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Editorial............................................................................................................................................7
DOUTRINA
Artigos
Pedido de reconsideração
Jonathan Iovane de Lemos.........................................................................................................69
1 Notas introdutórias..........................................................................................................69
2 Pedido de reconsideração – Elementos.........................................................................71
2.1 Conceito e conteúdo.........................................................................................................71
2.2 Origem e natureza jurídica.............................................................................................72
2.3 Hipóteses de cabimento...................................................................................................72
2.3.1 Preclusão............................................................................................................................73
Parecer
RESENHAS
Índice ...........................................................................................................................................231
Lúcio Delfino
Fernando Rossi
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 7, jul./set. 2010
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 11-42, jul./set. 2010
1 Introdução
Em sede processual, os recursos podem ser definidos como meios de
impugnação às decisões judiciais, aptos a ensejar seu reexame pelo mesmo
magistrado ou por outro de hierarquia superior, almejando obter seu escla-
recimento, integração, reforma ou anulação, tudo fundado na natural rea-
ção humana de desejo a um duplo julgamento e na possibilidade de erro ou
má-fé do julgador, segundo Theodoro Júnior (2009). De modo que recurso é
remédio processual disponibilizado às partes para, na mesma relação jurídica
processual e voluntariamente, impugnar decisões judiciais, almejando sua
reforma, invalidação, cassação, esclarecimento ou integração. Visa, ainda,
obstar a preclusão e a coisa julgada, mas induz à litispendência.
Nesse viés, exsurge o princípio da fungibilidade dos recursos com ine-
gável relevo para os operadores do direito processual civil e penal, haja vista
sua capacidade, através da permissão de se sanar equívoco na interposição do
recurso cabível contra uma decisão, de propiciar adequada solução para certas
situações que, por conta do formalismo excessivo, não se faria possível, em
rota de colisão com a cláusula constitucional do acesso amplo e justo ao Poder
Judiciário (art. 5º, inciso XXXV, da Constituição da República de 1988 – CR/88).
Consiste, pois, noutros termos, tal princípio na conversão de um
recurso erroneamente interposto pelo certo, o que se dá sob certas diretrizes.
Sem embargo, a solução dada pela franca maioria da jurisprudência
atual, inclusive do colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ), como se verá
em momento oportuno, ainda se encontra jungida às amarras do diploma
que inaugurou o aludido princípio à sistemática processual civil, qual seja,
o Código de Processo Civil (CPC) de 1939, olvidando-se de que a realiza-
ção prática do direito material deve-se sobrepor ao rigor formal, sob pena de
desatendimento ao escopo social do processo de pacificação.
Assim, há muito vem defendendo Wambier (1992) o estudo a que se
propõe, isto é, dirigir-se ao exame do pressuposto único para incidência, na
atualidade, do princípio da fungibilidade recursal, o que se fará, com uso
de metodologia teórico-documental, por meio de minuciosa análise de obras
doutrinárias e arestos jurisprudenciais, esses a partir de 1973, com enfoque
às decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), do Tribunal de Justiça
de Minas Gerais (TJMG) e do STJ.
Por primeiro, será tratado o postulado constitucional do acesso amplo
à jurisdição, externando o seu conteúdo material, para, depois, examinar as
formas dos atos processuais ao lume daquele postulado. Na sequência, ultra-
passada a definição de princípios, distinguindo-os de regras, será enfocado
o princípio da fungibilidade recursal sob a égide das revogadas e vigentes
sistemáticas processuais civis, assentando o que determina, hodiernamente,
a sua incidência e finalizando com o procedimento a ser seguido nesse caso.
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estabelece, em seu art. 5º, inciso XXXV, que “a lei não excluirá da apreciação
do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (BRASIL, 1988).
De início, impende mencionar a opção pelo termo “acesso à
jurisdição”, em vez de “acesso à justiça”, por ser essa última de variegados
significados, conforme lapidar observação de Leal (2009). Dessa forma:
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Observe-se que o processo não busca “decisões justas”, mas assegura as partes
participarem isonomicamente na construção do provimento, sem que o impre-
ciso e idiossincrático conceito de “justiça” da decisão decorra da clarividência
do julgador, de sua ideologia ou magnanimidade. Afaste-se desde logo ser o
processo o “tema-ponte a interligar o processo civil com a justiça social” ou o
modo de fazer aflorar toda uma problemática inserida em um contexto social
e econômico, cuja solução coubesse à sapiência do juiz.
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Ora, se o que se espera e o que se quer é que o processo atinja suas fina-
lidades, impende proceder à relativização do valor das formas, utilizando-as
tão somente na exata medida do necessário àquela consecução, não sendo
OLIVEIRA. Do formalismo no processo civil, p. 7-8.
DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 377.
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“razoável que este pudesse ser desenvolvido sem que houvesse um mínimo
de controle sobre as atividades a serem desempenhadas pelas partes e pelo
próprio Estado-juiz”. Desse modo, a propalada lição de Liebman (1984), no
sentido de que “as formas são necessárias, mas o formalismo é uma defor-
mação”, sendo essa a razão pela qual a efetividade do processo “depende
menos das reformas legislativas (sem jamais ignorar sua importância), do
que da postura cultural dos operadores do direito”.
Em virtude disso, vem se entendendo que a grande reforma a ser levada
a efeito no Poder Judiciário, em caráter de extremada urgência, é a mudança
da mentalidade dos juízes, dada a frequência de “sentenças e acórdãos dos
tribunais recheados de citações eruditas, escritos em linguagem rebuscada e
centrados na discussão de formalidades processuais, dando pouca ou nenhuma
importância à questão justiça”.10 Dessa maneira:
Por outro lado, para que seja possível a aplicação do princípio da instrumentalidade
das formas, deve ser superada a visão tradicional do juiz neutro, substituindo-a
pela concepção do juiz diretor, concebido como autoridade dentro do processo,
que exercita seus poderes-deveres para a efetiva direção e comando das atividades
processuais, de modo a obter o esclarecimento dos fatos e a busca da verdade,
sem que fique preso ou amarrado ao papel de mero espectador.11 12
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4 Dos princípios
Preleciona o mestre Reale (1991) que os princípios jurídicos consistem
no fundamento básico do sistema normativo, a “base de validade das demais
asserções que compõem dado campo do saber”.15 Em explanação mais por-
menorizada, assevera Bandeira de Mello (2006) que:
13
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil e processo
de conhecimento. 50. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. 1, p. 569.
14
THEODORO JÚNIOR. Curso de direito processual civil, p. 569.
15
REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 299.
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ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 9. ed. São Paulo: Malheiros,
17
2009. p. 78-79.
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contra quem se redirecionou ação executiva, regularmente citado e, portanto, integrante do pólo passivo da
demanda, são os de devedor, e não por embargos de terceiros, adequados para aqueles que não fazem parte da
relação processual. Todavia, em homenagem ao princípio da fungibilidade das formas, da instrumentalidade do
processo e da ampla defesa, a jurisprudência admite o processamento de embargos de terceiro como embargos
do devedor. Exige, para tanto, entre outras circunstâncias, a comprovação do implemento dos requisitos legais de
admissibilidade, notadamente quanto à sua propositura dentro do prazo legal” (EREsp nº 98.484/ES, 1ª Seção, Rel.
Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 17.12.2004). 3. Os sócios somente podem ser responsabilizados pelas dívidas
tributárias da empresa quando exercerem gerência da sociedade ou qualquer outro ato de gestão vinculado
ao fato gerador. 4. Na hipótese dos autos, o Tribunal de Justiça estadual entendeu que o sócio, contra o qual se
buscava o redirecionamento da execução fiscal, não participava da gerência, administração ou direção da empresa
executada. Assim, para se entender de modo diverso ao disposto no acórdão recorrido, é necessário o reexame do
conjunto fático-probatório contido nos autos, o que, no entanto, é vedado em sede de recurso especial, nos termos
da Súmula nº 7/STJ. 5. Agravo regimental desprovido” (BRASIL. STJ. 1ª Turma. AgRg no Ag nº 847.616/MG. Rel.
Min. Denise Arruda, julgado em 04 set. 2007. DJU, Brasília, p. 302, 11 out. 2007).
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Num quadro tal, exaltou Jorge (2002) que, em face dessas duas premis-
sas — inexistência de previsão e simplicidade do sistema recursal — a dou-
trina e a jurisprudência negaram, de início e com tintas fortes, a existência do
princípio em comento.28 Trata-se, como se percebe, de decisões impregnadas
27
BRASIL, 1973, Exposição de Motivos do CPC.
28
Colhe-se da jurisprudência contemporânea ao limiar da vigência do Código de 1973: “EMENTA: PRINCÍPIO
DA FUNGIBILIDADE DOS RECURSOS NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. INEXISTÊNCIA. NÃO
CONHECIMENTO, ASSIM, DE REMÉDIO PROCESSUAL INADEQUADO. No sistema do Código de Processo
Civil de 1973, em vigor, inexiste a fungibilidade de recursos, admitida no anterior, e, assim, a interposição de
um dos especificamente previstos, por outro, constitui erro grosseiro, o que impedirá o seu conhecimento na
instância superior” (SÃO PAULO. TJSP. 1ª Câmara Civil. Agravo de Instrumento nº 203.400. Rel. Des. Francisco
Negrisollo, julgado em 11 set. 1974. Revista dos Tribunais, 473/114); e, “EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO.
INTERPOSIÇÃO CONTRA DECISÃO QUE INDEFERE INICIAL. INADMISSIBILIDADE. HIPÓTESE DE
APELAÇÃO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. SUPRESSÃO PELO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL VIGENTE.
I – O recurso cabível contra a sentença que indefere a petição inicial é o de apelação. II – O Código de Processo
Civil atual eliminou o princípio da fungibilidade dos recursos” (SÃO PAULO. TJSP. 3ª Câmara Civil. Agravo de
Instrumento nº 250.987. Rel. Des. Costa Manso, julgado em 06 maio 1976. Revista dos Tribunais, 491/87).
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os princípios são, normalmente, regras de ordem legal, que muitas vezes decor-
rem do próprio sistema jurídico e não necessitam estar previstos expressamente
em normas legais, para que se lhes empreste validade e eficácia. Logo, mesmo
à falta de regras expressas, pode-se entender, em tese, que a fungibilidade dos
recursos não repugna ao sistema do CPC [...].31
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Num quadro tal, fica claro que a fungibilidade recursal deve atender
a certos requisitos de aplicabilidade, para que a sua incidência não resulte,
repisa-se, em conflito com outros preceitos processuais, como o princípio da
singularidade recursal, consistente na impossibilidade de se atacar uma deci-
são, utilizando-se mais de um tipo de recurso ao mesmo tempo.
Ao se debruçar sobre o exame dos requisitos, tem-se que parte da juris-
prudência36 e da doutrina,37 ainda se orienta no sentido de que o princípio da
fungibilidade deva ser aplicado da mesma forma e com os mesmos requisitos
do codex revogado.
Lado outro, vozes não menos abalizadas propendem para a sua apli-
cação em face das necessidades e peculiaridades do sistema vigente, como
Wambier (1996) e Nery Júnior (1997), entendimento esse que parece o mais
técnico, permissa venia.
Não se deve tão somente transportar os requisitos do sistema pretérito
para o atual, já que a sistemática recursal foi mudada sobremaneira e o direito,
assim como a sociedade, encontra-se em constante evolução. Deve-se, isto
sim, fazer uso do tirocínio adquirido, estabelecendo-se concepção própria,
de molde a relegar os problemas do passado e atender às necessidades do
sistema vigente, em conformidade com Jorge (2002).
Ao se compreender desse modo, o afastamento, desde já, da inexis-
tência de má-fé, como requisito necessário para a aplicação do princípio, é
medida que se impõe, notadamente diante da dificuldade e do inseparável
casuísmo para sua definição. Em abono à tese, Wambier (1996) aduz que:
a má-fé era aspecto que tinha de ser enfrentado à luz do estatuto revogado, que
lhe fazia referência explícita, mas não, a nosso ver, à luz da lei vigente, que nem
menciona o princípio. Logo, parece que sua formulação deve ser a mais simples
e operativa possível. A má-fé, a nosso ver, deve ficar de fora.38
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39
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Dúvida objetiva: o único pressuposto para aplicação do princípio da fungibilidade.
Revista de Processo, São Paulo, ano 17, n. 65, p. 56-74, jan./mar. 1992. p. 60.
40
A mesma contradição, concessa venia, cometem os Tribunais: “EMENTA: PROCESSO CIVIL. AGRAVO. LEI
8.038, ART. 28. DESCABIMENTO PARA ATACAR DECISÃO QUE ORDENA O DESENTRANHAMENTO DAS
CONTRA-RAZÕES AO RECURSO ESPECIAL. FALTA DE PREVISÃO LEGAL. FUNGIBILIDADE RECURSAL
NÃO ACOLHIDA. ERRO INESCUSÁVEL. AGRAVO DESPROVIDO. I – A sistemática processual vigente somente
prevê agravo de instrumento no Superior Tribunal de Justiça para viabilizar o seguimento do recurso especial
obstado na origem e nos casos em que funcione ele, por previsão legal, como órgão de segunda instância, sendo
descabido seu manejo contra decisão que ordena o desentranhamento das contra-razões ao recurso especial. II
– A fungibilidade recursal reclama, dentre outros pressupostos, que o erro seja escusável, como na hipótese de
fundada dúvida. Decisão. Por unanimidade, negar provimento ao Agravo Regimental” (BRASIL. STJ. 4ª Turma.
AGA 33557. Processo nº 1993.00.03898-2/SP. Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado em 24 jun. 1993.
DJU, Brasília, p. 14256, 02 ago. 1993); e, “EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. CONTRADIÇÃO ENTRE O VOTO-
CONDUTOR E A EMENTA DO ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. EMBARGOS
DE DECLARAÇÃO: ADMISSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO
ART. 538 DO CPC: IMPOSSIBILIDADE. DECISÃO HOMOLOGATÓRIA DE ATUALIZAÇÃO DE CÁLCULOS
NO CURSO DA EXECUÇÃO. RECURSO CABÍVEL: AGRAVO DE INSTRUMENTO, E NÃO APELAÇÃO.
DÚVIDA OBJETIVA: INEXISTÊNCIA. ERRO GROSSEIRO: CONSTATADO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE
RECURSAL: INAPLICÁVEL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I – Não são protelatórios os embargos de
declaração interpostos com o fito de eliminar contradição existente entre o voto-condutor e a ementa do acórdão.
II – Embora não esteja inserto em nenhum dos dispositivos do código de processo civil em vigor, o princípio da
fungibilidade ainda rege o sistema recursal pátrio. O princípio da fungibilidade só tem aplicação quando o recorrente não
comete erro grosseiro. Para que o equívoco na interposição de recurso seja escusável é necessário que haja dúvida objetiva, ou
seja, divergência atual na doutrina ou na jurisprudência acerca do recurso cabível. Se, ao contrário, não existe dissonância ou
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R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 11-42, jul./set. 2010
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é sentença, pelo critério do seu conteúdo, pois que o juiz proferirá decisão com
fulcro necessariamente num dos incisos dos arts. 267 ou 269, ou, mais especifi-
camente, arts. 267, I, IV, VI; 269, IV; 295, I a VI e parágrafo único, I a IV. Como
dissemos, o legislador especificou quais conteúdos fazem com que se possa
identificar um pronunciamento judicial como sentença. Estes possíveis conte-
údos estão previstos justamente nos incisos dos arts. 267, 269 e 295 do Código
de Processo Civil. Destes pronunciamentos, o recurso cabível é a apelação,
segundo o art. 513. Esta é a regra.
Excepcionalmente, se recorre de sentenças por meio de agravo.42
Não me parece, porém, que seja assim. Estou convencido de que, apesar das
novas redações dos dispositivos legais, a sentença continua a ser, no direito pro-
cessual civil brasileiro, um ato final. Aceita a idéia de que existem três módulos
processuais distintos (o de conhecimento, o de execução e o cautelar), deve-se
considerar sentença o ato do juiz que, resolvendo ou não o mérito da causa,
tenha sido capaz de pôr termo a um módulo processual (no primeiro grau de
jurisdição). Em outros termos, isto significa dizer que o conceito de sentença,
afinal de contas, não se alterou, embora a Lei nº 11.232/05 tenha modificado o
texto legal como o fez.
[...] Atos de resolução parcial do mérito, que não determinam a extinção do
módulo processual em que proferidos, não são sentenças, mas decisões inter-
locutórias.43
[...] Se resolve qualquer dessas matérias, o ato judicial, sem dúvida, terá
enfrentado situação prevista ou no art. 267 ou no 269 do CPC. Mas seria com-
patível com o sistema de efetividade e celeridade do processo qualificar como
sentença, e permitir a interposição de apelação, antes que o mérito da causa
tenha sido completamente resolvido? As regras legais não podem ser lidas e
interpretadas isoladamente, fora do sistema a que se integram e em atrito com
a sua teleologia.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005b. p.
42
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Conforme dito alhures, esses dois últimos juristas possuem razão, não
se descartando, porém, a possibilidade de uma decisão interlocutória gerar
efeitos próprios de uma sentença, como a formação de coisa julgada mate-
rial e o cabimento de ação rescisória, consoante exemplos fornecidos por
Dinamarco (2004) e Araújo (2007).
5.2.2 Da tempestividade
Não há como encerrar o exame dos requisitos para incidência do prin-
cípio da fungibilidade recursal sem tecer considerações acerca do prazo para
a interposição do recurso. Vale mencionar, se o recorrente deve obediência ao
prazo do recurso tido como adequado ou não.
Conforme já foi exposto, a tendência preponderante à verificação da ine-
xistência de má-fé pelo irresignante radica-se no fato de que ele deverá se valer
do prazo do recurso de menor tempestividade, exegese que valia para a siste-
mática revogada e, para aqueles que a ela se prendem, continua persistindo.
Noutros termos, para os seguidores dessa corrente, havendo dúvida, por exem-
plo, entre o cabimento do recurso apelatório e o de agravo de instrumento,
deverá o recorrente observar o prazo legal de 10 (dez) dias, previsto no art. 522
do CPC, e não o de 15 (quinze) dias do art. 508 do mesmo diploma.
Roga-se obsequiosa vênia a quem entende de forma diversa, considera-se
que tal exigência é um rematado absurdo, haja vista, como destacado acima, a
grande dificuldade para delinear a má-fé, o que gerava intensa celeuma desde
a sistemática passada, desaguando em critérios absolutamente subjetivos e
casuístas para tanto, o que não pode e não deve ocorrer em decisões judiciais.
Ademais, a má-fé, além de não se erigir em qualquer dos pressupostos
processuais que regem a admissibilidade dos recursos, deve ser punida na
forma dos arts. 17 e 18 do CPC ou, na fase executiva, na forma dos arts. 600 e
601, desse mesmo estatuto processual.
De modo que fica claro que o recorrente deve respeito ao prazo do
recurso efetivamente interposto.
44
THEODORO JÚNIOR. Curso de direito processual civil, p. 581.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 11-42, jul./set. 2010
EXECUTIVO JUDICIAL – ART. 475 DO CPC ALTERADO PELA LEI 11.232/2005 – RECURSO CABÍVEL – AGRAVO
DE INSTRUMENTO – ERRO ESCUSÁVEL – FUNGIBILIDADE – ALEGAÇÃO DE PAGAMENTO NA FASE DE
EMBARGOS QUESTÃO NÃO SUSCITADA NA FASE DE FORMAÇÃO DO TÍTULO JUDICIAL – EXCESSO DE
EXECUÇÃO NÃO CONFIGURADO – DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO. I – Embargos à execução fundados
em título executivo judicial, após a entrada em vigor da lei 11232/05, passam a ser denominados impugnação ao
cumprimento de sentença, devendo observar o procedimento previsto nos arts. 475-J e seguintes do CPC, que prevê
o recurso de apelação em caso de extinção da execução. II – Havendo fundada dúvida doutrinária e jurisprudencial sobre
qual o recurso cabível contra decisão que julgar os Embargos à execução, agora denominados impugnação, não há falar em erro
grosseiro se o recurso ajuizado de forma equivocada tiver sido interposto no prazo do recurso adequado, aplicando-se o princípio
da fungibilidade recursal. III – Transitada em julgado a sentença executada, descabe a discussão acerca da certeza
do título ou até mesmo de fatos impeditivos, extintivos ou modificativos do direito do exeqüente, se anteriores
ao provimento judicial exeqüendo, vez que a decisão executada está protegida pelo manto da coisa julgada”
(MINAS GERAIS. TJMG. 12ª Câmara. Apelação Cível nº 1.0079.06.289916-0/001. Rel. Des. Alvimar de Ávila, julgado
em 03 dez. 2008. TJMG, Belo Horizonte, Data da publicação 12 jan. 2009, grifo próprio); “EMENTA: AGRAVO
DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. APELAÇÃO. RECURSO
INADEQUADO. ERRO GROSSEIRO PRESENTE. FUNGIBILIDADE RECURSAL INVIÁVEL. RECURSO NÃO
PROVIDO. I – A fungibilidade recursal é excepcional e pressupõe a existência de dúvida objetiva quanto à espécie de recurso
cabível, não estar presente erro grosseiro e o recurso inadequado tenha sido interposto no prazo legal daquele que seria correto.
