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RESENHA
DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 14. ed. São Paulo:
Atlas, 2010. 1442 p.
Gil Ferreira de Mesquita ...................................................................................................................................... 277
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 70, p. 9-10, abr./jun. 2010
ofertadas como orientação de leitura, todas concernentes a importantes
obras jurídicas disponibilizadas há pouco no mercado.
Esperamos que também esta edição agrade a todos.
Os Diretores
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 70, p. 9-10, abr./jun. 2010
DOUTRINA
Artigos
O princípio da oralidade e o sistema recursal nos Juizados Especiais 13
1 Introdução
Tenho, desde sempre, afirmado minha convicção no sentido de
que todo o sistema dos Juizados Especiais Cíveis deve ser compreendido
a partir dos princípios elencados no art. 2º da Lei nº 9.099/1995. Isto
vale, evidentemente, para todos os institutos tratados no sistema dos
Juizados Especiais, sejam eles estaduais ou federais, versando a causa
neles deduzida sobre direito privado ou direito público.
Consequência direta disso é que os princípios referidos se aplicam,
também, ao sistema recursal estabelecido para os Juizados Especiais
Cíveis. O que se pretende, com este ensaio, é demonstrar que, como con
sequência inexorável disso, não podem as Turmas Recursais, no exercício
de sua competência recursal, reexaminar provas, limitando-se a devolu
ção operada às questões de direito, em razão da absoluta necessidade
de respeito ao princípio da oralidade.
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14 Alexandre Freitas Câmara
Digo em tese porque, como sabem todos os que têm experiência prática nos Juizados Especiais Cíveis, raramente
1
os atos das partes são orais. Petições iniciais, contestações, embargos declaratórios, requerimentos executivos,
tudo isso se costuma fazer por escrito, como se fossem destinados aos juízos comuns.
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O princípio da oralidade e o sistema recursal nos Juizados Especiais 15
2
Trata-se do direito, costumeiramente reconhecido nos sistemas jurídicos de origem anglo-saxônica, a um “dia
perante o Tribunal”. Não posso, porém, deixar de registrar que a tendência, mundialmente observada, de
uso de novas tecnologias no processo judicial pode levar a que as audiências se realizem através da técnica
da videoconferência, o que reduziria bastante essa garantia. Não obstante a inexorabilidade do uso das
novas técnicas, penso que se deve receber com cuidado algumas inovações, sob pena de se provocar uma
“desumanização” do processo, com o fim do contato pessoal, substituído por contatos virtuais.
3
Tudo isso, porém, se diz apenas em tese. É que, na prática, houve um total desvirtuamento do sistema. Os
juízes que atuam nos Juizados Especiais Cíveis, inexplicavelmente, não proferem suas sentenças na audiência.
Levam os autos conclusos para sentença, aplicando uma regra contida no Código de Processo Civil que permite
ao juiz proferir a sentença no prazo de dez dias após o encerramento da audiência. Esta regra, contida no
CPC, tem caráter geral, e não pode prevalecer sobre os precisos e claros termos do que consta no já citado art.
28 da Lei nº 9.099/1995. A prática está, como dito, inteiramente desvirtuada. Não só as sentenças não são
proferidas desde logo, como determina a lei, mas — para piorar ainda mais — ainda se designam “audiências
de leitura de sentença”. Essas audiências – que são, a rigor, falsas audiências, pois não se realizam na verdade,
com as partes tão somente comparecendo à secretaria do Juizado para tomar conhecimento do teor da decisão
— além de tudo, contrariam ainda um outro princípio, o da celeridade processual, também estabelecido no
art. 2º da lei entre os que norteiam o processo nos Juizados Especiais Cíveis.
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16 Alexandre Freitas Câmara
Isso consta — como todas as minhas outras opiniões anteriormente manifestadas sobre Juizados Especiais
4
Cíveis — do livro em que faço uma exposição sistemática do microssistema processual dos Juizados. Cf., pois,
Alexandre Freitas Câmara. Juizados especiais cíveis estaduais, federais e da Fazenda Pública: uma abordagem
crítica. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. Passim.
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18 Alexandre Freitas Câmara
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Não posso, aqui, deixar de observar que deveria ter havido, também, a previsão de cabimento de agravo contra
(algumas, pelo menos) decisões interlocutórias proferidas in executivis. A inadmissibilidade do agravo contra
essas decisões — como, e.g., a que determina a penhora de um bem ou a que defere sua adjudicação leva
ao uso — em tese inadequado, mas absolutamente justificável na prática forense, do mandado de segurança
como sucedâneo recursal.
6
Duas observações precisam ser feitas neste ponto. A primeira é a de que também nos Juizados Especiais Cíveis
se deve admitir a oposição de embargos de declaração contra decisões interlocutórias. A segunda é que se deve
reputar como não escrita a afirmação, contida na Lei nº 9.099/95, de que os embargos de declaração seriam
cabíveis quando na decisão houver dúvida. Isto se diz porque a dúvida é, na verdade, um estado subjetivo
daquele que lê o teor da decisão, provocado por obscuridade, contradição ou omissão em seu texto.
7
Suspende, e não interrompe, diferentemente do que se dá no sistema do Código de Processo Civil.
8
Assim já decidiu o STF: AI no AgR nº 451078/RJ, rel. Min. Eros Grau, j. em 31.08.2004.
9
Deixo, aqui, por serem absolutamente irrelevantes para a compreensão do que se pretende sustentar neste
ensaio, de apresentar quaisquer considerações sobre o cabimento — evidente, diga-se — de agravo contra a
decisão que, na origem, deixa de admitir o recurso extraordinário interposto.
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O princípio da oralidade e o sistema recursal nos Juizados Especiais 19
10
Esta frase já se tornou um verdadeiro lugar-comum. É a mesma empregada, entre outros, por Flávio Cheim Jorge
(Apelação cível: teoria geral e admissibilidade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 51). Também outros
doutrinadores brasileiros a empregam, como se vê, por exemplo, em José Carlos Barbosa Moreira (Comentários
ao Código de Processo Civil. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. v. 5, p. 409). Na doutrina estrangeira mais
autorizada, a mesma frase pode ser lida, e.g., em Loïc Cadiet e Emmanuel Jeland (Droit judiciaire privé. 5. ed.
Paris: LexisNexis, 2006. p. 507) (“voie de recours ordinaire par excellence”).
11
Neste sentido, Luigi Paolo Comoglio, Corrado Ferri e Michele Taruffo (Lezioni sul processo civile. 4. ed. Bolonha:
Il Mulino, 2006. v. 1, p. 612).
12
Este é o sistema tradicionalmente adotado nos ordenamentos anglo-saxônicos, como já apontava Cappelletti
em seu célebre “parecer iconoclástico”. Cf., pois, Mauro Cappelletti (Dictamen iconoclástico sobre la reforma
del proceso civil italiano. In: CAPPELLETTI, Mauro. Proceso, ideologías, sociedad. Trad. esp. de Santiago Sentís
Melendo e Tomás A. Banzhaf. Buenos Aires: EJEA, 1974. p. 279-280). Impõe-se observar, porém, que no
moderno direito processual inglês tem-se admitido, ainda que em casos excepcionais, que a Court of Appeal
reexamine o material probatório ou até colha novas provas. Sobre o ponto, Neil Andews (O moderno processo
civil. Trad. bras. orientada e revista por Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
p. 194-197).
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20 Alexandre Freitas Câmara
13
SOUSA, Miguel Teixeira de. Estudos sobre o novo processo civil. 2. ed. Lisboa: Lex, 1997. p. 399.
14
Venho já há bastante tempo sustentando que no sistema do Código de Processo Civil o que se adotou foi um
modelo de “processo escrito mitigado”. Sobre o ponto, seja permitido fazer referência ao que está escrito
em Alexandre Freitas Câmara (A oralidade e o processo civil brasileiro. In: CÂMARA, Freitas. Escritos de direito
processual: primeira série. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. p. 22-29). Voltei ao tema, posteriormente, em
Alexandre Freitas Câmara (A oralidade e o processo civil brasileiro: estado atual da questão. In: CÂMARA,
Freitas. Escritos de direito processual: terceira série. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 60-66).
15
Na qualidade de integrante de um tribunal de segunda instância, não posso deixar de registrar aqui a dificuldade,
que muitas vezes tenho, de valorar as provas que foram produzidas oralmente, já que não tive contato imediato
com os depoentes. Aqui, porém, é preciso registrar o fato de que a adoção de novas tecnologias, com a
gravação em arquivos audiovisuais das audiências, certamente modificará o modo como as Cortes Recursais
se relacionam com a prova. Observou o ponto o processualista norte-americano Paul Carrington (Technology
and civil litigation in the United States in the twenty-first century. In: KENGYEL, Miklós (Coord.). Electronic
Justice: Present and Future. COLLOQUIUM OF THE INTERNATIONAL ASSOCIATION OF PROCEDURAL LAW.
Pécs: University of Pécs Faculty of Law, 2010. p. 164), que narra um caso em que a Suprema Corte dos EUA,
em um julgamento ocorrido em 2007, contrariando seu papel tradicional de revisora das questões de direito,
reexaminou provas em um processo em que se tratava de responsabilidade civil pelos danos decorrentes de um
acidente de trânsito que foi inteiramente filmado através de uma câmera que estava em um dos automóveis
envolvidos.
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O princípio da oralidade e o sistema recursal nos Juizados Especiais 21
5 Conclusão
De tudo quanto se expôs, a única conclusão possível é esta: a prática
já consagrada, de permitir à Turma Recursal o reexame integral da
matéria em sede de apelação, inclusive quanto à matéria de fato, contraria
o disposto no art. 2º da Lei nº 9.099/1995, revelando-se incompatível
com o modelo processual inspirado na oralidade que se construiu para
os Juizados Especiais Cíveis. Pode-se concordar ou não com a opção do
legislador; pode-se considerar que esta leva a resultados melhores ou
piores do que os que seriam alcançados com a adoção de outro sistema.
O que não se pode é, simplesmente, desconsiderar-se a escolha conscien
temente feita pelo Estatuto dos Juizados Especiais, tratando-se o processo
que tramita perante estes tão importantes órgãos jurisdicionais como
se fossem processos ordinários, desses que tramitam nos juízos comuns,
regidos pelo Código de Processo Civil. Essa desconsideração pela escolha
do legislador é perniciosa e deve, por isso, ser a todo custo combatida.
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Variáveis acerca do cabimento de intervenção de terceiros no mandado de segurança 23
1 Colocação do tema
No presente ensaio, procura-se enfrentar aspectos ligados ao
cabi
mento de intervenção de terceiros no mandado de segurança, em
decorrência da especialidade procedimental.
Consoante previsão do art. 1º da LMS, é cabível o mandamus para
defender direito líquido e certo1 contra ato de autoridade. Contudo,
alguns problemas práticos podem advir da conceituação, como: a) a auto
ridade coatora é ré no mandado de segurança? b) é admitida pelo siste
ma a presença, como sujeito passivo, de pessoa física ou jurídica alheia a
qualquer conotação pública? c) é admissível intervenção de assistente e
de amicus curiae no mandado de segurança?
São indagações que ainda não restam totalmente resolvidas em
sede doutrinária e jurisprudencial, mesmo com a promulgação da nova
Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/09) e merecem aprofun
damento neste trabalho.
segurança, inclusive no que respeita ao processo de formação de coisa julgada material. Sobre o assunto, ver
meu “Aspectos envolvendo o direito líquido e certo, a decadência e a coisa julgada no mandado de segurança”
(Revista Dialética de Direito Processual, São Paulo, n. 16, jul. 2004).
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24 José Henrique Mouta Araújo
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Variáveis acerca do cabimento de intervenção de terceiros no mandado de segurança 25
Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, ‘habeas data’, ação direta
6
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26 José Henrique Mouta Araújo
7
Mandado de segurança. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 23.
8
O STF já decidiu: “Mandado de segurança: legitimação passiva da pessoa de direito público ou assemelhada, à
qual seja imputável o ato coator, cabendo à autoridade coatora o papel de seu representante processual, posto
que de identificação necessária: conseqüente possibilidade de sanar-se o erro do impetrante na identificação
da autoridade coatora, mediante emenda da inicial, para o que se determina a intimação da parte: voto médio
do relator para o acórdão” (Rcl nº 367/DF. Rel. Min. Marco Aurélio. Rel. Acórdão Min. Sepúlveda Pertence. J.
em 04.02.1993. Tribunal Pleno. DJ, p. 00004, 06 mar. 1998, Ement. vol -01901-01, p-00001).
9
Também aduzindo que é a pessoa jurídica de direito público quem irá suportar os efeitos decorrentes da ação,
ver obra clássica de Sérgio Ferraz intitulada Mandado de segurança (individual e coletivo): aspectos polêmicos.
3. ed. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 52.
10
Nesse particular, há duas passagens de ensaio de Fredie Didier Júnior que merecem transcrição: “a participação
da autoridade coatora restringe-se a prestar informações e completar a citação, comunicando ao réu a
existência da demanda contra ele proposta. Empós, sai do processo. No momento da prolação da sentença,
por exemplo, já é pessoa totalmente estranha ao feito, fato que a qualifica, neste momento, como terceiro”.
E, em seguida, defende corretamente que: “a participação da autoridade coatora, ao que nos parece, pode
ser visualizada muito melhor de acordo com a teoria geral da prova: trata-se de colheita de prova, por escrito,
feita em momento procedimental anterior ao da apresentação da defesa” (Natureza jurídica das informações
da autoridade coatora no mandado de segurança. In: BUENO, Cassio Scarpinella; ALVIM, Eduardo Arruda;
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais do mandado de segurança. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2002. p. 370, 371).
11
Por outro lado, em caso de dúvida objetiva, é possível a impetração contra mais de uma autoridade coatora.
Neste caso, se ambas forem vinculadas à mesma pessoa jurídica de direito público, ainda assim é incabível
falar-se em litisconsórcio passivo, mas sim em mais de um presentante cujos atos estão sendo impugnados.
A contrario sensu, há precedente indicando tratar-se de litisconsórcio passivo, senão vejamos: “Mandado de
segurança. Impetração contra duas autoridades – Determinação pelo Juiz para que os impetrantes escolham
uma autoridade para permanecer no pólo passivo – Litisconsórcio passivo que pode permanecer, com exame
da matéria por ocasião da sentença – Decisão reformada – Recurso dos autores provido. Possível o litisconsórcio
passivo em mandado de segurança, podendo ser dirimida a dúvida sobre a efetiva autoridade coatora por ocasião
da sentença” (TJSP. AI 110.813-5 – SP, 1ª CDPu., v.u., j. 30.3.99, Rel. Luís Ganzerla. CD/APMP. In: REMÉDIO,
José Antonio. O mandado de segurança na jurisprudência. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 491).
12
“Acolhida a tese de que o sujeito passivo é a pessoa jurídica, não é admissível o ingresso da autoridade como
assistente litisconsorcial, porque ela não é titular de qualquer relação jurídica com o adversário do assistido. Por
outras palavras, a autoridade a quem se atribui a prática do ato integra a pessoa jurídica (parte passiva), não
tendo, pois, qualidade para agir nem como parte, nem como assistente” (LOPES, João Batista. Sujeito passivo
no mandado de segurança. In: BUENO, Cassio Scarpinella; ALVIM, Eduardo Arruda; WAMBIER, Teresa Arruda
Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais do mandado de segurança. São Paulo: Revista dos Tribunias, 2002.
p. 418).
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Variáveis acerca do cabimento de intervenção de terceiros no mandado de segurança 27
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28 José Henrique Mouta Araújo
que se dá, por exemplo, no mandado requerido por funcionário que perdeu o cargo, ou deixou de ser nomeado
ou promovido, se o cargo pretendido já estiver ocupado por outrem. Igualmente, no mandado requerido contra
a concessão de serviço público a outrem, hipótese em que o deferimento implica cancelar a concessão” (BARBI,
Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 126).
15
Do mandado de segurança. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 129.
16
Sobre a necessidade de citação dos demais candidatos (inclusive os aprovados e já empossados) como
litisconsortes necessários em mandado de segurança, o STJ já decidiu: “Embargos de declaração em recurso
em mandado de segurança. Ausência de citação de litisconsortes necessários — art. 47 CPC. Nulidade.
Provimento. Efeitos modificativos. Tendo o recurso sido provido para, concedendo a ordem como requerida,
anular-se o discutido item do edital que conferia pontos diferenciados aos diversos candidatos, e certo que os
demais candidatos aprovados (alguns até mesmo já empossados) que se beneficiaram com os referidos pontos.
Deveriam ter sido citados para integrarem a lide como litisconsortes necessários, já que a concessão da ordem
culminou por afetá-los. Tal ponto fora colocado pelo estado em suas contra-razões, e omisso no julgado.
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Variáveis acerca do cabimento de intervenção de terceiros no mandado de segurança 29
Embargos conhecidos e providos para, dando efeito modificativo ao “decisum”, anular o processo a partir
da sentença de 1º Grau inclusive, com o fim de proceder-se a citação dos litisconsortes passivos necessários”
(EDcl no RMS 7.940/MG – 5ª Turma. Rel. Min. Ministro José Arnaldo da Fonseca. J. em 10.06.1997. DJ, p.
36278, 12 ago. 1997). Ainda sobre a necessidade de citação dos demais candidatos, ver: RMS nº 2.339/BA
– 5ª Turma. Relator Min. Felix Fischer. J. em 10.03.1998. DJ, p. 131, 11 maio 1998; e RESP. nº 11.369 – 5ª
Turma. Rel. Min. Felix Fischer. J. em 15.03.2001. DJ, 02 abr. 2001.
17
Como o tempo decorrido para a citação de todos os municípios ou todos os candidatos do concurso
— mantendo-se os exemplos anteriormente apresentados.
18
Vejamos a jurisprudência do STJ: “Recurso especial em mandado de segurança. Licitação. Homologação e
adjudicação. Prova da contratação. Dispensa. Perda de objeto. 1. No processo de mandado de segurança, é
obrigatória a citação da pessoa em favor de quem foi praticado o ato impugnado, em razão de ser litisconsorte
necessário, uma vez que a anulação do mencionado ato interferirá na sua esfera jurídica, violando seu direito.
2. A extinção do processo ante a falta da citação somente poderá ser decretada se a parte intimada para
providenciar a citação, nos termos do art. 47, parágrafo único do Código de Processo Civil, quedar-se inerte.
3. Recursos especiais parcialmente providos” (REsp. nº 493.679/RS – 2ª Turma. Relator Ministro João Otávio
de Noronha. J. em 16.11.2004. DJ, 17 dez. 2004). “Recurso ordinário. Processual. Mandado de segurança.
Litisconsórcio passivo necessário. Aplicabilidade. Decisão que afeta situação jurídica de terceiros. Citação.
Prazo para defesa. Art. 225, VI. Ausência. Nulidade da citação. Matéria de ordem pública. No caso em que a
anulação do ato inquinado de violar direito líquido e certo implica em prejuízo para terceiros; ou o contrário,
a manutenção do ato implica em vantagem para aqueles, fica demonstrada a necessidade de se instaurar
litisconsórcio. Não há, em mandado de segurança, regra específica, diversa da regra geral do art. 46 e seg. do
CPC, para se apurar a necessidade do litisconsórcio. A citação há que conter, expresso, o prazo para defesa
(art. 225, IV, do CPC), sob pena de nulidade. Recurso ordinário provido em parte” (RMS nº 14.106/MS. 6ª
Turma. Rel. Ministro Paulo Medina. J. em 09.12.2003. DJ, p. 363, 02 fev. 2004).
19
“1. Intervenção de terceiro. Assistência. Mandado de segurança. Inadmissibilidade. Preliminar acolhida.
Inteligência do art. 19 da Lei nº 1.533/51. Não se admite assistência em processo de mandado de segurança.
2. Legitimidade para a causa. Passiva. Caracterização. Mandado de segurança. Impetração preventiva contra
nomeação de juiz de Tribunal Regional do Trabalho. Ato administrativo complexo. Presidente da República.
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30 José Henrique Mouta Araújo
Litisconsorte passivo necessário. Competência do STF. Preliminar rejeitada. Aplicação dos arts. 46, I, e 47, caput,
do CPC, e do art. 102, I, ‘d’, da CF. O Presidente da República é litisconsorte passivo necessário em mandado de
segurança contra nomeação de juiz de Tribunal Regional do Trabalho, sendo a causa de competência do Supremo
Tribunal Federal. 3. Mandado de segurança. Caráter preventivo. Impetração contra iminente nomeação de juiz
para Tribunal Regional do Trabalho. Ato administrativo complexo. Decreto ainda não assinado pelo Presidente
da República. Decadência não consumada. Preliminar repelida. Em se tratando de mandado de segurança
preventivo contra iminente nomeação de juiz para Tribunal Regional do Trabalho, que é ato administrativo
complexo, cuja perfeição se dá apenas com o decreto do Presidente da República, só com a edição desse
principia a correr o prazo de decadência para impetração. 4. Magistrado. Promoção por merecimento. Vaga
única em Tribunal Regional Federal. Lista tríplice. Composição. Escolha entre três únicos juízes que cumprem
todos os requisitos constitucionais. Indicação de dois outros que não pertencem à primeira quinta parte da lista
de antiguidade. Recomposição dessa quinta parte na votação do segundo e terceiro nomes. Inadmissibilidade.
Não ocorrência de recusa, nem de impossibilidade do exercício do poder de escolha. Ofensa a direito líquido
e certo de juiz remanescente da primeira votação. Nulidade parcial da lista encaminhada ao Presidente da
República. Mandado de segurança concedido, em parte, para decretá-la. Inteligência do art. 93, II, ‘b’ e ‘d’,
da CF, e da interpretação fixada na ADI nº 581-DF. Ofende direito líquido e certo de magistrado que, sendo
um dos três únicos juízes com plenas condições constitucionais de promoção por merecimento, é preterido,
sem recusa em procedimento próprio e específico, por outros dois que não pertencem à primeira quinta parte
da lista de antiguidade, na composição de lista tríplice para o preenchimento de uma única vaga” (MS nº
24.414/DF – Relator Min. Cezar Peluso. J. 03.09.2003 – Tribunal Pleno. DJ, p. 00009, 21 nov. 2003. Ement.
vol 2133-03, p 00440). “Processual civil. Mandado de segurança. Concessão de serviço público. Interesse na
causa alegado pela união federal. Pedido de assistência (inadmissibilidade). Mostra-se correto o entendimento
firmado pelo v. Acórdão recorrido no sentido do descabimento de assistência no mandado de segurança,
tendo em vista o que dispõe o art. 19 da lei n. 1533/51, na redação dada pela lei n. 6701/74, que restringiu
a intervenção de terceiros no procedimento do writ ao instituto do litisconsórcio. Sendo parte ilegítima para
recorrer, como assistente, considera-se inexistente o recurso extraordinário interposto pela união federal. RE
não conhecido” (RE nº 111.778/SP. Relator Min. Célio Borja. J. em 08.09.1987. 2ª Turma. DJ, p. 23814, 30 out.
1987, Ement. vol-01480-03, p. 00646). “Processual civil. Mandado de segurança. Assistência. 1. A assistência
não cabe em mandado de segurança, por: a) o art. 19, da Lei 1533, referir-se, exclusivamente, à admissão de
litisconsórcio; b) o CPC, em face das dicções dos arts. 19 e 20, da Lei 1533, não é supletivo da lei que regula o
procedimento do mandado de segurança; c) a lei prevê procedimento específico para o mandado de segurança,
não cabendo ao intérprete ampliá-lo; d) a admissão de assistência em mandado de segurança cria obstáculo
para a consecução da celeridade imposta para o seu curso. 2. Precedentes jurisprudenciais pela não admissão:
RTJ 123/722/STF-RT 626/242; RDA 170/132; RSTJ 85/364; STJ RT 732/186; TFR – MAS 106.842, DJU 19.12.85,
AI 90.01.11636-1, DJU 24.9.90, P. 22.063, TRF – 1ª R; REO EM MS 8.851, DJU 12.9.95, P. 59.865 TRF 2ª R,
AI 94.04. 10.202.4, DJU 29.6.94, TRF – 4ª R; AI 44.240, DJU 19.11.82, p. 16.182, TFR; AI 90.01.024378,
DJU 1.10.90, P. 22.817, TRF, 1ª Reg. 3. Posição contrária de Sérgio Ferraz, Alfredo Buzaid e Hely Lopes, além
dos precedentes seguintes: AI 43.009, DJU 14.10.82, P. 10361, TFR; MS 90.01.03405-5, P. 22.060, TRF, 1ª
Região; AI 89.01.22703-7, DJU 12.2.90, P. 1726, TRF, 1ª Região; RE 78.620, RTJ 72/220; REsp 39.937-8,
DJU 5.6.95, P. 16.635, STJ. 4. Apanhado jurisprudencial da obra de Theotônio Negrão (Código de Processo
Civil....... 31ª edição) e de Sérgio Ferraz (Mandado de Segurança – aspectos polêmicos). 5. Agravo regimental
improvido” (AgRg no MS nº 5.690/DF. Rel. Min. Ministro José Delgado. 1ª seção. J. em 13.06.2001. DJ, p. 232,
24 set. 2001).
20
O precedente citado foi o acórdão lavrado pela 2ª Turma do STF, com o voto condutor do Ministro Célio Borja,
disponível em RTJ 123/722.
21
Manual do mandado de segurança. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 117.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 23-34, out./dez. 2010
Variáveis acerca do cabimento de intervenção de terceiros no mandado de segurança 31
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 23-34, out./dez. 2010
32 José Henrique Mouta Araújo
mas que não deve ser considerado óbice a esta modalidade interventiva,
é o indeferimento do requerimento de assistência e eventual recurso
por parte do interessado (art. 51 do CPC).
Conclui-se observando que, se é admitida a assistência em sede
recursal (inclusive o recurso da própria autoridade coatora), não se vis
lumbra óbice para admissão desta modalidade interventiva durante o
próprio procedimento originário do mandamus.
