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Revista Brasileira de
DiReito PRocessual RBDPro 77
Revista Brasileira de
DiReito PRocessual
RBDPro
(RBDPro) renasce. Inicialmente produzida no seio
• Atualização permanente Capítulos de sentença e os limites do efeito devolutivo da apelação no direito processual civil brasileiro da cidade de Uberaba, MG, pela Editora Vitória,
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e, depois, editada, por muitos anos, pela Forense,
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PERIÓDICOS Uberaba (ano de 2011) sabilidade inquestionável nesse propósito.
É diante desse cenário de transformações
• Interesse Público – IP Exposição de Motivos da Proposta de Reforma do Código de Processo Civil português – Os princípios que a RBDPro ressurge. Sua aparência encontra-
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ROSSI, Fernando et al. (Coord.). O futuro do processo civil no Brasil: uma análise crítica ao projeto do
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DELFINO, Lúcio. Direito processual civil: artigos e pareceres. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
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R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 9-10, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 9-10, jan./mar. 2012
1 Introdução
Há quase trinta anos divulgamos nossa tese de doutoramento em que, em
respeito às exigências do devido processo legal, advogávamos a adoção de lege ferenda
de um novo sistema para o cumprimento das sentenças, que fosse mais simples e
mais eficiente do que o previsto no Código de Processo Civil de 1973.1
Naquela época, anterior à Constituição de 1988, não havia previsão expressa
da garantia do devido processo legal no texto da Carta então vigente. Foi com
base nas garantias fundamentais implícitas,2 mesmo na ausência de disposição literal,
que consideramos a cláusula do due process of law como garantia inerente à do
acesso à Justiça, garantia essa que figurava textualmente na Constituição daquele
1
THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal. Rio de
Janeiro: Aide, 1987.
2
“A especificação dos direitos e garantias expressos nesta Constituição não exclui outros direitos
e garantias decorrentes do regime e dos princípios que ela adota” (CF- 1969, art. 153, §36).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 13-35, jan./mar. 2012
tempo (CF – Emenda nº 1, de 17.10.1969, cujo art. 153, §4º, prescrevia a inafastabilidade
da apreciação do Poder Judiciário de “qualquer lesão de direito individual”).
Levando em conta que integrava a teoria do devido processo a garantia de
celeridade e economia processual, nossa tese era a de que a dualidade de ações para
definir e realizar os direitos violados ou ameaçados retardava e encarecia a tutela
jurisdicional, injustificadamente.3 Urgia, portanto, uma reforma do Código de Pro
cesso Civil que, a exemplo das ações especiais de natureza mandamental, ou execu
tiva lato sensu, abolisse por completo a actio iudicati (ação executória de sentença),
generalizando o sistema unitário, já existente para as ações cautelares e algumas
ações de mérito, como a de despejo, a de depósito e os interditos possessórios.4
Essa remodelação da execução forçada viria a iniciar-se por meio do Código
de Defesa do Consumidor, no terreno das obrigações de fazer a cargo do fornecedor
de bens e serviços, cuja tutela haveria de se realizar dentro de uma só relação proces
sual, em cujo conteúdo caberiam tanto os atos de definição (acertamento) como os
de realização dos provimentos judiciais pronunciados em tutela dos consumidores
(CDC, art. 84).
Pouco tempo depois, a renovação se estenderia ao Código de Processo
Civil, primeiro no tocante às obrigações de fazer e não fazer em geral, depois
com a instituição da tutela de mérito antecipada, em seguida, no mecanismo do
cumprimento das obrigações de entrega de coisa, e, por último, das obrigações
de quantia certa. Portanto, no espaço de tempo que mediou entre 1990 e 2005,
a execução de sentença no direito processual civil brasileiro viria a libertar-se,
completamente, da arcaica estrutura da actio iudicati romana, transformando o
cumprimento das condenações judiciais em simples fase de um procedimento
unitário e simplificado.
Com isso, a ação autônoma de execução, regulada pelo Livro II do Código
de Processo Civil, ficou restrita aos títulos extrajudiciais. Seus dispositivos apenas
subsidiariamente passaram a se aplicar à fase de cumprimento de sentença, dentro
do processo unitário (CPC, art. 475-R).
3
A tese, em suma, tinha o propósito de “demonstrar que a exigência de dois processos distintos,
de duas ações separadas, para compor aquilo que, em essência, é um só conflito, ou uma só
lide, tal como hoje [então] se faz em nosso processo civil, diante do processo de conhecimento
e do processo de execução, não satisfaz as expectativas da completa, autêntica e mais eficaz
tutela jurisdicional” (THEODORO JÚNIOR, op. cit., p. 75).
4
“Qualquer deficiência estrutural do sistema de processo executivo que protele, além do
estritamente necessário, a concretização do direito líquido, certo e exigível da parte credora,
deve rapidamente ceder a inovações que aperfeiçoem o processo civil e o aproximem mais do
ideal do moderno Estado de Direito” (THEODORO JÚNIOR, op. cit., loc. cit.).
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5
COMOGLIO; FERRI; TARUFFO. Lezioni sul processo civile. 4. ed. Bologna: Il Mulino, 2006. v. 1, p. 227.
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com que o núcleo atual da ideia de um processo justo se confunda com a política
de proteção às situações de direito material, e não mais se explique como simples
garantia de acesso a um processo qualquer. A justiça contemporânea, colocada no
centro dos direitos fundamentais, cumpre o dever constitucional de compor os
conflitos jurídicos de maneira adequada e justa, sempre na ótica do direito material.
De fato — em sintonia com os princípios constitucionais —, opõe-se à visão
excessivamente abstrata e autônoma do direito de ação, a consciência de que:
6
COMOGLIO; FERRI; TARUFFO. Lezioni..., v. 1, p. 227.
7
COMOGLIO; FERRI; TARUFFO. Lezioni..., v. 1, p. 230.
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8
DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. São Paulo: Malheiros, 2002. n. 10, p. 36.
9
Em termos de direito fundamental, “acesso à justiça equivale à obtenção de resultados justos. É
o que também já se designou como acesso à ordem jurídica justa (Kazuo Watanabe). Não tem
acesso à justiça aquele que sequer consegue fazer-se ouvir em juízo, como também todos os
que, pelas mazelas do processo, recebem uma justiça tarda ou alguma injustiça de qualquer
ordem” (DINAMARCO, op. cit., n. 10, p. 37).
10
COMOGLIO, Luigi Paolo. Etica e técnica del “giusto processo”. Torino: Giappichelli, 2004. p. 8.
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partilha e do divórcio consensuais por via notarial (CPC, art. 982 e 1.124-A), com a
criação da ação monitória (CPC, art. 1.102-A a 1.102-C) etc.
11
COMOGLIO, op. cit., p. 26.
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12
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual, tentativa de
compatibilização. 2005. Tese (Concurso de Professor Titular) – Universidade de São Paulo – USP,
São Paulo, 2005. f. 13.
13
BEDAQUE. Efetividade do processo e técnica processual, cit. p. 13.
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14
BEDAQUE. Efetividade do processo e técnica processual, cit. p. 16.
15
BEDAQUE. Efetividade do processo e técnica processual, cit. p. 45. Segundo Barbosa Moreira, o
processo deve assegurar à parte vitoriosa o gozo da específica utilidade a que faz jus segundo
o ordenamento, com o mínimo de dispêndio de energia (Efetividade do processo e técnica
processual. In: Temas de direito processual: sexta série. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 18). O aspecto
positivo da instrumentalidade “é caracterizada pela preocupação em extrair do processo, como
instrumento, o máximo de proveito quanto à obtenção dos resultados propostos (os escopos
do sistema)” (DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 5. ed. São Paulo:
Malheiros, 1996. p. 319). No seu aspecto negativo, o princípio da instrumentalidade alerta para
o fato de que o processo “não é um fim em si mesmo e não deve, na prática cotidiana, ser
guindado à condição de fonte geradora de direitos. Os sucessos do processo não devem ser
tais que superem ou contrariem os desígnios do direito material, do qual ele é também um
instrumento” (CINTRA, Antônio Carlos de Aguiar; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO,
Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. n. 12, p. 47-48).
16
“O processo deve dar, quanto por possível, praticamente, a quem tenha um direito, tudo aquilo
e exatamente aquilo que ele tenha direito de conseguir” (CHIOVENDA, Giuseppe. Institui
ções de direito processual. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1969. v. 1, n. 12, p. 46). Para Proto Pisani, a
instrumentalidade do processo preconiza sua justificação indicativa da resposta que caso a caso
o legislador deveria dar para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva às específicas necessidades
de tutela (Lezioni di diritto processuale civile. 3. ed. Napoli: Jovene Editore, 1991. p. 34).
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17
YARSHELL, Flávio Luiz. Alterações na legislação processual e segurança jurídica. Carta Forense,
São Paulo, n. 50, p. 6, jul. 2007. É de Ives Gandra da Silva Martins a advertência também no
mesmo rumo, de que a pouca atenção do julgador aos reais propósitos da nova roupagem do
direito processual pode redundar num certo desalento, diante da “possibilidade de resultarem
inúteis as medidas de aprimoramento da legislação processual, se o Poder Judiciário não estiver
comprometido em aplicá-las com razoabilidade” (Razoabilidade das decisões judiciais. Carta
Forense, São Paulo, n. 50, p. 3. jul. 2007).
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18
FREITAS, José Lebre de. A ação executiva depois da reforma. 4. ed. Coimbra: Coimbra Ed., 2004.
p. 25, nota 54.
19
CUNIBERTI, Giles. Un concept de droit de l’exécution en droit anglais. In: ISNARD, Jacques;
NORMAND, Jaques. Nouveaux droits dans un nouvel espace européen de justice: le droit processuel
et le droit de l’exécution. Paris: Éditions Juridiques et Techniques, 2002. p. 171.
20
COELHO, Glaucia Mara. Notas sobre a execução de decisão judicial que determinam o paga
mento de quantia no EUA e na Inglaterra. Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, n. 43,
p. 60-61, jul./ago. 2011.
21
COELHO, op. cit., p. 51.
22
COELHO, op. cit., p. 52.
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23
FREITAS. A ação executiva, cit. n. 1.6, p. 27-28.
24
PAIVA, Eduardo; CABRITA, Helena. O processo executivo e o agente de execução. 2. ed. Coimbra:
Wolters Kluwer; Coimbra Ed., 2010. p. 44.
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25
PAIVA; CABRITA. op. cit., p. 16.
26
PAIVA; CABRITA. op. cit., p. 17.
27
FREITAS. A ação executiva, cit. n. 1.6, p. 28.
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28
FREITAS, op. cit., nota 54, p. 25.
29
TOMMASEO, Ferruccio. L’esecuzione forzata. Padova: CEDAM, 2010. n. 7, p. 19.
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30
COMOGLIO, Luigi Paolo; FERRI, Corrado; TARUFO, Michele. Lezioni sul processo civile. 4. ed. Bologna:
Il Mulino, 2006. p. 325.
31
CADIET, Loïc; JEULAND, Emannuel. Droit judiciaire privé. 6. ed. Paris: LITEC, 2009, nºs 738, 739.
p. 509-510.
32
CROZE, Hervé; MOREL, Christian; FRADIN, Olivier. Procedure civile. 4. ed. Paris: LITEC. 2008. n. 169, p. 64.
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33
Aliás, é o que, ainda hoje, se dá com a arbitragem. Os árbitros extrajudiciais julgam a causa, mas a
execução das suas sentenças, se necessária, haverá de ser requerida, por meio de ação executória
junto ao Poder Judiciário (Lei nº 9.307/1996, art. 31; CPC, art. 475-N, IV).
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34
Lei nº 8.952/1994, complementada pela Lei nº 10.444/2002.
35
Lei nº 8.952/1994; Lei nº 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), art. 84; Lei nº 10.444/2002.
36
Lei nº 10.444/2002.
37
CPC, arts. 471-I e 475-J, com a redação da Lei nº 11.232/2005.
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A ação mandamental, para Pontes de Miranda, enfim, “tem por fito pre
ponderante que alguma pessoa atenda, imediatamente, ao que o juízo manda”.40
38
GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores
do anteprojeto. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. nota 1 ao art. 83, p. 768.
39
DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. São Paulo: Malheiros, 2002, n. 162, p. 230. No
mesmo sentido: PONTES DE MIRANDA. Tratado das ações. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1970.
v. 1, §33, p. 168 et seq., e §37, nºs 1-2, p. 211.
40
PONTES DE MIRANDA. Tratado das ações. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976. v. 6, §1º, n. 1, p. 3.
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41
DINAMARCO, op. cit., n. 162, p. 231; idem, DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito
processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001. v. 3, n. 919, p. 242 et seq.
42
DINAMARCO. A reforma da reforma, cit., n. 162, p. 231; idem, DINAMARCO, Cândido Rangel.
Fundamentos do processo civil moderno. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. v. 1, n. 307, p. 603-604;
PONTES DE MIRANDA. Tratado das ações, cit. v. 1, §33. n. 6, p. 181.
43
O juiz vai além da simples declaração de estar a parte condenada a entregar, fazer ou não fazer
alguma coisa, pois o que emite é, realmente, “uma ordem a ser observada pelo demandado”
(SILVA, Ovídio A. Batista da. Curso de processo civil. Porto Alegre: Fabris, 1990. v. 2, p. 247).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 13-35, jan./mar. 2012
... si ripensa alla utilità della cesura rappresentata dal titolo esecutivo,
e della netta scissione fra cognizione ed attuazione, in una prospettiva
di concentrazione di entrambe in capo allo stesso giudice e allo stesso
provvedimento...
44
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 46. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2011. v. 2, n. 1.030, p. 552. A ação cautelar não é remédio processual que se contente com a
sentença. “Tende diretamente à constituição do estado de segurança ou prevenção, de modo que
a medida cautelar [fase executiva] é parte integrante do seu próprio procedimento ou simples fase
dele” (THEODORO JÚNIOR, op. cit., II, nº 1.030, p. 551; CALVOSA, Carlo. Provvedimenti d’urgenza. In:
NOVISSIMO digesto italiano. v. XIV, p. 466; TOMMASEO, Ferrucio. I provvedimenti d’urgenza. Padova:
CEDAM, 1983. p. 328, 331; LIEBMAN, Enrico Tullio. Problemi del processo civile. Milano: Morano, 1962.
p. 104 et seq.).
45
Leis nºs 8.952/1994, 10.444/2002 e 11.232/2005.
46
FONSECA, Elena Zucconi Galli. Attualità del titolo esecutivo. Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura
Civile, anno LXIV, n. 1, p. 71 et seq. mar. 2010.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 13-35, jan./mar. 2012
É com esse objetivo que a lei processual brasileira foi remodelada, permi
tindo que toda sentença condenatória se torne mandamental e permita, de ime
diato, a expedição do mandado executivo, sem necessidade de submeter o credor à
propositura de uma nova ação para alcançar a execução forçada.
Na Itália, vários são os procedimentos especiais, além dos cautelares, que
eliminaram a dualidade de processos para obter a condenação e a sucessiva exe
cução da sentença. Dentre eles se destacam os que cuidam das demandas travadas
no campo da família, mormente quando se acha em jogo a proteção dos filhos,
onde a execução forçada direta se revela impositiva.48 Aliás, entre nós, as ações de
alimento, por exemplo, sempre permitiram liminares prontamente exequíveis e, a
respectiva condenação, sempre que possível, permitiu medida executiva imediata,
como a averbação em folha de pagamento, fugindo totalmente das padrões da
actio iudicati tradicional.
Embora haja resistência dos conservadores à ampliação da mandamenta
lidade para alcançar todas as sentenças condenatórias, são altamente significativas
as vozes que justificam a eliminação ou atenuação da separação entre cognição e
execução, sob o argumento de que as dificuldades opostas à execução da sentença
podem, de fato, repercutir sobre o conteúdo do próprio provimento, o que é
indesejável, uma vez que “l’attuazione della decisione è parte integrante del giusto
processo”.49
Se os procedimentos especiais rompem com a tradição dualística do Código
de Processo Civil, que seguramente se justificou ao tempo áureo das codificações,
o certo é que essas disciplinas particulares tendem à generalização, em face dos
tempos atuais, caracterizadas pelas peculiaridades da “età della decodificazione”,
já inaugurada por meio do florescimento das “execuções especiais”, amplamente
divorciadas do regime de completa separação entre cognição e execução.50
47
FONSECA, op. cit., p. 73.
48
FONSECA, op. cit., p. 73.
49
FONSECA, op. cit., p. 74.
50
FONSECA, op. cit., loc. cit.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 13-35, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 13-35, jan./mar. 2012
8 Conclusões
A abolição da actio iudicati e a adoção do processo unitário no direito brasi
leiro representa mais um passo de pioneirismo de nosso direito processual civil,
o qual reiteradamente tem avançado na modernização das técnicas de prestação
jurisdicional, assumindo posição de relevo na superação de entraves históricos à
implantação de um processo moderno e compatível com os anseios daquilo que
hoje se entende como um “processo justo”, em termos da tutela prometida como
direito fundamental pela Constituição.
Se foi, sem maiores resistências, possível a implantação do procedimento uni
tário nas ações cautelares e em inúmeros procedimentos especiais de mérito, não
haveria razão para não admitir que, em nome da efetividade da tutela jurisdicional,
esse tipo de sistema ágil, eficiente, prático e econômico fosse generalizado para o
cumprimento de todas as sentenças.
Nessa perspectiva, a mandamentalidade atribuída a todas as condenações
judiciais, com a consequente abolição da velha ação executória, é providência
que, sem dúvida, se afina com a garantia de efetividade da tutela jurisdicional, que,
segundo a Constituição deve ser realizada por meio de um processo de duração
razoável e ordenado segundo meios instrumentais aptos a garantir a celeridade da
respectiva tramitação (CF, art. 5º, LXXVIII).
Não se pode, por fim, deixar de mencionar os critérios renovados de expro
priação executiva e satisfação mais célere do direito do exequente que atualmente
a lei põe à sua disposição, seja por meio da adjudicação, em caráter preferencial, seja
pelas diversas modalidades de venda dos bens penhorados, de que se pode valer
livremente o credor, segundo suas próprias conveniências.
Uma derradeira observação, porém, se impõe. Não será apenas com a
remodelação das normas procedimentais que a melhoria do sistema de execução
de sentença, entre nós, se aprimorará até o nível desejado. Sem a necessária e indis
pensável modernização do aparelhamento dos serviços judiciais e a melhoria da res
pectiva gestão, todo o esforço desempenhado no plano legislativo terá sido em vão.
O processo continuará emperrado e caro e as penosas “etapas mortas” continuarão
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R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 37-42, jan./mar. 2012
a mesma (Lei nº 5.869/73). Mas o modelo de processo nela contido é bem outro.
Elogiável sob alguns aspectos; criticável quando se lho mira por outro ângulo.
Mas um fator preponderante continua a lhe marcar o perfil e isso a despeito
do ambiente democrático e republicano estabelecido pela Constituição de 1988:
continua sendo um CPC “do juiz”, um CPC autoritário, um CPC viabilizador das mais
perversas arbitrariedades. Ou seja: mudou-se muito, mas nada — ou muito pouco —
mudou. Na essência, as matizes metodológicas do nosso CPC continuam a movimentar
uma engrenagem na qual o processo civil se desenvolve como categoria jurídica a
serviço da jurisdição (= Poder), e não como estrutura democrática e republicana
viabilizadora da dialética que caracteriza o devido processo legal (= Garantia). E a
prova de que pouco mudou está no fato de que atualmente tramita na Câmara dos
Deputados um anteprojeto de novo CPC. Eis aí o “processo civil gattopardista” a que
me refiro no título acima. Queremos mudar novamente, mas pouco será mudado!
A atuação do prático diante do Poder Judiciário “civil” nos mostra isso, apesar
de a dogmática (doutrina) continuar a nos seduzir com um discurso legitimador
desse “poderoso juiz” que tudo pode em nome da “verdade”, da “justiça” e da concre
tização de um “processo justo”. O processo civil dos livros (law in books) é romântico;
o processo civil da prática (law in action) é assustador, ao menos na perspectiva dos
artífices da postulação (advocacia, MP, defensoria pública). Estes são testemunhas
do ultraje que a garantia do devido processo legal sofre no dia a dia do foro cível —
além do penal, é claro! — nas mãos desse “juiz redentor” dos males da sociedade, tão
decantado em verso e prosa nas lições da grande maioria dos nossos processualistas
e que tanta influência exerce sobre nossa jurisprudência. Ignoramos que de nossa
Constituição da República transborda um modelo semântico-processual garantista e
nos deixamos levar por um arbitrário e equivocado modelo pragmático-processual
de viés ativista, onde avulta a figura de um juiz comprometido com a própria “justiça
subjetiva” que melhor lhe ocorrer diante do caso concreto.1 Não é incomum que na
cena processual nos deparemos com justiceiros — e não com juízes — agigantados
sob o sacrossanto manto da toga.
Venho pensando e cada vez mais tenho para mim que a falta de sintonia entre
o modelo semântico que se projeta da Constituição e o modelo pragmático do pro
cesso que praticamos tem boa parte de sua etiologia radicada nos exatos 354 anos
1
Tomo a liberdade de remeter o leitor ao meu “Ativismo e garantismo no processo civil: apresentação
do debate”, veiculado originalmente na Revista MPMG Jurídico, n. 18, p. 8-15, dez. 2009, publicação
oficial do Centro de Estudos do Ministério Público de Minas Gerais. Posteriormente também
publicado na RBDPro, n. 70, p. 83, abr./jun. 2010. Neste texto apresento uma resenha da evolução
histórica desse debate, indicando alguns de seus principais protagonistas no processualismo
ibero-americano.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 37-42, jan./mar. 2012
2
Não ter atitude própria de parte, determinando prova de ofício, por exemplo, já que o ônus
probatório é do demandante e do demandado. Nesse sentido, cf. o meu “Repensando a prova de
ofício”. RePro, n. 190, p. 315, dez. 2010.
3
Para uma rápida visão dos antecedentes, tanto no STF, como no STJ, que geraram a edição da
Resolução nº 12/2009, cf. o meu “Reclamação no Superior Tribunal de Justiça”. RePro, n. 192/369,
fev. 2011.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 37-42, jan./mar. 2012
direito material, não servindo, portanto, em situações nas quais as Turmas Recursais
estaduais ignoram importantíssimas regras de garantia contidas no CPC.4 5
O art. 1º da Resolução nº 12 não faz qualquer ressalva quanto a caber recla
mação contra acórdão que tenha malversado direito material ou processual, já que
o respectivo enunciado prescritivo afirma que o cabimento é para “dirimir diver
gência entre acórdão prolatado por turma recursal estadual” e aquilo que é praticado
pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Tal fenômeno restritivo é fruto
da denominada jurisprudência defensiva deste tribunal de superposição, forte em
buscar argumentos retóricos para impedir a — de fato existente — arribada tsunâmica
de processos para sua análise.
No que toca aos Juizados Especiais Federais a abertura para o arbítrio judicial
é equivalente, até porque o regramento procedimental é o da Lei nº 9.099/95, con
forme determina o art. 1º da Lei dos JEFs.
Contudo, os JEFs têm uma característica que é praticamente ignorada pela
legislação processual brasileira e pode ser identificada em dois atributos bem
particulares de seu funcionamento que, a rigor, são os mesmo da Justiça Federal
comum: i) é processo onde, na grande maioria das vezes, será a Administração Pública
4
STJ – 1ª Seção – Rcl 4701/MT – Rel. Min. Castro Meira – j. 10/08/11 – DJe, 13 set. 11. PROCESSO
CIVIL. RECLAMAÇÃO. RESOLUÇÃO STJ 12/2009. MATÉRIA PROCESSUAL. DESCABIMENTO.
CONTRARIEDADE À JURISPRUDÊNCIA DO STJ. AUSÊNCIA. 1. Cuida-se de reclamação fundamentada
na Resolução STJ 12, de 14.12.2009, na qual se alega que a 2ª Turma Recursal Cível de Mato
Grosso desrespeitou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça quanto à aplicabilidade
dos arts. 475-J, 739-A, §§1º, 2º e 6º, 128,do CPC, bem como o art. 6º, da LICC e art. 93, IX, da CF.
2. A reclamação disciplinada pela Resolução STJ nº 12/2009 deve seguir a mesma sistemática
dos demais procedimentos de uniformização aplicáveis aos juizados especiais, cingindo-se a
solucionar os dissídios pretorianos acerca da aplicação do direito material, não se prestando a
uniformizar a interpretação das normas processuais. Precedentes. 3. Ademais, a reclamante não
demonstrou que o aresto impugnado contrariou a jurisprudência pacificada pelo STJ. A Turma
Recursal entendeu ser indevida a multa cominatória porque não houve o descumprimento
da decisão judicial. Os precedentes indicados pela reclamante, por seu turno, não trataram da
peculiar situação ocorrida no acórdão combatido, o que afasta a alegativa de descumprimento
do entendimento jurisprudencial desta Corte. 4. Reclamação improcedente.
5
STJ – 2ª Seção – AgRg na Rcl 4916/SP – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – j. 23/02/11 –
DJe 04/03/2011. AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO. ADMISSIBILIDADE DE AGRAVO
DE INSTRUMENTO NO CURSO DE AÇÃO SUBMETIDA AOS JUIZADOS ESPECIAIS. QUESTÕES
PROCESSUAIS QUE REFOGEM DO ÂMBITO DA RECLAMAÇÃO. RESOLUÇÃO Nº 12/2009. 1. O
Superior Tribunal de Justiça, desde a decisão do STF nos EDcl no RE 571.572-8/BA, Rel. Min. Ellen
Gracie, passou a admitir o uso da reclamação para “dirimir divergência entre acórdão prolatado
por turma recursal estadual e a [sua] jurisprudência...” (art. 1º da Resolução nº 12/2009, do STJ).