II – O provimento judicial que julga liquidação de sentença é decisão interlocutória e desafia agravo de instrumento
nos exatos termos do art. 475H do CPC. III – Diante da expressa previsão legal, a parte que interpõe apelação contra
o mencionado provimento judicial pratica erro grosseiro, o que impede a excepcional aplicação da fungibilidade.
4. Agravo de instrumento conhecido e não provido, mantida a decisão que negou recebimento à apelação por ser
recurso inadequado” (MINAS GERAIS. TJMG. 2ª Câmara. Agravo de Instrumento nº 1.0105.95.006479-7/001. Rel. Des.
Caetano Levi Lopes, julgado em 17 abr. 2007. TJMG, Belo Horizonte, Data da publicação 27 abr. 2007, grifo próprio);
“EMENTA: AÇÃO CIVIL. INDEFERIMENTO PARCIAL DA INICIAL. RECURSO DE AGRAVO. APELAÇÃO
INTERPOSTA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. OBSERVÂNCIA DO PRAZO.
PRECEDENTES. TEMPESTIVIDADE NÃO COMPROVADA. SÚMULA 7/STJ. I – Ainda que pertinente a existência
de dúvida quanto ao recurso a ser utilizado contra decisão que indefere parcialmente a inicial, na hipótese não se pode falar na
aplicação do princípio da fungibilidade recursal, que exige o cumprimento de mais dois requisitos: ausência de erro grosseiro e
que o recurso erroneamente interposto, tenha sido protocolado dentro do prazo do recurso que se quer seja admitido. Este último
requisito não pode ser comprovado dos elementos trazidos aos autos, uma vez que o recorrente não cuidou de juntar
a certidão da intimação da decisão atacada via tal recurso. Incidência da Súmula nº 7/STJ. II – Precedentes: REsp
nº 641.431/RN, Rel. Min. LUIZ FUX, DJ de 17/12/2004, REsp nº 117.429/MG, Rel. Min. ADHEMAR MACIEL, DJ de
09/06/1997, AgRg nos EREsp nº 588.006/SC, Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, DJ de 13/12/2004. III – Agravo
improvido” (BRASIL. STJ. 1ª Turma. AgRg no REsp nº 920.389/RS. Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 17 maio
2007. DJU, Brasília, 31 maio 2007, p. 407, grifo próprio); e, finalmente, “EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO
ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO AO INVÉS DE APELAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE
MÁ-FÉ E ERRO GROSSEIRO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. APLICABILIDADE. I – É possível sanar o equívoco
na interposição do recurso pela aplicação do princípio da fungibilidade recursal, se inocorrente erro grosseiro e inexistente má-
fé por parte do recorrente, além de comprovada a sua tempestividade. II – Informa o acórdão recorrido que o recorrente
interpôs recurso de agravo de instrumento em situação em que o juiz de 1º grau determinou o arquivamento, com
baixa na distribuição, situação em que seria cabível a apelação. Ocorre, entretanto, que ao apreciar os embargos
declaratórios opostos pelo ora recorrente contra a decisão terminativa, denominada de “despacho”, o próprio juiz
de 1º grau o induziu a erro, no que consignou que: “a irresignação dos autores traz ínsito o escopo de reforma do
decisório, vertendo-se, pois, contra os próprios argumentos de direito abraçados em sua fundamentação, insurgência
que não cabe na estreita via declaratória, havendo de conformar-se ao recurso cabível, precisamente o de agravo de
instrumento” (fl. 275). III – A indução à interposição de recurso equivocado pelo próprio órgão recorrido, aliada ao
prazo mais exíguo do agravo de instrumento, quando em comparação com a apelação, afasta a suspeita de má-fé
e o erro grosseiro, permitindo a aplicação do princípio da fungibilidade recursal. IV – Recurso especial provido”
(BRASIL. STJ. 1ª Turma. REsp nº 898.115/PE. Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 03 maio 2007. DJU, Brasília,
p. 551, 21 maio 2007, grifo próprio).
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O que se tem de reconhecer é que a lei abriu uma exceção à regra, segundo a
qual o escoamento in albis do prazo para o recurso cabível faz transitar em jul-
gado a decisão; ou, antes, que a res iudicata se forma sob condição resolutiva da
subseqüente interposição de recurso inadequado, mas conversível no adequado
por inexistência de erro grosseiro ou má-fé.46
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tem que ser havido como tempestivo, já que de quinze dias é o seu prazo para
interposição (art. 508 do CPC).
Ao entender o órgão julgar competente que o caso seria de recurso de
agravo, cujo prazo é de dez dias (art. 522 do CPC), mesmo assim deverá recebê-lo,
não se operando a preclusão temporal e nada importando a convicção pes-
soal do magistrado, uma vez que jamais se poderá olvidar que o princípio
da fungibilidade foi instituído em benefício da parte, e não do Estado. Não
se pode prejudicar os jurisdicionados por erro do próprio sistema, sendo
escorreita — não se cansa de insistir — a interposição do recurso impertinente
dentro do prazo que a norma jurídica instrumental lhe previu.
Não é só. A exigência do prazo menor, diverso daquele próprio do
recurso que a parte considerou cabível, afronta o princípio do devido processo
legal (art. 5º, inciso LIV, da CR/88) e o da ampla defesa (art. 5º, inciso LV, da
CR/88), por subtrair ao interessado o direito de recorrer em consonância com
as regras processuais.
Conforme se deixou entrever ao ensejo do capítulo 2 do presente
estudo, interpretação em sentido contrário do que se está a apregoar implica
malferir o postulado constitucional do acesso amplo à jurisdição (art. 5º,
inciso XXXV, da CR/88), sobrelevando trazer ao cotejo a magistral lição do
tantas vezes mencionado Nery Júnior (2009):
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o §2º, os incisos V, X e XXV do art. 5º, os incisos VI, VII, XXI do art. 7º, o
inciso XI do art. 37, todos da CR/88, além de outros. Como noticia Suppioni
de Aguirre (2005), o qual se encarrega de justificar a divergência como
fruto do recente “reconhecimento da positivação constitucional do princí-
pio”.50 Aliás, no ponto, importa transcrever a lição de Barroso (2006a):
50
AGUIRRE, José Eduardo Suppioni de. Aplicação do princípio da proporcionalidade no processo civil. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris, 2005. p. 114.
51
BARROSO, Luís Roberto. A nova interpretação constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006a. p. 362-363.
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Por tudo o que se vem de dizer, deve-se garantir à parte o acesso à jurisdi-
ção sempre que haja dúvida, nada mais, nos termos da lição de Santos (2002).
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 11-42, jul./set. 2010
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6 Conclusão
Como visto, com espeque no art. 5º, inciso XXXV, da CR/88, todos têm
direito à busca da tutela jurisdicional justa, adequada e efetiva, de há muito
se encontrando ultrapassada a estrita visão de simples acesso aos diversos
órgãos integrantes do Poder Judiciário, o que reduzia o amplo acesso à juris-
dição a um direito puramente formal.
Nessa linha de raciocínio, o processo não é um fim em si mesmo,
devendo o Estado-juiz acatar a inobservância de determinada forma, desde
que tenha o ato atingido sua finalidade, sobrepujando-se, assim, o princípio
da instrumentalidade das formas.
A fungibilidade recursal é princípio decorrente da instrumentalidade
das formas e dos atos processuais que, por seu turno, decorre de postula-
dos maiores, que são os princípios do devido processo legal, do acesso
amplo e efetivo à jurisdição, da proporcionalidade e da razoabilidade, todos de
envergadura constitucional. É certo que aquele se faz presente no sistema
processual vigente de modo implícito, incidindo sempre que existente dúvida
objetiva sobre qual o recurso adequado a atacar uma decisão judicial.
Assim é que, à míngua de consenso doutrinário e/ou jurisprudencial
acerca do recurso cabível contra uma decisão — dúvida objetiva —, deverá o
TEIXEIRA. Teoria do princípio da fungibilidade, p. 162.
54
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Ementa: Processual Civil. Agravo que não ataca todos os fundamentos da decisão agravada.
Desprovimento. Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, julgado em 05 maio 1993. Diário de Justiça da
União, Brasília, p. 11240, 07 jun. 1993.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 1ª Turma. AgRg no Ag nº 847.616/MG. Ementa:
Preenchimento dos requisitos. Tempestividade dos embargos. Princípio da fungibilidade
recursal. Possibilidade de aplicação. Responsabilidade do sócio vinculada ao exercício de
gerência ou ato de gestão. Súmula nº 7/STJ. Agravo Desprovido. Rel. Min. Denise Arruda,
julgado em 04 set. 2007. Diário de Justiça da União, Brasília, p. 302, 11 out. 2007.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 1ª Turma. AgRg no REsp nº 920.389/RS. Ementa: Ação
Civil. Indeferimento parcial da inicial. Recurso de agravo. Apelação interposta. Aplicação
do princípio da fungibilidade recursal. Observância do prazo. Precedentes. Tempestividade
não comprovada. Súmula nº 7/STJ. Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 17 maio 2007.
Diário de Justiça da União, Brasília, p. 407, 31 maio 2007.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 1ª Turma. REsp nº 898.115/PE. Ementa: Processual
Civil. Recurso especial. Interposição de agravo de instrumento ao invés de apelação.
Inexistência de má-fé e erro grosseiro. Princípio da fungibilidade. Aplicabilidade. Rel.
Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 03 maio 2007. Diário de Justiça da União, Brasília,
p. 551, 21 maio 2007.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 2ª Turma. AgRg no REsp nº 741.541/SP. Ementa:
Processual Civil e Tributário – Agravo regimental – Recurso especial – art.105, III, “a” e
“c” – Contribuição social previdenciária – Repetição do indébito – Combinação de espécies
recursais – Agravo regimental com pedidos de reforma e de suprimento de omissões e
obscuridades – Inadequação – Fungibilidade impossível. Rel. Min. Humberto Martins,
julgado em 18 dez. 2008. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 05 mar. 2009.
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§1 Premissa
As pesquisas de direito comparado tiveram, de nossa parte, prevalen-
temente como objeto o direito francês e o direito germânico e foram condu-
zidas mais como momento integrativo do estudo do nosso direito positivo
do que como investigação autônoma, em que o confronto de ordenamentos
* Publicado nos Estudos em homenagem a Enrico Redenti (Milano, Giuffré, 1951), na Rivista italiana per le scienze giuridiche
(Roma, 1948) e nos Problemi del Processo Civile (Napoli, Morano, 1962). Tradução e notas de adaptação de Otávio
Domit, acadêmico do último ano do curso de graduação em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
N.T.: A tradução baseou-se na versão do texto publicada na coletânea de textos do autor intitulada “Problemi del
Processo Civile”, Napoli: Morano editore (1962). Tendo em conta a data da primeira publicação, é de se perceber
que as referências do autor à legislação brasileira têm em conta o Código de Processo Civil brasileiro de 1939
(Decreto-Lei nº 1.608 de 1939), substituído pelo ainda vigente Código de Processo Civil de 1973 (Lei nº 5.869 de
1973), e o Código Civil de 1916 (Lei nº 3.071 de 1996), que deu lugar ao recente Código Civil de 2002 (Lei nº 10.406
de 2002). Ademais, além de versar o texto para o vernáculo, no que procurou-se manter o mais fiel possível ao
original, fizeram-se pequenas notas de acomodação ao atual direito processual civil brasileiro, não apenas no
que diz com a atualização do ordenamento positivo, mas também apontando eventuais mudanças sistemáticas e
estruturais adotadas pelo vigente Código elaborado por Alfredo Buzaid, as quais, por óbvio, não tiveram qualquer
pretensão de exaurir os assuntos ali tratados. Por fim, as referências a preceitos legais nas presentes notas referem-se
ao CPC/73, salvo expressa indicação.
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Quando algum caso for trazido em pratica, que seja determinado per alguma lei
de nossos Reinos, ou stylo de nossa Corte, ou costume em os ditos Reinos, ou em
cada huma parte deles longamente usado, e tal, que por direito se deva guardar,
seja por eles julgado, sem embargo do que as Leis Imperiaes acerca do dito caso
em outra maneira dispoem; porque onde a lei, stylo ou costume de nossos Reinos
dispoem, cessem todas as outras leis e direitos. E quando o caso, de que se trata,
não for determinado por lei, stylo ou costume de nossos Reinos, mandamos que
seja julgado, sendo materia que traga pecado, per os sagrados Canones.
Por ex., Planiol, Traité élémentaire de droit civil, I, n. 135.
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E sendo matéria que não traga pecado, seja julgado pelas leis Imperiaes. As quaes
leis Imperiaes mandamos somente guardar pela boa razão em que são fundadas.
1. E se o caso, de que se trata em pratica, não for determinado por lei de nos-
sos Reinos, Stylo ou costume acima dito, ou leis Imperiaes, ou pelos sagrados
Canones, então mandamos que se guardem as Glosas de Accursio, incorporadas
nas ditas leis, quando por comum opinião dos doutores não forem reprovadas;
e quando pelas ditas Glosas o caso não for determinado, se guarde a opinião
de Bartolo, por que a sua opinião comumente he mais conforme à razão, sem
embargo que alguns doutores tivessem o contrario; salvo se a comum opinião
dos doutores, que depois dele escreveram, for contraria.
Storia e sistema delle fonti del diritto comune, I, Le origini, Milano, 1938, passim e especialmente p. 39 et seq.; Lezione di storia
del diritto italiano, Milano, 1948, p. 189 et seq.; Verbete: Diritto Romano Comune, in Encicl. Italiana, v. 29, p. 693 et seq.
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no formular o seu ius proprium territorial, havia-o extraído na sua maior parte,
com um juízo criterioso de escolha, daquele mesmo mare magnum das doutri-
nas do direito comum, a que remetia, por sua vez, o intérprete em via subsi-
diária para todos os casos que não houvessem sido expressamente contem-
plados. Até mesmo aquilo que formalmente era direito particular, substan-
cialmente era ainda direito comum, escolhido, ordenado e formulado com
clareza e precisão e com vivo e moderno senso das necessidades da prática.
Notáveis foram as consequências desse fato: quando mais tarde tam-
bém em Portugal o direito comum deixou de valer como fonte subsidiária e as
Ordenações mantiveram-se em vigor como única fonte de direito nacional, atra-
vés delas continuou indiretamente a viver o direito comum, em boa parte quase
até os nossos dias; e dele, muitos institutos passaram intactos ou pouco altera-
dos para o direito atualmente em vigor em longínquas regiões do mundo.
5 Acontecimentos sucessivos. – A pequena nação havia empregado todas as
suas energias nas viagens, nas grandes descobertas, na empreita colonizadora.
Àquele tempo, as suas melhores forças pareciam exauridas. Sucede um longo
período em que Portugal, quase satisfeito por aquilo que havia feito, fecha-se
sobre si próprio, alheio aos eventos da vida europeia, totalmente absorvido
pelos problemas muito grandes que as imensas colônias lhe apresentavam a
cada dia. Até mesmo a atividade legislativa silencia. O direito havia assumido
uma forma que parecia definitiva, fixado nas Ordenações dentro de esquemas e
conceitos que remontavam em grande parte à metade do século XV.
Somente um século e meio após a promulgação do código filipino, isto
é, por volta do século XVIII, o país parece acordar de tal torpor por obra do
ministro Marquês de Pombal, que deu início à reforma de toda a estrutura do
Estado, no espírito das doutrinas iluministas e do direito natural, que àquele
tempo triunfava na Europa. Retoma a sua atividade legislativa a lei de 18 de
agosto de 1769, dita a lei da boa razão, pela qual se estabelecia que se poderia
recorrer em via subsidiária ao direito romano unicamente quando as suas
regras fossem conformes à boa razão, compreendendo-se por estas palavras os
princípios eternos do direito natural, o espírito das leis nacionais e as neces-
sidades e circunstâncias do tempo; limitava-se o valor do direito canônico
aos tribunais eclesiásticos; retirava-se qualquer autoridade às glosas e às opi-
niões dos doutores; e reconhecia-se eficácia de fonte subsidiária, nas matérias
comerciais e marítimas, às leis das nações civilizadas da Europa.
De tal modo, o direito nacional vinha a adquirir uma autoridade e uma
uniformidade até então desconhecidas; e é com essa compreensão que o maior
jurista daquele tempo, Pascoal José de Melo, escreveu as suas Institutiones
iuris civilis lusitani, impulsionando a doutrina e a jurisprudência a se emanci-
parem da antiga dependência do direito comum.
Não muitos anos mais tarde, os exércitos franceses espraiavam-se
sobre a Europa e nem mesmo o longínquo Portugal escapava à sorte comum;
o rei era forçado a abandonar Lisboa e a procurar refúgio na sua colônia
além-mar, onde estabeleceria sua Corte na cidade do Rio de Janeiro. A inva-
são francesa trouxe a todas as nações um sopro de vida nova e de novas
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§3 Resenha
7 As ações de “jactância”. – As figuras das ações de “jactância”, elaboradas
pela doutrina medieval italiana mediante uma adaptação e ampliação daquilo
de preceituavam dois textos das fontes romanas (l. si contendat, Dig. 46, 1, 28 e l.
diffamari, Cod. 7, 14, 5) para servir às necessidades de declaração (accertamento),17
foram logo acolhidas na prática espanhola e portuguesa; mas tiveram sorte
diversa. Na Espanha, a terceira Partida, tít. II, 46, acenou expressamente, como
exceção ao princípio de que ninguém possa ser forçado a agir, a essa particu-
lar provocatio ad agendum, com eventual condenação ao perpétuo silêncio; e os
autores recuperaram e desenvolveram amplamente o tema, em estreita conexão
com a doutrina italiana do período.18 Em Portugal, as coisas andaram de maneira
diversa: referem os autores da época ter sido o foro de tal modo inundado por
esses juízos provocatórios, que o legislador viu-se forçado a intervir para res-
tringir o seu uso. Proveu, nesse sentido, uma lei de 30 de agosto de 1564, cujo
conteúdo foi, posteriormente, incorporado às Ord. Fil. (Liv. III, tít. 11, §4), através
da qual se dispunha que se alguém difamava uma pessoa sobre o seu estado
“como se dissesse que era seu captivo, liberto, infame, spurio, incestuoso, Frade,
Clerigo ou casado”, o difamado poderia fazer citar o responsável no seu local de
domicílio, assinalando-lhe um termo para propor a demanda e provar o vício
de estado. Acrescentava-se, de outra parte, que em nenhuma outra causa civil se
pudesse constranger outrem a agir ou impor perpétuo silêncio, abreviando, des-
se modo, o tempo que o direito concede para agir em juízo.19 Nos casos admiti-
dos, a ação é sumária: o difamado pode propô-la perante o juiz de seu domicílio,
requerendo sua admissão para provar os fatos que considera difamatórios, e se
consegue fazê-lo, o juiz ordena a citação do suposto difamador, incitando-o a
propor a ação dentro de um prazo de 8 dias; se não a propunha no prazo fixado,
vinha pronunciada a sentença que lhe impunha perpétuo silêncio.20
17
Cf. Chiovenda, Istituzioni di diritto processuale civile, 2ª ed., n. 60 et seq.
18
Ocuparam-se particularmente do assunto Rodericus Suarez e Covarrubias. Cf. WEISSMAN, Feststellungsklage, Bonn,
1879, p. 86 e 97, e mais amplamente PIERTO CASTRO, Acción declarativa, Madrid 1932, p. 32 et seq., 36 et seq.
19
Os juristas portugueses estavam plenamente conscientes da origem medieval e não romana dessas ações: MELO
FREIRE, Institutiones iuris civilis lusitani, 5ª ed., Coimbra, 1860, Liv. Iv, tít. VII, §16, de fato escreveu: “Quae quidam
Ordinatio originem suam debet non tam iuri Romano, hoc est lege Diffamari 5 Cod. de ingen. manumiss., cum ad
solam status ingenuitatem pertineat, quam Glossatoribus, qui eam ad omnes diffamationes produxerunt”.
20
PEGAS, Commentaria ad Ordinationes, Ulissipone 1759, liv. III, tít. 11, par. 4.
