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Título provisório: NUNCA TE VI E TE GOSTO TANTO.

Em um alaranjado dia de outono, o


menino Anthony já havia testado diversas formas de se entreter sozinho em seu
quarto, brincado com todos os brinquedos, mil caretas ao espelho, mudado coisas de
lugar, encontrado outras que a tanto estavam sumidas, e não conseguia sentir outra
coisa a não ser tédio. Deitado em sua cama vendo pela janela as folhas que caíam
das árvores, se entediando ainda mais.
Derrepente começou a ouvir sons ritmados que vinham de cima da sua cabeça e faziam
o teto vibrar… se esforçou, esticando -se pra cima para identificar do que se
tratava aquele ruído interessante, mas ainda não ouvia com clareza, apenas um
claft- ploft, clact ploft sincronizados. Curioso , decidiu investigar… Vasculhou
seu baú de pirata e encontrou um velho projeto de escola , um “telefone” daqueles
feitos com copos plásticos ligados a um barbante ,pegou a fita para prender no
teto uma das partes e assim ouvir melhor de que se tratava os organizados sonidos.
Prendeu em cima o copo, mas lhe faltou coragem para ouvir, pensou que pudesse ser
errado , desrespeitoso com seu barulhento vizinho . E aí resolveu do jeito de
sempre, quando lhe surgia alguma questão. Consultava seu nobre , fiel escudeiro e
melhor amigo inanimado, seu cavalo Aramado . Que como sabiamente você já deve estar
pensando , Aramado não disse nada , nem que sim ou que não, então jogou uma moeda
para o alto mas nem esperou ela cair e já tinha se decidido que sim, respirou
ansioso e partiu à resolver o mistério.
Ao colocar o telefone no ouvido , conseguiu ouvir o som mais presente e nítido , e
fez então sua primeira descoberta, se tratavam de sapatos batendo ao chão ao som da
música , o que permitiu concluir que:

Eram SAPATOS DE SAPATEADO,


Vestidos em PÉS que no ritmo SAPATEAVAM,
Ainda que CALEJADOS ou cansados,
Esses mesmos PÉS aqueles SAPATOS AMAVAM.

Continuou a ouvir e dessa vez veio junto uma voz, de mulher, que gritava dizendo :
“ - Romeu, Romeu! Onde estás, meu Romeu?
Renega o teu pai e abdica o teu nome;
E, se não tiveres coragem, jura que me amas,
E eu deixarei de ser uma Capuleto.", aquilo lhe soou familiar, e pensou : “ - Eu
conheço isso, de onde mesm… (lembrou).
Era da peça de final de ano da escola , encenaram Romeu e Julieta.
você não achou estranho que tony tenha se lembrado de uma fala inteira de uma
história escrita lá em 1593, e mais 400 anos depois apresentada pela escola tenha
causado a ele esse efeito inesquecível ?
Mas adivinha quem era o Romeu do espetáculo de final de ano do colégio…
EXATAMENTE!!! Quando deu por si , já estava dando as réplicas as falas da Julieta
desconhecida, e só não as disse mais alto por medo de ela ouvir e descobrir sua
espionagem secreta .
O tempo que outrora não passava, voou!
As tardes do menino agora estavam interessantíssimas, foram dias ouvindo relatos ,
versos e canções , a enxurrada de informarções que escorriam por aquele copo , já
tinha levantado a ficha de JULIETA, que descobriu , se chamava DOROTHY, já tinha lá
seus setenta e poucos anos. E isso ele só descobriu, quando em um dia de mais
sapateado lá em cima , claft pra lá , ploft pra cá, a pobre escorregou e se
estabacou no chão, esbravejou quase uma dúzia de palavrões, depois chorou dizendo
que a velhice havia tirado tudo o que ela mais amava.
Dorothy havia sido na juventude uma grande estrela do rádio , cantando , fazendo
rádio novelas e grandes espetáculos de teatro como a estrela principal. Mas com a
chegada das televisões , TELE VISÕES, acabou sendo esquecida, como ela mesmo disse
outro dia:
“ - fui abandonada , jogada na calçada, junto as ratazanas, vivendo essa vida do
Cara%$o, Put% que p#%*¥!!! To presa e essa extremissima solidão, velha e
invisivel.”
O menino nesse dia se doeu junto a entristecida , e muito boca suja, Sra. Dorothy.
Quanto mais os dias passavam mais envolvido e interessado ficava, sentiu que
precisava guardar , escrever cada história , canção ou mesmo palavrão que vinham do
andar de cima e as fez uma a uma tentando lembrar de cada detalhe.
Ele acreditava tanto nas histórias dela que facilmente conseguia se ver inserido
nelas, fazendo parte e as vezes até papéis importantes em algumas situações .
O que não foi diferente quando ela, ao telefone, contou que quando era moça ainda
bem nova tinha trabalhado em um circo como assistente de um mágico. Tony na mesma
hora viu seu quarto se transformar em uma lona de circo e ele andando em uma corda
bamba montado em seu valente cavalo Aramado.
Amado, como tony o apelidou. Realmente seu porte e cara passavam a imagem de um ser
muito corajoso, no entanto fez o caminho todo em cima da corda de olhos bem
cerrados , os dentes em tremeliques e o rabo entre as pernas , tamanha sua valentia
. Aramado era um medroso muito especial, do mundo dos raros, uma espécie de
guardião espiritual, protetor do menino, e possuía uma beleza comovedora ,
reluzente .
La do alto tony via a pequena Dorothy se apresentar no picadeiro com o mágico, e
percebeu que dessa vez estavam com seus lugares opostos. Agora ele a tinha lá de
cima, e era ela quem estava no andar de baixo.
Mais tarde recuperado do impacto profundo do mergulho nesse mundo paralelo e
fantástico, tinha o sorriso nos olhos e o coração em valsa enquanto anotava mais
uma história no papel.

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