2. A divergência exigida, nos termos do art. 1º da Resolução nº 12, deve ser verificada em face
de jurisprudência consolidada do STJ acerca de temas de direito material, excluindo questões
processuais (art. 14, “caput” e §4º da Lei nº 10.249/01). 3. A admissibilidade de agravo de
instrumento no curso de ação submetida aos Juizados Especiais configura questão processual,
que não pode ser analisada pela via da reclamação. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 37-42, jan./mar. 2012
6
Cf., dentre outros textos verdadeiramente originais de Eduardo Costa, por exemplo, “Uma
arqueologia das ciências dogmáticas do processo”, RBDPro, n. 61, p. 11, jan./mar. 2008. Cf, também,
sua extraordinária dissertação de mestrado cuja versão comercial é intitulada O direito vivo das
liminares. São Paulo: Saraiva, 2011.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 37-42, jan./mar. 2012
pragmático esse tipo de trâmite acaba sendo aceito por todos, não como imposição
vertical e arbitrária por parte do juiz, mas sim como decorrência de um consenso
entre as partes, criando um modelo pragmático de processo civil muito afeiçoado
ao denominado sistema adversarial próprio dos Estados reativos do qual nos fala
Damaska, que respeitam os direitos sociais e individuais dos cidadãos não viabili
zando a utilização do Poder de forma arbitrária, inclusive — e acima de tudo — do
poder jurisdicional.7
Portanto, observa-se nos Juizados Especiais Federais um modelo de processo
criado pelo plano pragmático que em muitos de seus aspectos passa ao largo do
modelo “oficial” de processo civil que se lhe quer impor. E isso, a mim parece, fundado
e legitimado na característica do modelo de processo que acaba sendo implemen
tado quando na relação processual tem-se um grande litigante envolvido, como é o
caso típico das demandas que tramitam perante os JEFs.
Concluo, pois, chamando a atenção para o fato de que nosso processo civil
deve ser repensado na perspectiva garantista que a Constituição da República nos
assegura e isso passa, também, pelo processo civil praticado nos Juizados Especiais.
Se não redimensionarmos nossa perspectiva de análise do direito processual,
prosseguiremos na toada gattopardista de Tomasi di Lampedusa. Mudando tudo,
para que nada mude.
RAMOS, Glauco Gumerato. O processo civil gattopardista dos Juizados Especiais. Revista
Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 37-42, jan./mar. 2012.
7
Cf. DAMASKA, Mirjan R. Las caras de la justicia y el poder del Estado: análisis comparado del proceso
legal. Santiago de Chile: Editorial Juridica de Chile, 2000. p. 128 (Título original: The Faces of Justices
and State Authority: A Comparative Approach to the legal Process): “Un Estado reactivo se limita a
proporcionar el marco de apoyo dentro del cual los ciudadanos persiguen los objetivos que
han elegido. Sus instrumentos deben liberar las fuerzas espontâneas de la autogestión social.
El Estado no contempla ninguna noción de interes separado, aparte de los intereses sociales
e individuales (privados): no existen problemas que son inherentes al Estado, sólo problemas
sociales e individuales”.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 37-42, jan./mar. 2012
1 Considerações iniciais
Este trabalho divide-se em três partes. Na primeira delas (item 2), trataremos,
brevemente, da teoria dos capítulos da sentença. A ideia é apenas apresentar ao
leitor a dimensão do conceito de capítulo de sentença segundo o direito positivo
brasileiro — premissa fundamental para a boa compreensão das questões que serão
analisadas nos itens subsequentes.
No item 3, iniciaremos propriamente o estudo do impacto da teoria dos capí
tulos de sentença sobre a disciplina recursal. Faremos algumas considerações gerais
sobre os limites dos efeitos “devolutivo” e “suspensivo” dos chamados “recursos parciais”
e acerca do destino dos capítulos sentenciais não abrangidos pelo(s) recurso(s)
interposto(s). As conclusões fixadas nesse item serão determinantes para a tomada
de posição diante das questões práticas específicas envolvendo o recurso de ape
lação que nos propusemos a enfrentar.
Na terceira e derradeira parte (item 4) é que se tem o objeto central de nosso
estudo. Nela serão analisadas as implicações concretas que a adoção da “teoria dos
capítulos da sentença” gera precisamente sobre a disciplina do recurso de apelação.1
Proporemos questões (correntes no dia a dia dos operadores do direito e bastante
1
Vide o item 4.1.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
DINAMARCO, Cândido Rangel. Capítulos de sentença. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 11.
2
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
3
O que não nos parece ter ocorrido, conforme exposto na nota 26, a seguir. De todo modo, todas as
situações tratadas no item 4 servem mesmo na hipótese de se entender que houve uma alteração
substancial do conceito de sentença (ampliação do conceito). Isso porque todos os casos em que
reputamos haver sentença, há sentença também para quem sustenta ter havido uma alteração
conceitual substancial.
4
DINAMARCO, op. cit., p. 12.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
5
Id.
6
Ibid., p. 18-30.
7
BONÍCIO, Marcelo José Magalhães. Capítulos de sentença e efeitos dos recursos. São Paulo: RSC
Editora, 2006. p. 33-44.
8
CRUZ E TUCCI, José Rogério. Lineamentos da nova reforma do CPC: Lei 10.352, de 26.12.2001, Lei
10.358, de 27.12.2001 e Lei 10.444, de 07.05.2002. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 90.
9
APRIGLIANO, Ricardo de Carvalho. A apelação e seus efeitos. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 117
et seq.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
10
DINAMARCO, op. cit., p. 35.
11
Ibid., p. 37-38.
12
LIEBMAN, Enrico Tullio. “Parte” o “capo” di sentenza. Rivista di Diritto Processuale, Padova, v. XIX,
1964. p. 50, nota 6. Esse entendimento de Liebman havia sido anteriormente defendido por Piero
Calamandrei, conforme a seguinte passagem: “Secondo me in tanto si ha un ‘capo’, in quanto
si abbia quello che, con felice fraseologia chiovendiana, si può chiamare l’accertamento di una
singola concreta volontà di legge, cioè un atto giurisdizionale completo e tale da poter costituire
da sè solo, anche separato dagli altri capi, il contenuto di una sentenza. Non dunque possono
considerarsi come altrettanti capi della sentenza tutte le decisioni di singole questioni di diritto
o di fatto che il giudice abbia dovuto risolvere per preparare le premesse del suo silogismo;
ma solo quelle decisioni colle quali il giudice trae delle premesse le ultime conclusioni, idonee
e destinate ad acquistare forza di giudicato” (CALAMANDREI, Piero. Appunti sulla “reformatio in
pejus”. In: CALAMANDREI, Piero. Studi sul processo civile. Pádua: CEDAM, 1939. v. 3, p. 46). Como se
vê, Calamandrei não incluía no conceito de capítulo as unidades do decisório que não fossem
portadoras de julgamento de mérito — pois o autor fala em decisão apta a fazer coisa julgada
material. Sobre a possibilidade de haver capítulos estritamente processuais na sentença, vide o
item 2.3.2.1, a seguir.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
13
BONÍCIO, op. cit., p. 41e.
14
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Sentença objetivamente complexa, trânsito em julgado e
rescindibilidade. Revista do Advogado, São Paulo, n. 88, p. 90-91, nov. 2006.
15
CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 89.
16
APRIGLIANO, op. cit., p. 122.
17
BARBOSA MOREIRA, op. cit., p. 91.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
18
LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de direito processual civil. 3. ed. Tradução e notas de Cândido Rangel
Dinamarco. São Paulo: Malheiros, 2005. v. 1, p. 251.
19
DINAMARCO, op. cit., p. 38.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
20
DINAMARCO, op. cit., p. 39-40.
21
VERDE, Giovanni. Profili del processo civile: parte generale. 2. ed. Napoli: Jovene, 1988. v. 1, p. 134;
MANDRIOLI, Crisanto. Corso di diritto processuale civile: nozioni introduttive e disposizioni generali.
Editio minor. Torino: G. Giappichelli, 2000. v. 1, p. 102-103; MONTELEONE, Girolamo. Diritto
processuale civile. 3. ed. Padova: CEDAM, 2002. p. 191-192; ATTARDI, Aldo. Diritto processuale civile:
parte generale. Padova: CEDAM, 1994. v. 1, p. 124.
22
DINAMARCO, op. cit., p. 40-41.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
23
Ibid., p. 41.
24
Tem-se discutido muito sobre o conceito de sentença, desde que foi editada a Lei nº 11.232/2005.
Para parte da doutrina, sentença, na disciplina vigente, é simplesmente o ato que apresenta
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
como conteúdo uma das “situações” dos arts. 267 ou 269 do CPC — ex vi do §1º do art. 162. Para
quem pensa assim, o ato que exclui um dos litisconsortes do processo consiste em sentença, pois
apresenta como conteúdo a “situação” do inciso VI do art. 267. Nesse sentido, por exemplo: SICA,
Heitor Vitor Mendonça. Algumas implicações do novo conceito de sentença no processo civil, de
acordo com a Lei 11.232/2005. In: CARMONA, Carlos Alberto (Coord.). Reflexões sobre a reforma
do Código de Processo Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 187-209; OLIVEIRA, Bruno Silveira de. Um
novo conceito de sentença?. Revista de Processo, São Paulo, n. 149, p. 120-138, jul. 2007; VARGAS,
Jorge de Oliveira. O novo conceito de sentença e o recurso daquela que não extingue o processo:
apelação ou agravo de instrumento?. Revista de Processo, São Paulo, n. 148, p. 111-118, jun. 2007;
OLIVEIRA, Guilherme Paes de. Novo conceito de sentença: análise da jurisprudência acerca do
recurso cabível nas situações duvidosas e aplicação do princípio da fungibilidade. Revista de
Processo, São Paulo, n. 164, p. 296-308, out. 2008.
Mas alguns autores ressalvam que não basta o ato apresentar como conteúdo uma das situações
do art. 267 para configurar sentença. Afirma-se que, diferentemente do que se passa nos casos
do art. 269, o ato que apresenta como conteúdo uma das situações do art. 267, para caracterizar
sentença, deve ainda colocar fim ao processo — conforme a literalidade do caput do art. 267 c/c
o art. 162, §1º. Esse é o entendimento, por exemplo, de: APRIGLIANO, op. cit., p. 17.
Por outro lado, há quem entenda que o pronunciamento judicial, para que possa ser considerado
“sentença”, deve sempre encerrar o procedimento (nos casos em que o processo não for “sincré
tico” — v.g., a sentença de procedência da ação condenatória contra a Fazenda Pública é executada
em processo autônomo, não no mesmo processo em que proferida) ou então uma das fases (de
conhecimento, de liquidação ou de execução) do procedimento em primeiro grau de jurisdição
(nos casos de processo sincrético) — não bastando, portanto, que tenha como conteúdo uma
das situações dos arts. 267 e 269 do CPC. A esse respeito, confira-se o que escrevem, por exemplo,
os seguintes autores: BONDIOLI, Luiz Guilherme Aidar. O novo CPC: a terceira etapa da reforma
(leis 11.187/05, 11.232/05, 11.276/06, 11.277/06 e 11.280/06). São Paulo: Saraiva, 2006; GRECO,
Leonardo. Primeiros comentários sobre a reforma da execução oriunda da Lei 11.232/2005. Revista
Dialética de Direito Processual, São Paulo, n. 36, p. 70-86, mar. 2006; JORGE, Flávio Cheim; DIDIER
JR., Fredie; RODRIGUES, Marcelo Abelha. A terceira etapa da reforma processual civil: comentários às
leis n. 11.187 e 11.232, de 2005; 11.276, 11.277 e 11.280, de 2006. São Paulo: Saraiva, 2006; LEITE,
Clarisse Frechiani Lara. O conceito de sentença. In: COSTA, Susana Henriques da (Org.). A nova
execução civil: Lei 11.232/05. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2006. p. 69-94; YARSHELL, Flávio
Luiz; BONÍCIO, Marcelo José Magalhães. Execução civil: novos perfis. São Paulo: RCS Editora, 2006.
***
A corrente referida no parágrafo anterior afasta-se dos estritos termos do art. 162, §1º, do CPC.
Seus adeptos negam que o legislador tenha pretendido dizer o que a literalidade do dispositivo
indica. Dizem que, ao excluir a menção à “extinção do processo” no caput do art. 269, o legislador
nada mais teria pretendido do que compatibilizar a regra com a nova sistemática de execução dos
títulos judiciais. Se a sentença é agora, em regra, executada no bojo do mesmo processo em que
proferida, então não se pode mais afirmar que é ato que põe fim ao processo: após a sua prolação,
o processo continua...
O legislador jamais teria pretendido permitir, porém, que pudesse haver diversas sentenças no
curso de uma mesma fase ou procedimento em primeira instância. O fato de a sentença não mais
pôr, em regra, “fim ao processo” (e não vem ao caso, aqui, adentrar na discussão sobre se antes
da reforma ela punha ou não efetivamente fim ao processo...) não poderia significar que seria
ela identificada doravante pelo seu conteúdo, pura e simplesmente. A sentença, agora, deve ser
considerada o pronunciamento que, apresentando como conteúdo uma das situações dos arts.
267 e 269 do Código, encerra o procedimento ou fase cognitiva em primeira instância ou, então,
o pronunciamento que encerra o procedimento ou fase executiva em primeira instância (art. 794).
Os autores que seguem essa linha de raciocínio não deixam de criticar o fato de o legislador ter
mantido no caput do art. 267 a menção a “extinção do processo”. Notam que mesmo as sentenças
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
***
Concordamos com o entendimento de que não houve uma alteração substancial no conceito de
sentença com a edição da Lei nº 11.232. De fato, uma interpretação sistemática e teleológica da lei
não permite chegar a outra conclusão. Para saber o que se deve entender por “sentença”, deve-
se investigar o que, afinal, levou o legislador a alterar a sua definição legal. Será que o legislador,
ao alterar o conceito de sentença, quis mesmo abandonar — e efetivamente abandonou — o
critério topológico? A resposta a esta pergunta pode ser buscada na Exposição de Motivos da Lei
nº 11.232/2005.
Em nenhum momento a Exposição de Motivos sugere que se tenha pretendido dar margem
para a existência de mais de uma sentença no curso de uma mesma “fase” processual. O que se
pretendeu, com a edição da lei, foi, entre outras providências, unificar as atividades cognitivas
e executivas em um mesmo processo. Em regra, tais atividades não se dão mais em processos
distintos, mas em um só: o processo sincrético. Se assim é, pensou o legislador, a sentença
simplesmente não pode mais ser o ato que encerra o processo de conhecimento. Afinal, a
sentença que julga o mérito (contendo um capítulo condenatório) passa a ser executada no
mesmo processo em que proferida.
Diz a Exposição de Motivos, na parte que interessa ao presente trabalho, que, em razão das
modificações introduzidas pela Lei nº 11.232 no CPC, “a efetivação forçada da sentença con
denatória será feita como etapa final do processo de conhecimento, após um tempus iudicati,
sem necessidade de um processo autônomo de execução (afastam-se princípios teóricos em
homenagem à eficiência e brevidade); processo sincrético, no dizer de autorizado processualista.
Assim, no plano doutrinário, são alteradas as cargas de eficácia da sentença condenatória,
cuja executividade passa a um primeiro plano; em decorrência, sentença passa a ser o ato de
julgamento da causa, com ou sem apreciação do mérito.” Em virtude dessa “alteração sistemática”,
conclui a Exposição de Motivos, impõe-se “a alteração dos arts. 162, 269 e 463, uma vez que a
sentença não mais põe fim ao processo.”
De acordo com a Exposição de Motivos da Lei nº 11.232, portanto, a sentença passaria a ser
considerada o “ato de julgamento da causa, com ou sem apreciação do mérito”. Apresentando
como conteúdo uma das situações do art. 269, imaginou o legislador, a sentença julga o mérito
e encerra a etapa de cognição — ao que seguirá a fase de execução, se a sentença contiver (e no
mais das vezes conterá) capítulo condenatório. Por outro lado, apresentando como conteúdo
uma das situações do art. 267, a sentença extingue o processo (na verdade, como já se disse, o
procedimento ou a fase de conhecimento) sem julgamento de mérito. Daí o conceito do art. 162,
§1º, do Código.
O raciocínio do legislador nitidamente tomou por base a hipótese de o pedido formulado na inicial ser
simples, haver uma só causa de pedir e não haver litisconsórcio ativo e/ou passivo. Considerando-se
essa “estrutura básica ou mínima” da demanda, realmente, o ato que apresentar como conteúdo
uma das situações do art. 269 extingue a fase ou procedimento de conhecimento. Mas o
encerramento não acontece se o pronunciamento judicial se referir a apenas um dos pedidos,
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quando mais de um houver sido formulado de forma cumulada; ou quando o ato se referir a
apenas uma das causas de pedir apresentadas (exceto em caso de acolhimento do pedido,
quando o seu exame com base na outra causa de pedir fica dispensado...) ou a apenas um dos
litisconsortes ativos ou passivos presentes no processo (especialmente em caso de litisconsórcio
não unitário, quando haverá um pedido pertinente a cada litisconsorte...). Nesses casos, a fase
ou procedimento de conhecimento prossegue (ou pode prosseguir, conforme observações
entre parênteses acima) em relação aos demais pedidos, causas de pedir ou litisconsortes. Daí
surge o problema das pretensas sentenças de mérito parciais — com o qual o legislador não se
preocupou.
Da mesma forma, o raciocínio do legislador no sentido de que o ato que apresenta como
conteúdo uma das situações do art. 267 sempre encerra o “processo” (i.e., a fase ou procedimento
de conhecimento) é correto quando se tratar de demanda sem pedidos cumulados, com apenas
uma só causa de pedir e sem litisconsortes ativos e/ou passivos (especialmente em caso de
litisconsórcio simples, conforme já ressalvado acima). Havendo pedidos cumulados, diversas
causas de pedir e/ou litisconsórcio ativo ou passivo, para que encerre o “processo”, a situação
do art. 267 deve se referir a todos os pedidos, causas de pedir e/ou litisconsortes. Referindo-se
a apenas um ou alguns deles, não porá fim ao “processo”. Daí surge o problema das pretensas
sentenças terminativas parciais — no qual o legislador também não pensou.
É preciso, enfim, ter em mente que o legislador, ao alterar a redação dos arts. 162, §1º, 269 e
463 não pensou nas ações objetiva e subjetivamente complexas. Pensou na estrutura mínima da
demanda, em que há um pedido, uma causa de pedir e um autor contra um réu. Estrutura esta
para a qual o conceito de sentença do art. 162, §1º, pode até ser suficiente — mas suficiente não
é para todos os casos de demandas subjetiva e objetivamente complexas.
Em que pese o lapso do legislador, não há dúvidas de que a mens legis não foi afastar o critério
topológico. Como diz Leite no texto referido mais acima, o critério topológico não foi substituído
pelo critério substancial, mas simplesmente adequado à nova estrutura do processo sincrético. A
confirmar isso, não bastassem os termos da Exposição de Motivos, note-se que a lei não alterou
a disciplina recursal, para adaptá-la às pretensas profundas alterações que muitos visualizam no
conceito de sentença. O critério do conteúdo é, porém, ainda útil para diferenciar as sentenças
de mérito das terminativas...
Nossa conclusão, portanto, é a de que ainda hoje o critério topológico tem relevância para
identificar o que seja a sentença. Considerados os objetivos da Lei nº 11.232 e compreendido
que o legislador desenvolveu seu raciocínio em torno da estrutura mínima da demanda (um
autor, um réu, uma causa de pedir e um pedido) ao alterar os arts. 162, §1º, 269 e 463 do Código,
parece-nos inevitável dizer que sentença não pode ser pura e simplesmente o ato que apresenta
como conteúdo uma das situações dos arts. 267 e 269. Sentença é, na verdade, o ato que encerra
a instância, pondo fim ao procedimento (nos casos em que o processo não é sincrético) ou então
a uma das fases (de conhecimento, de liquidação ou de execução) do procedimento em primeiro
grau de jurisdição (nos casos de processo sincrético).
Para que ponha fim ao procedimento ou fase de cognição (inclusive a de liquidação e a que se abre
com eventual impugnação ao cumprimento de sentença) com julgamento de mérito, a sentença
deve necessariamente apresentar como conteúdo uma das situações do art. 269 — simples
mente porque são essas as únicas soluções “de mérito” possíveis em nosso ordenamento (aliás,
em regra, apenas a sentença é que poderá decidir questões de mérito e o próprio mérito, por força do
princípio da reserva do julgamento de mérito para a sentença). Porém, conforme exposto acima,
isso não significa que sempre que apresentar como conteúdo uma daquelas situações o ato
porá fim ao procedimento ou fase, constituindo sentença.
Para que ponha fim ao procedimento ou fase de cognição (inclusive a de liquidação e a que se abre
com eventual impugnação ao cumprimento de sentença) sem julgamento de mérito, a sentença
deve necessariamente apresentar como conteúdo uma das situações do art. 267. Isso não quer
dizer que sempre que apresentar como conteúdo uma daquelas situações o ato porá fim ao
procedimento ou fase, constituindo sentença (ver observações acima).
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E o ato que encerrar o procedimento ou fase de execução, para ser sentença, não apresentará
necessariamente o conteúdo dos arts. 267 e 269 (aliás, algumas das situações desses artigos,
sobretudo as do art. 269, não têm pertinência nenhuma em relação a execuções). De um
modo geral, tal ato terá lugar nos casos do art. 794. E, pondo fim num desses casos à fase ou
procedimento de execução, será sentença.
É verdade que poderá haver mais de uma sentença no mesmo processo — por exemplo, uma
encerrando a fase de cognição, outra encerrando a fase de liquidação (observação: caso de sentença
agravável) e outra encerrando a fase de execução. Mas nem por isso se pode dizer que o critério
topológico foi abandonado ou coisa que o valha. Nesses casos, de processo sincrético, a sentença
será o ato que encerra uma dessas fases do processo.
25
Por exemplo, quando o autor ajuíza ação contra dois réus, não se tratando de litisconsórcio
unitário, haverá um pedido contra cada um deles. Pode ser que na inicial tenha sido formalmente
deduzido um único pedido. Mas, na verdade, ter-se-á nesse caso um pedido contra um réu e um
outro, com idêntico teor, contra o outro réu. Eis que a sentença de mérito, nesse caso, terá dois
capítulos de mérito (além dos processuais), um referente a cada réu.
26
Há casos em que o cúmulo subjetivo não gera um cúmulo objetivo. É o que se passa, por
exemplo, nos casos de litisconsórcio passivo unitário (facultativo ou necessário). Formulado um
pedido, com base em uma causa de pedir, por um autor contra litisconsortes passivos unitários,
há uma só demanda. Não há um pedido contra cada litisconsorte, mas um só contra todos eles.
Por conseguinte, a sentença de mérito conterá, na hipótese, um só capítulo de mérito — o que
explica regras como a do caput do art. 509 do CPC (aplicável a casos em que há litisconsórcio
unitário). Vide, a esse respeito, o item 4.4.
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29
BONSIGNORI, Angelo. L’effetto devolutivo nell’ambito dei capi conessi (effetto esterno). Rivista
Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, Milão, ano XXX, p. 954, 1976.
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autonomia em relação aos capítulos que decidem sobre pedidos diferentes assume
dois significados: “a) o da possibilidade de que cada um deles [os pedidos] fosse
objeto de um processo separado e b) o da regência de cada um por pressupostos
próprios, que não se confundem necessariamente nem por inteiro com os pressu
postos dos demais.”30
Os capítulos puramente processuais jamais serão autônomos no sentido
descrito no item “a”. Tais capítulos “não têm aptidão a uma vida própria, em processos
instituídos somente em relação a eles. Não seria juridicamente possível instaurar
um processo só com o pedido de declaração de uma ilegitimidade ad causam, ou
de uma incompetência absoluta etc. Capítulos a esse respeito só são autônomos no
interior do processo.”31
Autonomia, em qualquer dos sentidos acima expostos, não significa inde
pendência. O fato de um capítulo ter pressupostos próprios, diversos dos de outros
capítulos, ou se referir a pedido que poderia ser objeto de um processo separado não
o torna necessariamente independente. Todos os capítulos são autônomos em pelo
menos um dos sentidos que expusemos, mas nem todos são independentes.
A boa compreensão da noção de (in)dependência de capítulos da sentença
é fundamental para a adequada resolução de uma série de problemas relacionados
às repercussões que a teoria dos capítulos gera sobre outros institutos processuais,
inclusive sobre a disciplina dos recursos. Isso, acreditamos, ficará bastante claro
quando analisarmos alguns possíveis problemas práticos sobre o tema, no item 4,
a seguir.
Id.
31
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2.3.3.2
Dependência entre capítulos de mérito e capítulos
processuais
Existe, também, relação de dependência entre capítulos processuais e capí
tulos de mérito. Com efeito, a existência dos capítulos de mérito depende do que se
decidir sobre os pressupostos de admissibilidade do julgamento de mérito e, assim,
sobre o pedido imediato. O mérito da causa apenas será julgado (procedente ou
improcedente) se o autor tiver direito a tanto — desde, portanto, que o pedido ime
diato seja acolhido (o que ocorrerá se preenchidos os pressupostos de admissibi
lidade de julgamento de mérito).
