Recentemente gerou polêmica entre os brasileiros uma ação do Ministério
Público Federal em que se exigia a retirada da frase “Deus seja louvado” das notas do dinheiro corrente no Brasil, o Real. Muita gente foi favorável alegando que Deus está presente em praticamente todas as religiões, enquanto que os eram contra alegava que o Estado deve ser laico, não pendendo para nenhuma religião, mesmo que seja à mais predominante entre a população do país. Sobre a laicidade do Estado e as religiões que atuam em determinada sociedade, muito pode ser debatido, pois a religião está presente entre os seres humanos desde a antiguidade e é difícil mesmo separar uma prática consolidada ao longo de séculos da atuação estatal e social como um todo. Mas uma faceta desta questão que nunca se viu ser discutida é a presença da religião na TV e nos demais meios de comunicação de concessão pública como o rádio, que vem ganhando cada vez mais espaço. Muitos canais atualmente pertencem a entidades religiosas e as que não possuem canais e rádios, compram longos espaços de tempo na TV aberta para transmitirem seus programas de conteúdo religioso. As TVs abertas no Brasil pertencem ao Estado e isto significa que pertencem ao povo brasileiro. As concessões das TVs são apenas exploradas pela iniciativa privada, por empresas particulares, que não são proprietárias da TV e do canal que utiliza. Assim sendo, a presença da religião na TV também estaria atentando contra a laicidade do Estado. O Brasil possui uma série de denominações religiosas. Algumas mais presentes e outras menos presentes, mais ou menos numerosas, mas que de qualquer forma merecem ser respeitadas, desde que respeitem as demais religiões e a sociedade como um todo. Mas nem todas estão sendo representadas e possuem o mesmo espaço na TV. As religiões menos predominantes e numerosas, obviamente, possuem menos recursos financeiros e não podem comprar espaços para transmitirem sua pregação religiosa como algumas entidades religiosas fazem, gastando vultuosos recursos dos seus fiéis. Desta forma, entra-se numa ditadura do poder econômico, onde a entidade religiosa que tiver mais dinheiro tem mais espaço na TV (pois pode comprar este espaço), enquanto que as demais não podem. Algo parecido com o que ocorre com os partidos políticos, onde os maiores partidos (mais ricos e representativos) possuem mais tempo no horário eleitoral do que os partidos pequenos. Isto não é democracia, pois não prevalece a igualdade e sim o poder econômico. Vale ressaltar que não se está discutindo o conteúdo das mensagens religiosas que são transmitidas na TV, pois muitas possuem um conteúdo valioso e enriquecedor, enquanto outras visam apenas o interesse da própria entidade religiosa. Muitas atendem apenas os seus interesses particulares em uma concessão pública de TV e geralmente trata-se de interesse financeiro. Se o Brasil possui um Estado laico, isto é, um Estado que não possui, mas reconhece as religiões, como permite que algumas entidades religiosas, utilizando de seu poder econômico, dissemine suas mensagens de interesse particular, voltada para um público específico em uma concessão pública? Acredito que a sociedade brasileira deva repensar a forma como é distribuída a concessão pública de TV, bem como a presença das religiões na TV aberta. As entidades religiosas deveriam atuar apenas na TV paga, onde poderiam utilizar seu poder econômico naturalmente. Os religiosos podem protestar, mas também devem entender que existem pessoas que não compartilham de sua religião, bem como aquelas que não compartilha de religião alguma. É claro que dentro de um regime democrático, as religiões devem ter liberdade de atuação e assim deve ser, mas esta liberdade de atuação deve ter alguns limites e este limite se inicia quando o caráter passa do particular para o caráter público, que deve ser voltado para todos, universalmente. Uma TV laica não condiz em uma TV ateísta, que impeça a religião de se manifestar. Uma TV laica consiste em ter uma programação universal, voltada para todos, onde prevaleça a educação, a informação e o entretenimento saudável.