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REDAÇÃO E LINGUAGEM JURÍDICA II
PROFESSOR(A): ADRIANA FERNANDES

Texto Jurídico: aspectos sintáticos, semânticos e pragmáticos


por Tadeu Luciano Siqueira Andrade

A interação do homem no contexto onde se encontra ocorre simbolicamente. Essa relação


simbólica é dada pela linguagem como representação de mundo pelos signos linguísticos. Falar
em linguagem é falar de texto verbal ou não verbal, inserida no contexto discursivo-semântico-
pragmático. Tratando-se do discurso jurídico, reportamo-nos a um texto que apresenta
peculiaridades lexicais estruturadas em três bases: sintaxe, semântica e pragmática. Nessas
bases, há uma integração da forma, significado/conteúdo e uso da língua em situação de
interação.

O texto jurídico se fundamenta em três níveis de análise, segundo Robles (2008, p. 56):

a) Análise Sintática (Lógico-Linguística): corresponde às estruturas linguísticas. Neste nível, a


sintaxe atua na organização dos argumentos, segundo a estrutura da língua, é responsável pelas
relações formais entre os signos linguísticos. Graças a essas relações, o texto, ao ser construído,
cumpre suas várias funções, quais sejam definir, ordenar, postular, recorrer, julgar, denunciar.
Quando o legislador, por exemplo, positivou no Artigo 1º do Código Penal (CP) que Não há crime
sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal, o complexo de palavras
no eixo sintagmático, definiu o princípio da legalidade. Devido às combinações de palavras, a
sentença tem um sentido na argumentação. Se as palavras não obedecessem a uma lógica,
consequentemente não teriam sentido. Sintaxe é, portanto, condição para a semântica:

OBS.: Pode-se dizer que no caso das sentenças de uma determinada língua, a sintaxe é
pressuposto da semântica. Isso ocorre porque se os signos não estiverem corretamente
articulados, a própria sentença não terá significado nem valor de verdade, não poderá
descrever adequadamente fatos ocorridos e, portanto, não será, nem verdadeira nem falsa, mas
sem sentido. No texto, a sintaxe e a semântica se intercomplementam, porque palavras soltas
fora de um contexto discursivo-semântico nada dizem.
(MARCONDES, 2007, p. 9).

b) Análise Semântica: responsável pelo conteúdo da significação, isto é, o significado que uma
palavra pode assumir em contextos diferentes da enunciação, como o vocábulo exceção, entre
outras palavras no português, é polissêmica, pois apresenta vários significados: algo que não é
comum, não faz parte das regras, aquilo que está excluído.
No léxico Processual, esse termo apresenta um sentido diverso do que o dicionário registra: é o
meio de defesa que o réu apresenta às pretensões do autor, refutando-as.

A semântica estuda o significado das palavras e da intenção. Por si só, não é suficiente para dar
conta do significado de uma palavra ou sentença, se conjugar apenas a forma e o significado que
uma determinada palavra apresenta. É necessária a inserção das palavras ou estrutura em uma
determinada situação comunicativa. Analisando o Artigo 121 do CP: “Matar alguém”, sem inserir
esse dispositivo em um contexto macro, apesar de estar composto conforme os padrões sintáticos
da língua, não compreenderíamos que se trata de uma infração penal ou uma norma proibitiva
pelo diploma legal, por tal estrutura não apresentar o advérbio NÃO.
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c) Análise Pragmática: descreve o uso da linguagem, os diversos matizes semânticos que uma
palavra apresenta em diversos contexto (discursivos). A pragmática é o ramo da linguística que
estuda como os falantes usam a linguagem na sua concretude, em suas práticas comunicativas.
Para a pragmática, o contexto em que a comunicação se efetiva influi na compreensão do
enunciado. Se, por exemplo, um advogado disser ao cidadão comum que, em uma relação de
consumo, ele é vulnerável, certamente, o profissional do Direito não estará se reportando ao
sentido literal da palavra definido pelo dicionário, mas dizendo que, em uma determinada situação,
o consumidor apresenta uma fragilidade, em relação ao fabricante do produto. Essa relação de
consumo vai determinar a vulnerabilidade. Podemos, pelo contexto, entender que o cidadão
comum não terá como discutir a composição química de um determinado produto com um
farmacêutico. Por desconhecer as fórmulas de química; ou por não conhecer os métodos de
produção. O profissional do Direito deve ter cautela, ao falar com o seu cliente, para que a justiça
não se torne inacessível.

