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Universidade de Brasília – UnB

Instituto de Ciências Humanas


Departamento de História

Disciplina: Introdução ao Estudo em História


Aluno: Pedro Henrique Teixeira Lourenço
Matrícula: 190036524

DEMONUMENTA:

QUESTÕES RELATIVAS A UMA EFETIVA DEMOCRATIZAÇÃO DA


HISTÓRIA DO BRASIL; EM OPOSIÇÃO A UMA NATURALIZAÇÃO DA
INDIFERENÇA HISTÓRICA PERANTE GRUPOS SOCIAIS
MARGINALIZADOS

Brasília, 2022
RESUMO
Nos últimos anos, tem-se observado nas sociedades contemporâneas o movimento
gerado por alguns grupos, no que diz respeito à derrubada de estátuas e de monumentos
que possuem passados relacionados com traumas sociais; de forma que, ao redor do globo
tornou-se casa vez mais frequente, discursões a respeito de tais ações do tipo -tanto por
parte da sociedade civil (organizada ou não) quanto por parte de historiadores, que estão
a se debruçar sobre o tema. De forma que, a sociedade como um todo é chamada para
refletir sobre o que é o passado, suas raízes históricas de relação de poder, perpetuado
pelo inconsciente coletivo; ou seja, pautada pelo imaginário histórico presente nas nações.
Assim, surge nesse prisma, as questões relacionadas com o caso brasileiro -que de
forma geral- são ligadas a história da própria nação; logo, pode-se entender uma ligação
tênue, limitada pela irreversibilidade do tempo, entre o colonialismo presente na história
da América Latina; e noções adjacentes à um progresso, ou melhor, a uma ideia que é
idealizada de uma nação moderna que amplamente, foram pensadas e colocadas em
prática por uma elite que se caracterizou por determinar o tipo ideal de brasileiro, assim,
como o tipo ideal de história brasileira (FREIXO, 2019).
Ademais, como se sabe, a história só é institucionalizada em espaços de memórias,
quando o passado em si, começa a se desprender do presente -muito por conta da rapidez
de transformações de cunho político, social, econômico e tecnológicos- e em tais espaços,
(como os museus, monumentos e estátuas públicos) é necessário, que se perceba, as
relações correlacionadas a uma história única e universal -influência direta dos séculos
imperialistas onde nações europeias se firmaram como ideal de nação- que são induzidas
por um grupo de pessoas que compõem as elites brasileiras; tal indução se dá por conta
de múltiplos instrumentos de dominação que trabalham com a noção de nostalgia, ou seja,
instrumentos que se utilizam da história para se reafirmaram como a própria História
Universal e única (FREIXO, 2019).
A questão central a ser trabalhada nesse texto, focaliza-se nessas relações de poder
que cercam a história nacional brasileira; buscando trazer um questionamento sobre as
noções de nostalgia; sobre os agentes históricos brasileiros (no sentido de entender quem
são esses ou quem pode ser esses) e suas complexidades, atuações e exclusões; além de
buscar discutir todas essas questões relacionando à prática de ações reflexivas com a
derrubada de monumentos e estátuas, tendo em vista, uma melhor efetivação da
democratização do que de fato é (ou melhor, se aproxima) de uma História do Brasil de
forma crítica, trazendo à dentro da história, aqueles que sempre foram marginalizados por
essa falsa noção de História Universal, perpetuada pelas elites locais.