Enfim, o que determina a dependência do capítulo de mérito ao capítulo
processual é a relação de impedimento que existe entre ambos. A rejeição do pedido
imediato, por conta do acolhimento de uma preliminar, inviabiliza o julgamento
do pedido mediato.
2.3.3.4
Breve nota sobre a nomenclatura empregada nos itens
subsequentes
Nos itens seguintes, iremos nos referir aos capítulos da sentença cujo teor ou
existência depende do teor de outros como capítulos “dependentes”, “condicionados”,
32
BONÍCIO, op. cit., p. 128.
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***
A devolução operada pelos recursos aos Tribunais se põe tanto no plano
horizontal quanto no plano vertical.
O art. 505 do CPC estabelece que a sentença pode ser impugnada no todo ou
em parte. Ou seja, é possível recorrer de apenas um ou alguns dos capítulos da
sentença ou então de todos eles. O art. 515, caput, por sua vez, consigna que a ape
lação devolverá ao Tribunal o conhecimento da matéria impugnada. Da análise con
jugada dos arts. 505 e 515, caput, do CPC extrai-se que a apelação abrange apenas
os capítulos ou partes da sentença que tenham sido nela expressamente impug
nados — havendo, porém, exceções a essa regra geral (mais adiante analisadas). Tais
dispositivos — aplicáveis, mutatis mutandis, em relação a quaisquer recursos do
CPC — fixam a extensão do efeito devolutivo da apelação, i.e., o efeito devolutivo da
apelação no seu plano horizontal. Eis o conhecido princípio segundo o qual tantum
devolutum quantum appellatum.
No plano vertical, a devolução operada pelo recurso abrange os pontos (i.e.,
os fundamentos ou alegações tanto do pedido quanto da defesa) e as questões (i.e.,
pontos controvertidos) de fato e de direito efetivamente resolvidas na sentença ou
que poderiam tê-lo sido, mas nos limites do que foi devolvido ao Tribunal no plano
horizontal. As “questões que poderiam ter sido decididas mas não o foram” com
preendem: questões examináveis de ofício a respeito das quais o juízo a quo não se
manifestou — as quais não estão sujeitas a preclusão; e questões não examináveis
de ofício que surgiram do embate entre as alegações das partes, mas acabaram
igualmente não sendo apreciadas nem ficaram preclusas.34 Isso decorre dos arts.
515, §§1º e 2º, e 516 do CPC.
33
DINAMARCO, Cândido Rangel. Nova era do processo civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 142.
34
MENEZES MARCATO, Ana Cândida. O princípio do duplo grau de jurisdição e a reforma do Código de
Processo Civil. São Paulo: Atlas, 2006. p. 111.
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35
Como se sabe, no caso dos recursos especial e extraordinário, os Tribunais Superiores não podem
(re)decidir questões de fato. A versão dos fatos em que devem os julgadores se pautar é aquela
assentada nas instâncias ordinárias. Ademais, é preciso que se tenha decidido, nas instâncias
ordinárias, a respeito de fatos da causa, aplicando-lhes as normas de direito suscitadas pelas
partes ou outra que ao juiz tenha parecido mais adequada para definir uma das etapas ou o
destino do processo (prequestionamento). No recurso especial ou extraordinário, o recorrente,
partindo da versão dos fatos assentadas nas instâncias ordinárias, deve demonstrar que as
questões de direito foram mal solucionadas, ofendendo a legislação federal e/ou a Constituição e,
assim, gerando um julgamento injusto ou inválido sobre o pedido formulado ao juízo/Tribunal a
quo. Diz-se, portanto, que a profundidade possível da devolução operada pelos recursos especial
e extraordinário é menor do que a verificada em relação aos demais recursos cíveis. O Tribunal
Superior jamais poderá reexaminar as questões de fato pertinentes ao mérito recursal: deve se fiar
na solução a elas dadas pelo juízo/Tribunal a quo. Por outro lado, apenas as questões de direito
examinadas pela decisão recorrida podem ser reapreciadas pelo Tribunal Superior.
Ou seja, quando se afirma que apenas a questão de direito examinada pela decisão recorrida
pode ser (a pedido do interessado) reapreciada pelo Tribunal Superior, quer-se dizer que
o Tribunal Superior deve decidir se, em vista do panorama fático assentado nas instâncias
ordinárias, o Tribunal a quo aplicou bem ou mal o direito ao adotar uma determinada solução
para o processo ou uma de suas etapas. Por exemplo: a parte “1” pedia a aplicação da regra “x”. A
parte “2”, a aplicação da regra “y”. Mas o Tribunal aplica a regra “z”, decidindo o pedido “p”. Essa é a
questão jurídica a ser julgada no Tribunal Superior, em caso de recurso do interessado: aplicou-se
corretamente o direito aos fatos, para decidir sobre o pedido “p”, devolvido pelo recurso especial/
extraordinário?
Mas, ainda pensando-se na situação do parágrafo anterior, esclareça-se o seguinte: se a parte
sucumbente recorre ao Tribunal Superior (por exemplo, recurso especial) alegando violação ao
dispositivo “z” e negativa de vigência ao “x”, poderia o Superior Tribunal de Justiça reconhecer
ofensa (rectius, negativa de vigência) a “y”? Isso estaria, de alguma forma, compreendido na
questão de direito devolvida ao Tribunal Superior? A resposta é negativa — e não por falta de
prequestionamento, propriamente, mas por falta do questionamento necessário para incluir tal
matéria no mérito do recurso. Com efeito, os recursos especial e extraordinário têm como mérito
o pedido de declaração/reconhecimento da ofensa, pela decisão recorrida, ao(s) dispositivo(s)
indicado(s) na petição de interposição — pedido cujo acolhimento pode acarretar a mera
cassação da decisão recorrida ou também a sua reforma, eventualmente para se julgar o próprio
mérito da demanda procedente.
Em suma, nos recursos especial e extraordinário são devolvidos ao Tribunal Superior, no plano
horizontal, o(s) capítulo(s) da decisão a que se referem as questões jurídicas cuja solução sustenta-
se ter sido ofensiva a dispositivos de lei federal infraconstitucional ou da Constituição. No plano
vertical, devolvem-se apenas as questões de direito prévias ao mérito recursal — além das
questões de ordem pública, nos limites da extensão do efeito devolutivo.
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3.1.3.2
Falta de legitimidade ou interesse para recorrer de
capítulos
O recurso pode ser parcial, também, em razão da falta de interesse e/ou
legitimidade para impugnar determinado(s) capítulo(s) da sentença.
Em regra, só a parte vencida tem legítimo interesse em recorrer. É o que diz o
art. 499 do CPC. Este dispositivo estabelece, ainda, a legitimidade do terceiro pre
judicado e do Ministério Público em relação a capítulos que sejam do interesse do
primeiro ou digam respeito à esfera de atuação do segundo.
A legitimidade e o interesse recursais devem ser apurados no caso concreto.
A parte jamais poderá recorrer daqueles capítulos que lhe houverem sido favoráveis,
36
“Dificilmente se conceberia uma sentença ou acórdão portador de algum capítulo que já em
tese fosse irrecorrível — ou seja, insuscetível de qualquer recurso, por qualquer das partes,
independentemente das circunstâncias do caso concreto. Um acórdão local será irrecorrível se no
caso concreto não se configurar qualquer hipótese de admissibilidade do recurso extraordinário,
do especial, do ordinário constitucional ou mesmo dos embargos infringente — mas isso não
significa que a priori esse acórdão seja insuscetível de recurso algum, porque tais recursos podem
caber ou não caber, conforme o caso” (DINAMARCO. Capítulos..., p. 100-101).
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mas apenas e tão somente dos desfavoráveis — caso em que o recurso será parcial.
Da mesma forma, o recurso do Ministério Público ou do terceiro prejudicado, se
admissível apenas em relação a um ou alguns capítulos da sentença, será parcial.
37
Note-se que o efeito suspensivo não “suspende” a decisão recorrida, mas os seus efeitos (na verdade,
nem sempre se trata de verdadeira e própria “suspensão”, conforme exposto na nota seguinte).
É o que ensina Dinamarco: “Esse efeito não incide sobre a decisão judicial recorrida, como ato
processual sujeito a ser cassado e eventualmente substituído por outro, mas propriamente sobre
os efeitos que eles se destinam a produzir” (DINAMARCO. Nova era..., p. 146).
38
Diz-se que o efeito suspensivo não suspende a eficácia das decisões impugnadas, mas prorroga
o seu estado de ineficácia — vigente a partir do momento em que, proferida, a decisão fica
sujeita a recurso dotado, por lei, de efeito suspensivo. Nesse sentido, por exemplo: DIDIER JR.,
Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de direito processual civil: meios de impugnação
às decisões judiciais e processo nos tribunais. 7. ed. Salvador: JusPodivm, 2009. v. 3, p. 81;
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil: arts. 476 a 565. 14. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2008. v. 5, p. 258; LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Efeitos imediatos da
decisão e impugnação parcial e total. In: ARRUDA ALVIM, Eduardo Pellegrini; NERY JUNIOR, Nelson;
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2000. p. 527.
Mas note-se que o simples estado de sujeição a recurso não é suficiente para impedir que a
decisão produza seus efeitos, se o recurso cabível não tiver efeito suspensivo ope legis. A excepcional
atribuição de efeito suspensivo ao recurso pelo juízo a quo ou pelo juízo ad quem implicará,
por conseguinte, a verdadeira e própria suspensão dos efeitos que vinham se produzindo. A esse
respeito, trata-se mais adiante no corpo do texto.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
39
Sobre as particularidades envolvendo a sentença de improcedência ou extintiva e os efeitos da
apelação contra ela interposta, vide a nota 45, a seguir.
40
É o que ensina: DINAMARCO. Nova era..., p. 150.
41
Especialmente os capítulos condenatórios da sentença de procedência, uma vez que os
declaratórios e os constitutivos não são capazes de produzir os efeitos programados antes de
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transitados em julgado. Dinamarco chama atenção para este aspecto, que na prática passa
muitas vezes desapercebido: “A sentença constitutiva só produz seu institucional efeito
substancial de modificar uma situação jurídico-substancial das partes no momento em que
passa em julgado — sendo absurdo pensar, por exemplo, no averbamento da sentença de
separação judicial no registro civil enquanto pende o recurso especial, com o risco de voltarem
as partes, depois, em caso de provimento deste, ao estado de casadas. Quanto às meramente
declaratórias, chega a ser intuitivo que elas não produzem a definitiva certeza jurídica que são
destinadas a produzir, enquanto o Poder Judiciário não houver dado sua última palavra sobre
o caso, perdurando portanto a incerteza jurídica durante todo o tempo em que algum recurso
estiver pendente. Nada há, portanto, a suspender por força de lei nesses casos, porque a eficácia
natural da sentença constitutiva e da declaratória é menos intensa que a da condenatória, não
tendo aquelas, em si mesmas, força para se impor enquanto não sobrevier o trânsito em julgado”
(Ibid., p. 149).
42
Diz o autor: “é inequívoco que a suspensividade do prazo para o recurso ocorrerá sempre que o
recurso previsto tiver efeito suspensivo. O problema surge quando o recurso não tiver, por lei,
tal efeito: como considerar não executável a decisão que, mesmo se recorrida, não produzirá o
efeito suspensivo? Se a efetiva interposição da apelação não é, por si só, capaz de suspender a
eficácia da sentença, uma vez que será recebida somente no efeito devolutivo, como a mera
possibilidade de interposição pode suspender tal eficácia? A solução mais coerente parece
ser conferir eficácia imediata à sentença cuja apelação produza apenas o efeito devolutivo,
podendo ser executada mesmo na pendência do prazo para a apelação. Porém, em virtude de
outros fatores, a conclusão correta é em sentido oposto, ou seja, mesmo nos casos de sentenças
cujos recursos produzam, em tese, apenas o efeito devolutivo, não poderá ocorrer a execução
do julgado no prazo para interposição da apelação ou antes da decisão declaratória de seus
efeitos.” E prossegue Aprigliano: “os efeitos que a apelação produz dependem fundamental
mente da decisão judicial que os declara, não se podendo falar em produção de efeitos indepen
dentes dessa decisão. Ainda que a lei preveja casos em que se produzem ambos os efeitos, e
outros em que somente o efeito devolutivo é produzido, o fato é que muitas situações, não
tão claras, requerem efetivamente a decisão judicial, sem a qual não é possível definir quais os
efeitos produzidos naquele caso concreto. Em outras situações, o próprio magistrado atribui
efeito suspensivo a recurso que não o tem, por vislumbrar risco de grave dano ao recorrente. Em
suma, todo o sistema de recebimento do recurso depende efetivamente da decisão proferida
pelo juiz da causa, não se podendo falar em efeitos da apelação ou execução do julgado
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43
Quando se diz “vencedor”, no texto, pensa-se no demandante cuja pretensão é acolhida. Isso
porque, quando o demandado é (em sentido amplo) vencedor, a sentença terminativa ou de
improcedência (em ambos os casos, a sentença é declaratória) não tem o condão de provocar
alteração alguma no plano da relação controvertida trazida a juízo, mantendo-se a situação que
o demandante pretendia afastar ou corrigir com a demanda. A tutela ao direito do demandado
vencedor realiza-se automaticamente, com a simples prolação da sentença terminativa ou
de improcedência e independentemente dos efeitos da eventual apelação do demandante.
Suspender os efeitos da sentença terminativa ou de improcedência é algo que não faz sentido.
Não há o que suspender em uma sentença terminativa ou de improcedência — exceto os efeitos do
capítulo que trata das verbas de sucumbência e do capítulo que excepcionalmente mantém os efeitos
de antecipação realizada no curso do processo (não se pode descartar por completo a hipótese de
a sentença de improcedência manter efeitos de medida urgente antes concedida — conforme:
DINAMARCO. Nova era..., p. 96).
Quanto a essas duas últimas situações ressalvadas: o capítulo que trata das verbas de sucumbência
sujeita-se a apelação com efeito suspensivo ope legis (logo, não se põe em relação a ele a
necessidade de o demandante vencido buscar a excepcional concessão de efeito suspensivo
ao recurso que interpuser). Já quanto ao capítulo da sentença de improcedência que mantém
os efeitos de antecipação da tutela, é necessário que o demandado vencedor agilize-se para
suspender seus efeitos — eventualmente, antes mesmo de interpor a sua apelação (conforme
exposto no corpo do texto, acima).
44
E não estamos aqui a fazer referência aos casos de sentenças de procedência declaratórias ou
constitutivas — as quais, como se indicou na nota 43, apenas produzem seus efeitos depois de
ocorrido o trânsito em julgado. Referimo-nos especificamente a casos de sentenças condenatórias.
45
A possibilidade de pedir ao juízo a quo a concessão de medidas urgentes após a prolação da
sentença (mas antes da subida dos autos ao Tribunal) não deixa de ser uma exceção à regra
segundo a qual, proferida a sentença, é vedado ao juiz inovar no processo (art. 463 do CPC).
É uma exceção que se justifica para o fim de garantir a efetividade do acesso à justiça.
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Na verdade, o Código prevê (no art. 518) que o juiz, após proferir a sentença, pode decidir a
respeito dos efeitos da apelação interposta. Mas nada impede que, em situações excepcionais, o
juiz emita pronunciamento suspendendo os efeitos da sentença antes mesmo da interposição da
apelação, conforme sustentado acima, no corpo do texto.
Tratando especificamente da “antecipação da tutela”, Dinamarco apresenta razões que permitem
justificar a necessidade da concessão de medida urgente de qualquer natureza (antecipatória
ou cautelar) pelo juízo a quo após a prolação da sentença e antes da subida dos autos ao Tribunal,
inclusive previamente à interposição do recurso de apelação: “A necessidade de antecipar pode
surgir a qualquer tempo, inclusive no momento de decidir a causa ou até mesmo depois da
sentença, sem que antes disso houvesse o periculum in mora justificador da medida; pode também
inexistir no espírito do juiz a convicção da probabilidade do direito do autor, ou fumus boni iuris,
antes desses momentos adiantados do procedimento, sobrevindo no momento de sentenciar ou
mesmo depois. Essas não são situações ordinárias, do dia-a-dia, mas quando ocorrerem é preciso
ter a disposição de tomá-las em consideração sem o preconceito de uma suposta preclusão do
poder de ditar a antecipação da tutela jurisdicional. Quando ocorrer uma situação extraordinária
que clame por uma medida urgente, é perfeitamente legítimo incluir na sentença de mérito um
capítulo impondo a providência adequada a evitar que o direito pereça. Sistematicamente, é até
mais seguro conceder a tutela antecipada nesse momento, quando, superadas pela instrução
exauriente as dúvidas do julgador sobre os fatos e as teses jurídicas pertinentes, ele terá chegado
ao convencimento de que o autor tem razão: se houver a urgência que a legitime, a antecipação
deve ser concedida ainda nesse momento final do procedimento em primeiro grau de jurisdição.”
E prossegue o autor: “Mesmo depois de proferida a sentença de mérito, é mais do que razoável
entender que permanece a competência do juiz de primeiro grau para apreciar pedidos de
antecipação tutelar, desde que os autos ainda estejam em seu poder, não havendo sido remetidos
ao tribunal. Essa afirmação poderia parecer obstada pela regra do exaurimento da competência,
pela qual o juiz está em princípio proibido de introduzir alterações na sentença já publicada
(CPC, art. 463), mas conta com o apoio de uma disposição soberanamente superior, que é a
garantia do acesso à justiça” (DINAMARCO. Nova era..., p. 91-93).
Por razões similares, parece-nos perfeitamente possível o juiz, antes mesmo da interposição do
recurso, determinar a suspensão dos efeitos da sentença a pedido do vencido. Essa possibilidade
fica de certo modo reforçada pela existência de regra legal expressa atribuindo ao juízo a quo o
poder-dever de decidir a respeito dos efeitos da apelação interposta. Se cabe ao juízo a quo, por
expressa disposição legal, decidir a respeito dos efeitos da apelação interposta, razoável admitir
que, em casos excepcionais, suspenda os efeitos da sentença antes mesmo da interposição do
recurso (algo nos moldes da medida cautelar destinada a suspender os efeitos de acórdão antes
mesmo da interposição do recurso especial, admitida pela jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça).
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Confiram-se os seguintes textos, nos quais são colacionados alguns julgados sobre o tema:
46
AZEVEDO, Ana Paula Schoriza Bueno de. Capítulos da sentença: como o STJ tem se posicionado
sobre o termo inicial para a contagem do prazo da ação rescisória?. Revista de Processo, São Paulo,
n. 176, out. 2009. p. 196, nota 1; GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Capítulos autônomos da decisão
e momentos de seu trânsito em julgado. Revista de Processo, São Paulo, n. 111, p. 290-305, jul./set.
2003; CARDOSO, Oscar Valente. Capítulos de sentença, coisa julgada progressiva e prazo para a
ação rescisória. Revista Dialética de Direito Processual, São Paulo, n. 70, p. 75-85, jan. 2009.
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ação rescisória quando o recurso interposto contra a sentença não fosse conhecido.
Afirmavam, os julgados, a necessidade de contar o prazo da rescisória da data do
trânsito em julgado da decisão de não conhecimento do recurso — e não do termo
ad quem do prazo em que deveria ter sido interposto o recurso não conhecido.
Mas a Súmula nº 401 acabou indo além dessa questão, para afirmar a impos
sibilidade de ajuizar ação rescisória contra capítulos de mérito não abrangidos
por recurso interposto no processo. Apenas quando não couber mais recurso algum
no processo é que terá início o prazo para ação rescisória, contra todos os capítulos
da sentença. É exatamente o que havia sido decidido no bojo dos Embargos de
Divergência nº 404.777/DF, referidos no item anterior.
47
BARBOSA MOREIRA. Sentença..., p. 92 et seq.
48
DINAMARCO. Capítulos..., p. 118 et seq.
49
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Os elementos objetivos da demanda examinados à luz do
contraditório. In: TUCCI, José Rogério Cruz e; BEDAQUE, José Roberto dos Santos (Coord.). Causa
de pedir e pedido no processo civil: questões polêmicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 48.
50
MIRANDA, Gilson Delgado. Comentário ao art. 505. In: MARCATO, Antonio Carlos (Coord.). Código
de Processo Civil interpretado. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 1740.
51
BONÍCIO, Marcelo José Magalhães. Novos perfis da sentença civil: classificação, estrutura, capítulos,
efeitos e coisa julgada. Revista Dialética de Direito Processual, n. 53, p. 110-111, ago. 2007.
52
TALAMINI, Eduardo. Coisa julgada e sua revisão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 192.
53
GARCIA, op. cit., p. 296.
54
CARDOSO, op. cit., p. 78 et seq.
55
AZEVEDO, op. cit., p. 225.
56
LIEBMAN. “Parte” o “capo”..., p. 47-62.
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57
SICA, op. cit., p. 194. De acordo com o autor: “A descumulação de demandas (seja no curso do
processo [para quem admite essa possibilidade], seja na sentença final) se inspira em parte nos
mesmos objetivos que a própria cumulação, ou seja, os princípios da economia e celeridade
processuais, os quais hoje encontram, inclusive, assento constitucional. Afinal, não faria sentido
que as demandas fossem cumuladas por medida de economia, para que, a partir de então, jamais
pudessem ser separadas, mesmo que isso importasse em amarrar o andamento de uma por
conta das demais.”
58
BARBOSA MOREIRA. Sentença..., p. 96.
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Os capítulos não abrangidos pelo recurso não são substituídos por outros do Tribunal
(art. 512). Ora, se o capítulo não recorrido não é substituído por outro do Tribunal,
então, quando transitar em julgado a última decisão proferida no processo, haverá
coisa julgada material acobertando decisões de diversas instâncias judiciais. A
competência para a ação rescisória contra a decisão de primeiro grau que não foi
recorrida não será do mesmo órgão competente para julgar a ação rescisória contra
a decisão de mérito que, por conta dos diversos recursos interpostos no processo,
acabou advindo de Tribunal. A esse respeito, vide o item 4.7.
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da reformatio in pejus. Tal princípio, como veremos mais adiante, assume especial
importância quando se trata de verificar os limites da devolução operada pelo recurso
parcial interposto: pode o Tribunal, ao julgar o recurso parcial, reformar capítulos
não impugnados para piorar a situação do recorrente?
De acordo com o princípio da proibição da reformatio in pejus, a parte que
recorre de determinada decisão não pode ter a sua situação piorada, do ponto de
vista prático, em razão do julgamento do seu recurso. Ou seja, ao julgar um deter
minado recurso, o Tribunal não pode proferir decisão que piore (qualitativamente
ou quantitativamente) a situação em que se encontra o recorrente, mas apenas
pode mantê-la ou melhorá-la.
Não está o dito princípio expressamente previsto em lei, em nosso ordena
mento.59 Mas ninguém nega a sua existência e aplicabilidade. De uma análise con
junta de princípios e regras expressos do CPC, como o princípio da congruência ou
adstrição (arts. 128 e 515 do CPC) e a regra do interesse recursal (art. 499), fica evidente
que a reformatio in pejus é vedada em nosso ordenamento.
Com efeito, se nem mesmo a parte pode recorrer para pleitear a reforma da
decisão para pior, por falta de interesse recursal, muito menos pode o Tribunal fazê-lo
sem tal provocação. Se o fizesse, estaria ofendendo o princípio da adstrição e, assim,
realizando reformatio in pejus. Mais ainda, possivelmente estaria ofendendo a coisa
julgada formada em relação ao capítulo não impugnado — possivelmente, e não
necessariamente, pois pode ocorrer que o capítulo não recorrido não seja de mérito,
mas processual (por exemplo: um dos pedidos formulados não foi julgado no mérito
por suposta falta de interesse de agir em relação a ele; o conhecimento e rejeição
de tal pedido pelo Tribunal, quando a apelação houvesse se voltado apenas contra
a declaração de improcedência do outro pedido formulado, agravaria a situação do
demandante; haveria afronta ao princípio da proibição da reformatio in pejus, mas
não a coisa julgada).
Para Barbosa Moreira: “Teria sido melhor que o diploma de 1973 houvesse proibido expressis
59
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60
DINAMARCO. Capítulos..., p. 112.
61
BARBOSA MOREIRA. Comentários..., p. 437.
62
Ibid., p. 435.
63
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Apelação: questões sobre admissibilidade e efeitos. Revista
da Procuradoria Geral do Estado, São Paulo, 2003. p. 116. Edição especial “30 anos do Código de
Processo Civil”.
64
KOZIKOSKI, Sandro Marcelo. Manual dos recursos cíveis: teoria geral e recursos em espécie. 2. ed.
Curitiba: Juruá, 2004. p. 172.
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66
BARBOSA MOREIRA. Comentários..., p. 353-354.
67
APRIGLIANO, op. cit., p. 126-127.
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69
APRIGLIANO, op. cit., p. 129.
70
BONÍCIO. Capítulos..., p. 113 et seq.
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71
DINAMARCO. Capítulos..., p. 45.