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E antes de o reo vir com contrariedade, nem responder ao libello cousa alguma,
virá à segunda audiencia com todas as exceições dilatorias que tiver, juntamente,
sendo certo que desque huma vez for pronunciado sobre a tal exceição, ou
exceições dilatorias, com que vier, não poderá jamais vir com outras, nem lhe
será para isso dado lugar.
29
CHIOVENDA, Relaz. sul Progetto di riforma, §6, in Saggi, v. II, Roma, 1931, p. 53; CARNELUTTI, Intorno al progetto
preliminare del cod. proc. civ., Milano, 1937, p. 113; ZANZUCHI, Osservazioni intorno al prog. prel. del cod. proc. civ.,
Milano, 1937, p. 31.
30
GRATIA, De iudiciario ordine, cit. 9., §2; Durante, liv. II, part. I, de excep. §1, n. 5 et seq.
31
MENDES DE CASTRO, Practica lusitana, Lisboa, 1767, liv. III, cap. 3; PEREIRA E SOUSA, Primeiras linhas sobre o
processo civil, 3ª ed., Lisboa, 1825, cap. 12.
32
N.T.: O CPC/73 apresenta um regime um pouco diverso daquele exposto pelo autor, relativo ao CPC/39. O código
em vigor determina que devam ser apresentadas em separado, no prazo de resposta, as exceções de incompetência
relativa, de impedimento ou de suspeição do juízo (art. 304). Recebida a exceção, o processo ficará suspenso até
o seu julgamento (art. 306). Trata-se, a toda evidência, de exceções processuais dilatórias, diferentes das objeções
de coisa julgada e litispendência, que devem ser suscitadas em preliminar de contestação (art. 301, V e VI).
33
Supremo Tribunal Federal, 21 de outubro de 1941, Revista Forense, v. 91, 124.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 43-64, jul./set. 2010
Posto que a sentença não aproveite nem empece mais que às pessoas entre que
é dada, poderá, porem, dela apelar não somente cada um dos litigantes, que
dela se sentir agravado, mas ainda qualquer outro, a que o feito possa tocar e
lhe da sentença vir algum prejuízo.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 43-64, jul./set. 2010
39
N.T.: O CPC/73, a exemplo do código anterior, também legitima o terceiro prejudicado a recorrer da decisão
(art. 499), o qual deve fazê-lo, no entanto, sempre no mesmo prazo concedido às partes, eliminando-se a hipótese
de dilação do prazo do §1º do art. 815 do CPC/39.
40
Revista Forense, Rio de janeiro, v. 25, 163 et seq.
41
ANDRADE, Odilón de. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense 1946, v. 9, p. 112; FAGUNDES,
Seabra. Recursos ordinários em matéria civil. Rio de Janeiro, 1946, p. 50 et seq.
42
Revista de Direito, v. 17, 481.
43
N.T.: Por expressa disposição legal (art. 499, §1º), “cumpre ao terceiro demonstrar o nexo de interdependência entre
o seu interesse de intervir e a relação jurídica submetida à apreciação judicial”. A doutrina tende, assim, a encarar
como legítimo o terceiro passível de ser apanhado por algum efeito reflexo da sentença, fazendo-o nas mesmas
bases da admissão do assistente simples (art. 50). A jurisprudência recente, no entanto, tende a alargar as hipóteses
de legitimação. Nesse sentido, é paradigmática a situação em que se entendeu possível o recurso de terceiro, credor,
que vê o bem penhorado para satisfazer o seu crédito alienado em outro processo, homologado pelo juiz (STJ. REsp
nº 415.692/SP. Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. em 06.12.2002. DJ, p. 190, 10 mar. 2003).
44
N.T.: O atual direito processual civil brasileiro concede ao terceiro prejudicado três alternativas de confrontar
sentença que venha em seu prejuízo: são elas a apelação de terceiro (art. 499, §1º), a ação de embargos de terceiro
(art. 1.046) ou a ação rescisória (art. 487); as duas últimas faculdades “ficam-lhe asseguradas desde que permaneça
na condição de terceiro a quem não se tenha dado ciência da demanda” (SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso
de processo civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. v. 1).
45
Para um amplo exame das opiniões dos doutores, v. Delitalia, Il divieto della reformatio in peius, Milano, 1927, p. 173
et seq.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 43-64, jul./set. 2010
O conceito foi acolhido integralmente nas Ord. Fil., Liv. III, tít. 72 (“que
quando os juízes da alçada acharem que o apelado é agravado, o desagra-
vem, posto que não apele”) e explicado pelos autores em estreita adesão ao
ensinamento dos doutores italianos.46 No mesmo sentido posiciona-se a dou-
trina brasileira do século XIX.47 No entanto, a jurisprudência mais recente,
influenciada provavelmente pela doutrina europeia, atenuou os rigores do
princípio, inadmitindo a reformatio in peius e nesse sentido coloca-se hoje a
doutrina dominante.48
Mas nesse caso, qualquer condescendência com o exemplo europeu é
enganosa e perigosa. O caráter “comum” da apelação andou em desuso no
direito francês;49 escrevia, de fato, Rebuffe:50 “Licet de iure appellatus possit se
iuvare appellatione appellantis, quia appellatio communis est, l. Ampliorem
C. Tamem de stilo curiarum Franciae est opus utramque partem appellare,
alioquin appellatio nil proderit ei qui non appellavit, nec sententia quoad
eum reformatibur et ita fuit conclusum saepius in curia Burdegalense, ut
refert Boer. in suis decis. q. 73 saepe, n. 7”. Em troca, o Code de procédure
civile introduziu a figura da apelação incidental, que o apelado pode propor
mesmo após o decurso do prazo para a apelação principal. Evitava-se, assim,
que, em caso de sucumbência parcial, apelasse a parte que estivesse disposta
a aceitar a sentença, com a condição de que não apelasse o adversário.
No entanto, essa nova solução dada pelo direito francês ao difícil pro-
blema não teve qualquer repercussão no direito brasileiro. De fato, o código
vigente não resolve expressamente a questão e, enquanto ignora a figura
da apelação incidental, limita-se a estabelecer que “a apelação devolverá à
superior instância o conhecimento integral das questões suscitadas e discuti-
das na ação” (art. 824). Mas enquanto falta a apelação incidental, não se pode
negar o caráter comum do recurso (vai entendido no âmbito dos capítulos
da sentença confrontados pela impugnação) sem romper de maneira grave
o equilíbrio do juízo de segunda instância, tornando iniquamente gravosa
a posição do apelado. Tais razões, vindas à tona há não muitos anos, foram
acolhidas em alguns julgados recentíssimos.51
12 A querela nullitatis. – O remédio da apelação, surgido nos procedi-
mentos extra-ordinem, servia para reformar as sentenças injustas, não para
invalidar as sentenças nulas, que eram ineficazes de pleno direito. A nulidade
podia ser alegada como defesa contra a actio iudicati ou como réplica à excep-
tio rei iudicate ou em qualquer outra ocasião; e era a consequência não ape-
nas da inobservância das regras e garantias fundamentais do processo, como
46
MATHAUES HOMEM LEITAM, De gravaminibus, in “De iure lusitano”, tomus primus, Coimbra, 1736, qu. 3,
n. 45 e qu. 5, n. 57.
47
BATISTA, Paula. Compendio de teoria e prática do processo civil e comercial, Recife, 1855, §231, nota 2; RAMALHO.
Praxe brasileira, Rio de Janeiro, 1870, §340.
48
GUSMÃO, Sadi. Recursos cíveis e criminais. Rio de Janeiro, 1936, p. 43; GUIMARÃES, Machado. Do efeito devolutivo
da apelação. Revista Direito, v. I, p. 184 et seq., 1940; ANDRADE, Odilón de. Op. cit., p. 169; FAGUNDES, Seabra op.
cit., p. 175.
49
É característica a obstinação com que os autores alemães pretendem encontrar no antigo direito germânico a
origem do novo princípio, sem, contudo, consegui-lo.
50
De appellationibus, in Commentaria in Costitutiones seu Ordinationes regias, t. III, Lugduni, 1613, praef. n. 25 e 26.
51
N.T.: O CPC/73, por sua vez, resolveu a questão através do seu art. 500, que instituiu o chamado “recurso adesivo”,
fazendo ressentir a influência da solução francesa referida no texto.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 43-64, jul./set. 2010
52
Cf. CALAMANDREI, Cassazione civile, Torino, 1920, I, p. 46.
53
Como se os referidos motivos práticos não bastassem por si só para explicar tal solução, a doutrina alemã pretendeu
enxergar aí a consequência de um suposto princípio da validade formal da sentença, que teria sido próprio do
direito primitivo germânico. Trata-se de uma simples hipótese, carente de demonstração.
54
SCACCIA, De appell., qu. 11, n. 114; ALTIMARO BLASIO, Tractatus de nullitatibus sententiarum, Venezia, 1701, rub.
I, qu. 3, n. 25.
55
B. ALTIMARO, op. cit., rub. I, qu. 3, n. 2; rub. VIII, qu. 3, n. 3.
56
REBUFFE, op. cit., art. 11, gl. II, n. 19.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 43-64, jul./set. 2010
da sentença, não podem ser alegadas de forma alguma (Ord. Fil., Liv. III,
tít. 63). Existem, no entanto, algumas nulidades mais graves, por conta das
quais a sentença “é per direito nenhuma” e “nunca em tempo algum passa
em cousa julgada”, de modo que não é necessário contra ela apelar (Liv. III, tít.
75); e a nulidade pode ser alegada mesmo quando se pretenda a sua execução
(tít. 81, §1). As causas de nulidade são aquelas habituais: ausência de citação
do réu, contrariedade a outra sentença transitada em julgado, suborno ou
incompetência do juiz, falsidade da prova e, por fim, contrariedade a “direito
expresso”, que se dá quando o juiz julgue em modo “diretamente contrário
ao que dispõem as Ordenações”, não, ao contrário, quando seja contrária ao
“direito da parte” (tít. 75, com clara referência ao que afirmava Macro na pas-
sagem recordada mais acima, da qual se reproduzem também os exemplos).
A doutrina, em pleno acordo também aqui com aquela do direito comum,
considera a expressão “direito expresso” como equivalente a “direito em
tese”, em contraposição a “direito em hipótese”, distinção que corresponde,
na realidade, àquela entre questão jurídica abstrata e concreta.57
O rigor das expressões usadas para qualificar a nulidade poderia fazer
crer que se tratasse de nulidade absoluta. Era, no entanto, lição recorrente que
a pronúncia de nulidade deveria ser requerida pela via da habitual querela
nullitatis, sujeita apenas a prescrição trienal.58 De tal forma, compreende-se
que Pereira e Souza pudesse afirmar que “a sentença tem os efeitos da coisa
julgada, enquanto não anulada”,59 ao que fazia eco, no Brasil, Pimenta Bueno,
escrevendo: “as sentenças eivadas de nulidade absoluta não perecem ipso
iure em todo o rigor da expressão, ao contrário produzem efeitos até que
sejam declaradas nulas”.60 Realmente, a lei portuguesa de 19 de dezembro
de 1843, art. 317, fala de “ação de nulidade e de rescisão da sentença”; e no
Brasil, o art. 681 do Reg. 737 dispõe que “a sentença póde ser anullada por
meio da acção rescisoria”. A evolução pode-se considerar completada quando
o Código Civil brasileiro reduziu o prazo de prescrição de tal ação para cinco
anos61 (art. 178, §10, VIII)62 e o vigente Código de Processo Civil excluiu a
possibilidade de a nulidade ser alegada nos embargos à execução. A antiga
nulidade absoluta tornou-se, portanto, uma simples anulabilidade, que pode
ser proposta por meio de um remédio excepcional, limitado no tempo e des-
tinado a impugnar a coisa julgada.
Dessa forma, a querela nullitatis sobrevive com o nome de ação rescisó-
ria, sendo proponível no prazo de cinco anos perante as câmaras civis reu-
nidas do tribunal de apelação, nos seguintes casos: sentença prolatada por
juiz subornado ou incompetente em razão da matéria, ou contrária à coisa
julgada ou contrária à literal disposição de lei ou quando fundada em prova
57
Para a análoga doutrina italiana, cf. CALAMANDREI, op. cit., p. 160 et seq.
58
SILVA, Commentaria ad Ordinationes, Olissipone, 1731, liv. III, tít. 75, n. 2 et seq.; Melo Freire, op. cit., liv. IV, tít. 23,
§20.
59
PEREIRA E SOUSA. Primeiras linhas, cit., I, nota 578.
60
BUENO, Pimenta. Apontamentos sobre as formalidades do processo civil. Rio de Janeiro, 1850, p. 93.
61
N.T.: O CC/02 não se ocupou da matéria, deixando a sua disciplina a cargo da legislação processual.
62
N.T.: A versão utilizada nessa tradução apresenta erro de datilografia, vez que lá é apontado o art. 78, §10, VIII,
do CC de 1916, e não o art. 178, §10, VIII, como correto. A tradução corrigiu a falha no próprio corpo do texto.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 43-64, jul./set. 2010
cuja falsidade se tenha apurado no juízo criminal (art. 798 Cód. proc. civil).63
O caso mais frequente e também mais delicado é o referente à contrariedade
a literal disposição de lei: tendo presente a outra norma que estabelece que “a
injustiça da sentença ou a má apreciação da prova não autorizam o exercício
da ação rescisória” (art. 800),64 vê-se reproduzida, substancialmente, a clássica
distinção entre “direito em tese” e “em hipótese”, entre “direito expresso” e
direito “da parte”. Escreve, de fato, Pontes de Miranda: “A sentença é nula
quando ofende o direito objetivo e não quando lesa o direito dos litigantes.
Uma coisa é a sentença injusta, lesiva ao direito subjetivo invocado pela parte,
outra coisa é a sentença nula, que ofende o direito objetivo. O direito subjetivo
é protegido somente pelos meios de impugnação. Das sentenças que não
ofendem a lei, mas apenas os direitos dos litigantes, poder-se-á dizer que são
iníquas, não que ofendam o direito constituído”.65
Trata-se, todavia, de uma ação de anulação sui generis, que carrega con-
sigo muito de um verdadeiro e próprio meio de impugnação, uma vez que, se
a sentença vem a ser anulada, o mesmo tribunal decidirá a causa novamente
(e a doutrina qualifica este fato como uma cumulação do iudicium rescindens
com o rescissorium).66
A jurisprudência não admite ação rescisória por violação da lei pro-
cessual, mas apenas por violação do direito material67 e decide em concor-
dância que tal ação é admissível quando a sentença ofenda diretamente um
texto expresso de lei, não, ao contrário, quando ofenda uma regra que seja o
resultado de deduções mais ou menos fundadas,68 nem quando tenha apenas
mal interpretado uma norma de lei.69 70 Pode-se, assim, dizer que ao tribunal
chamado a conhecer de uma ação rescisória é deixada uma grande latitude
de apreciação para decidir se o error in iudicando tem, no caso concreto, as
características da violação do ius in thesi. O Supremo Tribunal Federal, em
uma decisão muitas vezes citada (25 de novembro de 1941, Archivo judiciario,
vol. 61, 294), afirmou que o intérprete e o juiz não se devem preocupar tanto
63
N.T.: O CPC/73 reduziu o prazo para a propositura da ação rescisória para 2 anos (art. 495), nas hipóteses elencadas
no art. 485. Subsiste ainda, ao lado da ação rescisória, a querela nullitatis insanabilis nas hipóteses de ausência
de citação do réu ou por ausência de citação válida de um dos litisconsortes necessários (STJ. 3ª Turma. REsp
nº 12.586/SP. Rel. Min. Waldemar Zveiter, j. em 08.10.1991. DJ, p. 15684, 04 nov. 1991), passível de ser levantada
em sede de impugnação de cumprimento de sentença (art. 475-L, I). (MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO,
Daniel. Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 491-492).
64
N.T.: Tal norma não veio reproduzida no CPC/73.
65
Ação rescisória, Rio de Janeiro, p. 166; conf. Odilón de Andrade, op. cit., p. 80, 87.
66
MIRANDA, Pontes de. Ação rescisória, cit., p. 138.
67
Trib. Just. S. Paulo, 23 de agosto de 1946, Revista Forense, v. 111, 157; Trib. Just. Minas Gerais, 29 de janeiro de 1945,
Revista Forense, v. 101, 329.
68
Supremo Tribunal Federal, 22 de novembro de 1944, Revista Forense v. 105, 67; Trib. Just. S. Paulo, 26 de março de
1943, Revista Forense, v. 95, 592.
69
Trib. Just. S. Paulo, 14 de julho de 1944, Revista Forense, v. 100, 78; Trib Just. Distrito Federal, 18 de fevereiro de
1943, Revista Forense, v. 97, 400.
70
N.T.: Como bem anotado, a palavra lei vai “empregada no art. 485, V, CPC em sentido amplíssimo — corresponde
a ‘direito’ e autoriza a rescisão de coisa julgada em que há violação de princípio, regra ou postulado”, razão pela
qual não persevera o entendimento de impossibilidade de rescisão de julgado que tenha violado norma processual,
ainda mais tendo em conta a estatura constitucional do processo. Outrossim, na atualidade, “a jurisprudência
exige que a decisão tenha outorgado sentido ‘aberrante’ à legislação para autorizar a ação rescisória (STJ, 6ª turma,
REsp 9.086/SP, rel. Min. Adhemar Maciel, j. em 29.04.1996, DJ 05.08.1996, p. 26.424)” (MARINONI, Luiz Guilherme;
MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 493). Ademais,
“não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei quando a decisão rescindenda se tiver baseado em
texto legal de interpretação controvertida nos tribunais” (Súmula nº 343 do STF).
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Sistema de enjuizamento
escalonado (ou procedimento
judicial funcionalmente escalonado).
Repensando o modelo de processo
Glauco Gumerato Ramos
Mestrando em direito processual na Universidad Nacional de Rosario (UNR – Argentina).
Professor de direito processual civil (graduação, extensão e pós-graduação lato sensu). Membro
dos Institutos Brasileiro (IBDP), Ibero-Americano (IIDP) e Panamericano (IPDP) de Direito
Processual. Advogado em Jundiaí-SP. <http://www.glaucogumerato.com.br>.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 65-68, jul./set. 2010
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Pedido de reconsideração
Jonathan Iovane de Lemos
Advogado. Especialista em Direito Processual Civil e Mestrando em Direito pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
1 Notas introdutórias
A precípua função do processo, em virtude do monopólio da jurisdi-
ção, está na proteção dos interesses individuais e da coletividade, mediante a
aplicação do ordenamento jurídico, sendo, indefectivelmente, em seu desen-
lace, um instrumento de realização da justiça.
Sob esse foco, cumpre ao legislador determinar o processo de maneira
a torná-lo rápido, efetivo e justo, entregando à parte o bem da vida almejado,
devendo ser estruturado em tantos atos quantos sejam necessários para
alcançar a sua finalidade.
Todavia, o processo, por mais que busque esforços na tentativa de
alcançar uma prestação jurisdicional célere, que resolva, de maneira irrepreen-
sível, os conflitos intersubjetivos existentes, ainda acarretará, de maneira
paradoxal, um inconformismo à(s) parte(s) litigante(s). A solução estatal, à
primeira vista, nunca desfrutará de validade perante o polo sucumbente, já
que a irresignação é característica indissociável da condição humana.
A permissão para impugnação das decisões judiciais assegura o aper-
feiçoamento do ato judicial, possibilitando a reparação de qualquer erro exis-
tente, se existente, no conteúdo do provimento, apaziguando-se verdadeira-
mente os litigantes.
Entretanto, a ânsia das partes em recorrer não se dá por satisfeita com os meios
legais existentes, fato que “desbravou outros caminhos para desafiar os pronuncia-
mentos do órgão judiciário”, originando os chamados sucedâneos recursais.
RIBEIRO, Darci Guimarães. La Pretension Procesal y La Tutela Judicial Efectiva: Hacia una Teoría Procesal Del Derecho.
Barcelona: Bosch, 2004. p. 88-89.
BUZAID, Alfredo. Exposições de Motivos do CPC. n. 5.
ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 31.
ASSIS, op. cit., p. 835.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 69-89, jul./set. 2010
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 69-89, jul./set. 2010
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 69-89, jul./set. 2010
15
ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 863.
16
NERY JÚNIOR, Nelson. Teoria geral dos recursos. 6. ed. atual. ampl. e reform. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2004. p. 89-90.