Destarte, ocorrendo hipótese enquadrável no art. 50 do CPC,
deve-se admitir o cabimento de assistência,28 não apenas durante o
seu procedimento originário, mas também em sede de recurso, pela
autoridade coatora,29 ou pelo assistente que intervém no feito desde (ou
a partir) da impetração.
Outro aspecto também complexo refere-se ao cabimento de in
tervenção do amicus curiæ no mandado de segurança.
Como é sabido, esta forma de intervenção passou a ser mais
difundida na legislação brasileira a partir das alterações ocorridas na Lei
nº 6.385/1976, decorrentes da Lei nº 6.616/1978, passando a admitir
a intervenção da Comissão de Valores Mobiliários em processos indivi -
duais. Ela também é prevista nas ações de controle de constitucionali -
dade, nos incidentes de formação de Súmula Vinculante, de repercussão
geral, de recursos especiais repetitivos e mesmo nas hipóteses previstas
no art. 5º, parágrafo único, da Lei nº 9.469/97.
a aceitação da assistência virá, como o litisconsórcio, a ampliar a eficiência do writ como moderno instrumento
de busca da justiça” (Mandado de segurança: assistência e amicus curiae, cit., p. 218).
28
Edmir Netto de Araújo defende que: “é admissível também no mandado de segurança a figura da assistência
de órgão ou entidade, ou de interessado, para auxiliar o impetrado ou o impetrante, a qualquer tempo, em
princípio sem a extensão dos efeitos da sentença a esse interveniente. Naturalmente, para a admissão do
assistente, deve ser comprovado o legítimo interesse, mesmo que indireto, na decisão da lide” (Mandado de
segurança e autoridade coatora. São Paulo: LTr, 2000. p. 70).
29
Registra-se julgado de 1974 em que o STF entendeu o cabimento de assistência da pessoa jurídica de direito
público ao seu funcionário apontado como autoridade coatora. Esta é a decisão: “Mandado de segurança.
– Assistência. Pode a pessoa jurídica de direito público interior como assistente de seu funcionário, apontado
como coator em mandado de segurança. Recurso extraordinário conhecido e provido” (RE nº 78.620/GB
– Guanabara. Relator Min. Rodrigues Alckmin. J. em 20.09.1974. 1ª Turma. DJ, 11 out. 1974). Já no âmbito
do Superior Tribunal de Justiça, em precedente mais recente, admitiu a intervenção assistencial da pessoa
jurídica de direito público: “Mandado de segurança – Processual civil – Assistência – Legitimidade para apelar
– lei 1.533/51 (art. 19). 1. Embora regido por lei especial, ao processo do mandado de segurança aplicam-
se os dispositivos do Código de Processo Civil versando o litisconsórcio e a assistência (art. 19, lei 1.533/51;
arts. 46 a 55, CPC). A pessoa jurídica de direito público pode intervir como assistente. 2. A legitimidade para
recorrer cabe a pessoa jurídica de direito público e não a autoridade coatora. No caso, a fazenda estadual
não tem a representação judicial da pessoa jurídica de direito público, representada pela procuradoria geral
do estado. 3. Admissão da fazenda estadual, como assistente, sem obediência ao incidental procedimento de
impugnação (art. 51, CPC), viciando o processamento da sua apelação e do conseqüente recurso especial. 4.
Recurso não conhecido” (REsp. nº 39.937/.SP – 1ª Turma. Rel. Ministro Milton Luiz Pereira. J. em 17.05.1995.
DJ, p. 16635, 05 jun. 1995).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 23-34, out./dez. 2010
Variáveis acerca do cabimento de intervenção de terceiros no mandado de segurança 33
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 23-34, out./dez. 2010
34 José Henrique Mouta Araújo
fundamento ao menos, a intervenção” (Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático. São
Paulo: Saraiva, 2006. p. 601).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 23-34, out./dez. 2010
Direito Processual e democracia 35
1 Abertura temática
Decisão e totalitarismo — os dois maiores assuntos impregnados de
tirania ao longo da história da humanidade — nunca foram esquecidos.
Ao contrário, foram (e ainda são) objetos de vários estudos e pesquisas.
Do ponto de vista historiográfico, há versões básicas de como a magis
tratura usou e abusou do discurso de autoridade. Embora a acusação
pareça excessiva, o acúmulo de fatos, em detrimento da análise, não deixa
dúvida de que a magistratura apoiou-se em algumas teorias autoritárias.
Como diz Elpídio Nunes, “há de haver uma forte justificativa histórica
para que, em pleno século XXI, ainda visualizemos a jurisdição como
um espírito divino, que desceu a Terra e aqui se incorporou na pessoa
do juiz.”2
Todo esse leque temático está cada vez mais visível a partir da
teoria da relação processual, de Oscar von Bülow, que trouxe à tona um
retrato de como o Direito Processual pode ser usado nas ditaduras para
atingir os seus fins. Contudo, a comentada teoria ainda é revitalizada na
1
Dedico este artigo ao Prof. Dr. Rosemiro Pereira Leal, a quem devo tanto em matéria de aprendizado, porque
me fez descobrir o alcance do compartilhamento decisório do qual já fiz uso tão fecundo nas minhas pesquisas
no recinto do Direito Constitucional. Certamente, as minhas produções teóricas não teriam se tornado reais
sem essa grande referência que é a teoria neoinstitucionalista do processo. Presta-se homenagem também
a André Leal, que desempenhou um papel de primeiro plano em importante tese de doutoramento, o que
permitiu sepultar, de vez, a teoria da relação jurídica bülowiana.
2
NUNES, Elpídio Donizetti. Jurisdição, judicação e tutela legal na teoria do processo contemporâneo. In: LEAL,
Rosemiro Pereira. Estudos continuados de teoria do processo. Porto Alegre: Síntese, 2001. v. 2, p. 237.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 35-43, out./dez. 2010
36 André Del Negri
3
VIEIRA, José Marcos Rodrigues. Da ação cível. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 18.
4
CRUZ E TUCCI, José Rogério; AZEVEDO, Luiz Carlos de. Lições de história do processo civil romano. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1996.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 35-43, out./dez. 2010
Direito Processual e democracia 37
5
WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1980.
6
WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1980. p. 532.
7
BÜLOW, Oscar von. La teoría de las excepciones procesales y los presupuetos procesales. Buenos Aires: Ediciones
Jurídicas Europa-América, 1964.
8
GONÇALVES. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: AIDE, 1992. p. 73-74.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 35-43, out./dez. 2010
38 André Del Negri
9
LEAL, André Cordeiro. Processo e jurisdição no Estado democrático de direito: reconstrução da jurisdição a partir
do direito processual democrático. 2006. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade
Mineira de Direito – PUC, Belo Horizonte, 2006.
10
LEAL, André Cordeiro. Instrumentalidade do processo em crise. Belo Horizonte: Mandamentos, 2008 (Faculdade
de Ciências Humanas – FUMEC).
11
LEAL, André Cordeiro. Processo e jurisdição no Estado democrático de direito: reconstrução da jurisdição a
partir do direito processual democrático, f. 18. Cf. LEAL. Instrumentalidade do processo em crise.
12
LEAL, André Cordeiro. Processo e jurisdição no Estado democrático de direito: reconstrução da jurisdição a partir
do direito processual democrático. 2006. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade
Mineira de Direito – PUC, Belo Horizonte, 2006. f. 32.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 35-43, out./dez. 2010
Direito Processual e democracia 39
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 35-43, out./dez. 2010
40 André Del Negri
15
POPPER, Karl. Conhecimento objetivo: uma abordagem evolucionária. Belo Horizonte: Itatiaia, 1999.
16
FAZZALARI, Elio. Processo-teoria generale. In: Novissimo digesto italiano. Turim: Uter, 1966. v. 13, p. 1072.
“[...] quando no segmento de formação de um provimento, existe contraditório [...]” (Tradução livre).
17
LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria geral do processo. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 94.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 35-43, out./dez. 2010
Direito Processual e democracia 41
dirigida pelo juiz a um dos litigantes, para que este dê ou faça algo em prol
do outro.18 (grifei)
Por isso é que André Leal vai dizer que o paradoxo de Bülow foi
parcialmente superado por Fazzalari, uma vez que o eixo da jurisdição,
para o processualista italiano, ainda está centrado na figura do julgador
(Estado-juiz/poder dos juízes), o que resgata resquícios das “represe n
-
ta
ções gráficas da relação jurídica de Bülow propostas por Wach e
Hellwing”.19 Em consequência, depois de submeter a referida teoria ao
crivo da crítica científica, André Leal respalda-se na teoria neoinstituciona
lista do processo, de Rosemiro Leal,20 a qual mostra-se mais adequada ao
Direito Democrático.
18
FAZZALARI, Elio. Istituzioni de diritto processuale, p. 364. “I provvedmenti giurisdizionali consistono in
‘comandi’ Che il giudice rivolge alle parti e Che svolgono direttamente efficacia nel loro patrimônio [...] Cosi,
il provvedimento (giurisdizionale) civile di ‘codanna’ é um ‘comando’, rivolto dal giudice ad uno dei litiganti,
perché questi dia o faccia alcunché a favore dell’altro.”
19
LEAL, André Cordeiro. Processo e jurisdição no Estado democrático de direito: reconstrução da jurisdição a partir
do Direito Processual Democrático. 2006. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade
Mineira de Direito – PUC, Belo Horizonte, 2006. f. 96.
20
LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria geral do processo. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 35-43, out./dez. 2010
42 André Del Negri
Referências
BÜLOW, Oscar von. La teoría de las excepciones procesales y los presupuetos procesales. Buenos
Aires: Ediciones Jurídicas Europa-América, 1964.
CRUZ E TUCCI, José Rogério; AZEVEDO, Luiz Carlos de. Lições de história do processo civil
romano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996.
FAZZALARI, Elio. Processo-teoria generale. In: Novissimo digesto italiano. Turim: Uter,
1966. v. 13.
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: AIDE,
1992.
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Rio de Janeiro:
Tempo Brasileiro, 1997. v. 1, 2.
LEAL, André Cordeiro. Instrumentalidade do processo em crise. Belo Horizonte: Mandamentos,
2008 (Faculdade de Ciências Humanas – FUMEC).
LEAL, André. O contraditório e a fundamentação das decisões no direito processual democrático.
Belo Horizonte: Mandamentos, 2002.
LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria geral do processo. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
NUNES, Elpídio Donizetti. Jurisdição, judicação e tutela legal na teoria do processo
contemporâneo. In: LEAL, Rosemiro Pereira. Estudos continuados de teoria do processo. Porto
Alegre: Síntese, 2001. v. 2.
POPPER, Karl. Conhecimento objetivo: uma abordagem evolucionária. Belo Horizonte:
Itatiaia, 1999.
VIEIRA, José Marcos Rodrigues. Da ação cível. Belo Horizonte: Del Rey, 2002.
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997.
21
v. 1, 2.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 35-43, out./dez. 2010
Direito Processual e democracia 43
WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
1980.
NEGRI, André Del. Direito processual e democracia. Revista Brasileira de Direito Processual
– RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 35-43, out./dez. 2010.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 35-43, out./dez. 2010
O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 45
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
46 Felipe Scripes Wladeck
1 Introdução
Segundo conhecida lição de Enrico Tullio Liebman,1 difundida
entre os processualistas brasileiros por Cândido Rangel Dinamarco:
“Toda demanda deduzida em juízo como ato inicial de um processo traz
em si a soma de duas pretensões, ou seja, de duas aspirações que o de
mandante apresenta ao juiz em busca de reconhecimento e satisfação.”2
De um lado, há a pretensão ao bem da vida, que é anterior ao
processo jurisdicional. Este é justamente a via de que o interessado
dispõe para pedir o reconhecimento e satisfação de seu direito sobre o
bem, nos casos em que tal reconhecimento e satisfação não se deram
extrajudicialmente ou, então, nos casos em que apenas podem se dar
judicialmente (casos de “jurisdição necessária”, conforme exposto na nota
6 e item 3.4.2). Tal pretensão ao bem da vida, trazida ao processo para
o fim de ser reconhecida e satisfeita, é o que se chama de mérito da causa.
De outro lado, há a pretensão a um provimento jurisdicional
a respeito da pretensão ao bem da vida, i.e., a pretensão a uma provi-
dência do juiz que tenha o condão de garantir o acesso do interessado
ao bem da vida. A apreciação dessa pretensão antecede logicamente a
apreciação da pretensão ao bem da vida, ou seja, antecede o julgamento
do mérito da causa.
LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de direito processual civil. Tradução e notas de Cândido Rangel Dinamarco. 3.
1
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 47
Ibid., p. 39-40.
3
VERDE, Giovanni. Profili del processo civile: parte generale. 2. ed. Napoli: Jovene, 1988. v. 1, p. 134; MANDRIOLI,
4
Crisanto. Corso di diritto processuale civile: nozioni introduttive e disposizioni generali. Torino: G. Giappichelli,
2000. (Editio minor). v. 1, p. 102-103; MONTELEONE, Girolamo. Diritto processuale civile. 3. ed. Padova:
Cedam, 2002. p. 191-192; ATTARDI, Aldo. Diritto processuale civile: parte generale. Padova: Cedam, 1994. v.
1, p. 124.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
48 Felipe Scripes Wladeck
5
Quando uma das partes da relação de direito material resiste a pretensão da outra a determinado bem da vida,
tem-se o que Francesco Carnelutti chamou de “lide” [CARNELUTTI, Francesco. Lezioni di diritto processuale civile.
Pádua: Cedam, 1986. (Ed. fac-símile da edição de 1926). v. 1, p. 130]. Sendo vedada, como regra, a autotutela
no ordenamento brasileiro, o recurso ao Poder Judiciário torna-se necessário para solucionar a lide.
6
Já quando o reconhecimento e satisfação da pretensão simplesmente não podem se dar espontaneamente,
exigindo-se para tanto a tutela jurisdicional, tem-se a chamada “jurisdição necessária”: apenas o Judiciário pode
dizer quem tem o direito. Ou seja, nos casos de jurisdição necessária, a atuação do direito material depende
da intervenção judicial. Pouco importa se existe ou não resistência de uma das partes em face da pretensão
da outra ao bem da vida. O concurso do Judiciário será sempre necessário para satisfazer a pretensão, por
força de lei. Veja-se o caso de anulação de casamento. De nada adianta os cônjuges estarem de acordo com
a anulação do casamento. Somente o Judiciário pode dizer se existe o vício ou não e, havendo, “anular”
o casamento. Mas note-se que a necessariedade da intervenção judicial é absolutamente excepcional no
ordenamento pátrio — e isso não apenas no âmbito das relações de direito privado, mas também nas de
direito público. De um modo geral, os estados de insatisfação e crises de direito material podem ser eliminados
independentemente da intervenção judicial. Nesse sentido: TALAMINI, Eduardo. A (in)disponibilidade do
interesse público: conseqüências processuais (composições em juízo, prerrogativas processuais, arbitragem e
ação monitória). Revista de Processo, São Paulo, n. 128, p. 61-62, out. 2005.
7
CRUZ E TUCCI, José Rogério. A causa petendi no processo civil. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p.
130. No mesmo sentido: BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo: influência do direito material
sobre o processo. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 115.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 49
ao juiz conceder ao autor mais do que fora pedido, ou por razões diversas
das deduzidas na inicial, estar-se-ia possibilitando a tutela jurisdicional
de ofício. Tudo o que excedesse os limites objetivos da demanda impli
caria atuação sem provocação.”8
Vê-se, pois, que a fixação dos limites objetivos da atuação jurisdicional exige
a exata compreensão do conteúdo da causa de pedir. A depender da configuração
que se lhe atribua — e é ao legislador que compete tal tarefa — aqueles
referidos limites serão mais ou menos estreitos. Assim, entendendo-se
que os fatos constitutivos do direito alegado integram a causa de pedir,
a atuação jurisdicional não poderá basear-se em outros além daqueles
oportunamente descritos pelo demandante. De outra parte, se os fatos
constitutivos do direito forem tidos como não integrantes da causa de
pedir, o julgador não ficará preso àqueles descritos pelo demandante,
podendo inclusive se amparar em outros dos quais tenha tomado
conhecimento de ofício.
Depois, a exata definição do conteúdo da causa de pedir revela-
se importante também quando se pensa no exercício do contraditório e
da ampla defesa por parte do demandado. Caso se repute que a causa
de pedir (ativa)9 resume-se à pura e simples afirmação do direito sobre
um dado bem da vida, não incluindo os respectivos fatos constitutivos,
o demandado tende a ter maiores dificuldades para se defender: não
havendo um momento preclusivo para o demandante alegar os fatos
constitutivos do seu pretenso direito, o demandado terá de estar sempre
preparado para se manifestar a respeito de inovações que em relação a
eles aquele eventualmente venha a realizar. Por outro lado, caso se enten
da que os fatos constitutivos do pretenso direito também integram a
causa de pedir, o demandante haverá de decliná-los até determinado
momento processual, sob pena de preclusão. Ou seja, a livre alteração dos
fatos constitutivos não será admitida, a fim de que a causa de pedir possa se estabi
lizar. Ademais, apenas em relação aos fatos constitutivos oportunamente
alegados é que o demandado haverá de se defender. O julgador sequer
poderá conhecer de outros além daqueles tempestivamente indicados
pelo demandante.
A compreensão da causa petendi permite, outrossim, resolver diversas
questões de ordem processual, entre as quais, a da coisa julgada, a da
8
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Os elementos objetivos da demanda examinados à luz do contraditório.
In: CRUZ E TUCCI, José Rogério; BEDAQUE, José Roberto dos Santos et al. (Coord.). Causa de pedir e pedido
no processo civil: questões polêmicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 24-25.
9
Sobre o conceito de causa de pedir ativa, vide o item 2.3.3.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
50 Felipe Scripes Wladeck
10
VERDE, op. cit., p. 135. No mesmo sentido: VIANA, Juvêncio Vasconcelos. A causa de pedir nas ações de
execução. In: CRUZ E TUCCI, José Rogério; BEDAQUE, José Roberto dos Santos (Coord.). Causa de pedir e
pedido no processo civil: questões polêmicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 91.
11
MONTELEONE, op. cit., p. 192. A doutrina parece, aliás, estar assente quanto a isso. A mesma conclusão pode
ser encontrada, por exemplo, nas obras dos seguintes autores: LEONEL, Ricardo de Barros. A causa petendi
nas ações coletivas. In: CRUZ E TUCCI, José Rogério; BEDAQUE, José Roberto dos Santos (Coord.). Causa de
pedir e pedido no processo civil: questões polêmicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 128; VIANA,
op. cit., p. 91.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 51
12
MANDRIOLI, op. cit., p. 106.
13
Ibid., p. 107.
14
MONTESANO, Luigi; ARIETA, Giovanni. Diritto processuale civile. 3. ed. Torino: Giappichelli, 1999. v. 1, p.
176. Em semelhantes termos: LEONEL, op. cit., p. 129; OLIVEIRA, Bruno Silveira de. Conexidade e efetividade
processual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 43.
15
Como se verá mais adiante, no item 2.3.3, a causa de pedir se divide em ativa e passiva. As divergências que
existem entre as teorias da substanciação e da individuação estão restritas ao conteúdo da causa de pedir
ativa. Para ambas, o conteúdo da causa de pedir passiva compõe-se pelos fatos violadores ou ameaçadores
do direito alegado, seja qual for a natureza do direito alegado — entendimento este que merece ressalvas,
para que se possa explicar o conteúdo da causa de pedir passiva nas ações necessárias (vide o item 3.4.2).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
52 Felipe Scripes Wladeck
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 53
17
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Tradução de Paolo Capitanio e anotações de
Enrico Tullio Liebman. 4. ed. Campinas: Bookseller, 2009. p. 438.
18
Bruno Silveira de Oliveira, igualmente, explica que, para os adeptos da teoria da individuação, o fato constitutivo
do direito pode ser alegado na nova demanda desde que “... não pudesse haver sido deduzido ao tempo da
primeira demanda, por se tratar de fato superveniente; que, por seu turno, implicará um direito superveniente
e, destarte, não alcançado pelos limites temporais da coisa julgada” (OLIVEIRA, op. cit., p. 53, nota de rodapé
60, sem grifo no original).
19
Nas palavras de Chiovenda: “Em especial, na ação de reivindicação basta a afirmação de ser proprietário de
determinado objeto a fim de que a identificação seja plena, e não é, com efeito, necessário indicar o fato jurídico
em virtude do qual se tornou proprietário; isso pode ser necessário para provar a existência da relação jurídica
de propriedade, não, porém, para identificar a ação” (CHIOVENDA, op. cit., p. 437, sem grifo no original).
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54 Felipe Scripes Wladeck
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 55
22
MONTELEONE, op. cit., p. 197-198.
23
CHIOVENDA, op. cit., p. 438.
24
LIEBMAN, op. cit., p. 250.
25
LEONEL, op. cit., p. 131.
26
OLIVEIRA, op. cit., p. 44-46.
27
“Per i diritti eterodeterminati la causa petendi svolge uma funzione di vera e propria polarizzazione, che s’incentra
sull’identificazione del fatto, tale da implicare, almeno tendezialmente, anche il petitum: con la conseguenza
che il mutamento del fatto costitutivo comporta sempre il mutamento del diritto fatto valere” (MONTESANO;
ARIETA, op. cit., p. 176).
28
VERDE, op. cit., p. 136.
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56 Felipe Scripes Wladeck
Id.
31
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58 Felipe Scripes Wladeck
Logo, para ambas as teorias, não é possível alterar livremente, no curso do processo, os fatos violadores ou
35
ameaçadores alegados para justificar a necessidade da tutela jurisdicional. A causa de pedir (tanto a ativa
quanto a passiva, seja qual for a sua composição) não pode ser alterada depois de estabilizada a demanda;
e, antes disso, existem limites legais a modificações na causa de pedir. Sobre a estabilização da demanda no
ordenamento jurídico brasileiro, vide o item 4.6, a seguir.
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 59
36
Oliveira expõe isso com muita clareza: OLIVEIRA, op. cit., p. 43 et seq.
37
LEONEL, op. cit., p. 134.
38
Ibid., p. 135.
39
“Como, na teoria da substanciação, o que interessa para a identificação da causa petendi ativa são os fatos
constitutivos do direito afirmado pelo autor, então a adução de novas alegações fáticas, como supostas
aquisições de direitos, importará modificação da demanda. Já para a teoria da individuação — sempre,
frisemos, em se tratando de demandas autodeterminadas (pois com relação às heterodeterminadas vimos
que as teorias se equiparam) — a dedução de alegações fáticas diversas daquelas que constam do libelo
não configura, por si só, modificação da causa petendi ativa. Desde que as novas alegações conduzam ao
mesmo direito afirmado pelo autor, não se poderá sustentar haja ocorrido modificação alguma, já que, para
os postulados da individuação, a causa de pedir ativa, por estar compreendida nos limites do direito afirmado,
haverá conservado sua identidade” (OLIVEIRA, op. cit., p. 51-52).
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60 Felipe Scripes Wladeck
40
Nas palavras de Leonel: “Partindo-se da substanciação da demanda, em sistemas que adotem restrições à sua
alteração após a propositura, qualquer mudança relacionada aos fatos constitutivos leva à modificação proscrita
da causa de pedir. Entretanto, ficam excluídos da eficácia preclusiva da coisa julgada os fatos não alegados
pelo autor, que poderão fundamentar, futuramente, outra demanda a respeito do mesmo direito. Nota-se,
assim, que os fatos constitutivos são imperativos para a identificação da ação, o estabelecimento dos limites
à atuação jurisdicional, à possibilidade de modificação da demanda e para a própria coisa julgada” (LEONEL,
Ricardo de Barros. Causa de pedir e pedido: o direito superveniente. São Paulo: Método, 2006. p. 88).
41
OLIVEIRA, op. cit., p. 53. É que também ensina Leonel: “Já na teoria da individuação da demanda, como esta
se identifica pelo conteúdo do direito deduzido, ficam absorvidos todos os fatos que servem à sustentação
do direito invocado em juízo. Inviabiliza-se que, em ulterior ação, seja formulada a mesma pretensão, com
amparo em fatos já existentes na época da primeira ação, ainda que não alegados” (LEONEL. Causa de pedir...,
p. 88-89).
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 61
42
Como se demonstrará no item 5, o Projeto de Novo CPC em trâmite no Congresso Nacional propõe a substituição
das regras hoje existentes para a alteração da causa de pedir no curso do processo, a fim de permitir que a sua
alteração ou aditamento possa ser realizado enquanto não proferida a sentença — desde que não caracterizada
a má-fé do demandante e, ademais, a modificação não gere prejuízos ao demandado.
43
LEONEL. A causa..., p. 134.
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62 Felipe Scripes Wladeck
Ressalve-se que causa de pedir não se confunde com causa excipiendi. Esta consiste nos fundamentos de fato e
46
de direito da defesa do demandado. Ao lado daquela, forma o objeto de conhecimento do juiz (DINAMARCO,
Cândido Rangel. O conceito de mérito em processo civil. In: DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do
processo civil moderno. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. t. I, p. 322-328). No presente trabalho, como indica
o título, o objetivo é tratar apenas e tão somente da causa de pedir.
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 63
47
“Aos fundamentos jurídicos do pedido, ou seja, à demonstração de que os fatos jurídicos afirmados pelo autor
levam à conseqüência requisitada, a doutrina denominou causa petendi próxima” (COSTA, Susana Henriques
da. Condições da ação. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 93).
48
MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 25. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 17.
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64 Felipe Scripes Wladeck
números dos artigos de lei em que baseia o seu pedido. Aliás, nem mesmo
a errônea capitulação legal conduz à inépcia. O que o requisito impõe
é que, expostos os fatos, passe o autor a demonstrar as conseqüências
jurídicas que dos fatos entende resultantes. Ou seja, que a relação jurídica
conflituosa emergiu dos fatos narrados. Portanto, o fundamento jurídico
nada mais é do que o nexo de causalidade entre os fatos e o pedido.
