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PODCAST 3:
INCENTIVOS FISCAIS E POLÍTICAS PARA
A ECONOMIA CRIATIVA NO BRASIL
AULA 1:
POLÍTICAS PÚBLICAS PARA ECONOMIA
DA CULTURA NO BRASIL
PROFESSORA:
CLÁUDIA LEITÃO
Cláudia Leitão: Queria lembrar com vocês um importante pensador sobre Estado
e Cultura no Brasil, que é o Sergio Miceli. Sergio Miceli organizou um livro que é uma
preciosidade chamado “Estado e Cultura no Brasil”, que está na bibliografia de vocês.
Ele convida vários autores para pensar essas relações entre o Estado e a Cultura
no Brasil e propõe logo no início dessa obra uma agenda para debates, trazendo
exatamente algumas questões que gostaria aqui de me referir a elas, só para, de uma
certa forma, aguçar a curiosidade de vocês e perguntas que podem ser importantes
depois para a gente debater, para a gente conversar e para avançarmos nessas
reflexões sobre políticas públicas para a dimensão econômica da cultura, que é o que
nos interessa nesse módulo.
Acho que esse é o problema que eu queria trazer para esse terceiro bloco para
conversar com vocês e vou aqui colocar algumas das perguntas que Sergio Miceli
coloca um pouco para provocar a nossa reflexão desse terceiro bloco. Diz Miceli: “Afinal,
quais são as vantagens e desvantagens de uma eventual criação ou da criação do
Ministério da Cultura?”. Essa pergunta que ele faz na década de 1980 é extremamente
importante para nós agora, no século seguinte, século XXI, pela extinção, mais uma
extinção do Ministério, dessa feita, realizada pelo presidente Jair Bolsonaro. Quando
Miceli faz essa pergunta, ele diz: “O objetivo da criação de um Ministério é realmente
de realçar as políticas de cultura”. O Ministério, no início, sai de dentro do MEC, do
Ministério da Educação, e para sair e ter uma vida própria deveria ter recursos, teria
que poder viabilizar suas políticas. Alguns ministérios mais jovens, como é o caso do
Ministério da Ciência e da Tecnologia, são ministérios que conseguiram trabalhar
recursos, a partir de suas agências de fomento, por exemplo, na ciência e tecnologia,
de instituições como o CNPQ, como a Finep. Mas em relação ao Ministério da Cultura, como
é que realmente esse Ministério poderia conseguir dar sustentabilidade e viabilidade as
suas políticas? Acho que essa é uma primeira reflexão importante para nós.
Nós sabemos que, em geral, os bancos públicos especialmente, são bancos que
complicam profundamente a vida dos pequenos trabalhadores da cultura e
necessariamente não desejam trabalhar com eles. Criam condições, exigências,
necessidade de fundos garantidores, o que faz com que um criativo não consiga
realmente obter recursos de bancos, sejam eles públicos ou privados.
Então, a compreensão da cultura como um bom negócio define uma decisão política de
cunho liberal sobre a qual estamos aqui para refletir. Trata-se mesmo, como já disse, de
se entregar - e isso aconteceu no Brasil durante vários períodos, já citamos aqui alguns-
a força dos departamentos de marketing, a força das grandes empresas, decidindo
para onde vai o seu incentivo e, na verdade, rechaçando ou abandonando uma grande
expressão, grande parte da expressão da nossa diversidade cultural brasileira.
Ora, a Lei Rouanet, vai contribuir para essa concentração cultural. A Lei Rouanet vai
contribuir para essa hegemonia das indústrias culturais sobre grande parte do campo
cultural brasileiro, o campo invisível, o campo dos informais, o dos pequenos que
sequer têm acesso aos editais lançados pelo Ministério ou pelas secretarias estaduais
e municipais de cultura. A Lei Rouanet, portanto, acabará revelando as contradições
do país e dos seus problemas estruturais, e a desigualdade sem dúvida é o maior
problema estrutural do nosso país.
Como vocês veem, os dilemas persistem. Mesmo sem Ministério ou com Ministério,
o que sabemos é que no Brasil, por exemplo, é quase inexistente a presença de um
mecenato puro, ou seja, de uma ação privada que venha realmente investir em projetos
culturais, sem recurso de vantagens fiscais, o que contribuiria para uma presença mais
forte do mundo empresarial que não acontece. Essa tradição do mecenato público é
grave, porque ela nos marca e ela é estruturante, a presença empresarial é pequena, no
sentido de que ela é insatisfatória, ela sempre acontece em função das leis de incentivo
e não em recursos próprios da empresa.
Isso é alguma coisa que também fala, digamos, das características da nossa cultura
empresarial brasileira pouco afeita a um verdadeiro mecenato como vemos nos
outros países.