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CONHECIMENTO E
DESENVOLVIMENTO: ESSÊNCIA
DO PROGRESSO TÉCNICO
Abstract
1. Introdução
* Este texto nasceu da necessidade de serem alinhandos alguns conceitos teóricos para sustentar o conteúdo
programático da disciplína "Inovação Tecnológica & Teoria Econômica", ministrada pelo autor no
PPGA/UFRGS. Uma versão preliminar deste texto é o Texto Didático n°2 do Departamento de Economia da
UFRGS. A louvar as críticas e sugestões de Edi M. Fracasso e Paulo C. D. Motta. Evidentemente, nenhuma
destas pessoas tem qualquer responsabilidade sob os deslizes cometidos pelo autor.
"os princípios científicos não podem ser aplicados à produção sem a intervenção
de engenheiros mecânicos e de pessoal qualificado em know-how técnico
ordinário; e isto, mesmo em indústrias baseadas na ciência. (...) Todas indústrias
baseadas na ciência beneficiam-se destas mudanças incrementais."
* * *
A estrutura deste artigo é feita de modo a percorrer o conteúdo da relação
conhecimento/desenvolvimento e poder chegar ao progresso técnico.
Inicialmente, será feita a definição formal de conhecimento, dividindo-o em
dois sistemas: techne e episteme (seção 2). Na seqüência, será feita a passagem do
conhecimento para o universo das aplicações e usos, onde são necessárias as definições
de técnica, de ciência e de tecnologia (seção 2). Estas constituem, na verdade, a
interface que permite acontecer a relação entre conhecimento e desenvolvimento
(seção 2). O circuito é fechado (seção 5), com a definição de desenvolvimento
enquanto conjunto de progressos (econômico, técnico, social, etc)1.
Em uma segunda parte, por assim dizer, será vista a forma de produção de
novos conhecimentos, basicamente representados pelas inovações (seção 6). As
inovações supõem, por sua vez, um processo que assume contornos históricos (seção
7) e que adquire complexidade formal (seção 8). Enfim, o debate estende-se até a
questão da diferença entre o conteúdo do desenvolvimento tecnológico e do progresso
técnico, respaldados pelas diferenças entre inovações de produtos e de processos
(seção 9).
principalmente na sua forma mais pura: a linguagem. Sem símbolos e sem linguagem,
o pensamento mantém-se a um nível rudimentar e, mais ainda, não pode ser
transmitido através do grupo ou para outras gerações." (Braverman, 1976, p. 48).
São justamente as faculdades intelectuais que permitem não somente a
concepção no imaginário, antes da concepção de fato, mas permitem também evoluir
no que concerne o entendimento que se tem das coisas e dos fatos. É neste sentido que
o conhecimento está por trás de todo desenvolvimento.
O conhecimento, porém, não é só o que está acumulado no intelecto dos
homens, adquirido pela experiência e pelo aprendizado. Mais do que isso, o
conhecimento pode ser documentado, criando um verdadeiro sistema de fluxos e
estoques. Nestes termos, deve-se fazer um discernimento quanto à aparência do
conhecimento: ele pode se apresentar como conhecimento empírico, uma forma mais
elementar e não documentada (a definição número "4" do Dicionário Aurélio), ou
como conhecimento científico (número "5"), uma forma mais elaborada e, portanto,
documentada.
O conhecimento empírico é aquele adquirido através da experiência e que
informa o "como fazer" das coisas, sem no entanto informar as razões de se fazer
assim. Trata-se, em suma, do know-how (do savoir-faire) utilizado para executar as
atividades mais diversas. O conhecimento científico, por outro lado, é a decomposição
epistemológica das diferentes atividades, onde justamente se busca saber, além do
"como fazer", a razão pela qual se faz de tal ou tal forma. Aqui, o objetivo é saber a
fundo as razões das coisas e dos fenômenos para poder dominar o encadeamento das
relações que estão por trás de alguma coisa ou alguma atividade concreta.
Estes dois âmbitos do conhecimento são aprofundados por Marglin (1990, p.
232) ao tratar dos dois "sistemas de conhecimento (...) [para] caracterizar diferentes
formas de saber." Estes dois sistemas de conhecimento são a techne e a episteme.
A techne é um conhecimento pessoal, de uso rotineiro (e, muitas vezes,
inconsciente), que se torna de difícil descrição. Ela é, em certo sentido, "autoritária",
pois, ao não seguir princípios rígidos (metodologia), ela passa a depender da intuição.
