rev. atual. e com remis-
sões ao Código Civil de 2002. São Paulo: Malheiros, 2004. v. 2.
MACIEL, Adhemar Ferreira. “Amicus curiae”: um instituto democrático. Revista da Ajuris, Porto Alegre,
v. 29, n. 87, t. 1, p. 7-10, set. 2002.
MARTEL, Letícia de Campos Velho; PEDROLLO, Gustavo Fontana. Amicus curiae: elemento de
participação política nas decisões judiciais-constitucionais. Revista da Ajuris, Porto Alegre, v. 32,
n. 99, p. 161-179. set. 2005.
MELLO, Maria Chaves de. Dicionário jurídico português-inglês, inglês-português = Law Dictionary
Portuguese-English, english-portuguese. 6. ed. Rio de Janeiro: Barrister’s, 1994.
NOGUEIRA, Gustavo Santana. Do amicus curiae. Revista de Direito do Tribunal de Justiça do Estado
do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, n. 63, p. 13-28, abr./jun. 2005.
PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e fundamentos úteis para o pesquisador do
direito. Florianópolis: OAB/SC Editora, 1999.
PEREIRA, Milton Luiz. ‘Amicus curiae’: intervenção de terceiros. Revista de Informação Legislativa,
v. 39, n. 156, p. 7-11, out./dez. 2002. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/
handle/id/810/R156-01.pdf?sequence=4>. Acesso em: 25 set. 2007.
PRADO, Rodrigo Murad do. O amicus curiae no direito processual brasileiro. Jus Navigandi, Teresina,
ano 9, n. 676, 12 maio 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/6717/o-amicus-curiae-no-
direito-processual-brasileiro>. Acesso em: 25 set. 2007.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014 179
REIS, Palhares Moreira. Amicus curiae. Fórum Administrativo – FA, Belo Horizonte, Fórum, ano 3, n. 25,
p. 1988-1990, mar. 2003.
RONAI, Paulo. Não perca o seu latim. 5. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990.
SANTOS, Esther Maria Brighenti dos. Amicus curiae: um instrumento de aperfeiçoamento nos processos
de controle de constitucionalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 906, 26 dez. 2005. Disponível
em: <http://jus.com.br/artigos/7739/amicus-curiae>. Acesso em: 17 mar. 2014.
SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 27. ed. Atualizada por Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho.
Rio de Janeiro: Forense, 2007.
SILVA, Luiz Fernando Martins da. Anotações sobre o “amicus curiae” e a democratização da jurisdição
constitucional. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 598, 26 fev. 2005. Disponível em: <http://jus.com.
br/artigos/6358/anotacoes-sobre-o-amicus-curiae-e-a-democratizacao-da-jurisdicao-constitucional>.
Acesso em: 17 mar. 2014.
SOUZA FILHO, Luciano Marinho de Barros. Amicus curiae: instituto controvertido e disseminado no
ordenamento jurídico brasileiro. Justilex, Brasília, v. 6, n. 67, p. 35-37, jul. 2007.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 2005. v. 1.
180 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 149-180, jan./mar. 2014
Palavras-chave: Direito Processual Civil. Direito Processual do Trabalho. Jurisdição comum. Jurisdição
especial. Impessoalidade jurisdicional.
Sumário: 1 Delimitação do tema – 2 A jurisdição comum, civil e penal, e as jurisdições especiais – 3 A
delimitação dos campos do Direito Processual Civil e do Direito Processual do Trabalho – 4 A disciplina
do Direito Processual do Trabalho na CLT – 5 A fonte subsidiária na teoria das fontes – 6 As fontes do
Direito Processual do Trabalho – 7 O Direito Processual Civil como fonte subsidiária do Direito Processual
do Trabalho – 8 O problema das lacunas – 9 A aplicação do Direito no Direito Processual Civil e no Direito
Processual do Trabalho – 10 O suprimento das lacunas no Direito Processual Civil e no Direito Processual
do Trabalho – 11 Conclusão – Referências
1 Delimitação do tema
O Direito Processual Civil e o Direito Processual do Trabalho são ramos autôno-
mos do Direito Público.
A comparação entre eles demonstra que há institutos jurídicos que são comuns
a ambos os ramos, há institutos jurídicos semelhantes, em ambos, há institutos jurí-
dicos em um dos ramos sem correspondência no outro, e há institutos jurídicos que
disciplinam de modo diferente questões processuais semelhantes.
Essas questões têm provocado diversas indagações quanto às possibilidades e
os limites da atuação do magistrado, na aplicação do Direito Processual do Trabalho
com recurso às normas e aos institutos do Direito Processual Civil.
Uma das indagações que tem se tornado recorrente, nos dias atuais, forma-se em
torno das inovações introduzidas por meio de amplas reformas do Direito Processual
Civil, que ensejaram maior agilidade no processo e na satisfação do crédito judicial-
mente reconhecido.
O Direito Processual do Trabalho não experimentou reformas semelhantes, ofe-
recendo, ainda, à aplicação do Direito material, antigos institutos contemporâneos do
advento da CLT.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014 181
1
GONÇALVES. Técnica processual e teoria do processo, p. 41-48.
2
LIEBMAN. Manual de direito processual civil, v. 1, p. 3.
3
CARNELUTTI. Como se faz um processo, p. 33-35.
182 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014
4
DINAMARCO. Instituições de direito processual civil, v. 1, p. 330.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014 183
A matéria das causas alcançada pelo Direito Processual Civil dá-se por exclusão.
Uma lide civil não é sempre a que apresenta controvérsia referente ao âmbito
do Direito Civil e que deve ser resolvida com normas do Direito Civil.
As normas do Direito Processual Civil aplicam-se aos litígios sobre relações jurí-
dicas atinentes à matéria de Direito Civil e de Direito Empresarial, de Direito Agrário,
de Direito Administrativo, de Direito Tributário, de Direito Constitucional, e outros
ramos, abrangendo conteúdos de Direito Público e de Direito Privado.
Para se encontrar a lide que se coloca sob as normas do Direito Processual Civil,
procede-se por eliminação.
Excluem-se as que constituem objeto de jurisdições especiais: do trabalho, militar
e eleitoral.
Esse procedimento leva à lide de direito comum, que pode ser civil ou penal.
Se se puder excluir a matéria penal, surge a lide que tem natureza civil.
Discorrendo sobre as matérias compreendidas no âmbito da jurisdição civil,
reguladas por normas do Código de Processo Civil e pelas leis extravagantes de natu
reza processual civil, Barbosa Moreira ressalta o seu caráter residual e a razão que
faz do Direito Processual Civil um Direito Processual comum.
5
DINAMARCO. Instituições de direito processual civil, v. 1, p. 383.
6
LIEBMAN. Manual de direito processual civil, v. 1, p.14.
184 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014
Conforme diz:
7
MOREIRA, José Carlos Barbosa. As bases do direito processual civil. In: MOREIRA. Temas de direito processual:
primeira série, p. 3, 4.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014 185
A referência feita pelo citado artigo à jurisdição civil, como abrangente da con-
tenciosa e voluntária, é imprecisa e defeituosa.
O que o Código chama de jurisdição voluntária não constitui atividade jurisdicional
e não se expressa por meio do processo.8
Constitui atividade administrativa, que se exerce por meio de mero procedimento,
do qual está ausente a lide e o contraditório.
O Direito Processual Civil não se esgota no Código de Processo Civil, que siste-
matiza as suas normas, mas compreende, também, a legislação extravagante, como
a do Mandado de Segurança, da Ação Civil Pública, da Ação Popular, do Juizados
Especiais Cíveis, disciplinados na Lei nº 9.099, de 26.09.1995, entre outras.
Abrange toda legislação de índole processual que não se refira à matéria sujeita
à jurisdição penal e às jurisdições especiais, que, no sistema jurídico brasileiro são a
do trabalho, a eleitoral e a militar.
De igual modo, o Direito Processual do Trabalho contém princípios e normas
que regem o exercício da jurisdição especial do trabalho e o processo do trabalho.
Suas normas estão sistematizadas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)
e se estendem, também, pela legislação extravagante, de índole processual e maté-
ria sujeita à jurisdição especial do trabalho, como, por exemplo, a Lei nº 5.584, de
26.06.1970.
O Direito Processual Civil e o Direito Processual do Trabalho submetem-se aos
princípios constitucionais da prestação da jurisdição, do contraditório, da ampla defesa,
do devido processo legal, da fundamentação das decisões.9 Ambos possuem alguns
princípios e normas de conteúdos praticamente idênticos, como, por exemplo, o prin-
cípio dispositivo, que exige a iniciativa da parte na busca da tutela jurisdicional (com
exceção da previsão do art. 856 da CLT, que trata do Dissídio Coletivo suscitado pelo
Presidente do Tribunal Regional do Trabalho em caso de greve), o princípio inquisi-
tório, que confere ao Juiz a liberdade de impulsionar o processo, da oralidade, da
celeridade processual, da instrumentalidade das formas, que impede a pronúncia da
nulidade quando o ato alcança a sua finalidade e não há prejuízo, da não reformatio
in peius, do convencimento racional do Juiz.
Possuem princípios e normas que, embora compareçam nos dois campos, são
mais abrangentes ou mais acentuados no Direito Processual do Trabalho, como, por
exemplo, o da oralidade, o do jus postulandi exercido pela própria parte, restrito no
Direito Processual Civil às causas submetidas ao Juizado Especial Civil (art. 9º, da Lei
nº 9.099/95), o da conciliação.
8
BARBI. Comentários ao Código de Processo Civil, v. 1, p. 10-13; ALVIM. Manual de direito processual civil,
p. 1-15.
9
Quanto aos princípios do Direito Processual do Trabalho, ver: ALMEIDA. Manual de direito processual do tra
balho, p. 36-86 e NASCIMENTO. Curso de direito processual do trabalho, p. 58-66.
186 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014
I - Disposições Preliminares
II - Processo em geral
III - Dissídios individuais
IV - Dissídios Coletivos
V - Execução
VI - Recursos
VII - Aplicação de penalidades
VIII - Disposições finais
Essa matéria está contida nas disposições dos artigos 763 a 910, da CLT.
A disciplina processual da CLT não é extensa. Ao contrário, é bem restrita,
limitando-se a cento e quarenta e sete artigos.
A que se encontra na legislação extravagante também é bem sucinta.
Naturalmente, não se pretende deter na análise de cada um dos artigos, o que
escaparia ao propósito inicialmente delineado.