17
“Título LXV – Das sentenças interlocutórias, e como podem ser revogadas. [...] 2. E a sentença interlocutória póde
ser revogada até dez dias, contados do dia, em que foi dada, se a parte contra quem foi dada, allegar por onde
haja de ser revogada, e o Juiz, que a deu, achar per Direito que a deve revogar. E se o Juiz do seu proprio motu,
podel-o-ha fazer a todo tempo se achar per Direito, que não foi justamente dada; com tanto que a revogue antes
da sentença deffinitiva, e ella seja tal interloentoria, que segundo Direito, possa ser revogada, como acima temos
dito” (Disponível em: <http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/l3p666.htm>).
18
Conforme Araken de Assis (Manual dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 864, nota 172; Introdução
aos sucedâneos recursais. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 310, p. 24, ago. 2003), o dispositivo 528 da Lei nº 65-RS,
de 16.01.1908, tinha a seguinte redação: “Art. 528. A sentença interlocutória simples pode ser revogada antes de
executada, ou a requerimento da parte ou ex officio, por justa causa superveniente, até a sentença definitiva”.
19
NERY JÚNIOR, Nelson. Teoria geral dos recursos. 6. ed. atual. ampl. e reform. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2004. p. 91 e 96.
20
De acordo com Araken de Assis (Manual dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 838), “o verdadeiro
sucedâneo recursal é o mecanismo que, alheio ao quadro oficial de recurso, impugna o provimento judicial sem
criar processo autônomo”.
21
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. O pedido de reconsideração e suas hipóteses de cabimento. Revista Dialética
de Direito Processual, São Paulo, v. 4, p. 100-101, jul. 2003.
22
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4. ed. rev. atual. ampl. de acordo com a nova Lei
do Agravo (Lei n.º 11.187/2005). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 480.
23
Artigos 285-A, 296 e 523, §2º do CPC.
24
Art. 527. Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator: [...] Parágrafo único.
A decisão liminar, proferida nos casos dos incisos II e III do caput deste artigo, somente é passível de reforma no
momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar. (Redação dada pela Lei nº 11.187/2005).
25
NERY JÚNIOR, Nelson. Teoria geral dos recursos. 6. ed. atual. ampl. e reform. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2004. p. 91.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 69-89, jul./set. 2010
2.3.1 Preclusão
A preclusão, instituto que tem origem no direito romano-canônico,30
foi inspirada na poena praeclusi,31 possuindo, em sua gênese, caráter punitivo
dentro do processo. Em seu progresso, ganhou largo desenvolvimento
pela doutrina italiana,32 recebendo contornos através do célebre estudo de
Chiovenda, que definiu a preclusão como a perda, a extinção ou a consuma-
ção de uma faculdade processual da parte, em função de se ter atingido os
limites assinalados em lei ou ao seu exercício.33
Tal conceito, hodiernamente, recebeu críticas e novos limites, retirando-se
a ideia de faculdade, vislumbrando em seu lugar a noção de ônus — pois a parte
possui a “oportunidade de agir, prevendo a lei, no caso de omissão, determina-
da conseqüência jurídica”.34 Ou seja, nos dizeres de Teresa Arruda Alvim, ônus
é “uma atividade que, se concretizada ou realizada, terá (provavelmente) seus
resultados revertidos em benefício daquele que a desempenhou”.35
Ultrapassada a sua conceituação, nota-se que a preclusão foi criada
para fornecer os meios de evitar discussões infinitas no bojo processual,
estipulando, a cada parte, os momentos e prazos para as suas respectivas
manifestações. É, portanto, um instituto que visa a fazer o processo “andar
para frente”,36 impedindo “eternos retornos no curso do procedimento”,37
fator que ressalta “o caráter público, objetivo e rigoroso do princípio da
26
PINTO, Teresa Arruda Alvim. Agravo de instrumento. 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. p. 222, também
em WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4. ed. rev. atual. ampl. de acordo com a nova
Lei do Agravo (Lei n.º 11.187/2005). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 481.
27
GIANNICO, Maurício. A preclusão no direito processual civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 184.
28
Art. 471. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide, salvo: I – se, tratando-se
de relação jurídica continuativa, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito; caso em que poderá a parte
pedir a revisão do que foi estatuído na sentença; II – nos demais casos prescritos em lei.
29
Art. 473. É defeso à parte discutir, no curso do processo, as questões já decididas, a cujo respeito se operou a preclusão.
30
GIANNICO, Maurício. A preclusão no direito processual civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 36.
31
MITIDIERO, Daniel Francisco. Comentários ao Código de Processo Civil brasileiro. São Paulo: Memória Jurídica, 2005.
t. II, p. 133. Arts. 154 a 269.
32
DE STAFANO, Giusepe. L’oggetto del processo in un libro recent di Walter J. Habscheid. Revista Trimestrale di
Diritto Processuale Civile, anno 11, p. 327-338, 1957. p. 337. Sobre o assunto, interessantes as palavras do autor: “[...]
il concetto di preclusione non ha avuto, fuori d’Italia, l’ampiezza di impostazione e di sviluppo che a noi, per
merito del Chiovenda e di altri insigni studiosi, è familiare.”
33
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processo civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1969. v. 3, p. 155-156.
34
GREGO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. 12. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 12.
35
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4. ed. rev. atual. ampl. de acordo com a nova Lei
do Agravo (Lei n.º 11.187/2005). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 474.
36
DALL’AGNOL, Antônio. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. v. 2,
p. 329. Do processo de conhecimento: arts. 102 a 242.
37
PESSOA, Flávia Moreira Guimarães. Pedido de reconsideração e preclusão pro judicato no processo civil. Revista
IOB de Direito Civil e Processual Civil, ano 7, n. 42, p. 103-109, jul./ago. 2006. p. 104.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 69-89, jul./set. 2010
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47
Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: [...] §3º O juiz conhecerá de ofício, em qualquer tempo e grau
de jurisdição, enquanto não proferida a sentença de mérito, da matéria constante dos ns. IV, V e VI; todavia, o réu que
a não alegar, na primeira oportunidade em que lhe caiba falar nos autos, responderá pelas custas de retardamento.
48
Art. 301. Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar: [...] §4º Com exceção do compromisso arbitral,
o juiz conhecerá de ofício da matéria enumerada neste artigo.
49
ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 863; e Introdução aos sucedâneos
recursais. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 310, p. 24, ago. 2003.
50
MIRANDA, Francisco Calvalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. rev. aument. atual.
Legislativa de Sérgio Bermudes. Rio de Janeiro: Forense, 1997. t. V, p. 146. Arts. 444 a 475.
51
MIRANDA, op. cit., p. 146.
52
CINTRA, Antonio Carlos de Araújo. Comentários ao Código de Processo Civil. 2. ed. rev. atual. inclusive de acordo
com o novo Código Civil. Forense: Rio de Janeiro, 2003. v. 4, p. 316. Arts. 332 a 475. Aduz o autor: “questões
relativas à lide são sempre questões de mérito e o juiz só as decide em sentença, de modo que a nova decisão
de questões já decididas, ora proibida, seria posterior à prolação da sentença.” De forma uníssona: MIRANDA,
Francisco Calvalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. rev. aument. atual. Legislativa de
Sérgio Bermudes. Rio de Janeiro: Forense, 1997. t. V, p. 146 et seq. Arts. 444 a 475; LACERDA, Galeno. Despacho
saneador. Porto Alegre: La Salle, 1953. p. 165-166.
53
PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. v. 6, p. 206.
Do Processo de Conhecimento: arts. 444 a 495.
54
Para Buzaid (Do agravo de petição na sentença do Código de Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1956. p. 96-103),
“o elemento que delimita em concreto o mérito da causa não é, portanto, o conflito existente entre as partes fora
do processo e sim, o pedido feito em relação àquele conflito. Parece-nos, todavia, que o conceito de lide se presta
de modo fecundo a caracterizar o mérito da causa”.
55
BUZAID, Alfredo. Exposições de Motivos do CPC. n. 06.
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2.3.1.2 Síntese
A doutrina, em todos os livros consultados, procurou estabelecer que
apenas as questões passíveis de manifestação ex officio pelo magistrado pode-
riam ser reconsideradas, apontando as principais hipóteses68 em que se admi-
tiria o pedido de reconsideração, salientando ser inútil “tentar encartá-las em
categorias que se pretendam exaurientes”.69 Entretanto, como destacado no
item superior, essa não parece ser a melhor resposta sobre o assunto.
66
Pleno do STF. AgRg no AI 268-DF. Rel. Alfredo Buzaid, 28.04.1982. ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 864, nota 178; e Introdução aos sucedâneos recursais. Revista Jurídica, Porto
Alegre, v. 310, p. 24, ago. 2003. nota 115.
67
PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. v. 6. Do
Processo de Conhecimento: arts. 444 a 495. v. 6, p. 218.
68
São elas: (a) condições de ação e pressupostos processuais; (b) matérias suscitadas em preliminar de contestação —
art. 301, §4º; (c) antecipação de tutela e medidas liminares; (d) determinação do reexame necessário; (e) requisitos
de admissibilidade dos recursos e seus efeitos; (f) direito probatório; (g) nulidades absolutas e relativas; (h) validade
e adequação das medidas executivas.
69
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4. ed. rev. atual. ampl. de acordo com a nova Lei
do Agravo (Lei n.º 11.187/2005). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 485.
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2.5 Prazo
Do breve estudo realizado sobre o tema da preclusão, tem-se que a
parte poderá pedir a reconsideração de uma decisão singular até o momento
anterior em que ela se torne preclusa,80 o que, normalmente, se dará após o
transcurso do prazo do recurso cabível contra a decisão a ser reconsiderada.
Indeferida a realização de perícia técnica, e não interposto agravo des-
sa decisão, no décimo segundo dia após a data de disponibilização da decisão
no Diário de Justiça (de acordo com o art. 4º, §§3º e 4º da Lei nº 11.419/0681 c/c
79
O disposto nos arts. 543-B, §3º (Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica
controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal,
observado o disposto neste artigo. [...] §3º Julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados serão apreciados
pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se) e 543-
C, §7º, II (Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso
especial será processado nos termos deste artigo. [...] §7º Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos
especiais sobrestados na origem: [...] II – serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido
divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça.), ambos do CPC, não autorizam a interposição do pedido de
reconsideração contra decisões colegiadas, já que a reanálise da matéria ocorre, nos casos, por imposição legal e não
mediante pedido da parte.
80
Em sentido contrário: OLIANI, José Alexandre Manzano. O contraditório nos recursos e no pedido de reconsideração.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 167. “(o pedido de reconsideração) não se sujeita a prazo e, em virtude de
não estarem disciplinados no Código de Processo Civil, não há requisitos de forma a serem observados”.
81
Art. 4º Os tribunais poderão criar Diário da Justiça eletrônico, disponibilizado em sítio da rede mundial de
computadores, para publicação de atos judiciais e administrativos próprios e dos órgãos a eles subordinados, bem
como comunicações em geral. [...] §3º Considera-se como data da publicação o primeiro dia útil seguinte ao da
disponibilização da informação no Diário da Justiça eletrônico. §4º Os prazos processuais terão início no primeiro
dia útil que seguir ao considerado como data da publicação.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 69-89, jul./set. 2010
arts. 184, §2º,82 e 52283 do CPC), estará preclusa a questão para parte, a qual
não poderá mais requerer do juízo a sua reconsideração.
Esse é o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:
Com efeito, enquanto não preclusa a questão para a parte, esta resta
possibilitada da apresentação do pedido de reconsideração.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 69-89, jul./set. 2010
da decisão agravada pelo juiz. Nota-se que a questão não estaria preclusa, já
que pendente de julgamento o agravo de instrumento. Tecnicamente, pela
evolução do estudo até o momento, não se mostra incabível a interposição do
pedido. Todavia, no caso concreto, dever-se-á analisar as razões do pleito, já
que, à primeira vista, estaria beirando as penas da litigância de má-fé.
Nesse ponto, deve-se atentar pela diferenciação existente entre o pedido
de reconsideração e a possibilidade de retratação do magistrado, de acordo
com a lei recursal pertinente, pois aquele é oriundo da praxe forense, enquanto
esse funda-se na lei.86
Ainda, outro caso instigante seria, pegando-se o mesmo exemplo referido
acima, quando o magistrado a quo, pelo acúmulo de serviço, demora para anali-
sar o pedido de reconsideração interposto, sobrevindo o julgamento do agravo
distribuído no Tribunal. Nesse caso, não há mais possibilidade de o juiz reconsi-
derar sua decisão, face ao disposto no art. 51287 do CPC, pois operada “a substi-
tuição do ato impugnado pelo ‘julgamento’ emanado do órgão ad quem”.88
Por fim, ressalta-se ser plenamente cabível a penalização da parte por
utilizar de maneira impertinente o pedido de reconsideração, devendo os
magistrados empregarem o instituto da litigância de má-fé (art. 17, IV, V e
VI89 do CPC) para conter eventuais abusos cometidos pelas partes.90 Essa é a
orientação do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO DE DECISÃO
COLEGIADA QUE NÃO CONHECEU ANTERIOR PEDIDO DE RECONSIDE-
RAÇÃO CONTRA DECISÃO COLEGIADA. Pedido manifestamente incabível. Não
conhecimento do pedido. Aplicação de multa (CPC, ARTS. 17, VI E 18). (RCDESP
na RCDESP no AgRg no Ag 795.560/SP, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki,
Primeira Turma, julgado em 21.02.2008, DJe, 12 mar. 2008, grifo nosso)
2.7 Legitimidade
Diferente do aduzido por Maria Berenice Dias,92 o pedido de recon-
sideração pode ser interposto por qualquer uma das partes, desde que haja
86
GIANNICO, Maurício. A preclusão no direito processual civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 187. Também,
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4. ed. rev. atual. ampl. de acordo com a nova Lei
do Agravo (Lei n.º 11.187/2005). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 534.
87
Art. 512. O julgamento proferido pelo tribunal substituirá a sentença ou a decisão recorrida no que tiver sido objeto
de recurso.
88
ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 252.
89
Art. 17. Reputa-se litigante de má-fé aquele que: [...] IV – opuser resistência injustificada ao andamento do
processo; V – proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; VI – provocar incidentes
manifestamente infundados.
90
MARINONI, Tereza Cristina. Sobre o pedido de reconsideração: sucedâneo de recurso?. Revista de Processo, São
Paulo, n. 62, p. 299-306, abr./jun. 1991. p. 300.
91
Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente
a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os
honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.
92
DIAS, Maria Berenice. Reconsideração versus revisão: uma distinção que se impõe. Disponível em: <http://www.
berenicedias.com.br>. Acesso em: 23 out. 2008.
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2.8 Competência
Outro ponto que merece atenção é a competência para a decisão sobre
o pedido de reconsideração. Segundo Nelson Nery Júnior,95 o juízo compe-
tente para apreciação do pedido de reconsideração é o “juiz que proferiu a
decisão que se pretende ver reconsiderada”. Frisa-se que se trata do juízo e
não, especificamente, do mesmo juiz que prolatou a decisão.
No caso de um processo no qual tenha sido indeferido o pleito liminar
pelo juiz plantonista, o pedido de reconsideração será apreciado pelo magis-
trado titular da vara à qual a ação foi encaminhada pela distribuição, e não
para o juiz plantonista que indeferiu a medida acautelatória.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 69-89, jul./set. 2010
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 69-89, jul./set. 2010
2.10 Efeitos
Em face da ausência de previsão legal, a doutrina é pacífica em relação
à inexistência de efeito suspensivo no pedido de reconsideração,103 não sus-
pendendo nem interrompendo os prazos de interposição dos recursos cabí-
veis contra a decisão a ser reconsiderada. Conforme aduz Araken de Assis,104
“sua pendência não impedirá a preclusão do direito de recorrer, nem a deci-
são a seu respeito restituirá o prazo já vencido”.
Tal posicionamento é realizado, justamente, para evitar que a fluência
do prazo recursal não reste ao alvedrio da parte, o que daria ensejo à possi-
bilidade de recuperação do lapso a qualquer tempo,105 prorrogando-se, quiçá
infinitamente, o início do dies a quo para interposição do recurso.
O posicionamento do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo
Tribunal Federal não diverge do que dito:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO. INTERRUPÇÃO DO PRAZO RECURSAL.
INOCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (REsp nº 984.724/MG,
Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 20.05.2008,
DJe, 02 jun. 2008)
103
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 11. ed. rev. atual. inclusive de acordo com o
novo Código Civil. Forense: Rio de Janeiro, 2003. v. 5. Arts. 476 a 565. p. 492-493. No mesmo sentido: VASCONCELOS,
Antônio Vital Damos de. O pedido de reconsideração e a preclusividade das decisões judiciais. Revista da AJURIS, Porto
Alegre, ano 14, n. 40, p. 155-165, jul. 1987. p. 163; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. O pedido de reconsideração
e suas hipóteses de cabimento. Revista Dialética de Direito Processual, São Paulo, v. 4, p. 100-112, jul. 2003. p. 112;
GIANNICO, Maurício. A preclusão no direito processual civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 185; WAMBIER,
Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4. ed. rev. atual. ampl. de acordo com a nova Lei do Agravo (Lei
n. 11.187/2005). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 481; NERY JÚNIOR, Nelson. Teoria geral dos recursos. 6. ed.
atual. ampl. e reform. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 92; OLIANI, José Alexandre Manzano. O contraditório
nos recursos e no pedido de reconsideração. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 165.
104
ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 865 e Introdução aos sucedâneos
recursais. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 310, p. 7-37, ago. 2003. p. 25.
105
DIAS, Maria Berenice. Reconsideração versus revisão: uma distinção que se impõe. Disponível em: <http://www.
berenicedias.com.br>. Acesso em: 23 out. 2008.
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3 Considerações finais
Tentou-se, com o presente estudo, realizar uma série de questionamen-
tos até então esquecidos pela doutrina, de um fenômeno corriqueiro nos cor-
redores forenses.
O pedido de reconsideração é um sucedâneo recursal, que prescinde
de forma e requisitos para sua análise, mostrando-se muito útil como meio de
resolução, normalmente célere, para problemas ocorridos no processo.
Buscou-se demonstrar que, ao contrário do que amplamente divulgado,
inexiste preclusão de questões para o juiz — salvo alguns casos —, estando,
contudo, limitada a sua atuação pelos artigos 2º e 128 do CPC, não podendo
rediscutir questões que sejam de matéria disponível das partes, sob a qual
tenha se operado a preclusão — de acordo com o artigo 473.
O pedido de reconsideração não suspende e nem interrompe a inter-
posição do meio legal de impugnação da decisão, devendo ser utilizado com
cautela pelas partes, podendo atacar tanto decisões interlocutórias quanto
despachos, e alguns tipos de sentença (arts. 285-A e 296 do CPC), restando
vedado contra decisões colegiadas.
Fora posicionamento duvidoso do Superior Tribunal de Justiça, o
pedido de reconsideração não admite fungibilidade, não se encontrando óbi-
ces para sua interposição concomitante com recursos. Sua utilização temerá-
ria deve ser coibida, rigorosamente, pelo Poder Judiciário.
Ao fim, nota-se que o pedido de reconsideração, em um Poder Judiciário
cada vez mais assoberbado pelo acúmulo de demandas, é um instrumento
útil para resolução de qualquer problema existente ao bom andamento pro-
cessual, já que, de maneira célere e eficaz, possibilita a correção de erros que
somente após longo e burocrático trâmite recursal seriam modificados.
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Giuridiche. Napoli: Morano, 1965. v. 1, p. 200-226.
Art. 50. Quando interpostos contra sentença, os embargos de declaração suspenderão o prazo para recurso.
112
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R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 91-111, jul./set. 2010
Introdução
Discutir a problemática da eficácia das normas protetoras do meio
ambiente a partir de seu reconhecimento como componente constitucionalmente
garantido da dignidade humana e, por correlato, dos Direitos Fundamentais
é, de certa forma, lançar luz sobre um dos temas mais emergentes do mundo
globalizado contemporâneo. Emergente pois, ao não encontrar limites, a velo-
cidade do contexto industrial pós-moderno, potencializada por uma cultura
individualista e consumista, toma de assalto os recursos naturais e os dizima
em período desproporcionalmente menor do que o tempo levado para que a
natureza os recomponha. Com isso, não poupa nem mesmo aquele que é con-
siderado um bem essencial à existência saudável: o meio ambiente.
Em terrae brasilis o cenário não é menos desanimador: 4º maior polui-
dor do mundo se contabilizadas as emissões de gases provocadas pelas quei-
madas, o país vê suas florestas, consideradas as maiores reservas de biodi-
versidade do mundo, serem devastadas em volume calculado em “campos
de futebol”. Enquanto isso, padece do mesmo mal dos países em desenvol-
vimento que crescem sem planejamento, com a explosão de megalópoles
industrializadas, carentes de saneamento básico e contumazes devastadoras
de rios e da atmosfera, em que a poluição do ar representa, segundo estudos,
cerca de 2 anos a menos na expectativa de vida das pessoas.
