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Frequência Direito do trabalho- 9/03

Capitulo 20. Regime comum do despedimento.

1. A) Os antecedentes- O sistema de LCT. No sistema anterior ao código ( LCT de 1969), o


contrato de trabalho podia ser extinto, por mero efeito de uma declaração unilateral
do empregador ( despedimento), através de três mecanismos diferentes: a rescisão
com justa causa, a denúncia unilateral e a extinção do contrato sem justa causa nem
aviso prévio.
A via normal ou ordinária de cessação por iniciativa patronal era a denuncia unilateral,
independentemente da indicação de motivos, mas sujeita a aviso prévio: tratava-se
pois ai de uma declaração extintiva com eficácia diferida.

2. O sistema estabelecido em 1975/76. Com a publicação do DL 372-A/75, de 16 de julho,


o quadro de possibilidades modificou-se substancialmente. A quase absoluta liberdade
de desvinculação que o sistema de LCT reconhecia à entidade empregador sofreu uma
importante compressão. A validade de uma declaração extintiva unilateral do
empregador passou a depender da existência de justa causa disciplinar ou de motivo
atendível.
3. Eram contempladas duas formas de despedimento individual:
a) O despedimento disciplinar, requerendo processo disciplinar;
b) O despedimento individual por causa objetiva, designado pela expressão
“ cessação” uma decisão da entidade empregadora que devia ser procedida de um
conjunto de comunicações.

Estes dois mecanismos tem em comum a fundamentação da rutura, embora de diferentes


naturezas, era sujeita a critério de aferição que consiste na prática impossibilidade da
subsistência da relação de trabalho ( artigo 9º/1 e 27/ 1 b) e ambos também sob a aparência
do imediatismo do efeito extinto, estavam cobertos por um conjunto de exigências
processuais ( arts. 10º e 28º a 30º) que implicavam uma significativa dilação entre a formação
do projeto de despedir e a sua consumação.

4. A continuidade do regime. Sob o ponto de vista estrutural, o sistema de vias de


cessação do contrato de trabalho por iniciativa do empregador quase não sofreu
alteração com o Código do trabalho. Essas vias são o despedimento por fato imputável
ao trabalhador, reconduzível ao despedimento como sanção disciplinar ( artigo 351º a
358º); o despedimento coletivo ( art 359º a 366º), o despedimento por extinção de
posto de trabalho ( art 367º a 372º) e o despedimento por inadaptação ( arts. 373º a
380º). O Código de trabalho introduziu a resolução judiciária do contrato, para
situações de despedimento ilícito em que o tribunal considera não dever haver
reintegração do trabalhador na empresa (art.392º).

5. A motivação do despedimento. Isto é, na progressiva eliminação da possibilidade da


extinção ad nutum do contrato de trabalho de duração indeterminada, por iniciativa
do mesmo empregador. Este funda-se numa ideia do caracter necessariamente
temporário das relações obrigacionais, que implicava não só a liberdade de
desvinculação a todo o tempo mas também a paridade dos contraentes quanto à
amplitude dessa liberdade. A evolução verificada nos ordenamentos jurídico-laborais
traduziu-se, justamente, na negação de tais pressupostos: a relação de trabalho
destina-se a perdurar ( em homenagem à exigência de estabilidade do emprego); a
liberdade de desvinculação não pode ser garantida em idêntico grau ao empregador e
ao trabalhador; a extinção do vinculo pelo primeiro há de fundar-se em motivos
externamente controláveis.

6. A processualização do despedimento. Um segundo passo na linha evolutiva de


condicionamento do direito de despedir é a processualização do despedimento, em
qualquer das suas modalidades. Soma-se a definição de requisitos de forma para as
ações desvinculatórias do empregador. Estes requisitos tem ou podem ter várias
finalidades: a de assegurar uma mais aprofundada ponderação das decisões extintivas,
a de fazer participar os trabalhadores nos processos decisórios e mantê-los ao
corrente das perspetivas de atuação do empregador, e também a de garantir meios de
controlo, a priori ou a posteriori, da regularidade do despedimento. Tal controlo pode
assumir a forma de uma autorização administrativa ou de uma decisão judicial,
solução mais corrente, também adotada entre nós. A importância das exigências
processuais acentua-se no domínio do despedimento individual com alegação de justa
causa.
C) suspensão do despedimento- Por regra, uma vez decretada a suspensão do
despedimento a relação juslaboral mantém-se viva, válida e eficaz como se contra a
mesma não se tivesse atentado, pelo que a reação previste como normal seria a de o
empregador viabilizar imediatamente ao trabalhador a recuperação do seu posto e
função, até que a providencia caduque ou se decida a ação de impugnação de que é
dependência, não existindo, neste caso qualquer prejuízo por banda dos protagonistas
da relação, pois o empregador paga a retribuição mas dispõe de força de trabalho e do
resultado da prestação do trabalhador.