Para o objetivo exposto, interessa mais imediatamente uma análise, ainda que
breve, do sentido e do alcance das normas do art. 763, que define a fonte principal
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014 187
do Processo do Trabalho, e o art. 769, que trata das lacunas do Processo do Trabalho
e da fonte supletiva, a ser aplicada no procedimento de integração.
O art. 763, da CLT, assim dispõe:
Art. 769. Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte
subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for
incompatível com as normas deste Título.
O dispositivo legal indica o meio pelo qual devem ser preenchidas as lacunas do
Direito Processual do Trabalho.
A CLT elegeu, no art. 763, suas normas processuais como fonte principal na
regência do Processo do Trabalho e, no art. 769, indicou o Direito Processual comum,
que, por exclusão da matéria penal é o Direito Processual Civil, como fonte subsidiá-
ria, naquilo que não seja incompatível com suas normas processuais, para a solução
dos casos omissos.
O sentido e o alcance das duas disposições do Direito Processual do Trabalho,
citadas, assim como a extensão de sua obrigatoriedade, bem como as balizas de
seus limites, surgem, claramente, quando se busca compreendê-los com o auxílio
das aquisições da teoria das fontes do Direito.
188 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014
10
PEREIRA. Instituições de direito civil, v. 1, p. 55-59.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014 189
A leitura atenta do citado artigo mostra que ele não contém norma de natureza
processual.
Suas disposições se referem ao conteúdo das decisões, portanto, ao direito
material, ou substancial, aplicado.
Anote-se, também, que o art. 8º, da CLT, refere-se às atividades das Autoridades
administrativas e da Justiça do Trabalho, que têm atribuições e funções distintas, não
possuindo, as primeiras, competência jurisdicional.
Mesmo que as Autoridades administrativas, no exercício do poder de fiscalizar
a observância da legislação trabalhista, sejam competentes para aplicar multas, a
última palavra sobre a legalidade e a licitude do resultado dessa atribuição, em caso
de conflito, caberá sempre ao Poder Judiciário, no exercício da função jurisdicional.
A jurisprudência, a analogia, a equidade, os princípios gerais do Direito, princi-
palmente do Direito do Trabalho, os usos e costumes, o direito comparado, na dicção
do citado artigo, são fontes secundárias, que podem ser invocadas para cobrir as
lacunas da lei ou das normas contratuais, na esfera do direito material do trabalho.
Ressalve-se que as fontes do Direito do Trabalho vão além da enumeração da
CLT e a sua hierarquia é menos rígida do que a do Direito comum.11
11
DELGADO. Curso de direito do trabalho, p. 177.
190 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014
De todo modo, o parágrafo único do art. 8º, ao preconizar que o Direito comum
será fonte subsidiária do Direito do Trabalho, completando o caput do artigo, fortalece
ainda mais o convencimento de que os meios previstos naquele dispositivo, para
suprir a falta de disposições legais e contratuais, são fontes secundárias do Direito
material do Trabalho, e não do Direito Processual do Trabalho.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014 191
12
BOBBIO. Teoria do ordenamento jurídico, p. 140.
192 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014
Essa disposição, que proíbe o Juiz de se eximir de julgar e que exige que o julga-
mento se baseie em norma e em recursos consagrados no sistema jurídico, encontra
13
BOBBIO. Teoria do ordenamento jurídico, p. 144.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014 193
paralelo no art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil, que trata das lacunas e dos
meios adotados para seu preenchimento.
Encontra, também, correlação no art. 8º da CLT, que se remete às fontes que
deverão fundar a decisão, em caso de lacunas, indicando a jurisprudência, a analo-
gia, a equidade, os princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito
do trabalho, os usos e costumes, o direito comparado, e, como fonte subsidiária, o
Direito Civil, quando não for incompatível com os princípios fundamentais do Direito
do Trabalho.
Entretanto, é necessário ressaltar que as normas de direito material que indi-
cam e delimitam as fontes que devem ser aplicadas nas decisões não se confundem
com as normas de natureza processual.
Há relações, e não identidade, entre o Direito Processual, enquanto disciplina o
exercício da jurisdição e do processo, considerado como o procedimento que se realiza
em contraditório na preparação do provimento, e o Direito Material ou substancial,
que é exatamente o concretizado pelo provimento, enquanto ato imperativo estatal.
O fato de o Juiz ser obrigado a decidir as controvérsias que lhe são apresenta-
das com base em normas do sistema jurídico não significa que ele possa escolher
as normas processuais que irá aplicar no curso do procedimento preparatório do
provimento.
O Magistrado, como órgão da jurisdição, não pode exercer uma faculdade de
escolha que não possui.
Não se pode ignorar que, no Direito do Trabalho, tem ampla aceitação a tese da
prevalência da norma mais favorável, aferida com base na teoria da acumulação ou
na teoria do conglomerado.14
Não cabe, todavia, o transplante dessas teorias para o campo do Processo.
As normas processuais são imperativas e esse caráter deve ser sublinhado,
porquanto o exercício jurisdicional é o exercício de uma função e de um poder estatal,
que se exerce com a participação das partes.
Para que a competência para julgar, que importa no exercício de um poder auto-
rizado por normas jurídicas, se cumpra no quadro legal, é preciso que a função juris-
dicional se exerça nos limites das normas jurídicas instituídas para sua disciplina, a
fim de que a aplicação do Direito não se confunda com um ato meramente arbitrário.
14
BARROS. Curso de direito do trabalho, p. 129-132.
194 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014
Não é lícito ao Juiz transplantar uma norma processual feita para disciplinar o
exercício de uma jurisdição para outra jurisdição diversa, sem autorização de norma
do sistema.
Não pode o Juiz abandonar um instituto do Direito Processual do Trabalho ou as
normas que regem as etapas do Processo do Trabalho, para aplicar instituto ou normas
do Direito Processual Civil.
Se o fizer, o Magistrado não estará aplicando o Direito Processual Civil como
fonte subsidiária, mas, sim, como fonte principal.
Estará, desse modo, invertendo a teoria das fontes, para mudar a sua hierarquia.
No sistema jurídico brasileiro, as fontes legisladas são hierarquizadas.
Para a aplicação subsidiária do Direito Processual Civil, o primeiro requisito é a
existência da lacuna.
Não basta, portanto, que o instituto do Direito Processual Civil seja harmônico
e compatível com os princípios do Direito Processual do Trabalho, para que tenha
aplicação no processo do trabalho.
Se o Julgador abandonar o instituto do Direito do Trabalho existente para aplicar
o instituto do Direito Processual Civil, por considerá-lo mais adequado, por ensejar
maior celeridade, por ser mais condizente com os princípios do Direito do Trabalho,
estará, por certo, criando uma lacuna que não existe no Direito positivo, estará decla-
rando, ainda que tacitamente, uma lacuna ideológica, que, como se viu, baseia-se na
comparação do direito existente com o direito ideal.
É preciso não perder de vista a necessária separação entre normas de direito
processual e normas de direito material.
Assim, se é possível dizer que o direito material do trabalho protege o hipossu-
ficiente, a mesma afirmação, apesar de abalizadas opiniões em contrário,15 não pode
ser feita no campo do exercício da jurisdição e do processo.
O Direito Processual do Trabalho pode conter normas que sejam mais compa-
tíveis com a posição das partes, como, por exemplo, a das consequências do não
comparecimento do Reclamante ou do Reclamado à audiência inaugural, ou a da
distribuição do ônus da prova.
É uma opção lógica da legislação, no equilíbrio da atuação das partes, no pro-
cesso, quando ela puder ser afetada por circunstâncias extraprocessuais.
Sempre que houver a intenção de se promover, no processo, o equilíbrio que
falta nas relações sociais, a providência deve vir consagrada em lei, para compor um
modelo de processo destinado a todos os jurisdicionados.
Contudo, se o exercício da jurisdição devesse se fazer para beneficiar uma
das partes, sem apoio em norma jurídica preexistente na cadeia do procedimento,
15
ALMEIDA. Manual de direito processual do trabalho, p. 27.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014 195
11 Conclusão
Ao Juiz não cabe recriar o sistema jurídico, segundo seus valores pessoais.
No exercício da jurisdição, ele deve observar o dever de imparcialidade, atuando
de acordo com o modelo legal de processo e com as normas processuais.
A esse propósito, é oportuno recordar a sempre preciosa lição de Dinamarco:
16
DINAMARCO. Instituições de direito processual civil, v. 1, p. 337.
196 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014
Artigo 10 – Todos, em plena igualdade, têm direito a que sua causa seja
ouvida, equitativamente e em público, por um tribunal independente e
imparcial, que decidirá sobre os seus direitos e as suas obrigações, ou
sobre qualquer acusação penal, que lhes seja feita.
Referências
ALMEIDA, Isis. Manual de direito processual do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 1993.
ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985-1986.
BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1992. v. 1.
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 4. ed. São Paulo: Ltr, 2008.
BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Brasília: Editora Universidade de Brasília; São
Paulo: Polis, 1989.
CARNELUTTI, Francesco. Como se faz um processo. Rio de Janeiro: Editora Minelli, 2002.
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria
geral do processo. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 7. ed. São Paulo: LTr, 2008.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros,
2009. v. 1.
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.
LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 1984. v. 1.
MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 1985-1986.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: primeira série. 2. ed. São Paulo:
Saraiva, 1988.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito processual do trabalho. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1992.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004. v. 1.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 181-197, jan./mar. 2014 197
Resumo: O presente trabalho tem por escopo estudar o regime das medidas de urgência no futuro Código
de Processo Civil Brasileiro (Projeto de Lei do Senado nº 166/2010), à luz das garantias constitucionais
da ação, calcado na efetividade da tutela jurisdicional e na duração razoável do processo. Destarte, faz-se
uma análise dos institutos da tutela de urgência e de evidência previstas no atual Projeto, cotejando-os
com os institutos da medida cautelar e de antecipação de tutela do atual CPC.
Palavras-chave: Tutela de urgência. Tutela de evidência. Medida cautelar. Antecipação de tutela. Efetividade.
Futuro CPC.
Sumário: Noções introdutórias – 1 Garantia constitucional da ação e tutela jurisdicional – 2 O futuro Código
de Processo Civil (Projeto de Lei no Senado nº 166/2010) – 3 Tutela de urgência – 4 Tutela de evidência
– Conclusões preliminares – Referências
Noções introdutórias
Com as mudanças sociais advindas de uma sociedade moderna, dinâmica e
ágil, o homem contemporâneo precisa se adaptar e, constantemente, atualizar seus
métodos de controle social. O direito, como instrumento regulador de condutas inter-
subjetivas, igualmente deve acompanhar essas mudanças, de modo a se manter
eficaz e continuar a refletir as relações sociais.