Por exemplo, um artesão com uma determinada techne não descreve tal conhecimento
uma vez que todos os resultados esperados são atingidos através do seu método próprio
não documentado. Na realidade, "os proprietários de techne seguidamente acham
impossível articular seu conhecimento" (Marglin, 1990, p. 234). É um conhecimento
implícito e, principalmente, restrito a um determinado contexto de ação, isto é,
diretamente ligada à prática que se tem com alguma coisa. Os trabalhadores e seu
know-how são até hoje o exemplo insubstituível de tal poder. A episteme, ao contrário,
é o conhecimento baseado em dedução lógica a partir de princípios rígidos onde nada
deve ser deixado ao acaso ou à imaginação. Trata-se do conhecimento científico e,
portanto, articulado. A episteme é um conhecimento analítico, universal, cerebral,
teórico e impessoal (Marglin, 1990).
Mas as diferenças não param por ai. Os próprios métodos de produção, de uso e
de transmissão destes dois tipos de conhecimento são radicalmente diferentes. A
techne (conhecimento técnico) é dependente da criação e das descobertas informais e
aleatórias, baseados em processos de tentativa e erro, enquanto que a episteme
(conhecimento científico) somente se torna válida e universalmente aceita após a
verificação metódica do seu conteúdo em confronto com os fatos e/ou casos que ela
deverá explicar, o que é feito por intermédio de pesquisa -- antes disto, é como se ele
6
2 Latour (1989) e Pavitt (1992) discutem a existência de produção de conhecimentos empíricos dentro dos
laboratórios de pesquisa científica. A "prática em pesquisa" também é geradora de conhecimentos que serão
agregados ao conjunto de conhecimentos científicos resultantes da pesquisa. Na verdade, esse tipo de
conhecimento empírico resultante não será jamais externalizado como tal, estando aí a sua diferença em relação
ao conhecimento empírico originado de outras atividades práticas quaisquer. O próprio método de pesquisa
científica permite a ocorrência deste tipo de conhecimento, ao mesmo tempo que impede a sua existência plena e
independente. Este conhecimento empírico será, tão logo possível, estudado e sistematizado, integrando-se ao
corpo de conhecimentos científicos resultantes da atividade de pesquisa.
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bem como os objetos dela originados -- objetos técnicos que substituem gradualmente
os gestos humanos. Como define Simondon (1958, p. 34), trata-se do "conjunto de
savoir-faire que permite a obtenção de um resultado em um domínio técnico qualquer."
Na verdade, existe, por trás das técnicas, um conteúdo bem mais profundo, o
qual se busca deliberadamente conhecer. É neste momento que se põe em
funcionamento um processo de observação, de racionalização, de descrição da técnica.
A CIÊNCIA não é a ação propriamente dita. Ela busca, justamente, ultrapassar
a simples ação para identificar as razões por trás do fenômeno. Na verdade, a ciência é
a decomposição epistemológica da ação, criando assim um verdadeiro sistema de
conhecimentos sobre determinado assunto. É, em última análise, o logos puro, a
descrição, a análise, o estudo, trazendo em si o know-why de uma atividade ou de um
fenômeno. A ciência não se restringe somente à ação, ela produz um corpo de
conhecimentos próprio, justamente para servir de instrumental para a descrição, a
análise e o estudo da ação. Na maior parte das vezes, a ciência altera os contornos da
ação prática em função deste instrumental.
Uma vez de posse das razões de ser da atividade e do fenômeno, a ciência
propõe um retorno à ação concreta tendo como base um conjunto de instrumentos
intelectuais, lógicos e descritivos, resultantes da decomposição e da sistematização.
Este retorno à ação, à técnica, é feito de modo lógico. Usando os termos gregos, é a
techne que se torna logos, ou seja, tecnologia.
Mas tecnologia é também aquela técnica desenvolvida exclusivavmente a partir
do discurso científico. É a descrição lógica do conhecimento que é, muito mais,
produzido de modo sistemático e não como obra do acaso, isto é, da prática. A
tecnologia não deixa de ser técnica; é a técnica que escapa do empirismo da execução
da atividade. É aquela técnica desenvolvida a partir da dimensão intelectual, discursiva
e racional. Trata-se de uma ação, de um conjunto de procedimentos e de objetos que só
se concretizam graças a um processo científico anterior de maturação de idéias (que
podem, originalmente, ter sido idéias práticas) e de busca de soluções respaldadas por
princípios teóricos previamente definidos. Em outras palavras, sabendo-se das razões
de funcionamento dos componentes de uma atividade, cria-se (muitas vezes de forma
inédita) o próprio modo de fazer a atividade, ou seja, a técnica. "As tecnologias são
modos de fazer, operações e fabricações integradas a um complexo ou a um corpo
teórico e prático, justamente aquele da tecno-ciência". (Séris, 1994, p. 2).