Daí que emerge o problema que orienta esta reflexão: em que medida
a hermenêutica constitucional pode dar conta do problema da ineficácia das
normas protetoras do meio ambiente, em um cenário marcado de um lado
pela complexidade das relações econômico-sociais, que tem por consequência
a crua assertiva de que facticidade desmente a validade das normas, para utilizar
expressão de Habermas em triste referência a uma “brasilização” do texto
constitucional, e de outro por verdadeira prodigalidade de produção norma-
tiva, a produzir inclusive normas flagrantemente inconstitucionais?
O primeiro passo, decerto, passa pelo reconhecimento de que o tra-
tamento normativo dado à matéria não pode passar incólume de críticas.
Inserido numa dogmática jurídica viciada por aquilo que Luis Alberto Warat
denominou senso comum teórico dos juristas, a eficácia das normas proteto-
ras do meio ambiente, torna-se objetivo de difícil consecução. Diagnosticar o
problema e superar essas dificuldades, num país que é pródigo em produção
Importante reflexão sobre o assunto, que não será aprofundado neste artigo, pode ser encontrada na vasta produção
do sociólogo francês Gilles Lipovetsky, da Universidade de Grenoblè, da qual se extrai textos como A era do vazio:
ensaios sobre o individualismo (publicado pela Editora Manole em 2006) e O luxo eterno (publicado pela Editora
Companhia das Letras em 2004). A obra de Eduardo C. B. Bittar, em especial sua tese de livre-docência, O direito
na pós-modernidade (2. ed. rev. atual. e ampl., publicada pela editora Forense Universitária em 2009) também é
reveladora deste momento histórico, que se convencionou chamar “pós-modernidade”, em especial nas suas
interrelações com o Direito.
A notícia, de 2002, é antiga: <http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG50233-6010,00-POLUICAO+DO+
AR+PODE+TIRAR+ATE+DOIS+ANOS+DE+VIDA+DO+PAULISTANO.html>. O sucessivo incremento da quantidade
de poluentes lançados pelo país na atmosfera pode significar ainda menos anos de vida.
A citação do autor: “(...) o problema de Hegel retorna de outra maneira, quando consideramos aquelas sociedades
em que o teor imaculado do texto constitucional não é mais do que a fachada simbólica de uma ordem jurídica
imposta de forma altamente seletiva. Nesses países, a realidade social desmente a validade das normas, para cuja
implementação faltam as condições efetivas e a vontade política. Uma semelhante tendência à ‘brasilização’ poderia
até mesmo se apossar das democracias estabelecidas do Ocidente” (HABERMAS, Jürgen. Verdade e justificação. São
Paulo: Loyola, 2002. p. 222).
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NALINI, José Renato. O juiz e a Constituição Ecológica. In. NALINI, José Renato et al. (Org.). Juízes doutrinadores:
doutrina da câmara ambiental do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Campinas: Millennium, 2008. p. 45.
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 522.
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E prossegue:
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STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 49.
12
Sobre isso, tem-se a crítica de Willis Santiago Guerra Filho: Verifica-se, contudo, que a processualística moderna,
13
desenvolvida em moldes privatísticos, não apresenta um aparato conceitual e institucional capaz de dar conta da tarefa
de garantir o respeito a tais direitos [do meio ambiente], não mais individuais, mas sim “comunitários”. O próprio
conceito de “lide”, correspondente ao objeto do processo, do Direito positivo e dogmática processuais brasileiros, nos
termos clássicos em que o define CARNELUTTI — “conflito intersubjetivo de interesses qualificado por uma pretensão
resistida ou insatisfeita” —, não se aplica aos conflitos sociais em torno do meio ambiente e outros bens objetos de
interesses coletivos ou difusos, pois se tratam de conflitos “pluri-subjetivos” e a pretensão de se usufruir tais bens não
pode ser propriamente questionada, pois há uma convergência da necessidade de todos partilharem deles. (...) Observa-
se, assim, que é fundamentalmente na dimensão processual que há um déficit legislativo e doutrinário, responsável pela
escassa efetividade das normas de direito material sobre meio ambiente, que em geral são bastante razoáveis, ficando-se
a espera de que sejam observadas (GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constitucional e direitos fundamentais. 2. ed.
rev. e ampl. São Paulo: Celso Bastos; Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, 2001. p. 117.
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meio ambiente, que surgiu no direito alemão dos anos 70, amadureceu no
encontro da ONU de Estocolmo, de 1972 e se consolidou, no direito brasileiro,
através do art. 225 da Constituição Federal de 1988.19
Está-se diante, portanto, de matéria cuja natureza de direito funda-
mental goza de posição consensual. Pois trata-se de
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conteúdo de busca pela verdade essencial, até então (e, como se verá, ainda
hoje) predominante nas principais reflexões do campo da hermenêutica
jurídica.28 Com Luis Alberto Warat, chega-se ao diagnóstico que a dogmática
jurídica ainda sofre de uma “compulsiva lógica da aparência de sentidos, que
opera como uma espécie de garantia de obtenção, em forma retroativa, de um
significado que já estava na lei desde sua promulgação”.29
Desse cenário é que surgem as (requentadas) construções no campo da
hermenêutica jurídica, em que
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Estas observações dizem respeito a um forte laço que se foi tecendo entre o
juridicismo que sustenta as crenças sobre o Estado de Direito e as formas de um
saber, que em nome da Ciência, postula a objetividade para impedir a formação
de novas identidades coletivas. Um jogo de conexões ambíguas vai gerando um
certo “clima”, um horizonte que faz possível conjunto das interpretações da lei:
disfarçando o caráter político das mesmas estratégias míticas, dissimulam o fato
de que todo processo interpretativo é sempre a manifestação de um poder. O
exercício do poder de produzir os sentidos da lei. No caso, um poder que, por
outro lado, não consegue, na perspectiva juridicista, transgredir a estrutura de
dominação que lhe outorgou tal faculdade.32
uma série de pressupostos sobre a própria concepção de ciência e seu valor social
que se aceitam como opiniões intocáveis. É o imaginário da linguagem científica
que dá a seus enunciados atribuições impossíveis: estabelecer palavras sem
ambiguidades, eliminar os componentes míticos da verdade, situar o erro como
polifonia e a verdade como univocidade, impor a ilusão da linguagem como versão
objetiva do mundo, eliminar a determinação conotativa da verdade etc.33
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o sentido comum teórico dos juristas como parte da visão de mundo juridicista
poderia ser caracterizado, em uma nova aproximação, como o “superego” da
34
WARAT, op. cit., p. 29.
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Embora não responda ainda ao problema que se colocou para esta aná-
lise, é certo que a problemática da ineficácia da proteção ao meio ambiente
tem sua formação umbilicalmente ligada a esse diagnóstico apresentado —
do que realmente está por trás da dogmática jurídica e sua pretensão de cien-
tificidade. Assim, pouca neutralidade sobra quando se pensa nas leis pro-
duzidas por bancadas ruralistas no parlamento — leis cujo processo de ela-
boração, aliás, passa batido na maior parte das aulas durante os 5 anos de
uma faculdade de Direito. Agora que um indício importante da origem do
problema foi estabelecido, segue-se, adiante, com o papel da hermenêutica
jurídica em sua superação.
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40
MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria geral do processo. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 405.
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Como esse direito fundamental incide sobre o Estado e, portanto, sobre o legislador
e o juiz, é evidente que a omissão do legislador não justifica a omissão do juiz.
Diante disso, para que a jurisdição possa exercer a sua missão — que é tutelar os
direitos — e para que o cidadão [e a sociedade, anotamos] realmente possa ter
garantido o seu direito fundamental à tutela jurisdicional, não há outra alternativa
a não ser admitir ao juiz a supressão da omissão inconstitucional.42
À guisa de conclusão
Este trabalho pretendeu esmiuçar brevemente o problema da ineficá-
cia da proteção constitucional ao meio ambiente saudável, proteção essa que
remonta à noção de que se está diante de verdadeiro direito fundamental e
atributo inato à dignidade da pessoa humana.
Dessa maneira, não há que se falar simplesmente em resposta legisla-
tiva a um problema que é epistemológico e filosófico, na medida em que está
enraizado na própria crise da dogmática jurídica. Eis uma constatação de
profunda repercussão na forma como se trata, de maneira geral, o problema
da ineficácia das leis brasileiras: produzindo-se mais leis!
Assim, é essencial que se reconheça o importante papel da hermenêutica
jurídica na superação deste problema, mas não de qualquer hermenêutica
jurídica: uma hermenêutica que não tenha a Constituição como uma estra-
nha, mas como fundamento de destino. Nesse sentido, é preciso, em especial
no plano do direito ambiental, superar o paradigma das velhas lides indi-
viduais, na medida em que se tratam de problemas cuja natureza se revela
transindividual, e reconhecer, também, a crise da dogmática jurídica e seus
efeitos sobre a eficácia das normas protetoras do meio ambiente saudável,
como se apresentou nesta reflexão.
Tal impõe ao Poder Judiciário um papel de protagonista, ante a tra-
dicional (e superada) noção de separação de poderes e de que o juiz é
mero espectador de pedra dos conflitos que são levados à sua apreciação.
Esse protagonismo deve se traduzir na consciência de que a Constituição
ainda é documento hábil a delinear os caminhos e os projetos pretendidos
pela sociedade e encerra, em seu conteúdo normativo, as diretrizes a serem
41
CANOTILHO, J. J. Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito constitucional ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 80.
42
MARINONI, op. cit., passim.
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Considerações iniciais
Ao estudar a ciência do direito processual e seu objeto, Aroldo Plínio
Gonçalves aponta que na racionalidade moderna o centro de atuação do
direito é a norma, e os ordenamentos mais racionais têm como centro a
superação do subjetivismo a fim de se chegar à justiça, havendo uma evo-
lução da teoria do direito, que antes centralizava-se na figura do juiz, hoje
se apresentando mais racional. Nesse sentido a importância de a ciência do
direito processual propiciar melhor aplicabilidade da norma jurídica, por
meio dos órgãos jurisdicionais, não mais vista subjetivamente. Daí a necessi-
dade da criação da ciência do direito processual capaz de dar novo dinamismo
ao processo (fase de criação dessa ciência).
Este artigo jurídico busca, exatamente, estudar as técnicas norma-
tivas das decisões jurisdicionais, no sentido de que não haja essa liberalidade
toda no momento do magistrado decidir, tendo como ambiente o Estado
Democrático de Direito, partindo não somente da ideia da aplicação da sub-
sunção, mas também dos princípios gerais de direito, e tentando solucionar
a seguinte questão: existe uma única decisão jurisdicional justa ou várias
decisões jurisdicionais podem ser consideradas como igualmente justas?
Certamente, no ambiente da estrutura das decisões jurisdicionais, cuja técnica
se confunde com o próprio procedimento, a busca de uma decisão menos
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 1992. p. 45-47.
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subjetiva (mais concreta, com elementos reais e concretos) alicerçada nos escopos
do processo não tem recepção na estrutura do Estado Democrático de Direito.
Também será demonstrado que a grande dificuldade do processo civil
moderno é adequar o tipo de procedimento. Não tendo que haver tantos proce-
dimentos diferentes. Aqui é que se verifica a importância do manejo da correta
técnica processual. Difícil desvincular a técnica de procedimento, isso porque ao
se adotar a teoria estruturalista do processo (Fazzalari), que processo é procedi-
mento em contraditório, a estrutura do Código deveria ser: Livro I – dos procedi-
mentos cognitivos (ordinário, sumário e especiais), portanto a redução dos pro-
cedimentos especiais, inserindo-os no processo de conhecimento; Livro II – dos
procedimentos executivos; Livro III – dos procedimentos cautelares. Não se deve
trabalhar tanto com procedimento especial, mas com um procedimento geral.
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Quatro anos depois, retomo meus estudos e vejo que o trabalho peca
exatamente por isso, por colocar o magistrado como ator principal da resolutivi-
dade dos conflitos materiais, o que torna o direito cada vez mais autocrático.
O direito processual, especialmente o civil, fez-me abrir novos horizontes
no sentido de identificar que a decisão judicial, que em última análise acaba sendo
a lei entre as partes (em uma visão bem chiovendiana), deve ser construída pelas
partes, em simétrica paridade e em condições de igualdade, figurando o magis-
trado apenas como um ator revelador do direito e não tecnicamente como o
construtor desse direito, diminuindo-se, via de consequência, o ativismo judicial
e homenageando o princípio do contraditório e da ampla defesa, na medida em
que as partes é que serão as principais afetadas pelo provimento jurisdicional, de
certa forma corroborado pela existência de lacunas no ordenamento jurídico, as
quais aparecem “quando nem a lei nem o Direito consuetudinário nos dão uma
resposta imediata a uma questão jurídica”, propiciando, que ao preencher esta
lacuna, o magistrado, muitas vezes, utiliza-se da metafísica e de valores indivi-
duais, subjetivos e baseados em um estrutura não levada a debate.
Essa correlação com o direito material é importante porque, no direito
processual, igualmente, não pode o magistrado ser o senhor dos desejos das
partes e, apesar de estarmos vivendo uma época em que a Judicialização do
direito é que está predominando, devem ser construídos mecanismos menos
subjetivos e mais concretos no sentido de evitar-se a decisão tomada autori-
tariamente, sem a participação das partes no debate processual.
Assim, é que se apresenta pertinente outra questão suscitada por Picardi
ao trazer pensamento de Popper, segundo o qual não é importante saber quem
decide, quem deve comandar, mas sim como se controla quem comanda. No caso do
direito, se nossa época é apropriada para a jurisdição, a grande preocupação é
saber como controlar os atos do juiz, já que ele encarna em si a figura da jurisdi-
ção. Quando da criação do CNJ ocorreu este questionamento: quem vai reformar
as decisões tomadas por este Conselho? Quem vai controlar suas decisões?
Não se pode confundir, contudo, o elastecimento dos poderes do juiz
com a garantia da independência que este deve possuir, na medida em que
“l’indipendenza dei giudici è garantia quam máxime dal punto di vista político”.
Esse controle dos atos jurisdicionais é um dos temas do direito proces-
sual mais estudados na atualidade, passando necessariamente pela técnica
a ser utilizada pelo magistrado, tudo em um ambiente denominado Estado
Democrático de Direito.
ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 7. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1996. p. 279.
REDENTI, Enrico. Diritto processuale civile. 4a ed. Milano: Giuffré, 1995. p. 43.
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não quer dizer que ele possa atribuir à norma conteúdos conforme à sua prefe-
rência subjetiva e arbitrária; pelo contrário, ele deve se esforçar para exprimir
as exigências e os valores da sociedade de seu tempo. O fim último da sua
atividade è a justiça, e, com ela e por meio dela, a paz social.18
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 113-127, jul./set. 2010
19
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Campinas: Bookseller, 2000. p. 67, v. 1.
20
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Campinas: Bookseller, 2000. p. 67, v. 1.
21
GRINOVER, Ada Pellegrini. O magistério de Enrico Tullio Liebman no Brasil. In: Novas tendências do direito processual.
Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990. p. 441.
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38
PERELMAN, Chaïm. Ética e direito. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 303.
39
CÔRTES, Osmar Mendes Paixão. Súmula vinculante e segurança jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 13.
40
CÔRTES, Osmar Mendes Paixão. Súmula vinculante e segurança jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 13.
41
LORENZETTI, Ricardo Luis. Teoria da decisão judicial: fundamentos de direito. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2009. p. 161.
42
DINAMARCO, Cândido R. Fundamentos do processo civil moderno. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986. p. 100.
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pluralidade dos princípios constitucionais visa criar uma democracia mais pro-
funda, mais inclusiva e mais dinâmica, permitindo um desenvolvimento e uma
43
GOYARD-FABRE, Simone. Os fundamentos da ordem jurídica. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 112.
44
GARCEZ NETO, Martinho. Direito econômico e o futuro do Código Civil. Temas atuais de Direito Civil. Rio de
Janeiro: Renovar. p. 330.
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A parte deste aspecto, a “sistematização era dada pela hierarquia legal, pouca
importância se atribuía aos princípios”,46 e que somente serviriam para suprir
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com preterição de defesa plena e dos juízos de direito para que se exercite o
contraditório como direito fundamental de argumentação jurídica, desfigura
o pensar discursivo de uma sociedade que se pretenda democrática e condena
ao horror alguns poucos decisores que ainda reservam sua fidelidade ao saber
científico-jurídico.50
Considerações conclusivas
O Estado Democrático de Direito não mais pode admitir que o magis-
trado decida tudo isoladamente, usando de elementos subjetivos. O adequado
manejo das técnicas normativas desenvolvidas no espaço procedimental dialó-
gico entre as partes mitiga a concepção de que a decisão judicial é ato somente
do magistrado, mas sim objeto de construção das partes, em constante inter-
locução com o próprio julgador, pugnando-se com a exclusão dos conhecidos
escopos do processo, como se o processo fosse dependente da jurisdição.
O Estado Democrático de Direito exige, pois, que na construção dos
procedimentos legislativos, deve-se seguir o modelo constitucional do pro-
cesso, ficando inclusive posteriormente sujeita a legislação à adequação, por
meio da interpretação, ao próprio texto constitucional, posto que muitas vezes
esse controle é feito de forma superficial e sem o devido rigor técnico-jurídico
perante as comissões de feitura da norma, na medida em que pode haver
mais de uma decisão jurisdicional, tida como justa, mas que somente devem
ser obedecidas ou respeitadas se tiverem sido testificadas pelo devido
49
OLIVEIRA, Rafael Tomaz de. Decisão judicial e o conceito de princípio: a hermenêutica e a (in)determinação do direito.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 27-28.
50
LEAL, Rosemiro Pereira. A judiciarização do processo nas últimas reformas do CPC brasileiro. In: BRÊTAS, Ronaldo
Carvalho Dias; NEPOMUCENO, Luciana Diniz (Coord.). Processo civil reformado. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.
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51
BRÊTAS, Ronaldo Carvalho Dias. Exame técnico e sistemático do Código de Processo Civil reformado. In: BRÊTAS,
Ronaldo Carvalho Dias; NEPOMUCENO, Luciana Diniz (Coord.). Processo civil reformado. 2. ed. Belo Horizonte:
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1 Introdução
Após as reformas introduzidas em nosso Código de Processo Civil, o legisla-
dor ordinário, ancorado nas normas que regem os direitos e garantias constitucio-
nais, mais especificamente à luz dos princípios constitucionais da inafastabilidade da
jurisdição e da razoável duração do processo judicial dispostos nos incisos XXXV e
LVXXIII do art. 5º da Constituição Federal, realizou diversas modificações no sistema
da execução civil, em especial, na modalidade por quantia certa contra devedor sol-
vente, a qual tem se revelado o calcanhar de Aquiles do sistema processual brasileiro,
e que, ao longo dos anos, se tornou protagonista de uma enorme crise.
GUERRA, Marcelo Lima. Os direitos fundamentais do credor na execução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 83.
Nesse sentido, Paulo Henrique dos Santos Lucon, ao tratar da crise da execução que se tornou não só um problema
nacional como também mundial, deixou assentando que: “A efetividade do processo de execução é um problema
mundial. O ambiente sociológico alterou-se. Nos dias de hoje, ser devedor não é mais um grave defeito e não pagar as
próprias dívidas deixou de ser um sinal de vergonha. A facilidade na obtenção de crédito e a intensificação dos negócios
jurídicos criaram condições excelentes para os devedores. É senso comum a todos que hodiernamente é bem mais
confortável ser devedor do que ser credor [...]. Os tempos mudaram. A ordem do juiz já não é suficiente para permitir
a efetiva apreensão dos bens. Além disso, o juiz deixou de ser uma autoridade intocável, que encarna uma verdade
superior que ninguém discute; suas decisões resultaram, em grande parte, ineficazes. Vive-se verdadeiramente uma
crise de poder. E a jurisdição, como poder de decidir imperativamente e impor decisões, não é exceção” (LUCON, Paulo
Henrique dos Santos. Eficácia das decisões e execução provisória. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 424-425).
Como bem aduzido por Leonardo Greco e, incessantemente, repetido por outros autores, “[...] ser devedor neste
país não é mais motivo de vergonha e não pagar os débitos não é mais um sinal de desonra” (GRECO, Leonardo.
O processo de execução. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. v. 1, p. 05).
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No intuito de minimizar ou, quiçá, fazer cessar essa crise em que a execução
se enveredou, o legislador ordinário iniciou seu trabalho com a elaboração das
Leis nºs 11.232/05 e 11.382/06, que alteraram, respectivamente, a execução por
quantia certa fundada em título judicial e a fundada em título extrajudicial,
principalmente no que tange aos meios de defesa que possui o executado, os
quais consistiam em um dos principais alvos de críticas pela doutrina em razão
de acarretar verdadeiro emperramento injustificado da execução, inovações
essas que, resumidamente, buscaremos analisar ao longo desse trabalho.