7. A lei faculta ao trabalhador um meio excecional de oposição provisório à eficácia da


decisão de despedimento, em qualquer das suas modalidades: a suspensão do
despedimento.
Nos cinco dias úteis seguintes à receção da respetiva comunicação, pode o trabalhador
atingido recorrer ao tribunal competente para dele obter que seja decretada a
suspensão do despedimento ( artigo 386º CT). Esta declaração do tribunal tem o
alcance de, apesar de proferido o despedimento, manter a vinculação entre as partes
até que venha a ser decidida a respetiva ação de impugnação. Assim o salário continua
a ser devido durante o período de suspensão.
A situação do vinculo laboral entre a decisão de suspensão e a declaração final de
ilicitude ou licitude do despedimento não deixa de ser problemática. A peculiaridade
desta figura consiste em que a decisão judicial definitiva, conforme o sentido em que
se oriente, vai determinar, a posteriori, a natureza jurídica da situação em que
estiveram as relações entre o empregador e o trabalhador envolvidos desde a
suspensão. Esta implica a ineficácia provisória do despedimento e portanto, faz a
reviver o contrato que o empregador quis extinguir. Se a decisão definitiva for no
sentido da ilicitude do despedimento, o período de suspensão terá sido,
simplesmente, confirmado como um tempo de permanência do vinculo. Se, ao invés,
essa decisão for no sentido da licitude do despedimento, ela terá o alcance de
confirmar o seu originário efeito extintivo, não só pondo termo à suspensão mas
também deixando sem suporte contratual as prestações de trabalho e salariais que se
produziam a partir dela ( artigo 122º).

8. O regime processual. O processo de suspensão de despedimento individual é


estruturado pelo CPT (arts. 34º a 40º) em termos simples e expeditos.
As partes são simplesmente ouvidas, podendo apresentar qualquer meio de prova,
exceto se tiver havido processo disciplinar, caso em que só é admitida prova
documental (artigo 35º.).
A não comparência injustificada do trabalhador, determina, sem mais, o indeferimento
do pedido de suspensão; a não comparência injustificada do empregador tem como
consequência imediata a concessão de suspensão, a não ser que tenha sido
apresentado o processo disciplinar, casso em que o juiz decidirá perante ele ( artigo
37) .
A decisão deve ser proferida em regra na própria audiência; mas pode ser retardada
até oito dias, se a complexidade da causa o justificar (art. 36º).
Dela cabe recurso para a relação, em regra com efeito meramente devolutivo; ma o
empregador pode obter o efeito suspensivo se depositar no tribunal a quantia
correspondente a seis meses de retribuição do trabalhador- caso em que o tribunal
passará a atuar como pagador do salário enquanto a situação durar ( art.40º) .

9. O critério de decisão. A apreciação do pedido de suspensão, necessariamente


expedita, abster-se-á com os elementos indispensáveis ao estabelecimento de uma
convicção provisória, em termos de “probabilidade”, “ aparência” ou “
verosimilhança”, sobre a ilicitude do despedimento. Essa apreciação incidirá,
normalmente, no próprio processo disciplinar ( se for esse o caso) e outros
documentos, não tendo o juiz que ouvir testemunhas ( art.35º CPT).
Os fundamentos da suspensão tanto podem respeitar às condições de forma do
despedimento como à procedência da justa causa invocada.
Assim, tratando-se do despedimento disciplinar, a suspensão pode fundar-se na
prescrição do direito de ação disciplinar ( art.329º/1 e 2) ou do próprio procedimento
disciplinar ( art. 329º/3), na pura e simples inexistência de processo como na
contestação de alguma nulidade insuprível. Neste sentido é explicito o art 39º/1 CPT.
Se são controvertidas a própria qualificação do contrato ( como trabalho subordinado
ou autónomo) ou a natureza da causa de rutura ( caducidade? Revogação?
Despedimento?) , nem por isso existe fundamento para a rejeição liminar da
suspensão.
Mas é a aparência de justa causa que se trata sobretudo de determinar. Essa aparência
poderá no caso de despedimento disciplinar, resultar da verificação de que a situação
invocada corresponde a um dos tipos factuais que a lei enumera (art.351º/2) .

