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A TV deve ser laica?

29/12/2012

Por Edison Evaristo Vieira Junior

Recentemente gerou polêmica entre os brasileiros uma ação do Ministério


Público Federal em que se exigia a retirada da frase “Deus seja louvado” das
notas do dinheiro corrente no Brasil, o Real. Muita gente foi favorável alegando
que Deus está presente em praticamente todas as religiões, enquanto que os
eram contra alegava que o Estado deve ser laico, não pendendo para nenhuma
religião, mesmo que seja à mais predominante entre a população do país.
Sobre a laicidade do Estado e as religiões que atuam em determinada
sociedade, muito pode ser debatido, pois a religião está presente entre os seres
humanos desde a antiguidade e é difícil mesmo separar uma prática consolidada
ao longo de séculos da atuação estatal e social como um todo.
Mas uma faceta desta questão que nunca se viu ser discutida é a presença
da religião na TV e nos demais meios de comunicação de concessão pública
como o rádio, que vem ganhando cada vez mais espaço. Muitos canais
atualmente pertencem a entidades religiosas e as que não possuem canais e
rádios, compram longos espaços de tempo na TV aberta para transmitirem seus
programas de conteúdo religioso.
As TVs abertas no Brasil pertencem ao Estado e isto significa que
pertencem ao povo brasileiro. As concessões das TVs são apenas exploradas
pela iniciativa privada, por empresas particulares, que não são proprietárias da TV
e do canal que utiliza. Assim sendo, a presença da religião na TV também estaria
atentando contra a laicidade do Estado.
O Brasil possui uma série de denominações religiosas. Algumas mais
presentes e outras menos presentes, mais ou menos numerosas, mas que de
qualquer forma merecem ser respeitadas, desde que respeitem as demais
religiões e a sociedade como um todo. Mas nem todas estão sendo representadas
e possuem o mesmo espaço na TV.
As religiões menos predominantes e numerosas, obviamente, possuem
menos recursos financeiros e não podem comprar espaços para transmitirem sua
pregação religiosa como algumas entidades religiosas fazem, gastando vultuosos
recursos dos seus fiéis. Desta forma, entra-se numa ditadura do poder econômico,
onde a entidade religiosa que tiver mais dinheiro tem mais espaço na TV (pois
pode comprar este espaço), enquanto que as demais não podem. Algo parecido
com o que ocorre com os partidos políticos, onde os maiores partidos (mais ricos e
representativos) possuem mais tempo no horário eleitoral do que os partidos
pequenos. Isto não é democracia, pois não prevalece a igualdade e sim o poder
econômico.
Vale ressaltar que não se está discutindo o conteúdo das mensagens
religiosas que são transmitidas na TV, pois muitas possuem um conteúdo valioso
e enriquecedor, enquanto outras visam apenas o interesse da própria entidade
religiosa. Muitas atendem apenas os seus interesses particulares em uma
concessão pública de TV e geralmente trata-se de interesse financeiro.
Se o Brasil possui um Estado laico, isto é, um Estado que não possui, mas
reconhece as religiões, como permite que algumas entidades religiosas, utilizando
de seu poder econômico, dissemine suas mensagens de interesse particular,
voltada para um público específico em uma concessão pública?
Acredito que a sociedade brasileira deva repensar a forma como é
distribuída a concessão pública de TV, bem como a presença das religiões na TV
aberta. As entidades religiosas deveriam atuar apenas na TV paga, onde
poderiam utilizar seu poder econômico naturalmente.
Os religiosos podem protestar, mas também devem entender que existem
pessoas que não compartilham de sua religião, bem como aquelas que não
compartilha de religião alguma.
É claro que dentro de um regime democrático, as religiões devem ter
liberdade de atuação e assim deve ser, mas esta liberdade de atuação deve ter
alguns limites e este limite se inicia quando o caráter passa do particular para o
caráter público, que deve ser voltado para todos, universalmente.
Uma TV laica não condiz em uma TV ateísta, que impeça a religião de se
manifestar. Uma TV laica consiste em ter uma programação universal, voltada
para todos, onde prevaleça a educação, a informação e o entretenimento
saudável.

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