Pela atividade jurisdicional, a sociedade aguarda sempre do magistrado — ao
qual está incumbida, preponderantemente, a função de julgar — a entrega de resul-
tados úteis àqueles que procuram no Estado a solução de seus conflitos. Em última
análise, todos esperam, ao buscar uma tutela jurisdicional, a garantia de que seus
direitos serão preservados, não violados por outrem. A cada dia, requer-se uma pres-
tação jurisdicional mais ágil, mais eficaz e efetiva, do contrário esta se torna inútil
para garantir aqueles direitos.
A partir de uma análise da evolução histórica das cautelares no sistema jurí-
dico, Ovídio Batista afirmou que as técnicas de sumarização que importem execução
provisória:
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014 199
1
SILVA. Do processo cautelar, p. 15.
2
Para Willis Santiago Guerra Filho, a garantia do acesso à justiça exige também uma efetividade social da
prestação de tutela judicial (Teoria processual da Constituição, p. 40).
200 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014
3
DINAMARCO. Instituições de direito processual civil, v. 1, p. 114-115.
4
BEDAQUE. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização),
p. 64-65.
5
Napoleão Nunes Maia Filho recorda que a garantia constitucional de acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV) não é
mais entendida (e não pode mais ser entendida) como se identificando apenas com o tradicional direito de ação
na sua concepção clássica, mas sim com a objetiva obtenção de provimento judicial útil e tempestivo, daí se
imporem a necessária revisão e o redimensionamento de todos os institutos processuais e dos procedimentos
que de qualquer modo repercutem ou interessam à efetivação daquela mesma garantia (Estudo sistemático da
tutela antecipada, p. 200).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014 201
6
CASTRO JÚNIOR. Eficiência jurisdicional: a razoável duração dos procedimentos frente às garantias funda
mentais, p. 93.
7
VIANA. Da duração razoável do processo. Revista Dialética de Direito Processual, p. 53-68.
202 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014
de recurso orçamentário destinado ao Poder Judiciário, a fim de que ele possa fazer
frente às suas necessidades; b) alterações estruturais no Poder Judiciário, principal-
mente no tocante à distribuição de competência; c) a conscientização por parte do
Estado-Administração de que o processo não constitui mecanismo para protelar o
cumprimento de suas obrigações.8
Apesar de serem providências absolutamente necessárias, elas estão fora do
alcance da doutrina processual. O máximo que se pode fazer nesta sede é chamar
a atenção dos responsáveis para as verdadeiras causas do mau funcionamento da
Justiça e da ineficiência do sistema.
Dentro dos limites e das possibilidades dos juristas, o estudo, a criação e o
desenvolvimento de técnicas e meios adequados a uma tutela jurisdicional mais efi-
caz e útil são as providências passíveis de execução. Ocorre que, por mais que sejam
desenvolvidas técnicas processuais modernas e eficientes, é necessário aprimora-
mento na própria estrutura (humana e física) do aparelho estatal que presta a tutela
jurisdicional. A simples reforma do Código de Processo Civil não se mostra suficiente
para tornar o sistema mais eficiente, caso os instrumentos processuais modernos
não encontrem condições favoráveis para sua aplicação.
8
De acordo com Gérson Marques, o problema do Judiciário vai além de sua estrutura, pois este Poder vive uma
crise ética. Segundo ele, “a eficácia de suas decisões, a tutela efetiva da prestação jurisdicional e a celeridade
do processo não dependem apenas do número de juízes. O agigantamento humano nos órgãos judiciários
constitui apenas um fator voltado a superar os problemas emergenciais e superficiais da instituição, mas
não é suficiente. [...] Enfim, parece-nos inconteste a necessidade de aprimorar a formação dos magistrados,
conscientizando-os do importante papel ao qual está institucionalmente fadado o Judiciário e, ao mesmo
tempo, estimulando a aplicação ética da norma dentro de uma perspectiva de justiça” (O Supremo Tribunal
Federal na crise institucional brasileira, p. 123).
9
A importância do fator tempo no desenvolvimento do processo foi muito bem delineada por Napoleão Maia
Filho, que destacou ser o problema do tempo a mola propulsora do principal motivo da crise da justiça
brasileira (Estudo sistemático da tutela antecipada, p. 95-102).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014 203
10
BEDAQUE. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização),
p. 25-26.
11
LOPES. Tutela antecipada no processo civil brasileiro, p. 58-59.
12
Segundo Alexandre Mota Brandão, o novo CPC pretende romper o modelo de tutela de urgência atualmente vigente
— semelhante ao que vigora na Itália, abandonando a ideia de autonomia da função cautelar e aproximando-se
do modelo alemão (A tutela de urgência e o novo Código de Processo Civil. Revista Jurídica, p. 5).
13
BARROSO. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito (o triunfo tardio do direito constitucional no
Brasil). Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE).
204 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014
14
Corroborando a mesma ideia do PLS nº 166/2010, Alexandre Henrique Tavares Saldanha afirma que a tutela
jurisdicional das situações emergenciais tende a ficar, ao menos sistematicamente, mais organizadas (Da
recorribilidade das decisões denegatórias de liminares inaudita altera pars no novo Código de Processo Civil.
In: DIDIER JR. (Org.). Projeto do novo Código de Processo Civil: 2ª série: estudos em homenagem a José
Joaquim Calmon de Passos, p. 38).
15
RODRIGUES. Elementos de direito processual civil, v. 2, p. 179.
16
Demetrius Lopes Ramscheid alerta que, apesar da aparente extinção do livro do processo cautelar, alguns
dos procedimentos específicos foram deslocados para outras seções do código, a exemplo da exibição de
documento (arts. 382 a 390, PLS nº 166/2010) (Anteprojeto do novo Código de Processo Civil: tutela de
urgência e tutela à evidência).
17
A preocupação pela degeneração dos denominados provvedimenti d’urgenza (medidas de urgência), com a
inclusão de uma função antecipatória, já foi manifestada por Liebman na década de 1980, que alertava para o
desvirtuamento do processo cautelar pelo seu emprego indiscriminado. Disse o jurista italiano: “Già si vedano
gravi fenomini degenerativi affiorari nel corpo del processo e addiritura fuori di esso; cito ad esempio l’uso di
servirsi dei procedimenti d’urgenza dell’art. 700 C.P.C. fuori del loro ambiente naturale, i qualidone strumenti
eccezionale di tutela preventiva e provvisoria tendono a trasformarsi in provvedimenti antecipatori e sostitutivi
delle decisione finale” (LIEBMAN, Enrico Tullio. Per un nuovo Codice di Procedura Civile. Rivista di Diritto
Processuale, 1982 apud SILVA. Do processo cautelar, p. 2-3).
18
PINHO. Direito processual civil contemporâneo, v. 1, p. 500.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014 205
3 Tutela de urgência
3.1 Conceito
Pode-se entender as tutelas de urgência, nesse contexto, como “o conjunto de
técnicas processuais voltadas à resolução das situações intersubjetivas que deman-
dam rápida solução sob pena de se tornar inútil ou impossível a proteção pleiteada
jurisdicionalmente”.19
O exercício da função jurisdicional é pautado num conjunto de normas instituído,
inicialmente, pelo legislador constituinte — através dos princípios processuais cons-
titucionais — e pelo legislador ordinário — a partir de um sistema processual comum
aplicável à maioria dos casos. Ocorre que a técnica processual comum e ordinária
nem sempre é meio adequado à solução de todas as questões postas à apreciação
jurisdicional.
Nalguns casos, há situações peculiares que merecem pronta resposta do Poder
Judiciário, sob pena de esta prestação estatal se tornar inútil. Assim, foram realiza-
das modificações, com a introdução de institutos processuais e técnicas a serviço da
efetividade do processo, v.g., as tutelas de urgência. Percebe-se que tais mudanças
foram e continuam sendo essenciais para que a função jurisdicional atinja seu objetivo
de fornecer tutela jurídica eficaz e em tempo razoável, consoante estabelece o art. 5º,
inciso LXXVIII, da Constituição Federal.
19
FRIEDE; KLIPPEL; ALBANI. A tutela de urgência no processo civil brasileiro, p. 6.
206 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014
se desenvolve, seja em tempo normal, seja de forma patológica, tem-se como regra
a impossibilidade de que as partes usufruam quaisquer efeitos sociais positivos que
dali podem emanar.20
Com base nessa constatação, a espera do jurisdicionado pela prestação juris-
dicional, pela via ordinária, seria suficiente para a tutela requerida? Ou necessita ele
de uma efetiva e rápida tutela, sob pena de se tornar inútil o processo? Pelo que se
demonstra, o próprio direito material alegado poderá perecer sem uma apreciação
urgente do pedido, tornando sem qualquer efeito social a decisão judicial.
Em verdade, as tutelas de urgência são técnicas processuais aplicadas a fim de
mitigar o problema do tempo no processo, propiciando soluções eficazes às partes
que demandem (todos ou alguns) dos efeitos antes do momento processual adequado.
A instituição dessas medidas, vale salientar, não representam qualquer violação ao
contraditório ou à ampla defesa, mas, pelo contrário, são verdadeiros meios garanti-
dores do princípio constitucional de acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CF/88).
Denomina-se de técnicas de urgência o conjunto desse aparato processual,
criado para o fim de prover ao jurisdicionado a tutela de urgência, ou seja, a proteção
jurisdicional efetiva nos casos em que a demora do processo extinga sua utilidade e
a do próprio direito material. De acordo com Reis Friede, há duas formas ou técnicas,
que permitem a implementação da tutela de urgência:
1. A primeira forma se dá pela inversão da ordem lógica dos atos processuais,
antecipando-se à “declaração da norma concreta aplicável ao caso” a “frui-
ção de um ou de algum de seus efeitos práticos”. Inverte-se, pois, a sequên-
cia cognição-efetivação, antecipando-se o segundo componente do binômio.