Palavras-chaves
História – Brasil – Elites – Minorias – Poder – Nostalgia

Introdução
Em primeiro lugar, a existência de estátuas e monumentos que se encontram na
atualidade relacionados a passados traumáticos, tem como característica, enaltecer
através de homenagens a possíveis heróis -considerados contraditórios por uma parte da
população- e é nesse fato, que grupos ligados a movimentos de derrubadas, se afirmam
na sociedade, causando uma maior visualização de uma possível nova interpretação da
realidade; do presente, tendo como base tais passados traumáticos (AVELAR, 2022); de
forma que esses passados “são aqueles que parecem não passar, e que mobilizam
múltiplos sentidos e afetos no presente” (AVELAR, 2022, p.135). Assim, deve-se
perceber que a existência em si desses monumentos públicos, dizem respeito direto à
história do Brasil -já que, se “afirmaram” no presente, pois ainda existem- entretanto, tal
história ou narrativa que foi contada, na verdade, não corresponde em si a uma história
do país, de forma que fosse caracterizada como uma unidade, uma única narrativa (fixa,
conjugada como algo natural, decorrente do processo de progresso da nação; como se
fosse um ideal a se seguir) mas sim, a história de desenvolvimento e transformações das
elites brasileiras (FREIXO, 2019).
Ademais, tais grupos de derrubada além de ocuparem um papel importante nessa
discussão/luta social a cerca dos espaços de memórias e da própria memória em si e
consequente projeção de sentimento de identidade nacional (AVELAR, 2022),
reivindicam a destituição da certa lógica dominante e por consequência gerem debates
acerca de seus atos, assim, existem aqueles que atribuem a ação desses grupos como
sendo boas para a sociedade, outros pensam o oposto disso, tal discursão se encontra em
pauta por toda a sociedade -muito por conta dos meios de comunicação que durantes os
últimos anos e devido a todos acontecimentos marcantes desse período estiveram à
postos- logo, não é diferente o cenário entre aqueles que estudam a história e dentro dos
pensadores, encontram aqueles que apontam que tal ação é vantajosa para a sociedade
pois levam a mesma a refletir sobre esses passados traumáticos -e mesmo para a história,
pois tal reflexão abriu novas portas para o estudo em história nesses assuntos (AVELAR,
2022); e também existem aqueles que interpretam tal ação como sendo negativa, pois
atribuem à ela o sintoma de ser influída de anacronismo (AVELAR, 2022). O que
acarreta, tal atitude desses grupos, é a presença direta e indireta das questões que
compõem o imaginário popular sobre o passado do país, pois após séculos de dominação
portuguesa sobre o país, aquelas elites que estavam presentes na época da Independência
Brasileira (política), tiveram a função de se afirmarem como uma nação; aqueles que
herdaram o poder nos últimos dois últimos séculos, mantiveram a função de
autoafirmação perante as elites passadas (tendo como base um progresso apontado como
linear, porém, de melhora), dessa forma, a história do brasil se confundiu com a história
do desenvolvimento do poder das elites brasileiras (FREIXO, 2019); e assim, durante esse
longo percurso, foi-se criado um imaginário popular sobre o que o brasileiro significava
perante sua própria história -houveram, é claro, instrumentos para a manipulação e
criação de tal pensamento tão amplamente difundido, que até o ano de 2022 encontra-se
bastante presente no imaginário dos brasileiros- e consequentemente, uma verdade foi
posta, uma identidade, um modelo; de forma que, numa sociedade multifacetada,
composta por uma extensa diversidade de povos, aqueles que não constituem tal modelo,
são marginalizados perante a história do seu próprio povo (FREIXO, 2019).
Assim, na prática, não há uma real unidade de povo ou da história, já que, existem
diferenças de cunho político, social e econômico; assim como também existem múltiplos
atores e múltiplos enredos do que é a História do Brasil, ou seja, não existe uma efetiva
democratização da história do país e por conta disso, passados traumáticos nunca passam;
nunca se encontram no passado, mas sim, no presente (AVELAR, 2022). Agora, quando
é ainda presente, algumas estátuas ou nome de monumentos, deve-se no mínimo
questionar sobre pois, qual seria a imagem que a elite mantém ainda acessa no
inconsciente do povo brasileiro? Que verdade é essa, tão cruel e imutável? Por que, deve-
se aceita-la? E questionamentos desse gênero, fazem surgir uma dura crítica perante as
elites, e principalmente, a sua ideologia; já que pode-se pensar: em primeiro lugar, essa
imagem posta pelas elites aconteceu e acontece com base no poder político que tal possui,
tal poder se estende as camadas mais elevadas, do pensamento científico, do controle ou
influência dos meios de comunicação; da formação e conscientização do “povo” ideal
brasileiro (FREIXO, 2019) e um dos mecanismo utilizados de forma direta e indireta para
mexer na identidade nacional das pessoas está relacionada ao sentimento histórico de
nostalgia (BOYM, 2017). Pois, muitas das vezes “Nostalgia e progresso são como pares
e imagens espelhadas um de outro” (BOYM, 2017, p.154), e isso, nada mais é, do que o
modo operante da reafirmação da ideologia dominante decorrente das elites brasileiras, e
é por isso, que existem tais monumentos que prestam homenagens a figuras históricas
contraditórias, que nada mais são do que personagens participantes de enredos históricos
traumáticos, como por exemplo: o genocídio indígena, a escravidão dos africanos, os
períodos ditatórias: Estado Novo (1937- 45) e Ditadura Militar (1964 - 85) e a perseguição
a camadas minoritárias da sociedade da época, que por constituírem parte da história do
país, foram capazes de se enraizarem e se tornarem ainda hoje latentes: como a
perseguição dos povos indígenas e suas terras, do racismo estrutural, da higienização
social e outros elementos que são contemporâneos ao ano de 2022.