Ou, ainda, é a demonstração de que dos fatos apresentados surgiu para
o autor o direito que busca obter no pedido.”49
Na ordem processual civil brasileira, o fundamento legal, distin
tamente da fundamentação jurídica, não integra a causa de pedir. Não se
exige do demandante, no inciso III do art. 282 do CPC nem em qual
quer outro dispositivo legal, o enquadramento dos fatos por ele narrados
em uma específica hipótese de incidência normativa ( fattispecie).
Ademais, ao juiz é dado decidir o feito com base em norma diversa
daquela invocada pelas partes — o que se deve ao princípio segundo o
qual iura novit curia. O autor pode, outrossim, invocar, no curso do
processo, norma diversa daquela suscitada na petição inicial. Apenas
se impõe que sejam observados os limites dos fundamentos de fato e dos efeitos
jurídicos pleiteados.
A mesma conclusão é exposta por Chiovenda, no tocante ao
direito processual civil italiano: “... a simples mudança do ponto de vista
jurídico (ou seja, a invocação duma norma diferente no caso em que
um fato possa incidir em diferentes normas de lei) não importa diversi-
dade de ações; é lícita, portanto, assim à parte como ao juiz.”50
Mas ressalve-se, com Cruz e Tucci, que “... a liberdade outorgada
ao órgão jurisdicional de eleger a norma a ser aplicada, até mesmo inde
pendentemente de sua invocação pelo interessado, não dispensa a colheita
de prévia manifestação das partes sobre os novos rumos a serem impri
midos à solução do litígio, em homenagem à regra do contraditório.”51
Nesse mesmo sentido, Bedaque: “Mesmo a liberdade na aplicação da
regra jurídica deve ser examinada à luz do contraditório. O brocardo iura
novit curia significa a possibilidade de o juiz valer-se de norma não invocada
pelas partes, desde que atendidos os limites quanto ao pedido e à causa de
pedir. Isso não significa, todavia, desnecessidade de prévia manifestação
49
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo e
processo de conhecimento. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. v. 1, p. 337.
50
CHIOVENDA, op. cit., p. 435.
51
CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 211.
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 65
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66 Felipe Scripes Wladeck
norme sulla locazione, sarebbe ancora quella stessa azione che è coperta
dal giudicato, e perciò sarebbe preclusa.”53
É o que também ensina Cruz e Tucci: “Embora o nomen iuris e/ou
o fundamento legal porventura invocado pelo autor possa influenciar
o raciocínio do julgador, não há qualquer impedimento, dada a incidên
cia do aforismo iura novit curia, a que este requalifique juridicamente
a demanda, emoldurando-a em outro dispositivo de lei: o juiz goza de
absoluta liberdade, dentro dos limites fáticos aportados no processo, na
aplicação do direito, sob o enquadramento jurídico que entender per
tinente (art. 126). E isto, certamente, ainda que ambos os litigantes este
jam concordes com a tipificação legal deduzida na peça vestibular”.54
Parece-nos que também a eventual requalificação jurídica dos fatos proce
dida pelo juiz deve ser submetida ao contraditório das partes. Afinal, como
Cruz e Tucci mesmo observa na passagem acima transcrita, “o raciocínio
do julgador” pode ser eventualmente influenciado pelo fundamento
legal invocado pelo autor e, outrossim, pelo nomen juris dado aos fatos
da causa.
53
MANDRIOLI, op. cit., p. 104-105.
54
CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 208.
55
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. v. 2,
p. 185 et seq.
56
Ibid., p. 139.
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 67
que o art. 474 gera especialmente para o réu (ver as notas de rodapé
112 e 113).
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68 Felipe Scripes Wladeck
na formação da vontade concreta da lei. Quando se muda o fato simples ou motivo, mas para deduzir-lhe o
mesmo fato jurídico, não há diversidade de ação; não há mudança de demanda; perdura a exceção de coisa
julgada” (CHIOVENDA, op. cit., p. 435).
62
PINTO, Junior Alexandre Moreira. A causa petendi e o contraditório. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
p. 41.
63
TALAMINI, Eduardo. Coisa julgada e sua revisão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 77.
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 69
Ibid., p. 78.
64
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70 Felipe Scripes Wladeck
Mas é claro que as coisas não se passam desse modo. O absurdo a que
o entendimento acima conduziria deixa patente que, no exemplo
cogitado, cada evento entre o réu e terceiro (seja o terceiro sempre uma mesma
pessoa ou não) deve ser considerado um fato principal, i.e., uma causa de pedir
autônoma. Nada impediria, nesse passo, que na nova ação o autor alegasse
evento de adultério não referido — propositadamente ou não — no
processo anterior, pouco importando se superveniente ou não.
Quando o autor deixa de alegar um episódio específico de adul -
tério no processo, quando dele tinha conhecimento, simplesmente
reduz suas chances de obter êxito no feito. Nada o impedirá, porém, de
alegá-lo em processo subsequente. Não caberá falar em litispendência
ou coisa julgada.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 71
67
Na verdade, como destaca Costa: “Se, por último, busca-se uma tutela declaratória, não há propriamente uma
violação ao direito do autor, mas sim um ato do réu que ponha em dúvida uma situação jurídica de titularidade
deste” (COSTA, op. cit., p. 90).
68
Vide a nota 5, acima.
69
Faz-se referência em especial às ações necessárias de jurisdição contenciosa.
70
Antônio Cláudio da Costa Machado, em estudo sobre a questão, sustenta que jamais haveria a lide carneluttiana
nas ações necessárias. Para o autor, não podendo um sujeito subordinar o seu interesse ao de outro nos casos
de ação necessária, não faria sentido falar em relação a eles em pretensão (compreendida justamente como a
exigência de subordinação do interesse de outrem ao próprio) nem em resistência a pretensão (pois a lei veda
a possibilidade de resistir). Logo, não caberia falar em lide (MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Jurisdição
voluntária, jurisdição e lide. Revista de Processo, São Paulo, n. 37, p. 68-84, jan./mar. 1985).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
72 Felipe Scripes Wladeck
71
FREDERICO MARQUES, José. Ensaio sobre a jurisdição necessária. Campinas: Millennium, 2000. p. 120-121.
Na referida obra, o autor defende que a jurisdição voluntária teria natureza administrativa, justamente por não
se referir a lides. A seu ver, a jurisdição seria atividade necessariamente desenvolvida em torno de lides. Sendo
assim, apenas a jurisdição contenciosa seria verdadeira jurisdição. Para explicar a natureza jurisdicional das
ações necessárias de jurisdição contenciosa é que Frederico Marques recorre ao argumento de “contencioso
fictício” ou “lide presumida”.
72
Conflito coincide com insatisfação, como fenômeno psíquico decorrente da carência de um bem desejado.
Ou seja, conflito é uma “... situação objetiva caracterizada por uma aspiração e seu estado de não-satisfação,
independentemente de haver ou não interesses contrapostos. De tão amplo, esse conceito abrange os casos
em que inexiste lide (no sentido puro carneluttiano) e não se expõe às criticas dirigidas ao sistema centrado
nesta (além do mais, não é uma idéia colocada ao centro da teoria do processo, à moda de Carnelutti)”
(DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 141,
nota 151).
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 73
73
MACHADO, op. cit., p. 68.
74
DINAMARCO, Cândido Rangel. Procedimentos especiais de jurisdição voluntária. In: Fundamentos do processo
civil moderno. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. t. I, p. 380-384.
75
GRECO, Leonardo. Jurisdição voluntária moderna. São Paulo: Dialética, 2003. p. 15-21.
76
TESHEINER, José Maria Rosa. Jurisdição voluntária. Rio de Janeiro: Aide, 1992. p. 40 et seq.
77
LUCENA, João Paulo. Natureza jurídica da jurisdição voluntária. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1996. p.
127-129.
78
Oliveira, tratando das ações constitutivas necessárias, afirma que não possuem elas causa de pedir passiva. A
necessidade da tutela existiria, a seu ver, em abstrato. Decorreria “... da circunstância de o sistema não permitir
ao titular do direito potestativo, senão por meio do processo, a obtenção da alteração jurídica pretendida”
(OLIVEIRA, op. cit., p. 65).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 75
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78 Felipe Scripes Wladeck
4.2 O art. 282, inciso III, do CPC traz regra “tradicional” na legislação
brasileira (os Códigos de Processo Civil estaduais e o art. 158, inciso
III, do CPC de 1939)
Como lembra Cruz e Tucci, no período da “dualidade processual”,
muitos Códigos estaduais continham regra estabelecendo que na inicial
82
BEDAQUE. Os elementos..., p. 29; LEONEL. Causa de pedir..., p. 88; PINTO, Junior Alexandre Moreira. Sistemas
rígidos e flexíveis: estabilização da demanda. In: CRUZ E TUCCI, José Rogério; BEDAQUE, José Roberto dos
Santos (Coord.). Causa de pedir e pedido no processo civil: questões polêmicas. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. p. 63-64; VIANA, op. cit., p. 96.
83
CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 161.
84
“Como facilmente se percebe, o ônus de afirmar tem a dupla finalidade de (a) oferecer elementos ao adversário
para a efetividade de sua defesa, sabendo o que negar e o que afirmar contrariamente; e (b) delimitar a área
da tutela jurisdicional postulada, não podendo o juiz decidir com fundamento em fatos não alegados (CPC,
arts. 128 e 460)” (SILVA DINAMARCO, Pedro da. Ônus processuais: limites à aplicação das conseqüências
previstas para o seu não-cumprimento. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo,
Departamento de Direito Processual Civil, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007. f. 101).
85
Segundo os adeptos da teoria da individuação, os fatos violadores ou ameaçadores do pretenso direito do
demandante não podem ser livremente alterados. Isso porque, também para eles, esses fatos integram a causa
de pedir passiva. Vide, a respeito, o exposto nos itens 2.3.3 e 2.4, alínea (d).
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 79
Sobre a causa de pedir passiva nas ações necessárias, vide os itens 2.3.3 e 3.4.2.
87
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 81
91
BUENO, op. cit., p. 973, notas ao art. 295.
92
CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 172.
93
O art. 295, parágrafo único, inciso II, do CPC estabelece que a inicial será inepta quando da narração dos
fatos não decorrer logicamente a conclusão. Também esse dispositivo compreende a hipótese de falta de
fundamentação jurídica (que nada mais é do que a correlação lógico-jurídica entre os fatos e o pedido). Mas
não só isso. A regra merece ser interpretada de modo mais amplo. Ela exige que a inicial seja um arrazoado
lógico e coerente em todos os seus aspectos. A versão dos fatos apresentada não pode ser contraditória ou
obscura nem conflitar, logicamente, com as diversas conclusões parciais contidas na petição. Trata-se, enfim,
de regra ampla, que visa em última análise a assegurar a compreensibilidade da inicial e a possibilidade do
pleno exercício do contraditório e ampla defesa pelo demandado.
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82 Felipe Scripes Wladeck
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São Paulo: Malheiros, 2006.
94
p. 195-196.
BUENO, op. cit., p. 895, notas ao art. 282.
95
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 83
Ibid., p. 19.
97
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dos fatos, porque fora destes o juiz jamais poderá julgar (art. 128) e é dos
fatos narrados que o réu se defenderá (...). Da causa de pedir, somente
a narrativa dos fatos se estabiliza, até porque, quanto aos fundamentos
jurídicos, o próprio juiz pode trazer outros diferentes dos que o autor
haja alegado (narra mihi factum dabo tibi jus).”105
“Já os fatos instrumentais, que apenas confirmam os essenciais, sempre podem ser conhecidos de ofício pelo
106
juiz, independentemente de serem supervenientes ou não. Aliás, fatos instrumentais não podem ser deduzidos
como causa de pedir de nova demanda, incidindo sobre eles — e não sobre os essenciais — o art. 474 do
Código de Processo Civil” (SILVA DINAMARCO, op. cit., p. 182).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 45-106, out./dez. 2010
O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 87
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Id.
108
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 89
110
Por exemplo, se o demandante pede a anulação de contrato por motivo de vício de vontade, não pode o juiz
declará-lo nulo por incapacidade absoluta de ofício ou a pedido do autor, com base no art. 462. Embora a
incapacidade absoluta seja matéria passível de ser conhecida até mesmo de ofício, não poderia ser considerada
no processo imaginado, vez que implicaria alteração da causa de pedir — e, também, do pedido (BEDAQUE.
Os elementos..., p. 47-48).
111
DINAMARCO. Instituições..., v. 2, p. 76.
112
Mas nada impede que o fato essencial superveniente (não oportunamente alegado) venha a embasar nova
ação do autor, contra o mesmo réu e com o mesmo pedido. É que nesse caso a causa de pedir será diversa,
de modo que não incidirá o óbice da coisa julgada. Aliás, também um fato essencial já existente ao tempo
do processo anterior e que nele não tenha sido alegado poderá ensejar uma nova ação do autor. A eficácia
preclusiva da coisa julgada (art. 474) não atinge fatos essenciais de interesse do autor que não tenham sido
alegados, i.e., não abrange causas de pedir não deduzidas ou dedutíveis, mas apenas fatos que lhe sejam
acessórios.
113
Quanto à causa excipiendi, o entendimento é diverso. Ao réu é permitido alegar, após a contestação, fatos
supervenientes (ou até mesmo fatos anteriores, desde que justificadamente os desconhecesse nem sejam eles
incompatíveis com os já narrados na contestação) que a alterem e, eventualmente, fulminem a pretensão
do autor (v.g., art. 303 do CPC). Isso se deve ao fato de o art. 474 atingir com maior intensidade a causa
excipiendi, impedindo que o réu obtenha futuramente, com base em qualquer argumento de defesa deduzido
ou que fosse dedutível no processo anterior, decisão oposta à coisa julgada nele formada.
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119
CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 153-155. As mesmas referências podem ser encontradas, quase todas, em outro
trabalho de Cruz e Tucci (CRUZ E TUCCI, José Rogério. Questões práticas de processo civil. São Paulo: Atlas,
1998. p. 22-24).
120
MOREIRA, op. cit., p. 17.
121
CARMONA, op. cit., p. 20.
122
BUENO, op. cit., p. 895, notas ao art. 282.
123
TALAMINI, op. cit., p. 73.
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130
OLIVEIRA, op. cit., p. 55.
131
OLIVEIRA, op. cit., p. 56.
132
MESQUITA, José Ignacio Botelho de. A causa petendi nas ações reivindicatórias. Revista de Direito Processual
Civil, São Paulo, v. 6, p. 197, 1967.
133
CARVALHO, Milton Paulo. Do pedido no processo civil. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1992. p. 92-93.
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96 Felipe Scripes Wladeck
134
OLIVEIRA, op. cit., p. 56-57.
135
Texto do Projeto disponível em: <http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf>.
136
Para acompanhar a tramitação do Projeto no Senado Federal, acessar o seguinte site: <http://www.senado.
gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=97249>.
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das decisões judiciais, previsto no art. 165 do CPC e no art. 93, inciso
IX, da Constituição Federal.
***
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 99
137
O que significa que o juiz pode, conforme as particularidades do caso, ampliar esse prazo.
138
Imagine-se que o demandante protocola petição requerendo a modificação da causa de pedir quando os
autos já estão “conclusos para sentença”. Se a sentença ainda não houver sido proferida, o juiz, tomando
conhecimento da existência da petição, pode-deve (se presente a boa-fé do demandante e ainda for possível
ao demandado exercer seu direito de defesa) acolher a modificação.
139
Especialmente após a fase de saneamento, não deverão ser admitidas alterações no pedido e/ou na causa
de pedir que não tenham sido realizadas anteriormente por simples desídia do demandante ou, então, de
forma planejada, com o objetivo de causar “surpresa” ao demandado e dificultar a sua defesa.
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O art. 267, §4º, do CPC utiliza, porém, na sua parte inicial, no lugar de “oferecida a contestação”, a expressão
140
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 101
141
O Projeto mantém, inclusive, a regra que consta, hoje, no art. 517 do CPC, que prevê limite para a alegação,
em sede de apelação, de “questões de fato não propostas no juízo inferior” — o que não inclui fatos aptos
a alterar a causa de pedir, aos quais se aplicam as regras dos arts. 264 e 294 do CPC (conforme: MIRANDA,
Gilson Delgado. Comentários aos artigos 274 a 281, 496 a 521 e 530 a 538. In: MARCATO, Antonio Carlos
(Coord.). Código de Processo Civil interpretado. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 1.766, notas ao art. 517).
Confira-se o art. 927 do Projeto (houve apenas uma correção formal, com a eliminação de uma vírgula que,
no art. 517 do CPC, está mal posicionada).
142
Reitere-se: o dispositivo não trata de alterações na causa de pedir.
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102 Felipe Scripes Wladeck
***
Como se vê, são poucas as mudanças pretendidas com o Projeto
acerca do conteúdo da causa de pedir.
A causa de pedir continuará sendo eminentemente fática, caso as
regras acima venham a ser aprovadas tal como apresentadas ao Con -
gresso. A ausência de indicação dos fatos constitutivos do direito alegado
(além dos fatos violadores desse mesmo direito) já na petição inicial
implicará a inépcia desta — a exemplo do que se passa hoje, na sistemá
tica do CPC. Isso porque os fatos continuarão sendo indispensáveis para
a identificação do direito no qual se funda a pretensão.
Depois, o juiz não poderá decidir com base em fatos jurígenos
(constitutivos e violadores ou ameaçadores do pretenso direito) diversos
daqueles devidamente alegados pelo autor. Com efeito, o art. 475 do
Projeto não permite que o juiz conheça de fatos jurígenos de ofício,
i.e., não permite que ele modifique a causa de pedir remota (ativa ou
a passiva) por conta própria. Apenas o autor é que pode fazê-lo, mas
sempre mediante a observância dos limites legais.
Mudarão, é verdade, os limites legais para a alteração ou adita -
mento da causa de pedir (remota). As limitações dos arts. 264 e 294 do
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 103
CPC serão substituídas pelas do art. 314 do Projeto, mais brandas do que
aquelas. Isso não significa, porém, que o princípio da eventualidade
será abandonado ou que os fatos deixarão de ter importância para a
identificação da causa de pedir e da demanda.
O princípio da eventualidade continuará sendo acolhido justa -
mente na medida em que continuará havendo limites à modificação
dos fatos constitutivos e, também, dos fatos violadores ou ameaçadores
do direito alegado. Vale dizer: esses fatos deverão ser necessariamente
alegados já na petição inicial. Antes da citação, poderão ser livremente
alterados ou aditados pelo demandante. Depois da citação, porém, os
fatos apenas poderão ser aditados ou alterados pelo demandante se,
além de presente a boa-fé deste, a modificação não for apta a gerar
prejuízos ao direito de defesa do demandado. Ademais, proferida a sen
tença, simplesmente não haverá mais como modificar os fatos jurígenos: terá
sido ultrapassada a “fase-limite” do processo até a qual modificações
em relação aos fatos jurígenos ou principais são em tese possíveis (“pre-
clusão por fase do processo”, modalidade de preclusão temporal).
Por todas essas razões, conclui-se que, com a eventual entrada em
vigor do “Novo CPC”, não se deixará de adotar no ordenamento jurí -
dico brasileiro a teoria da substanciação. A causa de pedir continuará
sendo integrada pelos fatos constitutivos do direito alegado — além dos
fatos violadores ou ameaçadores.143 Sem que esses fatos tenham sido
devida e oportunamente especificados nos autos, o direito alegado não
estará devidamente identificado e, por conseguinte, o mérito da causa
não poderá ser julgado.
6 Considerações finais
A teoria da individuação e a teoria da substanciação, como se
expôs, divergem apenas em relação ao conteúdo da causa de pedir ativa
das demandas que os adeptos da primeira chamam de autodeterminadas.
Para teoria da individuação, tal conteúdo seria formado apenas pelo direito
afirmado sobre um dado bem da vida. Para a teoria da substanciação, seria
ele composto também pelos fatos constitutivos do direito afirmado.
Em relação ao conteúdo da causa de pedir ativa das demandas
heterodeterminadas e em relação ao conteúdo da causa de pedir passiva
Sobre a causa de pedir passiva nas demandas necessárias, faz-se remissão, mais uma vez, ao exposto nos
143
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O conteúdo da causa de pedir no processo civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC 105
Abstract: This paper analysis the content of the cause of action in Brazilian
Civil Procedure Law. It shows that the Civil Procedure Code adopts the
“substantiation theory”, by requiring that the plaintiff indicate the facts that
constitute the alleged right (be it “relative” or “absolute” in nature) in the
Id.
145
Está-se a referir justamente às consequências práticas que a adoção da teoria da substanciação implica.
146
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106 Felipe Scripes Wladeck
Statement of Claim and, moreover, by limiting the cases in which these facts
may be changed at later points in the procedure. This conclusion will not be
affected by the New Civil Procedure Code Project (Senate Bill 166/2010), if
it is approved and sanctioned as presented to the National Congress.
Key words: Content of the cause of action. Brazilian civil procedure law.
Substantiation theory and individuation theory. New Civil Procedure Code
Project.
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A presunção judicial no Estado Democrático de Direito: uma análise crítica do artigo 335 do Código... 107
1 Introdução
Ao mesmo tempo em que a presunção iuris é objeto de vários manuais
e textos jurídicos, a presunção simples, não obstante sua relevância
histórica e jurídica, recebe da doutrina pátria um tratamento escasso e
superficial, o que inviabiliza uma abordagem mais rigorosa e atualizada
da matéria, dentro do contexto do Estado Democrático de Direito.
O presente trabalho visa a suprir, ainda que minimamente, a omis
são que vem sendo perpetrada quanto à presunção judicial, mediante
uma análise crítica do artigo 335 do Código de Processo Civil. Para
tanto, serão expostas as teorias sobre o processo atualmente adotadas
e defendidas no Brasil, bem como os paradigmas constitucionais que
E-mail: <henriqueyukio@gmail.com>.
1
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A presunção judicial no Estado Democrático de Direito: uma análise crítica do artigo 335 do Código... 115
3 A prova
A palavra prova vem do latim probatio, podendo ser traduzida como
verificação, reconhecimento ou confirmação. Segundo Fernando Capez,
a prova é:
[...] o conjunto de atos praticados pelas partes, pelo juiz e por terceiros, des
tinados a levar ao magistrado a convicção acerca da existência ou inexistência
de um fato, da falsidade ou veracidade de uma afirmação. Trata-se, portanto, de
todo e qualquer meio de percepção empregado pelo homem com a finalidade
de comprovar a verdade de uma alegação. (CAPEZ, 2003, p. 251)
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A presunção judicial no Estado Democrático de Direito: uma análise crítica do artigo 335 do Código... 117
5 Presunção
O termo presunção procede do latim ‘praesumptione’, juízo, concepção
anterior a qualquer experiência, ideia inata (ACQUAVIVA, 2000, p. 1.060).
O aspecto filológico se aproxima do sentido jurídico da palavra, defi
nido por Sergio Carlos Covello como o convencimento antecipado da verdade
provável a respeito de um fato desconhecido, obtida mediante fato conhecido e
conexo (COVELLO, 1983, p. 19). A ideia da probabilidade da verdade
é, para ele, inseparável da noção de presunção, vez que esta parte de um
fato para chegar a outro, que permanece, todavia, insuficientemente conhecido,
e, portanto, sujeito à comprovação diversa (COVELLO, 1983, p. 25).
Para Vicente Greco Filho, a presunção é uma forma de raciocínio do
juiz, o qual, de um fato provado, conclui a existência de outro que é relevante
para produzir a consequência pretendida (GRECO FILHO, 2008, p. 209).
Arruda Alvim estabelece uma relação entre as chamadas provas
indiretas — chamadas por Luiz Guilherme Marinoni de provas indiciárias
— e as presunções, definindo-as em seguida:
A prova tida por indireta ou lógica o é, precisamente, por não se retratar nela
mesma o fato probando; pelo contrário, retrata-se nela, apenas, um outro fato, a
que muitos denominam de fato auxiliar ou fato base, o qual levará à percepção
do fato probando (fato principal).
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122 Henrique Yukio Pereira de Souza
As presunções judiciais são inseridas no sistema do processo civil pelo art. 335
do CPC, que manda o juiz a decidir segundo suas máximas de experiência — que são
a expressão da cultura dos juízes como intérpretes dos valores e da experiência
acumulada pela sociedade em que vivem. Atentos e sensíveis às realidades do
mundo, eles têm o dever de captar pelos sentidos e desenvolver no intelecto
o significado dos fatos que os circundam na vida ordinária, para traduzirem
decisões sensatas aquilo que o homem comum sabe e os conhecimentos que
certas técnicas elementares lhes transmitem. (DINAMARCO, 2003, p. 122)
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 107-126, out./dez. 2010
A presunção judicial no Estado Democrático de Direito: uma análise crítica do artigo 335 do Código... 123
Justamente por isso, e por não ser mais possível a exigência de uma autoridade
sensível, sábia, intuitiva e experiente, é que tais elementos metajurídicos não
podem ser utilizados como fundamentação do provimento, a não ser que se
queira exigir das partes uma esdrúxula investigação acerca da vida pessoal
do juiz para fins de argumentação processual.
Decerto, um fundamento não extraído da plataforma procedimental, como o
é a experiência ou qualidade individual do magistrado, é imprestável à moti
vação do provimento, eis que não se oferta à crítica, tornando a decisão ilegítima
juridicamente. (MADEIRA, 2008, p. 171-172)
10 Considerações finais
As regras processuais previstas no CPC de 1973 foram elaboradas
num contexto de Estado Social, dentro de uma perspectiva instrumen
talista do processo.