Noutros termos, antecipa-se um dos efeitos práticos da tutela jurisdicional
requerida ao Estado-juiz. Chama-se essa técnica de “antecipação dos efeitos
práticos da tutela jurisdicional” ou, simplesmente, tutela antecipada, tutela
antecipatória ou antecipação de tutela;
2. Por outro modo, ao invés de se antecipar o exercício do direito ou de efeito
deste, defere-se ao jurisdicionado uma proteção que, embora não permita a
ele exercer seu direito material, o resguarda, para que, no momento oportu-
no, possa ser exercido. Esse segundo conjunto de técnicas de urgência se
caracteriza pelo deferimento à parte interessada de uma garantia, diversa
da tutela jurisdicional de direito material que veio ao processo buscar, mas
que permitirá que, no momento procedimental adequado, ainda seja útil a
providência jurisdicional pleiteada. Essa espécie de proteção jurisdicional de
urgência é conhecida pelo nome de tutela cautelar e sua finalidade não é
permitir, desde logo, que o autor usufrua da tutela de direito material que
20
FRIEDE; KLIPPEL; ALBANI. A tutela de urgência no processo civil brasileiro, p. 8.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014 207
veio ao processo obter; é, por outro lado, uma forma de garantir a utilidade
do processo, seja em sua fase cognitiva, seja na executiva, e, portanto, de
modo mediato, do próprio direito material em debate.21
3.3 Modalidades
Segundo a doutrina majoritária, a tutela de urgência pode ser descrita como o
gênero que engloba duas espécies de instrumentos criados pelo legislador proces-
sual para prover tutela jurisdicional nas situações em que o tempo que o processo
demora a se desenvolver puder ocasionar perigo de inutilidade da atividade jurisdicio-
nal e até mesmo de perda do direito material deduzido em juízo. Tais espécies são a
tutela antecipada e a tutela cautelar.22
Conforme José Miguel Garcia Medina, pode-se dizer que, no direito brasileiro,
existem três modalidades de tutela de urgência, que possuem características simila-
res, mas têm estruturas sensivelmente distintas, e que podem ser assim visualiza-
das: a) tutela cautelar, antecedente ou incidental; b) antecipação dos efeitos (diretos
ou indiretos) da tutela; c) tutela de urgência satisfativa, com ou sem realização de
cognição exauriente sucessivamente, no mesmo processo.23
Seguindo a mesma linha tripartite das tutelas de urgência, Humberto Dalla
Bernardina de Pinho assevera que essas tutelas se manifestam nas formas ante-
cipatória (natureza satisfativa), cautelar (natureza instrumental, não satisfativa)24 e
inibitória (natureza preventiva — pleiteada antes da ocorrência de um dano).25
No Projeto de Lei do Senado nº 166/2010 (futuro CPC), o art. 269 deixa trans-
parecer de modo cristalino apenas duas modalidades das tutelas de urgência: medi-
das satisfativas e medidas cautelares:
21
FRIEDE; KLIPPEL; ALBANI. A tutela de urgência no processo civil brasileiro, p. 9-10.
22
A jurisprudência dominante do STJ aplica a distinção entre as medidas cautelares e antecipatórias de tutela,
demonstrando a sua adesão ao entendimento adotado pela doutrina majoritária. Nesse sentido: AgRg no
REsp 503.211/PR, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, DJ, 26 nov. 2007; REsp nº 202.740/PB, Rel. Min.
Castro Filho, 3ª Turma, DJ, 07 jun. 2004. Por outro lado, para J. E. Carreira Alvim, a “antecipação de tutela,
tanto quanto a liminar cautelar, são espécies do gênero provimento antecipado, apresentando a característica
comum de serem concedidas fora daquele momento normalmente adequado ao reconhecimento do direito,
que é a sentença” (Tutela antecipada, p. 29).
23
MEDINA. Código de Processo Civil comentado: com remissões e notas comparativas ao projeto do novo CPC,
p. 260. Nesse mesmo sentido é a doutrina de Ovídio Araújo Baptista (Do processo cautelar, p. 86-87); José
Roberto dos Santos Bedaque [Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa
de sistematização), p. 218 et seq.]; Rogério Aguiar Munhoz Soares (Tutela jurisdicional diferenciada: tutelas
de urgência e medidas liminares em geral, p. 172 et seq.); Andrea Proto Pisani (Lezioni di diritto processuale
civile, p. 637 et seq.); Federico Carpi, Vittorio Colesanti e Michele Taruffo (Commentario breve al Codice di
Procedura Civile, p. 2111 et seq.).
24
Para Barbosa Moreira, a provisoriedade é uma das notas dominantes da medida cautelar (O novo processo
civil brasileiro, p. 311).
25
PINHO. Direito processual civil contemporâneo.
208 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014
26
LOPES. Tutela antecipada no processo civil brasileiro, p. 235.
27
Segundo Reis Friede, a medida liminar é “somente um dos veículos processuais por meio dos quais se pode
determinar uma tutela ou proteção a situação urgente”. Por esta razão, não se deve confundir as tutelas de
urgência com as medidas liminares, nem que estas são espécie daquelas (FRIEDE; KLIPPEL; ALBANI. A tutela
de urgência no processo civil brasileiro, p. 43).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014 209
28
Cf. STJ. AgRg no REsp nº 456.633/MG, Rel. Min. Paulo Medina, 6ª Turma, DJ, 1º ago. 2006.
29
MARINONI. A antecipação da tutela na reforma processual, p. 59-61; GONÇALVES. Novo curso de direito pro-
cessual civil, v. 1, p. 300-301.
210 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014
propõe que a antecipação de tutela deve ser analisada em tópico próprio, depois da
fundamentação. Isso porque, nesse momento, o julgador já superou todas as preli-
minares que poderiam obstaculizar o julgamento da demanda e já analisou todas as
questões fáticas e jurídicas trazidas pelas partes.30
Por último, saliente-se que o exame do pedido de tutela de urgência também
pode ser feito em grau de recurso. Esta medida se justifica, tendo em vista o próprio
objetivo desta tutela diferenciada: garantir a efetividade da prestação jurisdicional —
e esta vale em qualquer grau de jurisdição. Enquanto não solucionada definitivamente
a lide, o jurisdicionado pode pleitear a fruição ou a garantia de seu direito subjetivo,
não havendo qualquer razão para se obstaculizar esta tutela.
No Projeto de Lei do Senado nº 166/2010 (futuro CPC), os temas referentes ao
momento processual para o deferimento das tutelas de urgência e de evidência, bem
como o recurso adequado para impugnar a decisão que delas tratar, estão dispostos
nos arts. 271 a 273, verbis:
Numa análise preliminar, algumas conclusões podem ser inferidas: (i) o recurso
cabível da decisão que conceder ou negar a tutela de urgência ou a tutela de evidên-
cia é o agravo de instrumento; (ii) toda decisão deve ser fundamentada, sobretudo a
que envolver as tutelas de urgência e de evidência; (iii) a competência do juízo para
apreciar tais medidas é o mesmo daquele que analisará o pedido principal, conforme
os procedimentos dos arts. 282 e 283 do Projeto.
3.5 Procedimento
No atual CPC vigente, os procedimentos são tão variados quantas são as medidas
de urgência previstas no Código. Assim, tem-se o tratamento da tutela antecipada no
art. 273; já o procedimento das cautelares está previsto nos arts. 796 a 889 do CPC.
No Projeto de Lei do Senado nº 166/2010 (futuro CPC), o procedimento das
medidas de urgência vem sendo tratado, de forma conjunta e simplificada, nos
30
JORGE NETO. Sentença cível: teoria e prática, p. 234.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014 211
212 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014
3.6 Execução
Uma vez concedida uma tutela de urgência, seja antecipando os efeitos do pedi-
do ou mesmo resguardando uma situação fática/jurídica futura, a fim de evitar lesão
irreparável ou de difícil reparação à parte, como qualquer decisão judicial, espera-se
o seu natural cumprimento. No entanto, isso nem sempre ocorre, razão pela qual é
necessário garantir a efetividade da prestação desta tutela jurisdicional.
O não cumprimento espontâneo pela parte contra a qual fora proferida a decisão
— via de regra, de cunho condenatório — gera uma prerrogativa para o Estado-juiz de
invadir sua esfera patrimonial, o que se chama de execução forçada.32 A satisfação
da obrigação, nestes termos, é de certo modo uma sanção imposta ao devedor que
não atendeu o comando estatal.
Partindo da premissa da provisoriedade das tutelas de urgência,33 a execução
da decisão judicial que as concedeu, de acordo com Reis Friede, dá-se nos moldes
do art. 475-N, inciso I, e art. 475-O, do atual CPC, verbis:
31
MARINONI; MITIDIERO. O projeto do CPC: críticas e propostas, p. 111.
32
Marcelo Lima Guerra trata da polêmica distinção entre “processo de execução” e “execução forçada”, porém
conclui que a distinção tem valor meramente terminológico, não havendo grave prejuízo em se utilizar como
sinônimos (como faz o CPC brasileiro) (Execução forçada: controle de admissibilidade, p. 48).
33
Para José Roberto dos Santos Bedaque, a provisoriedade da cautelar está ligada ao seu escopo, enquanto que
a da tutela sumária guarda relação com a cognição [Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de
urgência (tentativa de sistematização), p. 271].
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014 213
34
FRIEDE; KLIPPEL; ALBANI. A tutela de urgência no processo civil brasileiro, p. 54.
35
Cf. STJ. REsp nº 653.381/RJ, Rel. Min. Nancy Andrigui, 3ª Turma, Julg. 21.02.2006.
214 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014
e a tutela cautelar, sob a égide do atual CPC, não se fará mais necessária, tendo
em vista que, no Projeto, incorporaram-se na sistemática das tutelas de urgência as
espécies: cautelar e satisfativa.
4 Tutela de evidência
4.1 Conceito
A tutela de evidência consiste no direito evidenciado ao juízo por meio de pro-
vas, sendo desnecessário e custoso às partes esperar o deslinde da causa para ver
satisfeito um direito evidente desde o início da lide.36
São situações em que a tutela atua mais que o fumus boni juris: uma probabili-
dade de certeza do direito alegado, pois a evidência exclui a cognição sumária, já que
a própria demanda se apresenta completa, mantendo-se uma margem de erro comum
à essência do julgamento humano em um processo cuja cognição foi exauriente. Essa
forma de tutela pode até confundir-se com o mandado de segurança, em face do
direito líquido e certo, mas a tutela de evidência não se restringe apenas a atos de
autoridades, mas abrange também atos de particulares.
36
FUX. Tutela de segurança e tutela de evidência.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014 215
37
MEDINA. Código de Processo Civil comentado: com remissões e notas comparativas ao projeto do novo CPC,
p. 261.
38
Nessa mesma linha de entendimento, estão Reis Friede, Rodrigo Klippel e Thiago Albani (A tutela de urgência
no processo civil brasileiro, p. 159-162) e José Miguel Garcia Medina (Código de Processo Civil comentado:
com remissões e notas comparativas ao projeto do novo CPC, p. 263).
216 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014
têm no sistema atual, ainda que de coisa julgada não se trate (vide art. 283, parte
final, PLS nº 166/2010).