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Não nos parece, porém, que as coisas se passem dessa forma. Parece-nos que,
rejeitado o pedido de rescisão, o de restituição não chega a ser examinado. O juiz
não dá “o passo a mais” visualizado por Dinamarco, para rejeitar também o pedido
de restituição. A própria prática demonstra isso: nas decisões sobre pedidos em
cumulação sucessiva eventual, quando rejeita o pedido dominante, o juiz nada diz
sobre o dependente — não se podendo ver em tal silêncio uma decisão implícita
(inadmissíveis que são as “decisões implícitas” em nosso ordenamento jurídico).
Nesse mesmo sentido, Aprigliano.72
Seja como for, parece-nos claro que jamais poderá o autor apelar pedindo
apenas o acolhimento do pedido de restituição da coisa, pois o acolhimento do
pedido de rescisão é condição inarredável para tanto. Mas, a contrario sensu, ele
pode, se quiser, apelar somente do pedido de rescisão, abrindo mão de obter a coisa
objeto do contrato. O acolhimento do pedido de rescisão contratual não depende,
logicamente, do acolhimento do pedido de restituição da coisa. Poderia, inclusive,
ter sido feito independentemente deste.
Portanto, se o autor não reiterar expressamente, na sua apelação, o pedido
de restituição da coisa, limitando-se a impugnar o capítulo que rejeitou o pedido de
rescisão contratual, então a devolução operada pelo recurso abrangerá apenas este
último. E assim é por força do art. 293 do CPC, segundo o qual os pedidos (mesmo
no âmbito recursal)73 são interpretados restritivamente.74 75
Mas, note-se que, uma
72
APRIGLIANO, op. cit., p. 130.
73
DINAMARCO. Nova era..., p. 130; LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Recurso especial: ordem
pública e prequestionamento. In: YARSHELL, Flávio Luiz; MORAES, Maurício Zanoide (Org.). Estudos
em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: DPJ, 2005. p. 729.
74
É o que também defende Aprigliano, op. cit., p. 131. Diz o autor: “A devolução da ação dependente,
absorvida pela rejeição da ação principal, não é compreendida, porém, na ampla devolução do
art. 515, pois não se trata de mera questão suscitada e discutida na ação. Por tratar-se de ação
autônoma, o seu reexame dependerá de específica menção no recurso de apelação, para que
a matéria não transite em julgado [a nosso ver, não ocorre a formação de coisa julgada, pois
inexistirá decisão acerca do pedido dependente; o que obstará o julgamento de tal pedido pelo
Tribunal será o limite da devolução operada pela apelação: o Tribunal não pode julgar mais do
que lhe foi devolvido].”
75
Outra questão é saber se, uma vez formulado pelo recorrente o pedido para julgamento do
pedido dependente, pode ou não o Tribunal examiná-lo diretamente ou se deve devolver o
feito ao juízo a quo, para que este decida. Diz Aprigliano: “Se, por hipótese, a ação absorvida for
expressamente mencionada na apelação contra a rejeição da ação principal, estaremos diante
de um ulterior problema, qual seja, definir se o tribunal deve ou não analisar tais pedidos, em
caso de provimento do recurso quanto à ação principal, pois o julgamento direito pelo tribunal
pode caracterizar ofensa ao princípio do duplo grau de jurisdição, uma vez que a questão não
chegou a ser decidida em primeiro grau. Aqui, valem as observações feitas anteriormente sobre
a necessidade de o órgão a quo ter tido ao menos a oportunidade de julgar a causa. O órgão ad
quem poderá prosseguir no julgamento da ação apenas se, quando da prolação da sentença,
todas as condições para o julgamento do mérito estiverem presentes” (Ibid., p. 131).
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76
Mas nem todos pensam assim. Humberto Theodoro Júnior, por exemplo, reputa, apresentando
exemplo semelhante ao que formulamos no texto, que cabe ao Tribunal, diante da apelação
contra a rejeição do pedido dominante, acolhendo este último, passar ao exame dos pedidos
dependentes (que, diz o autor, acabaram não sendo apreciados pelo juízo a quo). Nas suas
palavras: “São, também, todas as prejudiciais de mérito propostas antes da sentença e que
deveriam influir na acolhida ou rejeição do pedido, ainda que o juiz a quo não as tenha enfrentado
ou solucionado por inteiro (art. 516). É o que se passa, por exemplo, com a cumulação de pedidos
conexos e consequentes. O juiz, negando o primeiro, deixa de examinar os demais. Recorrendo
a parte vencida e logrando reformar a sentença para acolher o primeiro pedido, terá o tribunal
de completar o julgamento decidindo os demais pedidos conexos prejudicados pela decisão de
primeira instância. Por exemplo: pedia-se, originariamente, a anulação do contrato, a condenação
a perdas e danos, e restituição do bem negociado, e lucros cessantes. Como a sentença denegou
a anulação, todos os demais pedidos do autor nem sequer foram por ela cogitados. Ao tribunal,
porém, não é licito limitar o julgamento da apelação ao tema da anulação. Se entender que é o
caso de acolhê-la, terá também de prosseguir na análise das outras pretensões consequenciais
(perdas e danos, restituição, lucros cessantes), pouco importando que tais temas não tenham sido
julgados na instância de origem” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil:
teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 49. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2008. v. 1, p. 594-595).
77
APRIGLIANO, op. cit., p. 133.
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78
CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 91.
79
APRIGLIANO, op. cit., p. 128.
80
BONÍCIO. Capítulos..., p. 116.
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81
APRIGLIANO, op. cit., p. 132.
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Mas pode ser que o recurso do réu vingue. Se isso ocorrer, o autor “perderá”
aquilo que havia obtido em primeiro grau, i.e., a procedência do pedido dominante
ou principal. E o que ocorre, nesse caso, com o pedido subsidiário? Não temos
dúvida de que continua podendo ser apreciado no bojo do mesmo processo, sob
pena de o autor, que já não pôde interpor recurso, ficar sem nada.
Resta saber se o Tribunal deve devolver o feito ao juízo a quo, para que julgue
o pedido subsidiário formulado, ou se deve passar ele mesmo diretamente ao seu
julgamento? Em princípio, entendemos, deve devolver o feito ao juízo a quo, para
que não haja supressão de instância. Mas, se a matéria controvertida for exclusiva
mente de direito ou, sendo de fato e de direito, não houver mais provas a produzir
relativamente ao pedido “subsidiário” e, ademais, o contraditório acerca de tal pedido
tiver sido devidamente instaurado e exercido pelas partes, deve o Tribunal julgá-lo,
aplicando por analogia a regra do art. 515, §3º, do CPC.
É verdade que no caso imaginado não se tem sentença terminativa, como
na situação prevista no §3º do art. 515. Mas, substancialmente, as situações não são
diversas: em ambos os casos, haverá pedido(s) não apreciado(s) pelo juízo a quo —
variará apenas a causa para a ausência de tal apreciação. E em ambos os casos trata-
se de saber se pode o Tribunal, afastando a causa que havia impedido o juízo a quo
de apreciar determinado pedido, julgá-lo imediatamente. Não vemos razão para
dizer que apenas na hipótese em que o processo de origem tenha sido extinto sem
julgamento do mérito tal seria possível. As mesmas razões que determinam o “salto
de grau” em um caso justificam-no em relação ao outro.
Exemplo 03 (pedido principal e pedido referente a verbas de sucumbência): e
se se tratar de pedido principal e de pedido (“implícito” ou não) de condenação ao
pagamento de honorários advocatícios e despesas processuais?
Se o réu, ao apelar contra a sentença que julgou procedente o pedido prin
cipal, nada disser sobre o capítulo que o condenou ao pagamento das verbas de
sucumbência, esta condenação terá de ser invertida em caso de provimento do recurso.
O capítulo referente às verbas fica, portanto, abrangido pela devolução operada
pela apelação — mas, também aqui, de forma limitada. Ou seja, o vínculo existente
entre o capítulo impugnado e o não impugnado determina, pela sua intensidade
e por razões lógico-jurídicas, a devolução de ambos ao Tribunal — mas aquele não
expressamente impugnado, de forma limitada, em respeito ao princípio da adstrição.
E se o pedido principal foi acolhido, mas o de condenação do réu ao pagamento
dos honorários e custas não: o recurso do réu devolve ao Tribunal o capítulo referente
às verbas de sucumbência? Não. O Tribunal, mantendo o capítulo impugnado, refe
rente ao pedido dominante, não poderia condenar o réu-apelante no pagamento
das verbas de sucumbência que o juízo a quo deixou de imputar-lhe, sob pena
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82
DIDIER; CUNHA, op. cit., p. 108.
83
BEDAQUE. Os elementos..., p. 45.
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84
BARBOSA MOREIRA. Comentários..., p. 444.
85
THEODORO JÚNIOR, op. cit., p. 600-601.
86
MENEZES MARCATO, op. cit., p. 75-76.
87
BONÍCIO. Capítulos..., p. 145.
88
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado. 10. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 517.
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89
Por exemplo: DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. 4. ed. São Paulo: Malheiros,
2003. p. 154-157; LUCON. Recurso especial..., p. 730; MIRANDA, op. cit., p. 1763; MENEZES MARCATO,
op. cit., p. 80.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
***
90
APRIGLIANO, op. cit., p. 171.
91
THEODORO JÚNIOR, op. cit., p. 597-598.
92
BARBOSA MOREIRA. Comentários..., p. 431, nota 48.
93
LUCON. Recurso especial..., p. 730. O autor diz ser “vedada” a remessa dos autos ao juízo a quo
quando a causa estiver madura para julgamento do mérito, não havendo (novas) provas a
produzir.
94
BEDAQUE. Apelação..., p. 120.
95
MENEZES MARCATO, op. cit., p. 82-83.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
96
APRIGLIANO, op. cit., p. 163 et seq.
97
THEODORO JÚNIOR, op. cit., p. 598-599.
98
KOZIKOSKI, op. cit., p. 176.
99
DIDIER; CUNHA, op. cit., p. 109.
100
APRIGLIANO, op. cit., p. 162.
101
DINAMARCO. A reforma..., p. 159-160.
102
MENEZES MARCATO, op. cit., p. 83.
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***
E se, aplicando o art. 515, §3º, do CPC, o Tribunal julga o mérito da causa
contra o autor-apelante: nesse caso ocorre reformatio in pejus? Alguns autores dizem
que sim. Ter-se-ia, na hipótese, uma exceção legítima ao princípio da proibição da
reformatio in pejus, ou melhor, uma reformatio in pejus legítima. É o que afirma, por
exemplo, Bedaque.103 A legitimidade da reformatio in pejus decorrente da aplicação
daquele dispositivo dever-se-ia ao fato de estar ela prevista expressamente no
ordenamento, o que permitiria ao autor saber de antemão da possibilidade de o
Tribunal, ao julgar a apelação, decidir o mérito em seu desfavor (inclusive, sabendo
de tal possibilidade, poderia o autor ter optado por lançar mão de nova ação no lugar
da anterior, extinta sem julgamento do mérito).
Para aqueles autores que entendem que a aplicação do §3º do art. 515
depende de requerimento expresso do recorrente, haveria reformatio in pejus ilegí
tima (e, tecnicamente, a verdadeira reformatio in pejus seria apenas aquela ilegítima,
inadmissível, não prevista no ordenamento) sempre que, não havendo tal requeri
mento, a sentença fosse reformada para julgar improcedente o pedido formulado na
inicial. É o posicionamento de Aprigliano104 (no caso em que o mérito fosse julgado
contra o réu, não haveria de se falar em reformatio in pejus; mas a nulidade, nesse caso,
também existiria, por ofensa ao contraditório e ampla defesa).
Por fim, há quem negue haver reformatio in pejus (ou, mesmo, uma exceção
legítima à sua proibição) na situação imaginada. Dinamarco entende que, na
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***
105
DINAMARCO. A reforma..., p. 162.
106
MENEZES MARCATO, op. cit., p. 86-87.
107
Como expusemos na nota 26, Sica entende que, com a edição da Lei nº 11.232, por “sentença
terminativa” deve-se compreender o ato que apresenta como conteúdo uma das situações do
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art. 267 do CPC, ponha ou não ele fim ao procedimento em primeiro grau. Disso decorreria
importante consequência sobre o sistema de preclusões. As questões de ordem pública, como se
sabe, não estão sujeitas a preclusão. O entendimento predominante é o de que a decisão tomada
a seu respeito no curso do processo pode ser revista a qualquer tempo e em qualquer grau de
jurisdição, inclusive de ofício. Por exemplo: se o juiz acolhe a preliminar de ilegitimidade passiva
de um dos litisconsortes no início do processo, nada impede que venha a decidir diferentemente
mais para frente, caso se convença da legitimidade, reinserindo o litisconsorte no processo. Mas,
segundo Sica, essa solução, a partir da edição da Lei nº 11.232, já não seria mais possível. Isso
porque, doravante, ter-se-ia, na hipótese, sentença. E, assim, decisão que, caso não recorrida, fica
acobertada por coisa julgada formal — e, por conseguinte, não mais passível de ser revista no
curso do processo (SICA, op. cit., p. 198). Embora não concordemos, conforme expusemos na nota
26, com o conceito de sentença defendido por Sica, reputamos correta a conclusão do autor no
sentido de que a parte da sentença que acolhe preliminar, se não impugnada, transita em julgado
formalmente, não podendo ser revista pelo Tribunal — e isso nem mesmo se houver apelação
contra capítulo referente a outro pedido, no qual se tenha acolhido preliminar a ele referente ou
julgado o próprio mérito.
108
Alguns preferem dizer que, nesse caso, o que se tem é o “efeito translativo” da apelação, não efeito
devolutivo. Diz-se que o efeito translativo implica a transferência ao Tribunal de questões de
ordem pública pertinentes a capítulo processual que, embora não impugnado, tem relação de
impedimento com o capítulo de mérito devolvido pelo recurso. Faz-se a seguinte diferenciação:
a) Quando o apelante impugna o capítulo processual, as questões processuais (as que não são
de ordem pública mas não estão preclusas e, também, aquelas que são de ordem pública — não
sujeitas a preclusão) são transferidas ao Tribunal por conta do efeito devolutivo em sua dimensão
vertical, não por conta do efeito translativo.
b) Já quando o capítulo processual não é impugnado, as questões processuais de ordem pública,
por sua relevância para o sistema (e, por isso, não são passíveis de preclusão) e na medida em que
sejam prejudiciais ou condicionantes do capítulo de mérito devolvido pela apelação, podem e
devem ser conhecidas pelo Tribunal. São a ele transferidas por conta do efeito translativo, previsto
em lei.
Porém, não nos parece necessária essa diferenciação. Basta compreender que o efeito devolutivo,
além de transferir ao Tribunal os capítulos expressamente impugnados e aqueles que lhe sejam
(nos termos anteriormente expostos neste trabalho) “dependentes”, transfere-lhe também (por
força de lei) as questões processuais de ordem pública (e, assim, o capítulo processual que nelas
se funda) cuja decisão tenha o condão de afetar os capítulos de mérito abrangidos pelo recurso.
Trata-se, de certa forma, de exceção ao princípio segundo o qual a impugnação ao capítulo
condicionado não devolve ao Tribunal o capítulo condicionante — afinal, o capítulo processual
condiciona a existência do capítulo de mérito... Mas é uma exceção prevista em lei: a lei autoriza
que determinadas questões, por sua relevância para o sistema e a ordem pública, sejam
conhecidas e decididas a qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente de pedido
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das partes. Entre essas questões estão, por exemplo, as condições da ação e outros requisitos de
admissibilidade do julgamento de mérito (por exemplo, competência absoluta).
109
DINAMARCO. Capítulos..., p. 110. Não se ignora a existência de entendimento no sentido de que
a sentença de carência é de mérito e faz coisa julgada material (por exemplo: COSTA, Susana
Henriques da. Condições da ação. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 148 et seq.). Mas mesmo para
aqueles que o acolhem, não fica impedida a repropositura da demanda se o fator que houver
determinado anteriormente a decretação de carência deixar de existir ou for corrigido.
110
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São Paulo:
Malheiros, 2006. p. 388.
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111
BONÍCIO. Capítulos..., p. 171.
112
DINAMARCO. Capítulos..., p. 110.
113
BEDAQUE. Os elementos..., p. 48-49.
114
THEODORO JÚNIOR, op. cit., p. 594.
115
É o que escreve Bonício — para quem, porém, a questão em exame versa sobre o “efeito
translativo” dos recursos: “Portanto, o efeito translativo dos recursos (no que se refere às matérias
de ordem pública, reabrindo a possibilidade de análise destas), na verdade, encontra seus limites
na medida das impugnações realizadas no recurso, não podendo atingir capítulos que não foram
impugnados, salvo de houver capítulos dependentes destes (rectius: efeito devolutivo externo)”
(BONÍCIO. Capítulos..., p. 173-174).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
116
DINAMARCO. Capítulos..., p. 109.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
O que faz com que o seu julgamento possa, em tese, atingir o capítulo de mérito
não é nada mais do que o seu efeito devolutivo externo — que é limitado.
E se a carência de ação for reconhecida pelo Tribunal apenas em relação a
alguns dos pedidos cumulados acolhidos em primeiro grau? Nesse caso, somente
os respectivos capítulos na sentença é que poderão ficar prejudicados. Pode ser, por
exemplo, que o autor careça de legitimidade em relação a apenas um dos pedidos
formulados. O capítulo da sentença referente ao outro pedido, para o qual não havia
ilegitimidade, não poderá ser atingido pelo acolhimento da preliminar pelo Tribunal.
Por fim, note-se que, se o réu apela para alegar a carência apenas em relação
a um dos pedidos acolhidos em primeiro grau, apenas o capítulo referente a esse
pedido é que poderá ser atingido pela decisão que o Tribunal vier a proferir. Ainda
que existam impeditivos processuais de ordem pública em relação aos demais
pedidos formulados e julgados pelo juízo a quo, o Tribunal deles não poderá conhe
cer para reformar ou cassar os capítulos não impugnados referentes a esses outros
pedidos. O trânsito em julgado material desses outros capítulos não terá sido impe
dido pela apelação interposta, haja vista os limites da devolução por ela operada no
plano horizontal.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
117
BEDAQUE. Os elementos..., p. 38-42
118
APRIGLIANO, op. cit., p. 194.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
de parte. A sentença não fará, portanto, coisa julgada para os litisconsortes citados nem para os
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c) Prescrição e decadência
A prescrição e a decadência podem, como se sabe, ser conhecidas ex officio
pelo juiz. Imagine-se que a prescrição ou a decadência é detectada pelo Tribunal
no momento de julgar a apelação interposta por uma das partes. Qual o destino
dos capítulos da sentença recorrida?
não citados. Será juridicamente ineficaz em relação aos litisconsortes que participaram do
processo. E, em relação aos não citados, inexistirá sentença que os vincule como partes (i.e.,
não haverá sentença enquanto ato oriundo de processo do qual tenham eles participado como
partes). Assim é em virtude de a situação de direito material ser incindível, não havendo como
imaginar, em caso de sentença de procedência, dois resultados diferentes — um para o(s)
litisconsorte(s) citado(s), outro para o(s) não citado(s). Nesse sentido: TALAMINI, op. cit., p. 346.
121
APRIGLIANO, op. cit., p. 185.
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c.2) O autor apela da sentença de improcedência (declarada por outra razão diversa da
prescrição ou decadência)
Segunda situação: o autor apela da sentença de improcedência, declarada
por outra razão diversa da prescrição ou decadência. Pode o Tribunal reconhecer a
prescrição ou decadência? Isso configura reformatio in pejus?
Pode. E não caberá falar, na hipótese, em reformatio in pejus. Substituir-se-á
um julgamento de mérito desfavorável ao autor por outro, a ele igualmente desfa
vorável e que também é “de mérito”.124 A situação do autor-apelante, portanto, não
será agravada do ponto de vista prático, substancial.
Mas observe-se que, se houver na sentença capítulos favoráveis ao autor,
estes, a menos que tenham sido objeto de recurso do réu, não serão atingidos pelo
reconhecimento da prescrição ou decadência pelo Tribunal, por ocasião do julga
mento da apelação. Terão transitado em julgado materialmente e, por conseguinte,
permanecerão hígidos. Por exemplo: o pedido de condenação na prestação especí
fica foi rejeitado, mas o (subsidiário) de condenação no equivalente pecuniário
foi acolhido. O autor apela contra a rejeição do pedido principal. Se o Tribunal reco
nhece a prescrição ou decadência, o capítulo referente ao pedido “subsidiário”,
na medida em que terá transitado em julgado, permanecerá intacto.
122
Ibid., p. 187.
123
APRIGLIANO, op. cit., p. 141.
124
Aliás, constatando a ocorrência de prescrição ou decadência, o Tribunal nem sequer precisa se
ocupar de verificar se os fundamentos da sentença estão ou não corretos. Limitar-se-á a declarar
a prescrição ou decadência.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
125
MENEZES MARCATO, op. cit., p. 84-85.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
126
DINAMARCO. Capítulos..., p. 91.
127
BARBOSA MOREIRA. Comentários..., p. 445.
128
BONÍCIO. Capítulos..., p. 184-185.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
b.2) Cumulação sucessiva eventual: o caso em que o pedido dependente foi acolhido
com base em fundamento não deduzido nem discutido nos autos
Pode ocorrer que o pedido de restituição da coisa objeto do contrato tenha
sido acolhido com base em fundamento não deduzido em juízo nem discutido nos
autos. Ou seja, o acolhimento do pedido de restituição não se deu em decorrência
do anterior acolhimento do pedido dominante, de rescisão contratual (olvidado pela
sentença); mas sim por força de fundamento não deduzido em juízo. Se isso tiver
acontecido, então não há dúvidas de que os limites objetivos da demanda terão
sido extrapolados.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
129
DINAMARCO. Capítulos..., p. 89.
130
Sobre a inexistência jurídica da sentença decorrente da falta de parte, vide: TALAMINI, op. cit.,
p. 337 et seq.
131
Cruz e Tucci entende que os terceiros beneficiados pela sentença ficam vinculados à coisa julgada
que a acoberta (CRUZ E TUCCI, José Rogério. Limites subjetivos da eficácia da sentença e da coisa
julgada civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 209). Talamini, por outro lado, pautando-se
nas lições de Liebman, entende que a coisa julgada não se estende, ao menos em princípio, a
terceiros. Os efeitos da sentença é que em regra se estendem a terceiros, eventualmente para
beneficiá-los juridicamente — nesse caso, retirando seu interesse para ajuizar ação voltada a
obter o mesmo resultado prático já obtido (TALAMINI, op. cit., p. 96 et seq.).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
b.3) Cumulação sucessiva eventual: o caso em que o pedido dependente foi acolhido
como consequência do acolhimento do pedido dominante — o qual, porém, está
“perdido” na fundamentação
Pode ocorrer, também, que na parte dispositiva da sentença esteja consig
nado apenas o acolhimento do pedido de restituição da coisa objeto do contrato —
nada se dizendo sobre o acolhimento ou não do pedido de rescisão do contrato.
Mas se da leitura da fundamentação puder-se extrair o acolhimento do pedido
dominante (do que o acolhimento do pedido dependente terá sido decorrência
direta), então não haverá omissão alguma a ser suprida, mas quando muito apenas
um esclarecimento a ser feito. Ter-se-á, na hipótese, uma falsa omissão da sentença
em relação ao pedido dominante.
Nesse ponto, cumpre destacar a importância da boa técnica na interpre
tação das sentenças. Nem sempre o julgador observará com exatidão a estrutura da
sentença definida no art. 458 do CPC. Eventualmente, por falha do julgador, a decisão
a respeito do pedido estará localizada fora da parte dispositiva da sentença. Isso,
porém, não permitirá afirmar que falta na sentença decisão sobre o pedido. A decisão
simplesmente não estará onde se esperava encontrá-la.
Confira-se, a esse respeito, a seguinte lição de Bonício: “É na parte dispositiva,
pois, que devemos buscar os capítulos de sentença, mas, convém advertir, nem
sempre encontramos decisões judiciais fiéis à sistematização estabelecida no art. 458
do Código de Processo Civil. Em algumas situações a parte dispositiva da sentença
encontra-se dispersa ao longo da motivação, ou então simplesmente antecede a
esta. Em situações assim, é bom lembrar que a análise da existência de capítulos da
sentença não leva em consideração nenhum critério ligado a localização da parte
dispositiva. Interessa, isso sim, o ‘conteúdo’ da decisão, ou seja, o momento em que
o juiz julga, efetivamente, o pedido formulado, considerando-o procedente ou
não. Por exemplo, no caso de pedidos alternativos, como o juiz deverá julgar proce
dente apenas um deles, a rejeição do outro pedido, quer conste na motivação, quer
conste na parte dispositiva da sentença, constituirá sempre um capítulo de sentença”.132
Assim, caso o pedido dominante tenha sido apreciado, mas apenas não esteja
localizado na parte dispositiva da sentença, não haverá omissão a ser suprida pelo
132
BONÍCIO. Capítulos..., p. 17.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
b.4) Cumulação sucessiva eventual: o caso em que o pedido dependente foi rejeitado
em decorrência da omissão do pedido dominante (possibilidade de aplicar o art. 515, §3º)
E se houve, efetivamente, omissão quanto ao pedido dominante (rescisão
do contrato) e, em razão de tal omissão, o pedido dependente (devolução da coisa
objeto do contrato) foi rejeitado: se o autor apela para alegar tal omissão, como
deve o Tribunal proceder?