Com o advento da Constituição de 1988 e do Estado Democrático
de Direito, foi criado um abismo entre o novo ordenamento jurídico
brasileiro e as disposições do Código de Processo Civil, que necessitam,
por esse motivo, de uma releitura, de uma nova abordagem científica
do processo, consonante com o atual paradigma constitucional. Dessa
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 107-126, out./dez. 2010
124 Henrique Yukio Pereira de Souza
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Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo: uma avaliação das críticas neoinstitucionalistas à teoria... 127
Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo:
uma avaliação das críticas
neoinstitucionalistas à teoria da
instrumentalidade do processo
Alexandre Araújo Costa
Professor adjunto da Universidade de Brasília (UnB). Mestre e doutor em direito pela UnB. Coor-
denador do Grupo de Pesquisa Política e Direito.
1 Introdução
A teoria instrumentalista de Cândido Dinamarco, consolidada
na obra A instrumentalidade do processo, é hoje a concepção dominante
sobre o processo civil nos meios acadêmicos brasileiros.1 Tal perspectiva
teve uma recepção muito positiva quando foi lançada, na década de 1980,
especialmente porque ela era compreendida como um aperfeiçoa mento
da corrente então hegemônica, ligada à escola paulista de processo e
centrada nas categorias de ação e jurisdição. A teoria de Dinamarco não
efetuou uma ruptura das categorias tradicionais (que eram familiares
aos processualistas desde a década de 1940 e estão presentes na legis
lação desde a década de 1970), mas agregou a elas uma dimensão de
Cf. DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
1
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 127-141, out./dez. 2010
128 Alexandre Araújo Costa, Henrique Araújo Costa
2
Cf. LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria processual da decisão jurídica. São Paulo: Landy, 2002.
3
Cf. DELFINO, Lúcio. Breves reflexões sobre a fungibilidade das tutelas de urgência e seu alcance de incidência.
Revista de Processo, São Paulo, v. 30, n. 122, p. 187-220, abr. 2005; Cf. GELLI, Mario Felippe de Lemos. Reflexões
sobre a instrumentalidade, efetividade e reformas processuais. Revista Eletrônica de Direito Processual, Rio de
Janeiro, v. 1, p. 190-206, 2007.
4
Cf. ABBOUD; OLIVEIRA. O dito e o não-dito..., p. 44.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 127-141, out./dez. 2010
Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo: uma avaliação das críticas neoinstitucionalistas à teoria... 129
5
Consideramos debilidade semântica a falta de critérios mais densos que possibilitem a definição do seu campo
denotativo, fazendo com que a aplicação dessa categoria a situações concretas dependa demasiadamente de
juízos de valor implícitos do julgador. Conceitos que têm essa característica podem ser chamados de definições
persuasivas (Cf. WARAT; ROCHA, O direito e sua linguagem...), na medida em que o potencial retórico dos
argumentos que os utilizam pressupõe o reconhecimento dos valores implícitos na argumentação.
6
A ciência política é o objeto de estudo da primeira parte da tese de Dinamarco, que ocupa precisamente até
a página 177. Trata-se de um desenvolvimento detalhado praticamente ignorado pelo restante da doutrina
processual, que tende a atribuir a esse capítulo metodológico uma função meramente protocolar. Na nossa visão,
esse é um valioso legado infelizmente negligenciado (Cf. DINAMARCO. A instrumentalidade do processo).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 127-141, out./dez. 2010
130 Alexandre Araújo Costa, Henrique Araújo Costa
7
DINAMARCO. A instrumentalidade do processo, p. 381.
8
DINAMARCO. A instrumentalidade do processo, p. 393.
9
Sobre a base axiológica do direito, Dinamarco chega a apresentar traços de jusnaturalismo, ao afirmar em
outro trabalho que: “Há valores que sobrepairam todas as leis — de todos os tempos e lugares — e os povos
todos buscam sua realização plena, embora conscientes de que essa utopia jamais será alcançada e embora
sejam extremamente vagas as palavras com que tais valores se expressam em tempos e em lugares diferentes”
(Cf. DINAMARCO, Cândido Rangel. Processo civil comparado. Revista de processo, São Paulo, v. 23, n. 90, p.
47, abr./jun. 1998).
10
DINAMARCO. A instrumentalidade do processo, p. 11.
11
DINAMARCO. A instrumentalidade do processo, p. 190.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 127-141, out./dez. 2010
Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo: uma avaliação das críticas neoinstitucionalistas à teoria... 131
Cf. DINAMARCO, Cândido Rangel. Vocabulário do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2009.
12
Tal texto diagnostica também “que há nos pressupostos basilares da teoria [da instrumentalidade] uma vinculação
13
— a princípio acrítica — com o modelo de fundamentação das liberdades democráticas que Mauizio Fioravanti
denomina estatalista”. Para os autores, tal doutrina seria responsável pela edificação do Estado Liberal europeu
do séc. XIX (ABBOUD; OLIVEIRA. O dito e o não-dito..., p. 28-29). Cf. FIORAVANTI, Maurizio. Los derechos
fundamentales: apuntes de historia de las Constituciones. 4. ed. Madrid: Trotta, 2003.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 127-141, out./dez. 2010
132 Alexandre Araújo Costa, Henrique Araújo Costa
14
É o próprio Dinamarco quem destaca essa anteposição dualista e monista: “Das posições então assumidas, a mais
puramente jurídica foi a de Chiovenda, ligando o processo à vontade do direito substancial e não lançando as
vistas à realidade subjacente a ele; a de Carnelutti, embora propusesse um resultado jurídico (a composição da
lide), partia de um dado sociológico, que é a lide” (DINAMARCO. A instrumentalidade do processo, p. 215).
15
A mesma linha de mitigação sutil entre os planos do direito e do processo é vista em José Roberto dos Santos
Bedaque, discípulo de Dinamarco: “A relativização do binômio direito-processo não compromete a autonomia da
ciência processual, mas torna necessário rever seus institutos fundamentais, a fim de adaptá-los às necessidades
exteriores” (Cf. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo: influência do direito material sobre o
processo. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 163).
16
DINAMARCO. A instrumentalidade do processo, p. 379.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 127-141, out./dez. 2010
Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo: uma avaliação das críticas neoinstitucionalistas à teoria... 133
17
DINAMARCO. A instrumentalidade do processo, p. 255.
18
DINAMARCO. A instrumentalidade do processo, p. 255.
19
Em síntese, a partir de Arthur Kaufmann, desenvolvem a relação jurídica como categoria primordial do processo
porque consideram que a jurisdição em Dinamarco assume uma postura autoritária ao concentrar o poder
no Estado, negando os poderes dos cidadãos (Cf. ABBOUD; OLIVEIRA. O dito e o não-dito..., p. 44-54. Cf.
KAUFMANN, Arthur. Filosofia do direito. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2004).
20
Abboud e Oliveira deixam claro que além de negarem a prevalência do eixo jurisdicional (pois associado ao
poder), elegem a relação jurídica de Kaufmann — e não a pandectista — como eixo que viabilize uma atuação
jurisdicional mais democrática. Nesse propósito citam José Lamego na tentativa de aproximar o processo da
hermenêutica. Os autores parecem cientes de que o desafio atual é muito maior do que escolher como eixo
um dos conceitos da trilogia estrutual, sendo necessário repensar os pontos de partida do próprio processo (Cf.
ABBOUD; OLIVEIRA. O dito e o não-dito..., p. 55. Cf. LAMEGO, José. Hermenêutica e jurisprudência: análise
de uma recepção. Lisboa: Fragmentos, 1990).
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134 Alexandre Araújo Costa, Henrique Araújo Costa
surge como apenas poder de decisão estatal, e não como categoria que
permita uma reflexão mais ampla das relações de dominação dentro de
uma sociedade.21 Por isso, cabe razão a Calmon de Passos quando aponta
que são ignorados pela instrumentalidade elementos “originados pelos
estudos semiológicos, a revalorização do político, a partir dos desencantos
existenciais recolhidos da experiência do capitalismo tardio e da derro
cada do socialismo real, a crise do Estado do bem-estar social (...). Tudo
isso denuncia a existência de um novo paradigma, a pedir seja repen -
sado o que ontem tínhamos como certeza”.
Além dessa desatualidade epistemológica, Calmon de Passos
destaca a reação acadêmica ao pensamento social em relação ao processo,
tendo em conta o desenvolvimento constitucional que passou a valorizar
uma participação mais abrangente de todos na produção do direito.
Citando Perez Luño, que sintetiza ideias de Häberle, Denninger e
Wiethölter, Calmon de Passos sustenta que “se na década de cinqüenta
o antiformalismo dos juízes legisladores foi assunto da ordem do dia,
a experiência mostrou o alto custo social e político, em termos de segu
rança jurídica, dessa formulação que, no fundo, era a de um discurso
antidemocrático (...)”.22 Ele também reforça a necessidade de atualizar o
pensamento do processo, pois não devemos continuar agindo como se o
panorama posto diante de nós fosse o mesmo das décadas de 50 e 60. Diz
que se, ao invés dessa época, Cappelletti fosse um jovem dos dias de hoje,
teorizaria de forma diferente do que fez e que anacronicamente ainda
sustenta o pensamento social do direito.23
Esses elementos indicam que a instrumentalidade não propôs
uma nova teoria geral do processo, mas apenas a incorporação de
argumentos de viés finalístico ao discurso jurídico processual. Essa pro
posta de apropriação de uma teleologia por uma base conceitual que
lhe é avessa pode ser creditada, ao menos parcialmente, ao caráter
pouco filosófico da própria teoria instrumental. A instrumentalidade, tal
como foi formulada, apresenta-se como uma forma prática de pensar,
sem diálogos mais amplos com a filosofia do direito e a hermenêutica
contemporâneas. Com isso, a instrumentalidade parece mais capaz
21
Embora o autor não ignore a existência de linhas de análise mais comportamentais do poder, como em
Niklas Luhmann (Cf. Legitimação pelo procedimento. Brasília: UnB, 1980) ou em Max Weber (Cf. Economia e
sociedade. Brasilia: UnB, 2004), apresenta uma definição bastante jurídica: “O conceito de poder, avançado
antes (‘capacidade de decidir imperativamente e impor decisões’), pretende constituir uma depuração do
‘decisionismo’ (...)” (DINAMARCO. A instrumentalidade do processo, p. 11).
22
Cf. PASSOS. Instrumentalidade do processo..., p. 58.
23
Cf. PASSOS. Instrumentalidade do processo..., p. 60.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 127-141, out./dez. 2010
Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo: uma avaliação das críticas neoinstitucionalistas à teoria... 135
“A santa cruzada que o prof. Calmon de Passos enceta contra a instrumentalidade é fruto de sua notória
24
desconfiança no Poder Judiciário brasileiro, a quem atribui imensa irresponsabilidade o mais elevado grau
de falta de confiabilidade. Emprega locuções fortes, como ‘a viscosidade da decantada instrumentalidade
transformada em arma na mão de sicários’; fala dos ‘frutos perversos, ou peçonhentos’, gerados por ela e diz
que em nome da instrumentalidade ‘hipertrofiaram o papel do juiz’” (DINAMARCO. A instrumentalidade do
processo, p. 393. Cf. PASSOS. Instrumentalidade do processo..., p. 66).
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136 Alexandre Araújo Costa, Henrique Araújo Costa
3 O neoinstitucionalismo de Rosemiro
Algumas das críticas mais elaboradas dirigidas ao instrumentalismo
são de autoria da escola mineira, que representa um bom exemplo de
uma corrente não hegemônica que vem desenvolvendo linhas de pesquisa
que entrelaçam processo e hermenêutica com bastante desenvoltura.
Essa oposição entre uma escola mineira e uma escola paulista pode
parecer exagerada a alguns, mas consideramos curioso que sempre
pareça tão culta a comparação entre concepções dominantes em certos
países e famílias jurídicas, e que ao mesmo tempo que sejamos pouco
capazes de reconhecer e dialogar com tendências divergentes dentro
do nosso próprio país. De alguma maneira, esse parece ser é um tabu, no
sentido mais literal da palavra, já que nós equacionamos mediante um
mandamento de silêncio: as várias escolas não podem dialogar.25
Talvez isso seja possível porque praticamente todas nossas escolas
derivam de uma mesma raiz tradicional, fortalecida por uma escolha
legislativa que consagrou uma opção eclética diante da teoria da ação. Ou
talvez cada autor que receba alguma projeção por sua originalidade se
volte a falar somente ao seu círculo, sem se preocupar em dialogar com o
país como um todo, o que pode ser encarado como uma tendência à
presunção. Ou seja, todas as explicações mais evidentes para essa falta
de comunicação as hipóteses apontam para uma situação preponderan
temente negativa. E por isso mesmo consideramos urgente o estabeleci
mento de um diálogo mais abrangente entre essas correntes, o que envolve
inicialmente um reconhecimento das posições que elas defendem.
No caso da escola mineira, trata-se de uma iniciativa difícil de ser
entendida como estudo processual no sentido clássico do termo, pois
seus interlocutores encontram-se mais no seio do Instituto de Herme
nêutica Jurídica (IHJ/MG) do que na comunidade processual como um
todo. Outro fator que dificulta a interlocução desse modo de pensar é
a combinação de uma linguagem demasiadamente hermética com uma
postura pouco cortês com o ramo da instrumentalidade, que goza de
prestígio no restante do país.
A título de exemplo, tomemos a afirmação de Rosemiro de que,
“a aceitar irrefletidamente o ensino de Bülow a Liebman e deste aos
ins
trumentalistas de hoje, alojando-se aqui os positivistas e neopositi
vistas, adeptos fatalistas da necessária garantia, interpretação e aplicação
Cf. FREUD, Sigmund. Totem e tabu. In: Obras psicológicas completas. Rio de Janeiro: Imago, 1996.
25
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 127-141, out./dez. 2010
Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo: uma avaliação das críticas neoinstitucionalistas à teoria... 137
26
Cf. PASSOS, Calmon de. A crise do Judiciário e as reformas instrumentais: avanços e retrocessos. Revista Síntese
de Direito Civil e Processual Civil, ano 3, jan./fev. 2002.
27
LEAL. Modelos processuais e Constituição democrática, p. 289. Ver também: “Verossimilhança e inequivocidade
na tutela antecipada em processo civil”, artigo consultado no site A priori, em 05.05.10, no endereço: <http://bit.
ly/bRaTfA>. Ainda sobre o pensamento de Rosemiro e seu grupo, consultar: LEAL, Rosemiro Pereira (Coord.).
Estudos continuados de teoria do processo. Porto Alegre: Síntese, 2000-2004. v. I-V.
28
LEAL. Modelos processuais e Constituição democrática, p. 291.
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138 Alexandre Araújo Costa, Henrique Araújo Costa
29
A noção de um modelo constitucional de processo que se funda em um esquema geral de base principiológica
uníssona, ou seja, um modelo único, com tipologia plúrima (BARROS. O modelo constitucional de processo..., p.
334-335. Cf. ANDOLINA, I; VIGNERA, G. Il fondamenti costituzionali della giustizia civile: il modello costituzionale
del processo civile italiano. Torino: G. Giappichelli, 1997).
30
NUNES. Apontamentos iniciais de um processualismo..., p. 350 et seq.
31
“Ao se falar num direito processual da pós-modernidade, almeja-se, com essa expressão, identificar nos textos
positivados o conjunto de normas institucionalizadas pelo modelo jurídico do devido processo constitucional
que, em sua gênese, reúna significância de superação da heteronomia produtiva do direito de tal modo a ensejar
a construção procedimental de uma legalidade que se abre à crítica corretiva ampla e irrestrita. Esse direito
processual assume compromisso teórico com as respostas a serem dadas numa universalidade pós-metafísica
de instalação de comunidades jurídicas autoras, simultaneamente destinatárias, confirmadoras, reconstrutoras e
operadoras do Estado democrático de direito discursivamente instituído” (LEAL. Teoria processual..., p. 28).
32
NUNES. Apontamentos iniciais de um processualismo..., p. 350.
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Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo: uma avaliação das críticas neoinstitucionalistas à teoria... 139
4 Conclusão
Nota-se que o diálogo entre Rosemiro de Dinamarco não se travou;
ou quando se deu foi unilateral e passou longe da civilidade. Aliás, pode
ser que esse enfrentamento por seus maiores representantes não acon -
teça nunca porque a visão social do processo tem perdido força e im
portância. Tanto é que não foi determinante para as últimas reformas
processuais, que modificaram completamente o CPC com uma visão muito
mais pragmática e concentradora de poder nas instâncias superiores.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 127-141, out./dez. 2010
140 Alexandre Araújo Costa, Henrique Araújo Costa
Referências
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instrumentalidade do processo: críticas e projeções a partir de uma exploração hemenêutica
da teoria processual. Revista de Processo, São Paulo, v. 33, n. 166, p. 27-70, dez. 2008.
BARROS, Flaviane de Magalhães. O modelo constitucional de processo e o processo penal:
a necessidade de uma interpretação das reformas do processo penal a partir da Constituição.
In: MACHADO, Felipe Daniel Amorim; OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni (Coord.).
Constituição e processo: a contribuição do processo ao constitucionalismo democrático
brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2009.
DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 11. ed. São Paulo: Malheiros,
2003.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 127-141, out./dez. 2010
Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo: uma avaliação das críticas neoinstitucionalistas à teoria... 141
DINAMARCO, Cândido Rangel. Vocabulário do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2009.
LEAL, Rosemiro Pereira. Modelos processuais e Constituição democrática. In: MACHADO,
Felipe Daniel Amorim; OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni (Coord.). Constituição e processo:
a contribuição do processo ao constitucionalismo democrático brasileiro. Belo Horizonte:
Del Rey, 2009.
LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria processual da decisão jurídica. São Paulo: Landy, 2002.
NUNES, Dierle José Coelho. Apontamentos iniciais de um processualismo constitucional
democrático. In: MACHADO, Felipe Daniel Amorim; OLIVEIRA, Marcelo Andrade
Cattoni (Coord.). Constituição e processo: a contribuição do processo ao constitucionalismo
democrático brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2009.
PASSOS, Calmon de. Instrumentalidade do processo e devido processo legal. Revista de
Processo, São Paulo, v 26, n. 102, p. 54-67, abr./jun. 2001.
WARAT, Luis Alberto; ROCHA, Leonel Severo. O direito e sua linguagem: 2ª versão. 2. ed.
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1995.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 127-141, out./dez. 2010
Assistência simples e coisa julgada material – A “justiça da decisão” do artigo 55 do Código de Processo... 143
1
Esta é a lição de THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 39. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2003. v. 1, p. 127.
2
Segundo WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado
de processo civil. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 265: “Trata-se de um instituto que tem em
vista gerar segurança. A segurança, de fato, é um valor que desde sempre tem desempenhado papel de um
dos objetivos do direito. O homem sempre está a procura de segurança e o direito é um instrumento que
se presta, em grande parte, ao atingimento desse desejo humano. Por meio do direito, procura-se tanto a
segurança no que diz respeito ao ordenamento jurídico como um todo, quanto a esta espécie de segurança
que a coisa julgada desempenha seu papel”.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 143-154, out./dez. 2010
144 Alexandre Paulichi Chiovitti
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 143-154, out./dez. 2010
Assistência simples e coisa julgada material – A “justiça da decisão” do artigo 55 do Código de Processo... 145
8
Com igual entendimento: ALVIM, Thereza Celina Diniz de Arruda. Da assistência. Revista de Processo,
São Paulo, v. 20, n. 79, p. 203, 1995; NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de
Processo Civil comentado. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 274; e, ainda: WAMBIER, Luiz
Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil.
9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 618.
9
Segundo GRINOVER, Ada Pellegrini. Considerações sobre os limites objetivos e a eficácia preclusiva da coisa
julgada. Revista do Advogado, São Paulo, v. 21, n. 65, p. 76, 2001 “é exata a afirmativa de que a coisa julgada
se restringe à parte dispositiva da sentença. A expressão, entretanto, deve ser entendida em sentido substancial
e não apenas formalístico, de modo que compreenda não apenas a frase final da sentença, mas também
tudo quanto o juiz porventura haja considerado e resolvido acerca do pedido feito pelas partes. Os motivos
são, pois, excluídos, por essa razão, da coisa julgada, mas constituem amiúde indispensável elemento para
determinar o alcance do dispositivo”.
10
No dizer de NERY JÚNIOR; NERY, op. cit., p. 701, “Fazendo-se a correlação entre petição inicial e sentença,
poder-se-ia dizer que a parte final da petição inicial, isto é, o pedido, corresponde à parte final da sentença,
vale dizer, o dispositivo. Assim, o conjunto formado pelo pedido e o dispositivo é alcançado pela coisa julgada
material”.
11
Para ARAÚJO CINTRA, Antonio Carlos de; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria
geral do processo. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 307, “Estabelecer os limites objetivos da coisa
julgada significa responder à pergunta: ‘quais partes da sentença ficam cobertas pela autoridade da coisa
julgada?”.
12
O citado exemplo nos é oferecido por MOREIRA, José Carlos Barbosa. Os limites objetivos da coisa julgada no
sistema do Novo Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 93.
13
A jurisprudência também assentou opinião neste sentido: STJ. REsp nº 182.735/SP. Segunda Turma. Ministro
Castro Filho. DJ, p. 153, 25 jun. 2001. Ementa: “Processo Civil. Coisa Julgada. Artigo 469, I e III, do Código de
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 143-154, out./dez. 2010
146 Alexandre Paulichi Chiovitti
Processo Civil. Fixação de Verba Honorária. Ausência de Fundamentação. Inocorrência. I – Os limites objetivos
da coisa julgada não abrangem os motivos da decisão nem questões prejudiciais, salvo, quanto a estas, a
propositura de ação declaratória incidental. II – Nas causas em que não há condenação, a fixação dos honorários
se dá consoante apreciação eqüitativa do juiz. Recurso a que se nega provimento”.
14
DIDIER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael de. Curso de direito processual civil. 2. ed.
Salvador: JusPodivm, 2008. v. 2, p. 560-561.
15
Definindo o tema, DINIZ, Maria Helena. Conflito de normas. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 15, aduz que
antinomia é: “um problema que se situa ao nível da estrutura do sistema jurídico (criado pelo jurista), que,
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 143-154, out./dez. 2010
Assistência simples e coisa julgada material – A “justiça da decisão” do artigo 55 do Código de Processo... 147
submetido ao princípio da não-contradição, deverá ser coerente. A coerência lógica do sistema é exigência
fundamental, como já dissemos, do princípio da unidade do sistema jurídico. Por conseguinte, a ciência do
direito deve procurar purgar o sistema de qualquer contradição, indicando os critérios para solução dos conflitos
normativos e tentando harmonizar os textos legais”.
16
SOUZA, Gelson Amaro de. A assistência e a coisa julgada. Revista Jurídica, Porto Alegre, ano 51, n. 310, p.
56, 2003.
17
Neste sentido: TJ/DF. Apelação Cível nº 4.102.596. 1ª Turma Cível. Relator: Des. Edmundo Minervino.
Disponibilização no DJe, p. 4.421, 19 mar. 1997, seção 3. Ementa: “Direito Civil e Processual Civil. Acidente
de Trânsito. Reparação de danos. Admissão da Cia. Seguradora como assistente simples da parte ré. 1. A
prova pericial feita por particular e sob encomenda da parte autora, ao firmar a culpa da ré-apelada, afronta
a conclusão, em sentido contrário, do laudo oficial da Polícia Técnica, bem assim a descrição dos fatos feita
pelas testemunhas. 2. A prova dos autos indica que a apelante, ao ingressar na pista, local do acidente, deixou
de observar as condições de tráfego, oferecendo seu veículo à colisão daquele dirigido pela ré. 3. A decisão
judicial não acolhedora do pedido de denunciação à lide da Cia Seguradora e formulada pela parte ré, não
impossibilita que o magistrado receba-o como o de assistente simples em favor de seu segurado. Recursos
conhecidos e desprovidos. Unânime”.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 143-154, out./dez. 2010
148 Alexandre Paulichi Chiovitti
18
Com efeito, por exemplo, na fase de cumprimento de sentença, a seguradora poderia alegar a inexigibilidade
do título (CPC, art. 475-L, II) ou ilegitimidade de parte (CPC, art. 475-L, IV), aduzindo que a cobertura do
seguro não mais estava em vigor, estando rescindido o contrato pelo agravamento do risco pelo segurado
(CC, art. 768).
19
Assim já reconheceu a jurisprudência: TJ/MG. Apelação Cível nº 1.0024.08.243280-8/001. 10ª Câmara Cível.
Des. Electra Benevides. Publicado em 24.02.2010. Ementa: “Apelação Cível – Ação de Reparação de Danos
– Contrato de Seguro – Acidente de Trânsito – Embriaguez do Segurado – Comprovação – Agravamento de
Risco – Indenização Securitária – Negativa de Cobertura – Licitude – Honorários Advocatícios. O boletim de
ocorrência, mesmo sendo um documento produzido unilateralmente, possui presunção de veracidade e tem
força probante, devendo a parte interessada, em observância ao disposto no artigo 333, II do CPC desconstituir
as informações ali contidas. Não tendo o apelante produzido nenhuma prova contundente com força suficiente
para elidir o seu estado alcoólico certificado pelos policiais que foram testemunhas na lavratura do Auto de
Constatação de Embriaguez, outra conclusão não há senão a de que o recorrente estava dirigindo sob os
efeitos do álcool. O estado etílico do segurado, além de importar em agravamento do risco objeto do contrato,
foi determinante para a ocorrência do acidente, o que afasta o dever da seguradora de efetuar o pagamento
dos valores reclamados. Nos termos do parágrafo 4º, do artigo 20 do Código de Processo Civil, nas causas em
que não houver condenação, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas
as normas das alíneas ‘a’, ‘b’ e ‘c’, do parágrafo 3º do mesmo artigo. Recurso provido em parte”.