Desenvolvimento
O assunto, estende-se além esses lugares físicos de memórias, como é apontado
“mantemos representações e figurações do passado em comemorações públicas,
monumentos históricos, programas de televisão e etc.” (FREIXO, 2019, p.74); de forma
que tal ideologia dominante, agarra-se com força ao sentimento humano de nostalgia, que
é historicamente compartilhado por todos, de forma que ela atua como instrumento
utilizados por essas ideologias para mexer na identidade nacional do povo, pois tal
sentimento se alimenta do desejo, ou da projeção dos desejos de forma que, comandado
por esse pensamento dominante -induzido, acarreta o sonho de “de retorno ao passado
(ou restauração)” (FREIXO, 2019, p.70). No caso das datas comemorativas, esse ideal se
torna quase que explicitamente ou implicitamente, a verdade única nacional; o caminho
do progresso, perante a unidade Brasil; onde mais uma vez, ocorre a exclusão de
brasileiros pela própria história da forma que é transmitida; ou seja: “a figuração dos
brasileiros nas celebrações oficiais assume traços bem específicos de etnia, classe e
religiosidade que excluem ou apagam parcelas muito significativas da população”
(FREIXO, 2019, p.68).
Ademais, tal modelo histórico proposto pelas elites, também possui a
característica de ser adequado a essas elites mas não aqueles que sofrem consequências
diretas da história, ou melhor, da sua exclusão histórica; como se sabe, a violência é
perpetuado contra grupos minoritários, tal violência em si, é fruto de uma marginalização
histórica perante aquela imutável História do Brasil e também é fruto da própria história
(FREIXO, 2019). Além disso, voltando-se mais uma vez paras noções correlacionadas a
ideia de nostalgia como sentimento histórico, destaca-se que a nostalgia é contemporânea,
ou melhor, em um sentido mais amplo “a nostalgia é uma revolta contra a ideia moderna
de tempo, o tempo da história e do progresso” (BOYM, 2017, p.154) e nem sempre ela é
projetada em direção ao passado, mas também, em direção à um futuro idealizado -onde
a base de tal idealização se encontra no passado; muitas das vezes por conta dessa
ideologia dominante (BOYM, 2017) e é nesse “futuro idealizado”, que se encontra o
perigo decorrente desse sentimento nostálgico, pois “ela tende a confundir o verdadeiro
lar com aquele imaginado” (BOYM, 2017, p.155); ou seja, trazendo para o caso
brasileiro, quando cria-se uma falsa sensação de história única, com seus personagens
centrais padronizados com essa falsa estética, confunde-se a história que deveria ser
contado ou ao menos pensada pelos brasileiros com a história que é imposta como sendo
verdadeiro e única, e isso, prejudica não só a compreensão da História do Brasil, como
também do Brasil de agora, e possibilita -consequentemente- que pessoas defendam ou
atribuem a algo errado, o levante crítico/reflexivo a cerca dos homenageados, e sobretudo,
das derrubadas desses mesmos monumentos.
O passado não é algo totalmente longe do presente, o passado e o presente se
encontram diversas vezes, dia após dia, se cristalizam na realidade; nas realidades
existentes; tal noção de tempo, de afastamento, cria a necessidade da institucionalização
da história; ou melhor dizendo: tal afastamento temporal, necessita que, as elites do poder
brasileiro, se reafirmem, como sinônimo de progresso, de continuidade -e por meio da
nostalgia infundida por ela- se afirmem no presente, constantemente, por meio de museus
nacionais, instituições patrimoniais e monumentos urbanos (BOYM, 2017). A nostalgia,
imposta pela ideologia dominante, impõe a ideia de “reconstrução trans histórica da terra
perdida” (BOYM, 2017, p.159); vende a ideia de que, aquilo que é mostrado como sendo
a história -por meio de estátuas, monumentos e etc.- é algo a se buscar; na verdade, é
algo não com a característica própria da nostalgia, mas sim como uma verdade e uma
tradição, algo que pode ser chamado de nostalgia restauradora (BOYM, 2017), ao passo
que, aqueles que lutam pela derrubada desses símbolos de dominação, tem no cerne de
suas intenções, uma nostalgia do tipo reflexiva, que se questiona sobre o presente, e não
o aceita como algo único; como uma história única, uma só verdade (BOYM, 2017).