D) Despedimento ilícito- Declarado ilícito o despedimento, porque tal tem eficácia


retroativa, restabelece-se o vinculo contratual e os efeitos do contrato de trabalho,
como se o despedimento não tivesse existido, o que exige a consequente restauração
natural, devendo o empregador indemnizar o trabalhador por todos os danos
patrimoniais e não patrimoniais e reintegrá-lo, com a categoria e a antiguidade
devidas, salvo se for requerida indemnização em substituição da reintegração.
10. A noção de despedimento “ ilícito”. O uso da expressão despedimento ilícito encontra
aplicação na postura singular do ordenamento jurídico português face aos
despedimentos declarados em violação da lei.
Ilicitude é mais do que ilegalidade é contradição, não apenas com as normas, mas com
valores ou bem jurídicos fundamentais para a ordem jurídica.

11. A evolução das técnicas sancionatórias. Sendo o despedimento um ato de disposição


do emprego individual por parte do empregador, a consequência natural da sua
ilicitude é a ineficácia jurídica, ou seja, a recolocação do vinculo em vigor e a reposição
da relação de trabalho em normal desenvolvimento. Isso implica admitir a
reintegração do trabalhador no posto de trabalho, mesmo contra a vontade do
empregador. O despedimento irregular ou ilegal não poderia, pois, deixar de produzir
o efeito prático visado: a cessação do contrato de trabalho.

12. A ineficácia do despedimento. Assim no ordenamento português, constitui traço


comum aos regimes das várias modalidades de despedimento o conjunto dos efeitos
da declaração judicial da ilicitude do ato de rutura do vinculo pelo empregador. Estes
efeitos estão presentes no artigo 389º CT e correspondem ao tratamento normal da
ineficácia do negócio jurídico ( artigo 289º/1 CCIV): recomposição do estado de coisas
que se teria verificado sem a prática do ato.

Despedimento disciplinar: se se tratar de “ deficiência de procedimento por omissão


das diligencias probatórias” requeridas pelo trabalhador ao abrigo do artigo 356º,
sendo por outro lado reconhecida pelo tribunal a justa causa invocada. O
despedimento irregular, é pois eficaz- produz efeito extintivo que o empregador
visava, embora de ao trabalhador o direito a uma indemnização reduzida em relação à
normal.
Nos casos de despedimento ilícito a entidade empregadora deverá pagar ao
trabalhador o valor das retribuições correspondentes ao período entre o
despedimento e o “ transito em julgado da decisão do tribunal ( art. 390º/1)- aquilo
que ele ganharia se o contrato tivesse subsistido ( os chamados salários de tramitação
ou salários intercalares porque cobrem o período entre o despedimento e a decisão
judicial final.

13. A responsabilidade por prejuízos. Por outro lado, e cumulativamente com os salários
de tramitação, o despedimento ilícito pode implicar para o empregador
responsabilidade por danos patrimoniais e não patrimoniais que o trabalhador tenha
sofrido em consequência daquele ato e das circunstancias que o tenham rodeado .
estes prejuízos de muita diversa natureza, são acessórios ou colaterais em relação ao
da perda do emprego, mas casualmente ligados ao despedimento como ato ilícito.
Podem apontar-se como exemplos a perda do acesso a gorjetas e a outros benefícios
dados por terceiros.

14. O regime dos salários intercalares. Foi muitos discutido o ponto de saber se,
aproveitando o trabalhador a desocupação resultante do despedimento para exercer
uma atividade renumerada, deveriam os respetivos rendimentos ser deduzidos no
valor dos salários intercalares a pagar pelo empregador. O CT resolve explicitamente a
questão no sentido afirmativo ( art.390º/2). O CT vai mesmo ao ponto de declarar
dedutíveis os valores recebidos a titulo de subsidio de desemprego ( art.390º-c). Estas
soluções permitem fazer coincidir o valor devido pela entidade empregadora com o
que corresponde à privação patrimonial efetivamente sofrida pelo trabalhador, como
se de mera reparação de prejuízos se tratasse, mas é por outro lado penalizadora dos
trabalhadores mais diligentes e produtivos que com as ocupações exercidas, podem
acabar por exonerar o autor do despedimento ilícito relativamente a uma parte
importante das consequências do ato.