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Sobre o assunto recomendamos ao leitor a leitura de texto específico: BORGES, Rodrigo Lanzi de Moraes;
BERTONCINI, Luís Cesar. O sincretismo processual como técnica para a concretização dos direitos fundamentais.
Revista Nacional de Direito e Jurisprudência, São José do Rio Preto, v. 90, p. 29-46, 2007.
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14
MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Breves comentários
à nova sistemática processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. v. 3, p. 161.
15
Entendendo ser bastante a comprovação do fumus boni iuris e do periculum in mora previstos no art. 798 do CPC
(poder geral de cautela) para a concessão do efeito suspensivo à impugnação se manifestou: BUENO, Cassio
Scarpinella. Variações sobre a multa do caput do art. 475-J do CPC na redação da Lei nº 11.232/05. In: WAMBIER,
Teresa Arruda Alvim. Aspectos polêmicos da nova execução de títulos judiciais. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2006. p. 143.
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à nova sistemática processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. v. 3, p. 161.
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Arruda Alvim. Aspectos polêmicos da nova execução de títulos judiciais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 447.
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18
Como bem observou Humberto Theodoro Júnior: “Opor os embargos não é o mesmo que falar nos autos, nem
tampouco é igual a contestar a ação. A reforma da Lei nº 11.382/06 explicitou, portanto, o que já estava assente nos
tribunais: aos embargos do executado não se aplica o disposto no art. 191 desta lei (i.e., do CPC)” (THEODORO
JÚNIOR, Humberto. A reforma da execução do título extrajudicial: Lei nº 11.382/06, de 06 de dezembro de 2006. Rio
de Janeiro: Forense, 2006. p. 138).
19
Nessa esteira, concluíram Luiz Rodrigues Wambier, Teresa Arruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina,
nos seguintes moldes: “a) o prazo para a apresentação de embargos é comum contando-se da juntada do último
mandado de citação devidamente cumprido, nos casos em que os cônjuges são originariamente executados, incidindo
o §1º, in fine, do art. 738; b) o prazo para a apresentação de embargos é autônomo, contando-se da juntada de cada
um dos mandados de citação, nos casos em que apenas um dos cônjuges é citado, originariamente, como executado,
e o outro somente passa a integrar o pólo passivo da execução em razão da penhora do imóvel, nos termos do
Art. 655, §2º acima comentado” (MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Teresa Arruda
Alvim. Breves comentários à nova sistemática processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. v. 3, p. 198).
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29
MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Breves comentários
à nova sistemática processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. v. 3, p. 193.
30
MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Breves comentários
à nova sistemática processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. v. 3, p. 152 e 194.
31
BRAGHITTONI, R. Ives. O princípio do contraditório no processo: doutrina e prática. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2002. p. 154-155.
32
CARMONA, Carlos Alberto. Código de Processo Civil interpretado. São Paulo: Atlas, 2004. p. 17.
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3 Conclusões
Após inúmeras reformas introduzidas em nosso ordenamento processual
civil, o legislador pátrio deu prosseguimento ao seu trabalho na busca da otimi-
zação, agora, da execução civil, ancorando-se nos direitos fundamentais previs-
tos na Constituição Federal, em especial, no princípio da razoável duração do
processo judicial disposto expressamente no inciso LXXVIII, do seu art. 5º.
Foi com a Lei nº 11.232/05 que o legislador rompeu com aquela ideia de
que os atos executivos deveriam ser realizados apenas em processo autônomo
de execução, ou seja, que o referido processo deveria ser puro, passando,
então, a existir uma dicotomia procedimental em relação às execuções funda-
das em título judicial e em título extrajudicial.
Desta forma, diante da dicotomia procedimental implantada pelo legis-
lador, principalmente com a implantação da técnica do sincretismo (reunião
dos processos de conhecimento e execução na mesma relação jurídica) na exe-
cução fundada em título judicial pela Lei nº 11.232/05, temos que acabaram
por ocasionar diferentes procedimentos no que tange, também, aos meios de
defesa em que o executado passa a ter à sua disposição.
As modificações realizadas pelas Leis nºs 11.232/05 e 11.382/06 na exe-
cução civil por quantia certa contra devedor solvente fundada em título judi-
cial e extrajudicial, em especial, as inerentes a sua forma de controle (meca-
nismos de defesa), que são a impugnação ao requerimento de cumprimento
de sentença, por execução, e os embargos do executado, tiveram a finalidade
principal de tornar a execução civil mais célere, nos moldes do princípio
constitucional da razoável duração do processo.
Diante da análise exposta em todo o trabalho, é possível vislumbrar o
empenho do legislador em tentar deixar o processo de execução mais célere,
eliminando alguns pontos de estrangulamento existentes, principalmente, no
que tange aos meios de defesa que possuía o executado, os quais eram calça-
dos em técnicas arcaicas e morosas que beneficiavam, exclusivamente, o exe-
cutado que tinha ao seu lado um verdadeiro mecanismo capaz de emperrar
indefinidamente o andamento da execução, haja vista que os embargos, antes
das aludidas reformas, tinham o condão de suspender automaticamente a
execução, postergando ou até mesmo impedindo que fosse entregue ao exe-
quente a tutela jurisdicional almejada.
Dentre outras técnicas implantadas, releva destacar a cessação ope legis
do efeito suspensivo dos embargos interpostos nas ações de execução fun-
dada em título extrajudicial e também na impugnação ao requerimento de
cumprimento de sentença, por execução, passando esse efeito, agora, ser ope
iudicis, ou seja, somente poderá ser concedido se restarem preenchidos os
requisitos — de difícil ocorrência na prática, diga-se de passagem —, descri-
tos nos arts. 475-M e 739-A, §1º do CPC, e serão concedidos caso a caso pelo
magistrado que irá suspender apenas no que tange à parte controvertida,
superando, assim, as críticas que sempre recaíram ao procedimento.
Vislumbra-se, ainda, dentre as reformas, a possibilidade do magistrado
rejeitar liminarmente a impugnação nos casos em que são alegados excesso
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de execução e o executado não declare o valor que entenda correto (art. 475-L,
§2º do CPC), ou nos casos em que forem propostos embargos meramente
protelatórios (art. 739), hipótese essa em que o juiz poderá aplicar multa de
caráter punitivo no percentual não superior a 20% (vinte por cento), nos ter-
mos do que reza o art. 740 do aludido codex.
Não se pode esquecer também da inovação trazida pela Lei nº 11.382/06
que autorizou o executado, nas ações de execução fundadas em título extraju-
dicial, reconhecendo o crédito exequendo — ao invés de interpor os embargos
destituídos de qualquer fundamento fático ou legal —, depositar a quantia
correspondente a 30% (trinta por cento) do montante total e requerer o par-
celamento do débito em até seis parcelas mensais, nos moldes do que reza o
art. 745-A do CPC, tudo isso para facilitar o seu cumprimento, reduzindo, por
consequência, o prazo de tramitação do processo executivo.
Em que pese às inovações legislativas, pode-se constatar, ainda, que
a defesa intraprocessual (exceção/objeção de pré-executividade), oriunda
de criação doutrinária, não fora abolida, muito ao contrário, continua tendo
aplicação prática, principalmente, no que tange às execuções fundadas em
título judicial, onde para apresentar a impugnação ainda se faz necessária a
garantia do juízo através da oferta de bens à penhora.
Enfim, sem ter a pretensão de resumir todas as inovações trazidas pelo
legislador ordinário, temos que as mesmas, principalmente, as ligadas aos
meios de defesa do executado, tiveram o grande escopo de otimizar a execu-
ção extraindo alguns mecanismos retrógrados que somente tinham o condão
de emperrar a sua tramitação, sem, contudo, violar qualquer garantia consti-
tucional do executado, sempre na busca do cumprimento dos ditames consti-
tucionais, em especial do princípio da razoável duração do processo.
Embora tenham sido louváveis as reformas realizadas pelo legislador
ordinário na execução civil por quantia certa contra devedor solvente, em
especial no que tange aos mecanismos de defesa — cerne do que nos pro-
pusemos a tratar —, acredita-se que as mesmas não foram suficientes para
torná-la plenamente eficaz e, consequentemente, estancar a crise em que a
execução se enveredou, até porque, como bem nos explica Barbosa Moreira,
não existe “fórmula mágica” ou um “abracadabra jurídico” capaz de sanar
definitivamente todas as mazelas processuais.33
É necessário também que, ao lado de todas as mudanças legislativas,
sejam realizados maiores investimentos tecnológicos nos órgãos judiciais pelo
Poder Público, na aquisição de computadores, móveis, materiais de trabalho
e outros, bem como seja realizada a contratação de funcionários públicos,
incluindo a de magistrados, através de concursos públicos, para suprir o acrés-
cimo desproporcional de demandas que abarrotam os Fóruns de todo o país.
E, principalmente, sejam realizados investimentos na área social, com a
implantação de um sistema educacional adequado, melhorias na saúde e na
cultura, aumento de ofertas de emprego, onde somente assim poderá acarre-
tar o decréscimo no índice de inadimplência e, por consequência, diminuir o
número de processos judiciais.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. O futuro da justiça: alguns mitos. Revista de Processo, São Paulo, n. 99, p. 145-147, 2000.
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R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 129-151, jul./set. 2010
Referências
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Teresa Arruda Alvim (Coord.). Processo de execução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. v. 2.
34
Como bem aduzido por Paulo Henrique dos Santos Lucon e Leonardo Greco em notas de rodapé nºs 2 e 3 transcritas
acima.
35
Sobre o assunto, remetemos ao leitor para a leitura de obra inovadora e específica sobre o assunto, a saber: BORGES,
Rodrigo Lanzi de Moraes. A restrição de direitos no processo e a efetividade da execução civil. In: GÖTTEMS,
Claudinei J.; SIQUEIRA, Dirceu Pereira (Coord.). Direitos fundamentais: da normatização à efetividade nos 20 anos
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Alvim. Breves comentários à nova sistemática processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais,
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MOREIRA, José Carlos Barbosa. O futuro da justiça: alguns mitos. Revista de Processo, São
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SHIMURA, Sérgio Seiji. A execução da sentença na reforma de 2005. In: WAMBIER, Teresa
Arruda Alvim. Aspectos polêmicos da nova execução de títulos judiciais. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2006.
SHIMURA, Sérgio Seiji. Título executivo. São Paulo: Saraiva, 1997.
SILVA, Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. 3. ed. Porto Alegre: Sergio Antonio
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THEODORO JÚNIOR, Humberto. A reforma da execução do título extrajudicial: Lei nº 11.382/06,
de 06 de dezembro de 2006. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 34. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. v. 2.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo de execução e cumprimento de sentença. 24. ed. Rio
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WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo.
Curso avançado de processo civil. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Sobre a objeção de pré-
executividade. In: SHIMURA, Sérgio Seiji; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.).
Processo de execução e assuntos afins. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
BORGES, Rodrigo Lanzi de Moraes. Os meios de defesa do executado após a nova sis-
temática da execução civil por quantia certa contra devedor solvente. Revista Brasileira
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1 Considerações iniciais
A súmula vinculante, inserida em nossa realidade pela Reforma do
Judiciário implementada pela Emenda Constitucional nº 45/2004, foi recebida
com entusiasmo pela comunidade jurídica como um todo, principalmente
por aqueles que há tempos por ela já proclamavam.
Fruto da falta de uniformidade e da imprevisibilidade nas decisões e
como instrumento de operabilidade do direito, buscando descongestionar o
pesado trato processual, a súmula vinculante logo passou a tema reverencial
no que se refere à celeridade processual e à estabilidade nestas relações.
Contabilizam-se, até o momento, 21 (vinte e uma) súmulas vinculantes
aprovadas pelo Supremo Tribunal Federal, seu órgão editor, tratando das mais
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instrumento de efetivo controle, quanto mais ante uma certa inocuidade, vez que
o próprio STF proferirá a decisão final. A questão do controle também será objeto
de tópico específico, na tentativa de se buscar institutos que realmente venham
servir de instrumento de efetivo controle na edição de súmulas vinculantes.
Apesar da operacionalidade pretendida quando da adoção das súmu-
las vinculantes, bem como de sua celebrada inserção em nosso ordenamento,
esta vem sendo duramente criticada, não lhe faltando ferrenhos opositores.
Se seus defensores visualizam nas súmulas vinculantes um instrumento
apto a efetivar a celeridade, a economia processual e a harmonização do
ordenamento, seus opositores questionam, principalmente, o seu caráter des-
pótico em relação ao livre convencimento motivado do órgão julgador e o
inevitável desequilíbrio no princípio da separação dos poderes.
Habermas critica a ausência de discurso na formação de tais súmulas.
Pontifica que a aparente legalidade do instituto nada apresenta de legítimo
aos jurisdicionados. Despidos de dialética, os destinatários da norma não
participam da produção do direito. A decisão ignoraria a alocução das partes,
tornando-se uma ação estanque e singular do juiz.
E não é só isso. Existem vários outros pontos de atrito entre a positiva-
ção das súmulas vinculantes e o direito posto. A começar pela transgressão
ao princípio constitucional da legalidade, perfazendo, segundo Djanira Maria
Radamés de Sá, a insustentável situação de “subversão do sistema jurídico
nacional pela inversão da ordem de prevalência das fontes do direito”.
Finalmente, citamos o não menos instigante entendimento que aponta
para ofensa ao direito de petição (e reflexamente ao princípio constitucio-
nal da inafastabilidade do Judiciário – artigo 5º, XXXV, da CF/88) pelo modo
como se encontram hoje perfilhadas as súmulas vinculantes. José Anchieta
da Silva alerta sobre os perigos desta sistemática, ao profetizar que chegará o
momento em que sequer haverá processo, tampouco o contraditório, existindo
tão somente uma decisão.
Em linhas gerais, este é o quadro das súmulas vinculantes em nosso
ordenamento hoje. Na sequência, a questão será enfrentada de forma mais
específica, no que concerne à edição destas súmulas em matéria de Direito
Administrativo e a possível afronta a primados constitucionais elementares.
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5 Conclusão
A crise enfrentada pelo Poder Judiciário acabou por promover a tão
propalada Reforma do Judiciário concretizada via Emenda Constitucional
nº 45/04. Nesta toada, trouxe como instrumento de inovação a súmula
vinculante, com a missão de garantir celeridade e segurança jurídica.
13
ARTEIRO, Lemos Rodrigo. O trâmite procedimental da súmula vinculante e seu controle de constitucionalidade
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R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 153-162, jul./set. 2010
Do contrato social. Trad. Márcio Pugliesi e Norberto de Paula Lima. 7. ed. São Paulo: Hemus. p. 112.
14
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 153-162, jul./set. 2010
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Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 153-162, jul./set. 2010.
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1 Introdução
Em que pese o fato de a grande maioria dos processos se voltar à solução de
lides que envolvem questões concernentes ao pagamento de quantias em dinheiro,
como ações de indenização, cobrança e execução para pagamento de quantia fun-
dada em títulos executivos judiciais e extrajudiciais, é certo que o ordenamento
consagra outros direitos que não se submetem à quantificação em pecúnia, o que
impõe a necessidade de um procedimento distinto para estes casos.
A este micro sistema de prestação de tutela jurisdicional de direitos não
voltados à obtenção de dinheiro dá-se o nome de tutela jurisdicional especí-
fica das obrigações, notadamente aquelas cujo objeto abarcam prestações de
fazer, não fazer e entrega de coisa. A natureza destas obrigações impõe que
as regras processuais e procedimentais que se voltem a proteger estes direitos
sejam distintas daquelas regras voltadas à tutela de cunho monetário.
Eduardo Talamini, em trabalho específico sobre o tema, aduz que, “do ponto de vista processual, genérica é toda
a forma de tutela que tende a obtenção de dinheiro no âmbito da responsabilidade do devedor — seja mediante
direta consecução do numerário, seja pela transformação de outros bens em pecúnia, através de expropriação.
Específica, é a tutela que tende a consecução de bens jurídicos outros, que não dinheiro. Mais precisamente tutela
específica é a que visa ao exato resultado jurídico que se teria, se não houvesse a necessidade do processo, em todos
aqueles casos em que o resultado final não consista na mera satisfação de uma dívida pecuniária” (Tutela relativa
aos deveres de fazer e de não fazer. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 230).
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DINAMARCO, Candido Rangel. A nova era do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 11.
As expressões clássico e moderno não pretendem rotular, nem muito menos definir com rigor científico aquilo
que vem a ser exatamente o processo civil clássico e o moderno. Tais termos possuem, única e exclusivamente, o
intuito de contrapor diferentes estágios de desenvolvimento da ciência processual.
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela de direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 81.
SILVA, Ovídio Baptista. Curso de direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. v. 3, p. 21 et seq.
Sobre a correlação entre as estruturas do processo civil clássico e a ideologia liberal predominante no séc. XIX, ver
MARINONI, op. cit., p. 35 et seq.
DINAMARCO, Candido Rangel. A nova era do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 11.
O dogma da coisa julgada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 12.
10
DINAMARCO, Candido Rangel. A nova era do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 29.
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Analisando este ponto com mais vagar vamos notar, como afirmam Teresa
Arruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina,19 que “a sentença conde-
natória supõe a idéia de que é possível após a realização de cognição exauriente
e definitiva, a obtenção de grau razoável de certeza acerca do direito que autorize
a realizar a execução” e, mais adiante, completam, “sob esse prisma, a sentença
condenatória sequer poderia ser arrolada dentre os instrumentos de tutela do
direito material, porque não se tutela direito material com a sentença condena-
tória. Daí a necessidade de se ajuizar outra ação (de execução) para se tutelar o
direito reconhecido (ou declarado) pela sentença condenatória como violado”.20
Marinoni também tem concepção semelhante acerca da sentença condenató-
ria e afirma que a doutrina que a definiu estabeleceu uma correlação entre ela e os
meios de execução tipificados em lei, e arremata “afora os casos de adimplemento
espontâneo do direito contido na sentença condenatória a tutela do direito depende-
ria da propositura da ação de execução, oportunizada ao vencedor pela sentença”.21 22
Em outra sede,23 procuramos deixar claro que à classificação tripartite
não se opõe a classificação quinária das sentenças, haja vista que a colocação
das sentenças mandamentais e executivas ao lado das declaratórias, consti-
tutivas e condenatórias fere o princípio lógico de que as classificações devem
observar um só critério para agrupar as diversas espécies classificadas, sendo
certo que em relação ao conteúdo as sentenças são necessariamente declara-
tórias, constitutivas e condenatórias, podendo estas últimas, a depender dos
mecanismos executivos ou coercitivos nelas contidos, ou seja, a depender de
seus efeitos, ser classificadas como executivas ou mandamentais.24
A sentença mandamental, grosso modo, caracteriza-se pelo fato de, além
de conter uma declaração acerca do direito posto em juízo e “condenação” do
réu em proporcionar determinada conduta em benefício do autor, conter um
plus que consiste na ordem dirigida a este réu.25
Já as sentenças executivas admitem, por definição, a realização de
medidas executivas no curso do mesmo processo e, portanto, prescindem do
ajuizamento do processo de execução.
19
O dogma da coisa julgada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 146.
20
Nesse sentido, Giuseppe Chiovenda (Instituições de direito processual civil, n. 43, p. 230 apud WAMBIER, Teresa
Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. O dogma da coisa julgada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 146):
“historicamente, a sentença nasce como preparação a execução, como sentença de condenação. Ou seja: a verificação
do direito surge como um incidente no curso da atuação do direito.”
21
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela de direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 42.
22
Sobre as motivações culturais da sentença condenatória, ver MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória. 3. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 326 et seq.
23
MONNERAT, Fábio Victor da Fonte. Conceito, classificação e eficácia executiva da sentença no novo regime de
execução de títulos executivos judiciais. In: BRUSCHI, Gilberto Gomes; SHIMURA, Sérgio (Coord.). Execução civil
e cumprimento de sentença. São Paulo: Método, 2007. v. 2, p. 139-163.
24
No trabalho acima referido conclui da seguinte forma “Assim considerando o sistema vigente pode-se classificar a
sentença em relação a seu conteúdo em: a) meramente declaratórias; b) constitutiva; ou, c) condenatórias. As duas
primeiras dotadas de capacidade para realizar o direito dentro do próprio ato, ao passo que a última necessita de
atos posteriores a sua prolação para realização de seus efeitos no plano empírico.