Obviamente, à tecnologia são acrescidos elementos de know-how prático. Isto,
no entanto, não retira do corpo técnico principal, isto é, da própria tecnologia, o seu
caráter intelectual; tão somente melhora o conteúdo já estabelecido. É, nestes termos,
que a tecnologia também contém conhecimentos empíricos, só que passados pelo crivo
da análise científica.
É justamente por isso que que o progresso técnico não é função exclusiva de
C&T, mas é função, também, do conhecimento empírico e das técnicas. Estes, mesmo
em um contexto altamente tecno-científico, continuam encontrando formas de
manifestação. Por exemplo, os operários, mestres e técnicos que, ao receberem uma
nova máquina sem, no entanto, saber como utiliza-la plenamente, desenvolvem uma
"técnica alternativa", baseada na intuição, no empirismo e que não é lógica. Esta
técnica alternativa não é uma tecnologia, mas o será enquanto técnica inserida a um
corpo tecnológico maior, a máquina em questão.
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3 Simondon (1958) desenvolve uma série de assertivas sobre as definições de "objeto técnico" e
"objeto tecnológico". Em suma, podemos considerar como sendo um objeto técnico todo o objeto que
contém uma técnica na sua origem. Por substituição, o objeto tecnológico se difere por ter uma
tecnologia na sua origem. Ambos diferem, no entanto do objeto natural, aquele que existe por si só
como resultado da natureza e sua criação. Em outras palavras, a diferença está na origem (gênese) dos
objetos.
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social que corresponde à inversão do sujeito e do objeto [no processo produtivo, e que]
é característica do capital enquanto relação de produção" (Richta, 1969, p. 18)4.
Não se deve, por exemplo, falar na "tecnologia da indústria de impressão".
Deve-se, isto sim, falar em termos da "técnica de impressão", a qual, nos últimos
tempos, sofre a ação das "novas tecnologias ligadas à indústria de impressão", como,
por exemplo, os editores de texto e a impressão a laser. Estas, aliás, não têm mais a ver
com a técnica tradicional de impressão, a não ser pelo resultado final: sinais
reproduzidos em uma superfície qualquer. O conteúdo da técnica tradicional de
impressão, baseado nos processos de carimbar, foram desenvolvidas a partir de
conhecimentos empíricos acumulados na atividade específica de impressão, não sendo
por isso, jamais, uma tecnologia.
No limiar das definições de "técnica" e de "tecnologia" está o mesmo conteúdo:
ambas traduzem um "como fazer" específico a uma atividade. Com o próprio
desenvolvimento histórico das atividades, as técnicas foram adicionando ao conjunto
de "como fazer", objetos técnicos que incorporam, de certa forma, uma parte destes
"como fazer", substituindo o próprio gesto humano. Se o homem das cavernas, ao
inventar a roda, foi dispensado de um esforço, podendo utilizar a sua capacidade
cognitiva para outras tarefas (por exemplo, desenvolver a carroça), o homofaber é
dispensado de possuir o próprio saber técnico. Com o aporte do conhecimento
científico, a memória técnica depositada nas máquinas e equipamentos é cada vez
maior, reduzindo a necessidade de o homem executar uma série de ações técnicas.
Sendo assim, "para estudar qualquer tecnologia (...) é necessário começar com as
práticas humanas e o know-how, sem abstrair seu conteúdo humano" (Clark, 1985, p.
37). Nestes termos, além de ser "máquinas em funcionamento", a tecnologia é, antes de
mais nada, "modos de fazer".
Voltemos ao início, quando foi utilizado o exemplo da abelha e do arquiteto e
quando foi definido o conhecimento como sendo uma faculdade intelectual exclusiva
do homem, e consideremos que as técnicas são elementos humanos. Mais ainda o são
as tecnologias, pois possuem o uso do intelecto para realizar a descrição lógica de uma
técnica.