20
É certo que a seguradora poderá pretender, em pedido independente contra o segurado, em regresso, o que
pagou ao terceiro; porém, com todas as mazelas de ter de ingressar com ação (contratação de advogado,
pagamento de custas, dano emergente do processo), e, ainda, correr o risco de uma decisão conflitante.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 143-154, out./dez. 2010
Assistência simples e coisa julgada material – A “justiça da decisão” do artigo 55 do Código de Processo... 149
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150 Alexandre Paulichi Chiovitti
Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada: I – erga omnes, exceto se
25
o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá
intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo
único do art. 81; II – ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por
insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do
parágrafo único do art. 81; III – erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas
as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.
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Assistência simples e coisa julgada material – A “justiça da decisão” do artigo 55 do Código de Processo... 151
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152 Alexandre Paulichi Chiovitti
Ora, nesses casos, não parece que o assistente deva se submeter aos
efeitos da decisão, pois este não interveio de modo efetivo na demanda.
E, ainda, especificamente no caso de conluio, a situação é agravada,
pois se fossem permitidas essas hipóteses, estar-se-ia prestigiando o
engodo ao revés da boa-fé.
Nesse sentido, inviável a submissão do assistente à justiça da
decisão.
Segundo Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, tais
exceções se configurariam quando o assistente comprovar que, pela ati
tude do assistido, à qual se encontrava subordinado, ficou limitado e não
pôde produzir provas que teriam sido capazes de modificar o resultado
do processo ou de, pelo menos, influir na sentença.26
Para o professor José Roberto dos Santos Bedaque, em razão de
circunstâncias a ele estranhas e fora de seu controle, foi-lhe obstado o
exercício pleno do contraditório e da ampla defesa. Assim, segue o autor,
se o assistente não teve oportunidade de participação integral, com con
dições de influir na convicção do juiz, não está ele impedido de discutir
a justiça da decisão.27
Essas exceções legais previstas no parágrafo único do art. 55 do
CPC são doutrinariamente denominadas de exceção de má gestão pro
cessual (exceptio male gesti processus).
Mister ressaltar que, consoante a exegese legal, será necessário ao
assistente alegar e provar que ficou tolhido no amplo auxílio ao assistido,
de forma que não pode defender aquele direito do assistido que no
futuro lhe atingirá reflexamente.
Nos casos em que o assistido atuar em contradição a esse direito,
v.g. no caso de reconhecimento da procedência da ação, ou de transação,
o assistente não terá maiores problemas na sua dilação probatória, pois
bastará a este colacionar as cópias do processo em que ocorreram esses
atos, para lhe ser possível a rediscussão acerca da justiça da decisão.
O assistente simples não pode se opor à extinção do processo de
corrente da transação entre as partes. Mas, pode rediscutir, em processo
futuro, a justiça da decisão, alegando uma das matérias do CPC 55 I
e II.28
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Assistência simples e coisa julgada material – A “justiça da decisão” do artigo 55 do Código de Processo... 153
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A teoria dos distintos planos da ordem jurídica 155
Introito
A exacerbada proliferação do número de textos normativos,
somada à complexidade das modernas relações jurídicas, tem feito sentir
seus efeitos no âmago do aprendizado jurídico. Sem o temor maior
do equívoco, pode-se atribuir a tais fenômenos elevada parcela de res
ponsabilidade no tangente a atual tendência da “especialização” dos
profissionais da área jurídica.
Ao jurista da atualidade, ou em formação, ao que tudo indica não
mais parece “acessível” investigar a fundo, e com a presteza necessária,
o fenômeno jurídico em sua integralidade em face da interminável
imensidão legislativa hoje vigente.
Não se duvida, portanto, que hodiernamente o estudioso mer gu
-
lhe, com todas as suas forças, na busca de conhecimento referente a um
ou outro específico ramo do direito. É esta a realidade contemporânea.
O fenômeno das “especializações”, ainda que a ele se reconheça
notória função positiva, indubitavelmente, acabou por refletir de forma
negativa no âmago de conhecimento das denominadas teorias gerais.
Buscando a perfeição e o máximo detalhamento atinente a um ou
outro ramo do direito tem descurado-se o estudioso de apreender noções
basilares, ou melhor, relega a um segundo plano verdadeiros alicerces
de nosso edifício jurídico.
Assim sendo, o presente estudo tem por escopo maior abordar
lição imprescindível e basilar a todo e qualquer operador do direito, qual
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156 Artur Luis Pereira Torres
1 Noções introdutórias
Como bem asseverou Pontes de Miranda, por questões de método,
indispensável preparar o terreno revisitando conceitos básicos atinentes
às noções de regra jurídica, hipótese de incidência, fato gerador e
correlatos.1
Por escapar aos objetivos estritos do presente estudo, não se pre
tende aqui abordar com maior profundidade a denominada e difundida
entre nós teoria do fato jurídico, senão tecer diminutos comentários
para situar o estudioso, possibilitando-lhe melhor reflexão a respeito do
objeto deste estudo.2
Não retrata novidade alguma a constatação de os sistemas jurí -
dicos preocuparem-se, em regra, apenas com fatos de relevo, dando às
costas a uma série de ocorrências corriqueiras da vida em sociedade
(ad exemplum, as normas de trato social, ajurídicas). Dentre o vasto elenco
de realidades triviais ocorrentes diuturnamente, o(s) sistema(s) jurídico(s)
elege(m) as de maior relevância para a manutenção da boa convivência
entre os homens, instituindo normas de conduta a serem respeitadas,
via de regra, de forma voluntária pelo jurisdicionado.3 Nesta esteira, e em
especial nos países adstritos ao sistema da civil law, realizado o referido
juízo axiológico, legisla-se a respeito, fazendo nascer norma de caráter
imperativo, geral e abstrato indicativa de um dever ser (lei).
Consoante a lição de José Maria Rosa Tesheiner o “direito não existe
senão para regular o convívio, isto é, para regular relações intersubje
tivas ou interpessoais”.4 Poder-se-ia afirmar, então, que é neste específico
contexto que deve aflorar à noção de hipótese de incidência.5
1
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado das ações. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. V/226,
§560.
2
A respeito da teoria do fato jurídico, vide, com grande proveito: RODRIGUES, Silvio. Direito civil: parte geral.
33. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. I, p. 155-346.
3
“Existem fatos irrelevantes ou desinteressantes ao direito: por exemplo, a estrela cadente ou o eclipse do sol.
Outros, no entanto, integram especialmente a disciplina da vida em sociedade” (ASSIS, Araken de. Cumulação
de ações. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 74).
4
TESHEINER, José Maria Rosa. Elementos para uma teoria geral do processo. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 02.
5
Inobstante façamos uso no presente estudo da expressão hipótese de incidência para explicitar a ideia da
existência de um comando pré-constituído, previsto abstratamente e, com intuito informar um dever ser geral,
por óbvio, não ignoramos a acentuada discussão doutrinária a respeito da melhor expressão a ser utilizada
para a explicação do fenômeno. O tema é bastante controvertido, principalmente, na doutrina tributária.
Exemplificativamente, vide: HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p. 480; TORRES, Ricardo Lobo.
Curso de direito financeiro e tributário, p. 244-245; ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. São
Paulo: Malheiros, 1992. p. 75, dentre outros.
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A teoria dos distintos planos da ordem jurídica 157
6
“Em geral se reserva a expressão ‘relação jurídica’ para aquelas relações interpessoais que o direito regula
mediante a atribuição, ao sujeito ativo, de um crédito (direito a uma prestação do devedor) ou de um poder
a que se submete o sujeito passivo (caso dos direitos formativos). Contudo, não deixa de ser regulada pelo
direito a simples relação interpessoal, em que dois sujeitos se defrontam, tendo apenas o mútuo dever de se
respeitarem como seres humanos, em que não há propriamente nem crédito nem poder de um diante do
outro. Respeitando a tradição, falaremos, nesses casos, de relações interpessoais e não de relações jurídicas,
ficando, porém, subentendido que também elas são reguladas pelo direito” (TESHEINER. Elementos para uma
teoria geral do processo, p. 02).
7
A respeito do tema positivismo jurídico, vide: MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria geral do processo. 3. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 31-33.
8
“O autor baseia seu comentário inicial no discernimento entre ação material e ação processual. Considera a
primeira como advinda do art. 75 do CC/1916, donde “a todo direito corresponde uma ação, que o assegura”.
Não havendo dispositivo análogo no CC/2002. Já a segunda, entende como o efetivo exercício do direito de
ação, isto é, o direito à tutela judicial do que entender necessário” (FUX, Luiz. Curso de direito processual civil:
processo de conhecimento. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. v. 1, p. 145).
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158 Artur Luis Pereira Torres
9
“Se não se pode privar o cidadão de ver resguardado aquilo que é seu, eis que isso constitui um direito
fundamental do ser humano e elemento basilar para o bom convívio do homem em sociedade, e se também
não se permite que ele possa se valer de força privada para assegurar a manutenção ou obtenção do que
lhe pertence, eis que tal ato compete a um Poder Estatal específico responsável pela distribuição da justiça,
denominado Poder Judiciário, parece evidente que essa atividade própria de efetivar direitos, por esse Poder
(Estado) que avocou, não se constitui faculdade, mas, sim, dever mínimo para a conservação da legitimidade
do sistema imposto” (CARPENA, Márcio Louzada. Da garantia da inafastabilidade do controle jurisdicional
e o processo contemporâneo. In: PORTO, Sérgio Gilberto (Org.). As garantias do cidadão no processo civil:
relações entre constituição e processo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 11).
10
ASSIS. Cumulação de ações, p. 73-86.
11
“Direito material é, pois, o conjunto de normas que se destinam a disciplinar as relações jurídicas que se
estabelecem entre os indivíduos para a fruição dos bens da vida e para o comportamento que um deve manter
em face de outro. Para a garantia desse ordenamento jurídico e para regular o processo que solucionará a
divergência surgida entre as partes integrantes dessa relação de direito substancial é que existe e se estrutura
o direito processual. O direito material representa a norma fria, abstrata o impessoal, posta ‘erga omnes’,
por sua vez, o direito processual regulará a atividade do órgão estatal que decidirá a controvérsia tornando a
norma viva, atuante e dirigida a pessoas determinadas. Em resumo, de um lado, a regra jurídica, do outro, o
instrumento de sua justa aplicação” (CUNHA, Mauro; COELHO SILVA, Roberto Geraldo. Guia para estudo da
teoria geral do processo. Porto Alegre: Acadêmica, 1990. p. 26-27).
12
GUASTINI, Ricardo. Dalle fonti alle norme. Torino: G. Giappichelli, 1992. p. 251.
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13
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Processo Civil. 5. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2001. t. I, p. 23.
14
“Mediante o preenchimento de um suporte fático, surge para alguém, uma peculiar situação de vantagem,
já designada de direito subjetivo” (ASSIS. Cumulação de ações, p. 76).
15
GUASTINI. Dalle fonti alle norme, p. 252.
16
ASSIS. Cumulação de ações, p. 75.
17
SILVA, Ovídio Baptista da. Direito subjetivo, pretensão de direito material e ação. Revista da Ajuris, n. 29, p.
100, 1983.
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18
ASSIS. Cumulação de ações, p. 75.
19
ASSIS. Cumulação de ações, p. 76.
20
Versando a respeito da gênese dos direitos subjetivos, Guastini afirma que: “(...) um direito subjetivo pode
ser conferido pelas normas mais diversas do ponto de vista da fonte de origem. Por conseguinte, à guisa de
princípio, os direitos subjetivos podem ser classificados conforme a fonte da qual se originam. Por exemplo,
pode-se distinguir entre: direitos subjetivos ‘contratuais’, direitos subjetivos ‘legais’ e direitos subjetivos
‘constitucionais’. Um direito ‘contratual’ é um direito que tem sua fonte no contrato, ou seja, num ato de
autonomia privada. Um direito ‘legal’ é um direito que foi conferido a um sujeito por uma norma legislativa,
ou seja, por uma norma dotada de ‘força de lei’. Um direito constitucional, por sua vez, é um direito que foi
conferido a um sujeito por uma norma constitucional, isto é, por uma norma estabelecida num plano ‘superior’
(se não em outro, sentido axiológico) relativamente à lei” (GUASTINI. Dalle fonti alle norme, p. 251).
21
“Certamente, na normalidade dos casos, há direito subjetivo e, há a respectiva pretensão, que não é outro
direito, mas o próprio direito subjetivo potencializado, dotado desse dinamismo capaz de torná-lo efeito”
(SILVA, Ovídio Baptista da. Direito subjetivo, pretensão de direito material e ação. Revista da Ajuris, n. 29, p.
103, 1983, grifos nossos).
22
“Pode haver direito subjetivo sem que haja, ainda, ou não mais exista, a faculdade normal que se u titular
deveria ter de poder exigir a observância e a realização do próprio direito” (SILVA. Direito subjetivo, pretensão
de direito material e ação, p. 101).
23
SILVA. Direito subjetivo, pretensão de direito material e ação, p. 99.
24
SILVA. Direito subjetivo, pretensão de direito material e ação, p. 102.
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rivolge anche al processo civile; l’indirizzo comparatistico e riformatore che accompagna la produzione legislativa
per tutto il secolo (e qui basterebe menzionare Mittermaier o Leonhardt); e infine il periodo, construttivo della
scienza processualistica, che inizia com Bülow (1868)” (NÖRR, Knut Wolfgang. La scuola storica, il processo
civile e il diritto delle azioni. Rivista di Diritto Processuale, Padova, v. XXXVI, a. 57, p. 23, 1981).
44
“Pode-se dizer que certo direito é um direito subjetivo ‘privado’ quando é conferido a um indivíduo perante
(ou contra) um outro indivíduo privado. Pode-se, ao contrário, que um certo direito é um indivíduo subjetivo
‘público’ quando é conferido a um indivíduo perante o Estado” (GUASTINI. Dalle fonti alle norme, p. 252).
45
A respeito da distinção entre direito subjetivo e direito subjetivo público, vide: FREITAS, Paulo de. Direito
processual subjetivo. São Paulo, 1955. p. 31-32.
46
THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. 41. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. v. 1,
p. 48-64.
47
Em sentido contrário, vide: CARPENA, Márcio Louzada. Da garantia da inafastabilidade do controle jurisdicional
e o processo contemporâneo. In: PORTO, Sérgio Gilberto (Org.). As garantias do cidadão no processo civil:
relações entre constituição e processo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 11.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 155-171, out./dez. 2010
A teoria dos distintos planos da ordem jurídica 165
48
A primeira particularidade a que nos referimos é a de que, diferentemente do que ocorre no plano material,
no plano processual jamais haverá dúvida em relação à existência do direito à tutela jurídica Estatal. De outra
banda, no plano material, somente em raríssimas situações poder-se-á, efetivamente, identificar de pronto à
existência do direito alegado. Por assim dizer, no plano material a pretensão potencializa suposto direito; no
processual, direito inconteste.
49
SILVA. Direito subjetivo, pretensão de direito material e ação, p. 107.
50
ASSIS. Cumulação de ações, p. 84.
51
Não se ignora, por óbvio, que também no plano do direito material, em determinadas situações exsurgem,
direito subjetivo e pretensão, em momento idêntico. Ad exemplum, refira-se os direitos reais, com destaque
para o direito de propriedade que, a nosso ver, já nasce dotado de pretensão material.
52
“A relação jurídica processual estabelece-se, inicialmente, entre o autor e o juiz. É apenas bilateral nessa fase.
Com a citação do réu, este passa também a integrá-la tornando-a completa e trilateral” (THEODORO JR.,
Humberto. Curso de direito processual civil. 41. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. v. 1, p. 66). Em sentido
oposto: “Desde que citado, o réu ostenta a posição de pólo do verso da relação, porque ela se oferece em
ângulo: dois sujeitos ativos (autor e réu) e um passivo (Estado)” (ASSIS. Cumulação de ações, p. 85).
53
“Constitui conquista definitiva da ciência processual o reconhecimento da autonomia do direito de ação, a
qual se desprende por completo do direito subjetivo material” (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. Teoria geral
do processo, p. 249).
54
“A ação é instrumental, é um direito a serviço de outro direito que é o de natureza material” (FUX, Luiz. Curso
de direito processual civil: processo de conhecimento. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. v. 1, p. 147).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 155-171, out./dez. 2010
166 Artur Luis Pereira Torres
55
Referindo-se aos sujeitos nas distintas relações jurídicas José Maria Rosa Tesheiner assevera que “Credor ou
beneficiado é aquele cujo interesse é tutelado pela norma jurídica que a outro imponha um dever, positivo ou
negativo; sujeito ativo do ato é aquele que pratica ou não pratica o ato previsto em norma jurídica mandamental
ou permissiva; sujeito passivo do ato é aquele que lhe sofre os efeitos” (TESHEINER. Elementos para uma teoria
geral do processo, p. 09).
56
TESHEINER. Elementos para uma teoria geral do processo, p. 02.
57
A esse respeito, vide: BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O novo processo civil brasileiro. 25. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2007; THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. 41. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2004. v. 1, p. 62.
58
“Existe, portanto, o direito público à jurisdição, provido da pretensão à tutela jurídica, a qual, exercida, põe
o Estado a dever a prestação jurisdicional” (ASSIS, Araken de. Cumulação de ações. 4. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2002. p. 85).
59
ASSIS, Araken de. Cumulação de ações. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 85.
60
“Em outras palavras: o exercício da ação não fica vinculado ao resultado do processo” (THEODORO JR.,
Humberto. Curso de direito processual civil. 41. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. v. 1, p. 49).
61
“O que distingue fundamentalmente direito material e direito processual é que este cuida das relações dos
sujeitos processuais, da posição de cada um deles no processo, da forma de se proceder aos atos deste — sem
nada dizer quanto ao bem da vida que é objeto do interesse primário das pessoas (o que entra na órbita do
direito substancial)” (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. Teoria geral do processo, p. 40).
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A teoria dos distintos planos da ordem jurídica 167
(...) pela escola denominada clássica ou imanentista (ou, ainda, civilista, quando
se trata da ação civil), a ação seria uma qualidade de todo direito ou o próprio
direito reagindo a uma violação. Tal conceito reinou incontrastado, através
de várias conceituações, as quais sempre resultam em três conseqüências
inevitáveis: não há ação sem direito; não há direito sem ação; a ação segue a
natureza do direito.64
62
A respeito vide: DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. 8. ed. Salvador: JusPodivm, 2007.
63
“A doutrina clássica da ação, conhecida por ‘teoria civilista’, apenas transportava para o plano processual
a ação de direito material, confundindo a actio romana - que mais significava pretensão de direito material
(WINDSCHEID) — com a ‘ação’ processual. A actio romana — diz KRELLER, Hans. Historia del derecho romano.
1948. p. 86) — é o poder de ‘perseguir’ uma prestação devida num litígio, ‘como caçador persegue a presa’.
Certamente tal espécie de ‘ação’ que é a expressão jurisdicional de um outro direito, assegurado mesmo aos
que não tenham razão” (SILVA. Direito subjetivo, pretensão de direito material e ação, p. 115).
64
CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. Teoria geral do processo, p. 250.
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A teoria dos distintos planos da ordem jurídica 169
Considerações finais
Ao fim e ao cabo, o presente ensaio permite concluir que:
A ordem jurídica pátria é composta por dois distintos planos.
Os planos do Direito Material e do Direito Processual não podem ser
confundidos entre si.
Tal noção apresenta-se como lição basilar, não mais podendo
escapar ao conhecimento de todo e qualquer operador do direito.
Enquanto o plano do Direito Material tem por espoco enunciar
regras capazes de permitir a boa convivência dos homens em sociedade,
o plano do Direito Processual presta-se tão somente a traçar regras
concernentes a forma a ser respeitada para a solução das contendas
levadas a juízo.
A incidência de norma de natureza material sob determinado fato
“pré-visto”, faz nascer uma relação jurídica de Direito Material (sujeitos,
objeto, vínculo); as relações de Direito Processual advêm da provocação
de um sujeito de direito ao Estado para que cumpra com seu poder-dever
de dizer/realizar o direito (partes, causa de pedir e pedido).
Tanto no plano Material como no plano Processual não se confun
dem as noções de Direito subjetivo, pretensão e ação. A noção de Direito
subjetivo reflete a existência de vantagem jurídica de um sobre outro
sujeito de direito, possuindo este natureza estática; a noção de pre
tensão, bem compreendida, retrata a ideia de potencialização do Direito
subjetivo. O nascimento da pretensão torna o Direito Subjetivo exigível;
interesse seu, protegido em abstrato pelo direito. É com referência a esse direito que o Estado está obrigado
a exercer a função jurisdicional, proferindo uma decisão, que tanto poderá ser favorável como desfavorável”
(CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. Teoria geral do processo, p. 252).
70
A respeito das críticas, vide: DIDIER JR. Curso de direito processual civil, p. 161-163.
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170 Artur Luis Pereira Torres
a noção de ação, por sua vez, guarda estrita relação com o verbo agir.
Retrata o momento em que o titular do direito deixa de exigí-lo, passando
efetivamente a agir para vê-lo satisfeito.
No concernente ao elo existente entre os distintos planos, pensamos
poder ou não existir, pois que a qualquer cidadão, na atual formatação
sistêmica do ordenamento, é possível exercer pretensão processual, esteja
esta vinculada, ou não, a qualquer “suposto” direito material alegado
em juízo.
Dentre as diversas teorias referentes ao direito de ação processual,
pelo menos para o momento, afigura-se mais aproximada da realidade
forense contemporânea tese sustentada pelos defensores da teoria do
direito abstrato de ação, seja por sua competência em explicar o fenômeno
das demandas improcedentes e das ações declaratórias negativas, seja
pelas atuais e convincentes críticas apontadas a teoria adotada formal
mente pelo CPC/73.
Referências
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A teoria dos distintos planos da ordem jurídica 171
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leira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 155-171, out./dez.
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R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 155-171, out./dez. 2010
A utilização da ação rescisória para a desconstituição de decisão fundamentada em prova obtida por... 173
Introdução
A ação rescisória sempre desempenhou papel relevante no ordena
mento jurídico nacional.2 É através dela que se propõe ataque à decisão
de mérito transitada em julgado.
Para tanto, deverá haver o preenchimento de alguns requisitos
previstos na legislação processual, dentre os quais merece destaque a
necessidade de que a pretensão do autor da ação se amolde ao menos
a uma das situações previstas no art. 485, do CPC.
E-mail: <mfs@amazon.com.br>.
1
Para uma análise da evolução do instituto da ação rescisória verificar MIRANDA, Pontes de. Tratado da ação
2
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 173-188, out./dez. 2010
174 Michel Ferro e Silva
3
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2010. v. 5,
p. 365.
4
“Admite-se ação rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenham esgotados
todos os recursos”.
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A utilização da ação rescisória para a desconstituição de decisão fundamentada em prova obtida por... 175
5
Nesse sentido, v. DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de direito processual civil.
Salvador: JusPodivm, 2007. v. 3, p. 294.
6
O Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil reduz para 01 (um) ano o prazo de ajuizamento da ação.
7
Por todos, conferir, BUENO, op. cit., p. 363.
8
Sobre o assunto, consultar, MIRANDA, op. cit., p. 104-8.
9
BUENO, 2010, p. 375.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 173-188, out./dez. 2010
176 Michel Ferro e Silva
10
Assim, por todos, NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 678. Sugerindo uma aplicação interpretativa, verificar, WAMBIER,
Tereza Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. Relativização da coisa julgada. In: DIDIER JR., Fredie (Coord.).
Relativização da coisa julgada. Salvador: JusPodivm, 2006. p. 343.
11
NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
p. 67. Prossegue o ilustre processualista afirmando que: “A CF é o contexto necessário de todas as normas.
Para tanto, é necessário que haja prévia e expressa disposição normativa no sistema autorizando a aplicação
desses institutos de exceção. Permitir que o magistrado, no caso futuro, profira decisão sobre o que fez e o que
não fez coisa julgada, a pretexto de que estaria aplicando o princípio da proporcionalidade, não é profligar-
se tese de vanguarda, como à primeira vista poderia parecer, mas, ao contrário, é admitir-se a incidência do
totalitarismo nazista no processo civil brasileiro”.
12
Como dito, em que pese o texto legal se referir a “violação literal de lei”, tem predominado o entendimento de
que a palavra “lei” deve ser empregada de maneira ampla, sendo sinônimo de norma jurídica. Nesse sentido:
“O texto emprega o vocábulo lei no sentido de norma, ou lei material, e abrange tanto a lei de direito público,
como a de direito privado, a de direito material e a de direito processual” (MARQUES, José Frederico. Manual
de direito processual civil. Campinas: Millennium, 2003. v. 2, p. 547). No mesmo sentido, conferir, DIDIER JR.;
CUNHA, 2007, p. 325.
13
O dogma da coisa julgada: hipóteses de relativização. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 179. Em outra
obra, os citados autores afirmam que: “Concebe-se hoje que o desrespeito a princípios é muito mais nocivo
para o sistema que a ofensa a dispositivos legais. Logo, a conclusão não poderia ser outra se não a de que o
desrespeito a princípios deve entender-se hoje como alcançado pelo art. 485, inc. V do Código de Processo
Civil” (WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. Relativização da coisa julgada. In: DIDIER
JR., Fredie (Coord.). Relativização da coisa julgada. Salvador: JusPodivm, 2006. p. 347). Compartilhando com
o entendimento, GERAIGE NETO, Zaiden. Ação rescisória: o lento caminhar do direito escrito, comparado às
rápidas transformações das sociedades contemporâneas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 187.
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A utilização da ação rescisória para a desconstituição de decisão fundamentada em prova obtida por... 177
14
BUENO, op. cit., 2010, p. 381.