Além das suas hipóteses legais de cabimento, a principal diferença entre a
tutela de urgência e a tutela de evidência consiste no fato de que, em relação a esta
não há a necessidade de demonstrar o periculum in mora, tal como ocorre na tutela
de urgência, pois se trata de situações em que a evidência do direito já se encontra
configurada nos autos. Igualmente não se deve perquirir o fumus boni juris, visto
que a ausência de defesa consistente (CPC, art. 273, II) ou de controvérsia sobre o
pedido ou parte dele (CPC, art. 273, §6º), representa, mais que a plausibilidade do
direito — autorizada por cognição superficial ou sumária —, a própria verificação de
sua existência, fundada em cognição judicial exauriente.
Por fim, como última diferença, na tutela de urgência permite-se a contrapartida
de caução real ou fidejussória (art. 276, parágrafo único, PLS); já na tutela de evidência,
as hipóteses expressas para sua concessão independem de caução (art. 278, PLS).
Conclusões preliminares
O clamor pela reforma da legislação processual civil brasileira é patente em
nossa sociedade, tanto por parte dos jurisdicionados (leigos na matéria) como dos
juristas39 (incluídos os juízes, advogados, promotores, procuradores etc.). A discus-
são preliminar colocada é se a reforma deve vir de forma ampla e geral (ou seja, um
novo código) ou deve ser pontual e cirúrgica (via minirreformas, a exemplo do que vem
sendo feito desde a década de 1990).
Se a filosofia do PLS nº 166/2010 é a de evitar mudanças bruscas ou radicais,
então algumas modificações em pontos específicos do atual CPC poderiam surtir
o mesmo efeito. Contudo, isso não é o que se deseja pelos autores do Projeto em
comento. A despeito da manutenção da estrutura geral do código, pretende-se algo
maior: implantar uma nova filosofia processual, pautada na organicidade, simplicidade,
segurança jurídica e efetividade processual.
No que diz respeito às tutelas de urgência e de evidência, merece encômios o
Projeto, notadamente nos arts. 269 a 286. Infere-se que a intenção do legislador é a de
imprimir uma maior organicidade e melhor sistematização dos institutos da tutela caute-
lar, tutela antecipada, tutela sumária e tutela de urgência. Cumpre salientar que o poder
conferido ao magistrado para garantir a efetividade das tutelas jurisdicionais é providên-
cia que vem sendo ampliada há décadas, através de reformas legislativas pontuais.
O PLS nº 166/2010 consagra a ampliação dos poderes concedidos aos magis-
trados na concessão de medidas destinadas à tutela de urgência e de evidência, que
39
O uso da expressão “juristas”, neste caso, é feito em substituição a “operadores do direito”, à qual tenho
profundas críticas.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014 217
Referências
ALVIM, J. E Carreira. Tutela antecipada. 5. ed. rev. e atual. Curitiba: Juruá, 2009.
BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito (o triunfo tardio
do direito constitucional no Brasil). Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador,
n. 9, mar./maio 2007. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com.br/buscarevistas.asp?txt_
busca=+Luis+Roberto+Barroso>. Acesso em: 25 out. 2012.
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de
urgência (tentativa de sistematização). 5. ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2009.
BRANDÃO, Alexandre Mota. A tutela de urgência e o novo Código de Processo Civil. Revista Jurídica,
São Paulo, v. 58, n. 401, p. 33-54, mar. 2011.
CASTRO JÚNIOR, Roberto Apolinário. Eficiência jurisdicional: a razoável duração dos procedimentos
frente às garantias fundamentais. Belo Horizonte: Arraes, 2012.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 2. ed. rev. e atual. São Paulo:
Malheiros, 2002. v. 1.
FRIEDE, Reis; KLIPPEL, Rodrigo; ALBANI, Thiago. A tutela de urgência no processo civil brasileiro.
Niterói: Impetus, 2009.
FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela de evidência. São Paulo: Saraiva, 1996.
GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2004.
v. 1.
GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria processual da Constituição. São Paulo: C. Bastos; Instituto
Brasileiro de Direito Constitucional, 2000.
GUERRA, Marcelo Lima. Execução forçada: controle de admissibilidade. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1995.
40
A preocupação com um aumento orçamentário estatal destinado ao Poder Judiciário é corroborada por
Alexandre Mota Brandão (A tutela de urgência e o novo Código de Processo Civil. Revista Jurídica, p. 2).
218 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014
JORGE NETO, Nagibe de Melo. Sentença cível: teoria e prática. Salvador: JusPodivm, 2009.
LIMA, Francisco Gérson Marques de. O Supremo Tribunal Federal na crise institucional brasileira.
Fortaleza: ABC, 2001.
LOPES, João Batista. Tutela antecipada no processo civil brasileiro. 4 ed. rev., atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
MAIA FILHO, Napoleão Nunes. Estudo sistemático da tutela antecipada. Fortaleza: Imprece, 2003.
MARINONI, Luiz Guilherme. A antecipação da tutela na reforma processual. São Paulo: Malheiros, 1995.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do processo de conhecimento. 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. O projeto do CPC: críticas e propostas. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2010.
MEDINA, José Miguel Garcia. Código de Processo Civil comentado: com remissões e notas comparativas
ao projeto do novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 22. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:
Forense, 2002.
PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Direito processual civil contemporâneo. 4. ed. São Paulo:
Saraiva, 2012. v. 1 - Teoria geral do processo.
RAMSCHEID, Demetrius Lopes. Anteprojeto do novo Código de Processo Civil: tutela de urgência
e tutela à evidência. Disponível em: <http://www4.jfrj.jus.br/seer/index.php/revista_sjrj/article/
view/290>. Acesso em: 04 set. 2012.
RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de direito processual civil. 2. ed. rev., atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. v. 2.
SALDANHA, Alexandre Henrique Tavares. Da recorribilidade das decisões denegatórias de liminares
inaudita altera pars no novo Código de Processo Civil. In: DIDIER JR., Fredie (Org.). Projeto do novo
Código de Processo Civil: 2ª série: estudos em homenagem a José Joaquim Calmon de Passos.
Salvador: JusPodivm, 2011. v. 2.
SILVA, Ovídio A. Batista. Do processo cautelar. Rio de Janeiro: Forense, 1996.
VIANA, Juvêncio Vasconcelos. Da duração razoável do processo. Revista Dialética de Direito Processual,
São Paulo, n. 34, p. 53-68, jan. 2006.
VIANA, Juvêncio Vasconcelos. Efetividade do processo em face da Fazenda Pública. São Paulo:
Dialética, 2003.
CARVALHO, Ivo César Barreto de. Regime das medidas de urgência no futuro CPC.
Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 22, n. 85,
p. 199-219, jan./mar. 2014.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 199-219, jan./mar. 2014 219
Resumo: Este artigo teve como foco e objetivo analisar o direito de privacidade do empregado e o poder
diretivo do empregador. Através de uma pesquisa bibliográfica, priorizando autores relevantes para o pre-
sente debate, foi possível concluir que mesmo a lei reconhecendo o poder diretivo do empregador, esse
poder jamais poderá gerar dano moral ao empregado frente aos direitos de sua personalidade, direitos a
sua intimidade e proteção da vida privada; uma vez que existe, em grande parte das vezes, uma fragilidade
na figura do empregado frente ao poder diretivo do empregador, torna-se cada vez mais essencial cuidado,
boa-fé, respeito e legislações mais efetivas no tocante a essa relação empregado-empregador, principal-
mente referente aos limites do poder diretivo do empregado, devendo a lei proteger o lado mais frágil: o
empregado e sua vida privada.
Palavras-chave: Privacidade. Intimidade. Poder diretivo. Dano moral.
1 Introdução
Desde os primórdios, o homem cogita da defesa de seus valores mais íntimos e
pessoais. Entretanto, a complexidade cada vez mais acentuada das relações sociais,
com as profundas transformações por que passa a sociedade, com uma verdadeira
inversão de valores, onde há nítida prevalência do material sobre a moral, a defesa do
patrimônio moral assume maior importância, cabendo ao Direito um papel fundamental.
Neste contexto, este artigo tem como objetivo analisar o direito de privacidade
do empregado e o poder diretivo do empregador, verificando as possibilidades de
dados morais nesse cenário, gerando possíveis aspectos processuais.
A importância do tema é relevante tanto do ponto de vista jurídico quanto social,
em virtude do incremento das tensões entre capital e trabalho gerando a competitivi-
dade e alterações no cotidiano dos trabalhadores que buscam um maior reconheci-
mento profissional, igualdade e independência financeira.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 221
1
CORTIANO JUNIOR. Alguns apontamentos sobre os chamados direitos da personalidade. In: FACHIN. Repensando
fundamentos do direito civil brasileiro contemporâneo, p. 30.
2
A tipificação, no campo do Direito Penal, de diversas condutas que atentam contra os direitos da personalidade
tem garantido a efetiva tutela desses direitos na generalidade dos sistemas mundiais. O Código Penal pátrio
contempla vários delitos, contra: a vida, a honra, a liberdade individual, a segurança, a saúde, a intimidade, o
respeito aos mortos, os direitos autorais (arts. 121 a 127, 129 a 136, 138 a 140, 146, 151, 153, 154, 184,
185, 187, 189, 197, 198, 208, 210, 212, 213 a 216, 241 a 243).
3
CORTIANO JUNIOR. Alguns apontamentos sobre os chamados direitos da personalidade. In: FACHIN. Repensando
fundamentos do direito civil brasileiro contemporâneo, p. 34.
4
Cortiano Junior fala na “crise ético-existencial” que toma conta da sociedade em face do desenvolvimento
tecnológico, notadamente no campo das manipulações genéticas (In: FACHIN. Repensando fundamentos do
direito civil brasileiro contemporâneo, p. 34-35).
222 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
5
CORTIANO JUNIOR. Alguns apontamentos sobre os chamados direitos da personalidade. In: FACHIN. Repensando
fundamentos do direito civil brasileiro contemporâneo.
6
BITTAR. Os direitos da personalidade e o projeto de Código Civil brasileiro. Revista de Informação Legislativa,
p. 117.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 223
7
DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA, v. 3, p. 1321.
8
SILVA. Dicionário jurídico, v. 3, p. 1154.
9
GUIMARÃES. Dicionário técnico jurídico, p. 437.
10
SOUSA. O direito geral da personalidade, p. 14.
11
PRADO. Bem jurídico-penal e Constituição, p. 32.