Diferente do animal, cujo instinto é "fazer", o homem tem como instinto o
"pensar", onde o "fazer" é uma espécie de subproduto. Em outras palavras, o instinto
humano é de sempre resolver problemas. E é graças a isto que o conhecimento e as
suas utilizações evoluem. Ao contrário, o instinto animal é estático, isto é, o de sempre
"fazer" a mesma coisa. Um castor jamais modificará o "como fazer" que é necessário
para construir barragens à base de galhos e pedaços de troncos; já o homem, não só
imita a natureza (a barragem do castor), como a aprimora (constituindo barragens em
concreto).
4 Por trás destas afirmativas está toda a essência do materialismo histórico de Marx. Para ele, o
desenvolvimento econômico seria a causa maior do surgimento de novas técnicas/tecnologias, bem
como o responsável pela forma como a história seria escrita. Nestes termos, é na necessidade de se
desenvolver que os capitalistas buscam na ciência subsídios para resolver seus os problemas. É neste
momento que as técnicas puras vão ganhando, cada vez mais, contornos lógicos, sendo que a
tendência é haver uma substituição de corpos técnicos influenciados por novos detalhes tecnológicos
por corpos tecnológicos influenciados por detalhes técnicos.
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5. O Desenvolvimento
* * *
À guisa de conclusão, a Figura 1, abaixo, serve de resumo das principais
interações que estão contidas na relação entre conhecimento e desenvolvimento.
entretando, continua sendo gradual. A figura 2 abaixo serve para caracterizar o que
acabamos de dizer das relações entre inovação radical e incremental5.
5Cabem aqui agradecimentos a Mauro C. Real pela ajuda ao sistematizar, nesta figura, os princípios envolvidos
neste debate.
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6 Marcorini (1988) descreve uma série de avanços técnicos, científicos e tecnológicos desde a antigüidade até os
tempos de hoje, comprovando que, só no século XX, se concentra muito mais da metade de tudo o que já se
inventou e se inovou. E, como diz Landes (1994, p. 10), "o cidadão inglês de 1750 estava muito mais próximo
dos legionários de César, em termos do acesso às coisas materiais, do que de seus próprios bisnetos".
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avião, é impensável que o seu processo de produção seja realizado de modo artesanal,
pois são necessárias pesquisas de aerodinâmica, de materiais, de gabaritos, de
eletrônica, etc.
Nas modernas sociedades industriais, a complexidade tecnológica alcançou
estágios onde é absolutamente indispensável o investimento em estruturas formais de
inovação em um número crescente de setores. O processo de inovação, em si, ganha
um status sistematizado, sendo subdividido em diferentes etapas, das quais ressalta-se
as seguintes: pesquisa fundamental, pesquisa aplicada, P&D industrial, inovação,
produção. A partir destas definições passa-se a ter noção do moderno processo de
inovação (tecnológica); processo este que passa a ser a essência do progresso técnico.
A PESQUISA FUNDAMENTAL (ou básica) é um trabalho experimental ou
teórico realizado com o objetivo primeiro de adquirir novos conhecimentos sobre os
fundamentos (as razões) dos fenômenos e dos fatos observáveis, sem para tanto
preocupar-se com uma aplicação particular ou uso imediato. Ao invés de dar início a
uma cadeia de atividades que irá terminar numa aplicação específica, esta é uma
pesquisa de alto grau de generalidade que visa o acúmulo de informações cientifico-
tecnológicas e o avanço da fronteira em todos os campos do conhecimento, sendo,
portanto, de longo prazo de maturação. É, na verdade, a atividade de pesquisa
científica por excelência. Realizada em universidades e institutos de pesquisa, ela é
geralmente uma atividade autônoma e externa ao sistema econômico, porém, em
muitas situações, ela é financiada, direta ou indiretamente, pelo próprio sistema
econômico. Exemplos de financiamento direto, como o da IBM que investe em
pesquisa e colhe os frutos abrigando inclusive alguns ganhadores de Prêmio Nobel
dentro de alguns dos seus laboratórios, não são raros na iniciativa privada. De modo
indireto, os governos tendem a monopolizar os gastos com este tipo de pesquisa. Neste
sentido, são investidas somas a fundo perdido, mas que são valores incluídos em
amplos projetos ou políticas nacionais de desenvolvimento econômico.
A cadeia tem a sua continuidade na PESQUISA APLICADA. Trata-se também
de investigação original realizada com o intuito de produzir novos conhecimentos. Ela
é, no entanto, direcionada para um objetivo específico. "Na pesquisa aplicada, o
objetivo é alcançar um dispositivo utilizável e útil (...)" (Abragam, 1980, p. 1).