Em relação ao mecanismo utilizado pelo magistrado para operar efeitos das decisões condenatórias duas técnicas
podem ser utilizadas: a) a técnica mandamental, onde consta na própria decisão condenatória uma ordem para
que o condenado cumpra o determinado na sentença, ordem esta que caso desobedecida implica em alguma
sanção, já contida na sentença ou fixada ou modificada pelo juiz após o ato decisório, além da possibilidade
de responsabilidade penal pelo crime de desobediência (art. 330 do Código Penal); e b) a técnica executiva,
propriamente dita, onde o magistrado, ao invés de se valer de medidas coercitivas, vale-se de atos executivos de
sub-rogação onde, agentes estatais agem em substituição da vontade do executado” (Op. cit., p. 150).
25
SILVA, Ovídio Baptista. Curso de processo civil. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. v. 3, p. 259.
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pelo Estado por meio do processo e o resultado que seria obtido caso houvesse
ocorrido o cumprimento voluntário da obrigação.31
É de se ressaltar que dentro do conceito de preferência pela tutela específica
encontra-se englobada, a par da obtenção da tutela específica propriamente dita,
a preferência pelo resultado prático equivalente, não obstante conceitualmente
tutela específica e resultado prático equivalente sejam categorias distintas.
Nesse sentido é indispensável trazer à colação a lição de Eduardo Talamini,32
que afirma: “Ambas — ‘tutela específica’ e ‘obtenção do resultado prático equiva-
lente’ — enquadram-se na noção doutrinária de tutela específica, contrapondo-se a
conversão em perdas e danos (...) que é relegada à excepcionalidade (art. 461, §1º).
Em síntese, ‘tutela específica’ e ‘obtenção do resultado prático equivalente’, refe-
ridas pela lei, podem ser identificadas como resultado específico, que se teria pelo
cumprimento espontâneo do dever de fazer e não fazer. Ambas se opõe o ressarci-
mento — pecuniário ou in natura — dos danos advindos do não cumprimento”.
Portanto, o princípio da preferência pela tutela específica determina
que o processo cujo objeto seja o cumprimento de uma obrigação de fazer,
não fazer ou entrega de coisa deve se voltar à busca do implemento na forma
específica, devendo o magistrado, antes de converter a obrigação em perdas
e danos, averiguar a possibilidade de efetivar a tutela específica ou obter o
resultado prático equivalente, salvo se assim requerer o autor ou se mostrar
impossível o cumprimento da obrigação.
A impossibilidade de cumprimento da obrigação específica pode ocor-
rer em virtude de limitações fáticas ou jurídicas.
Limitações fáticas são aquelas em que a própria natureza das coisas
impede sua realização (impossibilidades ontológicas), por exemplo, nos
casos de obrigação para entrega de coisa, a destruição ou desaparecimento
do bem, ou nos casos do dever de abstenção que não se consolidam uma vez
transgredidos (v.g. não publicar determinada notícia difamadora ou caluniosa)
e não pode ser desfeito uma vez realizado.
Já as limitações jurídicas se caracterizam pelo fato de a impossibilidade
ser imposta por normas jurídicas (impossibilidade deontológica), como na
hipótese da recusa de um fazer infungível por parte do obrigado (v.g. escre-
ver um livro ou pintar um quadro) que encontra barreira na intangibilidade
da dignidade da pessoa humana,33 bem como nos casos de entrega de coisa,
a posse da coisa em nome de terceiro de boa-fé.
Sobre o tema Cassio Scarpinella Bueno34 assevera que, “embora o art. 461
se afaste do modelo consagrado da conversão das obrigações em perdas e danos
(...) a intangibilidade da vontade humana não pode ser suplantada pela ordem
jurídica, até porque, em última análise, é garantida pelo art. 1º, III, da Constituição
Federal, quando lista, como um dos fundamentos da República Federativa do
31
No mesmo sentido: BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. São Paulo: Saraiva,
2008. v. 3, p. 407.
32
Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 232.
33
Rigorosamente a intangibilidade da dignidade da pessoa humana impede a utilização de mecanismos executivos
diretos (meios de sub-rogação) sendo possível a tentativa de sua obtenção pela via de mecanismos executivos
indiretos, cujo maior exemplo são as multas coercitivas. Contudo, caso persista o inadimplemento a execução
deverá ser convertida em perdas e danos.
34
Curso sistematizado de processo civil. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 3, p. 242.
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Brasil, a dignidade da pessoa humana. Assim toda vez que um específico fazer
repousar em qualidades que reúne determinada pessoa, é impossível a obtenção
forçada da obrigação, pelo que deverá ser convertida em perdas e danos”.
A efetivação do princípio da preferência pela tutela específica, impõe
a existência de mecanismos processuais eficazes sem os quais as partes e o
Estado-juiz não poderiam fazer com que o processo cumprisse seu papel,
desrespeitando por via de consequência a garantia constitucional de inafas-
tabilidade de controle jurisdicional.
Sobre estes mecanismos serão dedicados os próximos itens deste trabalho.
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Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 49-57.
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da prevista no art. 461, §4º e punir a parte ou terceiro que não obedeça a
determinação judicial nos casos do art. 14 parágrafo único, ambos do CPC.45
Ademais o art. 14, parágrafo único do CPC deixa claro que a imposição
da multa por ato atentatório à dignidade da justiça ali prevista se dará “sem
prejuízo de outras sanções, criminais, civis e processuais cabíveis”.
Nesse sentido Candido Rangel Dinamarco46 afirma que as multas
periódicas não se confundem com aquelas previstas no art. 14 do CPC, dado
que aquelas têm em mira evento futuro e querem promover a efetividade do
direito objeto do processo, ao passo que estas visam o passado, ou seja, o ato
merecedor de repulsa cometido pela parte.
O texto legal não deixa dúvidas que a medida em comento pode ser
concedida de ofício, isto é, independentemente de pedido formulado pela
parte autora (art. 461, §4º, do CPC). Não há na concessão desta medida qual-
quer ofensa ao princípio da congruência.47
Questão não esclarecida pelo Código acerca da multa é seu destina-
tário, ou seja, aquele a quem a multa deve ser revertida, entretanto, em que
pese a ausência de previsão legal é pacífico o entendimento de que o valor
devido a título de multa integra o patrimônio do autor.48
Luiz Guilherme Marinoni49 não diverge da referida opinião também
entendendo que o valor da multa periódica, tal como disciplinada no ordenamento
pátrio, destina-se ao autor da ação, porém sustenta que assim não deveria ser.
Para citado processualista, a multa, ainda que mediatamente tenha por objetivo
tutelar o direito do autor, visa precipuamente garantir a efetividade das decisões,
razão pela qual deveria ser revertida em favor do Estado, tal como o faz o Direito
alemão. Além disso, prossegue o autor, a cumulação de perdas e danos com a
multa não espelharia o direito do autor, dado que é a indenização que, por si só,
deve espelhar o prejuízo sofrido pelo mesmo em função do inadimplemento.
Eduardo Talamini50 ao comentar o tema também chama a atenção para a
aparente incoerência entre o caráter público da multa enquanto instrumento de pre-
servação da autoridade jurisdicional e sua destinação ao particular. Entretanto, o
citado processualista destaca dois pontos que justificam e legitimam tal destinação.
O primeiro deles seria a maior coercibilidade gerada pela perspectiva
de execução, rigorosa e imediata por parte da parte interessada, que difi-
cilmente ocorreria caso o titular da multa fosse o Estado, o que pode ser
depreendido pelo procedimento estabelecido no art. 14, parágrafo único,
do Código, inscrição em dívida ativa para posterior execução. Em segundo
lugar, eventualmente o crédito da multa pode ser utilizado pelo autor em
uma eventual composição com o executado, estimulando a busca pelo resul-
tado específico e a célere solução da demanda, o que restaria vedado caso a
destinação da verba fosse o Estado, o que tornaria o crédito indisponível.
45
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 3, p. 414.
46
Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2004. v. 4, p. 471.
47
Sobre o tema, ver item 6.
48
Por todos: BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 3,
p. 416.
49
Tutela inibitória. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 220.
50
Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 264.
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54
Nesse sentido: Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 258;
RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual da execução civil, p. 229-230; BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado
de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 3, p. 416; e MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil. 2. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 540.
55
Para Marinoni: “Se nosso sistema confere ao autor o produto da multa, é completamente irracional admitir que
o autor possa ser beneficiado quando a própria jurisdição chega a conclusão que ele não possui o direito de estar
presente ao executar (provisoriamente) a sentença ou tutela antecipatória” (Tutela inibitória. 3. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2003. p. 222).
56
No mesmo sentido, citando ampla doutrina: Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer. 2. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2003. p. 259.
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MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela de direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 292.
58
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da ação ver tutelado, por outro lado, os meios que podem ser determinados
pelo magistrado podem ser distintos daqueles originalmente requeridos pelo
autor da demanda, não havendo, portanto, no que tange à eleição da medida
executiva apta a levar a cabo o cumprimento da decisão, necessidade de cor-
relação entre o determinado pelo juiz e o requerido pelo autor.
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não fazer e entregar coisa, no momento não mais se justifica a distinção dos
mecanismos de defesas de acordo com a espécie de obrigação sendo perfei-
tamente possível e sistematicamente coerente que também nas hipóteses de
cumprimento específico das obrigações a defesa do executado seja instru-
mentalizada através da impugnação ao cumprimento de sentença, tal como
delineada nos arts. 475-L e 475-M do Código de Processo Civil.
Esta sistemática não se aplica nos casos de execução das obrigações de
fazer, não fazer e entregar coisa fundadas em título executivo extrajudicial,
objetos de análise no item subsequente haja vista que, nestes casos, por estar-
mos diante de um processo de execução e inexistir pronunciamento judicial
prévio sobre a existência e validade da obrigação, o mecanismo que possui o
executado para se exercer sua defesa são os embargos do executado discipli-
nados nos arts. 736 a 740 do CPC.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 163-186, jul./set. 2010
Manual da execução civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007. p. 278.
70
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MONNERAT, Fábio Victor da Fonte. Tutela específica das obrigações de fazer, não
fazer e entregar coisa. Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte,
ano 18, n. 71, p. 163-186, jul./set. 2010.
Contra, criticando a falta de sistemática do Código, mas defendendo a manutenção do prazo de dez dias para o
71
ajuizamento dos embargos: Rodrigo Mazzei (Reforma do CPC 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 593),
que assevera: No que se refere ao prazo, à míngua de qualquer indicativo direito no art. 738 quanto a execução
para entrega de coisa certa, apesar de evidente cochilo legislativo, o quadro legal que hoje se encontra impõe a
observância do prazo ditado no art. 621 do CPC, perdurando-se tal situação até que seja sanado, via nova lei, o
embaralho criado.
No que tange à necessidade de prévio depósito para que os embargos sejam admitidos o autor entende de forma
diversa e tem por revogada a referência a necessidade de prévia garantia.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 163-186, jul./set. 2010
Daniela Bomfim
Advogada. Mestranda em Direito Público pela UFBA.
1 Síntese da causa
Trata-se de ação ordinária ajuizada por A. LTDA. contra A. S/A por
meio da qual se requer (i) seja certificada obrigação de pagar quantia no valor
de R$102.775,56 (cento e dois mil setecentos e setenta e cinco mil e cinquenta
e seis centavos), a título indenizatório, haja vista suposta ocorrência de
danos decorrentes da ruptura desmotivada e unilateral de relação contra-
tual de transporte de mercadorias; (ii) seja certificada a obrigação de pagar
quantia no valor de R$689.109,68 (seiscentos e oitenta e nove mil cento e nove
reais e sessenta e oito centavos), decorrente do inadimplemento de obrigação
estipulada no contrato; (iii) seja certificada a obrigação de pagar a quantia de
R$492.447,05 (quatrocentos e noventa e dois mil quatrocentos e quarenta e
sete reais e cinco centavos), em razão da incidência de juros moratórios por
força do inadimplemento contratual; (iv) seja certificada a obrigação de pagar
a quantia de R$3.557.984,99 (três milhões quinhentos e cinquenta e sete mil
novecentos e oitenta e quatro reais e noventa e nove centavos), como indeni-
zação pelos lucros cessantes em razão da ruptura contratual.
Alegou a autora que, em 1º.09.1984, as partes (em verdade, as suas
antecessoras) celebraram contrato de transporte de mercadorias, por meio
do qual as concordaram que os transportes das mercadorias vendidas pela
ré seriam feitos pela autora, que, por sua vez, assumia o risco de eventual
perecimento da coisa durante o transporte, mediante a contraprestação
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 189-214, jul./set. 2010
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 189-214, jul./set. 2010
2 Primeiras considerações
Consulta-nos A. S/A acerca da existência atual das situações jurídicas ati-
vas (afirmadas pela autora) de receber as quantias equivalentes a 0,25% do valor
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das mercadorias por elas transportadas de setembro de 1984 a maio de 1993, por
força da cláusula quarta do instrumento contratual de fls. 31-32 dos autos.
É o que se passa a analisar.
A análise, por sua vez, será feita sob dois enfoques diversos, mas não
necessariamente excludentes entre si.
Em um primeiro momento, verificar-se-á se o comportamento omissivo
da transportadora pode ser caracterizado como uma declaração tácita de
vontade elemento de uma renúncia.
Em um segundo momento, analisar-se-á se, independentemente da
vontade da transportadora, ter-se-ia configurada situação de confiança da
consulente idônea a justificar a incidência do princípio da boa-fé.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 189-214, jul./set. 2010
é elemento das proposições jurídicas, mas não coincide com o fato jurídico,
sendo-lhe, inclusive, prévio no fenômeno jurídico.
O suporte fático concreto é um conceito do mundo dos fatos, mas não
corresponde ao conceito de fatos (da vida). Como afirma Marcos Bernardes
de Mello, “entre o fato (real), ou seja, o fato em si mesmo, e o suporte fático
há o elemento valorativo, que os qualifica diferentemente”.
Esta diferença também é realçada por Karl Larenz, ao distinguir as
noções de “situação de fato em bruto” e “situação de fato definitiva” (o enun-
ciado fático). Na premissa menor do silogismo da determinação da conse-
quência jurídica (“S é um caso de P”), “S” não seria a situação de fato bruto
(e note-se que também esta seria resultado de alguma interpretação), mas,
sim, um enunciado fático construído pelo intérprete, a partir das possíveis
proposições jurídicas aplicáveis no caso.
Veja-se: a valoração não está apenas no substrato fático abstrato (rea-
lizada pelo legislador), mas na construção do substrato fático concreto, que
seria decorrente de um julgamento (valorativo) dos fatos. Não se interpretam
apenas os textos normativos (para que se “reconstruam” as normas), mas
também os fatos, para que se construam os respectivos enunciados fáticos
(substratos fáticos concretos), à luz do caso particular, e para que se verifique
a sua correspondência com a hipótese abstratamente prevista. Isso porque os
fatos são também devem ser vertidos em linguagem, logo seus signos devem
ser interpretados para que se “construam” os seus significados.
Pois bem.
Os fatos jurídicos (em sentido lato) podem ser classificados em razão
do elemento cerne (nuclear) do suporte fático, assim entendido como aquele
“que determina a configuração final do suporte fático e fixa, no tempo, a sua
concreção”. Os elementos nucleares do suporte fático influem diretamente
na existência do fato jurídico.
Nesta classificação, há os atos jurídicos em sentido lato, aqueles cujo
suporte fático tenha como elemento nuclear a exteriorização consciente da
vontade humana. O ato jurídico em sentido lato é gênero do qual são espécies
o ato jurídico em sentido estrito e o negócio jurídico.
Em se tratando de ato jurídico em sentido estrito, a vontade humana
(exteriorizada) é elemento do suporte fático, mas ela não atua quanto aos
efeitos decorrentes do ato jurídico (vale dizer, não atua quanto ao plano de
eficácia do ato, mas apenas quanto ao seu plano de existência). Cuida-se de
efeitos preestabelecidos pela norma, efeitos necessários. Praticamente inexiste
possibilidade de escolha da categoria jurídica.
Em se tratando de negócios jurídicos, a vontade é elemento relevan-
te quanto à existência e quanto à eficácia do ato jurídico. Nas palavras de
Marcos Bernardes de Mello:
MELLO. Teoria do fato jurídico: plano da existência. 12. ed., op. cit., p. 38.
MELLO. Teoria do fato jurídico: plano da existência. 12. ed., op. cit., p. 63.
LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. p. 391 et seq.
MELLO. Teoria do fato jurídico: plano da existência. 12. ed., op. cit., p. 49.
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[...] o direito não recebe a vontade manifestada somente como elemento nuclear
do suporte fático da categoria que for escolhida pelas pessoas, mas lhe reconhece,
dentro de certos parâmetros o poder de regular a amplitude, o surgimento, a
permanência e a intensidade dos efeitos que constituam a conteúdo eficacial
das relações jurídicas que nascem do ato jurídico.
Como se viu, os negócios jurídicos (como atos jurídicos em sentido lato) são
fatos jurídicos cujo elemento cerne do suporte fático é a vontade humana exteriori-
zada (o que pressupõe, certamente, a sua consciência). Sem exteriorização de von-
tade humana, não há negócio jurídico nem tampouco irradiação de seus efeitos.
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[...] silêncio pode ser meio para uma verdadeira declaração negocial — um sinal
declarativo ou “meio declarativo”. Tratar-se-á, então, de um comportamento
negocialmente eficaz, “modelador de efeitos” segundo o seu significado, e cuja
eficácia é apenas reconhecida pelo direito objectivo.26
[...] o silêncio pode ser equiparado por convenção das partes a um elemento de
uma linguagem. Nestes casos, a omissão poderá encontrar-se então numa rela-
ção directa com um significado, pelo que a resultante declaração será expressa,
para os efeitos em relação aos quais isso possa ser relevante.27
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[...] a ilação é aqui realizada a partir dos chamados “factos concludentes”. Estes são
aqueles factos a partir dos quais, de acordo com o critério interpretativo, se pode
concluir uma declaração tácita — podem, portanto, ser todos os que se devem
considerar do ponto de vista hermeneuticamente relevante, sejam eles positivos ou
negativos, desde que se sirvam para constituir uma “impressão do destinatário”
no sentido da existência de uma declaração tácita e que não se trate de símbolos
integrantes de uma linguagem (pois então a declaração seria expressa).33
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 189-214, jul./set. 2010
35
Segundo Paulo Mota Pinto: “[...] é necessário, por um lado, adoptar um padrão normativo de conduta para
a avaliar e compreender o comportamento do agente, e, por outro, poder pressupor que o agente, com o seu
comportamento, não está concretamente a desviar-se, a colocar-se à margem daquele padrão” (PINTO. Declaração
tácita e comportamento concludente no negócio jurídico, op. cit., p. 783).
36
Sobre a função interpretativa da boa-fé objetiva, aduz Nelson Rosenvald: “O recurso interpretativo ao princípio da
boa-fé será a forma pela qual o operador do direito preservará a finalidade econômico-social do negócio jurídico
e determinará o sentido do contrato em toda a sua trajetória, preservando a relação cooperativa mesmo que a
operação hermenêutica contrarie a vontade contratual” (ROSENVALD, Nelson. Dignidade humana e boa-fé no Código
Civil. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 90).
37
PINTO. Declaração tácita e comportamento concludente no negócio jurídico, op. cit., p. 777
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Pois bem.
A boa-fé objetiva é princípio cuja incidência faz irradiar situações jurí-
dicas (em sentido lato), dentre as quais o dever de não comportar de forma
contraditória (a proibição do venire contra factum proprium) Segundo Anderson
Schreiber, não se busca manter a coerência em si, mas notadamente proteger
a situação de confiança despertada no outro.
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CORDEIRO, António Menezes. Litigância de má-fé, abuso do direito de acção e culpa in agendo. Coimbra: Almedina,
56
2006. p. 52. Estas notas distintivas podem existir em menor ou maior grau em um caso concreto — ou mesmo
alguma delas pode não se fazer presente, como afirma Antônio Menezes Cordeiro. É, pois, possível fazer relação
com a ideia de sistema móvel que Karl Larenz, por sua vez, relaciona ao pensamento. Os tipos distinguem-se
dos conceitos justamente por não exigir a presença de todas as suas notas distintivas, sendo relevante, para a sua
caracterização, a imagem global no caso concreto.
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Parece, todavia, razoável admitir que, nesse confronto com os casos legais
(prescricionais ou decadenciais), o valor da segurança que os inspira ceda em
favor da tutela da confiança naquelas hipóteses em que ao simples decurso do
tempo se somem comportamentos do titular do direito [...] ou circunstâncias
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significado que fosse atribuído ao seu silêncio seria incompatível com o quadro
de segurança posto e com o padrão de conduta que deve nortear a atividade
interpretativa. Aqui, o silêncio era comportamento negocial contundente, ele-
mento de um negócio jurídico; a vontade exteriorizada era relevante.