A situação dificilmente se verificará na prática. Mas não se pode destacar
por completo a possibilidade de o juiz rejeitar o pedido de devolução da coisa
precisamente por ter olvidado o pedido (dominante) de anulação do contrato que
tem a coisa como objeto (pedido este cujo acolhimento poderia resultar no acolhi
mento do pedido de restituição da coisa). Ou seja, estamos falando de caso em que,
se tivesse notado e decidido o pedido dominante, o juiz possivelmente teria acolhido
o pedido dependente.
Diante dessa situação, reconhecendo a omissão, deve o Tribunal anular o
capítulo dependente (que estará prejudicado) e devolver o processo ao juízo a quo,
para que perante ele seja feita a instrução e, assim, os pedidos formulados possam
ser devidamente apreciados.
Se, porém, a matéria for estritamente de direito ou, sendo de direito e de
fato, todas as provas necessárias já houverem sido produzidas, o Tribunal poderá
julgar diretamente o pedido dominante e substituir, a pedido do autor-recorrente, a
decisão de primeiro grau sobre o pedido dependente por outra — adequada ao que
houver sido decidido sobre o pedido dominante.
c) Não cabe ao réu apelar para alegar que um dos pedidos do autor não foi apreciado
Evidentemente não cabe ao réu apelar para alegar omissão em relação a
pedido do autor.
Mas, voltando-se ao caso referido no item “b.2”, em que houve omissão em
relação ao pedido de rescisão contratual e o pedido de restituição da coisa objeto
do contrato foi acolhido com base em fundamento não deduzido: nesse caso,
pode o réu apelar para alegar a nulidade (ou, como sustentamos, a inexistência/
ineficácia jurídica) da decisão em relação ao capítulo dependente e pedir a extinção
do processo sem julgamento do mérito.
Com efeito, o Tribunal apenas poderá anular o (ou melhor, declarar a inexis
tência/ineficácia do) capítulo impugnado e extinguir o processo sem julgamento
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
133
BONÍCIO. Capítulos..., p. 139.
134
DINAMARCO. Capítulos..., p. 111, conforme conhecida lição de Liebman.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
135
“A impugnação sucessiva, dentro do prazo, de partes distintas da decisão não ofende a preclusão
consumativa, porque apenas quanto à(s) parte(s) originalmente impugnada(s) se exercera o
poder de recorrer; nem vulnera o princípio da unicidade, porque cada parte é havida, desse ponto
de vista, como uma decisão per se. Dir-se-á, e com razão, que ela é capaz de gerar complicações
procedimentais; maiores, entretanto, são as criadas pelo recurso adesivo, e nem por isso deixou o
Código de consagrá-lo” (BARBOSA MOREIRA. Comentários..., p. 355).
136
DINAMARCO. A reforma..., p. 146.
137
Os capítulos não devolvidos ao Tribunal, como já se expôs, transitam em julgado. Como não
serão substituídos em função do julgamento a ser realizado no Tribunal, a sentença de primeiro
grau continuará os encampando. Já os capítulos devolvidos serão (se conhecida a apelação)
substituídos a partir do julgamento do Tribunal (ou por ele cassados, para que sejam futuramente
substituídos por novo julgamento do juízo a quo). Sendo substituídos, uma nova sentença (ou
acórdão-sentença) os abarcará. Pode, portanto, haver, em um mesmo processo, mais de uma
sentença (ou acórdão-sentença) — e, assim, sentenças transitadas em julgado em momentos
diversos. Isso não contradiz o que se afirmou no texto, sobre a unidade formal da sentença. Cada
sentença é um ato — possivelmente, com mais de um capítulo. Mas pode haver (BARBOSA
MOREIRA. Sentença..., p. 92-94) mais de uma sentença no processo — afirmação esta que, por
sua vez, não conflita com a conclusão que expusemos na nota 26, sobre a impossibilidade de
haver, em nosso ordenamento, sentenças parciais; a nossa conclusão, naquela nota, foi a de que
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
sentença é necessariamente, segundo o nosso CPC, ato que põe fim a fase ou ao procedimento,
encerrando a instância — não havendo, nisso, óbice a que haja mais de um ato encerrando
instância no curso de um mesmo processo.
138
No item 3.3.2, afirmou-se que é possível haver o ajuizamento de uma ação rescisória contra cada
capítulo de uma mesma sentença. É que nesse caso não tem cabimento falar em preclusão
consumativa, fenômeno intraprocessual. Além disso, destaque-se que a ação rescisória é um
meio de desfazimento da coisa julgada. Havendo mais de um comando de mérito na sentença,
proferido em sede de cognição exauriente, haverá mais de uma coisa julgada a desfazer — por
diversas demandas ou uma só, com pedidos cumulados.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
a quo deverá aplicar o §1º do art. 518, inadmitindo a apelação. Nesse caso, o fato de
o autor ter impugnado o capítulo referente às verbas de sucumbência não justificará
a remessa do recurso ao Tribunal, pois a simples inversão de condenação pretendida
apenas seria possível se o capítulo de mérito principal pudesse ser devolvido ao órgão
ad quem. Diferente será a solução se, no apelo, o autor houver requerido a redução do
valor da sua condenação, considerando eventual desprovimento do recurso no ponto
em que se volta contra o capítulo principal. É que existirá um interesse autônomo
do autor na redução da sua condenação nas verbas de sucumbência, passível de ser
satisfeito mesmo que a apelação não apresente condições de ser admitida ou provida
na parte em que se volta contra o capítulo principal. Por aí já se vê que a precisa
identificação dos capítulos da sentença abrangidos pelo recurso e a compreensão das
possíveis relações de dependência que pode existir entre eles são fundamentais para
que o juiz de primeiro grau possa exercer o juízo de admissibilidade adequadamente.
Acerca da postura que o juízo a quo deve ter no ato de recebimento da apelação,
Bonício escreve: “A teoria dos capítulos de sentença e os potenciais benefícios que
esta teoria pode trazer dependem, em muito, de uma análise do recurso interposto,
por parte do juiz. Desta análise dependerá a perfeita identificação dos capítulos da
sentença e a delimitação dos efeitos em que os recursos devem ser recebidos. Assim,
por exemplo, se o juiz constatar que o recurso interposto se limitou a apenas um,
dos três capítulos que existem em uma sentença, e verificar que os outros dois capí
tulos são absolutamente independentes do capítulo impugnado, deverá especificar
que recebe o recurso interposto em relação aos capítulos a e b, sobre os quais inci
dirão os efeitos devolutivo e suspensivo próprios do recurso. Deverá, ainda, o juiz,
declarar que o capítulo c não foi impugnado e, portanto, transitou materialmente
em julgado, facultando ao credor dar início à execução imediatamente desta parte
do julgado. Não se trata, neste caso, de execução provisória, mas, sim, de execução
definitiva, considerando que a parte da decisão não recorrida não poderá ser
prejudicada pela reforma da parte que foi objeto de impugnação no recurso.”139
Isso não significa, porém, que um despacho genérico de recebimento da
apelação (que não especifique os seus efeitos em relação a cada capítulo da sen
tença...) seja apto, por si só, a devolver capítulos não impugnados ao Tribunal ou a
prolongar o estado de ineficácia de capítulos não abrangidos pela devolução ope
rada pelo recurso. Diante de um despacho genérico, poderá a parte opor embargos
de declaração ou até mesmo apresentar petição simples ao juízo a quo, destacando
quais os capítulos impugnados e, assim, pedindo a correção do lapso cometido no
ato de recebimento do recurso. Se o juízo a quo se recusar a efetuar a correção devida,
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
140
DINAMARCO. Capítulos..., p. 117-118.
141
Observe-se que o entendimento do STF que consta de sua Súmula nº 292 — no sentido de que,
admitido o recurso extraordinário por apenas um de seus fundamentos, pode o STF conhecê-lo
pelos demais — vale apenas quando se tratar de fundamentos pertinentes ao mesmo capítulo
impugnado. Ou seja, se o recurso extraordinário é inadmitido por todos os seus fundamentos
na parte em que se volta contra o capítulo “A” e, por outro lado, admitido por apenas um dos
seus fundamentos na parte em que se volta contra o capítulo “B”, pode o STF conhecê-lo apenas
em relação ao capítulo “B”, por todos os fundamentos em que interposto. O capítulo “A” transita
em julgado.
O entendimento de Dinamarco, exposto no texto, não conflita, portanto, com a posição sumulada
pelo STF. No caso da apelação, como já se expôs neste trabalho, a apelação admitida/conhecida
transfere ao Tribunal todos os pontos e questões relacionados aos capítulos impugnados. Se a
apelação não for admitida em relação a algum dos capítulos nela tratados, deve o apelante
agravar — sob pena de tais capítulos transitarem em julgado.
142
É fundamental, porém, que a apelação seja analisada à luz de cada capítulo por ela abrangido. Pois
o recurso pode ser admissível em relação a alguns desses capítulos, mas não a outros. Admitida
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
5 Encerramento
Esperamos ter conseguido demonstrar, com o presente texto, a importância
da boa compreensão da tese dos capítulos de sentença, para a adequada solução
de problemas práticos bastante comuns relacionados aos limites e efeitos do recurso
de apelação.
Como dissemos no início da exposição, jamais tivemos a pretensão de exaurir
o tema. Nosso objetivo foi, a partir da experiência adquirida em nossa atuação
profissional e de lições extraídas da doutrina e da jurisprudência, contribuir com
sugestões e críticas a respeito da melhor forma de resolver as diversas questões
práticas que nos propusemos a enfrentar.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 43-119, jan./mar. 2012
1 Introdução
É com perplexidade que se depara, no dia a dia forense, com ações de exi
bição de documento que, mesmo diante de liminar ou sentença de procedência
da pretensão do autor, impondo ordem ao réu para que apresente os documentos
pleiteados, não apresentam um resultado fático útil ao autor tendo em vista a recusa
do réu em cumprir a ordem judicial.
Da análise do ordenamento jurídico verifica-se a existência de duas sanções
principais que podem ser impingidas ao réu a fim de convencê-lo a cumprir com a
ordem judicial de exibição dos documentos pleiteados pelo autor: a presunção de
veracidade dos fatos a serem alegados pelo autor em futura demanda proposta com
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 121-135, jan./mar. 2012
base nos documentos obtidos (CPC, art. 359) e a imposição de multa processual,
como meio de execução indireta, a incidir na hipótese de descumprimento da ordem
(CPC, art. 461).
Entretanto, os tribunais pátrios vêm seguindo a orientação jurisprudencial do
Superior Tribunal de Justiça, exposto na Súmula nº 372 desta Corte, cujo enunciado
expõe o entendimento segundo o qual “na ação de exibição de documentos não
cabe a aplicação de multa cominatória”.
Em atendimento a esta orientação jurisprudencial, a única sanção aplicável
ao réu que descumpre a ordem de exibição de documento é aquela prevista no art.
359 do CPC, pelo qual deverão ser considerados verdadeiros os fatos narrados pelo
autor na futura ação a ser movida por aquele que pretendia ter acesso aos documentos.
O objetivo do presente estudo é analisar em que medida a orientação juris
prudencial exposta na Súmula nº 372 do STJ prejudica a efetividade da tutela juris
dicional concedida no âmbito da ação de exibição de documento, bem como
demonstrar o equívoco que a fundamenta.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 121-135, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 121-135, jan./mar. 2012
a fim de satisfazer um direito material. Mas quando a exibição visa a servir de prova
em futuro processo, afirma que se trata de ação tipicamente cautelar, acautelando o
processo principal a fim de que este seja assegurado contra a proposição de demanda
infundada (THEODORO JÚNIOR, 2009, p. 586).
Não é o que nos parece: mesmo quando o autor, após ter obtido a exibição de
documentos, utiliza-os como meio probatório para a propositura de uma outra ação,
a ação de exibição apresenta-se, mesmo assim, com caráter autônomo, principaliter,
satisfativo de uma pretensão de direito material, i. e., não cautelar.
Isto porque em geral estas ações de exibição prescindem da demonstração
do fumus boni iuris e do periculum in mora: cabe ao autor da ação exibitória demons
trar cabalmente seu direito de obtenção dos documentos (e não apenas a “fumaça
do bom direito”), bem como não cabe ao autor demonstrar o perigo na demora
(salvo se pleitear liminarmente a exibição), pois para o exercício da pretensão de um
direito material, visando a satisfazê-lo, não se faz necessário o perigo de lesão.
Tornou-se pouco comum a ocorrência de uma ação de exibição propriamente
cautelar, aquela efetivamente instrumental de uma outra demanda (ainda que,
repita-se, os documentos exibidos sejam utilizados como meio probatório em outro
processo), necessitando que o autor tenha de demonstrar a presença dos requisitos
específicos da medida cautelar. Registre-se, inclusive, a não obrigatoriedade de o
autor, na petição inicial da ação de exibição, indicar a lide principal e seu fundamento
(como determina o art. 801, III do CPC). Isto se dá porque a ação de exibição de
documento não possui uma “referência imediata com o processo de conhecimento
a se instaurar” (SANTOS, 2008, p. 364), pois sequer se pode conhecer com antece
dência qual litígio surgirá da análise dos documentos, se é que surgirá algum.
Nesse sentido, expressiva a lição de Galeno Lacerda e Carlos Alberto Alvaro
de Oliveira (embora reconheçam também a existência de ação cautelar de exibição
de documento), que expõem assim seu entendimento sobre a existência de uma
ação exibitória satisfativa:
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 121-135, jan./mar. 2012
De toda sorte, afirmar que essa providência não tem natureza cautelar
também não implica dizer que ela sempre deva possuir caráter satis
fativo ou autônomo. Como se verá adiante a exibição é normalmente
instrumental, no sentido de que, por estar destinada a preservar direitos
fundamentais processuais (ação e defesa), em regra devem estar vincu
ladas a outro processo, em que ocorrerá o direito fundamental que esta
medida busca preservar. (MARINONI, 2008, p. 246)
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 121-135, jan./mar. 2012
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4 Conclusões
A análise da natureza da tutela concedida em sede da ação exibitória, aliada
à análise dos precedentes judiciais que deram ensejo à elaboração da Súmula nº 372
do STJ, permitiu-nos chegar às seguintes conclusões:
1. A tutela cautelar é aquela destinada a, preventivamente, diante de uma
situação de iminência de lesão a direito, garantir a utilidade da tutela juris
dicional a ser concedida no chamado “processo principal”, aquele em que
será deduzida a pretensão de direito material que se pretende ver satisfeita;
2. Embora a ação exibitória encontre-se encartada no Livro III do CPC, en
quadrando-a como ação cautelar, verifica-se que na maioria das vezes ela
veicula uma pretensão de satisfação de direito material, isto é, pretensão
de ver satisfeito um direito subjetivo, e não de simplesmente assegurar que
não sofra lesão. Não se trata, portanto, de ação cautelar;
3. Nas ações exibitórias movidas por consumidores vislumbra-se mais facil
mente a natureza satisfativa da tutela jurisdicional a ser concedida nas
ações exibitórias, principalmente diante da frequente negativa de os for
necedores de bem e serviços em fornecer contratos e outros documentos
ao consumidor, impedindo-os de terem acesso às informações contratuais;
4. Existe um dever de integração contratual, pelo qual o consumidor tem
direito de obter acesso a todos os documentos que digam respeito à relação
jurídica consumerista, direito este que deve ser satisfeito in natura, pois
esta é a função do processo civil: conceder a tutela jurisdicional satisfativa
do direito da parte reconhecido em juízo;
5. Ainda que os documentos obtidos em sede de ação exibitória venham a
ser efetivamente utilizados como instrumento probatório em outra de
manda, este fato não retira o substrato de direito material que embasou a
pretensão exibitória;
6. A análise dos cinco precedentes que deram origem à Súmula nº 372 do
STJ demonstra que foi desconsiderada a natureza satisfativa da tutela
concedida nas ações exibitórias, adotando-se o entendimento (por nós
considerado equivocado), de que essa espécie de ação seria sempre cautelar;
7. O entendimento adotado pela Súmula nº 372 do STJ não levou em con
sideração a autonomia da pretensão exibitória, destituída de natureza
cautelar, alicerçada em pretensão de direito material que deve ser satisfeita
in natura, e não apenas mediante a aplicação de uma sanção processual
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 121-135, jan./mar. 2012
Referências
ALVIM, Thereza. A tutela específica do art. 461, do Código de Processo Civil. Revista de Processo,
São Paulo, v. 80, p. 103-110, out./dez. 1995.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Ação de exibição de documentos. Multa cominatória. 1. A
multa cominatória é pertinente quando se trate de obrigação de fazer ou não fazer, não cabendo
na cautelar de exibição de documentos, em que, se não cumprida a ordem, segundo precedente
desta Terceira Turma, é possível a busca e apreensão. 2. Recurso especial conhecido e provido.
Recurso Especial n.º 433.711/MS. Terceira Turma. Julgado em 25 de fevereiro de 2003. Publicado
no Diário da Justiça da União, p. 229, 22 abr. 2003.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Ação de exibição. Processo cautelar. No processo cautelar,
o desatendimento da determinação de que se exiba documento ou coisa não acarreta a
consequência prevista no art. 359 do Código de Processo Civil. Recurso Especial n.º 204.807/SP.
Relator Ministro Eduardo Ribeiro. Terceira Turma. Julgado em 06 de junho de 2000. Publicado no
Diário da Justiça da União, p. 77, 28 ago. 2000.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Processo civil. Exibição de documento. Descumprimento.
Aplicação de multa diária. Impossibilidade. A busca e apreensão é a medida cabível para tornar
efetiva a exibição dos documentos, caso não seja atendida espontaneamente a ordem judicial.
Não cabe a aplicação de multa diária em ação de exibição de documento. Recurso Especial n.º
828.342/GO. Relator Ministro Humberto Gomes de Barros. Terceira Turma. Julgado em 18 de
outubro de 2007. Publicado no Diário da Justiça da União, p. 58, 31 out. 2007.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 121-135, jan./mar. 2012
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Processual civil. Ação cautelar de exibição de documento.
Multa diária pelo descumprimento. Descabimento. Suficiência da presunção de veracidade. I. A
fixação de multa pecuniária pelo descumprimento da ordem de apresentação do documento é
incompatível com a ação cautelar respectiva, pois suficiente à autora a presunção de veracidade
que o provimento da ação, como elemento probante, fornece ao processo principal. Precedentes
do STJ. II. Recurso especial conhecido e provido. Recurso Especial n.º 981.706/SP. Relator Ministro
Aldir Passarinho Junior. Julgado em 09 de outubro de 2007. Publicado no Diário da Justiça da
União, p. 236, 12 nov. 2007.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial. Ação cautelar. Exibição de documentos.
Multa cominatória. Descabimento. A incidência do artigo 359 do Código de Processo Civil nas
ações cautelares de exibição de documento, determinada pelo artigo 845 do mesmo estatuto,
afasta a possibilidade de aplicação de multa cominatória. Precedente da Terceira Turma. Recurso
provido. Recurso Especial n.º 633.056/MG. Relator Ministro Castro Filho. Terceira Turma. Julgado
em 12 de abril de 2005. Publicado no Diário da Justiça da União, p. 345, 2 maio 2005.
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R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 121-135, jan./mar. 2012
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1 Considerações iniciais
O sistema recursal brasileiro teve uma recente grande polêmica com a inserção
do parágrafo único no art. 527 do CPC, tal dispositivo prega pela irrecorribilidade das
decisões que apreciam efeito suspensivo em agravo de instrumento, ou convertem
este em retido. O mencionado parágrafo único impede o acesso do jurisdicionado à
tutela jurisdicional colegiada, no caso. Diante de tal situação, e ainda tomado por um
conhecimento intuitivo das referidas decisões1 — que, para Calamandrei, é o primeiro
1
“Diz-se que a intuição é uma forma de conhecimento direta, que se confunde com o objeto
conhecido, como se nada houvesse entre ambos, nem métodos nem raciocínios [...]. E no senso
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5
Cf. LOPES, João Batista. Curso de direito processual civil. São Paulo: Atlas, 2005. p. 48.
6
NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 6. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2000. p. 65.
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3 O princípio da colegialidade
O princípio da colegialidade é um princípio advindo de uma interpretação
sistemática do ordenamento jurídico. Primeiramente, como é notório na Constituição
Federal, está inserido nesta a função dos Tribunais de Justiça ou Regionais Federais
como órgãos julgadores das causas em segundo grau de jurisdição ou nas ações
de competência originária.
A Constituição Federal disciplina em seu art. 106 o Tribunal Regional Federal,
com composição colegiada (art. 107), o mesmo acontecendo com os Tribunais de
Justiça (art. 125), o Supremo Tribunal Federal (art. 101) e Superior Tribunal de Justiça
(art. 104). Em outras passagens como no art. 93, XI, fica estabelecido que os Tribu
nais poderão criar Órgãos Especiais compostos por onze membros, e, ainda no art.
97, onde a Constituição obriga o julgamento colegiado de todos os membros para
declarar inconstitucional uma lei ou ato do Poder Público.
Tendo em vista essas “composições” dos Tribunais, o quadro que se apresenta
é sempre de Tribunais compostos por divisões (Câmaras ou Turmas) como julga
doras das causas em segunda instância. Some-se a isso toda uma tradição de um
sistema romano-germânico que prega pelo julgamento por maioria, sendo esta
forma a essência dos Tribunais.
A reapreciação da causa em segunda instância não é somente com vistas
a um julgamento por um magistrado mais experiente, mas visa ao debate entre os
Desembargadores numa dialética que reflete o real Estado Democrático de Direito.
O julgamento colegiado pelos Tribunais resulta de uma absorção de vários preceitos
constitucionais.
A decisão colegiada é da essência dos tribunais, sendo o juízo natural dos
pronunciamentos dirigidos a tal corte, não podendo ser suprimido tal julgamento,
devendo sempre haver a possibilidade de recurso ao órgão colegiado.
Eduardo Talamini, em observações sobre o julgamento colegiado dos Tribu
nais constatou que “é da tradição constitucional brasileira o julgamento colegiado
em segundo grau. Está implícita na estruturação constitucional do Poder Judiciário
a pluralidade na composição dos tribunais locais e federais. E isso não consiste em
mero capricho burocrático ou administrativo. Ao estruturar os Tribunais em órgãos
colegiados, pretende-se fazer com que as decisões ali proferidas sejam essencialmente
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7
TALAMINI, Eduardo. Decisões individualmente proferida pelos integrantes dos Tribunais: legiti
midade e controle (agravo interno). In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY JUNIOR, Nelson
(Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
p. 180. No mesmo sentido: “a colegialidade é também um importante fator de busca da legi
timidade do Judiciário, ou seja, de persuasão dos jurisdicionado de que sua causa foi julgada
por uma junta de juízes, que discutiram a matéria procurando discutir em conjunto encontrar
a solução mais justa: juízes que revelaram o direito das partes no exercício mais autêntico do
mandato recebido pelo povo e sob o mais eficaz mecanismo de controle, aquele que cada
julgador exerce sobre o comportamento dos demais, porque a decisão que todos buscam vai
influir na reputação de cada um” (GRECO, Leonardo. A falência do sistema de recursos. Revista
Dialética de Direito Processual, São Paulo, v. 36, p. 30, 2003).
8
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 40. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2003. v. 1, p. 517.
9
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 14. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2006. v. 5, p. 677.
10
“Legitimidade constitucional da atribuição conferida ao Relator para arquivar, negar seguimento
a pedido ou recurso e dar provimento a este (RISTF, art. 21, §1º; Lei 8.038/90, art. 38; C.P.C., art. 557,
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redação da Lei 9.756/98) desde que, mediante recurso, possam as decisões ser submetidas ao
controle do Colegiado” (STF, 1.a T., RE-AgR 561645/SC, rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 27.11.07,
DJU, p. 51, 19 dez. 07) “Legitimidade constitucional da atribuição conferida ao Relator para
arquivar, negar seguimento a pedido ou recurso e a dar provimento a este RI/STF, art. 21, §1º; Lei
8.038/90, art. 38; CPC, art. 557, caput, e §1º-A, desde que, mediante recurso, possam as decisões
ser submetidas ao controle do Colegiado. Precedentes do STF” (STF, 2ª T., RE-AgR 346375/RS,
rel. Min. Carlos Velloso, j. 29.09.05, DJU, p. 21, 14 out. 05).
11
Basicamente os fundamentos para se recorrer na via do agravo regimental.