224 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
12
Além de colocar a dignidade humana como um princípio fundamental da República — coexistindo, lado a lado,
com a fundamentalidade igualmente reconhecida na soberania, na cidadania, nos valores sociais do trabalho e da
livre-iniciativa —, a Constituição pátria consagrou a prevalência dos direitos humanos nas relações internacionais
mantidas pelo Estado (art. 4º, II) e dela igualmente tratou no Título VIII – Da Ordem Social, estabelecendo que
o planejamento familiar deveria fundar-se nos “princípios da dignidade humana e da paternidade responsável”
(art. 226, §7º) e que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar ao idoso (art. 230, caput) e, com
absoluta prioridade, à criança e ao adolescente (art. 227, caput), dentre outro direitos, o respeito à dignidade
(GARCIA. Dignidade da pessoa humana: referenciais metodológicos e regime jurídico. Jus Navigandi).
13
“A Constituição Federal de 1988 impôs ao Direito Civil o abandono da postura patrimonialista herdada do século
XIX, em especial do Código Napoleônico, migrando para uma concepção em que se privilegia o desenvolvimento
humano e a dignidade da pessoa concretamente considerada, em suas relações interpessoais, visando à sua
emancipação” (FACHIN; RUZYK. Um projeto de Código Civil na contramão da Constituição. Revista Trimestral
de Direito Civil).
14
RAMOS. Estudo comparado do direito da personalidade no Brasil e na Alemanha. Revista dos Tribunais, p. 19-20.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 225
15
GUHUR. Programas de televisão e pessoas com necessidades especiais: uma reflexão acerca do grotesco e da
tutela civil da dignidade humana, f. 134.
16
ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JUNIOR, Vidal Serrano, op. cit., p. 116.
17
DOTTI, René Ariel apud SILVA, José Afonso da, op. cit., p. 210.
18
TEIXEIRA; MENDES apud LISBOA. Inviolabilidade de correspondência na internet. Revista Direito Eletrônico, p. 471.
226 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
19
GEDIEL. A irrenunciabilidade a direitos da personalidade pelo trabalhador. In: SARLET (Org.). Constituição, direitos
fundamentais e direito privado.
20
NASCIMENTO. Iniciação ao direito do trabalho, p. 203.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 227
21
RODRIGUES. Novo paradigma de subordinação na relação de emprego. Revista do Tribunal Regional do Trabalho
3ª Região, p. 64.
22
Art. 2º Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade eco-
nômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço (BRASIL, 2007, p. 39).
23
Parágrafo único do art. 468, CLT.
24
MARTINS. Direito do trabalho, p. 226.
25
DELGADO. Curso de direito do trabalho, p. 628.
228 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
Tal fato não é novo, o poder é algo inerente a todas as organizações sociais desde
que o homem comportou-se com ser gregário. O poder sempre esteve sustentado pela
noção de hierarquia, e, claro, neste entendimento, o empregador que possui o capital,
os meios de produção e a organização certamente acaba por ocupar, dentro da pirâmide
social, uma hierarquia superior em relação ao obreiro, exercendo assim, aquele sobre
este, o poder em todo o seu entendimento lato.
Não obstante ser o poder levantado como elo entre todos os conceitos apre-
sentados, não se pode fugir à lembrança, e ao entendimento, de que “não se trata
de noção social de empregador, mas de noção jurídica, que se extrai de um decisivo
elemento que é a direção”.26
De fato, a função do poder levantado pelos autores quanto ao dirigismo apontado
pela CLT diz respeito à capacidade empresarial de harmonizar responsavelmente a
atividade econômica como um todo, buscando minorar riscos e majorar resultados.
Dessa forma, traz benefícios claros no sentido da preservação dos postos de trabalho
ocupados pelos obreiros. Mais uma vez, Vilhena,27 ao dispor sobre a questão, reforça
o fato quanto ao que se destina o poder:
26
VILHENA. Relação de emprego: estrutura legal e supostos, p. 209.
27
Relação de emprego: estrutura legal e supostos, p. 213.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 229
Mais uma vez nota-se a total dissonância com a ideia democrática da atualidade.
Por essa razão tal concepção igualmente perdeu seu relevo para os dias atuais.
c) Status jurídico: esta terceira vertente, que tenta explicar a natureza jurídica
do poder diretivo do empregador, também nega ou não caminha em uma direção de
maior democratização em relação à justificação do poder dado ao empregador.
28
DELGADO. Curso de direito do trabalho, p. 650.
29
SANTOS. Limites do poder disciplinar do empregador: a tese do poder disciplinar compartilhado. Revista IOB
Trabalhista e Previdenciária, p. 54.
30
DELGADO. Curso de direito do trabalho, p. 650.
230 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
Não resta dúvida que, perante um olhar mais atento, mesmo o direito-função
possui certa dificuldade de individualizar-se ante os três primeiros postulados; para
tanto é preciso lançar mão de Magano apud Delgado,34 explicando que “a diferença
reside apenas na orientação do aludido poder, que concebido como direito-função,
deve visar a satisfação do interesse não do empresário, mas da empresa”. Por essa
31
NASCIMENTO. Iniciação ao direito do trabalho.
32
DELGADO. Curso de direito do trabalho, 2006.
33
DELGADO. Curso de direito do trabalho, p. 653.
34
DELGADO. Curso de direito do trabalho, p. 655.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 231
sutil, mas importante diferença, tal concepção mais moderna é a que tem alcançado
maior aceitação como justificadora da natureza jurídica do poder diretivo do emprega-
dor. Se por um lado o art. 2º celetista cria (não só ele) o fundamento legal do poder
diretivo, no outro extremo, mas não de forma antagônica, existe também a fundamen-
tação doutrinária que irá procurar prestar as devidas sustentações teóricas com o fito
de elucidar de onde emerge o poder diretivo do empregador.35 De uma forma geral, os
autores apresentam como sendo três os elementos fundantes básicos justificadores
do poderio patronal. Alguns poucos ainda apresentam um quarto ou quinto elemen-
tos, pouco trabalhados e explorados, é bem verdade. Todas as cinco teorias serão
explanadas na sequência.
a) Teoria da propriedade privada: de forma bastante direta, esta vertente remete-se
à teoria da propriedade privada como justificadora para o poder de direção do emprega-
dor. Nascimento36 aduz desta hipótese que “o empregador manda porque é o dono”.
Certamente tal justificativa, a da propriedade privada, é mais antiga do que a própria
ideia do Direito do Trabalho, remontando ainda os tempos feudais, fato que não coa-
duna com a atualidade.
b) Teoria do institucionalismo: ao definir tal fundamento, Nascimento37 posiciona-se:
A presente teoria carrega em seu bojo características que limitam seu devido
aproveitamento no mundo contemporâneo, especificamente no direito trabalhista.
O fato de haver sido concebida na Europa Ocidental na primeira metade do século
passado trouxe necessariamente em seu ventre ideias políticas autoritárias, como o
fascismo. No entender de Furtado,38 é a observância da ordem pública, em proteção
aos interesses sociais e manutenção das instituições privadas, que possui uma fun-
ção social, que faz protuberar para uns a missão de comandar e punir e para outros o
dever de se curvar a tal hierarquia. Segundo os autores apreciados, o fundamento ora
versado também não justifica com exatidão o poder patronal, quando muito se poderia
dizer que “trata-se, na verdade, preferentemente de concepção justificadora de certo
tipo de situação de poder [...] do que uma concepção explicativa dessa situação”.39
c) Teoria contratualista: tal teoria faz coro com o ramo civilista do direito, pois
a partir da autonomia da vontade e capacidade das partes, ambas celebram entre
si o princípio da exigibilidade contratual. Tal premissa traduz-se pelo brocardo latino
35
GUNTHER; ZORNIG. O vínculo empregatício e o requisito da subordinação. Bonijuris.
36
NASCIMENTO. Iniciação ao direito do trabalho, p. 203.
37
NASCIMENTO. Iniciação ao direito do trabalho, 204.
38
FURTADO. Alteração do contrato de trabalho.
39
DELGADO. Curso de direito do trabalho, p. 641.
232 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
do pacta sunt servanda, sendo então que, a partir da celebração do pactuado, surge
dessa forma o poder diretivo do empregador. Tal tese, agora voltada especificamente
à área justrabalhista, é defendida por grande parte da doutrina especializada, como
aquela prevalecente nos dias atuais como justificadora do poder diretivo do emprega-
dor. Explanando sobre a tese, Nascimento40 explica que:
40
NASCIMENTO. Iniciação ao direito do trabalho, p. 203.
41
FURTADO. Alteração do contrato de trabalho.
42
FURTADO. Alteração do contrato de trabalho, p. 643.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 233
43
NASCIMENTO. Iniciação ao direito do trabalho, p. 204.
44
DELGADO. Curso de direito do trabalho, p. 645.
45
SIMÕES. Internet: direito do empregado x interesse do empregador. Síntese Trabalhista – Administrativa e
Previdenciária, p. 151.
234 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
bem como porque contratuais encontram na legislação civil conceitos que a elas se
aplicam, por outro lado têm assumido características que encerram a abusividade de
direito nas condutas, nas diretrizes traçadas pelo empregador, mitigando os direitos
de personalidade dos empregados. Referindo-se a disposições constitucionais quanto
a direitos de personalidade, Santos assim se manifesta: “Todas essas normas delimi-
tam o poder diretivo do empregador, mais especificamente no que respeita ao exercí-
cio de fiscalização, de controle e disciplina no exercício de seu poder empregatício”.46
Assim, de um lado tem-se que ao empregador é lícito e essencialmente necessá-
rio o poder de comando, de forma que possa concretizar a organização da empresa, e
esta atinja os fins a que se propõe. Ocorre que, diante de aspectos, valores constitu-
cionais e mesmo civis, esse poder diretivo pode ser mitigado e mesmo limitado, as-
sim como a subordinação do empregado não se configura como total e incondicional,
porque as relações empregatícias devem ser pautadas, sobretudo, por fundamentos
e princípios como dignidade da pessoa humana, solidarismo, função social, boa-fé
objetiva. O poder diretivo do empregador deverá, portanto, ser analisado sob a ótica
do abuso do direito, de forma que se verifique se sua atuação constitui-se como
abusiva ou não ante os direitos de personalidade dos empregados.
Tendo em mente o que se disse sobre a vinculação direta dos particulares aos
direitos fundamentais, na realidade prática ocorrerão casos de dúvida em relação
a qual dos particulares (se o empregado ou se o empregador) estará com a razão,
nestes casos, deverá ser realizada a ponderação, de forma a harmonizar princípios
constitucionais em colisão. O indivíduo, como trabalhador, ou seja, na qualidade de
empregado, por conta do contrato de trabalho e das características que lhe são ine-
rentes — principalmente por força da subordinação ao poder diretivo do empregado
— poderá sofrer limitações quanto aos seus direitos individuais fundamentais, entre
eles os direitos de personalidade.