A reintegração e a indemnização “ substitutiva”- na fixação do valor da indemnização


em substituição da reintegração deve atender-se ao valor da retribuição, ao grau de
ilicitude do despedimento até ao transito em julgado da decisão judicial.
O valor da retribuição é ponderado na graduação da indemnização que tenderá a ser
mais elevada para um trabalhador que aufira uma renumeração inferior à média e
menor quando a retribuição se situa acima da média.

15. A reintegração. A segunda consequência da declaração judicial da ilicitude do


despedimento consiste, como se disse, na reintegração do trabalhador sem prejuízo
da sua categoria e antiguidade ( art. 389/1-b).
Ela só não ocorrerá numa de duas hipóteses.
A primeira é a de até à sentença, o trabalhador se desinteressar da reintegração e
optar por uma indemnização. A segunda é a de, por decisão judicial, suscitada por
pedido do empregador, a reintegração ser recusada nos termos que assinalaremos um
pouco adiante. A não reintegração consiste em duas coisas cumulativas ou
alternativas: não admissão “ física” no mesmo estabelecimento; não atribuição de
função ( ocupação efetiva) , sem justificação objetiva ( caso em que a não reintegração
se cruza com o assédio). Qualquer destes procedimentos preenche a contraordenação
grave.

16. A oposição à reintegração. A reintegração efetiva, como se disse, é muito rara, pois em
regra nem o empregador nem o trabalhador a desejam. Dai que a lei ofereça tanto a
um como o outro, meios de oposição à reintegração. Mas fá-lo de modo assimétrico.
O trabalhador pode opor-se à reintegração a todo o tempo, optando pela
indemnização de antiguidade “ até ao termo da discussão em audiência final de
julgamento” ( art. 391º/1), ou seja até a fase imediatamente anterior À decisão do
tribunal, e sem necessidade de fundamentar essa escolha. A opção do trabalhador tem
que ser forçosamente acolhida na mesma decisão.
A lei atribui assim ao trabalhador um direito potestativo de conformação das
consequências finais da decisão do tribunal. Encontra-se aqui uma forma atípica ou
inominada de extinção do contrato de trabalho. Na verdade a cessão do vinculo não é
juridicamente o efeito imediatamente visado pela declaração de opção do
trabalhador, mas a consequência desta e do contexto em que ela surge.
O empregador, por seu turno, tem, em certos casos, bastantes circunscritos, a
possibilidade de pedir que o tribunal, na sua decisão, rejeite ( “ exclua” é o termo
usado pela lei) a reintegração, invocando, como fundamento do pedido, factos e
circunstancias que tornem o regresso do trabalhador gravemente prejudicial e
perturbador da empresa ( art. 392º/1) .
A justificação exigida pela lei ao empregador é praticamente incontrolável pelo juiz:
tem o caráter de um prognóstico quanto ao comportamento futuro de um
trabalhador e às consequências que poderá ter o regresso desse trabalhador.
Como é obvio o pedido do empregador pode ser indeferido; esta decisão coloca-nos,
de novo, ante uma forma atípica e inominada de extinção do contrato: a resolução
judicial.
Nos termos do art.392º/3, a indemnização passa a ser fixada entre 30 a 60 dias de
retribuição base e diuturnidades por ano de antiguidade, não podendo ser inferior a
seis meses.

17. A indemnização “ substitutiva”. O art. 391º do CT trata de uma indemnização que o


trabalhador pode receber em substituição da reintegração. Na realidade, não existe
uma correlação entre o valor da reintegração e o montante da indemnização:
enquanto a primeira permite o prosseguimento da relação de trabalho, constituindo
dispositivo central da tutela da segurança do emprego, a segunda funciona como
compensação pela permanência de alguém ao serviço do mesmo empregador, ou seja,
como contrapartida da pertença continuada à empresa e da entrega pessoal que ela
representou, numa parte mais ou menos longa da vida ativa do trabalhador.

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