12
“Em favor de qualquer de seus membros, ‘utsinguli’, não podem os tribunais declinar de
competência que a Constituição neles investiu, enquanto órgãos colegiados. Sobretudo, não
podem, por meio de norma regimental, emprestar o atributo de decisão definitiva aos despachos
dos seus membros. Representação julgada procedente para declarar inconstitucional o parágrafo
2º do art. 364 do RI do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás. ‘Art. 115. Compete aos Tribunais:
III – elaborar seus regimentos internos e neles estabelecer, respeitado o que preceituar a Lei
Orgânica da Magistratura Nacional, a competência de suas Câmaras ou turmas isoladas, grupos,
seções ou outros órgãos, com funções jurisdicionais ou administrativas;’. O dispositivo transcrito
concede aos Tribunais o poder de estabelecer em norma regimental a competência jurisdicional
ou administrativa dos seus diferentes órgãos. Trata-se de uma delegação direta do constituinte ao
Poder Judiciário, assim nacional como local; seu exercício, porém, está submetido aos limites que
defluem dos princípios da Constituição e da ordem jurídica positiva do Estado. Assim, além das
limitações decorrentes da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, expressamente mencionada no
inciso III do art. 115, CF, outras, quer de origem federal quer estadual, deverão ser atendidas pelos
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Tribunais quando hajam de investir competência nos seus diferentes órgãos. A lei processual de
alcance nacional não poderá ter obstada, pelo regimento das Cortes de Justiça, a sua vigência
e eficácia; e os Tribunais dos Estados também não se poderão eximir do cumprimento das
Constituições respectivas, sobretudo no que diz à sua administração (arts. 13 e 144, caput). A
colegialidade dos órgãos do segundo grau de jurisdição, no dizer de BISCARETTI DI RUFFIA (Diritto
costituzionale, II Napoli, 1950, p. 23-24, n. 274, 275) atua em quase todos os Estados de civilização
européia, excetuados os anglo-saxões, e ainda quando não expressamente acolhido nos textos,
tem indubitáveis reflexos de ordem constitucional. A mesma observação aplica-se ao princípio da
pluralidade dos graus de jurisdição (pág. 22). Na Constituição Brasileira, o princípio da universalidade
da jurisdição (art. 153, §4º) auta na conformidade das estipulações nela estabelecidas, relativas à
ordem judiciária e à competência dos órgãos da função jurisdicional; e, igualmente, na harmonia
das regras emanadas da legislatura ordinária e dos próprios órgãos da função jurisdicional, como
autorizado no supratranscrito art. 115, III. Ora, seja em razão da formação histórica da organização
judiciária nacional, ou em virtude da própria estrutura dada ao Poder Judiciário federal e local pela
Constituição, é colegiado o órgão de Segundo Grau de Jurisdição” (STF, Pleno, Rp 1.299-GO, rel. Min.
Célio Borja, j. 21.08.1986, DJU, p. 22148, 14 nov. 1986, Ement. Vol. 1441, p. 93).
13
RTJ nºs 83/240 e 121/373.
14
“Processual Civil. Agravo Regimental. Impropriedade da Via Eleita. Recurso Cabível. Agravo Regi
mental no Tribunal de Origem. Princípio da Colegialidade das Decisões. (Agravo de Instrumento
com Pedido de Tutela Antecipada para Conveder Efeito Suspensivo. Decisão Liminar em
Mandado de Segurança). 1. É cabível a interposição de agravo regimental contra qualquer decisão
monocrática de relator de tribunal. 2. O art. 39 da Lei nº 8.038/90, que disciplina o cabimento do
agravo interno contra decisão singular proferida por membro do Superior Tribunal de Justiça e
ao Supremo Tribunal Federal, deve ser aplicado, por analogia, aos demais tribunais pátrios, ainda
que inexista previsão no Regimento Interno do Tribunal de Segunda Instância. Precedentes:
(AgRg no AG n. 556508/TO, de minha relatoria. DJ. 30.05.2005; AG n. 712619/PI. Rel. Min. Teori
Albino Zavascki. DJ. 10.11.2005; Ag no AG n. 421168/SP. Rel. Min. Eliana Calmon. DJ. 24.06.2002).
3. ‘A decisão monocrática de relator indeferindo antecipação de tutela recursal em agravo de
instrumento interposto perante tribunal de segunda instância pode ser impugnada por recurso
interno ao colegiado. Aplicação do princípio constitucional da colegialidade dos tribunais e
do art. 39 da Lei 8.038, de 1990. (MC 6566, Rel. Min. Teori Zavascki)’ 4. A lei 8.038/90 prevê, no art.
39, o direito de a parte reiterar o pedido perante o próprio colegiado. Nestes casos, cabe à parte
sucumbente impugnar os fundamentos da decisão monocrática através de agravo regimental,
como forma de assegurar o princípio da colegialidade, garantia fundamental do processo que
visa neutralizar o individualismo das decisões 5. A súmula 622/STF, que desautoriza o cabimento
do agravo regimental contra decisão do relator que concede ou indefere liminar em mandado
de segurança, não se harmoniza com o próprio artigo 317 do RISTF, que prevê agravo regimental
contra qualquer decisão monocrática de um dos seus membros que cause prejuízo ao direito
da parte, outra não é a exegese do art. 258 do RISTJ. 6. É da natureza dos tribunais superiores o
exercício colegiado da jurisdição. Consectariamente, se a lei ou o Regimento conferem a um dos
membros do Tribunal, por razões de urgência e de abreviação do serviço judiciário, o exercício de
função jurisdicional, ele a desempenha em nome do colegiado, mas sem poder tolher o acesso do
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jurisdicionado ao colegiado, que é o juiz natural da causa. 7. Agravo Regimental desprovido” (STJ,
1.a T., AgReg no AgIn n. 827.242/MT, rel. Min. Luiz Fux, j. 07.12.06, DJU, p. 427, 01 fev. 07). “Processual
Civil. Decisão De Relator Que Nega Efeito Suspensivo a Agravo de Instrumento. Agravo Interno.
Cabimento. ‘A decisão monocrática de relator que defere ou nega efeito suspensivo ou ativo a
agravo de instrumento interposto perante tribunal de segunda instância pode ser impugnada
por recurso interno ao colegiado. Aplica-se, in casu, o princípio constitucional da colegialidade
dos tribunais e do art. 39 da Lei 8.039, de 1990’” (REsp 770.620/PA, relatado pelo eminente Ministro
Castro Meira, DJ 03/10/2005). Recurso especial conhecido e provido” (STJ, 4.a T., Resp n. 793430/
SC, rel. Min. César Asfor Rocha, j. 17.10.06, DJU, p. 375, 11dez. 06). No mesmo sentido: STJ, 2.a T.,
Resp n. 770620, rel. Min. Castro Meira, 01.09.05, DJU, p. 236, 03 out. 05, e TRF2, 8.a T. Especializada,
ApCív 68169, rel. Des. Fed. 19.08.08, DJU, p. 205, 02 set. 08.
15
Inserido pela Lei nº 11.187/2005.
16
“Em que pese a aparente vedação recursal implementada pela Lei n. 11.187/2005, poderá a parte
sucumbente impugnar os fundamentos da decisão monocrática pelo agravo interno, como
forma de assegurar o princípio constitucional da colegialidade, garantia fundamental do processo
que visa neutralizar o individualismo das decisões” (TRF da 2.a Região, 3.a Seção Especial, MS
n. 200602010044162, rel. Des. Fernando Marques, j. 18.05.06, DJU, p. 167, 14 jul. 06).
17
NUNES, Dierle José Coelho. Colegialidade das decisões dos Tribunais. Sua visualização como
princípio constitucional e do cabimento de interposição de agravo interno de todas as decisões
monocráticas do relator. Revista IOB de Direito Civil e Processual Civil, São Paulo, v. 50, p. 54, nov./dez.
2007.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
18
DIDIER JUNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de direito processual civil.
Salvador: JusPodivm, 2008. v. 3, p. 167. Meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos
tribunais.
19
“Esse cuidado homenageia a garantia constitucional do devido processo legal, na medida em
que põe limite ao poder do relator em julgamentos que em princípio pertencem aos órgãos
colegiados; presta reverência também ao valor das garantias do juiz natural, porque os colegiados
são o juiz natural dos recursos” (DINAMARCO, Cândido Rangel. O relator, a jurisprudência e os
recursos. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY JUNIOR, Nelson (Coord.). Aspectos polêmicos e
atuais dos recursos cíveis de acordo com a Lei 9.756/98. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 132).
Ainda: “Fixada como premissa a existência de um juiz natural no tribunal, que é o colegiado, tem-
se que todas as decisões que o tribunal proferir devem, em princípio, ser dadas por algum órgão
do tribunal. É um corolário do juiz natural dos tribunais a adoção do princípio da colegialidade
das decisões a eles submetidas” (BIM, Eduardo Fortunato. Do cabimento do agravo regimental no
mandado de segurança de competência originária para aplicação do princípio constitucional da
colegialidade: alcance e crítica da súmula 622 do Supremo Tribunal Federal. Revista Dialética de
Direito Processual, São Paulo, n. 36, p. 42, mar. 2006).
20
“A decisão é tomada por maioria, sendo a discussão dirigida pelo presidente, que desempata
quando não possa formar-se maioria” (Cf. REGO, Carlos Francisco de Oliveira Lopes do. Comentários
ao Código de Processo Civil. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2004. v. 1, p. 605).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
276 do Código de Processo Civil Italiano,21 art. 449 do Código Francês22 e art. 197
do CPC Espanhol,23 disposições em que se obriga o julgamento de no mínimo três
magistrados.
Disposição interessante encontra-se na Inglaterra,24 referente aos julgamentos
submetidos ao Tribunal de Apelações: se a questão for flagrantemente previsível,
o relator submete a questão somente a um revisor, se este concordar, lavra-se o
julgamento.
Observa-se que o ordenamento inglês admite uma mitigação do órgão
colegiado quando a questão envolver a certeza jurídica necessária, no entanto,
para tornar constitucional uma supressão do julgamento por três magistrados no
órgão colegiado, há redução para dois julgadores a fim de preservar o debate que
legitima um julgamento pelo tribunal de segundo grau.
Em se tratando de decisões colegiadas, as mesmas guardam maiores
garantias de justiça e certeza da decisão. Pedro Miranda de Oliveira, citando Vittorio
Denti, apresenta os prós e os contras de um sistema, postulando que o princípio
da colegialidade consagra uma tríplice garantia: (a) de uma justiça iluminada, pela
elaboração da decisão proveniente do debate no interior do colegiado; b) de uma
justiça imparcial, pelo controle exercido pelos membros do colegiado na forma
ção da decisão; c) de uma justiça independente, pela maior liberdade de decisão
que proporciona aos juízes o anonimato da colegialidade, porquanto encobre a
responsabilidade individual. Por outro lado, assinala que o sistema monocrático,
assim como a redução do número de componentes dos colegiados nos tribunais,
21
“La decisione è deliberata in segreto nella camera di consiglio. Ad essa possono partecipare
soltano i giudici que hanno assistito allá discussione. Il collegio, sotto la direzione del presidente,
decide gradatamente lê questione pregiudiziali proposte dalle parti o rilevabili d’ufficio e
quindi il mérito della causa. La decisione è presa a maggioranza di votti. Il primo a vottare è il
relatore, quindi l’altro giudice e infine il presidente” (Cf. CARPI, Federico; COLENSANTI, Vittorio;
TARUFFO, Michele. Commentario breve al códice di procedura civile. 4. ed. Padova: CEDAM, 2002.
p. 818).
22
La decision est rendue à la majorité des voix (Cf. Nouveau code de procedure civile. 93. ed. Paris:
Dalloz, p. 228).
23
“En los tribunales colegiados, la discusión e votación de las resoluciones será dirigida por el
Presidente y se verificará siempre a puerta cerrada. El Magistrado ponente somentará a la
deliberación de la Sala o Sección los puntos de hecho y las cuestiones y fundamentos de
derecho, así como la decisión que, a su juicio, deba recaer y, previa la discusión necesaria, se
procederá la votación” (Cf. YAGÜE, Francisco Lledó (Coord.). Comentarios a la nueva ley de
enjunciamiento civil. Madrid: Dykinson, 2000. p. 236).
24
“The Civil Division of the Court of Appeal is headed by the Master of the Rolls, who is assisted
the Lord Justices of Appeal. Normaly three judges sit to hear an appeal, although in important
cases a full court of five may be assembled. Since 1982, some cases have been heard by two
judges, in an attempt to reduce the waiting time for hearings. Decisions are made by a simple
majority” (KEENAN, Denis; RICHES, Sarah. Business law. 2nd ed. London: Pitman, 1991. p. 40).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
25
DENTI, Vittorio. Giudice onorario e giudice monocratico nella riforma della giustizia civile.
Rivista di Diritto Processuale, n. 4, p. 622-623, out./dez. 1978 apud OLIVEIRA, Pedro Miranda de.
Acesso à justiça, poderes do relator e agravo interno. 2005. Dissertação (Mestrado em Direito) –
Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Curitiba. 2005. f. 145.
26
PERROT, Roger. Giudice collegiale e giudice único nel diritto processule francese. Rivista di
Diritto Processuale, n. 3, p. 377, jul./set. 1982 apud CARNEIRO, Athos Gusmão. Recurso especial,
agravos e agravo interno. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 185.
27
“Il soggetto della disciplina “speciale” Che si intende passare in rassegna si identifica col «giudice
designato a norma dell’articolo 168-bis o dell’articolo 484, secondo comma”, il quale, quando
è in fase di “decis[ione]” delle “cause”, stando al lessico legislativo, prende “tutti i poteri de
collegio” (AULETTA, Ferruccio. Le “specialitá” del processo civile davanti al giudice monocratico del
tribunale. Rivista di Diritto Processuale, Padova, v. 56, n. 1, p. 148, jan./mar. 2001).
28
ARRUDA ALVIM, José Manoel. Notas sobre algumas das mutações verificadas com as leis 10.352
e 10.358, de dezembro de 2001. In: Direito processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. v. 2, p. 366.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
29
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Lei n. 9.756/98: uma inconstitucionalidade flagrante e uma decisão
infeliz. In: MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual civil: sétima série. São Paulo:
Saraiva, 2001. p. 83.
30
“Esse cuidado homenageia a garantia constitucional do devido processo legal, na medida em
que põe limite ao poder do relator em julgamentos que em princípio pertencem aos órgãos
colegiados; presta reverência também ao valor das garantias do juiz natural, porque os colegiados
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
são o juiz natural dos recursos” (DINAMARCO, Cândido Rangel. O relator, a jurisprudência e os
recursos. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY JUNIOR, Nelson (Coord.). Aspectos polêmicos
e atuais dos recursos cíveis de acordo com a Lei 9.756/98. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.
p. 132). Ainda: “Fixada como premissa a existência de um juiz natural no tribunal, que é o colegiado,
tem-se que todas as decisões que o tribunal proferir devem, em princípio, ser dadas por algum
órgão do tribunal. É um corolário do juiz natural dos tribunais a adoção do princípio da
colegialidade das decisões a eles submetidas” (BIM, Eduardo Fortunato. Do cabimento do agravo
regimental no mandado de segurança de competência originária para aplicação do princípio
constitucional da colegialidade: alcance e crítica da súmula 622 do Supremo Tribunal Federal.
Revista Dialética de Direito Processual, São Paulo, n. 36, p. 42, mar. 2006).
31
FEU ROSA, Antônio José Miguel. Agravo regimental. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 738, p. 39,
abr. 1997.
32
JORGE, Flávio Cheim. Teoria geral dos recursos cíveis. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
p. 182.
33
“Como já demonstramos, no mais das vezes, tais decisões do relator implicam na complicada
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
análise de uma tutela de urgência, a qual não pode ser obstaculizada, sob pena de vulnerar o
princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (CF, art. 5º XXXV), o qual deve ser entendido
como uma garantia de uma tutela jurisdicional dotada de efetividade. [...] Ora, é da tradição
constitucional brasileira o julgamento colegiado em segundo grau, sendo certo que o juiz
natural do recurso é o órgão colegiado, não o relator, daí não se pode permitir que, em qualquer
hipótese, mormente tratando-se de tutela de urgência, bloqueie-se totalmente o caminho
até ele” (RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. Breves considerações sobre a irrecorribilidade das
decisões liminares do relator e o “juízo” de reconsideração (parágrafo único do art. 527 do CPC.
In: HOFFMAN, Paulo; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva (Coord.). O novo regime do agravo de
instrumento e do agravo retido: modificações da Lei n. 11.187/05. São Paulo: Quartier Latin, 2006.
p. 254-255).
34
Nesse sentido: BRUSCHI, Gilberto Gomes. Existe recurso contra a decisão do relator com base
no art. 527, III, do CPC?. Revista de Processo, São Paulo, n. 150, p. 372, ago. 2007. Ainda: “Processual
Civil. Agravo Regimental. Agravo de Instrumento. Decisão que Aprecia Liminar em Mandado
de Segurança da Competência Originária de Tribunal A quo. Cabimetno de Agravo Regimental.
1. É entendimento pacífico da Primeira Seção desta Corte que cabe agravo regimental contra
decisão que concede ou indefere liminar em mandado de segurança. 2. Agravo regimental
provido para conhecer do agravo de instrumento e dar provimento ao recurso especial”
(STJ, 2.a T., AgRg no Ag n. 556.879/TO, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 16.03.2004, DJU, p. 247,
10 maio 2004).
35
GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel. O novo regime do agravo de instrumento: Lei n. 11.187, de
19.10.2005. Revista de Processo, São Paulo, n. 134, p. 118, abr. 2006.
36
“Pero puede añadirse a estós un principio mas general que nos es sino la aplicación del principio
del mínimo medio a la actividad jurisdiccional y no solamente en el proceso particular, sino
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
39
OLIVEIRA, Gleydson Kleber Lopes de. Recurso especial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
p. 63.
40
“A regra, para os recursos, é a colegialidade das decisões. Quer dizer: a pluralidade de julgadores,
com o fim político de assegurar diversos exames ao mesmo tempo, além do duplo ou múltiplo
exame, no tempo, pelos juízes de primeiro grau e os demais juízes superiores” (PONTES DE
MIRANDA, Francisco Cavalcante. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. atual. Rio de
Janeiro: Forense, 1999. v. 7, p. 7).
41
“Todavia, não se pode esquecer que está inserido num tribunal colectivo, por tal, sujeito às
regras da colegialidade. Há regras específicas e apertadas no sentido de o processo ser dado
em vista aos juízes-adjuntos” (LEITÃO, Helder Martins. Dos recursos em processo civil. Porto:
Almeida e Leitão, 2005. p. 68).
42
“O que se quis dizer foi que contra essa decisão (a de conversão do agravo de instrumento em
retido), não cabe recurso para o órgão colegiado. Assim entendido, porém, o novo parágrafo
único parece-nos difícil de conciliar com a garantia constitucional do art. 5º, LV, fine” (MOREIRA,
José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
v. 5, p. 515).
43
“O órgão colegiado é o juiz natural dos recursos, sendo, diante disso, de duvidosa constitucio
nalidade as regras processuais que impedem a interposição de recurso contra decisões pro
feridas monocraticamente nos tribunais” (MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda
Alvim. Recursos e ações autônomas de impugnação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. v. 2,
p. 56. Processo civil moderno).
44
“A inconstitucionalidade da limitação imposta à recorribilidade das decisões monocráticas pro
feridas pelos relatores dos recursos, especialmente no que diz respeito à instabilidade jurídica
que proporcionam, oposta à função dos próprios tribunais, e ao desprestígio de uma maior
justiça, proporcionada pela colegialidade das decisões, em nome da celeridade das decisões,
como se fosse o único valor em jogo” (FREIRE, Rodrigo Cunha Lima et al. Reforma do CPC.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 67 apud DELGADO, José. Reflexões contemporâneas
(março de 2007) sobre o novo sistema do agravo introduzido pela reforma do processo civil
brasileiro. In: ASSIS, Araken de et al. (Coord.). Direito civil e processo. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2008. p. 1287).
45
PACHECO, Alexandre S. O mandado de segurança contra ato judicial e a reforma do agravo
de instrumento empreendida pela Lei 11.187/2005. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY
JUNIOR, Nelson (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. v. 11, p. 18.
46
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Agravo interno regimental. Revista Dialética de Direito
Processual, São Paulo, v. 39, p. 33, jun. 2006.
47
ZARIF, Cláudio Cintra. As diversas modificações no procedimento do recurso de agravo. In:
MEDINA, José Miguel Garcia et al. (Coord.). Os poderes do juiz e o controle das decisões judiciais:
estudos em homenagem à Professora Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2008. p. 640.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
48
“De fato, a ter como inconstitucional a norma constante no parágrafo único do art. 527, do
CPC, por ofensa aos princípios do duplo grau de jurisdição e do juiz natural, bem como por não
proporcionar a segurança necessária à prestação jurisdicional adequada, outra ilação não se
poderá extrair senão a de ser inaplicável a vedação ao recurso contra decisão do relator. Assim,
uma vez afastada a inaplicabilidade da norma em destaque, inevitável é não admitir óbice ao
ataque da decisão monocrática do relator que converte em retido o agravo de instrumento, o
que se fará por meio de agravo interno, como, aliás, sói acontecer aos demais provimentos
unipessoais dos membros do colegiado, dada a vocação natural e inarredável do controle
de tais decisões pelo órgão colegiado” (PINTO, Christian Barros. A inconstitucionalidade do
parágrafo único do art. 527, do Código de Processo Civil e o cabimento do agravo interno.
Revista Dialética de Processo Civil, São Paulo, v. 71, p. 26, 2009).
49
“[...] sempre existe a possibilidade de se recorrer ao colegiado (exceção, inconstitucional, do
art. 527, parágrafo único do CPC)” (BIM, Eduardo Fortunato. Do cabimento do agravo regimental
no mandado de segurança de competência originária para aplicação do princípio constitucional
da colegialidade: alcance e crítica da súmula 622 do Supremo Tribunal Federal. Revista Dialética
de Direito Processual, São Paulo, n. 36, p. 42, mar. 2006).
50
“Por outro lado, como reforça a doutrina, em órgãos colegiados é impossível pensar em decisão
do relator que não seja suscetível de revisão pelo órgão colegiado. Como o órgão colegiado
é o órgão competente para conceder ou denegar a liminar, também o é para julgar o feito. E,
se não há delegação ao relator, tal não exclui a competência do colegiado. Dizer-se irrecorrível
a decisão do relator sobre a liminar é dar-lhe competência não-delegada, que não tem respaldo
na lei nem justificativa na ciência ou técnica jurídica” (GIORGIS, José Carlos Teixeira. Notas sobre
o agravo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1996. p. 86-87).
51
NASCIMENTO, Bruno Dantas do. Inovações na regência do recurso de agravo trazidas pela Lei
n. 11.187/2005. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY JUNIOR, Nelson (Coord.). Aspectos
polêmicos e atuais dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. v. 9, p. 83. No mesmo
sentido: “O princípio da colegialidade das decisões nos Tribunais não constitui regra expressa na
Constituição, mas é possível extraí-lo do sistema constitucional brasileiro que não impede que
a lei infraconstitucional delegue ao relator a prática de alguns atos processuais, desde que se
preveja meio para que o órgão colegiado confira a adequação desses atos, se a parte prejudicada
assim o quiser. Sendo assim, a possibilidade de decisão monocrática em sede recursal não ofende
a Constituição, se previsto instrumento adequado à sua impugnação, com o fito de provocar do
Tribunal propriamente dito” (MAIA, Izabelle Albuquerque Costa. Breve exame da nova disciplina
do agravo. In: HOFFMAN, Paulo; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva (Coord.). O novo regime do
agravo de instrumento e do agravo retido: modificações da Lei n. 11.187/05. São Paulo: Quartier
Latin, 2006. p. 208; OLIVEIRA, Pedro Miranda de. A conversão do agravo de instrumento em agravo
retido: decisão irrecorrível?. In: WAMBIER, Tereza Arruda Alvim. Anuário de produção intelectual.
Curitiba, 2007. p. 199).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
52
Art. 247 do RITJPR. §3º - Não se admitirá o agravo regimental contra a decisão liminar do Relator
no agravo de instrumento e na apelação, a que se referem o art. 527, inc. III e o art. 558 e pará
grafo único, ambos do Código de Processo Civil (Redação alterada pela Resolução n. 02/2002,
de 22/03/2002 – DJE, 04 abr. 2002).
53
“Inadmissível a interposição de agravo interno ou agravo regimental contra decisão que nega
ou concede tutela antecipada pleiteada em recurso, conforme entendimento majoritário
desta Corte. Conclusão 6ª. do CETARGS, a qual teve alterada sua redação em 07/04/99, pelo
Centro de Estudos do Tribunal de Justiça. Agravo interno não conhecido (TJRS, 5.a Câm. cív.,
Ag n. 70022234454, rel. Des. Umberto Guaspari Sudbrack, j. 05.12.2007).
54
“Pensamos que não se aplica esta restrição à decisão do relator relativa ao efeito suspensivo
e/ou antecipação de efeitos de tutela recursal em apelação, por exemplo” (WAMBIER,
Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
p. 354).
55
“Uma vez que a irrecorribilidade imposta pela Lei 11.187/2005 é limitada à atuação do relator
o processamento do agravo. É evidente que um dos objetivos da Lei 11.187/2005 foi evitar a
proliferação de agravo interno (ou regimental) no curso do agravo de instrumento. Portanto,
a incidência da nova lei é restrita a essa espécie recursal” (MELO, Gustavo de Medeiros. O recurso
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
de agravo na nova sistemática da Lei 11.187/2005. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY
JUNIOR, Nelson (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007. v. 11, p. 123).
56
“Agravo Regimental. Denegação de efeito suspensivo a agravo de instrumento. Decisão liminar
proferida no caso do inciso III do art. 527 do CPC (Lei nº 11.187/2005) – Ausência absoluta de
interesse processual. Inadmissibilidade da interposição. Recurso não conhecido (TJSP, 20ª Câm.
Dto Priv., AgReg n. 7183103101, rel. Correia Lima, DJSP, 27 nov. 2007).
57
“A decisão que concede efeito suspensivo ao agravo de instrumento (CPC, art. 527, III), não
comporta qualquer recurso, mesmo o agravo regimental, até o pronunciamento definitivo da
Câmara ou Turma. Agravo não conhecido” (TJRS, 4.a Câm. Cív., AgReg n. 70020317848, rel. Des.
