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A IMPORTÂNCIA DA FUNÇÃO PATERNA:

AS RELAÇÕES ENTRE PAIS E FILHOS NA ATUALIDADE


Gizele Almeida*

Este texto é uma síntese da palestra de mesmo título, proferida em junho


de 2013 aos pais de algumas escolas municipais de São Gonçalo do Rio
Abaixo/MG. Dessa forma, não se pretende aqui construir um material técnico,
muito embora esteja todo ele embasado em consistente referencial teórico, mas
tem-se como objetivo maior oferecer a esses pais, em material impresso, um
breve panorama do que fora tratado na palestra.
Pois bem, iniciaremos com a expressão que deu origem ao título: “Função Paterna”. Muito se questionou
dentre os espectadores se função paterna era algo exclusivo do pai, e essa foi a primeira definição: função paterna
não é função só de pai! Na verdade, a função paterna é a lei, a castração, o interdito. A função paterna é algo
(trabalho, estudo) ou alguém (pai, avô/ó, tia, namorado/a) que vai separar a forte liga mãe-criança. É o meio pelo
qual se mostra à criança que ela não é o centro do universo. A função paterna não obedece, necessariamente, a
uma ordem cronológica, mas sim uma ordem lógica, dada pelo do Complexo de Édipo, abordado por Freud e,
posteriormente, por Lacan.
Reside aí outra dúvida: O que vem a ser Complexo de Édipo? O nome é estranho, mas a explicação é
simples! A ideia central do Complexo de Édipo diz respeito à ilusão que a criança tem de que possui o amor e
proteção total da mãe, até que um dia ela se vê obrigada a perceber que ela e a mãe não são um ser único, que é
necessária a separação dessa liga mãe-bebê e que é importante e saudável a sua imersão na cultura. Aí se dá o
desfecho saudável do Édipo, embora esse percurso não seja tão simples para a criança e venha acompanhado de
dor e hostilidade.
Atualmente, temos percebido em vários casos que as relações entre pais e filhos têm sido pautadas
basicamente em uma condição em que o filho não é colocado nesse campo de ter que aceitar essa falta da mãe,
esse limite, essa castração, mas, ao contrário, é tratado como objeto de “gozo”, que deve ser entendido aqui como
uma relação em que o filho é considerado como “objeto”, no qual se realiza todos os desejos, tanto dele enquanto
filho quanto os nossos, de pais.
Nessa lógica, os filhos “ganham o mundo”: consumismo exacerbado, acesso amplo e irrestrito a tudo – de
TV aos jogos de vídeo game, internet e celulares. Os desejos dos filhos passam a vir em primeiro lugar e as relações
se tornam extremamente permissivas, de modo que, num dado momento, esses pais perdem o controle e a
autoridade e sentem dificuldade em dizer o precioso “não” a eles.
Diante desse quadro, surge a questão: Como se instaurar a função paterna? É inegável a necessidade de que
essa castração se instaure. A criança precisa ser submetida à lei e à castração. Esse é o preço para se livrar da
loucura! Os pais devem o limite ao filho! O “NÃO” é o maior presente que os pais podem dar a eles.
Mas é preciso deixar claro que esse “não” deve ser firme, mas nunca agressivo. Autoridade é
completamente diferente de autoritarismo! Muitas vezes, os pais trazem como justificativa para essa não-
castração: “Eu bem que gostaria de corrigir o meu filho, mas o ECA não deixa! Antigamente era diferente!”.
De fato, antigamente era diferente, os filhos eram corrigidos a todo custo e, por isso, que foi necessária a
instituição, em 1990, do ECA, Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8069/90), que visa garantir os direitos
das crianças e adolescentes.
Mas, então, o ECA proíbe a castração? NÃO!!! Quem já pôde ler o ECA na
íntegra, percebeu que ele não proíbe aos pais a educação do filho, muito ao
contrário! No artigo 19, o ECA versa que “toda criança tem direito a ser criada e
educada no seio da sua família”. No artigo 22 diz que “aos pais incube o dever de
sustento, guarda e educação dos filhos menores” e no artigo 33 fala que “a guarda
obriga a prestação de assistência moral, educacional e material à criança”.
Ou seja, o ECA enfatiza que a educação primária da criança deve ocorrer no seio da família e cabe aos pais
oferecê-la de forma adequada.
A única exigência que o ECA faz é de que a criança seja tratada como um ser humano, ou seja, digna de
todos os seus direitos e, nesse sentido, o artigo 5º vem dizer que “nenhuma criança ou adolescente pode, seja por
ação ou omissão, ser objeto de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
Diante de tudo isso, outra questão se instaura: Como oferecer esse limite aos filhos?
É necessária aos pais e cuidadores uma dedicação a esse processo de educação dessas crianças e
adolescentes, e bem sabemos que o mundo moderno nos deixa cada vez mais assoberbados, seja pela extensa
jornada de trabalho ou pelas adversidades do dia a dia, que vão desde a dificuldade em se prover alimentação,
educação e saúde de qualidade aos filhos até as dificuldades em voltar para casa, dada a longa distância até o
trabalho ou mesmo a precariedade dos transportes.
Mas, enfim, não podemos nos esmorecer! Um olhar atento dos pais faz toda a diferença nesse processo de
educação! É necessário que estes mantenham uma observação crítica e atenta a tudo o que os filhos estão
fazendo ou deixando de fazer, bem como oferecer um confronto respeitoso diante daquilo que não é interessante
que os filhos façam, principalmente os excessos, tão comuns na TV, celulares ou internet.
É preciso ficar bem delimitada a fronteira entre o “pode” e o “não pode” e, mais do que isso, é necessário
que se deixe claro que o pai é o adulto e, por isso, deve conduzir o percurso do filho, e não o contrário.
É necessário chamar os filhos às regras e se posicionar no sentido de solicitar que estas sejam de fato
cumpridas. O “não” dado não deve vir com tom de “talvez”, sob pena de que essa criança/adolescente nunca
oferecerá credibilidade a um pai que não consegue sustentar a sua própria palavra.
Atualmente, os pais encontram muitos “rivais” na educação dos filhos: cultura televisiva, consumismo,
drogas, internet, celular, músicas, propagandas, dentre outros. Por isso mesmo é que sua tarefa de educar se torna
cada vez mais importante.
Fica aí o recado final: ser pai é saber suportar o horror que é a ideia de “perder” os filhos e prepará-los para
esse mundo tirano que os espera. Do outro lado, ser filho é poder acreditar nos pais e depositar neles a sua fé.
É esse o apelo que os filhos têm feito aos pais na atualidade!
Por fim, a todos os pais, mães e cuidadores(as) comprometidos(as) com a educação de seus filhos e filhas,
gostaria de parabenizá-los e desejar-lhes CORAGEM e BOA SORTE!
*Gizele Ap. Ameida (CRP MG 04|32902) é psicóloga, neuropsicóloga e psicanalista, graduada pela UFMG, pós-graduada pela UFOP e
pela UFLA e mestranda no MPEC/UFOP, com foco de pesquisa em TDAH e em Neurociência aplicada à Educação. Atua desde 2010 no
atendimento a crianças e adolescentes e, atualmente, é Neuropsicóloga Clínica no Consultório de Psicologia Gizele Almeida e Psicóloga
Escolar na Prefeitura Municipal de São Gonçalo do Rio Abaixo/MG. Contato: (31) 9 9232 1722 | gizelealmeida@gmail.com.

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