Exemplos de tais colisões serão tratados em item posterior, com exemplos
práticos.
46
SANTOS. Limites ao poder disciplinar do empregador: a tese do poder disciplinar compartilhado. Revista Magister
de Direito Trabalhista e Previdenciário, p. 23.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 235
47
Critérios citados por Fernando Büscher von Teschenhausen Eberlin, ao explicar o caso de testes toxicológicos
que passaram a ser aceitos após o acidente ecológico de um petroleiro na costa do Alasca (Poder de direção do
empregador versus direito à privacidade do empregado. Revista Trabalhista – Direito e Processo, p.135-136).
48
SAVITZ. A empresa sustentável: o verdadeiro sucesso é o lucro com responsabilidade social e ambiental.
49
PAVELSKI. Assédio moral: falta de ética e prejuízo da sustentabilidade nas empresas. In: BARACAT (Coord.).
Controle do empregado pelo empregador: procedimentos lícitos e ilícitos, p. 315-316.
50
WANDELLI, op. cit., p. 69.
51
MEIRELES. Abuso do direito na relação de emprego.
236 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
52
VIANA. Direito de resistência: possibilidades de autodefesa do empregado em face do empregador.
53
Art. 483. [...] a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons cos-
tumes, ou alheios ao contrato.
54
DALLEGRAVE NETO. Contrato individual de trabalho: uma visão estrutural.
55
BARROS. Proteção à intimidade do empregado, p. 29.
56
FONSECA. Modernidade e contrato de trabalho: do sujeito de direito à sujeição jurídica.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 237
Observe-se que aqui a empresa abusou de seu direito porque agiu de forma
contrária à boa-fé objetiva, pois feriu seu dever anexo de conduta constituído pelo
sigilo, pela proteção do empregado, aplicável mesmo após a extinção contratual. A
divulgação de dados médicos e genéticos do empregado, assim como preferências
ideológicas, de consumo, bem como quaisquer outras informações obtidas pela
empresa por força do vínculo empregatício, poderá ser considerada como abuso de
direito do empregador, pelo mesmo motivo antes mencionado. Inegável que tal con-
duta, ainda, estaria violando o direito à vida privada do empregado.
Um exemplo citado pela doutrina que põe em xeque a vida privada do empregado
seria a proibição, pelo empregador, de que fosse consumido cigarro no ambiente de
trabalho. Desde que essa restrição fosse informada pelo empregador aos seus empre-
gados, em princípio nada haveria de abusivo.
Porém, se o empregador, sem avisar da regra aplicasse punição ao empregado,
como uma advertência ou suspensão, estar-se-ia diante do abuso do direito no poder
diretivo, porque violado o dever de informação consubstanciado na boa-fé objetiva.
É certo, ainda, que os avanços tecnológicos, como sistemas de áudio e vídeo, para
além de significarem apenas fiscalização ou mesmo segurança, podem ser utilizados
de forma inadequada, ferindo, por exemplo, o direito de personalidade consubstan-
ciado na intimidade do indivíduo.
A título de exemplo, deve ser referido um julgado57 do Tribunal Regional do
Trabalho de Minas Gerais, Brasil, que considerou como violação da intimidade do
indivíduo a instalação de câmeras de vídeo nas dependências do banheiro utilizado
pelos empregados. Essa conduta do empregador fere frontalmente a função social
do contrato porque limita o direito fundamental e da personalidade consubstanciado
na intimidade.
Com efeito, não se tem como justificar, nesse caso, que o espaço de trabalho
pertence ao empregador e ele tem, portanto, assegurado constitucionalmente o direito
à propriedade. Ponderando os valores envolvidos, indubitável que a preservação da
intimidade do empregado deve prevalecer. Observe-se, contudo, que as câmeras, por
exemplo, têm sido consideradas como passíveis de utilização nos demais ambientes
de trabalho que não banheiros e vestiários. Com efeito, as decisões que tratam de
revistas de pertences e aplicam a sanção entendendo que os pertences fazem parte
da esfera íntima do empregado e entram na regra do artigo 373-A, VI da CLT, proibitiva
57
CARACTERIZAÇÃO DANO MORAL – INSTALAÇÃO DE CÂMERA DE VÍDEO NO BANHEIRO DA EMPRESA – VIOLAÇÃO
À INTIMIDADE DO EMPREGADO – Extrapola os limites do poder diretivo e fiscalizador, a empresa que instala
câmera de vídeo nos banheiros, porque viola a intimidade do empregado, acarretando-lhe, por óbvio, constran-
gimentos. Por decorrência de tal ato, deve a empresa ser responsabilizada pelo pagamento de indenização por
dano moral, à luz do inciso X do art. 5.o da Constituição Federal (TRT. 3ª R., RO nº 00413.2004.103.03.00.7,
4ª T., Rel. Juiz Fernando Luiz G. Rios Neto, DJMG, p. 8, 18 dez. 2004, JCF.5 JCF.5.X).
238 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
58
TRT-PR-03799-2006-513-09-00-8-ACO-31384-2008, 1ª T., Rel. Edmilson Antonio de Lima, DJPR, 02 set.
2008.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 239
Sendo que os danos morais: “são lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa
natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em
contraposição a patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetí-
vel de valor econômico”.60
Nessa esteira, infere-se que o dano moral está embasado na proteção do ser
humano e tem como ideal compensá-lo do mal que lhe foi causado, seja ele por dor,
angústia, humilhação ou qualquer outro sentimento de desgosto suportado.
59
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil, v. 4, p. 35.
60
Silva (1955, n. 1) apud RODRIGUES. Direito civil, v. 4, p. 189.
240 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
61
FLORINDO. Dano moral e o direito do trabalho.
62
SCHIAVI. Ações de reparação por danos morais decorrentes da relação de trabalho: os novos desafios da justiça
do trabalho após o Código Civil de 2002 e a Emenda Constitucional 45/2004, p. 71.
63
MORAIS. Dano moral nas relações de trabalho.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 241
4 Considerações finais
Diante das assertivas elencadas ao longo deste artigo científico, teve-se como
objetivo de pesquisa demonstrar quais os elementos de colisão entre os direitos da
personalidade do empregado e o poder diretivo do empregador.
Assim, por todo o exposto, tem-se que, através do estudo da evolução histórica
do Direito do Trabalho, o empregado sempre esteve sujeito a uma relação de subor-
dinação ao empregador. Contudo, o estudo revela que essa sujeição, anteriormente,
era deveras degradante à dignidade humana desses empregados. Esta degradação
se mostrou nos períodos iniciais através da condição de escravidão do trabalho e,
posteriormente, pelas excessivas horas e baixos salários, a uma semiescravidão,
somente cessada após o nascimento de normas laborais protetoras dos direitos
básicos dos empregados.
Ainda, tem-se por certo que a relação empregatícia é formada por cinco requisi-
tos essenciais, quais sejam, ser realizado por pessoa física, de forma não eventual,
64
MORAIS. Dano moral nas relações de trabalho, p. 121.
242 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 243
Abstract: This article had as focus and objective to analyze the scene of the labour social rights due to
the directive power of the employer analyzing the limits of the economic power. Through a bibliographical
research, prioritizing excellent authors for the present debate, it was possible to conclude that very often,
the scene is not as it presents and that on behalf of the directive power of the employer, rights are burled
and offences and siege are materialized, when, for example, an employee is searched without any apparant
reason, a decriminalizing interview takes place, whenever there is absence of support to the maternity,
feeding and rest during working hours. Their rights are burled, in favor of higher economic development.
It was possible to conclude that it is extremely important to make their rights concrete in the working
environment, in a way to delimit the economic and directive power of the entrepreneurial sector, because it
is relevant for the country´s development. We cannot leave aside the welfare state for the workers who are
the driving force of the economic development.
Key words: Social rights. Economic power. Limits. Directive power.
Referências
BARROS, Alice Monteiro de. Proteção à intimidade do empregado. São Paulo: LTr, 1997.
BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade e o projeto de Código Civil brasileiro. Revista de
Informação Legislativa, Brasília, n. 60, out./dez. 1978.
CORTIANO JUNIOR, Eroulths. Alguns apontamentos sobre os chamados direitos da personalidade.
In: FACHIN, Luiz Edson. Repensando fundamentos do direito civil brasileiro contemporâneo. Rio de
Janeiro: Renovar, 2000.
DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Contrato individual de trabalho: uma visão estrutural. São Paulo:
LTr, 1998.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 2006.
DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA. São Paulo: Encyclopaedia Brittannica do Brasil,
1987.
EBERLIN, Fernando Büscher von Teschenhausen. Poder de direção do empregador versus direito
à privacidade do empregado. Revista Trabalhista – Direito e Processo, Rio de Janeiro, v. 5, n. 19,
p. 129-155, jul./set. 2006.
244 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
FACHIN, Luiz Edson; RUZYK, Carlos Eduardo Pianovski. Um projeto de Código Civil na contramão da
Constituição. Revista Trimestral de Direito Civil, São Paulo, n. 4, p. 244-245, out./dez. 2000.
FLORINDO, Valdir. Dano moral e o direito do trabalho. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 1999.
FONSECA, Ricardo Marcelo. Modernidade e contrato de trabalho: do sujeito de direito à sujeição
jurídica. São Paulo: LTr, 2001.
FURTADO, Emmanuel Teófilo. Alteração do contrato de trabalho. São Paulo: LTr, 1994.
GARCIA, Emerson. Dignidade da pessoa humana: referenciais metodológicos e regime jurídico. Jus
Navigandi, Teresina, ano 9, n. 719, 24 jun. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/6910/
dignidade-da-pessoa-humana>. Acesso em: 18 mar. 2014.
GEDIEL, José Antônio Peres. A irrenunciabilidade a direitos da personalidade pelo trabalhador. In:
SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Constituição, direitos fundamentais e direito privado. 2. ed. Porto
Alegre: Livr. do Advogado, 2006.
GUHUR, Jaqueline Sophie Perioto. Programas de televisão e pessoas com necessidades especiais: uma
reflexão acerca do grotesco e da tutela civil da dignidade humana. Maringá, 2003. 195 f. Dissertação
(Mestrado)–Universidade Estadual de Maringá, 2003.
GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri (Org.). Dicionário técnico jurídico. São Paulo: Rideal, 1995.
GUNTHER, Luiz Eduardo; ZORNIG, Cristina Maria Navarro. O vínculo empregatício e o requisito da
subordinação. Bonijuris, ano XVI, n. 484, p. 13-16, mar. 2004.
MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2004.
MEIRELES, Edilton. Abuso do direito na relação de emprego. São Paulo: LTr, 2005.