Araken de Assis, j. 05.09.2007). “Agravo Interno. Descabimento Contra Decisão do Relator Que
Deferiu Efeito Suspensivo Ativo a Agravo de Instrumento. Poderá o relator, depois de recebido
o agravo de instrumento, negar-lhe seguimento, liminarmente, ou mesmo, atribuir-lhe efeito
suspensivo ou deferir total ou parcialmente a antecipação de tutela, devidamente amparado
pelo disposto no art. 527, I e III, do CPC. - Decisão liminar do relator em agravo de instrumento
impassível de impugnação pela via recursal, conforme reza o art. 527, §único, do CPC. Negado
Seguimento ao Agravo Interno” (TJRS, 3.a Câm. Cív., Ag. n. 70020233169, rel. Des. Pedro Luiz Pozza,
j. 17.07.2007).
58
“Agravo de instrumento visando a reforma da decisão que negou provimento aos embargos de
declaração opostos pelo executado por não ter vislumbrado nenhum vício na decisão atacada.
2. Não se conhece de agravo interno, tendo em vista que a decisão impugnada foi proferida
em maio de 2007, na vigência da Lei 11.187/05, que suprimiu o cabimento de agravo interno
contra deliberação que concede antecipação da tutela recursal no agravo de instrumento (CPC,
parágrafo único do art. 527). Diante da impossibilidade de recurso contra tal ato, por vontade
do legislador infraconstitucional, descabe o uso de meio impugnativo previsto em Regimento
Interno para a hipótese” (TRF, 2.a Região, 2.a T., AgInterno no AgIn n. 152472, rel. Des. Fed. José
Neiva, j. 28.08.07, DJU, p. 492, 06 set. 2007).
59
“Agravo Regimental. Conversão de Agravo de Instrumento em Agravo Retido. Determinação de
Prestação de Caução Real Para Cumprimento da Medida Liminar. Oferecimento de Bem Imóvel.
Exigência Judicial Cumprida. Decisão Mantida. Recurso Desprovido” (TJPR, 17.ª Câm. Cív., AgReg
n. 0334257-0/1, rel. Des. Paulo Roberto Hapner, j. 19.04.06, DJPR n. 7.122).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
60
“PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. EXCECUÇÃO FISCAL. LEILÃO.
SUSPENSÃO. Agravo regimental contra a decisão proferida pelo eminente Desembargador em
plantão que indeferiu liminar em agravo de instrumento a fim de sustar o leilão judicial do imóvel
pertencente ao Agravante, clube social e recreativo. A realização do leilão, ainda que condicional,
é capaz de gerar dano grave e de difícil reparação, o que recomenda atribuir efeito suspensivo
ao recurso. Recurso provido” (TJRJ, 17.a Câm. Cív., AgIn n. 2008.002.35749, rel. Des. Henrique de
Andrade Figueira, j. 19.11.2008) “Agravo Inominado no Agravo de Instrumento. Execução Fiscal.
Penhora de Renda. Efeito Suspensivo. Indeferimento. Agravo interno interposto contra decisão da
Relatora que deixou de atribuir o efeito suspensivo ao recurso oferecido contra decisão do ilustre
Juiz da 11ª Vara de Fazenda Pública” (TJRJ, 2.a Câm. Cív., AgIn n. 2005.002.20955, rel. Des. Elisabete
Filizzola, j. 22.02.06).
61
“Processo Civil. Recurso Especial. Inexistência de Omissão (art. 535, CPC). Decisão Monocrática
do Relator: Aplicação do Art. 557, par. 1º do CPC. Efeito Suspensivo ao Agravo de Instrumento.
(Art. 527 do CPC). Interpretação do art. 200 do Código de Processo Civil. 1. Julgado devidamente
analisado, sem omissão ou contradição na interpretação das questões fáticas postas para
julgamento. 2. “O relator está autorizado a julgar monocraticamente o recurso, para modificar a
decisão recorrida dando provimento, se a decisão impugnada estiver em desacordo manifesto
com a jurisprudência dos Tribunais Superiores (art. 557, §1º-A, CPC). 3. Efeito suspensivo a recurso
por ato do relator, avalizado pelo colegiado via agravo interno. 4. Recurso especial conhecido,
mas improvido” (STJ, 2.a T., REsp n. 785.154/RS, rel. Min. Eliana Calmon, j. 19.04.2007, DJU, p. 302,
30 abr. 2007).
62
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; WAMBIER, Luiz Rodrigues; MEDINA, José Miguel Garcia. Breves
comentários à nova sistemática processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. v. 2, p. 271.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
63
CARNEIRO, Athos Gusmão. Do recurso de agravo ante a Lei n. 11.187/2005. Revista Forense, Rio de
Janeiro, n. 384, p. 16, mar./abr. 2006.
64
PACHECO, Alexandre S. O mandado de segurança contra ato judicial e a reforma do agravo de
instrumento empreendida pela Lei 11.187/2005. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY JUNIOR,
Nelson (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2007. v. 11, p. 18. Nesse sentido: “Entendemos que estando preenchidos, no caso
concreto, os requisitos de natureza constitucional, ou seja, ato ilegal ou abusivo, ofensa ao direito
líquido e certo, e não oferecendo, o sistema da lei ordinária, solução eficiente, pode a parte
lança mão do mandado de segurança para impugnar a decisão judicial” (GIRARDELLI, Adriana
Carvalho. Nova lei do agravo: das decisões interlocutórias: qual o recurso cabível?. In: HOFFMAN,
Paulo; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva (Coord.). O novo regime do agravo de instrumento e do
agravo retido: modificações da Lei n. 11.187/05. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 40). “Assim, a
experiência demonstra e comprova que toda vez que a legislação tentar impedir a interposição
de um determinado recurso o advogado buscará outra via. Portanto, negada a liminar no agravo
de instrumento, certamente, diante da urgência e da necessidade, o advogado não terá outro
meio de impugnação autônoma para obter o efeito pretendido, seja para a turma ou para o
órgão superior, voltando-se, diante da falta de recurso adequado, a se fazer o uso impróprio
do Mandado de Segurança contra ato judicial (HOFFMAN, Paulo. Cuidado! O fim do agravo de
instrumento pode aniquilar o processo civil pátrio. In: HOFFMAN, Paulo; RIBEIRO, Leonardo Ferres
da Silva (Coord.). O novo regime do agravo de instrumento e do agravo retido: modificações da Lei
n. 11.187/05. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 308-309). Ainda: CÂMARA, Alexandre Freitas. O
agravo interno no direito processual civil brasileiro. In: MEDINA, José Miguel Garcia et al. (Coord.).
Os poderes do juiz e o controle das decisões judiciais: estudos em homenagem à Professora Teresa
Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 617. Em sentido contrário: AZEM,
Guilherme Beux Nassif. A nova disciplina do agravo. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY
JUNIOR, Nelson (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007. v. 11, p. 108.
65
“Mandado de Segurança. Pretensão de se Suspender a Decisão do Relator que Concedeu Efeito
Suspensivo a Agravo de Instrumento. Liminar Indeferida. Agravo Regimental. Ato que não se Mostra
Manifestamente Ilegal ou Terratológico. Da decisão do Relator que, em agravo de instrumento,
defere ou indefere efeito suspensivo ou ativo não cabe nenhum recurso (CPC, art. 527, parágrafo
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
único). Por isso, é possível o manejo do mandado de segurança contra essa decisão, mas desde
que, revelando-se primo ictu oculi manifestamente ilegal (discrepante do Direito) ou teratológica
(absurda), possa causar danos graves de difícil reparação. Agravo regimental desprovido. Processo
extinto, de ofício, sem resolução de mérito, com fulcro no art. 267, inc. VI, §3.º, do CPC diante da
ausência de interesse de agir pela inadequação da via eleita” (TJPR, 4.a Câm. Cív. em Composição
Integral, AgReg n. 0342447-9/01, rel. Des. Adalberto Jorge Xisto Pereira, j. 15.08.06, DJPR n. 7204)
“Essa possibilidade a que assim brevissimamente me refiro, de impugnação (excepcional) da
decisão mencionada mediante utilização do mandado de segurança, com as cautelas necessárias,
já agora por força da Lei n.º 11.187/2005, é admitida por doutrina de primeira grandeza, como
é o caso da destacada professora — e minha fraterna amiga — Teresa Arruda Alvim Wambier.1
3. Contudo, não obstante cabível o mandado de segurança nesse caso, para que tenha lugar o
remédio heróico, é imprescindível que o impetrante demonstre objetiva e inequivocamente que
a decisão atacada é manifestamente ilegal ou teratológica, o que não somente os impetrantes
não sustentam, como não deixam inequívoco” (TJPR, 18.a Câm. Cív., MS 0371285-4, rel. Des.
Rabello Filho, j. 02.10.06, DJPR n. 7227).
66
“Agravo Regimental. Mandado de Segurança. Ação de Improbidade Administrativa. Indeferimento,
em Primeiro Grau, do Pedido Liminar para que o Impetrante Fosse Afastado do Cargo de Prefeito
Municipal. Interposição de Agravo de Instrumento. Deferimento do Pedido de Antecipação Re
cursal. Mandado de Segurança Impetrado Contra Decisão Liminar Proferida no Recurso de Agravo.
Liminar Deferida. Ausência de Fatos Concretos Demonstrando que o Prefeito Atrapalharia a Ins
trução Processual. Decisão Acertada. Recurso Desprovido. 1. Nos termos do art. 20, parágrafo único,
da Lei 8.429/92, a autoridade judicial competente somente poderá determinar o afastamento do
agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando
a medida se fizer necessária à instrução processual. 2. Demonstrado nos autos de mandado de
segurança, por prova documental, que o impetrante não estaria sonegando documentos nem
tentando influenciar testemunhas, dúvida não há que os pressupostos para a concessão da
liminar nos autos de agravo de instrumento, quais sejam, relevância da fundamentação e risco
de dano irreparável ou de difícil reparação, não se faziam presentes. 3. O fato de o impetrante
ser réu em outras ações por ato de improbidade administrativa e, ainda, existirem inquéritos
civis públicos para apurar a prática de atos de improbidade administrativa, não justifica o seu
afastamento cautelar do cargo de prefeito, para o qual foi eleito pelo voto popular, já que tal
medida, nos termos do art. 20, parágrafo único, da Lei n. 8.429/92, somente pode ser determinada
quando for necessária para a instrução processual, ou seja, quando houver indicativos concretos
de que, permanecendo no cargo, tentará, valendo-se dele, atrapalhar a coleta de provas” (TJPR,
5.a Câm. Cív. em Composição Integral, AgReg n. 0356739-1/01, rel. Des. Eduardo Sarrão, j. 25.07.06,
DJPR n. 7.191).
67
“A excessiva restrição à utilização do agravo de instrumento e a vedação, à parte, de uma decisão
colegiada a respeito de sua irresignação, trouxe-nos de volta a um regime equivalente àquele
que vigorava antes da Reforma promovida pela Lei n. 9.139/95: a baixa efetividade do agravo de
instrumento implicará, novamente, o aumento da utilização do mandado de segurança contra
ato judicial. – A situação atual é particularmente mais grave porquanto, agora, o mandado de
segurança não mais é impetrado contra a decisão do juízo de primeiro grau (hipótese em que
seria distribuído a um relator das turmas ou câmaras dos tribunais). Ele é impetrado, em vez disso,
contra a decisão do próprio relator, que determina a conversão do recurso. Com isso, a tendência
a atravancamento tende a aumentar, já que tais writs devem ser julgados pelos órgãos plenos dos
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
Tribunais de origem” (STJ, 3.a T., Resp n. 22847/MT, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 01.03.07, DJU, p. 230,
23 mar. 07).
68
“Nos termos da jurisprudência consolidada nesta C. Corte e nos Tribunais Superiores, é incabível
mandado de segurança contra ato do Relator que indefere efeito suspensivo a agravo de
instrumento. Ademais, a propositura do mandado de segurança encontra óbice na interpretação
do art. 527, inciso III e parágrafo único, do CPC, o qual estabelece que a decisão que atribui ou
não efeito suspensivo a agravo somente é passível de reforma no momento do julgamento do
recurso, salvo se o próprio relator a reconsiderar, denotando a irrecorribilidade da decisão. Agravo
Desprovido, por maioria” (TJRS, 1.o Grupo de Câms. Cívs., AgReg n. 70017359472, rel. Des. Adão
Sérgio do Nascimento Cassiano, j. 01.12.2006).
69
CALMON FILHO, Petrônio. Reflexões em torno do agravo de instrumento. Revista de Processo, São
Paulo, n. 150, p. 37, ago. 2007.
70
LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Recurso de agravo. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY
JUNIOR, Nelson (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007. v. 11, p. 320-321. No mesmo sentido: ALVIM, José Eduardo Carreira.
Irrecorribilidade das liminares previstas no art. 527, II e III, do CPC. Revista de Processo, São Paulo,
n. 139, p. 105, set. 2006.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
71
TRF da 2.a Região, 3.a Seção Especial, MS n. 200602010044162, rel. Des. Fernando Marques, j.
18.05.06, DJU, p. 167, 14 jul. 06. Embora, advirta-se, certamente o relator do mencionado julgado
entende ser cabível agravo interno contra as decisões monocráticas incidentais, o que, de
acordo com demonstrado neste trata, não acompanha-se. O adequado seria a apresentação de
agravo regimental.
72
“A lei 8.038/90 prevê, no art. 39, o direito de a parte reiterar o pedido perante o próprio colegiado.
Nestes casos, cabe à parte sucumbente impugnar os fundamentos da decisão monocrática
através de agravo regimental, como forma de assegurar o princípio da colegialidade, garantia
fundamental do processo que visa neutralizar o individualismo das decisões” (STJ, 1.a T., AgReg no
AgIn n. 827.242/MT, rel. Min. Luiz Fux, j. 07.12.06, DJU, p. 427, 01 fev. 07) “A decisão monocrática de
relator que defere ou nega efeito suspensivo ou ativo a agravo de instrumento interposto perante
tribunal de segunda instância pode ser impugnada por recurso interno ao colegiado. Aplica-se,
in casu, o princípio constitucional da colegialidade dos tribunais e do art. 39 da Lei 8.039, de
1990” (REsp 770.620/PA, relatado pelo eminente Ministro Castro Meira, DJ 03/10/2005). Recurso
especial conhecido e provido” (STJ, 4.a T., Resp n. 793430/SC, rel. Min. César Asfor Rocha, j. 17.10.06,
DJU, p. 375, 11dez. 06). No mesmo sentido: STJ, 2.a T., Resp n. 770620, rel. Min. Castro Meira,
01.09.05, DJU, p. 236, 03 out. 05, e TRF2, 8.a T. Especializada, ApCív 68169, rel. Des. Fed. 19.08.08,
DJU, p. 205, 02 set. 08.
73
NUNES, Dierle José Coelho. Colegialidade das decisões dos Tribunais: sua visualização como princípio
constitucional e do cabimento de interposição de agravo interno de todas as decisões monocráticas
do relator. Revista IOB de Direito Civil e Processual Civil, São Paulo, v. 50, p. 57, nov./dez. 2007.
74
“Sugere-se que, na hipótese de desrespeito pelo relator à previsão legal, interponha-se o agravo
previsto no art. 557, par. 1º, do CPC, cabendo ao órgão competente a apreciação imediata na
sessão seguinte à interposição. Trata-se de decisão monocrática e ad referendum do colegiado,
portanto impugnável pela via do agravo, uma vez que não concebe em órgãos colegiados o não
reexame pelo colegiado daquelas decisões do relator” (MESQUITA, Eduardo Melo de. Agravo e
mandado de segurança contra atos do juiz em face das novas alterações do sistema processual.
In: HOFFMAN, Paulo; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva (Coord.). O novo regime do agravo de
instrumento e do agravo retido: modificações da Lei n. 11.187/05. São Paulo: Quartier Latin, 2006.
p. 125). “Espera-se que, a partir de tal constatação, nossos Tribunais reconheçam incidentalmente,
seguindo a orientação já fixada pelo STF, e passem a aceitar uma espécie de agravo inominado
das decisões que, respectivamente, convertem o agravo em retido e decidem sobre o efeito
suspensivo” (OLIVEIRA, Guilherme Peres de. A irrecorribilidade do parágrafo único do art. 527 do
CPC e a jurisprudência correlata do STF. Revista de Processo, São Paulo, n. 32, p. 193, jun. 2007).
75
“Assim, uma vez afastada a inaplicabilidade da norma em destaque, inevitável é não admitir óbice
ao ataque da decisão monocrática do relator que converte em retido o agravo de instrumento,
o que se fará por meio de agravo interno, como, aliás, sói acontecer aos demais provimentos
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
7 Conclusões
Diante das informações trazidas no presente estudo, verificou-se que o
princípio do juiz natural obriga que o Tribunal julgador já tenha sido criado para
poder apreciar determinada questão, e ainda, que o magistrado competente tenha
sido legitimado mediante os procedimentos legais necessários (concurso público,
nomeação pelo quinto constitucional, etc.). No tocante ao princípio do juiz natural
nos Tribunais, esse está contido no princípio da colegialidade, princípio este de
cunho constitucional que obriga, em caso de provocação, a manifestação do órgão
colegiado sobre as decisões monocráticas proferidas em um Tribunal.
Por consequência da incidência destes princípios, verificou-se que o parágrafo
único do art. 527 é inconstitucional por feri-los, e que a o agravo regimental é o recurso
cabível contra a decisão que nega efeito suspensivo a recurso, inclusive no trâmite
do agravo de instrumento, ante o fato de o magistrado ter o dever de desconsiderar
o art. 527, parágrafo único do CPC por inconstitucionalidade e conhecer do recurso,
embora se oriente a utilização no mandado de segurança neste caso pela ampla
aceitação na doutrina e jurisprudência.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
Appeal and civil remedy of writ of mandamus like the good way to
contest this decision.
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R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 137-165, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
Introdução
É evidente que essa crescente evolução tecnológica não traz somente van
tagens. Com as novas opções tecnológicas, novas opções de delitos surgiram e tem
aumentado significativamente a sua ocorrência, principalmente tratando-se da rede
mundial de computadores — a internet.
Com isso, tratando-se das novas oportunidades para cometimento de delitos
oriundos da evolução tecnológica, o Direito Penal, como ultima ratio, também deverá
estar pronto para tratar das condutas humanas que comportam a tutela penal.
A tipificação dos crimes cometidos através da internet tem trazido algumas
divergências entre doutrinadores e, por conseguinte tem se tornado uma proemi
nente área de pesquisa para acadêmicos das ciências jurídicas. Diante desse cenário,
o presente artigo pretende demonstrar que mesmo após a explosão tecnológica
alguns crimes apenas a utilizam como ferramenta ou instrumento para cometimento
do crime, deste modo, torna-se perfeitamente possível a sua tipificação utilizando
o Código Penal vigente.
Todavia, apesar de existir alguns crimes que não possuem legislação especial
para sua tipificação, faz-se necessária a tutela estatal. Não se pode aceitar uma pro
teção deficiente por parte do Estado.
É nesse prisma que o Princípio da Proporcionalidade tem despontado como
sendo uma opção plausível para garantir que o Estado não proporcione uma proteção
insuficiente.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
1 A “nova” criminalidade
Ao longo do tempo, tem-se notado que o Direito Penal é um instrumento
qualificado de proteção dos bens jurídicos mais importantes. As constantes mudanças
que ocorrem na sociedade acabam por fazer surgir novos bens jurídicos a serem
tutelados, deste modo, faz-se necessária a adequação desse instrumento de proteção
com vistas a garantir a efetiva tutela do Estado aos direitos dos cidadãos.
O avanço da tecnologia da informação tem ocasionado profundas transfor
mações no século XXI. O uso em massa dos recursos informáticos (computadores,
redes de fibra óptica, tecnologia wireless, entre outros) tem possibilitado coletar e
compartilhar dados em grande escala à coletividade. Entre as mais variadas novi
dades tecnológicas provenientes do desenvolvimento encontra-se a internet — rede
mundial de computadores (COLLI, 2010, p. 15).
A sociedade moderna tem contemplado transformações imediatas e incon
troláveis e com isso o campo de atuação do Direito Penal abriu um enorme leque de
possibilidades, intervindo em esferas antes não conhecidas, como: meio ambiente,
manipulação genética, informática, entre outras.
Para Sánchez (2001, p. 28),
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
não é fácil para o legislador acompanhar as novas formas de conduta. Por mais
previsível que sejam as mudanças tecnológicas, é possível que escape à natureza
humana a possibilidade de prevê-las.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
Na maior parte das vezes, os crimes de computador são nada mais que os
crimes comuns cometidos com o auxílio de um computador. É comum atualmente
ter notícia de consideráveis prejuízos patrimoniais por meio de crime de furto, apro
priação indébita, estelionato ou dano (LIMA, 2005, p. 29).
Um dos doutrinadores que defendem a necessidade de criação de novos
tipos penais é o Promotor de Justiça Paulo M. Ferreira Lima. De acordo com Lima
(2005, p. 204),
Por outro lado, Greco Filho apud Ferreira (2006, p. 1) defende que as condutas
ilícitas praticadas pela internet podem ser recepcionadas pelo ordenamento jurídico
vigente:
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
condutas delituosas tipificadas cometidas por meio do computador e que podem ser
combatidas com o uso do Código Penal vigente.
1.1.1 Pedofilia
Não se pode afirmar que a pedofilia, por si só seja um crime, mas sim um
estado psicológico, e um desvio sexual. O crime pode ser caracterizado quando a
pessoa pedófila, baseada em seus desejos sexuais, comete atos criminosos como
abusar sexualmente de crianças (NOGUEIRA, 2009, p. 127).
O parágrafo 4º do art. 227 descreve que “A lei punirá severamente o abuso,
a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente”.
Com a instituição da Lei nº 8.069 no dia 13 de julho de 1990, a proteção integral
foi regulamentada conforme pode ser observada no art. 3º da referida lei, assegu
rando à criança e ao adolescente todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes
facilitar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social em condições de
liberdade e dignidade.
No contexto atual, já não existe dúvidas de que, com o desenvolvimento
tecnológico, o ser humano tem em suas mãos mecanismos ou meios que fazem com
que a distância seja um mero obstáculo superável. A tecnologia, em especial a internet
abriu fronteiras quanto a transmissão de informação e a relacionamento social.
No caso da pedofilia, aqueles que a praticam somente utilizam da internet
como um instrumento para a realização do delito já tipificado pela lei penal, por
conseguinte, não necessitando de edição de novas leis para a sua repressão.
Sendo assim, o art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente abrange de
modo específico a pornografia infantil ou pedofilia na internet. Com isso, atende ao
preceito que prevê que não há como imputar a alguém fato que a lei não prevê.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
destacar que muitas vezes esses crimes não são punidos justamente por não existir
uma legislação específica a respeito (VALLOCHI, 2004, p. 15).
Diante dos avanços tecnológicos existentes, a seguir serão apresentados
alguns exemplos de crimes que trazem, como consequência, a problemática relativa
à criação ou readaptação do ordenamento penal para a proteção desses novos
bens jurídicos informáticos.
1.2.1 Furto
Segundo Inellas (2009, p. 57), a modalidade de furto mais praticada, utilizando-
se a internet, é a transferência de fundos bancários. O criminoso, através da internet,
acessa o computador central de um estabelecimento bancário e mediante um pro
grama especial, desvia pequenas quantias, das contas de todos os clientes, para
uma determinada conta.
Nesse caso, entende-se que a subtração de bens que possuam valor econô
mico, seja de energia, de qualquer tipo, seja de dinheiro de uma conta-corrente,
utilizando-se a internet, é furto como outro qualquer, diferenciando-se apenas no
meio empregado. Ou seja, a diferença está apenas no modus operandi.
Entretanto, quando trata-se de furto de dados, o crime de furto gera polêmica.
Dado que o art. 155 do Código Penal define furto como “subtrair, para si ou para
outrem, coisa alheia móvel”, a questão que se coloca e tem que ver com interpre
tação da doutrina, em especial Pinheiro (2009, p. 239), que questiona se seria
possível tipificar como furto a conduta de levar dados da empresa, mas deixá-los
também, sem eliminá-los ou apagá-los. Assim sendo, não haveria a indisponibilidade
do bem, o que se entende como requisito de subtração.
De acordo com Pinheiro (2009, p. 239), a realização de alguns ajustes na lei
penal, como no caso supracitado,
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
1.2.2 Invasão
As tentativas de invasão podem ser feitas de várias maneiras, todavia os
principais métodos são: dedução, engenharia social, tentativa e erro, cavalo de troia
e invasão do servidor (REINALDO FILHO, 2002, p. 16-17).
Para o crime em comento, na hipótese de uma invasão onde um cracker vio
lasse um determinado sistema privado sem causar prejuízo, não há crime. Tem-se
nesse caso um fato atípico.
O acesso indevido, assim como acontece na invasão de domicílio, deve ser
regulamentado de modo a não se permitir que alguém quebre uma senha e invada
determinado sistema. No mundo físico, invadir a casa de outra pessoa, mesmo sem
levar nada, é crime tipificado no Código Penal: crime de violação e invasão de domi
cílio. Porém, a analogia não pode ser empregada nesse caso.
Para Blum apud Brito Junior (2009, p. 173), a legislação ordinária brasileira
tipifica, total ou parcialmente 95% dos crimes eletrônicos. Os 5% restantes estão
causando grande preocupação.