O caso foi, neste aspecto, analisado à luz da vontade exteriorizada pelo
sujeito. A boa-fé objetiva foi invocada apenas no que concerne à sua função
interpretativa, e não quanto à sua função limitadora. A conclusão de inexis-
tência atual dos direitos afirmados pela autora (sucessora da transportadora)
teve como fundamento a configuração de um negócio jurídico e da irradiação
dos seus efeitos próprios.
Ocorre que, ainda que se entenda não restar configurada a renúncia tácita,
verificou-se a incidência do princípio da boa-fé (em sua função limitadora) para
que se tutelasse a situação da confiança da contraparte (a consulente), criada
legitimamente em razão da imagem de não exercício decorrente da inatividade
do sujeito durante o transcurso do tempo. Como já se disse, aqui é irrelevante
se o silêncio da transportadora significou ou não declaração tácita de vontade,
já que foi configurada a situação de confiança da outra parte.
O silêncio, nesta perspectiva, não é comportamento negocial, mas, sim,
conduta da qual decorre a imagem de não exercício (situação fática) apreen-
dida pelo direito (e que será elemento do fato jurídico). A conclusão da inexis-
tência atual dos direitos afirmados tem como fundamento, aqui, a suppressio
(efeito jurídico decorrente da incidência do princípio da boa-fé).
Por uma ou por outra via, os direitos estão extintos.
5 Conclusão
Por tudo quanto foi exposto, conclui-se:
(i) inexistem as situações jurídicas ativas afirmadas pela autora, consis-
tentes no direito de receber o equivalente a 0,25% do valor das mercadorias
transportadas de setembro de 1984 a maio de 1993, por ter-se configurado
a renúncia (negócio jurídico unilateral), eis que constatada a exteriorização
tácita de vontade da transportadora, em razão de um juízo de concludência;
(ii) ainda que se entenda não restar configurada a renúncia tácita, ter-se-ia
configurada a situação de confiança legítima da consulente no sentido de que
os direitos afirmados não seriam mais exercidos, razão por que incidirá o prin-
cípio da boa-fé, independentemente da vontade do sujeito inerte (a transporta-
dora), fazendo irradiar a suppressio (perda das situações jurídicas ativas).
É o parecer.
Cidade de Salvador, Bahia, em 19 de abril de 2010.
DIDIER JR., Fredie; BOMFIM, Daniela. Exercício tardio de situações jurídicas ativas. O
silêncio como fato jurídico extintivo: renúncia tácita e suppressio. Revista Brasileira de Direito
Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 189-214, jul./set. 2010. Parecer.
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defesa, como princípios de “moralidade política” que devem ser tomados como
um “todo coerente”, cuja importância só se existencializa no caso particular.
Processo, assim, é direito e garantia fundamental, condição de possibilidade
de acesso a uma ordem jurídica justa, constitucional e principiologicamente
íntegra. Por meio dele é que o cidadão, nas palavras de Francisco, “não só ‘pede
jurisdição’ (sic), mas verdadeiramente dela participa, concorrendo efetivamente
para a adequada concretização dos seus próprios direitos (tomados em conjunto
(...) com a integridade do ordenamento jurídico), o que não ocorre sem que um
diálogo seja permitido (e estimulado) pela agência judiciária, que, de sua vez,
só se justificará democraticamente na medida em que se deixe influenciar pelos
argumentos (de princípio!) universalizáveis e relevantes das partes, relaciona-
dos com a causa em disputa”. E aí o autor lembrará: “essa fórmula judiciária,
que se pretende democrática (e democratizante), não pode ficar confiada à sub-
jetividade assujeitadora (...) de um juiz ‘protagonista’”.
Os passos que Francisco entende importantes para que se possa falar
em um processo de autêntica jurisdição constitucional são os seguintes:
a) reconhecer que o Direito Processual Civil não desempenha o papel que
deveria desempenhar em nosso país, pois, primeiro, o modelo de Direito pra-
ticado é preparado para conflitos interindividuais, típicos de uma jurisdição
liberal, e, segundo, porque vivemos dependentes de um parâmetro filosófico-
interpretativo preso à filosofia da consciência, concebendo o Direito como
uma “ciência exata”, “técnica” ou “método”, desconsiderando que o Direito
“se dá” na linguagem, pois não é algo fixo; linguagem que não está à dispo-
sição do intérprete e que não é um instrumento, pois ela não permite que o
operador do Direito “assujeite-o” como quem “assujeita” um objeto. Em sín-
tese, a prática do direito não é silogismo; b) reconhecer a existência de uma
“baixa constitucionalidade” em terra brasilis (Streck), que não permite a com-
preensão adequada do Direito nos quadros do Estado Social e Democrático
de Direito e que faz com que continuemos, por um lado, compreendendo, à
moda liberal, o juiz como um “espectador” ou mero “mediador” (passivo) de
um conflito, e o processo como “processo escrito e dominado pelas partes”,
e, por outro, à moda “socializante”, o juiz como um “autoritário”, de função
“paternalista”, e o processo como “instituição estatal de bem-estar social”
(Klein), cujas respostas dependem cada vez menos da “fala” das partes.
Francisco deixa claro que pretende fornecer subsídios para o desenvol-
vimento de uma teoria processual que, ao mesmo tempo, seja hermenêutica e
democrática, fazendo jus aos desafios que o neoconstitucionalismo propõe à
Justiça Constitucional. Daí a importância de se resgatar a “estratégia” da lei-
tura moral das cláusulas constitucionais importantes, tais como as do Devido
Processo Legal, contraditório e ampla defesa, que devem ser compreendidas
como “veículo de princípios morais ‘abstratos’”, enfeixados no sistema cons-
titucional e principiologicamente coerente, que comungue de uma “teoria
moral” determinada: a de que o cidadão possui direitos morais “contra” o
Estado, cuja importância não se pode dobrar à “vontade da maioria”, pressu-
posto esse de uma autêntica democracia, em linguagem dworkiniana.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 217-228, jul./set. 2010
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não estiver coberto por uma das regras, o caso não pode ser resolvido pela
aplicação do direito, mas pelo “discernimento pessoal” do juiz; c) ter obriga-
ção jurídica é dizer que o caso enquadra-se na regra jurídica válida que exige
que alguém faça ou deixe de fazer alguma coisa —, atacando, como faz o jus-
filósofo norte-americano, a discricionariedade judicial em seu sentido “forte”,
sinônimo de decisionismo. Após descrever a teoria de Herbert Hart, que vê
o Direito como um sistema de regras em que, nos casos nebulosos, o juiz,
em face à “textura aberta” do Direito, age com discricionariedade, Francisco
aponta para a discussão de Hart com Dworkin, para quem o Direito, mais
que um sistema de regras, é um sistema de princípios, que não podem ser
considerados como um “número fixo de padrões”, mas, sim, “exigências” de
equidade, justiça ou outra dimensão da moralidade, que se chocam contra o
positivismo, desconhecedor que é do “problema interpretativo” do Direito.
Dworkin defende os chamados “direitos políticos preferenciais” (back-
ground rights), notadamente aqueles derivados do “direito abstrato à conside-
ração e respeito”, que preexistem ao Estado e que por isso podem ser opostos
a ele. Reconhece-se, assim, um caráter normativo das imposições de perfil
moral (justiça, equidade etc.) veiculadas pelos princípios que exercem uma
espécie de “força gravitacional” sobre a argumentação judicial.
O Direito, em Dworkin, é uma unidade coerente, devendo ser entendido
em sua “integridade”. Sua justificativa (do Direito) aponta para uma “perso-
nificação moralmente íntegra” em que as preocupações e tradições morais da
comunidade devem ser identificadas pelo operador do Direito. E é nos prin-
cípios que o jurista identificará o sentido das regras. Daí a não oposição entre
regras e princípios que, mais tarde, Lenio, com olhos postos na diferença ontoló-
gica (o ser é o ser do ente e o ente só é em seu ser) dirá que realmente não existe,
justamente porque o princípio é instituidor e está por detrás da regra.
A análise de Francisco passa pela descrição do juiz Hércules (metáfora
cunhada por Dworkin) que, apesar de ser considerado (ele, Hércules) um
jurista com capacidade sobre-humana, não é um “protagonista”, um “solista”,
mas alguém que compreende o Direito como uma totalidade, levando em
consideração o que os juízes fizeram no passado e fazem no presente, além
da produção legislativa. Hércules é o juiz que “presta contas” à Constituição
e ao seu conjunto principiológico, o que faz com que encontre no Direito
soluções que não se ajustam à sua preferência pessoal, tarefa essa que
deve(ria) ser de todos os operadores do Direito. Assim é que Hércules pode
dar “boas respostas”, “respostas corretas”, o que explica por que os juízes não
podem ficar desonerados do dever de fundamentar suas decisões com argu-
mentos de princípio. Francisco lembrará, então, que o juiz, por integrar uma
comunidade de pessoas livres e iguais, não é um outsider, devendo respeitar
a produção democrática do Direito, aceitando a noção de que as pessoas têm
direitos “contra” o Estado, em especial o de serem tratadas com igual consi-
deração e respeito. “Sua” jurisdição, portanto, tem de ser justificada perante
essas exigências. Numa palavra, com o autor, “se não podemos exigir do juiz
que chegue a respostas corretas sobre os direitos de seus cidadãos, podemos
ao menos exigir que o tente!”. Os juízes, assim, não podem desconsiderar
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o seu dever (constitucional) de elaborar uma teoria coerente e que não leve
em consideração a “complexidade normativa do Direito”. A resposta correta
será uma resposta à discricionariedade “forte” (decisionismo), a que se refere
Dworkin, “quebrando” o protagonismo judicial, cabendo ao processo, por-
tanto, fornecer as condições de possibilidade para a sua obtenção! O processo
jurisdicional democrático, nesse sentido, é “democratizante”, pois (deve)
conta(r) com a participação efetiva das partes.
Após tratar das noções acima referidas, Francisco passa a reconhecer
evidentes pontos de contato entre as teorias de Dworkin e de Gadamer, invo-
cando, então, a tradição gadameriana e o Direito como Integridade dworki-
niano para dizer que Dworkin sempre teve presente a ideia de que não há
cisão entre os momentos da compreensão-interpretação-aplicação, o que o
aproxima de Gadamer, pois, consoante o jusfilósofo norte-americano, “os
juízes não decidem os limites das restrições institucionais, para só então dei-
xar os livros de lado e resolver as coisas a seu próprio modo”. Dworkin, por-
tanto, desenvolve uma “interpretação construtiva”, tendo por objeto as rela-
ções sociais (leia-se “o Direito”), que, a toda evidência, prende-se à herme-
nêutica da tradição gadameriana e à ideia de que há uma “circularidade” da
hermenêutica na prática cotidiana, sendo a interpretação criativa um “caso de
interação entre propósito e objeto” que, naturalmente, “envolve o intérprete
(e seu propósito) com o objeto a ser interpretado”, devolvendo-o, portanto,
ao “círculo hermenêutico” (Heidegger e Gadamer). E aí Dworkin explicitará
ainda mais seu apego a Gadamer, ao se posicionar francamente contra a ideia
de uma “intenção histórica” que possa ser o “fundamento constitutivo da
compreensão”. Com isso Dworkin reconhece claramente a impossibilidade
de reconstrução da “intenção” do autor de um texto (no caso o legislador)
e deixa entender que o que importa como condição de possibilidade para a
construção da “resposta correta” é a “pergunta correta”, nos moldes do que
já ensinava Gadamer.
O grande desafio da prática do Direito, que é interpretativa, é, segundo
o autor, o de trabalhar uma postura que concilie o caráter produtivo (criativo)
da hermenêutica com a “exigência democrática de que o tribunal ‘construa’
suas decisões com a colaboração efetiva das partes, e de que o resultado deste
processo seja um provimento que honre a materialidade da Constituição e a
história judiciária produzida com sucesso”. É a superação desse desafio que
possibilitará combater o protagonismo judicial, possibilitando que a decisão
judicial seja uma resposta “do Direito”, e não simplesmente “do juiz”.
A Constituição, nesse aspecto, não poderá ser lida como uma
“metanorma” (Grundnorm), mas como integrante do Direito, cuja pretensão
de eficácia somente pode ser atendida quando “aplicada”! E é claro que não
se “descobrirão” sentidos, significados de textos, pois a prática do Direito é
interpretativa no sentido de interpretação da “história jurídica”, combinando
elementos de descrição e valoração, mas com estes não se confundindo. Vem
daí a “combinação” que Dworkin faz entre Direito e literatura, utilizando a
interpretação literária como modelo para o modo central da análise jurídica.
Cada juiz, nesse sentido, assume o seu papel de “romancista em cadeia”:
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“deve ler o que outros juízes fizeram no passado, não apenas para descobrir
o que disseram, mas para chegar a uma opinião sobre o que esses juízes
fizeram coletivamente, ou seja, como cada um deles (também) formou uma
opinião sobre o ‘romance coletivo’ escrito até então”. Assim, diz Francisco
referindo-se a Dworkin, “cada juiz deve considerar-se como ‘parceiro’ de
um complexo empreendimento em cadeia, da qual essas inúmeras decisões,
estruturas, convenções e práticas são a história; é seu trabalho continuar essa
história no futuro por meio do que faz agora”. Para isso, “o juiz deverá inter-
pretar o que aconteceu antes e determinar, segundo seu próprio julgamento,
o motivo das decisões anteriores, que deverão ser tomadas ‘como um todo’, o
que significará o ‘propósito ou o tema da prática até então’”.
O autor desenvolve, a partir daí, a concepção defendida por Dworkin
no sentido de que, além de uma “coerência de estratégia”, os juízes devem
observar uma “coerência de princípio”, que exija que os diversos padrões
regentes do uso estatal da coerção contra os cidadãos sejam coerentes expres-
sando uma única e abrangente visão de justiça. Aqui o ponto que Francisco
pretendia atingir: o Direito como Integridade, que pressupõe uma compre-
ensão do Direito como “totalidade”, “completeza”, em que as pessoas têm
direito a uma “extensão coerente”, fundada em princípios, das decisões polí-
ticas do passado, ainda quando os juízes divirjam profundamente sobre seu
significado. A integridade, nesse sentido, é um “ideal político” que explica
as práticas constitucionais, constituindo-se em forma de legitimação política
fundada na “fraternidade”, tão cara a uma comunidade que se pretenda
“comunidade de princípios”. Dworkin acrescenta às ideias rousseauniana e
kantiana de “autolegislação” a noção de “integridade”, que deve ser aceita
por uma comunidade de princípios. A comunidade de princípios, fiel à
integridade, pode “reivindicar a autoridade de uma verdadeira comunidade
associativa”, pois suas decisões coletivas são “questões de obrigação”, e não
apenas de “poder”. A comunidade de princípios, em suma, reivindica a
autoridade moral em nome da fraternidade (Dworkin).
O Direito como Integridade conviverá com a “verdade hermenêutica” que
deriva dos princípios de justiça, equidade e Devido Processo Legal que oferecem
a “melhor interpretação construtiva” da prática do Direito de uma comunidade.
É que o Direito como Integridade determina aos juízes que estes admitam, tanto
quanto possível, que o Direito é estruturado por um conjunto coerente de prin-
cípios que exigem do juiz “pôr à prova” sua interpretação da vasta rede de
estruturas e decisões políticas da sua comunidade. Em suma, o juiz tem o dever
de interpretar a história jurídica que encontra, e não de inventar uma “história
melhor”; seu dever é atender a alguma concepção de integridade e de coerência
do Direito como instituição (doutrina da responsabilidade política do juiz).
Francisco deixa claro, no entanto, que as respostas, evidentemente, não
estão “prontas”, pois a integridade convive com a possibilidade de altera-
ções das decisões anteriores. Ou seja, não está em jogo “história versus jus-
tiça”, uma vez que a decisão judicial que eventualmente venha a “quebrar”
um precedente estará apenas “conciliando” considerações que, em geral,
se combinam em qualquer cálculo de direito político, o que não é causa de
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 217-228, jul./set. 2010
surpresa alguma, pois a decisão judicial nada mais faz do que tornar efetivos
direitos políticos já existentes. Aliás, o “rompimento” com a tradição, já dizia
Gadamer, faz parte da “essência” (sic) do humano, mas isso só é possível com
uma “consciência hermenêutica desperta e vigilante”.
No fundo, o autor defende, com Dworkin, a possibilidade de novos
enfrentamentos de problemas pelo juiz com olhos postos na integridade,
pois os indivíduos têm direito à aplicação consistente dos princípios sobre
os quais se assentam suas instituições, uma vez que, apesar de a vontade
popular (“moralidade constitucional da comunidade”) por vezes poder ser
incoerente, mesmo assim o cidadão tem um direito a exigir decisões coeren-
tes. Assim como a hermenêutica, também a integridade não tem a pretensão
de ter a “última palavra”, mas há que se convir que tem a “primeira palavra”.
O objetivo da integridade, dirá Francisco, é um “princípio”!
O Capítulo III da obra é, na verdade, uma homenagem a Ovídio Baptista
da Silva, sem dúvida um (ou talvez o) dos melhores processualistas que o Brasil
já produziu. Para o autor, a obra do Prof. Ovídio é uma “estação necessária”
na viagem de qualquer um que se aventure nas coisas do processo. E é neste
capítulo que Francisco aproximará as lições de Ovídio a respeito do dever cons-
titucional de fundamentar decisões à premissa dworkiniana de que o tribunal
deve conduzir sua atividade jurisdicional por argumentos de princípio.
A análise parte da ideia de que o paradigma racionalista, como defen-
dia Ovídio, reduziu o fenômeno jurídico ao “mundo normativo” em que a lei
tem um “sentido unívoco”. O Direito Processual Civil, por sua vez, não acom-
panhou as transformações sucessivas aos movimentos liberais que culmina-
ram na Revolução Francesa, circunstância que se reflete atualmente na crise
de legitimidade do Poder Judiciário. A proposta de Motta é a de que se invista
na compreensão hermenêutica do Direito Processual Civil, promovendo, em
suas palavras, uma “articulação interdisciplinar”, de onde se possa “vislum-
brar os compromissos da ciência processual com a História” (Ovídio); tarefa
que não é fácil, uma vez que o paradigma racionalista comprometeu o Direito
Processual, sujeitando-o a princípios metodológicos e fazendo dele uma
“ciência” e do Direito um “conjunto sistemático de conceitos, com pretensão
à eternidade”, como já ensinava o Prof. Ovídio.
Comprometidos com a “certeza”, com o valor “segurança”, com a
“matemática” (Leibniz), com a “vontade da lei” e com uma pretensa “neu-
tralidade”, o Direito e a magistratura ficaram subordinados às leis, sem qual-
quer compromisso com a justiça concreta. Ovídio, no entanto, pensa que o
Direito deve, sim, fornecer instrumentos e condições concretas que possam
contribuir para a realização de uma sociedade mais próxima à justiça, que
se desvela em cada caso, não podendo a discricionariedade do ato judicial
transformar-se em arbitrariedade. E para que isso aconteça os juízes não
podem ser “burocratas”, “apolíticos”, “alguém que não pode ‘interpretar’” e
que consequentemente não “fundamenta” seus provimentos. Afinal de con-
tas, o juiz não pode ser um “irresponsável”. A aposta aqui, então, volta-se
para a hermenêutica, pois o Direito depende de uma compreensão herme-
nêutica, compromissada com a faticidade, “de olho” no fenômeno. Dito de
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 217-228, jul./set. 2010
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MOTTA, Francisco José Borges. Levando o direito a sério: uma crítica hermenêutica ao
protagonismo judicial. Florianópolis: Conceito, 2010. 232 p. (Coleção Lenio Luiz Streck).
Resenha de: HOMMERDING, Adalberto Narciso. Revista Brasileira de Direito Processual –
RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 217-228, jul./set. 2010.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 217-228, jul./set. 2010
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 4. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 4. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2009. Resenha de: CHARAFEDDINE, Giovanna Sabino Guaritá. Revista Brasileira
de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 229, jul./set. 2010.
R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 229, jul./set. 2010
Índice
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I O
INSTITUTOS DO DIREITO COMUM NO OBRIGAÇÃO DE FAZER, NÃO FAZER E
PROCESSO CIVIL BRASILEIRO ENTREGAR COISA
- Ver: Institutos do direito comum no pro- - Ver: Tutela específica das obrigações de
cesso civil brasileiro. Artigo de: Enrico fazer, não fazer e entregar coisa. Artigo de:
Tullio Liebman.......................................... 43 Fábio Victor da Fonte Monnerat........... 163
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R. bras. Dir. proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 71, p. 237-238, jul./set. 2010
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