MORAIS, Gardênia Borges. Dano moral nas relações de trabalho. São Paulo: LTr, 2003.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 28. ed. São Paulo: LTr, 2002.
PAVELSKI, Ana Paula. Assédio moral: falta de ética e prejuízo da sustentabilidade nas empresas.
In: BARACAT, Eduardo Milléo (Coord.). Controle do empregado pelo empregador: procedimentos lícitos
e ilícitos. Curitiba: Juruá, 2008.
PRADO, Luiz Régis. Bem jurídico-penal e Constituição. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
RAMOS, Erasmo Marcos. Estudo comparado do direito da personalidade no Brasil e na Alemanha.
Revista dos Tribunais, São Paulo, n. 799, maio 2002.
RODRIGUES, Bruno Alves. Novo paradigma de subordinação na relação de emprego. Revista do Tribunal
Regional do Trabalho 3ª Região, Belo Horizonte, n. 69, p. 64, jan./jun. 2004.
RODRIGUES, Sílvio. Direito civil. 20. ed. rev. e atualizada de acordo com o novo Código Civil. São
Paulo: Saraiva, 2003. v. 4 - Responsabilidade civil.
SANTOS, Enoque Ribeiro dos. Limites ao poder disciplinar do empregador: a tese do poder disciplinar
compartilhado. Revista Magister de Direito Trabalhista e Previdenciário, São Paulo, v. 4, n. 21,
p. 21-46, nov./dez. 2007.
SANTOS, Enoque Ribeiro dos. Limites do poder disciplinar do empregador: a tese do poder disciplinar
compartilhado. Revista IOB Trabalhista e Previdenciária, São Paulo, v. 19, n. 223, jan. 2008.
SAVITZ, Andrew W. A empresa sustentável: o verdadeiro sucesso é o lucro com responsabilidade social
e ambiental. Tradução de Afonso Celso da Cunha Serra. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.
SCHIAVI, Mauro. Ações de reparação por danos morais decorrentes da relação de trabalho: os novos
desafios da justiça do trabalho após o Código Civil de 2002 e a Emenda Constitucional 45/2004.
São Paulo: LTr, 2007.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014 245
246 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 221-246, jan./mar. 2014
página página
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 247-250, jan./mar. 2014 247
página página
248 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 247-250, jan./mar. 2014
página página
CONTRADITÓRIO EFETIVIDADE
- Ver: Cooperação no processo civil – A - Ver: Regime das medidas de urgência no
paridade do juiz e o reforço das posições futuro CPC. Artigo de: Ivo César Barreto de
jurídicas das partes a partir de uma nova Carvalho................................................ 199
concepção de democracia e contraditório.
Artigo de: Alexandre Pereira Bonna............ 75 F
FUTURO CPC
CULPA MÉDICA - Ver: Regime das medidas de urgência no
- Ver: Culpa médica e sua apuração futuro CPC. Artigo de: Ivo César Barreto de
processual – Uma análise das teorias Carvalho................................................ 199
da prova. Artigo de: Luciana de Paula
Lima Gazzola, Gláucio Ferreira Maciel H
Gonçalves............................................... 89 HIPÓTESES DE PARTICIPAÇÃO
- Ver: O amicus curiae no direito
D processual civil brasileiro. Artigo de:
DANO MORAL Francieli Pisetta..................................... 149
- Ver: O direito de privacidade do empregado e
o poder diretivo do empregador – Aspectos I
processuais. Artigo de: Renata Silva IMPESSOALIDADE JURISDICIONAL
Amaral.................................................. 221 - Ver: Processo civil e processo do
trabalho – Possibilidades e limites da
DEMOCRACIA DELIBERATIVA aplicação subsidiária. Artigo de: Aroldo
- Ver: Cooperação no processo civil – A Plínio Gonçalves..................................... 181
paridade do juiz e o reforço das posições
jurídicas das partes a partir de uma nova INEXIGIBILIDADE DE TÍTULO JUDICIAL
concepção de democracia e contraditório. - Ver: Da inexigibilidade do título judicial
Artigo de: Alexandre Pereira Bonna............ 75 fundamentado em norma declarada
inconstitucional pelo Supremo Tribunal
DIREITO PROCESSUAL CIVIL Federal (arts. 475-L, §1º, e 741, parágrafo
- Ver: Processo civil e processo do trabalho único, do CPC). Artigo de: Luiz Magno
– Possibilidades e limites da aplicação Pinto Bastos Junior, Paula Paz................ 119
subsidiária. Artigo de: Aroldo Plínio
Gonçalves............................................. 181 INSUFICIÊNCIA LEGAL
- Ver: O amicus curiae no direito
DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO processual civil brasileiro. Artigo de:
- Ver: Processo civil e processo do trabalho Francieli Pisetta..................................... 149
– Possibilidades e limites da aplicação
subsidiária. Artigo de: Aroldo Plínio INTIMIDADE
Gonçalves............................................. 181 - Ver: O direito de privacidade do
empregado e o poder diretivo do empregador
DIREiTOS COLETIVOS – Aspectos processuais. Artigo de:
- Ver: A coisa julgada na ação coletiva Renata Silva Amaral............................... 221
dos sojicultores – Comentário sobre o
REsp nº 1.243.386/RS. Artigo de: Celso J
Barberato, Márcio Bulgarelli Guedes, JURISDIÇÃO COMUM
Zaiden Geraige Neto................................. 11 - Ver: Processo civil e processo do
trabalho – Possibilidades e limites da
E aplicação subsidiária. Artigo de: Aroldo
EFEITO VINCULANTE Plínio Gonçalves..................................... 181
- Ver: Da inexigibilidade do título judicial
fundamentado em norma declarada JURISDIÇÃO ESPECIAL
inconstitucional pelo Supremo Tribunal - Ver: Processo civil e processo do
Federal (arts. 475-L, §1º, e 741, parágrafo trabalho – Possibilidades e limites da
único, do CPC). Artigo de: Luiz Magno aplicação subsidiária. Artigo de: Aroldo
Pinto Bastos Junior, Paula Paz................ 119 Plínio Gonçalves..................................... 181
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 247-250, jan./mar. 2014 249
página página
L PROJETO DO NCPC
LEGITIMAÇÃO - Ver: Audiência de conciliação versus audiência
- Ver: A coisa julgada na ação coletiva preliminar – A opção pela primeira e as
dos sojicultores – Comentário sobre o consequências da eliminação da segunda
REsp nº 1.243.386/RS. Artigo de: Celso no projeto do Novo Código de Processo Civil
brasileiro (NCPC). Artigo de: Lúcio Grassi
Barberato, Márcio Bulgarelli Guedes, de Gouveia.............................................. 25
Zaiden Geraige Neto................................. 11
R
M RATIO DECIDENDI
MECANISMO DE DEFESA DO EXECUTADO - Ver: A ratio decidendi dos precedentes
- Ver: Da inexigibilidade do título judicial judiciais. Artigo de: Marcos José Porto
fundamentado em norma declarada Soares.................................................... 39
inconstitucional pelo Supremo Tribunal
Federal (arts. 475-L, §1º, e 741, parágrafo RESPONSABILIDADE CIVIL
- Ver: Culpa médica e sua apuração processual
único, do CPC). Artigo de: Luiz Magno
– Uma análise das teorias da prova. Artigo
Pinto Bastos Junior, Paula Paz................ 119 de: Luciana de Paula Lima Gazzola, Gláucio
Ferreira Maciel Gonçalves......................... 89
MEDIDA CAUTELAR
- Ver: Regime das medidas de urgência no S
futuro CPC. Artigo de: Ivo César Barreto de STARE DECISIS
Carvalho................................................ 199 - Ver: A ratio decidendi dos precedentes
judiciais. Artigo de: Marcos José Porto
N Soares.................................................... 39
NATUREZA JURÍDICA
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
- Ver: O amicus curiae no direito - Ver: Da inexigibilidade do título judicial
processual civil brasileiro. Artigo de: fundamentado em norma declarada
Francieli Pisetta..................................... 149 inconstitucional pelo Supremo Tribunal
Federal (arts. 475-L, §1º, e 741, parágrafo
O único, do CPC). Artigo de: Luiz Magno
ÔNUS DA PROVA Pinto Bastos Junior, Paula Paz................ 119
- Ver: Culpa médica e sua apuração processual
– Uma análise das teorias da prova. Artigo T
TEORIAS DA PROVA
de: Luciana de Paula Lima Gazzola, Gláucio
- Ver: Culpa médica e sua apuração processual
Ferreira Maciel Gonçalves......................... 89 – Uma análise das teorias da prova. Artigo
de: Luciana de Paula Lima Gazzola, Gláucio
P Ferreira Maciel Gonçalves......................... 89
PODER DIRETIVO
- Ver: O direito de privacidade do TROCA
empregado e o poder diretivo do empregador - Ver: Audiência de conciliação versus audiência
– Aspectos processuais. Artigo de: preliminar – A opção pela primeira e as
Renata Silva Amaral............................... 221 consequências da eliminação da segunda
no projeto do Novo Código de Processo Civil
brasileiro (NCPC). Artigo de: Lúcio Grassi
PRECEDENTES VINCULANTES de Gouveia.............................................. 25
- Ver: A ratio decidendi dos precedentes
judiciais. Artigo de: Marcos José Porto TUTELA DE EVIDÊNCIA
Soares.................................................... 39 - Ver: Regime das medidas de urgência no
futuro CPC. Artigo de: Ivo César Barreto
PRIVACIDADE de Carvalho........................................... 199
- Ver: O direito de privacidade do
empregado e o poder diretivo do empregador TUTELA DE URGÊNCIA
– Aspectos processuais. Artigo de: - Ver: Regime das medidas de urgência no
futuro CPC. Artigo de: Ivo César Barreto
Renata Silva Amaral............................... 221 de Carvalho........................................... 199
250 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 247-250, jan./mar. 2014
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 251-252, jan./mar. 2014 251
As opiniões emitidas pelos autores dos artigos são de sua exclusiva responsa
bilidade.
Caso a publicação tenha imagens, enviar em arquivo separado, no tamanho natural
que será utilizado, em alta resolução (300 dpi), em arquivos de extensão .jpg, .tif, .eps, ou
arquivos do Photoshop (.psd), formato vetorial CorelDRAW (.cdr) ou Adobe Illustrator (.ai).
Eventuais dúvidas poderão ser aclaradas pelo telefone (31) 2121-4913 ou pelo
e-mail: <conselhorevistas@editoraforum.com.br>.
252 R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 22, n. 85, p. 251-252, jan./mar. 2014