Por mais que 5% parece ser um percentual aceitável quando comparado aos
95% restantes, não se pode conceber que o Estado não se preocupe com a tutela
de determinados bens jurídicos. Independentemente se o valor for 5%, 4%, 3%, 2%,
1% ou até menos, o artigo 5º, inciso XXXV garante a todo cidadão que “a lei não excluirá
da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Resta ao legislador
analisar qual caminho deverá seguir para tratar de tais situações.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
1ª) Proibir a retroatividade da lei penal (nullum crimen nulla poena sine
lege praevia);
2ª) Proibir a criação de crimes e penas pelos costumes (nullum crimen
nulla poena sine lege scripta);
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
como também não pode ficar aquém do limite mínimo (deficiência). Ou seja, visa
resguardar que o Estado atue de forma deficitária.
De acordo com Feldens apud Santiago e Araújo Neto (2009, p. 1522), a
doutrina e jurisprudência tradicionais, de maneira geral, restringem o Princípio da
Proporcionalidade apenas em relação a proibição de excesso. Todavia, a proibição
de excesso é apenas um dos prismas da proporcionalidade. De acordo com o dou
trinador, “o desenvolvimento teórico dos direitos fundamentais como deveres de
proteção tem sugerido o princípio da infraproteção ou da proteção deficiente”.
Não é somente quando presentes medidas gravosas e excessivas que exige-se
a proporcionalidade da atuação estatal, deve ser observado de igual modo quando
na proibição insuficiente ou subdimensionada.
De maneira resumida, diz-se que Princípio da Proporcionalidade tem como
objetivo principal determinar os limites máximos e mínimos das intervenções estatais.
Apesar de alguns ainda acharem que a internet é um território livre, sem lei
e sem punição, aos poucos essa sensação está sendo diminuída em virtude de que
a Justiça brasileira vem coibindo essa sensação de impunidade no mundo virtual
por meio da aplicação do Código Penal, do Código Civil e de legislações específicas
como a Lei nº 9.296 — que trata das interceptações de comunicação em sistemas de
telefonia, informática e telemática — e a Lei nº 9.609 — que dispõe sobre a proteção
da propriedade intelectual de programas de computador.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 167-187, jan./mar. 2012
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4 Conclusão
Depois das considerações feitas neste artigo, não é exagero afirmar que
atualmente a humanidade vive diante de uma nova revolução jurídica, trazendo,
como consequência, a problemática relativa à criação ou readaptação do ordena
mento penal para a proteção desses novos bens jurídicos informáticos e de outros
de igual ou maior relevância, que venham a ser atingidos criminosamente por meio
de computadores e por intermédio da internet.
É inevitável a dependência do mundo digital. As facilidades oriundas do uso
da tecnologia têm conseguido uma grande quantidade de adeptos. Porém, as faci
lidades são tanto para coisas benéficas quanto para as maléficas.
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Não é novidade ouvir nos noticiários pessoas que se utilizam dos recursos
tecnológicos para cometer crimes. Alguns desses crimes são facilmente tipificados
no código penal vigente, tendo em vista que os recursos tecnológicos apenas são
considerados instrumentos para o cometimento de crimes. Ou seja, muda-se apenas o
modus operandi. Nesses casos, tem-se o que a doutrina define como crimes impróprios.
Entretanto, atualmente existem aqueles crimes que só podem ser cometidos
através da informática. Nesses casos, definidos pela doutrina como crimes próprios.
Para esse tipo de crime, o legislador brasileiro encontra dificuldades para sua tipifi
cação, tendo em vista que sua previsão não existe no código penal vigente e também
devido à falta de legislação específica para tratar tais casos.
Existe uma infinidade de delitos que pode ser praticada com o uso da
informática. Alguns exemplos clássicos de crimes próprios e impróprios foram deta
lhados no decorrer deste trabalho. O advento da era digital trouxe consigo novas
relações jurídicas com óbvios novos conflitos e série de questões a serem analisadas.
Independentemente se se trata de crimes próprios ou impróprios, é funda
mental atentar-se para respeitar os princípios constitucionais que sempre nortearam
o Direito Penal. Em especial, tem a grande conquista para a humanidade no que diz
respeito à anterioridade e ao Princípio da Legalidade, segundo o qual “não há crime
sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.
Porém, corroborando como princípio norteador do Direito Penal, tem-se
o Princípio da Proporcionalidade que muito tem contribuído para a resolução de
questões consideradas complexas.
Apesar de várias pessoas só analisarem o Princípio da Proporcionalidade em
relação ao excesso, é importante destacar que o mesmo possui duas facetas: excesso
e insuficiência (deficiência).
Em meio a essa nova onda de criminalidade, a atuação do Poder Judiciário
tem sido constantemente alvo de posicionamentos quanto à necessidade ou não
de criação de legislação específica para tipificar os crimes até então não previstos.
Porém, insta ressaltar que o processo legislativo brasileiro é notoriamente
lento e a evolução tecnológica é totalmente oposta a essa realidade, ou seja, extre
mamente rápida. Sendo assim, pode-se levantar a questão de que quando se chegar
a aprovação de uma legislação específica para os crimes de informática, já existirão
vários outros não previstos oriundos da evolução tecnológica. Por mais que o Direito
queira acompanhar as mudanças na sociedade, no caso de evolução tecnológica
a velocidade chega a ser desproporcional.
Mesmo ciente disso, é imprescindível fazer com que o Estado proteja os
direitos de seus cidadãos. Então, o que fazer? A proposta deste artigo é demonstrar
que as questões dos crimes próprios cometidos através da internet possam ser
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O menino Edson Prata teve seu primeiro emprego em uma farmácia, para
qual fazia entregas. Ali já despontava sua qualidade rara, o que me faz lembrar
passagens da vida de Machado de Assis de cujas obras era, aliás, profundo conhe
cedor, tendo escrito Machado de Assis – O homem e a obra. Não largava os livros, sua
maior paixão, a ponto de ter-se criado a estória de que lia, enquanto pedalava sua
bicicleta, fazendo as entregas de medicamentos. Se se trata de folclore não sei, no
entanto, testemunhei quando ele, certa vez, acompanhava ao mercado sua esposa
Aparecida e, enquanto ela fazia as compras ele permanecia ao lado, alheio a tudo e a
todos, lendo e lendo. Seu carro era uma biblioteca ambulante. Tinha os mais variados
títulos.
Em suas poucas férias, somente gozadas tardonhamente, levava consigo a
mala de livros e embrenhava-se nas livrarias do Rio de Janeiro, de onde, às escondidas
da esposa, que já reclamava do excesso, enviava-me novos livros para compor sua
rica biblioteca, a qual cuidamos com carinho até hoje.
Dr. Edson Prata era dotado das maiores virtudes que um homem pode ter e,
embora não se derramasse em sorrisos, era misericordioso, humilde, simples, grato,
moderado, amoroso, puro e doce. Era capaz de praticar atos de generosidade como
poucos. Dentre inúmeros atos, dois destaco aqui: José Raimundo Jardim Alves
Pinto, seu colega de trabalho no Banco do Brasil, foi preso por ocasião do golpe
militar. Solto, não mais retornou ao trabalho, pois foi sumariamente demitido, tendo
mais tarde provado sua inocência perante os Tribunais. Os “amigos” afastaram-se
dele mas Dr. Edson, sem nada dizer, com o braço em seus ombros, desfilou pela
rua Artur Machado e avenida Leopoldino de Oliveira, passando pelo banco, onde
trabalhava, cumprimentado os espantados transeuntes. Feito isso convidou-o para
trabalhar ensinando-lhe a arte da advocacia.
Em outra oportunidade, tendo Gilberto Vasconcelos, deixado a prisão, após
dois longos anos, onde sofreu as amarguras reservadas àqueles que não concordavam
com o golpe militar, acolheu-o, a meu pedido, em seu escritório, dando-lhe o apoio
de que tanto necessitava naquele momento, vindo a tornar-se o respeitável profis
sional de hoje, motivo de orgulho para ele e para todos aqueles que com ele convivem.
Importante ressaltar que Dr. Edson não gostava de política, era tido por alguns como
de direita, como a esquerda, pejorativamente, gostava de designar aqueles que
não estavam engajados.
Dr. Edson via no trabalho e nos estudos a possibilidade de superar as dificul
dades trazidas em sua origem. Assim é que até mesmo seu ócio era produtivo, como
aquele sustentado por Bertrand Russell, abrindo mão do direito à preguiça, idolatrado
por Paul Lafargue, em obra com o mesmo título. Dormia cedo e acordava para os
estudos antes do sol nascer. Seu lema era que se tivesse mais transpiração e menos
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* Material encaminhado pelo Dr. Miguel Teixeira de Freitas, ilustre Professor da Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa.
1
A Proposta de Reforma do Código de Processo Civil foi apresentada em 15 de Dezembro de 2011
à Senhora Ministra da Justiça do XIX Governo Constitucional e elaborada por uma Comissão
coordenada pelo Dr. João Correia (Advogado e Secretário de Estado da Justiça no XVIII Governo
Constitucional) e integrada pelos seguintes membros: Cons. António Abrantes Geraldes (Juiz
Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça), Dr. Armindo Ribeiro Mendes (Advogado e ex-
Conselheiro do Tribunal Constitucional), Cons. Carlos Lopes do Rego (Juiz Conselheiro do Supremo
Tribunal de Justiça), Dr. João Cardoso Alves (Procurador-Adjunto nas Varas Cíveis de Lisboa), Prof.
João Paulo Remédio Marques (Professor Auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade de
Coimbra), Dr. Júlio de Castro Caldas (Advogado e Bastonário da Ordem dos Advogados), Dra. Maria
Gabriela da Cunha Rodrigues (Juíza de Direito nas Varas Cíveis de Lisboa), Prof. Miguel Teixeira de
Sousa (Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e Advogado) e
Dr. Paulo Pimenta (Docente do Departamento de Direito da Universidade Portucalense Infante D.
Henrique e Advogado).
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no que respeita à fixação das questões essenciais de facto que constituem tema da
prova, pode requerer a realização de audiência preliminar.
Assim, embora se permita ao juiz impulsionar o processo sem realização
de audiência preliminar, proferindo logo, sem o debate oral e contraditório que a
caracteriza, as decisões sobre as matérias atrás referidas, a dedução de reclamações
obriga à realização da audiência, evitando a inconveniente resolução das reclama
ções deduzidas mediante procedimento escrito — e acabando por facultar, por esta
via, à parte reclamante a realização de um acto que considera necessário aos fins
do processo.
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10 A fase de julgamento
Quanto à disciplina da audiência final, estabelecem-se duas alterações fun
damentais no quadro legal vigente:
10.1. Consagra-se o princípio da inadiabilidade da audiência final, a qual tem
lugar, salvo se houver impedimento do tribunal, faltar algum dos advogados sem
que o juiz tenha providenciado pela marcação mediante acordo prévio ou ocorrer
motivo que constitua justo impedimento, nos estritos termos em que esta figura
está consagrada no art. 146.º.
Deste modo — e a menos que não haja sido cumprida a norma constante do
art. 155.º — é praticamente seguro que a audiência agendada se realizará efectiva
mente, evitando a frustração das deslocações dos Advogados, das Partes e Testemu
nhas à sede do tribunal e permitindo uma gestão racional e segura da agenda por
parte do juiz e do Advogado, que podem estar seguros de que as diligências agen
dadas com toda a probabilidade se irão realizar.
Por outro lado — e em consonância com este regime — prescreve-se que a
suspensão da instância por acordo das partes — permitida por períodos que, na sua
totalidade, não excedam três meses — está condicionada a que dela que não resulte
o adiamento da audiência final já agendada, estabelecendo-se que, neste caso, a
suspensão não prejudica os actos de instrução e as demais diligências preparatórios
da audiência final.
10.2. Elimina-se a intervenção do colectivo — aliás, desde 2000, praticamente
inexistente no processo civil —, passando todo o julgamento da causa, nos seus
aspectos factuais e jurídicos, a decorrer perante o juiz singular a que está distribuído
o processo.
Desta unicidade do juiz singular na fase de julgamento decorrem potenciali
dades significativas de simplificação e racionalização do processado, na medida em
que passa a ser o mesmo julgador a:
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B) Processo executivo
1 Estatuto do agente de execução
Propõe-se:
1.1. A criação e regulação, em diploma legal autónomo, de entidade fiscali
zadora dos agentes de execução, incluída no Ministério da Justiça, reguladora do
exercício dessa profissão, com atribuições nas matérias de acesso e admissão a está
gio, avaliação, disciplina e regulamentação da actividade própria dos agentes de
execução, exercidas em cooperação com as competências próprias das associações
públicas interessadas — a Ordem dos Advogados e a Câmara dos Solicitadores.
Tal entidade — exercendo as suas competências relativamente a todos os
agentes de execução, seja qual for a sua origem profissional — deverá ser provida
de serviços inspectivos que lhe permitam realizar prontamente as inspecções,
inquéritos, sindicâncias e instrução dos processos disciplinares que a actuação irre
gular de agente de execução haja originado.
1.2. A revisão do estatuto deontológico do agente de execução, prevendo-se,
designadamente, um exigente regime de incompatibilidades e impedimentos, que
torne o exercício dessa função incompatível com as profissões de advogado ou solici
tador, sem prejuízo do estabelecimento de regime transitório que garante expec
tativas fundadas dos agentes de execução actualmente em funções.
1.3. O reforço da imparcialidade e autonomia do agente de execução perante
o exequente que o designou, reservando ao juiz a competência para a sua destituição
com fundamento em actuação dolosa ou violação reiterada dos deveres estatutários.
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C) Normas transitórias
1 Consagra-se a regra da aplicação imediata das alterações introduzidas na
lei de processo às acções pendentes, com ressalva, nomeadamente:
- Das execuções regidas pelo regime anterior ao editado pelo Decreto-Lei
38/03, de 8/3, que ainda subsistam;
- Da estabilização das formas do processo e do elenco de títulos exequíveis à
data do início da acção;
- Da não aplicação aos procedimentos cautelares pendentes do novo regime
de inversão do contencioso;
- Da não aplicação da limitação no acesso ao Supremo, decorrente da con
sagração pelo Decreto-Lei 303/07 da regra da dupla conforme, aos recursos
interpostos em processos que já estivessem pendentes na data em que
esse diploma legal iniciou a sua vigência.
2. Aplica-se o novo regime que visa eliminar a pendência de execuções inviá
veis — por não terem sido identificados em prazo razoável bens penhoráveis — a
todos os processos pendentes, incluindo aqueles que, por se terem iniciado antes
de vigorar a reforma operada pelo Decreto-Lei 38/03, obedecem a um figurino
processual completamente diferente.
3. Aplica-se o novo regime de execução de sentença nos próprios autos do pro
cesso declaratório a quaisquer sentenças ainda não executadas, independente
mente da data em que foram proferidas.
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Neoinstitucionalismo e Constituição
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Todavia, Rosemiro Leal se mostra cético acerca das teorias que se fundam
na sacralização dos consensos sociais e na confiança desmedida na esfera pública,
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dado que “a chamada sociedade complexa, além de não ser sociedade, e sequer
complexa, porque centrada em marcos de crenças coletivas já ideologicamente
sistematizadas, é um conglomerado mítico em que se despontam os componentes
ditos identificatórios do dinheiro, poder e solidariedade, que as comporiam em
sua atuação integrativo-política” (p. 61). Enquanto o controle de constitucionalidade
se desenvolveu a partir da ideia de que as leis editadas pelo parlamento consti
tucionalmente eleito podiam ser contrárias à constituição, Rosemiro Leal acentua
que o próprio controle de constitucionalidade precisa ser avaliado, para evitar que
conduza a situações contrárias à democracia.
Contra o constitucionalismo que parte do dogma da democraticidade do
judicial review, Rosemiro Leal afirma que seu estudo “vai privilegiar um controle
processual de democraticidade constitucional das leis e não mais um controle de
constitucionalidade (legalidade hierárquica) das leis ou por leis” (p. 17). Quando
compreendemos que a constituição pode ser a base de uma argumentação antide
mocrática, precisamos reconhecer que nem toda aplicação constitucional significa
um incremento da democracia. E é por isso que ele se pergunta quando aplicação
da constituição pode ser democrática? E, especialmente, quando o processo de controle
de constitucionalidade contribui para a democracia?
Essa é uma crítica que vem em boa hora, pois começa a se esgotar o tempo
em que a mera referência à Constituição de 1988 é percebida como um signo de
democracia. Consolidado o processo de redemocratização, chegamos a uma época
em que nossos dilemas se relacionam com o quão democrática é a atuação do sis
tema jurídico voltado para a sua interpretação e aplicação. Em que medida o discurso
constitucionalista é efetivamente capaz de promover uma concretização do projeto
democrático determinado pela Constituição? Não será ele capaz de promover um
simulacro de democracia, a partir de uma redefinição autoritária dos sentidos do
texto?
Rosemiro Leal desenvolve essa crítica chamando atenção para elementos
como para o caráter ideológico da categoria de Estado Democrático de Direito (cap. I),
para as “sequelas míticas do poder constituinte originário” (cap. II), para a sutil “vio
lência da parlamentarização da lei” (cap. IV) e para as ilusões racionalistas envolvidas
no controle de constitucionalidade (capítulos VI a VIII). Seguindo esse itinerário,o
autor reafirma sua vinculação com uma postura filosófica contemporânea, inspi
rada pelo desconstrutivismo de Derrida e, em especial, pelo racionalismo crítico de
Karl Popper.
Muitos trechos do livro são calcados em uma contraposição entre as teorias
discursivas de Popper e de Habermas, defendendo que a primeira representa
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LEAL, Rosemiro Pereira. Processo como teoria da lei democrática. Belo Horizonte: Fórum, 2010.
Resenha de: COSTA, Alexandre Araújo; COSTA, Henrique Araújo. Revista Brasileira de Direito
Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 215-220, jan./mar. 2012.
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Fernando Rossi
Mestre em Constituição e Processo pela
Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP).
Especialista em Processo Civil e Direito Civil pela
Universidade de Franca (UNIFRAN). Membro do
Instituto dos Advogados de Minas Gerais (IAMG).
Diretor da Revista Brasileira de Direito Processual –
RBDPro. Advogado.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 221-222, jan./mar. 2012
PORTO, Sérgio Gilberto. Coisa julgada civil. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. Resenha
de: ROSSI, Fernando. Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 20,
n. 77, p. 221-222, jan./mar. 2012.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 221-222, jan./mar. 2012
Excelente. Outra não foi, confesso, a primeira palavra que me recordo de ter
pensado após a leitura do livro Direito ao Processo qualificado: o processo civil na
perspectiva do Estado Constitucional, versão comercial da dissertação de mestrado
apresentada pelo autor à Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUCRS), no final do ano de 2009, a qual, após aprovação, com louvor, da banca
examinadora, vem a público pela prestigiosa Editora Livraria do Advogado.
Possuindo o Estado Constitucional a precípua função de tutelar os direitos, ou
seja, não só proclamá-los, mas realizá-los na vida prática, tornando-os efetivos, nada
mais natural que o ente estatal tenha a obrigação de viabilizar um processo justo,
por intermédio de seus órgãos competentes. A obra de Guilherme Botelho, professor
de Processo Civil da FEEVALE, justamente, nesse ponto, tem o seu grande mérito, já
que delimita o conceito e identifica os elementos constitutivos do processo cível
próprio do Estado Democrático de Direito — o que faz com maestria, diga-se de pas
sagem, equilibrando denso conteúdo doutrinário com uma fácil e agradável leitura.
Sempre externando as suas preocupações com o destino prático do processo,
o autor desenvolve, em um primeiro momento, uma análise histórica de todo caldo
cultural que deu vida a nova forma de compreensão do direito processual, acabando
por concluir que no Estado Constitucional o direito ao processo não pode ser visto
como uma simples possibilidade de acesso formal ao judiciário, mas como um direito
qualificado, que deve ser, “em seus meios e resultados, tempestivo, justo e ade
quado ao direito material em litígio” (p. 135). Após verificar e analisar os elementos
que integram o seu conteúdo (adequação, tempestividade e justiça), encerra com a
observação de que o processo qualificado age como o princípio-síntese de todos os
demais textos processuais, devendo ser utilizado como “postulado aplicativo apto
a guiar a interpretação das normas de natureza processual civil” (p. 177).
A obra do Professor Guilherme, ao final, reflete a sua própria personalidade:
um livro inteligente, instigante, de alto teor crítico, que busca um ponto de equilí
brio entre as posições nele defendidas, harmonizando características contrastantes,
indicando caminhos para a construção de um processo previsível, mas adaptável
ao caso concreto; de um processo célere e efetivo, mas, obrigatoriamente, seguro.
O tempo, com a mais absoluta certeza, confirmará o sucesso desse livro e
consolidará o nome do autor entre os expoentes do processo civil (exatamente
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 223-224, jan./mar. 2012
como prevê o Professor Doutor José Maria Rosa Tesheiner, no prefácio da obra (p. 9)).
Nada mais nos resta do que recomendar a sua leitura atenta, já que indispensável a
todos que manejam o processo e que procuram entendê-lo dentro da ótica de um
verdadeiro Estado Constitucional.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 223-224, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 225-226, jan./mar. 2012
Vale sublinhar que o prefácio foi escrito por ninguém menos que o Ministro
do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux. Além disso, trata-se de um trabalho elaborado
com o propósito de homenagear a figura do advogado mineiro Claudiovir Delfino,
pelos seus quarenta e dois anos de contínua atividade na advocacia e sobretudo
pelo trabalho sério e ético que vem desempenhando com afinco até então.
Felicito os coordenadores, coautores e a própria Editora Fórum pela publicação
dessa importantíssima obra jurídica, que muito acrescenta às letras jurídicas.
ROSSI, Fernando et al. (Coord.). O futuro do processo civil no Brasil: uma análise crítica ao projeto
do novo CPC: obra em homenagem ao Advogado Claudiovir Delfino. Belo Horizonte: Fórum,
2011. Resenha de: RUFINO, Luciano da Silva. Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro,
Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 225-226, jan./mar. 2012.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 225-226, jan./mar. 2012
Lúcio Delfino
Advogado. Diretor da Revista Brasileira de Direito
Processual – RBDPro. Doutor em Direito Processual
Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito
Processual. Membro da Academia Brasileira de
Direito Processual Civil. Membro do Instituto dos
Advogados de Minas Gerais.
KLIPPEL, Rodrigo; BASTOS, Antonio Adonias. Manual de processo civil. Rio de Janeiro: Lumen
Juris; Vitória: Acesso, 2011. Resenha de: DELFINO, Lúcio. Revista Brasileira de Direito Processual –
RBDPro, Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 227, jan./mar. 2012.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 227, jan./mar. 2012
Em boa hora, a Editora Fórum nos traz a obra Direito processual civil: artigos
e pareceres da autoria de Lúcio Delfino, exímio processualista mineiro, Diretor da
consagrada Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro.
Lúcio está de parabéns! Como revela Fredie Didier Jr., no prefácio, o autor
“é um jurista seguro e sereno” que escreve textos de forma clara sobre “temas atuais
e relevantes”.
Essa coletânea de trabalhos — artigos e pareceres — de Lúcio Delfino não
poderia ser diferente.
O livro é dividido em duas partes.
As primeiras 280 páginas, primeira parte, são compostas de doze artigos do
autor sobre temas relevantes para o direito processual civil.
No primeiro artigo, intitulado “O processo democrático e a ilegitimidade
de algumas decisões judiciais”, com muito talento, aborda que as decisões judiciais
proferidas no Estado Democrático de Direito somente encontram legitimidade
se realizadas à luz do contraditório, que é a democracia no ambiente processual.
Além de profunda base teórica, apresenta diversos exemplos práticos de decisões ile
gítimas que violam o princípio do contraditório.
No segundo artigo, aventura-se no difícil tema do direito intertemporal
aplicado em conflitos de leis que envolvem o “velho” e o “novo” regime do mandado
de segurança.
Por sua vez, no terceiro artigo, Lúcio faz uma interessante análise, em coau
toria com Fernando Rossi, sobre a “interpretação jurídica no Estado Constitucional”,
onde demonstram que toda e qualquer interpretação jurídica, que tem por escopo
desvelar significados do texto normativo, deve-se pautar na substancial supremacia
da Constituição, que é pautada pela democracia como eixo teórico e composta por
princípios e por direitos fundamentais.
No quarto artigo, com sua perspicácia, o autor discorre sobre o recente e
pouco explorado tema do direito aos alimentos gravídicos e as questões referentes
às técnicas processuais diferenciadas instituídas pela Lei nº 11.804/2008 para a
proteção da pessoa embrionária.
Já no quinto artigo, examina o princípio da legalidade das formas e a adaptação
do procedimento às especificidades do litígio ao escrever sobre a “flexibilização
procedimental no Novo CPC”, onde demonstra os poderes do juiz e seus limites na
flexibilização do procedimento e apresenta algumas críticas.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 229-232, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 229-232, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 229-232, jan./mar. 2012
DELFINO, Lúcio. Direito processual civil: artigos e pareceres. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
Resenha de: SANTOS, Welder Queiroz dos. Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro,
Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 229-232, jan./mar. 2012.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 229-232, jan./mar. 2012
página página
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 233-235, jan./mar. 2012
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J PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
JUIZADOS ESPECIAIS - Ver: Crimes de internet à luz do princípio da
- Ver: O processo civil gattopardista dos proporcionalidade: proibição da proteção
Juizados Especiais. Artigo de: Glauco deficiente do Estado. Artigo de: Dauster Souza
Gumerato Ramos..................................................... 37 Pereira, Mariana Secorun Inácio.......................167
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 233-235, jan./mar. 2012
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 20, n. 77, p. 237-238, jan./mar. 2012
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