15
“Quer isto dizer que a rescisória, fundada em prova falsa, somente deve ser acolhida, caso se demonstre
a relação de causalidade entre a conclusão a que chegou o juiz e a prova tida como falsa. Se, reconhecida
a falsidade da prova, persiste a sentença, por haver outros elementos que lhe confiram substrato, não há,
então, razão para acolher-se a rescisória ou para julgar-se diferentemente” (DIDIER JR; CUNHA, op. cit, 2007,
p. 330). E, ainda: “É claro que não basta a simples comprovação da prova falsa. Faz-se necessário, também,
que referida prova seja vital para a existência, ou melhor, subsistência da decisão. Isto é, caso referida decisão
possa sobreviver por outro motivo, mesmo sendo comprovada a prova falsa, referido fundamento não poderá
ser utilizado como forma de rescisão. Claro, pois, sob os pontos de vista prático e também jurídico, não há
lógica em se tentar rescindir uma decisão se a mesma se sustenta com legitimidade, independentemente da
existência de eventual prova falsa” (GERAIGE NETO, op. cit., 2009, p. 56).
16
Ibidem, 2007, p. 330.
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178 Michel Ferro e Silva
17
“Não será por ter sido o legislador omisso a respeito, ou então porque à época em que foi feita a lei se
desconhecia, cientificamente, um meio de prova, que este não deve ser admitido. O que interessa é que o
meio seja jurídico – isto é, não repelido pelo sistema, mas harmônico com este – como também moralmente
lícito” (ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. v. 2, p. 460).
Verificar, ainda, THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 1987.
v. 3, p. 456-457; DIDIER JR., Fredie. Regras processuais no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 53-55.
18
MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2007. p. 269. Seguindo a mesma
linha de raciocínio, merece destaque o comentário: “Diversamente, por prova ilícita, ou ilicitamente obtida,
é de se entender a prova colhida com infração a normas ou princípios de direito material — sobretudo de
direito constitucional, porque, como vimos, a problemática da prova ilícita se prende sempre à questão das
liberdades públicas, onde estão assegurados os direitos e garantias atinentes à intimidade, à liberdade, à
dignidade humana” (AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas: interceptações telefônicas, ambientais e
gravações clandestinas. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 51).
19
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2010. v. 2, t. I,
p. 269.
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A utilização da ação rescisória para a desconstituição de decisão fundamentada em prova obtida por... 179
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180 Michel Ferro e Silva
(CPC, art. 4º, II). Todavia, se a sentença proferida na ação declaratória de autenticidade, houver declarado
autêntico o documento, fica excluída a possibilidade de rescisão com base nesse fundamento, em razão da
eficácia positiva da coisa julgada” (Op. cit., p. 330-331).
25
BUENO, op. cit., 2010, v. 5, p. 375.
26
Nesse sentido, conferir, CÂMARA, 2007, p. 80. O Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil substitui a
antiga expressão por norma jurídica (art. 884, V).
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A utilização da ação rescisória para a desconstituição de decisão fundamentada em prova obtida por... 181
27
BUENO, op. cit., 2010, v. 5, p. 381. Vale o registro de que “É ponto incontroverso na doutrina e na jurisprudência
que lei, tal como empregada no dispositivo, constitui expressão ampla, abrangendo tanto a lei estrangeira
como a nacional, tanto a material como a processual, tanto a infraconstitucional como a constitucional. A
expressão lei está, aí, abrangendo a lei complementar, a ordinária, a delegada, a medida provisória, o decreto
e qualquer outro ato de conteúdo normativo. Não abrange, porém, violação a texto de súmula, mesmo se
tratar de súmula vinculante” (DIDIER JR.; CUNHA, op. cit., 2007, p. 325).
28
No mesmo sentido, conferir, SILVA, César Dario Mariano. Provas ilícitas. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 113;
GOÉS, Gisele. Teoria geral da prova. Salvador: JusPodivm, 2005. p. 47-49 e DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, op.
cit., 2007, p. 33. Pela inadmissão das provas obtidas por meio ilícito, v. CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de
direito processual civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. v. 1, p. 402.
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182 Michel Ferro e Silva
29
AVOLIO, op. cit., 2010, p. 72. Ainda a respeito da teoria da proporcionalidade merece destaque a seguinte
passagem: “A definição geral da proporcionalidade estabelece-se em torno de dois elementos. Um elemento
fixo, constituído pela relação entre dois ou vários parâmetros, e outro elemento variável, representado pelo
grau de ligação que os une. É possível apresentar uma multiplicidade de definições, nas quais o conteúdo
será diferente, sendo que apenas a característica comum permanece na existência de determinada relação. A
concepção comum da proporcionalidade caracteriza-se pela existência de uma relação de correlação” (BARACHO,
José Alfredo de Oliveira. Direito processual constitucional: aspectos contemporâneos. Belo Horizonte: Fórum,
2008. p. 393). E, ainda: “A par dessa vinculação aos direitos fundamentais, o princípio da proporcionalidade
alcança as denominadas colisões de bens, valores ou princípios constitucionais. Nesse contexto, as exigências
do princípio da proporcionalidade representam um método geral para a solução de conflitos entre princípios,
isto é, um conflito entre normas que, ao contrário do conflito entre regras, é resolvido não pela explicitação
de distinto campo de aplicação entre as normas, mas antes e tão-somente pela ponderação do peso relativo
de cada uma das normas em tese aplicáveis e aptas a fundamentar decisões em sentidos opostos. Nessa
última hipótese, aplica-se o princípio da proporcionalidade para estabelecer ponderações entre distintos bens
constitucionais” (MENDES, Gilmar Ferreira. Intervenção federal e princípio da proporcionalidade: o caso dos
precatórios. Texto baseado em voto proferido em 14 de agosto de 2002 nos autos das Intervenções Federais
nºs 2.915 e 2.953, ajuizadas em desfavor do Estado de São Paulo).
30
NERY JUNIOR, op. cit, 2009, p. 260.
31
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tratou do tema, basicamente, sob o enfoque do direito
processual penal. De toda forma, merece destaque a seguinte decisão: “Constitucional e Processual. Mandado
de Segurança. Escuta telefônica com ordem judicial. Réu condenado por formação de quadrilha armada, que
se acha cumprindo pena em penitenciária, não tem como invocar direitos fundamentais próprios do homem
livre para desentranhar prova (decodificação de fita magnética) feita pela polícia. O inciso LVI do art. 5º. da
Constituição, que fala que ‘são inadmissíveis... as provas obtidas por meio ilícito’, não tem conotação absoluta.
Há sempre um substrato ético a orientar o exegeta na busca de valores maiores na construção da sociedade. A
própria Constituição Federal Brasileira, que é dirigente e programática, oferece ao juiz, através da ‘atualização
constitucional’ (VERFASSUNGSAKTUALISIERUNG), base para o entendimento de que a cláusula constitucional
invocada é relativa. A jurisprudência norte-americana, mencionada em precedente do Supremo Tribunal Federal,
não é tranqüila. Sempre invocável o princípio da ‘razoabilidade’ (REASONSABLENESS). O ‘princípio da exclusão
das provas ilicitamente obtidas’ (EXCLUSIONARY RULE) também lá pede temperamentos. Recurso Ordinário
improvido” (RMS nº 6.129/RJ. 6ª Turma. Rel. Min. Adhemar Maciel. J. 06.02.1996. DJ, p. 27492, 12 ago. 1996).
Conferir, ainda: RMS nº 17.482/BA. 5ª Turma. Rel. Min. Felix Fischer. J. 04.03.2004. DJ, 16 ago. 2004; HC nº
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 173-188, out./dez. 2010
A utilização da ação rescisória para a desconstituição de decisão fundamentada em prova obtida por... 183
93.856/ES. 6ª Turma. Rel. Min. Jane Silva. J. 17.03.2009. DJe, 19 out. 2009; HC nº 14.336/RJ. 5ª Turma. Rel.
Min. Edson Vidigal. J. 28.11.2000. DJ, 18 dez. 2000; HC nº 87.094/SP. 5ª Turma. Rel. Min. Napoleão Nunes
Maia Filho. J. 16.10.2008. DJe, 24 nov. 2008.
32
ARAÚJO, José Henrique Mouta. A verticalização das decisões do STF como instrumento de diminuição do
tempo do processo: uma reengenharia necessária. Disponível em: <www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/
salvador/jose.henrique.mouta.araujo.pdf>. Acesso em: 23 ago. 2010.
33
Nesse sentido, CÂMARA, 2007, p. 86-89; DIDIER JR.; CUNHA, 2007, p. 329 e BUENO, 2010, p. 382-383.
34
Verificar: AI nº 555.806 AgR. Rel. Min. Eros Grau. J. 01.04.2008. DJe, 18 abr. 2008; RE nº 564.781 AgR/ES.
Rel. Min. Ellen Gracie. J. 09.06.2009. DJe, 30 jun. 2009; AR nº 1.409/SC. Rel. Min. Ellen Gracie. J. 26.03.2009.
DJe, 14 maio 2009; RE nº 463.624 AgR-ED-ED/RS. Rel. Min. Joaquim Barbosa. J. 04.08.2009. DJe, 28 ago.
2009; RE nº 500.043 AgR/GO. Rel. Min. Carmen Lucia. J. 26.05.2009. DJe, 26 jun. 2009.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 173-188, out./dez. 2010
184 Michel Ferro e Silva
Não é a mesma coisa vedar a rescisória para rever uma interpretação razoável
de lei ordinária que tenha sido fundada por um juiz em confronto com outra
interpretação de outros juízes, e vedar a rescisória para rever uma interpre-
tação da lei que é contrária àquela fixada pelo Supremo Tribunal Federal em
questão constitucional.
E ainda:
Nesse ponto, penso que é fundamental lembrar que nas decisões proferidas por
esta Corte temos um tipo especialíssimo de concretização da Corte Constitucional.
E isto certamente não equivale à aplicação da legislação infraconstitucional.
25 ago. 2010.
ARAÚJO, op. cit., p. 2.961.
36
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 173-188, out./dez. 2010
A utilização da ação rescisória para a desconstituição de decisão fundamentada em prova obtida por... 185
37
CÂMARA, 2007, p. 89.
38
DIAS, Jean Carlos. Análise econômica do processo civil brasileiro. São Paulo: Método, 2009. p. 99.
39
Nesse sentido, v. DIDIER JR; CUNHA, p. 332.
40
ARAÚJO, op. cit., p. 2.962.
41
Verificar RE nº 402.717/PR. 2ª Turma. Rel. Min. Cezar Peluso. J. 02.12.2008; RHC nº 86.082/RS. 2ª Turma.
Rel. Min. Ellen Gracie. J. 05.08.2008; HC nº 91.350/SP. 2ª Turma. Rel. Min. Ellen Gracie. J. 17.06.2008; HC nº
93.050/RJ. 2ª Turma. Rel. Min. Celso de Melo. J. 10.06.2008; HC nº 89.032/SP. 1ª Turma. Rel. Min. Menezes
Direito. J. 09.10.2007; RHC nº 90.376/RJ. 2ª Turma. Rel. Min. Celso de Mello. J. 03.04.2007.
42
Nesse sentido: “Assim, se somente por meio do controle difuso de constitucionalidade, portanto, anos após as
questões terem sido decididas pelos Tribunais ordinários, é que o Supremo Tribunal Federal veio a apreciá-las,
é a ação rescisória, com fundamento em violação de literal disposição de lei, instrumento adequado para a
superação de decisão divergente” (ARAÚJO, p. 2961).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 173-188, out./dez. 2010
186 Michel Ferro e Silva
Conclusão
Respeitando-se as evidentes limitações inerentes a trabalhos dessa
natureza, as seguintes conclusões foram extraídas:
1. A ação rescisória continua desempenhando relevante papel na
sistemática processual brasileira, permanecendo como instru
mento apto a desconstituir decisões judiciais alcançadas pela
coisa julgada e que contenham os vícios arrolados no art. 485,
do CPC.
2. O rol do art. 485, do CPC, permanece devendo ser entendido
como taxativo, sendo vedada a sua interpretação extensiva ou
ampliativa, de maneira que o pedido rescisório deverá se amol
dar a uma das situações previstas na citada relação, sob pena
de reconhecimento pelo órgão jurisdicional de que o autor é
carecedor do direito de ação.
3. Em que pese não estar contemplada expressamente na relação
do art. 485, CPC, se mostra cabível a propositura de ação resci
sória que objetive desconstituir decisão de mérito passada em
julgado e que se valeu de prova obtida ilicitamente.
4. Referida ação não deverá ser ajuizada com base na hipótese
prevista no art. 485, VI, do CPC, uma vez que é flagrante a
distinção existente entre prova falsa e prova obtida por meio ilícito.
5. Cabível, todavia, com base no art. 485, V, do CPC, isto é, por violar
literal disposição de lei, que no presente caso possui roupagem
constitucional — art. 5º, LVI, da Constituição da República.
6. Em que pese haver divergência a respeito da utilização no pro
cesso civil das provas obtidas por meios ilícitos, o enunciado nº 343
da Súmula do Supremo Tribunal Federal não pode representar
óbice ao ajuizamento da ação rescisória na situação aqui tratada.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 173-188, out./dez. 2010
A utilização da ação rescisória para a desconstituição de decisão fundamentada em prova obtida por... 187
Abstract: This article is about the discussion that involves the convenience
of the termination claim for the undoing of judicial pronouncement that
is based on evidence obtained by illegal means. For that, at first, it’s made
a brief reminder of the demanded requirements by the process legislation
about the pertinence of this action and it’s established the premise that these
hypotheses corresponds to a precise list. After that, it’s defined the aspects
that distinguish the false evidence from evidence obtained by illegal means,
concluding for the impossibility of filing the action founded on article 485,
V of CPC, with the purpose of preserving the Constitutional supremacy and
the authority of Supreme Court decisions.
Key words: Termination claim. Undoing of judicial pronouncement.
Pertinence. Illegal evidence. Evidence obtained by illegal means.
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WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. Relativização da coisa
julgada. In: DIDIER JR., Fredie (Coord.). Relativização da coisa julgada. Salvador: JusPodivm,
2006.
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1 Introdução
Nesses tempos de comemoração dos vinte anos da estabilidade
constitucional, o direito processual penal brasileiro tem demonstrado
que ainda há sérias restrições à consolidação do sistema jurídico criado
pela Constituição brasileira.
Enquanto os demais ramos do Direito Público caminham, ainda
que lentamente, sobre os trilhos do processo de redemocratização posto
pelo texto constitucional, os institutos — e aqui queremos nos referir
às leis e às instituições propriamente ditas — da persecução penal têm
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190 Ricardo Augusto de Araújo Teixeira
Existe toda uma linha de pensamento teórico centrada nessa proposta. Para
essa base teórica, o processo se volta para sua instrumentalidade, como meio
de pacificação social, objetivando alcançar seus escopos metajurídicos, como
defende Dinamarco. (BARROS, 2008, p. 7)
A este problema voltaremos ao falarmos da estrutura necessária ao uso da técnica dos precedentes judiciais.
1
Nota do autor.
2
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Por todos, cf. NUNES, Dierle José Coelho. O princípio do contraditório: uma garantia de influência e não
3
surpresa. In: DIDIER JR., Fredie; JORDÃO, Eduardo Ferreira. Teoria do processo: panorama doutrinário mundial.
Salvador: JusPodivm, 2007.
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No original: “The most commonly heard justification for the doctrine of stare decisis rests on the need for
4
civil law que quer entender o sistema da common law enfrenta diz respeito ao papel e à estrutura da legislação,
e à incrível importância do caso concreto” (FORDHAM, 2006, p. 2, tradução livre). No original: “The main
challenges facing a civil lawyer who wishes to understand and function within a common law system thus
relate to the role and structure of legislation and the overwhelming significance of case law”.
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Por fundação estamos nos referindo ao momento histórico entre a declaração de independência e a promulgação
6
da Constituição.
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Precedente vinculante nos Estados Unidos não significa, porém, que o prece
dente de um caso está escrito em pedra. O precedente mudará progressivamente
quando o legislador mudar a lei sobre a qual o precedente se baseia, quando a
evolução cultural do tempo o requerer, quando a filosofia judicial da maioria
da Corte, com autoridade para mudar o precedente aplicável, alterar ou
revogar o precedente anterior, ou quando a Corte recursal com autoridade para
mudar o precedente determinar que cometeu um erro ao estabelecer o pre
cedente em questão. (COLE, 1998, p. 92)
7
Devemos informar que não se ignora a existência de quem afirme categoricamente a impertinência da distinção
entre questões “de fato” e questões “de direito”. Neste sentido, por exemplo, cf. o cap. 7 de MACINTYRE,
Alasdair. Depois da virtude. Bauru, SP: Edusc, 2001. Todavia, pela clareza da imagem que tais expressões têm,
as usaremos sempre que nos pareçam ser didaticamente satisfatórias.
8
A questão da maleabilidade do sistema será novamente abordada na parte final do trabalho, vez que é ponto
central da crítica relativa à aplicação que se tem dado à doutrina do Stare Decisis no Brasil.
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É preciso assinalar que stare decisis não é apenas uma doutrina de estabilidade
e uniformidade. Suas restrições e limitações inerentes bem como os fatores
que determinam a inaplicabilidade de decisões anteriores tornam possível
a necessária flexibilidade, indispensável para a mudança e o progresso.
(RE, 1994, p. 51)
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surgir ao se tentar transpor aquele modelo para países que até pouco
tempo não recebiam quase nenhuma influência direta dos ordenamentos
anglo-saxões.
É preciso não perder de vista que todo projeto que envolva diálogo
entre sistemas jurídicos diversos, cujas raízes históricas também não são
comuns, deve seguir um projeto preestabelecido a fim de não se reduzir
a uma mera comparação de legislações, nem a uma comparação caótica
entre modelos incompatíveis.9
Daí a conclusão de que a melhor metodologia de trabalho em
direito comparado é aquela apontada por Michele Taruffo (2001):
9
O melhor exemplo de tal incongruência parece ser o caso da imposição do Consenso Legal de Washington ao
Niger, especialmente no que diz respeito à esfera penal e processual penal. Enquanto para os ocidentais o que
se estava fazendo era modernizar o sistema legal daquele país, para os nativos o que estava acontecendo era
a imposição de um sistema “inconvenientemente remoto, caro, lento, corrupto, que, por fazer as perguntas
erradas, chegava a respostas erradas” (KELLEY, 2007, p. 37).
10
No original: “Al contrario, si riconosce ormani uniformemente Che l’analisi comparatistica si può fare utilmente
soltanto sulla base di um ‘progetto culturale’ presupposto e messo in opera da chi effettua l’analisi. Questa,
quindi, non è mai passiva, neutrale o indifferente: è invece condizionata ed orientata sia dalla cultura própria
Del comparatista, sia dalle finilità in vista delle quali egli svolge il proprio lavoro. Il progetto culturale dello
studioso di diritto comparato orienta non solo le sue scelte (su quali ordinamenti, quali istituti, quali esperienze
mettere a confronto), ma anche il metodo con cui la comparazione viene svolta”.
11
No original: “Le cose possono configurarsi diversamente, e la comparazione può diventare più interessante e
più fruttuosa, se si prendono in consisiderazione non solo norme specifiche (...), ma modellli processuali”.
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12
“It reduces the Fourth Amendment to a form of words”, no original. 251 U.S. 385.
13
371 U.S. 471.
14
A DEA, Drug Enforcement Administratiton, que é a polícia federal americana especializada no combate ao
tráfico só foi criada em 1973.
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15
Narcotics, no original.
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É possível criticar a escolha do habeas corpus como parâmetro de comparação, vez que tradicionalmente se
16
aceita que tal instrumento tem restrições quanto à possibilidade de análise de material probatório. Contudo,
tal crítica, para ser efetivamente válida, teria que passar por três questões: primeiro, o fato de que há uma série
de situações em que nosso Código de Processo prevê recursos apenas para acusação, não deixando a defesa
com outra opção que não o manejo do HC; segundo, o fato de que a questão da celeridade (ou a falta dela)
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no manejo dos recursos, dependendo da situação, obrigue a defesa a se valer do HC; terceiro, a questão do
acesso à justiça, vez que apenas o HC, por não exigir capacidade postulatória, possibilita, em várias situações,
que o acusado mesmo — não por opção, mas pela falta dela, ou seja, por não ter defensor técnico — faça
valer a norma constitucional que estabelece que nenhuma lesão ou ameaça de lesão a direito será excluída da
apreciação do Judiciário.
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“Exausta com o esforço, ela se frustra quando percebe que não saiu do lugar. No mundo da Rainha vermelha
17
é assim mesmo. Corre-se mais e mais, para não sair do lugar. Aliás, é preciso correr muito para ficar no
mesmo lugar”.
O personagem é de Lewis Carrol, em Alice no país das maravilhas; a imagem a que nos referimos está em
ROLIM, Marcos. A síndrome da Rainha Vermelha. Rio de Janeiro: Jorge Zahar; Oxford, Inglaterra: University of
Oxford, Centre for Brazilian Studies, 2006.
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6 Conclusão
A legitimidade das decisões judiciais, em razão do destaque
que a atuação do Judiciário vem tendo, deve ser posta no centro do
debate da questão da legitimidade da tomada de decisão em contextos
democráticos.
Já que, diversamente dos demais Poderes constituídos, o Judiciário
não tem qualquer respaldo popular direto, é preciso pensar um modo
pelo qual as decisões judiciais não sejam legitimadas tão somente de
modo indireto, em razão de sua “obediência” à lei, mesmo porque a lei,
como se adverte desde o giro-linguístico, nada mais é que linguagem, não
tendo, imanente em si, valor.
Pudemos observar que existe uma nova base teórica, ainda em
construção, mas com traços já consolidados, em que a questão da legi
timidade das decisões assume uma feição nova, apta a concretizar o agora
sempre presente adjetivo “democrático”.
É preciso ter, contudo, coerência, no método e na técnica, de forma
que a expressão “ordenamento jurídico” não seja simplesmente um termo
genérico que significa tão somente “conjunto” ao invés de “sistema”.
Analisamos, portanto, o uso do Stare Decisis nos EUA, modelo que
serve de base para algumas das recentes modificações do processo bra
sileiro, e observamos que ele exige uma série de requisitos de ordem
estrutural e educacional para ser implementado.
Passamos à análise de como tal modelo tem sido aplicado no Brasil,
a partir da observação das decisões do Supremo Tribunal Federal no
que diz respeito a provas ilícitas por derivação, e finalizamos analisando
a elaboração da Súmula Vinculante número onze, para concluir que se
trata, na verdade, do uso equivocado de um modelo.
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Abstract: This paper deals with the issue of legitimacy of the decisions from
the Judiciary, questioning how could it be possible to harmonize taking
erga omnes decisions with demands of concreting the democratic character
of contemporary State. For that purpose, we’ve gone through the model of
judicial precedents from the US, which, traditionally, are compatible with
the idea of discursive legitimacy by granting extensive debate about crucial
issues. We’ll deal specifically with precedents within the Fruits of the Poisonous
Tree Doctrine, and, afterward, we deal with how the use of precedents is taking
place in Brazil, in order to display how the transposition of that institute is
been complex, not filling the needs in order to grant legitimacy through
the discursive way.
Key words: Judicial decision. Precedents. Stare Decisis. Discursive theory.
Federal Supreme Court.
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A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão prospectiva da formação de um sistema processual... 215
1 Introdução
O que espera um cidadão que bate às portas do Poder Judiciário
clamando por uma solução justa ao caso concreto que apresenta? Poder-
se-ia responder: que o Estado-Juiz conheça e resolva o conflito, num só
processo, satisfazendo o direito do autor (se julgado procedente o pedido),
e prestando medidas acautelatórias quando a urgência assim o exigir.
Ocorre que essa não foi a sistemática adotada pelo processo civil
brasileiro, que, em regra, exige uma multiplicidade de processos para
solucionar uma única lide. E é exatamente por conta desse espectro que
E-mail: <msolesc@hotmail.com>.
1
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216 Maria Soledade Soares Cruzes
2 Premissas teóricas
Antes de adentrar especificamente ao tema proposto, torna-se
necessário delinear algumas premissas teóricas que nortearão o seu
desen volvimento, destacando-se a forte tendência do direito processual
civil brasileiro contemporâneo em permitir, cada vez mais, que as regras
e princípios constitucionais iluminem a elaboração e aplicação de suas
normas, na medida em que confere a mais ampla força normativa à
Constituição Federal de 1988.
Neste contexto, é preciso, inicialmente, estabelecer uma noção de
direito constitucional processual, em contraposição ao direito processual
constitucional. É que, à luz dos ensinamentos de J. J. Canotilho (2003,
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A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão prospectiva da formação de um sistema processual... 217
É preciso esclarecer, contudo, que Humberto Ávila (2007, p. 135, grifo nosso), ao distinguir “postulado
2
normativo” de “sobreprincípios” situa o devido processo legal nesta segunda categoria, asseverando que: “O
qualificativo de normas de segundo grau, porém, não deve levar à conclusão de que os postulados normativos
funcionam como qualquer norma que fundamenta a aplicação de outras normas, a exemplo do que ocorre
no caso dos sobreprincípios, como o princípio do Estado de Direito ou do devido processo legal. Isso porque
esses sobreprincípios situam-se no próprio nível das normas que são objeto de aplicação, e não no nível das
normas que estruturam a aplicação de outras. Além disso, os sobreprincípios funcionam como fundamento,
formal e material, para a instituição e atribuição de sentido às normas hierarquicamente inferiores, ao passo
que os postulados normativos funcionam como estrutura para a aplicação de outras normas”. Já o professor
Ricardo Maurício Soares (2008, p. 67), em obra dedicada especificamente ao estudo do devido processo legal
(sob uma visão pós-moderna), situa-o como “cláusula principiológica, prevista pela Constituição, irradiando-se
para a disciplina de todas as modalidades de processo (jurisdicional, legislativo, administrativo, negocial), como
modelo normativo de inegável inspiração pós-positivista”. De qualquer modo, o que se pode inferir dessas
afirmações é que, independente da classificação como “princípio geral”, “postulado”, “sobreprincípio” ou
“cláusula geral principiológica”, transparece como ponto pacífico o papel irradiante, derivante ou sustentador,
do devido processo legal no que tange aos outros princípios que regem o processo.