Geralmente, os institutos e centros de pesquisa podem ser vistos como um meio de
interface entre a ciência pura e as aplicações tecnológicas. Tem-se uma evolução
gradual do geral para o específico, partindo das universidades até chegar às empresas,
isto é, no universo da produção, local de aplicação das inovações.
Sendo a função primordial das empresas, em termos de desenvolvimento
tecnológico, garantir a aplicação material e economicamente viável das invenções, elas
devem, de qualquer forma, realizar algum esforço de pesquisa. Este esforço é
representado pela sua capacidade tecnológica, isto é, "a capacidade das empresas no
que diz respeito à seleção, ao licenciamento, à adaptação, ao aperfeiçoamento e à
difusão de tecnologias (...), assim com [a capacidade] de desenvolvimento endógeno
de inovações tecnológicas" (IPEA, 1990, p. 9). Tal capacidade é identificável através
da atividade de DESENVOLVIMENTO EXPERIMENTAL (ou P&D) realizada pelas
empresas em departamentos específicos. Aqui, o objetivo da pesquisa tecnológica diz
respeito à procura de uma solução para um problema real e imediato. Trata-se de
trabalho sistemático, desenhado com base no conhecimento científico existente e
acumulado com pesquisa fundamental e aplicada, que é direcionado à produção de
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7 Este processo formal de inovação, o qual tem origem na metodologia científica e dá origem a novas
tecnologias, é institucionalizado no sistema tecno-científico. Isto nada mais é que o objeto de análise
sistêmica da relação entre conhecimento e desenvolvimento, onde a base de conhecimento é
científica, concentrada em universidades, centros de pesquisa e empresas (Zawislak, 1991). Uma
análise em termos deste sistema subjuga, no entanto, o papel do conhecimento empírico dentro do
processo de inovação. Assim sendo, em termos de sistema tecno-científico, só é inovação o que for
resultado de pesquisa e de desenvolvimento. Isto até pode ser válido em certas realidades sociais, mas
não o é totalmente em outras.
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8 Fica aqui uma ressalva no que tange as inovações de processo em termos de máquinas e equipamentos. Kuznets
(1971) levanta o fato de que a definição de "inovação de processo" e de "inovação de produto" irá depender
muito do ponto de vista do qual se olha o resultado do processo de inovação. As inovações de processo são
caracterizadas por novas máquinas e equipamentos; ora, essas mesmas máquinas e equipamentos caracterizam
uma inovação de produto para quem as produz!
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Em resumo, o progresso das técnicas em geral deve incluir todo e qualquer tipo
de inovação (radical e incremental, de produto e de processo), mas o desenvolvimento
tecnológico será principalmente (e diretamente) influenciado pelos avanços nos
"modos de fazer". Os produtos têm um papel de estímulo às inovações de processos.
Portanto, uma empresa que investe na constituição de capacitação tecnológica, investe,
antes de mais nada, na capacidade de adequar o seu processo produtivo às normas e às
exigências de qualidade, competitividade e produtividade.
A falta de homogeneidade na qualidade de produtos, cujos projetos podem ser
altamente inovadores e conter um altíssimo nível de complexidade tecnológica, será
exclusivamente dependente do grau de desenvolvimento tecnológico do processo
produtivo. A inovação de produto, por melhor que seja, não passará de uma "invenção"
se o processo (ou a inovação de processo) por trás não viabilizar economicamente a
sua produção.
Finalmente, é mais fácil adaptar um produto qualquer a um processo
plenamente desenvolvido do que desenvolver um processo a fim de adaptá-lo a um
produto preestabelecido. O progresso técnico, mesmo que representado por produtos
cada vez mais complexos tecnologicamente, é variável dependente do
desenvolvimento tecnológico a nível de processo, e este, em suma, só irá acontecer se
o sistema econômico sentir necessidade para tanto.
Assim sendo, o simples desenvolvimento científico, sem a sua contrapartida
lógica, isto é, o desenvolvimento tecnológico, dificilmente será elemento de progresso
técnico. E, por isso, não será motor do desenvolvimento econômico.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CLARK, Norman (1985). The Political Economy of Science & Technology. Oxford,
Blackwell's.
PAVITT, Keith (1984). "Patterns of technological change". Research Policy, vol. 13,
n° 6, pp.343-74.
PAVITT, Keith (1992). "Les entreprises et la recherche de base". in: FORAY, D. &
FREEMAN, C. Technologie et Richesse des Nations. Paris, Economica, 1992.