Recentemente estava ouvindo uma rádio de notícias e foi transmitida uma
reportagem sobre os reajustes de início de ano nas escolas particulares. Uma mãe de dois filhos era entrevistada e ela relatava sobre o aumento, resultando numa mensalidade de mais de R$ 1.300,00 para cada filho, sendo que o salário mínimo atualmente é de R$ 622,00. A reportagem também abordou rapidamente sobre o aumento do material escolar. Realmente o valor da mensalidade citado pela referida mãe brasileira é um absurdo, mais que o salário de uma boa parcela dos brasileiros. Porém, em uma economia de mercado como a brasileira, a escola não está nada errada em cobrar este valor da mensalidade, visto que ninguém é obrigado a estudar lá. Paga quem quer é quem tem dinheiro. Mas a questão focada pela reportagem não foi os desdobramentos históricos que levaram uma escola particular se julgar no direito de cobrar um valor alto em suas mensalidades, mas sim o suposto abuso de alguns reajustes, que na verdade não são abusos de forma alguma, visto existir a concorrência com valores de mensalidades mais acessíveis e as próprias escolas públicas gratuitas. O abuso seria configurado no caso dos consumidores não terem outras opções de produtos e serviços e fossem obrigados a pagarem o valor exigido. Mas diferente da reportagem, os desdobramentos históricos que levaram uma escola particular a se encontrar no direito de cobrar uma mensalidade com um valor alto deve ser pensado e a causa está justamente na disposição de alguns em pagar esta mensalidade e no fato da qualidade da escola pública está muito longe do adequado e aceitável. E se a escola pública está tão ruim, a única saída é pagar mesmo uma escola particular certo? Plenamente errado! A escola pública no Brasil foi perdendo seu valor, sua qualidade e muitas vezes a sua função por uma falta de atividade e participação das comunidades usuárias da escola. Os pais e responsáveis dos alunos foram deixando de participar da vida escolar, mostrando um desinteresse em exercer sua cidadania e, conseqüentemente abrindo espaço para maus governos e maus profissionais sentirem-se com mais liberdade para agirem em benefício próprio. Foram deixando a cargo unicamente do Estado para que cuidassem da educação e este não se mostrou disposto a zelar pela instância mais preciosa e importante de uma sociedade. Obviamente estes politiqueiros, de olhos nas demandas mais imediatas da população, com vistas nas eleições, não encontraram na educação uma forma de angariar votos e a sociedade, por sua vez, não viu a importância da educação como um fator primordial para a existência de um povo. Este descaso com a educação por parte da sociedade brasileira, - e conseqüente e posteriormente dos políticos, pois estes surgem nessa mesma sociedade – foi deixando a escola pública em um estado deplorável, sem um planejamento adequado, sem objetivos definidos e ‘vitima’ de mandos e desmandos e o resultado foi que as escolas particulares passaram a oferecer como produto um serviço público, ‘mercantilizando’ a educação. O brasileiro ainda não percebeu a importância da educação para sua própria vida, não entendeu ainda que educação é libertação, é conforto, é compreensão, é menos sofrimento em praticamente todos os aspectos da vida humana. O mesmo ocorre hoje com a saúde e a segurança, por exemplo. Enquanto a saúde pública ia se deteriorando, a sociedade ao invés de se unir ao poder público e exigir medidas eficazes para que a sistema de saúde funcionasse de forma adequada, prisioneira de seu egoísmo, decidiu migrar para a saúde particular e hoje paga por um serviço que poderia obter quase que gratuitamente (levando em conta os impostos) se nossa sociedade tivesse a tradição de se unir diante de problemas comuns para resolve-los de forma inteligente, democrática e participativa, hoje teria hospitais públicos de qualidade. Com a segurança pública foi ainda pior. Enquanto a criminalidade ia crescendo, a população foi se posicionando ao lado do criminoso e contra as policias, atuando e agindo com benevolência com criminosos, pois muitos teóricos inconseqüentes e um tanto imbecis conseguiram colocar na cabeça de muitos que o crime era resultado da desigualdade social e isto está mais que provado que não é verdade, com exceções é claro. Além de ser uma visão preconceituosa (pois se assim fosse, todo pobre seria um criminoso em potencial), é uma visão torpe da realidade e trouxe conseqüências drásticas para muita gente, com morte, dor e sofrimento. Diante de tudo isto, os políticos, atendendo a uma demanda popular, foram tomando cada vez mais medidas para restringir o trabalho policial e diminuir a qualidade da segurança pública, com falsas alegações de humanização e defesa dos direitos humanos. Hoje a sociedade paga por mais uma omissão. Calou-se diante dos desmandos com a segurança pública e hoje se tranca em sua própria casa com medo de bandidos, sem contar aqueles que pagam por sistemas de segurança privada. Enfim, diante da omissão social, todos pagam de alguma forma. Tiveram a liberdade de se omitirem, mas hoje não possuem a liberdade de escolher as conseqüências da omissão. O rico paga para ter melhores serviços como saúde, segurança e educação e o pobre ‘paga’ obtendo serviços públicos gratuitos, mas de qualidade duvidosa. Quem tem dinheiro, como sempre, acaba levando vantagem, mas não deixa de ser atingido pela falta de cidadania da sociedade. Todas estas omissões são resultantes do egoísmo, que resultou num processo de individualismo onde o problema de um se tornou de um e o problema de todos tornou-se de ninguém. Os problemas sociais se tornaram do Estado e o Estado, que deveria ser fiscalizado pela sociedade, passou a agir livremente com o dinheiro público, tornando a corrupção e a incompetência uma verdadeira tradição na política brasileira. O sentimento coletivo, - essencial para uma sociedade prosperar – deu lugar a uma atitude egoísta diante do mundo e hoje todos pagam por isto. O egoísmo traz dor em muitos aspectos, e a ‘dor no bolso’ é uma delas.
Adolescentes em conflito com a lei: um estudo com os adolescentes da Casa Marista de Semiliberdade nas práticas discursivas acerca dos direitos fundamentais do Estatuto da Criança e do Adolescente