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3
Neste diapasão, torna-se oportuno pontuar que: “Se é indispensável uma porta de entrada, necessário
igualmente é que exista uma porta de saída, quer dizer, de nada adiantaria garantir-se o direito de postulação
a um juiz sem um devido processo em direito, isto é, sem um processo provido de garantias processuais”
(SOUZA, 2006, p. 20). E lembrar que, também sobre a correlação necessária entre os dois pilares do processo
também se manifesta J. J. Gomes Canotilho (2003, p. 494-495).
4
Wilson Alves de Souza (2010) também enfrenta este tema, em artigo específico, no qual critica a exaltação
da solução conciliatória dos conflitos (principalmente antes do acesso inicial à jurisdição, mas também nos
processos entregues ao Estado-Juiz), como se fosse “uma panacéia destinada a curar as graves deficiências
estruturais do Judiciário brasileiro”.
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A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão prospectiva da formação de um sistema processual... 219
Neste sentido, é preciso fazer uma reflexão crítica sobre a clássica afirmação de Rui Barbosa (2004, p. 53),
5
segundo a qual “a justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta”. Com efeito, Carlos
Alberto de Oliveira (2003, p.122, grifo nosso), ao desenvolver o instigante tema “Do formalismo no Processo
Civil”, enfatiza que “o processo só tem sentido quando atinge a sua principal finalidade em tempo relativamente
proporcional às dificuldades da causa, ou na medida em que se acomode à função reclamada em juízo”. Por
fim, Michele Taruffo (1999, p. 315) situa toda esta problemática na crise de funcionalidade da lei processual,
que apresenta como uma de suas manifestações a tentativa de conciliação da rapidez com a efetividade.
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220 Maria Soledade Soares Cruzes
que enquadra este último como a atividade por meio da qual se exerce a
função jurisdicional, em decorrência do direito de ação. Assim, sob uma
perspectiva lógica, sendo a jurisdição e a ação reconhecidamente unas,
o processo também deveria ser sistematizado.6
É exatamente sob esse fundamento que surge a ideia da alonomia
processual. Ora, alonomia é exatamente o antônimo de autonomia.
Diz-se “alônomo” o “organismo que é dirigido por estímulos provenientes
do exterior” (SILVA et al. 1979, v. 1, p. 100). Transpondo este conceito
para o âmbito jurídico, a alonomia processual seria, então, o reconheci
mento da ineficiência dos processos que, embora ditos autônomos, neces
sitam, em regra, um do outro para cumprir o seu desiderato de resolução
justa e efetiva do caso concreto apresentado ao Estado, no exercício de
seu poder jurisdicional.
Historicamente, a primeira das repartições do processo em espé
cies autônomas foi entre “conhecimento” e “execução”. Como bem
relata Theodoro Júnior (1987, passim), desde os primórdios do processo
civil romano já se exigia ação e processo autônomos para a execução da
sentença condenatória proferida.
Contudo, no direito germânico, que passou a prevalecer após
a queda do Império Romano, embora individualista, iniciando-se pela
execução, não havia separação entre as atividades executiva e cognitiva,
sendo elas exercidas em um só processo.
Do confronto do direito germânico com o romano, surgiu, ainda
na Idade Média, o direito comum ou intermédio, que conciliava os
aspectos positivos desses sistemas e também não aceitava a necessidade
de uma nova ação para que se chegasse à execução de uma sentença.
Fazia-se, assim, uma distinção até aquele tempo não aventada pelos doutos,
que era a existente entre a função cognitiva e função executiva dentro da jurisdição
e MARTINO DE FANO concebia, então, a idéia de officium iudicius, que iria
ser reconhecida por todos os escritores do direito comum.
[...] Para o direito medieval, o officium iudicis, que provocou a dispensa da actio
iudicati nas execuções de sentença, compreendia “todas as atividades que o juiz
devia exercer naturalmente, em virtude de seu ofício” (THEODORO JÚNIOR, 1987,
p. 136, grifo nosso).
Sobre essa sistemática tradicional, Alexandre Câmara (2007a, p. 231) reconhece que: “Não nos parece,
6
todavia, seja este o sistema adequado de lege ferenda. A unicidade da jurisdição é inequívoca. [...]. Ora, em
sendo única a atividade jurisdicional, não parece razoável afirmar a necessidade de dois [quiçá três] processos
distintos para que a tutela jurisdicional plena possa ser prestada”.
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A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão prospectiva da formação de um sistema processual... 221
A adoção não se deu de forma pacífica e tampouco unânime. Antonio Campos (1977, p. 311) — pouco tempo
7
após a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 1973 — registra que, entre os que doutrinaram no
sentido de ser a execução fase do processo estavam Gabriel de Rezende, Costa Carvalho e outros, apoiados
no pensamento de Eduardo Couture.
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É exatamente neste sentido que caminha Glauco Ramos (2006, p. 119-120): “Ora, qual a funcionalidade
8
atual do Livro II (processo de execução) se a tendência dos tribunais brasileiros é no sentido de aceitar ação
condenatória mesmo que o respectivo autor já disponha de título extrajudicial — o que obviamente ocorre pelo
fato de o CPC nada impor em sentido contrário —, e se atualmente o sistema processual positivo tem meios de
tornar mais efetiva a tutela jurisdicional executiva pelos caminhos do art. 461 e 461-A? Resposta: não há no
sistema nada que impeça o portador de título executivo extrajudicial de valer-se de uma ação que viabilizará
a tutela jurisdicional satisfativa, e mais efetiva, nos termos do art. 461 ou do art. 461-A do CPC, inclusive em
relação à prestação pecuniária, que obviamente não deixa de ser uma obrigação de entrega (obrigação de dar
coisa certa, no caso, dinheiro). [...] penso que as técnicas de tutela jurisdicional atualmente previstas no Livro I
podem ser utilizadas sem que seja necessária a utilização do procedimento da execução contra devedor solvente
prevista”. Como se pode observar, o autor derruba com maestria os entraves apresentados neste estudo, ao
entender que, além da Lei nº 11.232/2005 ter acabado com o processo de execução calcado em qualquer
título executivo judicial, o Livro II, que estaria reservado aos extrajudiciais, deve ser definitivamente abolido do
CPC. Mostra-se, assim, como perfeitamente compatível com o sistema atual a aplicação das técnicas do Livro
I aos títulos executivos extrajudiciais.
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226 Maria Soledade Soares Cruzes
9
Interessante notar que Piero Calamandrei (2000, p. 77-78), em sua “Introdução ao Estudo Sistemático do
Procedimento Cautelar”, ao analisar a extensão do poder geral de cautela a casos não previstos no ordenamento
jurídico italiano da década de 30 (época em que sua obra foi publicada), acabou ilustrando um exemplo
típico de medida satisfativa: “[...]. O proprietário de um clube noturno de Paris tinha dado o encargo a um
pintor de decorar a sala de baile com afrescos, que representassem danças de sátiros e ninfas; e o pintor,
para aumentar o interesse pela decoração mural, tinha pensado em poder dar aos personagens, que nessas
fotografias figuravam em vestes superlativamente primitivas, os semblantes, facilmente reconhecíveis, de
letrados e artistas muito conhecidos nos clubes mundanos. Na noite da inauguração uma atriz, que fazia
parte da multidão dos convidados, teve a surpresa de reconhecer-se em uma ninfa que dançava em vestes
extremamente sucintas; e visto que ela considerasse que essa representação fosse ofensiva para o seu decoro,
iniciou contra o proprietário do local uma ação civil, para condená-lo a apagar a figura ultrajante e a ressarcir os
danos; e nesse meio tempo pediu que, nas moras do julgamento, lhe fosse estabelecido cobrir provisoriamente
aquele pedaço de afresco, que reproduzia a sua imagem em pose impudica”. Segundo o autor, na Itália a
melhor solução para o caso relatado seria uma medida cautelar que, embora não prevista expressamente
no ordenamento jurídico, configuraria exercício do poder geral de cautela. Contudo, não foi este o caminho
seguido pela doutrina brasileira que, em sua maioria, insurgiu-se contra a possibilidade de concessão de uma
medida sumária satisfativa, com base no art. 798 do Código de Processo Civil (supracitado).
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A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão prospectiva da formação de um sistema processual... 227
Pelo que ora visualizamos, restarão ao processo cautelar autônomo duas únicas
utilidades: a) como ação cautelar incidental (art. 800 do CPC), tendo em vista a
necessária estabilização da demanda acautelada (arts. 264 e 294 do CPC), que já
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228 Maria Soledade Soares Cruzes
fora ajuizada, e também como forma de não tumultuar o processo com o novo
requerimento; b) nas hipóteses em que a ação cautelar é daquelas que dispensam
o ajuizamento da ação principal, exatamente porque não se trata de medida
cautelar (exibição – arts. 844 e 845 do CPC; caução – arts. 826 a 838 do CPC),
ou porque não se trata de medida cautelar constritiva (produção antecipada
de provas, ar ts. 846 a 851 do CPC). (DIDIER JR.; JORGE; RODRIGUES,
2003, p. 87-88)
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A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão prospectiva da formação de um sistema processual... 229
10
Neste sentido Glauco Ramos (2006, p. 114, grifo nosso) infere que “atualmente o ‘processo’ cautelar (Livro
III) carece de funcionalidade, sendo que o atual perfil das tutelas de urgência acabou por causar a primeira
grande fratura na estrutura tripartida do processo. O processo civil brasileiro não perderia em nada se uma
eventual lei de Reforma simplesmente derrogasse o CPC no tocante aos dispositivos de seu Livro III”.
11
Nas ideias de Teori Zavascki (2000, p. 09), trata-se do reconhecimento da relatividade da segmentação do
processo em espécies: “Tutela de conhecimento, tutela executiva e tutela cautelar constituem, nos moldes
clássicos acima reproduzidos, as três espécies de tutela jurisdicional e com base nelas é que também o legislador
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230 Maria Soledade Soares Cruzes
brasileiro de 1973 formulou a estrutura do sistema processual civil: a cada espécie de tutela correspondem
‘processo’, ‘ações’ e ‘procedimentos’, com seus princípios e normas próprias e separados em Livros específicos.
Está longe de ser absoluta, entretanto, em nosso sistema, a segmentação da tutela jurisdicional, consideradas
as espécies clássicas acima elencadas”.
12
Neste sentido, Didier Jr, Cheim Jorge e Abelha Rodrigues (2003, p. 86-87, grifo nosso) reconhecem que: “O
processo de conhecimento, que com a Reforma de 1994 já havia recebido grandes doses de efetivação e
asseguração (a própria antecipação da tutela, que possui funções executiva e de segurança), com essa nova
mudança atingiu a quase-plenitude do sincretismo das funções jurisdicionais: na própria relação jurídica
processual com função cognitiva, podem ser alcançadas a tutela cautelar e a tutela executiva. Observando-se
o quadro de mudanças legislativas, notadamente no que diz respeito ao incremento da tutela diferenciada
das obrigações de dar coisa distinta de dinheiro, fazer e não fazer pode-se tranqüilamente identificar uma
tendência inexorável de nossa legislação: a unificação dos ‘processos’. Com o claro objetivo de acabar com a
vetusta exigência de que, para cada função jurisdicional, uma relação jurídica processual própria, transforma-
se a relação jurídica processual de conhecimento, que passa a ter a característica da “multifuncionalidade”.
Aplausos”. Deve-se esclarecer que a afirmação dos doutrinadores refere-se a momento anterior à entrada em
vigor da Lei nº 11.232/2005 (que alterou definitivamente a sistemática da execução de sentença condenatória
proferida no cível, atingindo também a obrigação de pagar quantia certa). Contudo, não obstante esta ressalva,
nota-se que, já naquela época, os autores identificaram o fenômeno da sistematização (ou, no dizer deles,
“unificação”) do processo civil brasileiro.
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A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão prospectiva da formação de um sistema processual... 231
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A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão prospectiva da formação de um sistema processual... 233
Esse princípio é aprofundado por Cândido Dinamarco (2008), em sua obra intitulada “A instrumentalidade
14
do processo” e, na linguagem quase poética de Carlos Maximiliano (1997, p. 101, grifo nosso), se expressa
da seguinte forma: “Não basta a elaboração lógica dos materiais jurídicos que se encontram num processo,
para atingir o ideal de justiça baseada nos preceitos codificados. Força é compreender bem os fatos e ser
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234 Maria Soledade Soares Cruzes
inspirado pelo nobre interesse pelos destinos humanos; compenetrar-se dos sofrimentos e aspirações, e lhes
não oferecer uma pedra de simples raciocínio, e sim, o pão de amparadora simpatia”.
15
Neste sentido, pondera Glauco Ramos (2006, p. 111-112): “[...] processo é atividade de poder representada
na relação processual — rectius, num único ‘processo’ — seja realizada ora atividade cognitiva, ou atividade
executiva, ou atividade cautelar, o que variará de acordo com o momento procedimental e com a tutela
jurisdicional pretendida e adequada ao caso concreto”. E também merece destaque o pensamento de Luiz
Guilherme Marinoni (2009, p. 04): “El proceso civil nada más es una técnica que sirve para la tutela de los
derechos. Como técnica que es, debe estar en constante evolución, procurando siempre adaptarse a las
modificaciones que transforman la sustancia con que debe estar en contacto. Así, una vez que la sociedad y los
derechos a ella inherentes se alteran en todo momento, el cultor de la técnica procesal, o mejor, el legislador
y su interprete, no pueden ignorar la ardua tarea que tienen en manos, vale decir, el deber de elaborar un
proceso que realmente proteja a los ciudadanos y sus derechos.Desde el momento en que fue inventada la
rueda, el hombre a procurado elaborar técnicas para atender la vida social cada vez de forma más adecuada.
El proceso civil debe ser visto en esta perspectiva; solamente el interprete de la norma procesal que desconoce
la sociedad y sus derechos puede generar tesis que no respondan a la necesidad de un proceso que sea el
reflejo del principio constitucional de la efectividad, de las garantías de justicia contenidas en la Constitución
y de la propia naturaleza del derecho material.”
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A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão prospectiva da formação de um sistema processual... 235
Neste momento, remete-se às ideias de Jürgen Habermas (2003, p. 142): “E ‘discurso racional’ é toda a tentativa
16
de entendimento sobre pretensões de validade problemáticas, na medida em que ele se realiza sob condições da
comunicação que permitem o movimento livre de temas e contribuições, informações e argumentos no interior
de um espaço público constituído através de obrigações ilocucionárias. Indiretamente a expressão refere-se
também a negociações, na medida em que estas são reguladas através de procedimentos fundamentados
discursivamente”. Ademais, neste contexto de racionalidade, cumpre destacar que Josep Aguiló (1997) situa
a necessidade de independência e imparcialidade dos juízes, correlacionando com a argumentação jurídica
no processo. Ou seja, um processo democrático exige um juiz imparcial e comprometido em garantir a justiça
do caso concreto.
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236 Maria Soledade Soares Cruzes
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A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão prospectiva da formação de um sistema processual... 237
Além disso, não se pode deixar de ressaltar, ainda com base nas
proposições gerais sob comento, que há um intuito expresso em ampliar
os poderes do juiz conferindo-lhe a possibilidade de adequar as fases e
atos processuais às peculiaridades do conflito, buscando, desse modo,
garantir a maior efetividade possível ao bem jurídico tutelado, e desde
que observados o contraditório e a ampla defesa.
Ora, essa proposta, além de retomar a alusão à necessidade de
obediência aos princípios processuais constitucionalmente garantidos,
traduz-se, em especial, numa clara abertura do sistema processual à
justiça do caso concreto. Em outros termos, e para concluir, o espírito
do anteprojeto parece se coadunar com a mola propulsora das ideias
expostas neste trabalho, qual seja, a luta por um processo civil mais
efetivo e que possibilite o alcance da mais amparadora justiça.
6 Considerações finais
Em face do exposto, pode-se sintetizar que:
- Figuraram como premissas estruturantes do presente estudo os
pilares do devido processo legal e do acesso à justiça, no sentido
de garantir a adequação da técnica processual à prestação da
tutela jurisdicional de modo efetivo, e de atender, em tempo ra
zoável, às necessidades da vida (sob a ótica individual e social).
- Alonomia processual é o reconhecimento da ineficiência dos
processos que, embora ditos autônomos, necessitam, em regra,
um do outro para cumprir o seu desiderato de resolução justa
e efetiva do caso concreto apresentado ao Estado, no exercício
de seu poder jurisdicional.
- A ideia de um “processo de conhecimento puro” não é empecilho
para o avanço da alonomia dos processos de conhecimento e de
execução, seja na visão do processo como um desenrolar de fases,
seja como um conjunto de funções/atividades a serem exercidas
pelo Estado, na prestação jurisdicional.
- Trata-se do mesmo raciocínio a ser utilizado no que tange ao
processo executivo puro, mas identificando-se, neste caso, um
mero “ultrapassar de fases”.
- A introdução da tutela antecipada no ordenamento jurídico pátrio
e a fungibilidade das medidas de urgência enfraqueceram ainda
mais o processo cautelar, que já era essencialmente combalido.
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238 Maria Soledade Soares Cruzes
Referências
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 215-241, out./dez. 2010
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240 Maria Soledade Soares Cruzes
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A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão prospectiva da formação de um sistema processual... 241
CRUZES, Maria Soledade Soares. A sistematização do processo civil brasileiro: uma visão
prospectiva da formação de um sistema processual sincrético, multifuncional e aberto à
justiça do caso concreto. Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte,
ano 18, n. 72, p. 215-241, out./dez. 2010.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 215-241, out./dez. 2010
O agravo de instrumento e a inaplicabilidade do §4º do art. 515 do CPC no caso de defeito de formação... 243
O agravo de instrumento e a
inaplicabilidade do §4º do art. 515 do
CPC no caso de defeito de formação por
falta das peças facultativas
Gilberto Gomes Bruschi
Advogado. Doutor e mestre em Processo Civil pela PUC/SP. Professor na faculdade de direito da
Universidade São Judas Tadeu. Professor convidado nos cursos de pós-graduação lato sensu em
direito processual civil da EPD, da UNISANTA, do CESUSC, do Complexo Jurídico Damásio de Jesus,
da FADITU e da PUC/RJ. Sócio efetivo do IBDP.
Malheiros, 1996. n. 134-G, p. 189: “Faltando alguma das peças essenciais, o recurso estará mal-interposto e
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 243-247, out./dez. 2010
244 Gilberto Gomes Bruschi
Tal entendimento não deve mais persistir diante do §4º do art. 515 do CPC, que
se aplica ao agravo de instrumento. Ausente uma peça obrigatória do agravo
de instrumento, deve o relator, em vez de já lhe negar seguimento, determinar
a intimação do agravante para que providencie o complemento do traslado,
fazendo juntar aos autos do agravo a cópia que faltava. Cumprida a diligência,
prossegue-se no julgamento do agravo. Não cumprida, deve, então, ser-lhe
negado seguimento.
À evidência, a falta, no instrumento do agravo, de alguma peça obrigatória ou de
qualquer outra reputada essencial ou necessária à compreensão da controvérsia
não deve gerar a imediata inadmissibilidade do recurso, devendo, bem ao revés,
ser convertido o julgamento em diligência, com a determinação de intimação
do agravante para que supra a falha, complementando o recurso para trasladar
a cópia ausente.5
dele não conhecerá o tribunal (falta o requisito da regularidade formal, que é pressuposto de admissibilidade
de qualquer recurso). Mas ao agravante faculta-se incluir cópias de quaisquer peças dos autos do processo
— o que ele fará, naturalmente, mediante sua própria avaliação da conveniência de trazer cada uma delas
com vista ao sucesso do recurso. A falta de alguma peça do processo, ainda que não-essencial, poderá até
dificultar o improvimento do agravo, mas dificilmente lhe obstará à admissibilidade”.
2
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 5, n.
3.2.2, p. 163, de onde destacamos: “À falta de exigência legal para a sua juntada, contudo — e o art. 525, II,
está longe de exigi-la —, melhor interpretação é aquela que impõe ao órgão julgador do agravo de instrumento,
monocrático ou colegiado, que permita ao agravante, antes do julgamento, a juntada posterior das ‘peças
essenciais’, para que se aproveite, otimizando-o, o ato processual recursal tal qual praticado” (...) “Trata-se de
diretriz interpretativa que se afina ao §4º do 515 e que, por isto mesmo, não pode ser desconsiderada quando
do enfrentamento da questão”.
3
MOREIRA, Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. v. 5,
n. 275, p. 509, 510. No mesmo sentido: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de
conhecimento. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. n. 2.6.4, p. 549.
4
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Sanação de defeitos processuais no âmbito recursal (o §4º do art. 515 do
CPC). In: MEDINA, José Miguel Garcia; CRUZ, Luana Pedrosa de Figueiredo; CERQUEIRA, Luís Otávio Sequeira
de; GOMES JUNIOR, Luiz Manoel (Coord.). Os poderes do juiz e o controle das decisões judiciais: estudos em
homenagem à Professora Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 768.
5
Em sentido contrário: TJRS, Ag. nº 70019271493, 10ª Câm. Cível, rel. Des. Paulo Roberto Lessa Franz, decisão
monocrática, j. 12.04.2007, de onde destacamos: “Por fim, tratando-se de agravo de instrumento, ressalto
que não se mostra possível aplicar o disposto no art. 13 e no art. 515, §4º, ambos do Código de Processo
Civil, não havendo como intimar a parte para regularizar sua representação processual”.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 243-247, out./dez. 2010
O agravo de instrumento e a inaplicabilidade do §4º do art. 515 do CPC no caso de defeito de formação... 245
Cf. NERY JUNIOR, Nelson. Teoria geral dos recursos. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 390.
6
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 243-247, out./dez. 2010
246 Gilberto Gomes Bruschi
7
TJMG, AgIn nº 1.0231.08.125019-4/002, 12ª Câm. Cível, rel. Des. Saldanha da Fonseca, j. 04.03.2009: “Agravo
interno – Agravo de instrumento – Decisão monocrática – Não conhecimento do recurso – Ausência de peça
essencial. – O contrato de arrendamento mercantil é peça essencial à análise do pedido liminar de reintegração
de posse. A ausência de peça essencial à compreensão da matéria impõe o não conhecimento do agravo de
instrumento, ante a impossibilidade de conversão do julgamento em diligência”.
8
Cf. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
n. 4.3.1, p. 280, 281.
9
NEGRÃO, Theotonio; GOUVÊA, José Roberto Ferreira. Código de Processo Civil e legislação processual em
vigor. 41. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. nota 6 ao art. 525, p. 725, 726: “A Corte Especial do STJ decidiu que,
além das cópias obrigatórias referidas no inc. I do art. 525, ‘a ausência da peça essencial ou relevante para a
compreensão da controvérsia afeta a compreensão do agravo, impondo seu não-conhecimento’ (STJ – Corte
Especial, ED no REsp. 449.486, rel. Min. Menezes Direito, j. 2.06.04, rejeitaram os embs., cinco votos vencidos,
DJU, p. 155, 6 set. 04). ‘Na sistemática atual, cumpre à parte o dever de apresentar as peças obrigatórias
e facultativas — de natureza necessária, essencial ou útil —, quando da formação do agravo para o seu
perfeito entendimento, sob pena de não conhecimento do recurso’ (RSTJ 157/138; no mesmo sentido: RT
736/304, 837/241, JTJ 182/211). Ainda relativamente às referidas peças, a que se refere o art. 525-II do CPC,
‘não é possível que o relator converta o julgamento em diligência para facultar à parte a complementação do
instrumento, pois cabe a ela o dever de fazê-lo no momento da interposição do recurso’ (STJ – Corte Especial,
ED no REsp 509.394, rel. Min. Eliana Calmon, j. 18.8.04, negaram provimento, três votos vencidos, DJU, p.
157, 4 abr. 05,)” (grifos no original).
10
Cf. PINTO, Nelson Luiz. Manual dos recursos cíveis. 3. ed. 3. tiragem. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 147.
No mesmo sentido: ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. n.
51.1.2., p. 518: “Atribuiu-se ao agravante, no art. 525, o ônus de formar o instrumento de modo a permitir
a exata compreensão da controvérsia e o respectivo julgamento no tribunal. Traçam-se rígidas diretrizes
para atingir esse escopo. Desapareceu a possibilidade de converter o agravo em diligência, apresentando-se
insuficientemente instruído, constante da redação originária do art. 557, caput, segunda parte, explicável no
regime que incumbia o escrivão da extração, da conferência e do concerto (sic) do traslado e desconhecia
os meios contemporâneos de reprodução das peças. Na disciplina em vigor, existem tão-só dois termos de
alternativa: ou o agravo se encontra cabalmente instruído e é admissível; ou, ao invés, falta alguma peça nos
traslados e o recurso é inadmissível. Não é dado ao agravante, outrossim, corrigir eventual omissão após a
interposição do agravo de instrumento. Em tal hipótese, ocorre preclusão consumativa; ao relator, percebendo
a deficiência, cabe tirar a conclusão necessária: julgará inadmissível o recurso (art. 557, caput)”.
11
Ibid, n. 51.1.2., p. 521.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 243-247, out./dez. 2010
O agravo de instrumento e a inaplicabilidade do §4º do art. 515 do CPC no caso de defeito de formação... 247
Esse é o entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça, em que se afastou a aplicação do §4º do art. 515
12
do CPC, embora por decisão monocrática: Ag. nº 1.153.060/RS, 3ª T., rel. Min. Sidnei Beneti, j. 20.08.2009,
DJe, 28 ago. 2009; Ag. nº 1.100.349/PR, 4ª T., rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 13.05.2009, DJe, 26 maio
2009.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 243-247, out./dez. 2010
DOUTRINA
Parecer
Condenação de advogado a litigância de má-fé: cariz autoritário da decisão e atentado ao devido processo... 251
1 A consulta
Honra-me a brilhante Dra. XXX ao apresentar-me consulta a res
peito de questão de seu particular interesse. É procuradora da sociedade
empresária TFIL, e em favor dela atua numa “reclamação trabalhista”
promovida por LAMA. Concluída a instrução processual e proferida a
sentença, viu-se, a própria consulente, condenada, com exclusividade,
à litigância de má-fé.