Conclusão
Torna-se de importante preocupação e questionamento, as questões levantadas
sobre a suposta História única brasileira, de forma que tais relações de poder estão
presentes nessa escolha de “verdade”; nessa mensagem, que tais monumentos públicos
são capazes de transmitirem, capazes de se relacionarem com os passados traumáticos e
os tornarem normal, ao ponto, de vários não se questionarem sobre esses assuntos; ao
ponto de inconscientemente, o povo perpetuar tal ideologia; não só perpetuar, mas sim
conviver com a noção de normalidade frente a esses monumentos -em alguns casos, até
de pura nostalgia restauradora, onde alguns, não só admiram as estátuas de bandeirantes,
monumentos ou nomes públicos dedicados a ditadores e outras figuras controversas, mas
também de desejar a volta de uma passado ilusório.
Por isso, é de vital importância, que existam grupos de derrubada na sociedade
brasileira -não como um incentivo à violência do “nós contra eles”, mas sim para a
reflexão do “nós e eles”, como sujeitos históricos, que desfrutam do presente, para assim,
aos poucos, corrigir os erros do passado; ou seja, a existência desse tipo de grupo, é vital
para uma efetiva democratização da História do Brasil; para uma maior visibilidade
daqueles que hoje constituem o povo brasileiro, seja em sua maioria ou em sua minoria
(levando em conta aqui, apenas o fator populacional); que o povo -todos, em especial
aqueles marginalizados/apagados historicamente- possa ser capaz, de se enxergar como
um personagem histórico, independentemente de qualquer estética.
Assim, é importante também entender, que a elite -sua ideologia, sua forma de
dominação e exclusão social das demais camadas- é de forma direta e indiretamente
combatida com tais movimentos de derrubadas ou de levantamentos críticos gerados pela
população civil -como os tais grupos- ou por pensadores do tema, de modo que os usos
políticos de dominação utilizados nesse caso pela elite brasileira, são “poderosos e
eficazes instrumentos retóricos e ideológicos de bloquear mudanças e transformações
políticas (...), culturais concretas e de recusar a inclusão de todos que não se enquadram”
(FREIXO, 2019). Ao passo que as intervenções desses grupos procuram responder às
urgentes questões, do que fazer com tais monumentos ligados a passados traumáticos,
traumáticos principalmente para “grupos marginalizados historicamente e marcados pela
violência que nos definiu como formação social.” (AVELAR, 2022, p.143).
Referências Bibliográficas
AVELAR, Alexandre “Por que a derrubada de estátuas não deveria incomodar os historiadores?”.
ArtCultura Uberlândia, v. 24, n. 44, p. 134-156, jan.-jun. 2022.
BOYM, Svetlana “mal-estar na nostalgia”. História da Historiografia. Ouro preto, n. 23, 2017, p.153-165.
FREIXO, Andre de Lemos “PASSADOS PRIVADOS, OU PRIVADOS DO PASSADO? NOSTALGIA,
IN-DIFERENÇA E AS COMEMORAÇÕES DO SETE DE SETEMBRO BRASILEIRO”. Revista
NUPEM, Campo Mourão, v. 11, n. 23, p. 59-80, maio/ago. 2019.

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