Nos cursos jurídicos, difundiram uma afirmação de que o bom advogado é aquele que fala e
escreve com eloquência, porém eloquência não é “falar difícil”. A linguagem deve ser empregada
na situação, cujos interlocutores dominem as regras da comunicação. É comum profissionais do
Direito, em um processo cautelar, falar expressões como periculum in mora, fumus boni iuris,
inaudita altera pars, como se estivesse nos Tribunais da Antiga Roma. Por que não dizer perigo
na demora, onde há fumaça há fogo, ou seja, naquele processo há sinal de um direito, não ouvir a
parte contrária?

Nada adianta usar a expressão Dormientibus non sucurrit jus, para dizer que a demora na
prática de um ato implica a perda de um direito. Pragmaticamente, seria dizer: O direito não
socorre os que dormem. Esses brocardos são estranhos ao cidadão comum. Como a função do
jurista é dizer o direito, esse direito deve ser dito de forma clara àqueles que desconhecem os
recursos sintático-semânticos e pragmáticos do discurso jurídico.

Um texto pode ser compreendido por um leitor; não compreendido por outro, devido às
especificidades da forma e do conteúdo. Um leitor não versado em Direito, lê uma sentença de
pronúncia (define que o acusado deve ir a julgamento pelo Tribunal do Júri), mas, certamente, não
compreenderá sua aplicabilidade no mundo jurídico e alguns termos técnicos nela presentes.

Todos podem realizar uma leitura simples e superficial de muitos textos jurídicos, pois
normalmente as normas jurídicas são compreensíveis para o cidadão medianamente culto. Mas
uma leitura profunda que não se limite ao verniz daquilo que aparece, mas que penetre no mundo
conceitual e interpretativo do Direito, só é acessível aos juristas, isto é, aos profissionais do
Direito. (ROBLES, 2008, p. 53).

A ciência jurídica encontra na linguagem a sua possibilidade de existir, porque ele é


linguagem por excelência, não produzirá seu objeto numa dimensão exterior à linguagem. Para
que a comunicação se efetive a linguagem precisa estar ao alcance das partes e os recursos
sintático-semânticos, lexicais do discurso cumpram sua função social: facilitar a efetivação dos
direitos.
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A ESTRUTURA DOS TEXTOS JURÍDICOS

Ao analisarmos exemplos de textos do âmbito jurídico, temos o processo judicial como um


texto, formado a partir de relações humanas em contextos institucionais (outros textos). Seguindo
uma ordem discursiva programada (Código de Processo) as partes e o juiz interagem produzindo
discursos jurídicos que formam uma unidade discursiva. O Código é visto como uma gramática
jurídica ordenando os Atos de fala na jurisdição. Todavia, a técnica jurídica não deve se sobrepor
às relações humanas que formam o seu conteúdo.

No contexto de acesso à Justiça (CAPELLETI; GARTH, 1988), é possível analisar o


processo não mais como instrumento técnico sob o domínio restrito de juristas e de outros
profissionais da área. Assim sendo, o processo judicial democrático se apresenta como
instrumento discursivo/dialógico de aplicação do Direito.
Ao eleger a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental, a Constituição
Federal prescreve novos meios de operacionalizar o direito, dentre eles a proximidade
discursiva/dialógica entre as partes e o juiz.

Numa relação tridimensional, autor, réu e juiz produzam textos parciais segundo uma ordem
sintática, semântica e pragmática, que lhes permite narrar fatos, valorar condutas e produzir a
sentença como norma jurídica compartilhada entre eles e ato de encerramento dessa cadeia
discursiva.

OBS.: Nesse sentido, as práticas judiciárias devem estar comprometidas com o diálogo social.
Tratando o processo como instrumento discursivo/dialógico, podemos democratizar a
aplicação do Direito, rompendo com dogmas formalistas que dificultam o acesso à Justiça.

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