Ouvi toda a narrativa, incluindo as possíveis razões pelas quais o
Juiz a quo assim procedeu. Também tive acesso à sentença e a li atenta
mente. Concluído o relato, foi-me solicitado responder aos seguintes
quesitos:
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 251-260, out./dez. 2010
252 Lúcio Delfino
2 O parecer
2.1 Interesse e objeto recursal
É a consulente advogada constituída pela demandada, TFIL,
em processo cuja tramitação se dá na “Justiça do Trabalho”. Proferida
a sen tença que colocaria termo àquela fase procedimental (cognitiva),
e ali pronunciada condenação direcionada à consulente (CPC, arts. 14,
caput, 18, §1º, e 125, II), é nada menos que evidente o seu interesse em
desafiá-la mediante o competente recurso ordinário. Obviamente que
a decisão jurisdicional a inseriu em situação desfavorável. Perceba-se,
neste rumo, que o Código de Processo Civil autoriza, de modo expresso,
a interposição de recurso também pelo terceiro interessado, desde que
demonstre o nexo de interdependência entre o seu interesse de intervir
e a relação jurídica submetida à apreciação judicial (CPC, art. 499, §1º).
Não bastassem esses argumentos, a própria sentença espanca
quaisquer dúvidas que poderiam restar. Afinal, ali mesmo em seu bojo,
cuidou o Juiz a quo de esclarecer que ela, a consulente, possui interesse
recursal próprio e específico, diverso daquele reservado a sua cliente.
Confira-se:
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 251-260, out./dez. 2010
Condenação de advogado a litigância de má-fé: cariz autoritário da decisão e atentado ao devido processo... 253
1
Esta a redação atual do art. 14 do Código de Processo Civil: “Art. 14. São deveres das partes e de todos aqueles
que de qualquer forma participam do processo: I – expor os fatos em juízo conforme a verdade; II – proceder
com lealdade e boa-fé; III – não formular pretensões, nem alegar defesa, cientes de que são destituídas de
fundamento; IV – não produzir provas, nem praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou defesa
do direito; V – cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de
provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final. Parágrafo único. Ressalvados os advogados que se
sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB, a violação do disposto no inciso V deste artigo constitui ato
atentatório ao exercício da jurisdição, podendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais
cabíveis, aplicar ao responsável multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não
superior a vinte por cento do valor da causa; não sendo paga no prazo estabelecido, contado do trânsito em
julgado da decisão final da causa, a multa será inscrita sempre como dívida ativa da União ou do Estado.”
2
Esta a redação do art. 32 da Lei nº 8.906/94: “Art. 32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício
profissional, praticar com dolo ou culpa. Parágrafo único. Em caso de lide temerária, o advogado será
solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que
será apurado em ação própria.”
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 251-260, out./dez. 2010
254 Lúcio Delfino
3
Se num Estado Democrático de Direito toda a atividade estatal há de ser controlada, é nada menos que lógica
a necessidade de um advogado no processo judicial. E assim idealmente deve ser, ao menos segundo impõe a
Constituição quando afirma que o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por
seus atos e manifestações no exercício profissional (CF/88, art. 133). Por meio deste comando, o constituinte
originário apenas instituiu outra importante garantia ao cidadão, especialmente ao jurisdicionado, àquele
que efetivamente haverá de lidar com a autoridade judiciária. Instituiu o direito fundamental a um advogado.
Confira-se, a respeito disso, a lição de Rosemiro Pereira Leal: “Assim, por imperativo constitucional, o pressuposto
subjetivo de admissibilidade concernente à capacidade postulatória, para a existência legítima de processo,
ação e jurisdição, não pode sofrer, no direito brasileiro, restrição, dispensabilidade, flexibilização ou adoção
facultativa, porque os procedimentos jurisdicionais estão sob o regime de normas fundamentais que implicam
o controle da jurisdição pelo advogado (CR/88, art. 133) e que somente se faz pela presença indeclinável do
advogado na construção dos procedimentos jurisdicionais (litigiosos ou não).” E arremata: “O que se extrai do
art. 133 da CR/88 é que, muito mais que o retórico controle do judiciário, há que se restabelecer, de imediato,
por consectário constitucional, com pronta revogação ou declaração de inconstitucionalidade de leis adversas,
o controle da atividade jurisdicional pelo advogado” (LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria da defesa no processo
civil. In: LEAL, Rosemiro Pereira. Relativização inconstitucional da coisa julgada: temática processual e reflexões
jurídicas. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 47-48).
4
Esta a redação do art. 18 do Código de Processo Civil: “Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento,
condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 251-260, out./dez. 2010
Condenação de advogado a litigância de má-fé: cariz autoritário da decisão e atentado ao devido processo... 255
indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas
que efetuou. §1º Quando forem dois ou mais os litigantes de má-fé, o juiz condenará cada um na proporção
do seu respectivo interesse na causa, ou solidariamente aqueles que se coligaram para lesar a parte contrária.
§2º O valor da indenização será desde logo fixado pelo juiz, em quantia não superior a 20% (vinte por cento)
sobre o valor da causa, ou liquidado por arbitramento.”
5
Este o teor do art. 17 do Código de Processo Civil: “Art. 17. Reputa-se litigante de má-fé aquele que: I – deduzir
pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; II – alterar a verdade dos fatos; III
– usar do processo para conseguir objetivo ilegal; IV – opuser resistência injustificada ao andamento do
processo; V – proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; VI – provocar incidentes
manifestamente infundados; VII – interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.”
6
Neste sentido: CORRÊA, Orlando de Assis. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados
do Brasil – OAB. Rio de Janeiro: Aide, 1997; NETTO LÔBO, Paulo Luiz. Comentários ao Estatuto da Advocacia
e da OAB. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 251-260, out./dez. 2010
256 Lúcio Delfino
É digna de citação a advertência de Antônio Cláudio Mariz de Oliveira: “(...) nós advogados, como poucos,
7
estamos preparados para o contraditório, para a divergência, para a oposição. Somos, pois, talhados para o
exercício da Democracia. Aliás, é no regime democrático, e só com ele, que a advocacia encontra campo fértil
para o seu pleno desenvolvimento em busca do integral cumprimento de sua missão. Na verdade, sem liberdade,
o exercício da profissão torna-se praticamente impossível, a não ser para pugnarmos pelo seu restabelecimento.
Nessa exata medida, a vigência plena das garantias democráticas é condição para o desempenho da advocacia”
(OLIVEIRA, Antônio Cláudio Mariz de. Combate à criminalidade e as prerrogativas profissionais. Revista do
Advogado, São Paulo, n. 93, p. 14-18, set. 2007).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 251-260, out./dez. 2010
Condenação de advogado a litigância de má-fé: cariz autoritário da decisão e atentado ao devido processo... 257
Responde por litigância de má-fé (arts. 17 e 18) quem causar dano com sua
conduta processual, que, nos termos do art. 16, somente podem ser as partes,
8
Advoga-se o entendimento de que ao juiz não é lícito aplicar multa por litigância de má-fé sequer às partes, sem
antes instaurar o contraditório e conferir-lhes direito à ampla defesa. Neste rumo, as lições preciosas de Gelson
Amaro de Souza: “Não está o juiz autorizado a aplicar multa por litigância de má-fé às partes sem o devido
respeito ao contraditório e à ampla defesa. Em se tratando de regime, que se pretende viver e conviver com um
Estado de Direito, não se pode pretender condenar alguém, sem que lhe seja concedida antes, oportunidade
de defesa. Em todo processo ou procedimento, administrativo ou judicial, deve-se respeitar os princípios do
devido procedimento legal, do contraditório e da ampla defesa. Hoje, até mesmo para os procedimentos
particulares exige-se o atendimento do devido procedimento legal. É o que acontece em casos de expulsão
de aluno de escola, exclusão de sócio de sociedade, exclusão de plano de saúde, etc. Em todos eles, exige-se
o devido procedimento legal, para a aplicação da punição. Se, até mesmo para os procedimentos particulares
se exige o devido procedimento legal, com maior razão é de se exigi-lo para o procedimento judicial em que
se enfrenta a questão relacionada à litigância de má-fé. Somente se poderá falar em atendimento do devido
procedimento legal, quando se proporcionar ao interessado o contraditório e o direito à ampla defesa, garantias
estas asseguradas constitucionalmente. Sem o atendimento do devido procedimento legal, do contraditório
e da ampla defesa, não se pode falar em aplicação de punição ao litigante de má-fé. Ninguém poderá ser
condenado, sem ser ouvido. Este é princípio universal de direito que deve ser respeitado por todos os povos
e, mais precisamente por aqueles que se pretendem viver em um Estado Democrático de Direito. Não se pode
condenar alguém a cumprir qualquer sanção por litigância de má-fé, sem que antes lhe sejam assegurados o
contraditório, o direito de defesa e o devido procedimento legal” (SOUZA, Gelson Amaro. Litigância de má-
fé e o direito de defesa. Revista Bonijuris, 550, p. 5-11, 2009). Ainda mais grave é condenar à litigância de
má-fé aquele (advogado) que não é parte processual e atua no processo profissionalmente, não em busca da
satisfação de seus próprios interesses, mas na defesa dos direitos do seu constituinte.
9
Obviamente que está o juiz autorizado, em dadas hipóteses, a suscitar oficiosamente questões que extrapolam
aquelas que as partes vêm debatendo ao longo do processo. É o que se dá com as chamadas questões de
ordem pública. Mas é erro crasso, infelizmente difundido na praxe forense, identificar o agir oficioso do juiz
com um agir alheio ao contraditório. O juiz pode (e deve) suscitar questões de ordem pública oficiosamente
em algumas circunstâncias, mas ao fazê-lo é também seu dever instaurar o contraditório e ouvir as partes,
dar-lhes condições de exercer amplamente seus direitos à ação e à ampla defesa. A Constituição Federal, ao
estabelecer o contraditório e a ampla defesa, não os excepciona nas hipóteses em que o juiz, diante de questão
de ordem pública, está autorizado a agir oficiosamente.
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258 Lúcio Delfino
Portanto, a sentença que ora se examina traduz-se mesmo num ato estatal des
pótico, especialmente por contrariar, de maneira frontal, o regime constitucional,
10
Superior Tribunal de Justiça. REsp nº 140.578-SP. Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em
20.11.2008. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em: 1º jun. 2009.
11
Tribunal Superior do Trabalho. RR nº 808.822/2001.0. Rel. Juiz Vieira de Mello Filho, Primeira Turma. DJU, p.
932, 19 dez. 2002.
12
Tribunal Superior do Trabalho. RR nº 520763. Rel. Min. Gelson de Azevedo, Quinta Turma. DJU, 03 dez. 2004.
Também elucidativa a ementa adiante recortada, relativa a julgado do Tribunal Regional do Trabalho, 3ª Região:
“Litigância de má-fé. Co-responsabilidade solidária do advogado. Não há supedâneo jurídico para a condenação
solidária do advogado por litigância de má-fé na própria ação em que constatada a conduta antijurídica do
constituinte. Inteligência do parágrafo único do art. 32 da Lei nº 8.906/94 e do parágrafo único do art. 14
do CPC, por sujeitar-se o profissional do direito ao próprio estatuto profissional. Não prevalece, ademais, a
responsabilidade solidária destituída de lei ou de contrato” (Tribunal Regional do Trabalho. Terceira Região.
RO nº 2746/03. Rel. Juíza Emilia Facchini, Sexta Turma. DJMG, p. 12, 08 maio 2003).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 251-260, out./dez. 2010
Condenação de advogado a litigância de má-fé: cariz autoritário da decisão e atentado ao devido processo... 259
13
Sobre as prerrogativas do advogado e sua indispensabilidade ao exercício da profissão, leciona Braz Martins
Neto: “É no Estatuto da Advocacia que encontramos as disposições que normatizam as prerrogativas. Veja-
se que ao definir a indispensabilidade na administração da justiça, o Estatuto prevê que o Advogado presta
serviço público e exerce função social, e que, no seu mister, é inviolável por seus atos e manifestações. É, pois,
necessário, para que possa exercer livremente sua atividade profissional, que tenha instrumentos vigorosos
para o desempenho intransigente da defesa de seu constituinte. Não se trata de conferir ao advogado
privilégios, de conotação tipicamente corporativa, mas, isto sim, de lhe dar meios de atuação, em que não
haja lugar para a hesitação ou temor na defesa intransigente dos direitos de seu cliente.” E conclui, logo à frente:
“A inviolabilidade do escritório, dos arquivos, dos dados de correspondências e comunicações, inclusive
telefônicas, garante ao cliente a privacidade na relação com aquele que recebe a incumbência de tratar
de seus interesses, tanto na esfera negocial quanto nas lides forenses. A proteção, portanto, não é para o
Advogado,mas, sim, para o seu constituinte, que nele deposita confiança, munindo-o de informações sigilosas,
necessárias para a adequada e eficaz atuação de seu defensor, que não é o titular do segredo, mas, tão só,
o mais fiel depositário dele” (MARTINS NETO, Braz. Ética e prerrogativas. Revista do Advogado, São Paulo,
n. 93, p. 19-22, set. 2007).
14
A posição defendida neste parecer é a adotada também pelo Supremo Tribunal Federal. Ao julgar a ADIn
nº 2.652/DF, entendeu a Corte, estendendo os efeitos do art. 14 do Código de Processo Civil igualmente
aos advogados públicos, o seguinte: “Com efeito, seria mesmo um absurdo concluir que o legislador tenha
pretendido excluir da ressalva os advogados sujeitos a outros regimes jurídicos, além daquele instituído pelo
Estatuto da OAB, como ocorre, por exemplo, com os profissionais da advocacia que a exercem na condição
de servidores públicos. Embora submetidos à legislação específica que regula tal exercício, também devem
observância ao regime próprio do ente público contratante. Nem por isso, entretanto, deixam de gozar das
prerrogativas, direitos e deveres dos advogados, estando sujeitos à disciplina própria da profissão (Estatuto
da OAB, arts. 3º, §1º; e 18). Na verdade afigura-se-me claro que a expressão ‘que se sujeitam exclusivamente
aos estatutos da OAB’ revela a intenção de justificar a razão pela qual a multa prevista no dispositivo não
se aplica aos advogados. Contudo, a norma, que apresenta inequívoco cunho moralizador relacionado à
conduta processual das partes e de todos aqueles que participam do processo, estabeleceu, em seu inciso V, a
obrigatoriedade de que todos cumpram as decisões judiciais sem criar embaraço. Previu, por outro lado, uma
multa pela inobservância do preceito, sanção essa inaplicável aos advogados, por estarem esses submetidos,
no campo disciplinar, apenas aos Estatutos da OAB (Lei 8906/94, artigo 70), com observância à garantia
constitucional de inviolabilidade dos atos do advogado no exercício de sua profissão (CF, artigo 133)” (Supremo
Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.652-6/DF, Tribunal Pleno. Rel. Min. Maurício Corrêa,
julgado em 08.05.2003. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>). Mais recentemente, ao julgar reclamação,
promovida por um procurador federal, o Supremo Tribunal Federal manteve a mesma rota: “Tem-se, pois, que os
Procuradores Federais — advogados de entes estatais — estão incluídos na ressalva do parágrafo único do art.
14 do CPC, não sendo possível, assim, fixar-lhes multa em razão de descumprimento do dever disposto no art.
14, V, do CPC.” E mais: “Sem discutir o acerto ou desacerto da condenação por litigância de má-fé — prevista
no art. 17, V, do CPC —, imposta pela autoridade reclamada, cumpre esclarecer que a condenação pessoal do
Procurador do Instituto Nacional do Seguro Social ao pagamento de multa processual é inadequada porque,
no caso vertente, ele não figura como parte ou interveniente na Ação 2006.38.00.744462-0. A despeito de
terem sido apontados como fundamento legal para a condenação do Procurador os arts. 17, V, e 18 do CPC,
está patente a aplicação do art. 14, V, e parágrafo único, do CPC, de forma transversa, reflexa e contrária ao
que decidido na ação-paradigma” (Supremo Tribunal Federal. Rcl. nº 5.133/MG, Tribunal Pleno. Rel. Ministra
Cármen Lúcia. julgado em 20.05.2009. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>).
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 251-260, out./dez. 2010
260 Lúcio Delfino
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 251-260, out./dez. 2010
NOTAS E COMENTÁRIOS
Apresentação – Professor José Joaquim Gomes Canotilho 263
Nota dos Diretores da Revista: Trata-se de texto, de autoria do Professor Sérgio Tiveron, elaborado a fim de
1
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 263-265, out./dez. 2010
264 Sérgio Tiveron
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 263-265, out./dez. 2010
Apresentação – Professor José Joaquim Gomes Canotilho 265
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 263-265, out./dez. 2010
RESENHA
Resenha 269
DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Processo Constitucional e Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte:
1
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 269-271, out./dez. 2010
270 André Del Negri
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 269-271, out./dez. 2010
Resenha 271
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 269-271, out./dez. 2010
Resenha 273
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 273-274, out./dez. 2010
274 Lúcio Delfino
Lúcio Delfino
Advogado. Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Membro do
Instituto Brasileiro de Direito Processual. Membro do Instituto dos Advogados de Minas Gerais.
Diretor da Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro.
BRITO, Lúcio Eduardo de. A ação popular como instrumento de invalidação da sentença
lesiva ao patrimônio público. Belo Horizonte: Fórum, 2010. Resenha de: DELFINO,
Lúcio. Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72,
p. 273-274, out./dez. 2010.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 273-274, out./dez. 2010
Resenha 275
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 275-276, out./dez. 2010
276 Dnieper Chagas de Assis
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 275-276, out./dez. 2010
Resenha 277
DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 14. ed. São
Paulo: Atlas, 2010. 1442 p.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 277-278, out./dez. 2010
278 Gil Ferreira de Mesquita
DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2010.
1442 p. Resenha de: MESQUITA, Gil Ferreira de. Revista Brasileira de Direito Processual
– RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 277-278, out./dez. 2010.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 277-278, out./dez. 2010
Resenha 279
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 279-282, out./dez. 2010
280 Marcelo José Magalhães Bonicio
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 279-282, out./dez. 2010
Resenha 281
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 279-282, out./dez. 2010
282 Marcelo José Magalhães Bonicio
MOREIRA, Alberto Camiña; ALVAREZ, Anselmo Prieto; BRUSCHI, Gilberto Gomes (Coord.).
Temas atuais das tutelas individuais e coletivas: estudos em homenagem ao Professor
Sérgio Shimura. São Paulo: Saraiva, 2010. Resenha de: BONICIO, Marcelo José Magalhães.
Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72,
p. 279-282, out./dez. 2010.
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 279-282, out./dez. 2010
Índice 283
Índice
página página
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 283-286, out./dez. 2010
284 Índice
página página
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 283-286, out./dez. 2010
Índice 285
página página
CONTRADITÓRIO J
- Ver: Condenação de advogado a litigância de má-fé: JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
cariz autoritário da decisão e atentado ao devido pro - Ver: O princípio da oralidade e o sistema recursal
cesso legal. Parecer de: Lúcio Delfino............................251 nos Juizados Especiais. Artigo de: Alexandre Freitas
Câmara...................................................................................... 13
D
DECISÃO JUDICIAL JUSTIÇA DA DECISÃO
- Ver: Colhendo frutos da árvore venenosa: formação - Ver: Assistência simples e coisa julgada material
e uso dos precedentes no Brasil e nos EUA. Artigo – A “justiça da decisão” do artigo 55 do Código
de: Ricardo Augusto de Araújo Teixeira......................189 de Processo Civil brasileiro. Artigo de: Alexandre
- Ver: Condenação de advogado a litigância de má-fé: Paulichi Chiovitti.................................................................143
cariz autoritário da decisão e atentado ao devido
processo legal. Parecer de: Lúcio Delfino...................251 L
LEI Nº 9.099/1995
DECISÃO - Ver: O princípio da oralidade e o sistema recursal
- Ver: Direito Processual e democracia. Artigo de: nos Juizados Especiais. Artigo de: Alexandre Freitas
André Del Negri..................................................................... 35 Câmara...................................................................................... 13
DESCONSTITUIÇÃO DE DECISÃO JUDICIAL
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
- Ver: A utilização da ação rescisória para a des
constituição de decisão fundamentada em prova - Ver: Condenação de advogado a litigância de má-fé:
obtida por meio ilícito. Artigo de: Michel Ferro e cariz autoritário da decisão e atentado ao devido
Silva..........................................................................................173 processo legal. Parecer de: Lúcio Delfino...................251
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 283-286, out./dez. 2010
286 Índice
página página
M PROVAS ILÍCITAS
MANDADO DE SEGURANÇA - Ver: A utilização da ação rescisória para a descons-
- Ver: Variáveis acerca do cabimento de intervenção tituição de decisão fundamentada em prova obtida
de terceiros no mandado de segurança. Artigo de: por meio ilícito. Artigo de: Michel Ferro e Silva.......173
José Henrique Mouta Araújo............................................ 23
PROVAS OBTIDAS POR MEIO ILÍCITO
MODELO CONSTITUCIONAL DO PROCESSO - Ver: A utilização da ação rescisória para a descons
- Ver: Condenação de advogado a litigância de má-fé: tituição de decisão fundamentada em prova obtida
cariz autoritário da decisão e atentado ao devido por meio ilícito. Artigo de: Michel Ferro e Silva.......173
processo legal. Parecer de: Lúcio Delfino...................251
R
MULTA REFORMAS PROCESSUAIS
- Ver: Condenação de advogado a litigância de má-fé: - Ver: Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo:
cariz autoritário da decisão e atentado ao devido uma avaliação das críticas neoinstitucionalistas
processo legal. Parecer de: Lúcio Delfino...................251 à teoria da instrumentalidade do processo. Artigo
de: Alexandre Araújo Costa; Henrique Araújo
N Costa........................................................................................127
NEOINSTITUCIONALISMO
- Ver: Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo: REGIME DEMOCRÁTICO
uma avaliação das críticas neoinstitucionalistas - Ver: Condenação de advogado a litigância de má-
à teoria da instrumentalidade do processo. Artigo fé: cariz autoritário da decisão e atentado ao devido
de: Alexandre Araújo Costa; Henrique Araújo processo legal. Parecer de: Lúcio Delfino...................251
Costa........................................................................................127
S
P SISTEMATIZAÇÃO
PLANO DO DIREITO MATERIAL - Ver: A sistematização do processo civil brasileiro:
- Ver: A teoria dos distintos planos da ordem jurídica. uma visão prospectiva da formação de um siste
Artigo de: Artur Luis Pereira Torres...............................155 ma processual sincrético, multifuncional e aberto à
justiça do caso concreto. Artigo de: Maria Soledade
PLANO DO DIREITO PROCESSUAL Soares Cruzes.......................................................................215
- Ver: A teoria dos distintos planos da ordem jurídica.
Artigo de: Artur Luis Pereira Torres...............................155 STARE DECISIS
- Ver: Colhendo frutos da árvore venenosa: formação
PRECEDENTES e uso dos precedentes no Brasil e nos EUA. Artigo
- Ver: Colhendo frutos da árvore venenosa: formação de: Ricardo Augusto de Araújo Teixeira......................189
e uso dos precedentes no Brasil e nos EUA. Artigo
de: Ricardo Augusto de Araújo Teixeira......................189 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
- Ver: Colhendo frutos da árvore venenosa: formação
PRESUNÇÃO JUDICIAL e uso dos precedentes no Brasil e nos EUA. Artigo
- Ver: A presunção judicial no Estado Democrático de: Ricardo Augusto de Araújo Teixeira......................189
de Direito: uma análise crítica do artigo 335 do
Código de Processo Civil. Artigo de: Henrique Yukio T
Pereira de Souza..................................................................107 TEORIA DA SUBSTANCIAÇÃO E TEORIA DA
INDIVIDUAÇÃO
PRINCÍPIO DA ORALIDADE - Ver: O conteúdo da causa de pedir no processo
- Ver: O princípio da oralidade e o sistema recursal civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC. Artigo de:
nos Juizados Especiais. Artigo de: Alexandre Freitas Felipe Scripes Wladeck....................................................... 45
Câmara...................................................................................... 13
TEORIA DISCURSIVA
PROCESSO CIVIL - Ver: Colhendo frutos da árvore venenosa: formação
- Ver: A sistematização do processo civil brasileiro: e uso dos precedentes no Brasil e nos EUA. Artigo
uma visão prospectiva da formação de um sistema de: Ricardo Augusto de Araújo Teixeira......................189
processual sincrético, multifuncional e aberto à
justiça do caso concreto. Artigo de: Maria Soledade TEORIA GERAL DO PROCESSO
Soares Cruzes.......................................................................215 - Ver: Instrumentalismo x Neoinstitucionalismo:
uma avaliação das críticas neoinstitucionalistas
PROFESSOR JOSÉ JOAQUIM GOMES CANOTILHO à teoria da instrumentalidade do processo. Artigo
- Ver: Apresentação – Professor José Joaquim de: Alexandre Araújo Costa; Henrique Araújo
Gomes Canotilho. Notas e comentários de: Sérgio Costa........................................................................................127
Tiveron....................................................................................263
TEORIA NEOINSTITUCIONALISTA DO PROCESSO
PROJETO DE NOVO CPC - Ver: A presunção judicial no Estado Democrático
- Ver: O conteúdo da causa de pedir no processo de Direito: uma análise crítica do artigo 335 do
civil brasileiro e o Projeto de Novo CPC. Artigo de: Código de Processo Civil. Artigo de: Henrique Yukio
Felipe Scripes Wladeck....................................................... 45 Pereira de Souza..................................................................107
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 283-286, out./dez. 2010
Instruções de publicação para os autores 287
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 287-288, out./dez. 2010
288 Instruções de publicação para os autores
R. bras. Dir. Proc. - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, p. 287-288, out./dez. 2010